1) Uma candidata recorreu da decisão do TRE que desaprovou suas contas de campanha por não comprovar adequadamente a origem de R$ 230.000 utilizados.
2) O TRE entendeu que os documentos apresentados não comprovavam que R$ 100.000 depositados na conta de campanha vinham de um empréstimo feito em abril.
3) O ministro negou provimento ao recurso por entender que o TRE analisou corretamente os fatos e provas e não houve prequestionamento ou divergência jurispr
Projeto de leis desmembrando secretarias em tocantinópolis
Decisão monocrática sobre desaprovação de contas de candidata
1. Decisão Monocrática em 24/04/2012 - RESPE Nº 220934 MINISTRO MARCELO
RIBEIRO
DECISÃO
Solange Jane Tavares Duailibe de Jesus, candidata ao cargo de deputado estadual em
2010, interpõe recurso especial (fls. 521-554) de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral
do Tocantins (TRE/TO) que, à unanimidade, desaprovou suas contas de campanha, o
qual foi assim ementado (fl. 453):
PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2010. AUSÊNCIA DE
PREVISÃO LEGAL PARA EMPRÉSTIMOS PESSOAIS. IMPOSSIBILIDADE DE
EFETIVO CONTROLE SOBRE AS FONTES DE FINANCIAMENTO DA
CAMPANHA ELEITORAL. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS SUBSTANCIAIS DE
ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DESAPROVAÇÃO.
1. A modalidade de empréstimo bancário objetiva manter o controle efetivo pela Justiça
Eleitoral da regularidade de utilização das fontes de financiamento da campanha
eleitoral, pois, de outro modo, perderia-se o alcance da origem dos recursos.
2. A Lei 9.504/97, bem como a Resolução TSE nº 23.217/2010 não prevêem
empréstimos pessoais como forma de financiamento de campanha, somente
empréstimos bancários, conforme art. 17, § 2º, da mencionada Resolução. O objetivo de
tal dispositivo é, justamente, permitir que a Justiça Eleitoral mantenha o controle efetivo
sobre as fontes de financiamento da campanha eleitoral. Caso contrário, estaria aberta a
possibilidade de triangulação de recursos, uma vez que se um terceiro quisesse doar
recursos à candidatura, mas sem se identificar como doador, faria a doação (seja em
espécie seja por meio da conta bancária pessoal) ao candidato e ele aportaria na sua
conta específica de campanha como se fossem recursos próprios.
3. A aceitação da modalidade de empréstimos pessoais (não bancários) como fontes de
financiamento da campanha eleitoral tornaria possível a ocorrência de doações por
terceiros, sem verificação, pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, dos limites
previstos no art. 16, I e II, da Resolução TSE nº 23.217/2010, uma vez que estariam
convertidas em empréstimos.
4. Caso, ademais, em que o valor de R$ 130.000,00 (cento e trinta mil reais)
supostamente objeto de empréstimo pessoal em 20/7/2010 (durante a campanha) não foi
depositado de uma única vez na conta bancária aberta especificamente para a campanha,
tornando inverossímil a defesa da candidata no particular.
5. Não tendo a candidata informado em sua declaração de bens a existência de R$
100.000,00 (cem mil reais) em dinheiro, não há como reconhecer, à míngua de qualquer
prova adicional, que esse montante depositado na sua conta bancária específica seria
proveniente de saque realizado no mês de abril de 2010.
6. Não estando adequadamente comprovada a real origem de recursos substanciais
2. utilizados na campanha da candidata (R$ 230.000,00), deverá ser desaprovada as contas
e determinada a transferência dos respectivos valores ao Tesouro Nacional.
7. Contas desaprovadas por unanimidade. Determinação, por maioria, da transferência
de R$ 230.000,00 (duzentos e trinta mil reais) ao Tesouro Nacional.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 508-513).
A recorrente, afirmando a existência de prequestionamento da matéria e a
desnecessidade de reexame de provas, indica divergência jurisprudencial com julgados
desta Corte e de tribunais regionais eleitorais.
Aduz que o acórdão recorrido está ¿fundamentado em meras presunções de que os
esclarecimentos e documentos apresentados pela recorrente não correspondiam à
realidade dos fatos" (fls. 532-533).
Ressalta que, "enquanto o TRE/TO julgou por presunção, os acórdãos dissidentes
deixam claro a impossibilidade de se desaprovar contas sem a existência de provas da
materialidade das falhas apontadas (fls. 541-542).
Assevera que o Tribunal de origem desaprovou suas contas sem fundamentação em
qualquer prova, concluindo que a quantia de cem mil reais, depositada na conta bancária
específica, não corresponderia ao montante proveniente de saque realizado pela
candidata, o qual foi devidamente comprovado nos autos, inclusive com microfilmagem
do cheque nominal à recorrente.
Esclarece que o fato de não ter informado em sua declaração de bens a existência do
aludido valor, ¿por um mero lapso de cunho eminentemente formal, não é suficiente
para subsidiar a suspeita de que o dinheiro depositado na conta específica não seria o
mesmo oriundo do empréstimo firmado pela embargante em abril de 2010" (fl. 542).
Salienta que "no presente caso houve o atendimento à finalidade no que se refere à
aferição da regularidade na arrecadação de recursos, posto que o montante de R$
100.000,00 (cem mil reais) não adveio de fonte vedada pela legislação regente,
conforme se depreende do conjunto probatório dos autos" (fl. 547).
3. Destaca que o art. 17, § 2º, da Res.-TSE nº 23.217/2010, citado no acórdão recorrido,
¿não traz qualquer vedação a tomada de empréstimo pessoal junto à pessoa física ou
jurídica, a fim de utilizá-lo como recursos próprios na campanha, desde que neste
último caso não se enquadre nas vedações expressamente previstas" (fl. 548).
Afirma que a Corte Regional, mais uma vez, julgou por presunção, quando considerou
que o empréstimo pessoal, no valor de cento e trinta mil reais, teria se originado de
fonte vedada.
Acrescenta que não pode subsistir a tese de que os empréstimos pessoais não advindos
de instituições bancárias seriam proibidos pela legislação vigente, uma vez que o
legislador não incluiu essa espécie de arrecadação de recursos no art. 15 da Res.-TSE nº
23.217/2010.
Aponta violação ao art. 30, II, e §§ 2º e 2º-A da Lei nº 9.504/97, argumentando que o
conjunto probatório dos autos permite a aferição da regular movimentação financeira da
campanha, devendo ser reformado o acórdão combatido, porquanto fundado em
irregularidades devidamente sanadas.
Assegura que agiu de boa-fé, pois se empenhou em demonstrar a verdadeira origem dos
recursos utilizados em sua campanha eleitoral, atestando a veracidade de todos os dados
informados em suas contas.
Sustenta que, em atendimento aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade,
sua prestação de contas deve ser aprovada, uma vez que "as falhas supostamente
detectadas não são graves o suficiente para ensejar a rejeição, podendo, quando muito,
permitir a sua aprovação com ressalvas" (fl. 554).
O presidente do TRE/TO admitiu o recurso às fls. 586-590.
A Procuradoria-Geral Eleitoral manifestou pelo não conhecimento do recurso (fls. 599-
605).
É o relatório.
4. Decido.
O recurso não merece prosperar.
Inicialmente, assinalo que a questão relativa à existência de boa-fé e à aplicação dos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade não foi objeto de debate pelo
Tribunal a quo. Do mesmo modo se diz do aludido art. 15 da Res.-TSE nº 23.217/2010,
o qual dispõe acerca das fontes vedadas de arrecadação de recursos de campanha.
Assim, à míngua do indispensável prequestionamento, tais matérias não podem ser
analisadas em sede de recurso especial.
Não há também como prosperar a apontada ofensa ao art. 30, II, e §§ 2º e 2º-A da Lei nº
9.504/97.
A Corte Regional, soberana na análise dos fatos e provas, assentou a ausência de
comprovação da real origem de recursos substanciais utilizados na campanha da então
candidata, ora recorrente, o que impossibilitou o efetivo controle das contas prestadas.
Colho do voto condutor do acórdão integrativo (fls. 510-512):
[...] diferentemente do que sustenta a embargante, a questão não se cinge à
comprovação de saque na conta pessoal da então candidata, no mês de abril, mas à
origem não comprovada de recurso que transitou pela conta específica para
movimentação da campanha, o que, aliás, constou expressamente do voto oral condutor
do acórdão, conforme excerto das notas taquigráficas:
¿Em relação àquele primeiro empréstimo bancário de cem mil reais contraído em abril,
cujo valor teria sido sacado diretamente no banco em dinheiro pela então pré-candidata,
não tenho condições de reconhecer como tendo sido utilizado agora na campanha
mediante depósito na conta específica. Afinal, o valor (R$100.000,00) foi sacado em
abril. A candidata, ao requerer o registro de candidatura, provavelmente no início de
junho, não declarou que tinha esse valor em dinheiro. Depois o dinheiro entrou na conta
específica e ela quer atribuir esse depósito àquele saque feito em abril. Não vejo como
5. estabelecer um nexo de causalidade entre o saque do empréstimo (R$100.000,00) em
abril e o valor depositado na conta específica de campanha após o requerimento de
registro de candidatura.
(...)
Entraram cem mil reais na conta e a candidata quer atribuir esse valor ao empréstimo
que ela efetivou em abril, cujo montante teria sido sacado em dinheiro e que não
constou no início de julho da sua declaração de bens para a Justiça Eleitoral. Ora, se não
constou da declaração de bens não há como presumir que ela mentiu em julho para
agora se valer da própria torpeza para se valer em seu benefício. Afinal, há o princípio
geral do direito segundo o qual ninguém pode se beneficiar da própria torpeza. Assim,
se ela omitiu conscientemente esse valor na declaração, não pode agora se utilizar dessa
omissão para tentar salvar sua prestação de contas. Entendo, portanto, que esses cem mil
reais que ela atribui a empréstimo de abril são de origem não comprovada, sendo esse o
primeiro motivo para desaprovação das contas." (fl. 460) (grifei e negritei)
Além disso, não se tratam de meras presunções sem fundamentação em qualquer prova,
como quer fazer crer a embargante. Constou expressamente do voto condutor do
acórdão (conforme notas taquigráficas acostadas aos autos) que:
¿Entendo que há prova de que a candidata não tinha os cem mil reais em dinheiro no
início da campanha. A prova é a declaração de bens que ela fez omitindo esse valor.
Entendo que isso é uma prova. E prova oriunda da própria candidata, quando declarou o
que tinha e não incluiu esse valor. Não acredito que uma pessoa se esqueça de cem mil
reais em dinheiro guardados em casa." (fl. 462) (negritei)
[...]
Ademais, por ocasião da prolação do voto condutor do acórdão, restou asseverado que:
"[...] Sinceramente, não considero verossímel essa tese de que a candidata pegou, no dia
20 de julho, um empréstimo pessoal de cento e trinta mil reais para fazer despesas de
campanha e não depositou esse dinheiro imediatamente na conta específica, optando por
depositá-la de forma fracionada conforme as despesas eram realizadas. Por isso,
também entendo que, em relação aos cento e trinta mil reais, temos mais uma vez
utilização de recursos de origem não comprovada.
(...)
6. É preciso que seja empréstimo bancário, porque só assim se tem certeza de que os
recursos são provenientes de empréstimo e não de doação de uma fonte vedada ou de
alguém que esteja fazendo doação acima do limite." (fl. 461) (grifei e negritei)
Insiste a então candidata no argumento de que a Corte de origem entendeu pela
desaprovação de suas contas com base em mera presunção. No entanto, o que se
depreende dos excertos transcritos acima é que o TRE/TO formou sua convicção
levando em conta todo um contexto fático-probatório.
Assim, ao contrário do afirmado pela recorrente, a análise dos argumentos recursais
implicaria, efetivamente, reexaminar fatos e provas, o que não é permitido em sede de
recurso especial eleitoral, a teor da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça e da
Súmula nº 279 do Supremo Tribunal Federal.
Em relação ao disposto no art. 17, § 2º, da Res.-TSE nº 23.217/2010, ainda que se
entenda, como quer a recorrente, pela possibilidade de se contrair empréstimo pessoal
de terceiro para o fim de aplicá-lo na campanha eleitoral, assentou o Tribunal Regional
que, na espécie, a veracidade da origem dos recursos informados - R$ 130.000,00 - não
foi plenamente evidenciada.
Delineado esse quadro, não há como afastar a incidência das indicadas Súmulas nos
279/STF e 7/STJ.
Além do mais, o dissídio jurisprudencial invocado não é apto a reformar o acórdão
recorrido, pois não demonstrada a similitude fática entre os acórdãos confrontados.
Diversamente dos casos colacionados, não foi confirmada, na presente hipótese, a real
origem de recursos declarados na prestação de contas da candidata, restando
prejudicado o seu efetivo controle e fiscalização pela Justiça Eleitoral.
Adoto, ainda, como razão de decidir, o parecer da d. PGE (fl. 602):
7. O Tribunal considerou, então, que todas as impropriedades verificadas nas contas
versadas comprometeram sobremaneira a confiabilidade das informações prestadas à
Justiça Eleitoral.
Já nos arestos paradigmas, as contas dos candidatos foram aprovadas com ressalvas
porque as impropriedades não comprometeram a regularidade da prestação de contas
e/ou perfizeram um montante inexpressivo (TRE-ES, TER-MG). É digno de nota que
um dos arestos do TRE/MG (p. 534) refere-se à matéria criminal, e o do TRE/SC (p.
534) versa sobre a falta de contabilização de recursos.
Ante o exposto, nego seguimento ao recurso especial, com base no art. 36, § 6º, do
RITSE.
Publique-se.
Brasília-DF, 24 de abril de 2012.
Ministro Marcelo Ribeiro, relator.