Pequeno texto de apresentação sobre relação possível que estabeleço entre a técnica de consciência corporal e profunda pedagogia corporal que é a Eutonia e laboratórios da performance art. Sinopse extraída da minha dissertação de mestrado apresentada à UNICAMP, em 2006, Instituto de Artes, com o título: O Self dança: uma proposta de individuação hipertextual.
1. EUTONIA,
PEDAGOGIA CORPORAL E TERAPÊUTICA
A performance contemporânea vem se atualizando como práticas estéticas e
vivências sensíveis que nos transportam inevitavelmente a estados alterados de percepção,
elaborados no laboratório de improvisação, num espaço protegido que chamo de Temenos
onde, num continuum de elaboração e reflexão sobre o corpo em movimento, o movimento
nasce.
Levando em consideração que só construo minha própria dança enquanto construo a
mim mesma, a dança se apresenta como dinâmica de símbolos que se atualizam e se
alimentam do processo que os gera, numa interdependência e simultaneidade de
criatividade-produção processo.
Eutonia, concebida por Gerda Alexander, aluna de Jacques Dalcroze entre 1915 e
1929 é um processo que traz um autoconhecimento através da percepção e da
conscientização corporal. É uma pedagogia bastante profunda, pois através de uma direção
atenta do eutonista, aprofunda no indivíduo a percepção de si mesmo e do corpo como
unidade integrada.
Esse método está baseado principalmente no contato com o solo e com objetos,
investigando a mudança de tônus muscular, da postura, de sensações e das percepção de
si mesmo. O método explora também o uso do esqueleto como alavancas para o
movimento.
Por ser um processo de investigação simultaneamente do corpo e de si mesmo,
descompromissado em relação à estética do movimento e, também, por ser um método
puramente sensorial, podemos reconhecê-lo como o instrumental mais adequado e
desprovido de “matéria” para composição do movimento na dança.
Gerda Alexander, com grande influência da euritmia – método de ensino baseado
na
música e no movimento, de Jacques Dalcroze do início dos anos 1900 - não só concebeu o
corpo como unidade psicofísica, mas também, em plena eclosão dos grandes nomes da
arte moderna, antecipava o que hoje, mais de 80 anos depois, é vanguarda na arte
contemporânea e sempre foi uma necessidade humana: individuar-se. Não seguindo um
2. estilo ditado por outro, (Marcellino, 2006, p. 52) (mas) ... Sim desvelando suas
potencialidades, sua totalidade humana, expandindo-as e atingindo múltiplos significados.
Trata-se de um processo de vivências sensíveis do movimento onde se desenvolve a
consciência corporal, a reorganização postural e o conhecimento profundo de si mesmo.
Ativando reflexos, a Eutonia permite uma organização harmônica da coluna
vertebral, alinhando a postura, restabelecendo uma corporeidade natural e consciente.
É uma pedagogia corporal que explora e desenvolve toda a complexidade do
indivíduo, partindo do princípio de que ele deve ser agente-ativo em sua constante
transformação, resgatando sua autonomia psíquica e motora.
A Eutonia, assim como a dança, não aborda o corpo apenas do ponto de vista
orgânico/estrutural; além dos aspectos neuromotor e músculo esquelético, aborda o
organismo como um todo que vivencia, capta, transmite no dia a dia e ao longo da vida,
suas emoções e impressões. Através da ação muscular e da estrutura óssea na regulação
do tônus, da postura e do movimento, os aspectos simbólicos que emergem da observação
dessas vivências. Afirmam os eutonistas, pela longa experiência e depoimentos, que os
indivíduos resgatam e integram conteúdos psíquicos fundamentais para seu equilíbrio
psíquico, para sua capacidade expressiva e autonomia nas atividades diárias. Esse
ambiente sensível - corpo - que intermedia, pela fronteira dos sentidos, todo o universo
dentro ao universo fora, mas que é um universo só, é o ambiente no qual vivenciamos nossa
própria existência. (Marcellino, 2006, p. 53).
i
Eutonia como suporte para os laboratórios de dança.
A finalidade do uso desse método nos nossos laboratórios será de trazer um maior
recolhimento, um estado de consciência interior sem perder a consciência do movimento,
tanto orgânico quanto subjetivo, estabelecendo um diálogo entre o consciente e o simbólico.
O corpo pensa através de ações, percepções e sensações e a psique através de
imagens. A imagem psíquica pode se atualizar novamente no pensar corporal, desta vez
transformadas pelo encontro das duas realidades. O corpo torna-se acesso e portal de
investigação daqueles conteúdos que ficam no lado obscuro, prontos para sair, mas que
esbarram, não sabemos ainda em quê.
3. É possível pressentir que, o que pesa sobre o corpo são os códigos, a técnica. E se
o corpo quiser dizer de outra forma e não encontrar a linguagem “correta”? Dar de cara no
chão, jogar-se e espreguiçar? Precisaria de liberdade. A liberdade da performance, tomando
como referência que nós performers não representamos nem interpretamos um personagem
ou situação, mas, apresentamos situações ou dramatizações de nós mesmos. Gestalt!
Encontremo-nos no corpo!
Profa. Ms Vera Cristina Marcellino,
Mestre em Artes pela Unicamp,
Bacharel e Licenciada em Dança pela Unicamp.
Facilitadora de recursos expressivos em saúde mental
e arte-terapia (dança).
Mediadora de vivências em Eutonia.
Aborda e pesquisa a articulação e diálogo entre
performance-art,
somma psíquico e psicologia analítica.
4. i
i Marcellino, Vera Cristina. O Self dança: uma proposta de individuação hipertextual. /
– Campinas, SP: [s.n.], 2006.