Cap.1 - Menos um desempregado no mundo
Um tal de Colégio Augusto Ferreira estava me procurando, segundo as informações de Dona Deise,
minha mãe. Eu não sabia do que se tratava, curioso retornei a ligação. Daqui dois dias, segunda-feira,
irei dar aula para o Ensino fundamental ll, irei substituir meu amigo, Alberto. Eu e ele cursamos a mesma
faculdade, e temos a mesma profissão, somos professores de geografia. Alberto sofreu um acidente, e
vai ter que ficar alguns meses fora para recuperar-se totalmente, segundo as informações de Marília,
coordenadora do colégio.
Sabe aquelas sensações que você não esta nem um pouco animado mas no fundo, no fundo, você
pode considerar seu estômago como um pano torcido, de tanto nervosismo e ansiedade?
Eu achava que era o nervosismo de voltar a trabalhar, de ver os alunos, de ver toda aquela bagunça...
Mas no meu último emprego, eu percebi que tinha horas para brincar e outras horas para ficar sério.
Fiquei seis meses sem dar aulas, eu precisava voltar a me acostumar com a rotina, provas, lições de
casa, trabalhos, notas baixas... O de sempre.
Meus pais ficaram felizes por mim, e a caçula da família, minha irmã Elizabeth, mais conhecida como
Liz, estava mais preocupada com os preparativos de seu casamento.
°°°°°°°°
Marília, conversou comigo antes dos portões da escola se abrirem, ela me disse que o salário seria
o mesmo que Alberto ganhava e me disse sobre projetos e eventos anuais do colégio. O colégio era
grande, pelo o que eu ouvia o método de estudo e o material era bastante rígido e completo, o que vi
que judiava bastante das crianças dessa escola. Marília me apresentou aos professores, e as mulheres
eram todas velhas, então, resumindo, brochei. Eu não busco relacionamentos no trabalho, só é divertido
tirar algumas casquinhas das professoras gatas e da minha idade.
A primeira aula, foi interessante, a minha técnica de ensino é ignorar os nerds e ajudar aqueles que
precisam de ajuda e que busca ajuda, eu sempre ignorei e desrespeitei os métodos de estudo que eu
considero que são rígidos e muito exigentes, eu apenas sigo a apostila, mas como ainda são crianças,
sempre ficam confusas as tratando como alunos do colegial, menos matéria no caderno, mais falatório.
Por isso, sempre fui demitido por não cumprir as regras do colégio.
Marília ficava me avaliando, séria, fria, eu odeio esse tipo de gente. Fria, calculista... então, nos
últimos minutos daquela aula, eu quase a fiz ter uma indigestão, de tanto que riu, apesar de sair daquela
sala, ela voltando a ficar séria subitamente, como se fosse manipulada nessa escola.
A próxima aula, seria no 9°ano, isso seria divertido, pois minha família sempre me viram como
um homem mas com alma de criança e adolescente de 14, 15 anos. Isso seria bastante legal, sinto
que vou me inturmar bastante com essa turma. Enquanto aproximávamos da porta da sala, aquela
sensação tensa de frio na barriga de ontem voltou a me perturbar. Ao entrarmos na sala, eu quase ri,
os alunos, estavam fazendo bagunça na sala como sempre nos intervalos das aulas, mas quando eles
viram a Marília, automaticamente correram para seus lugares, encarei Marília, com os lábios cerrados,
controlando-me para não rir, tentar ter pelo menos uma postura disciplinado e exigente na frente da
Marta.
Enfim, os alunos que correram estavam ofegantes ainda da ‘’correria’’ , menos uma pessoa, uma
menina, quer dizer, ela nem se deu ao trabalho de correr para o lugar dela, por que o evidente estava
que ela sempre estava no lugar dela. Ela parecia tão concentrada na lição, o que seja que ela estava
fazendo, que ela tinha até aquela ruguinha de conflito, perturbação.
― Crianças, esse aqui é o professor Eduardo, ele irá substituir o professor de geografia, Alberto por
alguns meses... ― eu não prestava atenção mo que Marília falava, como se eu estivesse abobalhado por
aquela garota, eu só enxergava ela.
― Fernanda? ― Marta chamou sua atenção.
Fernanda, era o nome da garota que na qual eu estava completamente curioso sobre ela.
― Desculpe ― ela largou o que estava fazendo, e recostou-se na cadeira, e cruzou os braços.
Quando olhei para as feições daquela garota, fiquei chocado, evitando que meu queixo caísse.
Até certa parte, ela era bonita, tinha cabelos e olhos castanhos, nariz um pouco rebitado, e a boca
menor que o meu polegar, de tão pequenina. A parte que eu mais me assustei, foi a aparência de seu
rosto, não era nada saudável e nada comparável com um ser humano vivo. Ela era muito pálida, com
profundas olheiras e ainda mais com olhos inchados e vermelhos, como se tivesse a prantos a uns 5
minutos atrás, o que era bastante evidente, pois dava para enxergar a umidade de seus olhos de longe.
Nada daquilo era normal.
Dei minha aula normalmente, Fernanda pareceu descontrair-se um pouco, algumas garotas ficaram
me olhando com luxuria, e eu lutando contra a vontade de mostrar a língua para elas, por serem tão
idiotas por paquerarem um professor. Em relação a alunas darem em cima de mim, eu ignorava.
De relance, vi Fernanda passando as suas mãos pelas suas bochechas, preocupado, percebi que ela
estava limpando as suas lágrimas, limpando qualquer e mínimo vestígio de seu recente choro. Disfarçou-
se em uma aluna que estava completamente atenta nas coisas que eu falava. Por que ela chora tanto?
Eu estreitei meus olhos, eu não sabia como ela interpretava meu olhar, mas eu realmente me sinto
preocupado com aquela garota, pela primeira vez na minha carreira, eu senti vontade de correr até ela,
pegar sue rosto entre minhas mãos e perguntar o que estava acontecendo com ela, por estar chorando.
― Gente, pelo período que irei ficar com vocês, quero tornar amigo e vocês, quero que me conte o
que esta sentindo, as suas vontades. Enquanto, eu estar aqui nessa sala, eu não vou estar dando aulas
a vocês, mas sim conversando sobre um assunto que vocês não conhecem, por tanto atenção, eu vou
estar ensaiando-os para o colegial, por que no colegial, a metade da sala tem tendência de repetir de
ano ― a metade do que eu disse, a primeira parte eu havia dado um indireta a ela.
Acho que aquela foi a aula mais lenta e interessante que eu já havia dado. Os mandei fazer alguns
exercícios, enquanto os assistia trabalhar, eu planejava internamente alguma forma de eu me aproximar
daquela garota, e desvendar todo aquele mistério que ela mesma emanava.
― Marília? ― a chamei e ela assentiu, permitindo-me falar ― O que há com a Fernanda? – perguntei
enquanto estávamos indo para a sua sala, no final do dia, quando a escola inteira estava vazia.
― Senta-se, por favor, professor ― ela gesticulou para as duas cadeiras que se encontravam a frente
de sua mesa.
― Sem o professor, me chama de Eduardo, apenas ― disse ― Então...?
― Ela perdeu um amigo a uns três anos atrás. Eles se conheceram por aqui mesmo, na escola, eles
estavam no 6° ano, ela sempre foi sozinha, dava para ver que ele não era de deixar ninguém de lado,
e eles se tornaram grandes amigos, eram vistos como irmãos, e eles se consideravam irmãos. Depois
de algum tempo fiquei sabendo pelos pais dele que ele estava com leucemia, com os dias contados. A
família dele estava desesperada, sem saber o que fazer, era uma família pobre, uma família que não
tinha nem 10% da quantidade de dinheiro para pagar o tratamento [...]
No que eu ouvia, sentia pena, angustia, decepção, choque... Pensando na garota, e no garoto
também. Mas a pergunta era: Será que ela sabia disso?
[...] eu tentei ajuda-los, mas como eram orgulhosos de si mesmo, era impossível deles aceitarem
uma boa quantidade de dinheiro para pagar o tratamento mas eles não aceitavam de jeito nenhum. Eu
pensava nele, na Fernanda, qual seria a reação dela?...
― Espera ai, espera, ela não sabia? ― perguntei perplexo, como assim ela não sabia? Aquela garota
tinha que saber o que estava acontecendo com o seu ‘’amigo’’, por mais seja forte que fosse o vínculo
entre eles, não importa, ela tinha que saber. Marília suspirou, frustrado, eu já sabia a sua resposta: Não,
ela não sabia que o seu melhor amigo, seu ‘’irmão’’, acima de tudo, estava com leucemia, e estava com
os dias contados.
Sempre fui carinhoso com meus alunos, até mesmo aqueles que tem problemas na minha matéria,
eu não sou do tipo que que é frio e calculista como a maioria dos professores dessa escola parecem ser.
Claro, sempre tem hora para rir e para chorar. Mas com Fernanda, eu realmente estava preocupado,
nenhum aluno meu passou por isso. Mas perder o melhor amigo, por causa de uma doença, parece ser
pesadelo para uma adolescente de 13, 14 anos.
― O garoto me pediu para nunca tocar nesse assunto perto dela, e eu o entendia, ele não queria
contar que estava a beira da morte quando estava sendo fiel a uma garota de 12 anos, frágil, delicada e
infantil. Ele não queria contar a ela que estava doente, para não machuca-la mais do que estaria depois
que ele partisse. Antes disso acontecer, ele foi afastado do colégio, mentindo para a garota que ele
estava viajando, para os médicos tentar convence-lo a voltar a tomar os remédios, mas ele era teimoso
o bastante com a ideia que com os remédios não iriam fazer efeito algum.
O garoto era forte, pelas palavras de Marília, e logicamente teimoso. Muito teimoso. Parecia que ele
queria mesmo machuca-la profundamente. Se ele era tão próximo a ela, se era tão fiel a ela, porque
ele não queria contar a verdade para ela? Quando se é fiel a alguém não deve ter segredos entre eles,
certo?
― Como ela descobriu? ― perguntei, com uma voz derrotada.
― Quando os aparelhos o mantinham vivo, quando os médicos decidiram desligar os aparelhos, ela
descobriu uns segundos antes dele partir...
― O que? ― perguntei perplexo. Eu não me fazia de surdo, só queria confirmar o que eu havia
ouvido. Ele tinha morrido com ela vendo e tudo mais? Com aquele piiiiiiiiiiiiiii irritante, como os filmes
americanos, que geralmente significa que o protagonista morreu?
Marília estava com lágrimas nos olhos, prestes a serem derramadas, eu poderia consol-la, mas
não agora, eu queria saber primeiro o que havia realmente acontecido nquele momento totalmente
inusitado para mim, algo que não poderia ter acontecido com ela, com uma garotinha de 12, 13 anos.
Marília disse-me que ela ao entrar no quarto do hospital no qual ele estava, ela já estava chorando,
indicado que já sabia do movimento ao seu redor, ou seja, ela já sabia realmente do que estava
acontecendo com o seu melhor amigo naquele momento. Ele estava morrendo.
O garoto morreu nos braços dela, depois do último abraço dos dois, o abraço de despedida fazendo
todos daquele quarto emocionarem-se, seus pais, os pais da garota, os médicos.... Todos.
Ao sair daquela sala, eu fiquei com um tipo de um peso na consciência, pois eu realmente queria me
aproximar daquela garota mas não como professor, mas sim como amigo, alguém que pode rir sem
medo, contar os mais íntimos segredos, perguntar se você esta bem, feliz... Eu queria ser isso para ela.
Mas tudo envolve essa minha vontade, envolve minha carreira, minha profissão, a escola, os próprios
pais da garota, e principalmente ela.
Ela é do tipo de garota que me pareceu ser birrenta, teimosa, e... mimada. Mesmo de não conhece-
la, antes e depois daquela fase, que eu não presenciei.
A cada passo que eu dava em direção ao portão principal da escola, parecia que algo evitava que
minha ficha caísse, tornando cada vez mais difícil sentir-me ‘’péssimo’’ com a história que ouvi a poucos
minutos.
E a cada passo também, eu ouvia um barulinhos, soluços, uma espécie de choro, não melhor, era um
choro. Envolvente e curioso como sou, fui em direção ao barulho curioso.
Uma garota, estava chorando, eu sabia que era garota por causa dos compridos cabelos, mas não tendo
a visão do rosto eu não sabia quem era a garota.
‘’ É normal encontra-la encolhida pelos cantos do colégio, aos prantos, quando professores a
encontram, eles já estam acostumados, as vezes eles prestam ajuda, mas ela recusa...’’ As palavras de
Marta ecoaram em minha mente.
Aquela garota que se encontrava chorando compulsionavelmente a minha frente, era a Fernanda.
Imediatamente, larguei meu material, minhas coisas no chão de qualquer jeito e corri até ela, causando
nenhum efeito sob ela, Mas sim em mim, desespero, preocupação... Toquei seu cabelo sutilmente, a
fazendo levar susto, e levantar a cabeça assustada, e acidentalmente batendo a cabeça na parede com
violência.
― O que você está fazendo aqui? ― ela perguntou com uma voz chorosa e grogue por causa do seu
choro. Soluçando, e soluçando cada vez mais, logicamente, fazendo-a não ter fôlego para respirar. Suas
bochechas estavam alagadas, se antes seus olhos estavam inchados, agora podiam ser comparadas com
duas bolas de golfes.
― Ei... calma, eu não vou te fazer mal algum ― disse calmo por fora e nervoso por dentro. Seus
olhos, impossivelmente, encheram-se de lágrimas, e seu queixo tremeu, enfim,ela explodiu de novo em
lágrima. Ela me abraçou, chocado, e tonto como sou, demorei á retribuir aquele abraço, eu envolvi meu
braços em sua cintura, em um jeito fofo e meio, ela deitou a cabeça em meu ombro. Seu corpo tremeu
violentamente ― Ei, calma ― seus braços apertaram mais ao redor de meu pescoço. Eu virei minha
cabeça e apliquei um beijo na lateral de cabeça onde ela havia batido antes.
Com dificuldade, eu a peguei no colo, como uma criança pequena, a ‘’deitando’’ horizontalmente no
meu corpo, eu a apertei mais meu braços ao seu redor, a ninei como um bebê, e aquela garotinha tinha
um delicioso aroma de bebê, e ela própria era como um bebê, uma criança indefesa, insegura, e sozinha
nessa situação. Eu acho.
Eu estava sentado no chão do corredor do colégio, e ela dormindo, depois de muitos soluços e eu
pedindo para que ela se acalmasse, um pouco pelo menos, no meu colo. Eu não sei o que estava dando
em mim, eu nunca me envolvi tanto com uma pessoa, principalmente um aluno meu, mas as vezes eu
acariciava seu cabelo, secava todos os vestígios de suas lágrimas, como se eu mesmo fosse o próprio
garoto que mentiu para ela, que era excepcionalmente especial para ela.
Então... o que eu vou fazer com ela?