Este documento apresenta a primeira aula de uma apostila sobre direito civil. Resume os principais conceitos de direito, distinguindo entre direito objetivo e subjetivo, e entre direito natural e positivo. Explica que o direito objetivo estabelece normas de conduta social, enquanto o direito subjetivo confere faculdades aos indivíduos. Também divide o direito positivo em geral, particular, comum e especial.
1. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
AULA 01 – CURSO DE DIREITO CIVIL
PARTE GERAL
UNIDADE I – DO CONCEITO E DIVISÃO DO DIREITO
1. Introdução
2. Conceito de Direito
2.1 Definição Etimológica do Direito
2.2 Definição semântica de Direito
2.3 Acepções do Direito
2.3.1 Direito Objetivo e Subjetivo
a) Classificação dos direitos subjetivos
i) Quanto à pessoa, objeto do direito
- Direitos Subjetivos Públicos
- Direitos Subjetivos Privados
– Patrimoniais
– (Creditícios e Reais)
– Não Patrimoniais
ii) Quanto a suas qualidades
- Absolutos x Relativos
- Transmissíveis x Intransmissíveis
- Principais x Acessórios
- Divisíveis x Indivisíveis
- Renunciáveis x Irrenunciáveis
2.4 Direito Natural e Direito Positivo
a) Divisão do Direito Positivo
i) Direito Geral e Particular
ii) Direito Comum e Especial
iii) Direito Regular e Irregular
iv) Direito Público e Direito Privado
1. Introdução
Os atuais planos de estudos das Faculdades de Direito incluem, entre as disciplinas do
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primeiro ano, o ensino e o estudo da Teoria Geral do Direito Civil. É esta tarefa que
vamos empreender.
Impõe-se-nos um estudo do direito civil — e um estudo que considere o direito civil na
perspectiva de uma teoria geral. Equivale isto a dizer que não vamos curar de problemas
específicos de qualquer dos setores ou divisões que se possam estabelecer dentro do
direito civil (direitos de crédito, direitos das coisas, direitos da família, direitos das
sucessões).
Note-se que vamos assim cuidar da Parte Geral do Direito Civil dividida em duas teorias a
Teoria Geral da Norma Jurídica e a Teoria Geral da Relação Jurídica.
2. Conceito de Direito
A primeira idéia que devemos trabalhar é a de adaptação, adaptação do homem a si
próprio e ao meio em que vive. É da natureza das coisas que o ser humano, a fim de
realizar seus ideais, adapte-se à natureza. O que vale dizer, que o homem cria seu
mundo cultural e a ele se submete, valendo-se de processos adaptativos quer internos,
quer externos.
Mas onde entra o Direito?
Para respondermos a esta pergunta, carece analisar a relação humana com a sociedade
de seu duplo aspecto de adaptação: de um lado o Direito ajuda o homem a se adaptar às
condições do meio; de outro, é o homem que deve adaptar-se ao Direito, preestabelecido
segundo suas próprias aspirações.
A vida em sociedade só é possível com organização, daí a necessidade do Direito.
A sociedade cria o Direito para formular as bases da Justiça e segurança. Mas o Direito
não gera o bem-estar social sozinho. Seus valores não são inventados pelo legislador,
sendo, ao contrário, expressão da vontade social.
Se o Direito é fator de adaptação social, surgido da necessidade de ordem, Justiça e
segurança, caso a natureza humana atingisse nível supremo de perfeição, sem dúvida
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alguma, o Direito tenderia a desaparecer.
Em poucas palavras, o Direito não corresponde às necessidades individuais de cada
pessoa. Corresponde sim a uma carência da coletividade de paz, ordem e bem
comum.
Para o indivíduo e para a sociedade, o Direito não constitui fim em si mesmo, mas
apenas meio para tornar possível a convivência e o progresso social.
Nesse sentido, o Direito deve estar sempre se refazendo, de acordo com a mobilidade
social, pois só assim será instrumento eficaz na garantia do equilíbrio e da harmonia
social. O que se denomina de Dialética do Direito.
Mas o que é direito? Qual o significado dessa palavra tão corriqueira? Como
poderíamos definir o termo direito, enquanto objeto de nossos estudos.
De início, deve ficar claro que a palavra direito é polissêmica, ou seja, tem várias
acepções. Daí decorre que direito tem várias definições, dependendo da acepção sob
análise. Seria errôneo dar-se apenas uma definição para direito.
Devem ser dadas tantas definições, quantos forem os sentidos do vocábulo.
2.1 Definição Etimológica do Direito
A palavra direito vem do latim directum, que significa aquilo que é reto.
Directum, por sua vez, vem do particípio passado do verbo dirigere que significa dirigir,
alinhar.
O termo direito foi introduzido, com este sentido, já na Idade Média, aproximadamente no
século IV. A palavra usada pelos romanos era ius. Quanto a esta, os filólogos não se
entendem. Para alguns ius vem de iussum, particípio passado do verbo iubere, que quer
dizer mandar, ordenar. O radical, para eles, seria sânscrito, Yu (vínculo). Para outros, ius
estaria ligado a iustum, aquilo que é justo, tendo seu radical no védico Yos, significando
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aquilo que é bom.
As várias línguas ocidentais usam o mesmo radical - aquilo que é reto, correto - para
identificar o termo direito. Em francês, droit; em alemão, Recht; em espanhol, derecho; em
italiano, diritto; em russo, pravo, também significando o que é correto; em inglês, right,
apesar de mais usado o termo law, do latim lex - lei.
2.2 Definição semântica de Direito
A semântica procura definir "direito" por seus vários sentidos. Assim, primeiramente, a
palavra significa aquilo que é reto; em segundo lugar, aquilo que é conforme às leis; em
terceiro lugar, conjunto de leis; em quarto, a ciência que estuda as leis; em quinto, a
faculdade, o poder de cada indivíduo de exigir o que é seu.
Concluindo, temos que a palavra direito pode ser usada em várias acepções.
Ao dizermos que "o Direito é nossa disciplina favorita", usamos a palavra no
sentido de ciência do Direito.
Quando falamos que o Direito não foi bem aplicado, empregamos o termo no
sentido de regra.
Ao nos reportarmos a certa pessoa, como indivíduo direito, queremos dizer ser
ela justa, correta.
Às vezes, nos referimos ao Direito de certo país - Direito Brasileiro, Francês etc.
Neste sentido utilizamos a palavra enquanto ordenamento jurídico, ordem
jurídica ou sistema jurídico.
Quando falamos que o credor tem o direito de receber, nos referimos à
faculdade inerente a ele, credor, de exigir o pagamento.
Na opinião de Dante, poeta italiano do séc. XIII, "O direito é a proporção real e pessoal de
um homem em relação a outro, que, se observada, mantém a sociedade em ordem; se
corrompida, corrompe-a". ALIGHIERI, Dante. De monarchia. Madrid: Instituto de Estudos
Políticos, 1947, p. 11
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2.3 Acepções do Direito
A palavra direito, como vimos, possui inúmeras acepções. É empregada enquanto norma
de conduta, enquanto faculdade de agir, enquanto conjunto de leis etc.
Trabalhando as mais importantes acepções, a doutrina formulou todo um sistema
científico. É este sistema que passaremos, agora, a estudar.
2.3.1 Direito Objetivo e Subjetivo
Direito Objetivo é norma. Assim já o definiam os romanos - ius est norma agendi - o
Direito é norma de agir. O Direito Objetivo estabelece normas de conduta social. De
acordo com elas, devem agir os indivíduos.
→ Portanto Direito Objetivo é a norma de agir, a conduta-social padrão
regulamentada. Normas de comportamento, as quais as pessoas devem se
submeter.
Direito Subjetivo é faculdade. Quando se diz que alguém tem direito a alguma coisa,
está-se referindo a direito subjetivo seu, a faculdade que possui. Logicamente, os direitos
subjetivos encontram proteção na norma, no Direito Objetivo. É este que os garante.
Tomemos, como exemplo, a norma do art. 319 do Código Civil:
“O devedor que paga tem direito a quitação regular, e pode reter o pagamento, enquanto
não lhe seja dada.”
→ Norma agendi >>> que faculta um poder Facultas agendi
→ Vemos, pois, que aos direitos subjetivos de uma pessoa, normalmente,
correspondem deveres por parte de outra
→ Faculdade: é o poder de exercer um determinado direito.
o Também pode ser concebida como as qualidades inerentes ao
homem, nesse sentido, o direito subjetivo autoriza ou não o exercício
das faculdades.
→ Poder jurídico: denominado, ainda, de poder funcional. O exercício do
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poder não é exercício no interesse do titular, como ocorre com o direito
subjetivo, é exercido no interesse do sujeito passivo ou de um grupo social.
a) Classificação dos Direitos Subjetivos
Os direitos subjetivos se dividem em duas classes, quanto à pessoa, objeto do
direito e quanto a suas qualidades.
i) Quanto à pessoa, objeto do direito
- Direitos Subjetivos Públicos: quando a pessoa da qual se o exigir
for de Direito Público. Assim, o direito que temos de exigir do Estado
que se manifeste, enquanto juiz, ou seja, o direito que temos de exigir
que o Estado atue, resolvendo nossos conflitos, é público.
- Direitos Subjetivos Privados: se a pessoa contra a qual o
exercemos, for de Direito Privado, isto é, se for um particular, pessoa
física ou jurídica.
- Patrimoniais: se seu substrato material for apreciável em
dinheiro, por exemplo, uma casa, um quadro etc
- Creditícios: Os primeiros são direitos de um credor
contra um devedor determinado.
- Reais: por sua vez, são direitos de um titular sobre
certa coisa, como o direito de propriedade, por exemplo.
- Não Patrimoniais: dizem respeito à família e à
personalidade.
ii) Quanto a suas qualidades
- Absolutos (erga omnes): são os direitos, oponíveis contra toda a
coletividade. Ex.: direitos de propriedade, direitos da personalidade
- Relativos: são aqueles exercidos somente a pessoa determinada ou
determinável. Ex.: direito de crédito
- Transmissíveis: os direitos, quando puderem passar de um titular a
outro.
- Intransmissíveis: não admitem troca de titulares
- Principais: direito que existe por si mesmo e não em função de
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outro direito.
- Acessórios: é o direito que existe em função de outro direito, que
será o principal, em relação a ele. Ex: o direito do credor de receber o
principal da dívida é principal; já o direito de receber juros é acessório.
- Divisíveis x Indivisíveis : Um direito subjetivo pode ser exercido ao
mesmo tempo por várias pessoas ou pode ser fracionado entre elas,
de modo a que se torne vários.
– Renunciáveis x Irrenunciáveis: O titular de um direito subjetivo
pode ou não renunciar a ele, dependendo da espécie de direito
2.4 Direito Natural e Direito Positivo
Direito Positivo (Juspositivismo) é o conjunto de normas jurídicas, vigentes em
determinado lugar, em determinada época. Em outras palavras, é a Lei.
Mas, segundo muitos pensadores, há, de fato, normas de conduta que não são criadas
por nós. Essas normas, em conjunto, formam o chamado Direito Natural.
Jusnaturalismo seria, assim, a corrente de pensamento que reúne todas as idéias que
surgiram, no correr da história, em torno do Direito Natural. Na atualidade, segundo Paulo
Nader, o pensamento dominante é o de que o Direito Natural fundamenta-se na natureza
humana.
O Direito Natural, por suas características, é universal por ser comum a todos os povos.
Afinal, a natureza humana é uma só. É também perpétuo, pois vale em todas as épocas.
É imutável e irrenunciável. É indelével, uma vez que não pode ser apagado da
natureza do homem. É igual e obrigatório para todos, sem distinção. Ninguém vive sem
ele. Seus princípios são sempre válidos.
Mas, será mesmo que a natureza humana é uma só, imutável no tempo e no espaço?
Esse é o grande enigma dos jusnaturalistas.
a) Divisões do Direito Positivo
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i) Direito Geral e Particular - Geral é o Direito que se aplica a todo um território.
Particular, o que se aplica à parte dele.
ii) Direito Comum e Especial - Direito Comum é o aplicado a várias situações,
indistintamente a todos os indivíduos de uma sociedade. Assim é com o Direito Penal,
com o Direito Civil, o Constitucional etc. O Direito Especial não se aplica a todos,
indistintamente, mas apenas àqueles que se encaixem em seus ditames. Tal ocorre com
o Direito Comercial, destinado às relações de comércio apenas.
iii) Direito Regular e Singular - Regular é o Direito normal, que regula relações
quotidianas, habituais. Singular ou extraordinário é o Direito que surge em situações
atípicas, como guerras e outras catástrofes.
iv) Direito Público e Privado - Esta talvez seja a divisão mais importante do Direito
Positivo. Se não a mais importante, pelo menos, é a que mais polêmicas gerou. Várias
teorias surgiram, ora negando, ora adotando explicação especial para a dicotomia do
Direito Positivo em público e privado.
Público:
→ Aquele que regula as relações jurídicas concernentes à organização e atividade do
Estado e de seus agregados políticos;
→ Aquele que regula as relações jurídicas travadas entre os cidadãos e essas
organizações políticas;
• Predomínio do interesse geral;
• As normas de direito publico não podem ser afastadas pela vontade das partes.
Privado:
regula as relações jurídicas entre os particulares entre si;
regula as relações entre os particulares e o Poder Público (ou seus agregados),
quando estes não estiverem no exercício de suas funções de Poder Estatal
(político ou soberano).
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• Predomínio do interesse individual;
• As normas privadas podem ser afastadas, salvo quando se tratar de norma
cogente ou imperativa.
É lógico que esta subdivisão não é muito rígida. As normas de Direito Público e as de
Direito Privado a todo momento se intercomunicam.
O Direito Público e o Privado, também, se subdividem em ramos. Assim, temos:
Direito Público Direito Privado
Constitucional Civil
Administrativo Comercial / Empresarial
Internacional Público Internacional Privado
Previdenciário Trabalhista
Tributário Intelectual
Econômico
Processual
Penal
Por que é tão importante qualificarmos um ramo do Direito de público ou privado?
Por uma razão muito simples: os princípios que regem o Direito Público são
diferentes dos que regem o Direito Privado.
Por exemplo, no Direito Privado há um princípio que diz ser permitido tudo
aquilo que a Lei não proibir.
Já no Direito Público o princípio é diferente; diz ele que só é permitido aquilo
que estiver previsto em lei.
Portanto, se considerarmos o Direito do Trabalho ramo do Direito Público, teremos de
aplicar a ele o segundo princípio. Se o considerarmos, porém, ramo do Direito Privado,
aplicar-lhe-emos o primeiro princípio.
Sem embargo, hoje na divisão do Direito em Público e Privado predominam as teorias
dualistas.
Na verdade, tudo é uma questão de ponto de vista. Se, como Kelsen, entendermos que a
divisão do Direito deve se basear na origem, na fonte das normas jurídicas e, entendendo
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que o Estado é a única fonte, evidentemente, só haverá Direito Público.
Conseqüentemente, Kelsen está certo.
Ao contrário, se adotarmos como referencial, a teoria das relações jurídicas, teremos
Direito Público e Privado, assim como demonstrado no quadro acima. Pode-se afirmar,
portanto, que ambas as teses estão corretas. Tudo depende do enfoque, da referência
que se adote.
Na ciência do Direito nada é absoluto. A opção por uma ou outra teoria deve basear-se
no entendimento pessoal. Qual a que mais convence? Qual a que, na opinião de cada
um, apresenta menos lacunas, menos questões sem solução? Esta deverá ser a
escolhida.
A divisão do Direito em ramos nada mais serve que para orientar o estudioso, o qual
poderá examinar as normas e instituições jurídicas reunidas em grupos.
Mas, de fato, o Direito é um só. Todas as suas normas, princípios e instituições devem
interrelacionar-se de forma harmônica, formando um só sistema. Explicando melhor,
poderíamos fazer analogia entre o Direito e seus ramos e uma piscina dividida em raias.
Estas só servem para orientar o nadador. Contudo, não dividem as águas.
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UNIDADE II - AS FONTES DO DIREITO
1. Sentidos das Fontes do Direito
- Histórico
- Instrumental
- Sociológico (ou material)
- Orgânico
- Técnico-jurídico (ou dogmático)
2. Anomia
- Non-liquet
- Suspensivo
- Integrativo
3. Espécies de Fontes
- Fontes Formais
- Principal: Lei
- Acessória
- Costume
- Analogia
- Princípios Gerais do Direito
- Fontes não Formais
- Doutrina
- Jurisprudência
3. Lei
3.1 Classificação das leis
a)Quanto à hierarquia
b) Quanto à especialidade
- Normas gerais
- Normas especiais
c) Quanto à cronologia
- Leis permanentes
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- Leis temporárias
- Expressas
- Tácitas
3.2 Antinomia das leis
- Sistema integrativo
- critério hierárquico
- critério da especialidade
- critério cronológico
4. Analogia
5. Costumes
5.1 Elementos
- Opinio necessitatis
- Diuturnidade
5.2 Classificação
- Contra legem
- Praeter legem
- Secundum legem
6. Jurisprudência
7. Doutrina
8. Princípios Gerais do Direito
9. Brocardos Jurídicos
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→ A expressão fontes do direito tem diversos sentidos. Dentre eles, destacam‐se:
• Histórico: Direito Romano, Brasileiro e Português;
• Instrumental: os documentos que contêm preceitos;
• Sociológico (ou material): a circunstância que cria a norma;
• Orgânico: uma autarquia, uma assembléia, um tirano etc.;
• Técnico‐jurídico (ou dogmático): modos de formação e revelação das regras
jurídicas.
→ É sabido que o intérprete é obrigado a integrar o sistema jurídico, ou seja, diante
da lacuna (ausência de norma para o caso concreto) ele deve sempre encontrar
uma solução adequada. Aliás, basta verificarmos o verbo "decidirá" para
entendermos que o sistema jurídico ordena a decisão do caso concreto. (art. 4.º da
LICC)
Com efeito, diante da hipótese de anomia (ausência de normas), o ordenamento
jurídico de um Estado deve adotar um entre os três sistemas conhecidos para solução da
ausência de norma para o caso concreto, a saber:
• “Non liquet”: sistema pelo qual o magistrado decide pela não solução da relação
jurídica, por não haver respaldo legal. Este sistema é criticado por não atender aos
fins primordiais da jurisdição (realização da justiça, pacificação social e resolução
da lide).
• Suspensivo: por este, o intérprete suspende o andamento do feito, e
conseqüentemente suspende a decisão para a relação jurídica, comunicando o
legislativo da ausência de norma regulamentadora, para fins de edição.
• Integrativo: sistema pelo qual, ante a ausência de lei aplicável à relação jurídica
sob decisão, o intérprete não pode furtar-se à sentença, devendo fazer uso da
analogia, dos costumes e dos princípios gerais de Direito. É o sistema adotado por
nossa Lei de Introdução ao Código Civil.
O artigo 4.º, LICC, fez questão de estabelecer uma hierarquia entre as fontes, pois só
autorizou o juiz a valer‐se de outras fontes quando houvesse omissão na lei e
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impossibilidade de aplicação da analogia, buscando resoluções legais para casos
semelhantes.
Denotem que não há unanimidade, sobre as definições e relevância das fontes, que
variam conforme a posição de cada autor. Há, no entanto, uma abordagem clássica no
estudo das fontes do direito, que entende existir: fontes formais e fontes não formais.
As fontes formais do Direito podem ser principais ou acessórias.
• A fonte principal do Direito é a lei;
• Ao passo que o costume, a analogia e os princípios gerais do direito são fontes
formais acessórias.
Por outro lado, são fontes não‐formais, para a maioria dos juristas, a doutrina e a
jurisprudência.
→ LEI
1.1. Classificação das leis
A classificação das leis, para o nosso estudo, tem por objetivo resolver o problema da
antinomia, ou seja, o problema do conflito e da contradição das normas, hipótese em que
mais de uma norma incide sobre o caso concreto.
Antinomia deve, normalmente, ser resolvida por meio dos critérios mencionados a seguir,
já que o hermeneuta (intérprete) só deve valer-se de uma única norma para a solução de
um determinado caso concreto, devendo eliminar as demais.
a) Quanto à hierarquia
As leis não estão todas no mesmo plano, ou seja, existe uma hierarquia entre elas. Como
forma ilustrativa, podemos adotar o sistema piramidal preconizado por Kelsen,
simbolizando a estrutura hierárquica das normas.
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b) Quanto à especialidade
O segundo critério de classificação leva em consideração a amplitude das normas, tendo
por postulado o fato de que se o legislador tratou com maior acuidade (detalhe) de um
determinado ponto do Direito, ele deve prevalecer sobre outro tratado de maneira geral.
• Normas gerais: são as normas que discorrem sobre todo um ramo do Direito.
Temos, como exemplo, o Código Civil que é a norma geral do ramo civil.
• Normas especiais: são as que regulam determinado ramo do Direito.
Exemplo claro é a Lei do Divórcio, que trata de um aspecto dentro do ramo civil.
Dentre as leis especiais, há as de caráter extravagante, que têm por
objetivo cuidar de tema já codificado. É o caso da Lei de Locações que
modificou parte do Código Civil quanto ao referido contrato que, por sua vez,
também era abordado de maneira geral.
A lei especial revoga a lei geral, ante o fato da primeira ter sido elaborada com
maior rigor pelo jurista, versando sobre uma determinada matéria com maior
acuidade.
c) Quanto à cronologia
O critério cronológico leva em consideração o momento em que a norma jurídica entra em
vigor, passando a regulamentar uma determinada matéria e revogando as normas de
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igual conteúdo que já estavam no sistema jurídico. É a exata regra do artigo 2.º da Lei de
Introdução ao Código Civil. Tal critério só incide sobre as leis permanentes, já que as
temporárias apresentam um regime jurídico próprio.
• Leis permanentes: não têm prazo certo para vigorar, ou seja, têm prazo de
vigência indeterminado, vigendo até que outra a modifique ou revogue (artigo 2.º
da Lei de Introdução ao Código Civil).
• Leis temporárias: têm prazo certo para vigência, subdividindo‐se em:
– expressas: os prazos de vigência estão expressamente disciplinados na
própria norma. Nesse caso, a norma tem conteúdo autorevogatório (leis de
vigência temporária);
– tácitas: apesar de tais normas não terem prazo de vigência, são leis que
vigoram apenas para uma situação especial. Com a cessação do fato, ou da
situação, cessa também a norma (leis excepcionais).
O princípio fundamental é de que a lei posterior revoga a anterior.
A norma poderá ser eficaz e não ser efetiva, como no caso do casamento pelo regime
dotal (regime de dotes). É uma norma eficaz, considerando sua não‐revogação; no
entanto, não é efetiva, pois caiu em desuso.
1.2. Antinomia das leis
Como já mencionado, a classificação só tem interesse para resolver o fenômeno da
antinomia, ou seja, o conflito de leis. Todo conflito de leis tem solução, já que o juiz é
obrigado a decidir o caso concreto (sistema integrativo).
Outros conflitos, porém, adotam os princípios fundamentais para a solução, podendo ser
seguido um critério uniforme de solução, chamado conflito aparente de normas. Assim, os
critérios que podem ser adotados são:
• critério hierárquico: a lei superior revoga a inferior;
• critério da especialidade: a lei especial revoga a geral;
• critério cronológico: a lei posterior revoga a anterior.
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→ ANALOGIA
Analogia é fonte formal mediata do direito, utilizada com a finalidade de integração da
lei, ou seja, a aplicação de dispositivos legais relativos a casos análogos, ante a ausência
de normas que regulem o caso concretamente apresentado à apreciação jurisdicional (a
que se denomina anomia).
Há duas espécies de analogia:
– Analogia legis: na qual se parte de uma norma jurídica isolada para aplicá-la a
casos idênticos;
– Analogia Iuris: na qual se parte de uma pluralidade de normas e, com base
nelas chega-se a um princípio não previsto expressamente na norma. (não
chega a ser um método de colmatação de lacunas, já que não houve vazio no
sistema jurídico).
→ COSTUMES
O direito consuetudinário ou costumeiro pode ser conceituado como a norma aceita como
obrigatória pela consciência do povo, sem que o Poder Público a tenha estabelecido.
O direito costumeiro apresenta os seguintes requisitos:
• subjetivo (“opinio necessitatis”): é a crença na obrigatoriedade, isto é, a
crença que, em caso de descumprimento, incide sanção;
• objetivo (diuturnidade): constância na realização do ato.
Os costumes classificam‐se em:
• “Contra legem” (Contra lei): o costume não respeita as normas constantes do
sistema jurídico. É a desobediência reiterada do comando legal com a crença na
inefetividade da lei. Temos, como exemplo, o costume de não respeitar o sinal
vermelho, por questão de segurança, após um determinado horário.
• “Praeter legem” (Fora da Lei): é aquele que amplia o preceito da lei. É previsão
de uma conduta paralela, não prevista pela lei; porém, não proibida por esta,
podendo-se citar, como exemplo, o cheque que, apesar de ser uma ordem de
pagamento à vista, funciona como uma garantia de pagamento, respeitando ‐se sua
dupla condição. O cheque pós‐datado deve respeitar a data consignada para
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apresentação junto ao sacado, embora a apresentação à vista garanta o
pagamento.
• “Secundum legem” (Segundo a Lei): é o costume segundo o qual, o próprio
texto da lei delega ao costume a solução do caso concreto. Esse caso é
exemplificado pelo artigo 1.192, inciso II, do Código Civil, que determina ao
locatário pagar pontualmente o aluguel segundo o costume do lugar, quando não
houver ajuste expresso.
→ JURISPRUDÊNCIA
A jurisprudência é uma função atípica da jurisdição. São decisões reiteradas, constantes e
pacíficas do Poder Judiciário sobre determinada matéria num determinado sentido.
Não há necessidade de a jurisprudência ser sumulada para ser fonte.
Aqui, cabe ressaltar que a jurisprudência não pode ser confundida com a orientação
jurisprudencial, que é qualquer decisão do Poder Judiciário que esclareça a norma legal.
A orientação jurisprudencial é apenas um método de interpretação da lei e não precisa de
uniformidade, sendo rara a adoção da jurisprudência como fonte.
Existem três posições quanto à jurisprudência:
• corrente negativista: para essa corrente, a jurisprudência não é fonte de Direito;
• corrente jurisprudencialista: tudo se resolve pela jurisprudência;
• corrente eclética (realista): a jurisprudência pode ser usada desde que tenha
conteúdo científico.
→ DOUTRINA
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Chamada Direito Científico, é o conjunto de indagações, pesquisas e pareceres dos
cientistas do Direito. Há incidência da doutrina em matérias não codificadas, como no
Direito Administrativo e em matérias de Direito estrangeiro, não previstas na legislação
pátria.
Há duas orientações:
• formalista: o doutrinador é o doutor em Direito. Até a década de 60, essa
orientação era pacífica;
• informal: não precisa ser escrita por doutor, bastando que seu autor consiga
imprimir ao trabalho coerente conteúdo científico.
→ PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO
São postulados que estão implícita ou explicitamente expostos no sistema jurídico,
contendo um conjunto de regras. Os princípios gerais de Direito são a última salvaguarda
do intérprete, pois este precisa se socorrer deles para integrar o fato ao sistema.
Destaque-se os princípios gerais do Direito Romano, dos quais se extrai um substrato
mínimo do que o ordenamento jurídico reputa fundamental em termos axiológicos, sem
necessidade de expressa previsão legal. São os chamados princípios informativos, que
inspiram todo o sistema jurídico, sem prender-se ao texto positivo.
- neminem laedere: não lesar ninguém
- honeste vivere: viver honestamente
- summ cuique tribuere: dar a cada um que é seu
De acordo com as lições de Celso Antônio Bandeira de Mello, princípios são vetores de
interpretação, que, por sua generalidade e amplitude, informam as demais regras,
constituindo a base de todo o ramo do Direito ao qual se aplica.
→ BROCARDOS JURÍDICOS
Brocardos jurídicos são frases, sentenças concisas e de fácil memorização, que encerram
uma verdade jurídica (exemplo: ne procedat judex ex officio – princípio da inércia da
jurisdição). Funcionam como meio integrativo, estando configurada hipótese de anomia.
Aplicam‐se a todo o sistema jurídico, sendo muitas vezes traduzidos como normas do
ordenamento positivo. Exemplo: Exceptio non adimpleti contractus, que vem devidamente
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previsto no artigo 1.092 do Código Civil.
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UNIDADE III - PRINCÍPIOS DO DIREITO CIVIL
1. PERSONALIDADE: aceita a idéia que todo ser humano é sujeito de direito e
obrigações;
2. AUTONOMIA DA VONTADE: reconhece que a capacidade jurídica da pessoa humana
lhe confere o poder de praticar ou abster‐se de certos atos, conforme sua vontade;
3. LIBERDADE DE ESTIPULAÇÃO NEGOCIAL: cuida da permissão de outorgar direitos
e de aceitar deveres, nos limites legais, dando origem à negócios jurídicos;
4. PROPRIEDADE INDIVIDUAL: pela idéia assente de que o homem pelo seu trabalho
ou pelas formas admitidas em lei pode exteriorizar a sua personalidade em bens imóveis
ou móveis que passam a constituir o seu patrimônio;
5. INTANGIBILIDADE FAMILIAR: ao reconhecer a família como uma expressão imediata
de seu ser pessoal;
6. LEGITIMIDADE DA HERANÇA E DO DIREITO DE TESTAR: pela aceitação de que,
entre os poderes que as pessoas têm sobre seus bens, se inclui o de poder transmiti‐los,
total ou parcialmente, a seus herdeiros;
7. SOLIDARIEDADE SOCIAL: ante a função social da propriedade e dos negócios
jurídicos, a fim de conciliar as exigências da coletividade com os interesses particulares;
8. BOA‐FÉ OBJETIVA: é clausula geral, ao mesmo tempo em que se consubstancia em
fonte de direitos e obrigações, isto é, fonte jurígena, assim como a lei e as outras fontes.
A boa‐fé objetiva impõe ao contratante um padrão de conduta, de modo que deve agir
como um ser humano reto, vale dizer, com probidade, honestidade e lealdade. A boa ‐fé
objetiva atua tanto em seu aspecto compromissório (de comprometimento), reclamando
do contratante o cumprimento da obrigação, como também em seu aspecto eximente ou
absolutório, liberando o devedor de cumprir um contrato iníquo (contrato injusto, que lhe
prejudica).
9. Princípios fundamentais do Novo Código Civil
a) Socialidade: Se não houve a vitória do socialismo, houve o triunfo da
"socialidade", fazendo prevalecer os valores coletivos sobre os individuais, sem
perda, porém, do valor fundante da pessoa humana. Por outro lado, o projeto se
distingue por maior aderência à realidade contemporânea, com a necessária
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22. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
revisão dos direitos e deveres dos cinco principais personagens do Direito Privado
tradicional: o proprietário, o contratante, o empresário, o pai de família e o testador;
b) Eticidade: O Código atual peca por excessivo rigorismo formal, no sentido de
que tudo se deve resolver através de preceitos normativos expressos, sendo
pouquíssimas as referências à eqüidade, à boa‐fé, à justa causa e demais critérios
éticos. É discutível a geral plenitude da norma jurídica positiva, sendo preferível,
em certos casos, prever o recurso a critérios ético‐jurídicos que permita chegar‐se
à "concreção jurídica", conferindo‐se maior poder ao juiz para encontrar‐se a
solução mais justa ou eqüitativa;
c) Operabilidade: O terceiro princípio que norteou a feitura do novo CC é o
"princípio da operabilidade". Ou seja, toda vez que foi necessário examinar uma
norma jurídica, e havia divergência de caráter teórico sobre a natureza dessa
norma ou sobre a convivência de ser enunciada de uma forma ou de outra,
pensou‐se no ensinamento de Jhering, que diz que é da essência do Direito a sua
realizabilidade: o Direito é feito para ser executado; Direito que não se executa – já
dizia Jhering na sua imaginação criadora – é como chama que não aquece, luz que
não ilumina, O Direito é feito para ser realizado; é para ser operado.
d) Concretude: É a obrigação que tem o legislador de não legislar em abstrato,
para um indivíduo perdido na estratosfera, mas, quanto possível, legislar para o
indivíduo situado: legislar para o homem enquanto marido; para a mulher enquanto
esposa; para o filho enquanto um ser subordinado ao poder familiar. Quer dizer,
atender às situações sociais, à vivência plena do Código, do direito subjetivo como
uma situação individual; não um direito subjetivo abstrato, mas uma situação
subjetiva concreta.
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23. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
UNIDADE IV – LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO
1. EFICÁCIA DA LEI NO TEMPO
1.1. Princípios
- Princípio da obrigatoriedade (art.3.º LICC);
- Princípio da continuidade (art. 2.º LICC);
- Princípio da irretroatividade (art. 6.º LICC);
1.2. "Vacatio Legis"
1.2.1. Conceito
- Cognitivo
- Instrumental
1.2.2 Sistemas de vacatio legis
- Sistema simultâneo ou sincrônico
- Sistema progressivo
- Sistema omisso
1.2.3. Espécies de “vacatio legis”
- Expressa
- Tácita
- Ausência
1.2.4. Contagem do prazo da vacatio legis
1.3. Errata
- Erro Irrelevante
- Erro Substancial
- Anterior à publicação
- Durante a vacatio legis (art.1.º, § 3.º LICC)
- Após a entrada em vigor (art.1.º, § 4.º LICC)
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24. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
1.4. Revogação da Norma
- Formas
- Expressa
- Tácita
- Modalidades
- Ab-rogação
- Derrogação
- Critérios
- Hierarquia
- Cronologia
- Especialidade
1.5. Não-repristinação da Norma
1.6. Conflitos da Lei no Tempo
1.6.1. Introdução
- Direito Intertemporal
- Disposições Transitórias
- Princípio da Irretroatividade
1.6.2. Direito adquirido
a) Ato jurídico perfeito
- Forma
- Instantâneo
- Diferido
- De trato sucessivo, ou execução continuada
- Espécies
- Condicional
- Termo
b) Coisa Julgada
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25. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
- Espécies
- Formal
- Material
- Suprema (soberana)
2. Eficácia da lei no Espaço
2.1 Princípios
- Territorialidade
- Extraterritorialidade
2.2 Conflitos da lei no espaço
- Estatuto Pessoal (art. 7.º LICC)
- Bens (art. 8.º LICC)
- Obrigações (art. 9.º, § 2.º LICC)
- Sucessões (art. 10, §§ 1.º e 2.º LICC)
- Empresas estrangeiras (art. 11 = art. 7.º LICC)
2.3 Aplicação do Direito estrangeiro no Brasil
- art. 14 LICC
- Prova dos fatos ocorridos no estrangeiro (art. 13 LICC e art. 12, § 1.º =
art. 8.º)
- Exequatur (art. 15, I CF, arts. 12, § 2.º, 15, 16 LICC)
- Regras do casamento (art. 7.º,§§ 1.º e 2.º, art. 18 LICC)
- Limites à extraterritorialidade (art. 17 LICC)
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1. EFICÁCIA DA LEI NO TEMPO
1.1. Princípios
Os princípios que regem a eficácia da lei no tempo são os seguintes:
• Princípio da obrigatoriedade (artigo 3.º da Lei de Introdução ao Código
Civil): segundo esse princípio, somente a norma jurídica publicada é
obrigatória a todos e ninguém poderá descumpri-la, alegando ignorância.
Portanto, o erro de direito é inescusável (ignorantia legis neminem excusat).
• Princípio da continuidade (artigo 2.º, “caput”, da Lei de Introdução ao
Código Civil): tal postulado estabelece que uma norma permanente só
perderá a eficácia se outra, de mesma ou superior hierarquia, vier modificá-
la ou revogá-la. Portanto, a norma jurídica não perde vigência pelo mero
decurso do tempo.
• Princípio da irretroatividade (artigo 6.º da Lei de Introdução ao Código
Civil): a lei nova não pode retroagir para abarcar situações consolidadas por
lei anterior. Visa estabelecer a segurança jurídica do sistema, por intermédio
do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada.
1.2. "Vacatio Legis"
1.2.1. Conceito
Denomina-se vacatio legis o período de tempo que se estabelece entre a
publicação e a entrada em vigor da lei. A lei não produzirá efeitos durante a vacatio
legis (artigo 1.º da Lei de Introdução ao Código Civil), incidindo a lei anterior no
sistema. Existem dois motivos para sua existência:
• cognitivo: para que a lei seja levada ao conhecimento do destinatário
antes de sua vigência;
• instrumental: para que os órgãos da administração se aparelhem, para
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que a norma ganhe efetividade.
1.2.2. Sistemas de "vacatio legis"
Exitem três sistemas distintos de vacatio legis, quais sejam:
• Sistema simultâneo ou sincrônico: de acordo com esse sistema, que é o
sistema brasileiro, a lei sempre entra em vigor na mesma data em todo o
território nacional. Há, portanto, uma sincronia na entrada em vigor da lei.
• Sistema progressivo: era o sistema da Lei de Introdução ao Código Civil
anterior, no qual a vigência era distinta para locais distintos do território
nacional. Substituído por gerar insegurança jurídica.
• Sistema omisso: segundo esse sistema, não existe vacatio legis e toda lei
entra em vigor na data de sua publicação.
1.2.3. Espécies de “vacatio legis”
Há três espécies de leis referentes à vacatio legis:
• Lei com “vacatio legis” expressa: é a lei de grande repercussão. Temos,
como exemplo, a expressão contida em lei deteminando "entra em vigor um
ano depois de publicada".
• Lei com “vacatio legis” tácita: é aquela que continua em consonância
com o artigo 1.º da Lei de Introdução ao Código Civil, ou seja, no silêncio da
lei entra em vigor 45 dias depois de oficialmente publicada se no território
brasileiro; se no estrangeiro inicia-se em 3 meses (§ 1.º, art. 1.º LIC).
• Lei sem “vacatio legis”: é aquela que, por ser de pequena repercussão,
entra em vigor na data de publicação, devendo esta estar expressa ao final
do texto legal.
1.2.4. Contagem
A Lei Complementar n. 107/01 estabelece em seu artigo 8.º, § 1.º, o seguinte:
"A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de
vacância far-se-á com a inclusão da data de publicação e do último dia do prazo,
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28. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
entrando em vigor no dia subseqüente a sua consumação integral".
1.3. Errata
Os erros encontrados na lei podem ser de duas espécies:
• erro irrelevante: não influi na interpretação da norma, não havendo
necessidade de correção. É erro material, a ser corrigido de ofício pelo juiz.
• erro substancial: implica divergência de interpretação e poderá ocorrer em
três fases distintas do processo legislativo:
_ antes da publicação: a norma poderá ser corrigida sem maiores
problemas;
_ no período de “vacatio legis”: a norma poderá ser corrigida; no
entanto, deverá contar novo período de vacatio legis (artigo 1.º, § 3.º);
_ após a entrada em vigor: a norma poderá ser corrigida mediante
uma nova norma de igual conteúdo (artigo 1.º, § 4.º).
Observação: a Lei de Introdução ao Código Civil tratou da matéria no artigo 1.º, §§
3.º e 4.º, preocupando-se com o erro substancial antes da entrada em vigor e após
a entrada em vigor respectivamente.
1.4. Revogação da Norma
É a hipótese em que a norma jurídica perde a vigência porque outra norma veio
modificá-la ou revogá-la. A norma jurídica é permanente e só poderá deixar de
surtir efeitos se a ela sobrevier outra norma que a revogue (critério cronológico de
classificação das leis = lei posterior revoga lei anterior). O desuso não implica a
perda da vigência da norma, e sim, a perda de sua efetividade.
A revogação de uma norma jurídica pode ser feita de duas formas:
• revogação expressa: um novo comando normativo dispõe expressamente
a respeito da perda da eficácia da norma anterior;
• revogação tácita: a nova norma jurídica torna-se incompatível com a
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norma anterior, ficando esta última revogada.
Essas duas modalidades de revogação podem dar-se por ab-rogação ou
derrogação:
• ab-rogação: é a revogação total da norma, ou seja, a norma antiga perde
sua eficácia na totalidade;
• derrogação: é a revogação parcial da norma, ou seja, a norma antiga
continua vigorando com alguns pontos revogados pela nova lei.
Para a verificação de revogação das normas, três critérios devem ser utilizados:
• hierárquico: verificar qual das normas é superior, independentemente da
data de vigência das duas normas (exemplo: um regulamento não poderá
revogar uma lei ainda que entre em vigor após esta);
• cronológico: a norma que entrar em vigor posteriormente irá revogar a
norma anterior que estava em vigor;
• especialidade: as normas gerais não podem revogar ou derrogar preceito
ou regra disposta e instituída em norma especial.
1.5. Não-repristinação da Norma
A não-restauração da norma é a impossibilidade que uma norma jurídica tem de,
uma vez revogada, voltar a vigorar no sistema jurídico pela simples revogação de
sua norma revogadora, ou seja, o “aniquilamento” da norma revogadora não
restaura a norma revogada. O motivo dessa não-restauração de normas é o
controle do sistema legal para que se saiba exatamente qual norma está em vigor.
Admite-se, no entanto, a restauração expressa da norma, ou seja, uma norma
nova que faça tão-somente remissão à norma revogada poderá restituir-lhe a
vigência, desde que em sua totalidade.
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1.6. Conflitos da Lei no Tempo
1.6.1. Introdução
O direito intertemporal visa solucionar os conflitos entre as novas e as velhas
normas, entre aquela que acaba de entrar em vigor e a que acaba de ser
revogada. Isso porque alguns fatos iniciam-se sob a égide de uma lei e só se
extinguem quando outra nova está em vigor. Para solucionar tais conflitos
existem dois critérios:
• disposições transitórias: o próprio legislador no texto normativo novo
concilia a nova norma com as relações já definidas pela norma anterior;
• princípio da irretroatividade: a lei não deve retroagir para atingir fatos e
efeitos já consumados sob a lei antiga.
1.6.2. Direito adquirido
O direito adquirido é conceituado, de acordo com Gabba, como aquele que já se
incorporou definitivamente ao patrimônio e à personalidade de seu titular, ainda
que de efeitos latentes, de modo que nem a lei e nem fato posterior possa alterar
tal situação jurídica.
O direito adquirido apresenta os seguintes limites:
• não prevalece contra normas constitucionais, exceto, para alguns
doutrinadores, se e quando decorrentes de emenda constitucional, pois o
Direito adquirido é cláusula pétrea, por ser direito previsto no artigo 5.º da
Constituição Federal;
• retroage normas administrativas e processuais;
• retroage normas penais benéficas ao réu;
• retroage normas que dizem respeito ao estado e à capacidade das
pessoas.
Dentro do conceito de Direito adquirido, existem dois que são espécies do gênero,
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quais sejam:
a) Ato jurídico perfeito
É o ato que tem aptidão para produzir efeitos. Alguns doutrinadores entendem que
o ato jurídico não difere do negócio jurídico; no entanto, outros entendem que a
diferença reside nos efeitos de um e de outro, tendo em vista que no ato jurídico os
efeitos ocorrem independentemente da vontade das partes (exemplo: pátrio
poder), enquanto no negócio jurídico os efeitos são perseguidos pelas partes
(exemplo: contratos em geral).
O ato jurídico pode ser:
• instantâneo: aquele que, no momento de seu nascimento, já produz
efeitos e, neste caso, não existe conflito de leis (exemplo: compra e venda à
vista de um imóvel);
• diferido: é o ato que produz efeito em momento único, todavia, a
concretizar-se em momento posterior à sua prática (exemplo: compra e
venda, com entrega e pagamento a prazo);
• de trato sucessivo, ou execução continuada: ato que produz efeitos
periodicamente, enquanto a relação jurídica se protrai no tempo (exemplo:
contrato de locação com pagamento de parcelas periódicas).
O ato jurídico perfeito divide-se em duas espécies:
• condicional: há manifestação de vontade; porém, os efeitos dependem de
evento futuro e incerto, diferente de mera expectativa de direito (doação em
contemplação de casamento);
• termo: há manifestação de vontade; porém, os efeitos dependem de
evento futuro e certo (doação em contemplação de maioridade).
b) Coisa julgada
De acordo com a doutrina de vanguarda, coisa julgada é a qualidade dos efeitos
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da sentença, no sentido de lhes traduzir imutabilidade. Somente o dispositivo da
sentença, cuja função é analisar o pedido, fará coisa julgada, não podendo haver
coisa julgada quanto à fundamentação, em que se analisa a causa de pedir.
A coisa julgada é soberana, ou seja, não pode ser alterada por ação rescisória,
se decorrido o prazo legal para propositura desta (após o período de dois anos de
trânsito em julgado, a questão ficará inquestionável).
2. EFICÁCIA DA LEI NO ESPAÇO
2.1 Princípios
Os princípios que regem a eficácia da lei no espaço são os seguintes:
Princípio da Territorialidade: sob a égide do conceito jurídico de
soberania estatal a norma deve ser aplicada dentro dos limites
territoriais do Estado que a editou. Este princípio decorre
necessariamente da concepção tradicional de Estado, como reunião dos
elementos: povo, governo e território. Todavia, este princípio mostra-se
insuficiente na medida em que a limitação do território, fisicamente
falando, é insuficiente para abranger as relações jurídicas travadas neste
mundo globalizado de constante interação;
Princípio da Extraterritorialidade: Esta idéia é, portanto, a admissão de
aplicabilidade no território nacional de leis de outro Estado, segundo
princípios e convenções internacionais. Com este princípio tem-se a
consagração da figura do estatuto pessoal, que compreende a situação
jurídica em que a norma de um Estado acompanha seu nacional para
regular seus interesses em outro Estado.
Assim, tem-se que a lei nacional deve ser aplicada ordinariamente a todas as
relações travadas em seu âmbito espacial de incidência.
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Mas, no caso de interferirem estrangeiros sobre relações jurídicas constituídas no
território nacional ou de nacionais terem bens ou negócios jurídicos em território
estrangeiro, possam surgir exemplos de extraterritorialidade ou de aplicação
extraterritorial do Direito.
Assim diz-se que o ordenamento jurídico brasileiro adotou o princípio da
territorialidade moderada,uma vez que a LICC admite regras de territorialidade
(arts. 8.º e 9.º) e de extraterritorialidade (arts. 7.º, 10, 12 e 17).
2.2 Conflitos da lei no espaço
É objetivo do Direito Internacional Privado saber qual a norma de direito material
estrangeiro que excepcionalmente é aplicada no território de outro Estado
(extraterritorialidade).
Mas a leitura do CC ajuda-nos nesta tarefa, ao estabelecer os seguintes critérios
de aplicação:
• Em questões sobre começo e fim da personalidade, o nome, a
capacidade e os direitos de família, deve ser aplicada a lei do país
de domicílio da pessoa (art.7.º);
• Em questões sobre a qualificação e regulação das relações
concernentes a bens, deve ser aplicada a lei do país onde estão
situados (art. 8.º);
• Em questões envolvendo obrigações, deve ser aplicada a lei do
país onde foram constituídas, reputando-se constituída no lugar em
que residir o proponente (art. 9.º, § 2.º);
• Em questões envolvendo sucessão por morte (real ou presumida –
ausência), deve ser aplicada a lei do país de domicílio do de cujus,
ressalvando-se que, quanto à capacidade para suceder, aplica-se a
lei do domicílio do herdeiro ou do legatário. E, finalmente, quando a
sucessão incidir sobre bens do estrangeiro situados no Brasil,
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aplicar-se-á a lei brasileira em favor do cônjuge brasileiro e dos filhos
do casal, sempre que não lhes for mais favorável a lei do domicílio do
defunto (art. 10, §§ 1.º e 2.º).
• Em se tratando de empresas estrangeiras no Brasil, devem elas
obedecer à lei do Estado em que se constituíram (art. 11 = art. 7.º),
mas somente poderão ter aqui filiais, agências ou
estabelecimentos depois de terem seus atos constitutivos aprovados
pelo governo brasileiro, ficando tais sucursais submetidas à lei
nacional.
2.3 Aplicação do Direito estrangeiro no Brasil
→ Denote-se que para a aplicação do Direito estrangeiro no Brasil, não só
pode como deve o magistrado exigir de quem o invoca prova de seu texto e
vigência, na forma do art. 14, bem como do art. 337 do CPC.
→ A prova dos fatos ocorridos no estrangeiro é regida pela lei que nele vigorar,
quanto ao ônus e aos meios, não sendo tolerável a utilização de provas que a
lei brasileira não admita (art. 13).
1. A autoridade judiciária brasileira será a competente para recolher a
prova, quando for o réu domiciliado no Brasil, ou aqui tiver de ser
cumprida a obrigação, sendo que somente ela poderá conhecer
ações relativas a imóveis situados no Brasil (art. 12, § 1.º = art. 8.º)
→ As sentenças estrangeiras precisam ser homologadas no Brasil para
adquirirem eficácia (é a concessão do exequatur), a competência para a sua
homologação é do Superior Tribunal de Justiça (STJ), dada a Emenda
Constitucional 45 que inseriu a alínea a ao inciso I do art. 105 da Constituição
Federal. (a competência antes era do Supremo Tribunal Federal - STF).
1. Os requisitos para a concessão do exequatur estão no art. 15;
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35. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
2. A concessão do exequatur não é exigida para as sentenças
meramente declaratórias do estado das pessoas (ex. ação de
investigação de paternidade);
3. Concedido o exequatur pelo STJ , a autoridade brasileira cumprirá
a sentença segundo a forma adotada na legislação brasileira,
observando porém a lei estrangeira quanto ao objeto de diligências
(art. 12, § 2.º);
→ Na aplicação da lei estrangeira o magistrado deve limitar-se ao seu conteúdo
isoladamente, sendo vedado considerar qualquer remissão feita a outras leis
(art. 16).
→ Sem esquecer a regra do art 7.º , ao casamento realizado no Brasil será
aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos dirimentes e ás formalidades
da celebração. (Ex: se um saudita muçulmano quiser casar no Brasil, ainda que
a legislação saudita admita mais de um matrimônio, somente poderá convolar
núpcias se não tiver impedimentos – art. 7.º,§ 1.º; salvo se celebrar o
casamento perante a autoridade consular saudita – art. 7.º, § 2.º). Idem para
brasileiros residentes no estrangeiro (art. 18)
→ A extraterritotarialidade poderá ser limitada, caso os atos, as sentenças e as
leis do Estado alienígena não sejam aceitas no Brasil, por ferirem a soberania
nacional, a ordem pública e os bons costumes (art. 17). (ex: casamento entre
homossexuais na Dinamarca, Noruega, Suécia, Holanda, já que no Brasil, os
nossos costumes ainda reconhecem por princípio, a diversidade de sexos como
pressupostos existencial do ato nupcial).
3. A Lei de Introdução e o Novo Código Civil
O Decreto-lei n. 4.657/42 não sofre nenhuma alteração ou revogação em qualquer
de seus dispositivos, com a entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei n.
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36. Apostila do Curso de Direito Civil – Prof.ª Iracema Fazio
10.406/01). Isto porque, o objeto tratado pela Lei de Introdução é distinto do
objeto do Direito Civil.
Aliás, a Lei de Introdução não informa somente o Direito Civil, inserindo princípios
e regras de todo o ordenamento jurídico.
Aqui cabe destacar que a Lei de Introdução é posterior ao Código Civil de
1916 (Lei n. 3.071/16). Dessa forma, verificamos que já não introduzia o
Código Civil de 1916 e, portanto, não introduz também o novo Código.
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