1. ATENÇÃO BÁSICA NO DISTRITO FEDERAL: A QUEM INTERESSA?
Profa. Dra. Maria Fátima de Sousa1
Senti-me tocada como leitora, cidadã e militante da área da saúde pública, pela manchete
“UPA não atrai interessados” de matéria publicada na última semana em um jornal local do
Distrito Federal, no tocante à insistência do governo em relançar a Chamada Pública nº
01/2012 para repassar a iniciativa privada a gestão das Unidades de Pronto Atendimento
(UPA) no DF.
A matéria afirmava que a tentativa do governo de repassar a gestão das Unidades Básicas
de Saúde (UBS) para a iniciativa privada fracassou. Por que será? Afinal falamos da capital
da República do Brasil, onde vivem 2.570.160 pessoas (IBGE, 2010); temos uma divisão
territorial com Regiões Administrativas (30 RAs). Uma rede física para cuidar da doença
com 15 Hospitais; 67 Centros de Saúde; 40 Postos de Saúde; um Instituto de Saúde Mental;
uma Policlínica; três Unidades Mistas; 30 UBS; uma UPA; sete Centros de Apoio
Psicossociais (CAPS); 4.164 leitos gerais; 130 equipes do Programa Saúde da Família
(PSF); 1.363 Consultórios Ambulatoriais; 304 leitos de UTI.
Diante dos fatos, a questão fica mais inquietante. Do que será que o setor privado tem
medo? Ou eles não sabem que não faltam recursos no DF, afinal temos o maior
investimento per capita em saúde do Brasil. É bem verdade que o dinheiro por inúmeras
vezes foi empregado de forma imprudente e incorreta, com paralisação de vultosos
montantes de recursos em contas cujos rendimentos eram desviados por esquemas de
corrupção, com utilização de verbas essenciais em projetos alheios à saúde, como a Ponte
JK que, por isso, passou a ser conhecida como a “ponte dos remédios”. Mas isso é coisa do
passado.
Hoje, o que mais me provoca dúvidas é essa proposição de privatizar a rede de Atenção
Básica à Saúde. O que é isso companheiro? Somos filhos da escola onde aprendemos que a
saúde é um bem a ser protegido pelo poder público (Estado/Governo). Recorda quando os
representantes do complexo médico industrial nos deixaram falando aos ventos e se
retiraram da plenária da 8ª Conferência Nacional de Saúde? E na Assembléia Constituinte,
compraram muitos parlamentares? Naquela época e agora, mais que nunca, continuamos
nos posicionando que o lugar de ganhar dinheiro não é com os males da doença dos
indivíduos, famílias e comunidades, muito menos com seus sofrimentos.
Ainda assim fica a pergunta: “A quem interessa privatizar a Atenção Básica?” Certamente
não deve interessar às organizações sociais, pois essas gostam mesmo de participar da
construção dos “elefantes brancos”, leitos de UTI, internações, cirurgias, aquisição de
medicamentos, equipamentos, e nada mais. Senhor Governador o que se passa? Não se
esqueça da ética republicana, ou nos dizeres de Max Weber, da ética da responsabilidade.
Afinal, nos prometeu acabar com as filas em hospitais, com a falta de materiais e
1
Professora do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de
Brasília e Coordenadora do Núcleo de Estudos em Saúde Pública/NESP/CEAM/UnB.
2. profissionais compromissados e competentes, com o aumento do número de ações judiciais
contra o sistema, ausência de medicamentos essenciais no SUS do DF. Será que vamos
continuar ouvindo da população que só quem vivencia a realidade do SUS na capital do
Brasil sabe da dificuldade de se conseguir atendimento para suas questões em saúde. Onde
foram parar seus compromissos de campanha? Coloque a saúde do DF no lugar que a
população reconheça como um bem seu, respeite-a, cuide dos seus equipamentos e sinta
orgulho de uma rede de Atenção à Saúde das famílias, comprometidas com a defesa da
saúde e da vida. Os moradores do DF precisam saber a quem interessa esse outro caminho.