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Universidade Presbiteriana Mackenzie


O LUGAR DA MATERNIDADE NO DISCURSO DA MULHER CONTEMPORÂNEA
Maria Betânia de Lima Farias (IC) e Izabella Paiva Monteiro de Barros (Orientadora)
Apoio: PIBIC Mackenzie/MackPesquisa


Resumo

No decorrer da história muitas transformações ocorreram na sociedade influenciando de forma
significativa nos papéis dos sujeitos que dela fazem parte. Ao se analisar os papéis femininos,
constata-se que ao longo dos anos eles também se transformaram, oferecendo à mulher um novo
status e, em decorrência desse novo status, muitas exigências. Profissionalização, maternidade e
cuidados do lar são algumas das atribuições femininas que muito exigem dos atributos físicos e
psíquicos na prática e no psiquismo da mulher na sociedade atual. O presente trabalho procurou
compreender, por meio da fala de seis mulheres, qual o espaço destinado à maternidade na
contemporaneidade, considerando os diversos papéis exercidos por elas, discutindo as dificuldades,
saídas e significados encontrados por cada uma para exercê-los concomitantemente. A partir de
entrevistas semi-dirigidas (Minayo,2007) e aplicação da técnica do Desenho-Estória proposto por
Walter Trinca (1984) foram obtidos dados relevantes no que se refere aos objetivos propostos pela
pesquisa, dados estes das entrevistas que foram categorizado se analisados (Bardin,2000)
separadamente e depois relacionados com os resultados do desenho-estória para que as
informações pudessem ser complementadas. Os resultados encontrados mostraram que as
exigências da multiplicidade de papéis colocam a mulher diante de escolhas conflituosas que podem
confundir-se entre os paradigmas sociais e com seus próprios desejos. Concluiu-se com tal estudo
que a maternidade ocupa ideologicamente o primeiro lugar nos projetos de vida das mulheres,
contudo, especialmente as que já têm filhos, reconhecem as dificuldades para desempenhar seu
papel de mãe colocando-o em primeiro lugar. Mesmo as que descreveram a maternidade como algo
importante para a realização feminina, mostraram o quanto ela pode gerar conflitos ao dividir espaço
com os demais papéis e funções da mulher.

Palavras-chave: papéis femininos, contemporaneidade, maternidade


Abstract

Troughout history many transformations had occurred in the society influencing significantly on the
roles of the citizens who are part of it. By analyzing the feminine roles, it is evidenced that throughout
the years they had also changed themselves, offering to the woman a new status and in result of this
new status many requirements. Professionalization, maternity and home’s care are some of the
feminine attributions that demand a lot of the physical and psychic attributes in the practical way in the
current society. The actual work tried to understand, by means of speaks of six women, which is the
space destined to the maternity in the actual society, considering the diverse roles exerted by them,
arguing the difficulties, the exits and the meanings found for each one to exert them concomitantly.
From half-directed interviews (Minayo, 2007) and application of the technique of Desenho-Estória
considered by Walter Trinca (1984), relevant information had been gotten regarding the objectives
considered by the research, data of the interviews that had been categorized and analyzed (Bardan,
2000) separately and later related with the results of the desenho-estória so that the information could
be complemented. The found results had shown that the requirements of the multiplicity of roles place
the woman at conflicting choices that can be confused between the social paradigms and with their
own desires. One concluded with this study that the maternity ideologically occupies the first place in



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the women’ projects of life, however, especially the ones that already have children, recognize the
difficulties to blab out their role of being mother placing it in the first place. Even the ones that had
described the maternity as something important for the feminine accomplishment had shown how
much they can create conflicts when they share space with the other roles and functions of the
woman.

Key-words: female roles, contemporaneity, maternity




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INTRODUÇÃO

A inserção da mulher no mercado de trabalho tem crescido cada vez mais e comumente
ouve-se ser questionada a ausência da mãe no lar, cuidando e educando os filhos. Pode-se
constatar ainda um discurso imperativo exigindo que a mulher cumpra adequadamente suas
diversas funções (esposa, profissional, dona de casa, etc.). Fica uma pergunta: como a
mulher se coloca diante de todas essas exigências?

Para pensar melhor estas questões o objetivo geral desta pesquisa foi o de investigar o
lugar designado para a maternidade na atualidade. Além disso, como objetivos específicos a
identificação de possíveis dificuldades inerentes à maternidade enfrentadas pelas mulheres-
mães na vida contemporânea, possíveis razões para a não maternidade e como o papel
materno é “negociado” diante dos demais papéis exercidos pelas mulheres.

Cientificamente o aprofundamento do estudo acerca deste tema agregará valor à ciência
uma vez que trará contribuições teórico-práticas sobre as transformações no psiquismo
feminino decorrentes dos processos de transformações sociais e econômicos. A relevância
social deste trabalho encontra-se, portanto, na possibilidade de, a partir dos resultados
deste estudo haver uma reflexão crítica sobre o papel materno e seu entrelaçamento com os
demais papéis femininos e como estes são vividos pela mulher moderna.

REFERENCIAL TEÓRICO

Ao se analisar a sociedade, seus valores, práticas e costumes pode-se constatar o quanto
ela se transforma ao longo do seu processo histórico. Considerando todas as
transformações pode-se certamente constatar também as grandes mudanças ocorridas na
família desde os mais remotos registros de sua constituição (ARIÈS, 1981).

A configuração e os hábitos das famílias dos séculos XVI e XVII com seu modo de olhar
para si mesmas e para as crianças como um pequeno adulto, chegaram ao século XVIII
passando por grandes transformações no sentido de sua organização físico-espacial e suas
relações com a sociedade. Contrariando o que vinha ocorrendo, começa a ser delimitado o
espaço entre o interno e o externo, ou seja, entre o público e o privado, sendo essa
delimitação uma fonte para novos fenômenos nas relações familiares e na sua repercussão
social (ARIÈS, 1981; BADINTER, 1985).

Segundo Ariès (1981) apesar da instituição família sempre ter existido, por muito tempo ela
não existia como sentimento ou valor.      Portanto, se torna imprescindível entender o
processo de transformação da família para se compreender seu significado atual e suas
formas de interação social. Apesar de não se adentrar a fundo na questão da família no
presente artigo, considera-se importante mencioná-la uma vez que tais transformações e os


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papéis femininos estão diretamente relacionados: essa duas histórias, a da mulher e a da
família, e suas transformações se entrelaçam constantemente (BADINTER, 1985).

Em concordância com o pensamento de Badinter(1985) Oliveira (2007) aponta que além
das reformulações, também vêm se desconstruindo os papéis da mulher que vão alterando-
se e adaptando-se ao cenário histórico social de cada época. Todas essas mudanças e
adaptações que afetam a vida da mulher repercutem na representação social da
maternidade. Principalmente, com a chegada da modernidade torna-se mais evidente essas
mudanças (OLIVEIRA, 2007; MANSUR, 2003).

Tais mudanças e representações sociais tornam-se ainda mais marcantes na sociedade
pós-moderna, época atual e na qual se encontram as mulheres da presente pesquisa. A
pós-modernidade é um aspecto cultural da sociedade pós-industrial influenciado pelos
movimentos democráticos em vários setores de sua esfera (ex: tecnologia, teorias, valores e
costumes) e essas influências apontam para novas possibilidades e formas de relações dos
sujeitos com o mundo, com os outros e consigo próprios (PAIVA,2006).

Dentre todas as funções sociais exercidas pela mulher, a maternidade é pontuadamente a
que adquiriu maior valor social (GRANT, 2002). Com a entrada da mulher no mercado de
trabalho, o advento dos métodos anticoncepcionais e o divórcio colocou-se a mulher diante
de novas possibilidades de realização e passou-se a olhá-la de uma com uma nova
conotação no meio social. A mulher pôde se questionar a respeito do que realmente deseja
a despeito de sua condição feminina e fazer opções mesmo em alguns casos tendo que
sacrificar-se social e subjetivamente (BARBOSA E ROCHA-COITINHO, 2007).

O século XXI e seus avanços teóricos, tecnológicos e no campo do trabalho, trouxeram
novas possibilidades para as mulheres, deslocando a sexualidade feminina da maternidade,
redefinindo as fronteiras nos espaços familiares e do trabalho, o que promoveu aos poucos
o enfraquecimento dos modelos estabelecidos, inclusive o da conjugalidade tradicional. As
transformações apresentam-se no campo social e no campo dos desejos, que se
encontrava mais reprimido anteriormente, os lugares pré-determinados deixaram de ordenar
o destino e as escolhas femininas, e seus caminhos tornaram-se imprevisíveis (MANSUR,
2003; BARBOSA E ROCHA-COITINHO, 2007).

GRANT (2002) aponta que na sociedade contemporânea, ou seja, na atualidade, observa-
se uma forte valorização da mulher no mercado de trabalho, ainda assim, há uma constante
dificuldade, partindo da sociedade e da própria mulher, na conjunção dos diversos papéis
exercidos por ela na esfera pública e privada. Apesar da conquista de novos espaços, as
exigências domésticas não deixaram de fazer parte da vida das mulheres, pelo contrário, se
sobrepõem às novas exigências de profissionalização e autonomia. Há portanto uma



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sobreposição de papéis, além de ter que ser uma boa mãe, a mulher tem que ser também
uma boa profissional. Os significados desses desdobramentos aparecem não só na vida
social das mulheres mas também na sua vida psíquica.

Badinter (1985) em suas considerações sobre a mulher e a maternidade nega o conceito de
amor materno, ou seja, nega o amor materno como uma condição inerente à mulher. Para a
autora ele é adquirido e transformado ao longo da evolução social do sujeito. O amor
materno, nesse sentido, é um mito e sua constituição deriva de ideias especializadas que ao
longo dos séculos se projetaram no meio social de forma arrebatadora, muitas vezes se
sobrepondo e confundindo com os reais desejos dos sujeitos.

Apesar das contradições em relação à figura feminina e à constituição da condição de
maternagem, não se pode negar a relevância da mãe na vida da criança, o que
inevitavelmente aponta para o lugar da mulher como mãe(OLIVEIRA, 2007). Podemos obter
na literatura referências de grandes pesquisadores que ao se lançar sobre a questão da
constituição do sujeito dão ênfase na mulher em sua função materna, oferecendo
posicionamentos bem definidos sobre essa função no contexto da relação mãe-bebê,
inclusive apontando consequências na vida da criança e posteriormente do adulto da não
efetividade - ou de falhas e desencontros– no processo de construção dessa relação
(TOURINHO, 2006; BARROS, 2010). Podemos constatar esse posicionamento nas
considerações de Winnicott (2000)quando afirma que:

                      “(...)há uma continuidade no desenvolvimento do indivíduo, iniciando na concepção,
                      prossegue através da fase de latência e a primeira infância, e alcança o estado
                      adulto, sendo a criança o pai do homem. O objetivo da criação de filhos não é
                      apenas produzir crianças saudáveis, mas também o de permitir o desenvolvimento
                      posterior de um adulto saudável (...) a saúde do adulto é constituída ao longo dos
                      vários estágios da infância” (WINNICOTT, 2000. pg. 306).

Para Winnicott (2006), é a mãe que através de seus cuidados oferece as bases para o
desenvolvimento e consequentemente uma vida mental saudável para o filho. Esses
cuidados, no entanto, funcionam dentro de um limite que não pode ser ultrapassado em
excesso nem ficar aquém das necessidades do bebê uma vez que, para se constituir de
forma saudável o bebê precisa de um objeto que atenda suas necessidades mas que aos
poucos permita que ele possa diferenciá-las e administrá-las por si só. Nesse sentido, a
mãe ao segurar e prover adequadamente seu bebê, funciona como ego auxiliar que
possibilita uma forma muito pessoal e frágil de ego para o bebê, o que só é possível,
segundo ele, pela capacidade que a mãe possui de identificar-se com suas necessidades
básicas (WINNICOTT, 2006).




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Ao se levar em conta as características próprias do momento do nascimento de um bebê e
as alterações que estas podem ocasionar na vida da mãe pode-se constatar o quanto é
delicado assegurar os cuidados sob a perspectiva Winnicotianna, principalmente numa
sociedade em que a todo momento se é convocado a dar conta de um número maior de
atividades,   a ter mais para gastar mais, e ter mais implica em mais atividades. Nessa
realidade como garantir que os cuidados com o bebê não serão de mais ou de menos?
(GRANT, 2002). Na sociedade contemporânea, preza-se os atributos profissionais e
econômicos dos sujeitos, ou seja, se prima pela competência e autonomia, o que caracteriza
uma constante pressão sobre a mulher-profissional (SOCORRO, 2007). Vale ressaltar que a
mulher profissional não deixou de ser também, no ideal social, a mulher-mãe, dona de casa
e esposa. Com tantos papéis a mulher não pode ter limites, pois caso contrário, não daria
conta de tantas funções ( GRANT, 2002).

Com a diversidade de papéis e as novas possibilidades a que as mulheres se permitem,
elas acabam ou optando por alguma(s) em detrimento de outras ou sobrecarregando-se
com todas elas. Mesmo que secularmente o olhar para a mulher indique que ela já nasceu
com o potencial para a maternidade (BADINTER, 1985) atualmente considera-se, ou impõe-
se, que ela também tenha potencial profissional. Na impossibilidade de executar
satisfatoriamente as duas e as demais funções, sutilmente é sugerido o adiamento de uma,
ou uma opção definitiva (BARBOSA E ROCHA-COUTINHO, 2007).

Em estudo realizado com mulheres que não tiveram filhos Mansur (2003) aponta que a
opção por uma carreira profissional em detrimento da maternidade pode indicar que esta foi
se tornando uma prioridade na vida das mulheres, ou ainda que não há nelas recursos
afetivos desenvolvidos para a finalidade da maternidade. Contudo, a autora não considera
essa ausência de recursos afetivos para a maternidade como uma patologia, mas sim como
mais uma possibilidade de escolha ou um direcionamento dos desejos femininos que, de
certa forma, deixaram de seguir o padrão social estabelecido. Apesar da possibilidade de
redirecionamento das perspectivas e desejos percebe-se a existência de modelos, antigos e
recentes, que atuam fortemente sobre o universo feminino gerando conflitos entre os velhos
paradigmas e as novas possibilidades. Pensando na imposição, seja ela da maternidade ou
da carreira profissional (Barbosa e Rocha-Coutinho, 2007)

É importante ressaltar que, além das mudanças sócio-culturais no papel feminino, não se
pode desconsiderar as fantasias, expectativas e os desejos existentes no consciente e
inconsciente feminino acerca da gravidez e do nascimento de um filho. Barros(2010) e
Mansur (2003) afirmam que há uma diferença importante entre o desejo de engravidar e o
desejo de ter e cuidar de um filho. Muitas dúvidas, fantasias e ambivalências permeiam o
psiquismo feminino em relação a estes dois eventos e influenciam significativamente a


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decisão de dar ou não lugar para a maternidade e a forma como isto se realiza. Por vezes
as expectativas da mulher, principalmente numa sociedade onde tantas escolhas são
possíveis, podem estar voltadas ou mais direcionadas para outras possibilidades e não para
a maternidade e isso não representa em si mesmo uma patologia (MANSUR, 2003).

Considerando todas as colocações feitas pelos autores citados, cabe perguntar como as
mulheres se colocam em relação a seus diversos papéis. Este estudo investigará o lugar da
maternidade na vida da mulher contemporânea, considerando também os demais papéis
femininos e a vivência de todos eles, a partir da fala de seis mulheres. Considerar-se-á
também os fatores sociais próprios da nossa época tecendo reflexões sobre suas
características e efeitos históricos e subjetivos.

MÉTODO

A pesquisa realizada foi do tipo exploratória (CERVO E BERVIAN,1983)          e de caráter
qualitativo (MINAYO, 2002). Para coleta de dados foram entrevistadas seis mulheres entre
25 e 35 anos, dentre elas quatro casadas com filhos e duas solteiras sem filhos, todas
desempenhando atividades profissionais. Procurou-se para a composição da amostra
mulheres que manifestassem claro interesse pelo tema para alcançarmos maior
fidedignidade dos dados. Estas foram indicadas por colegas e conhecidos, tendo como
exigência que as mesmas não fizessem parte do ciclo de convivência das pesquisadoras.
Foram utilizados para coleta dos dados dois instrumentos: uma entrevista semi-dirigida e a
aplicação do Procedimento de Desenho-Estória de Walter Trinca (1984). As duas técnicas
foram aplicadas em um único encontro foi realizado na residência das mulheres, dentro de
todo sigilo necessário para a pesquisa científica. Após a coleta de dados foi realizada a
categorização das entrevistas e análise dos desenhos e estórias dentro das categorias
propostas por Trinca (1984). Posteriormente os dados obtidos por meio dos dois
instrumentos foram analisados conjuntamente objetivando-se a melhor compreensão dos
mesmos. Este procedimento foi realizado para cada colaboradora separadamente, Em um
segundo momento os dados foram cruzados entre si e com o referencial teório de
embasamento da pesquisa para a compreensão final e conclusões do estudo realizado.

Por tratar-se de uma pesquisa envolvendo seres humanos algumas providências no sentido
de preservar a integridade psicológica das colaboradoras foram tomadas. Não fizeram parte
da amostra mulheres grávidas, mulheres com histórico de gravidez de risco, estéreis ou
inférteis (ou com marido nessas condições), mulheres que tivessem sofrido aborto
recentemente, que tivessem feito laqueadura por risco de morte e mulheres esquizofrênicas
e depressivas com diagnóstico medico. Foi apresentado para cada sujeito a Carta de
Informação sobre a pesquisa e o Termo de Consentimento livre e Esclarecido foi assinado



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por todos. Deixou-se explícito para as colaboradoras a possibilidade de desistência ou
suspensão da sua participação caso emergissem sofrimentos ou constrangimentos
decorrentes do processo da coleta de dados. Além disso, colocou-se à disposição os
contatos das pesquisadoras para possíveis orientações se assim se fizesse necessário.

Tendo em vista a extensão do material obtido, optou-se neste artigo por discutir apenas um
caso dentre todos os analisados procurando melhor ilustrar as questões levantadas ao longo
da pesquisa. Contudo, salienta-se a riqueza e importância de todo material coletado.

RESULTADOS

Será apresentado o sujeito 5, escolhido para um estudo de caso com o intuito de ilustrar os
principais resultados da pesquisa. Trata-se de uma mulher de 33 anos, casada, que tem um
filho ainda pequeno. Cursou o ensino superior e hoje administra o próprio negócio. Mora
com o marido e o filho.

Dados da entrevista.

Tabela 1: Respostas fornecidas para as perguntas da entrevista semi-dirigida.
                   Categorias                                        Respostas do sujeito.
                     Infância.
                                                         Minha mãe sempre foi muito cuidadosa, muito
                                                                             presente.
        Transformações na vida da mulher.
                                                     Eram mais donas de casa, que viviam pros maridos e
                                                      filhos e hoje as mulheres são mais independentes.
      Importância da profissão para a mulher.
                                                    Quero que meu filho tenha orgulho de mim, que ele fale
                                                                    “nossa ela teve sucesso!’.
    Importância da maternidade para a mulher.
                                                       A maternidade só agrega , só faz crescer mesmo.
                                                                        É importante sim.



       Ser mãe no passado e ser mãe hoje.            As mulheres estão mais independentes, muitas vezes
                                                        até têm filhos solteiras porque não precisa mais
                                                                    daquela coisa da família.

                  Maternidade é...                                   É uma coisa especial!

           Condição para a maternidade.               A pessoa tem que tá preparada para uma mudança
                                                               geral e tem que querer mesmo.

    Idealização para o futuro (antes dos filhos).   Sempre falei que quando tivesse meu filho a prioridade
                                                     seria ele, mas também não abandonaria minha vida
                                                           profissional porque meu filho iria crescer.

          A sociedade espera da mulher.             As primeiras mulheres revolucionaram e as que vieram
                                                      depois tiveram que acompanhar. Elas têm que se
                                                    sustentar e às vezes abrem mão da maternidade para
                                                                            isso.

           Dificuldades da maternidade.             Adaptação inicial desse momento. Muda tudo na vida.

        Amor materno: inato ou construído?                Algumas mulheres nascem para ser mães.

     Mulheres que postergam ou não têm filho.                   Acho que o ideal é você procurar
                                                      conciliar a vida profissional com a maternidade para
                                                                     não deixar para tão tarde.



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            Espaço para a maternidade.                  Eu sempre quis e pretendo ter mais um filho, se eu
                                                         pudesse teria três mas como hoje em dia é meio
                                                          complicado eu acho que vou ficar no segundo.

Os dados da entrevista foram organizados em categorias para facilitar a análise e a compreensão do leitor.


Dados do Desenho-Estória

Serão apresentados os desenhos do sujeito e suas respectivas estórias.




                                                               Desenho 1
Título: Transformação
“No momento da transformação quando você sai da maternidade e vai para casa. É quando muda tudo... lá
tem médico, enfermeiras... o peso vem quando você chega em casa... esse é o momento”.




                                                                     Desenho 2
Título: Felicidade
“O prazer de você zelar pelo seu filho, olhar ele no berço, que lindo! Dá uma sensação de prazer, felicidade.
É um momento de felicidade. Aqui ele tá no quarto dele”.




                                                                                                             9
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011




                                                                Desenho 3
Título: Multitarefas
“Eu e as minhas funções. Profissional, casa, marido, filho. Tá feliz! Dividida, mas feliz”.




                                                           Desenho 4
Título: Jantar em família: situação de prazer.
“Eu servindo a pizza no jantar. É um momento que adoro, gosto de comer. Agreguei o prato de P. (filho). É
um momento dona de casa, o marido esperando, o filho tá brincando em casa... a TV mostra que estamos
em casa. É o momento que gosto!”




                                                            Desenho 5
Título: Tempinho para mim.
“Um tempinho para mim. Sou eu deitada na minha cama lendo um livro, esse eu adoro ler antes de dormir.
Tô tranquila... casa arrumada... momento para dar uma centrada”.




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Síntese das interpretações das categorias de análise.

Tabela 2: Critérios apresentados nas Categorias de Análise do Procedimento Desenho-Estória (Trinca,1984).
  Categorias do Análise das respostas emitidas pelo sujeito durante a narrativa.
      D-E
     Atitudes                         Identificação positiva: auto-imagem real e valorizada.
     básicas
     Figuras                                            Fraternas positivas
  significativas
  Sentimentos                                  Derivados do instinto de vida: alegria
   expressos
  Tendências e                                    Construtivas: de crescimento.
     desejos
    Impulsos                                                 Amorosos
   Ansiedades                                               Depressivas
 Mecanismos de                                        Identificação projetiva
      defesa
     Sintomas                                              Ausente
    expressos
   Simbolismos                                             Ausente
  apresentados
   Outras áreas                                       Funções femininas
  da experiência
A tabela acima mostra de forma sintética a prevalência dos dados obtidos nas categorias de análise das cinco
unidades de produção, ou seja, nos cinco desenhos e estórias do sujeito.


Síntese final das Categorias e itens do Desenho- Estória elaborada a partir da análise
de cada unidade de produção.

As produções do sujeito indicaram atitudes de aceitação diante das experiências
desafiadoras que se lhe apresentam, apesar do medo inicial que tais experiências podem
gerar. As produções indicam também uma aceitação positiva e de auto-realização por meio
de suas experiências, que em todas as estórias estiveram relacionadas com a vida
doméstica, com os papéis femininos e com a maternidade. Aparentemente as estórias foram
construídas a partir das vivências reais do sujeito, e em alguns momentos indicaram uma
certa idealização por apresentarem somente seu lado positivo, ou seja, ela provavelmente
projeta aquilo que faz para o marido e o filho mas que também gostaria que lhe fizessem, o
que por fim aparece claramente na estória frente ao desenho 5. No entanto, pode-se supor,
considerando a coerência em todas as unidades e entre os itens analisados, que o sujeito
não apresenta conflitos mais significativos na realização de seus papéis, no entanto
apresenta necessidade de um tempo para si mesma, como ela coloca, “um tempo para se
centrar em si mesma” (sic).
As ansiedades predominantes nas suas produções estão relacionadas à posição
depressiva, posição em que o sujeito funciona de forma mais integrada com a realidade,
reconhecendo as características ambivalentes dos objetos e desenvolvendo mecanismos de
defesa, como a identificação positiva* que prevaleceu dentre todas as defesas
apresentadas, que são mais elaborados para lidar com suas angústias maternas e
necessidades não satisfeitas. Tendo em vista a análise final de todas as produções


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(desenhos e estórias) integrada aos dados das entrevistas percebeu-se que, apesar de
inicialmente o bebê ter sido percebido como um representante do falo, ou seja, como algo
que a completou, assim como o trabalho, manter-se nesta posição fálica por um tempo
prolongado a leva por vezes a um sentimento de desamparo muito grande quando seus
recursos são levados à falência por não conseguir dar conta de tudo o que se propõe. Este
funcionamento psíquico é marcante no sujeito em questão.

DISCUSSÃO

Pensar o lugar da maternidade na vida da mulher na contemporaneidade pressupõe uma
reflexão sobre a história da mulher e da própria maternidade sem esquecer-se que estas
encontram-se mergulhadas na história de sua cultura. Aspectos da transformação social que
englobam desde os valores e a economia até os costumes mais rotineiros, como a forma de
se portar, da vida cotidiana das mulheres precisa ser considerado se pretende-se uma
aproximação do significado que a experiência da maternidade tem para cada mulher.

Observando-se as respostas do sujeito às perguntas da entrevista realizada, suas
produções gráficas e as narrativas pode-se identificar pontos importantes que foram
apontados no referencial teórico que embasou a pesquisa. Percebe-se que o sujeito não só
aponta as transformações no papel feminino como parece estar ciente dos efeitos delas
sobre as mulheres. Isto pode ser constatado quando em sua fala aponta que “antigamente
as mulheres viviam mais para a casa, o marido e os filhos e que na atualidade elas
mostram-se mais independentes”(sic). Esse dado aparece também nas falas de outras
mulheres que participaram da pesquisa. Falas como: “antes elas ficava muito à margem”,
“antigamente era dona de casa e tinha que ficar calada”, mostram a percepção das
mulheres colaboradoras da pesquisa sobre o lugar que durante muito tempo foi ocupado
pela mulher.

Badinter (1985), Mansur (2003) e Chodorow (1990) discorrem em seus trabalhos sobre este
lugar que durante um longo período histórico foi ocupado pela mulher na família e na
sociedade. Segundo as autoras, as mulheres eram tidas como reprodutoras e mantenedoras
do lar, não podendo participar de decisões importantes, que muitas vezes diziam respeito à
elas mesmas, tendo que negar seus desejos e necessidades em função das imposições que
lhes eram feitas. Elas apontam além dos aspectos de submissão das mulheres, suas lutas
psíquicas e sociais para alcançar um lugar de sujeito dos próprios desejos.

As entrevistas mostraram que a maioria das participantes tiveram mães (5 entre 6) que já
participaram de um momento em que as mulheres começaram a sair de casa e ingressar no
mercado de trabalho. Estes dados ajudam a pensar qual o registro que os sujeitos têm
sobre o papel da profissionalização na vida da mulher. Segundo o sujeito do estudo de caso



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aqui apresentado, sua mãe esteve muito presente na sua infância, o que remete ao lugar da
mulher como dona de casa e cuidadora do lar, mas o sujeito apontou também que sua mãe
além de cuidar dos filhos também trabalhava fora para ajudar nas despesas da casa, o que
certamente influencia na importância que o sujeito atribui tanto à maternidade e os cuidados
do lar, como à sua carreira profissional. Estes dados são observados em suas produções,
especialmente no desenho 3 em que põe o trabalho como um dos elementos de seus
pensamentos. Ela expressa também durante a entrevista o desejo de ser reconhecida pelo
filho não somente como mãe mas também como profissional bem sucedida: “quero que meu
filho tenha orgulho de mim, que ele fale ‘nossa ela teve sucesso!’’’(sic).

A maternidade como se apresenta nas falas do sujeito, indica os desafios e ambigüidades já
discutidos em estudos que também trataram deste fenômeno tais como Grant (2002),
Mansur (2003), Socorro (2007), Barros (2010). A primeira produção do desenho-estória
(desenho número1) traz o momento do nascimento do filho as emoções vivenciadas nesse
momento pelo sujeito. Sua produção oferece uma amostra importante de como este
momento pode gerar sentimentos e moções intensas e contraditórias que podem culminar
em angústias e desconfortos para as mulheres. Como aponta o sujeito em estudo, e os
outros 5 sujeitos que participaram deste estudo, a maternidade não gera somente
sentimentos bons, esse momento em que “muda tudo”(sic), (estória 1) é quando a mulher
pode sentir todas as contingências, sejam agradáveis ou desagradáveis, da maternidade.
Observando-se os desdobramentos emocionais de gerar e cuidar de um bebê, pode-se
compreender melhor o que este momento pode provocar nas mulheres e porque em muitos
casos as demais possibilidades existentes no mundo e no universo feminino acabam
ocupando espaço sem deixar lugar para a maternidade.

Mansur (2003) em seu estudo com mulheres que optaram pela carreira em detrimento da
maternidade, aponta que ao fazer essa escolha a mulher pode indicar que não há nela
recursos afetivos desenvolvidos para este fim ou que simplesmente a carreira profissional foi
tornando-se a prioridade para tais mulheres. Outra constatação a respeito do não lugar, ou
da postergação da maternidade é que, com os movimentos em prol dos direitos das
mulheres e o surgimento da pílula anticoncepcional as mulheres assumiram o poder sobre o
próprio corpo e sobre a decisão de ter ou não filhos (BADINTER, 1985; CHODOROW, 1990;
MANSUR, 2003; BARBOSA E ROCHA-COUTINHO, 2007).

Analisando o posicionamento do sujeito aqui estudado há indícios de que a maternidade
sempre esteve em seus planos, o que indica uma predisposição psicológica para esse fim,
ou seja, ela construiu durante sua vida recursos afetivos que possibilitaram a abertura,
dentro de todas as outras possibilidades que se lhe apresentaram, para ser mãe. Contudo, a
predisposição psicológica para a maternidade não garante a ausência de ambigüidades e


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conflitos em relação à ela.

Barros (2010) e Mansur (2003) chamam atenção para a distinção entre o desejo de
engravidar e o desejo de tornar-se mãe. Este dado apareceu na fala do sujeito quando
apontou que encontrou dificuldade logo do nascimento de seu filho. Houve, segundo suas
palavras, dificuldade na “adaptação inicial a esse momento. Muda tudo na vida”(sic). Muitas
vezes as expectativas das mulheres encontram-se relacionadas somente à gestação e
quando o bebê nasce elas se deparam com dificuldades que podem até mesmo dificultar
seu contato com o bebê e com as próprias emoções. Em relação ao sujeito de pesquisa, a
forma como conta sua história da maternidade e demais funções, por meio dos desenhos,
indica que apesar das dificuldades ela soube encontrar formas de lidar com este momento
sem que tais dificuldades se tornassem mais fortes do que sua capacidade de oferecer
amparo para o bebê.

Pensando a relação mãe-bebê da perspectiva de Winnicott (2000) o que ocorre, geralmente,
com a mulher-mãe com a chegada do bebê é que ela desenvolve uma capacidade de
relacionar-se com ele que a permite desligar-se do resto do mundo e viver para atender as
necessidades do filho. Pode-se, no entanto, considerar que nem sempre ocorre desta forma
para todas as mulheres e que este momento pode ser, para algumas, muito angustiante.

Winnicott (2000) aponta ainda para a importância do papel materno para o desenvolvimento
psíquico saudável do bebê. Considerando-se que, para além das construções teóricas, no
imaginário popular as mulheres foram e continuam sendo responsáveis e responsabilizadas
na maioria das vezes pelo que acontece com os filhos, este sentimento de responsabilidade
e o desafio de dar conta de gerar filhos saudáveis, física e emocionalmente, também pode
causar temores nas mulheres que as distanciam da maternidade.

Vale ressaltar que os conflitos provenientes do sentimento materno refletem a internalização
inconsciente das normas sociais que se reproduzem através das gerações e passam a
integrar a subjetividade feminina, modelando seus papéis e seus comportamentos. Segundo
Tourinho (2007) é a partir dessas introjeções que as mulheres passam a atribuir sentimentos
negativos ao fato de não corresponderem aos ideais normatizados, como não amarem
incondicionalmente seus filhos, sentirem frustração pelo seu nascimento, etc.

O sujeito desta pesquisa indica que seu desejo pela maternidade não impossibilitou sua
realização profissional, pelo contrário, mesmo antes de ter o filho parecia já ter refletido
sobre uma forma de poder desempenhar as duas funções concomitantemente. Isso fica
entendido quando ela afirma: “sempre falei que quando tivesse meu filho a prioridade seria
ele, mas também não abandonaria minha vida profissional porque meu filho iria
crescer”(sic). Sua fala indica que manter a carreira profissional também era parte de seus



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desejos e que seu posicionamento foi no sentido da realização dos seus desejos e não no
sentido de dedicar-se somente a um deles. Pode-se constatar que a normatização do amor
materno totalmente abnegado não imperou na sua subjetividade, deixando espaço para
outras realizações. É importante ressaltar que este modo de funcionamento em que a mãe
permite um espaço de diferenciação entre ela e o bebê é entendido como o mais saudável
para a constituição psíquica do filho como sujeito uma vez que ela inicialmente oferece os
cuidados necessários para seu desenvolvimento físico e psicológico e, posteriormente em
outro momento oferece um espaço para que este se constitua como ser diferenciado dela.
Este movimento de alternância entre presença e ausência materna permite que o filho se
constitua psiquicamente de forma mais saudável pois permite que ele se reconheça como
sujeito desejante, ou seja, se reconheça para além do desejo da mãe (BARROS, 2010).

O último desenho do sujeito deixa explícito que a saúde psíquica do indivíduo precisa ser
preservada, independentemente das suas escolhas, para que ele possa manter-se
disponível e disposto para suas atividades no mundo. O “tempinho para mim”(sic) sugerido
pelo sujeito pode ser entendido como a forma como a mulher, que realiza estas funções
sem se deixar sobrecarregar pelos excessos negativos que elas podem causar, encontra
para manter-se disposta para a realização no dia a dia de inúmeras atividades.

Vale ressaltar que ao longo do presente estudo encontrou-se mulheres nas quais esta
diversidade de papéis gera desconfortos e a tentativa de encaixar o papel materno entre os
demais apareceu sempre muito carregada de idealizações e angústias, elementos estes que
apontam na direção do descompasso emocional gerado pelo esforço em atender as
demandas contemporâneas e os próprios desejos. Estes dados podem ser constatados na
fala de algumas mulheres: “É muita coisa... Sou muito nervosa porque não sei equilibrar
isso”(sic), “Cansaço... muito tempo para se dedicar ao filho e conseguir ser mulher para o
marido”(sic), “As dificuldades são muitas, a mulher além de cuidar de outro ser, deixa de
cuidar dela, é muito difícil ficar inteirona, bonitona e ter uma criança arrumadinha, bonitinha
e cheirosinha...”(sic). Percebe-se que os conflitos apontam em direções muito abrangentes e
de grande significado no psiquismo feminino. O corpo, a relação amorosa, o campo
emocional, são aspectos do feminino que estão diretamente relacionados com a
maternidade e que precisam ser considerados para entender a relação da mulher com o
papel de mãe.

A sobreposição dos papéis femininos é considerada como um dos fatores geradores de
angústias e esforços permanentes da mulher no sentido de dar conta do que é esperado
dela socialmente (CHODOROW, 1990; GRANT, 2002; MANSUR, 2003; SOCORRO, 2007).
A maternidade ainda parece ser a função feminina mais carregada de idealização, contudo,
o exercício de novas possibilidades se faz cada vez mais presente no nosso meio cultural


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levando a mulher a questionar-se sobre seu desejo de ter ou não filhos e a hora que deve se
dedicar a esse fim. A despeito da sua condição feminina, o questionamento e a decisão por
ser ou não mãe são legítimos e precisam ser respeitados. Os desenhos 3 e 4 do sujeito
mostram como estes diversos papéis estão presentes na atualidade e como ela busca
atender à todos eles. No seu caso parece haver um equilíbrio na “dosagem” da energia
psíquica destinada para cada uma dessas atividades, uma vez que afirma, por meio da sua
narrativa que a mulher encontra-se “dividida, mas feliz”(sic).

Socialmente criou-se um conceito de maternidade como uma condição inerente à mulher.
Esse conceito internalizado e transmitido de geração para geração tornou-se tão poderoso,
que todas as transformações vividas pelas mulheres parecem não ser suficientes para
desmistificá-lo, pois a crença na maternidade como dom indiscutível da mulher continua
presente na sociedade e muitas vezes nas próprias mulheres (BADINTER, 1985;
CHODOROW,1990; TOURINHO, 2006).

Afirmar que a falta de espaço para a maternidade na vida da mulher indica distúrbios ou
anormalidades é retomar uma forma muito simplista de ver este fenômeno e deixa claro a
reprodução de uma forma de pensar o feminino que enjaula todas as possibilidades às quais
as mulheres têm direito. Na tentativa de compreender os desejos dos sujeitos, para ir além
das velhas e novas imposições e cobranças sociais, é imprescindível que se procure
entender como elas repercutem na vida subjetiva de cada um levando a esta ou aquela
decisão. Em detrimento do que se encontra no externo, tem-se que considerar que o sujeito
tem no seu funcionamento psicológico as próprias razões para querer ou não a
maternidade.

Pode ser exatamente nesse contexto que resida a necessidade de se estudar quais os
efeitos da aceleração das transformações culturais e tecnológicas e dos imperativos sociais
que tais avanços geram na vida da mulher. Se em outros momentos históricos teve-se como
imperativo, o que ainda não foi bem assimilado até os dias atuais, a maternidade abnegada,
o imperativo da profissionalização feminina da atualidade também pode ser gerador de
grandes conflitos psíquicos se não atribuir-se o devido valor ao que ele pode provocar nas
mulheres.

Por outro lado, se se pensar que os indivíduos evoluem no sentido de adaptar-se às
transformações da sociedade, pode ser que a nova mulher tenha desenvolvido condições
psíquicas que permitam que ela realize todas as atividades sem necessariamente se sentir
mal por isso. O que também não representaria necessariamente uma patologia da
atualidade, pois em todas as épocas as mulheres e demais indivíduos tiveram que se
adaptar as condições externas. Obviamente não são todos que conseguem realizar essa



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adaptação sem sofrimentos psicológicos, daí a necessidade de se considerar os sujeitos
individualmente, considerando-se que o que pode ser realizado com extrema facilidade por
alguns pode gerar o adoecimento de outros.

CONCLUSÃO

Considerando-se que o objetivo geral desta pesquisa foi o de investigar o lugar designado
para a maternidade na atualidade, pode-se constatar que ele divide espaço com os demais
papéis femininos na vida prática e psíquica das mulheres entrevistadas. Percebeu-se uma
certa idealização da maternidade no discurso das colaboradoras, tanto as com filhos quanto
as sem filhos, que pode ser relacionada com um resultado ou reprodução das construções
sociais discutidas ao longo do trabalho. No entanto, os resultados apontaram que ao
deparar-se com a situação de maternidade e maternagem as mulheres que já passaram por
esta experiência apontam claramente as dificuldades e desafios que ficam velados e que
podem ser o extremo contrário de toda a idealização feita anteriormente.

As dificuldades inerentes à maternidade apontadas pelas mulheres-mães do pressente
estudo referem-se à relação entre as idealizações anteriores à chegada do filho e a nova
realidade; à nova posição de ser cuidadora e não mais totalmente independente para a
realização desde ações simples, como sair de casa sem carregar uma mochila, como as
mais complexas, como sair para se distrair quando algo aborrece; à relação entre marido e
mulher que muitas vezes pode ficar restrita; à conciliação entre o papel de mãe e
profissional; aos imperativos e apelos sociais em relação ao que os pais têm que oferecer
aos filhos; e à adaptação a nova configuração física e emocional de suas vidas.

Percebeu-se que as possíveis razões para a não maternidade advêm de uma
sobredeterminação de variáveis externas e internas que envolvem a maternidade tais como
os conflitos e ansiedades pessoais e o não encontro com um parceiro que tenha o mesmo
objetivo. Contudo, estas variáveis se configuram de formas específicas para cada sujeito
que precisa ser olhado na sua singularidade.

A forma como o papel materno é negociado diante dos demais papéis exercidos pelas
mulheres também depende da forma como cada mulher experiencia a maternidade.
Percebeu-se durante as entrevistas que as mulheres que ainda não têm filhos afirmam o
desejo de abrir mão de suas carreiras depois da maternidade, contudo, as que já os têm
apontam não só o desejo como a necessidade de conciliar o exercício da função maternal e
da maternagem com a vida profissional.

Concluiu-se a partir dos dados levantados que o lugar da maternidade na vida da mulher
contemporânea, que tem semelhanças nos diversos momentos históricos, traz o grande


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desafio da conciliação de papéis uma vez que a mulher encontra-se mergulhada em um
espaço social de inúmeras possibilidades. Ficou claro que a maternidade não ocupa o lugar
primordial na vida e nos desejos femininos. Apesar da idealização da maternidade/
maternagem como função primeira da mulher, que em vários momentos apareceu na fala de
todas as colaboradoras da pesquisa, ela está sempre acompanhada e dividindo seu lugar
com outras funções que na prática acabam se tornando mais presentes na vida das
mulheres entrevistadas.

Foi importante perceber que para as mulheres/mães da presente pesquisa (4 das 6
entrevistadas) são as diversas funções, especialmente a ambição profissional e econômica
que acabaram se revelando em primeiro lugar. Já as mulheres sem filhos (2 das 6
entrevistadas)   mesmo    que   projetivamente,   apresentaram     algumas      pré-condições
imaginárias para a maternidade como: ter uma formação acadêmica, vida financeira
estabilizada, ter reconhecimento profissional e estar ao lado do parceiro ideal. Percebeu-se
que nos dois casos, tanto para as mulheres com filhos quanto para as sem filhos, a
profissionalização e a carreira aparecem fortemente colocadas em primeiro plano mesmo
que negadas conscientemente ou escamoteadas pela idealização da maternidade. Vale
ressaltar que tais ambições e desejos não significam que tais mulheres não apresentem
desejos e aptidões pela maternidade ou que não sejam “mães suficientemente
boas”(WINNICOTT, 2006). Também não se pode afirmar que as que ainda não tiveram
filhos não venham a colocar a maternidade em primeiro lugar. O que se constata no
momento, porém, é que todas elas têm outras funções que não a maternidade, como
estando em primeiro lugar em suas vidas.

Considera-se, por fim, que as questões levantadas nesse estudo foram aprofundadas e
estas mesmas e novas perguntas podem ser investigadas em futuras pesquisas. Questões
como: o desejo materno e a relação com a experiência filial; as ansiedades geradas pelos
novos modelos de constituição familiar; a diferença entre os desejos e idealizações e a
condição real da maternidade e os adoecimentos psíquicos causados pela frustração diante
da maternidade desejada e da maternidade não realizada, podem ser temas de novas
pesquisas que muito podem colaborar com o tema aqui estudado.

As dificuldades encontradas para a realização desta pesquisa foram no sentido de encontrar
na agenda das mulheres (colaboradoras e pesquisadoras) tempo para a realização dos
encontros, o que mais uma vez aponta para a multiplicidade dos papéis femininos.

Ressalta-se aqui a importância e os agradecimentos pela contribuição do programa de
bolsas para pesquisas do Programa de Iniciação Científica da Universidade Presbiteriana



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Mackenzie para a realização deste estudo.

A realização da pesquisa possibilitou para a pesquisadora a aproximação do campo da
pesquisa científica e a familiarização e compreensão do tema estudado. Ressaltou também
o desejo de realizar novas pesquisas que venham contribuir com a temática, entendida
pelas pesquisadoras como de grande importância.

REFERÊNCIAS

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TRINCA,W. e colaboradores. Diagnóstico psicológico: A Prática Clínica. São Paulo,
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WINNICOTT, D.W. Da Pediatria `a Psicanálise. Tradução: Davy Bogomoletz. Rio de
Janeiro: Imago, 2000. p. 163-167, 306-315.

WINNICOTT, D.W. Os Bebês e Suas Mães. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. 3ª edição.
São Paulo: Martins Fontes, 2006.



Contato: betaniafarias@yahoo.com.br e izabella@mackenzie.br




                                                                                              20

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Maternidade na contemporaneidade

  • 1. Universidade Presbiteriana Mackenzie O LUGAR DA MATERNIDADE NO DISCURSO DA MULHER CONTEMPORÂNEA Maria Betânia de Lima Farias (IC) e Izabella Paiva Monteiro de Barros (Orientadora) Apoio: PIBIC Mackenzie/MackPesquisa Resumo No decorrer da história muitas transformações ocorreram na sociedade influenciando de forma significativa nos papéis dos sujeitos que dela fazem parte. Ao se analisar os papéis femininos, constata-se que ao longo dos anos eles também se transformaram, oferecendo à mulher um novo status e, em decorrência desse novo status, muitas exigências. Profissionalização, maternidade e cuidados do lar são algumas das atribuições femininas que muito exigem dos atributos físicos e psíquicos na prática e no psiquismo da mulher na sociedade atual. O presente trabalho procurou compreender, por meio da fala de seis mulheres, qual o espaço destinado à maternidade na contemporaneidade, considerando os diversos papéis exercidos por elas, discutindo as dificuldades, saídas e significados encontrados por cada uma para exercê-los concomitantemente. A partir de entrevistas semi-dirigidas (Minayo,2007) e aplicação da técnica do Desenho-Estória proposto por Walter Trinca (1984) foram obtidos dados relevantes no que se refere aos objetivos propostos pela pesquisa, dados estes das entrevistas que foram categorizado se analisados (Bardin,2000) separadamente e depois relacionados com os resultados do desenho-estória para que as informações pudessem ser complementadas. Os resultados encontrados mostraram que as exigências da multiplicidade de papéis colocam a mulher diante de escolhas conflituosas que podem confundir-se entre os paradigmas sociais e com seus próprios desejos. Concluiu-se com tal estudo que a maternidade ocupa ideologicamente o primeiro lugar nos projetos de vida das mulheres, contudo, especialmente as que já têm filhos, reconhecem as dificuldades para desempenhar seu papel de mãe colocando-o em primeiro lugar. Mesmo as que descreveram a maternidade como algo importante para a realização feminina, mostraram o quanto ela pode gerar conflitos ao dividir espaço com os demais papéis e funções da mulher. Palavras-chave: papéis femininos, contemporaneidade, maternidade Abstract Troughout history many transformations had occurred in the society influencing significantly on the roles of the citizens who are part of it. By analyzing the feminine roles, it is evidenced that throughout the years they had also changed themselves, offering to the woman a new status and in result of this new status many requirements. Professionalization, maternity and home’s care are some of the feminine attributions that demand a lot of the physical and psychic attributes in the practical way in the current society. The actual work tried to understand, by means of speaks of six women, which is the space destined to the maternity in the actual society, considering the diverse roles exerted by them, arguing the difficulties, the exits and the meanings found for each one to exert them concomitantly. From half-directed interviews (Minayo, 2007) and application of the technique of Desenho-Estória considered by Walter Trinca (1984), relevant information had been gotten regarding the objectives considered by the research, data of the interviews that had been categorized and analyzed (Bardan, 2000) separately and later related with the results of the desenho-estória so that the information could be complemented. The found results had shown that the requirements of the multiplicity of roles place the woman at conflicting choices that can be confused between the social paradigms and with their own desires. One concluded with this study that the maternity ideologically occupies the first place in 1
  • 2. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 the women’ projects of life, however, especially the ones that already have children, recognize the difficulties to blab out their role of being mother placing it in the first place. Even the ones that had described the maternity as something important for the feminine accomplishment had shown how much they can create conflicts when they share space with the other roles and functions of the woman. Key-words: female roles, contemporaneity, maternity 2
  • 3. Universidade Presbiteriana Mackenzie INTRODUÇÃO A inserção da mulher no mercado de trabalho tem crescido cada vez mais e comumente ouve-se ser questionada a ausência da mãe no lar, cuidando e educando os filhos. Pode-se constatar ainda um discurso imperativo exigindo que a mulher cumpra adequadamente suas diversas funções (esposa, profissional, dona de casa, etc.). Fica uma pergunta: como a mulher se coloca diante de todas essas exigências? Para pensar melhor estas questões o objetivo geral desta pesquisa foi o de investigar o lugar designado para a maternidade na atualidade. Além disso, como objetivos específicos a identificação de possíveis dificuldades inerentes à maternidade enfrentadas pelas mulheres- mães na vida contemporânea, possíveis razões para a não maternidade e como o papel materno é “negociado” diante dos demais papéis exercidos pelas mulheres. Cientificamente o aprofundamento do estudo acerca deste tema agregará valor à ciência uma vez que trará contribuições teórico-práticas sobre as transformações no psiquismo feminino decorrentes dos processos de transformações sociais e econômicos. A relevância social deste trabalho encontra-se, portanto, na possibilidade de, a partir dos resultados deste estudo haver uma reflexão crítica sobre o papel materno e seu entrelaçamento com os demais papéis femininos e como estes são vividos pela mulher moderna. REFERENCIAL TEÓRICO Ao se analisar a sociedade, seus valores, práticas e costumes pode-se constatar o quanto ela se transforma ao longo do seu processo histórico. Considerando todas as transformações pode-se certamente constatar também as grandes mudanças ocorridas na família desde os mais remotos registros de sua constituição (ARIÈS, 1981). A configuração e os hábitos das famílias dos séculos XVI e XVII com seu modo de olhar para si mesmas e para as crianças como um pequeno adulto, chegaram ao século XVIII passando por grandes transformações no sentido de sua organização físico-espacial e suas relações com a sociedade. Contrariando o que vinha ocorrendo, começa a ser delimitado o espaço entre o interno e o externo, ou seja, entre o público e o privado, sendo essa delimitação uma fonte para novos fenômenos nas relações familiares e na sua repercussão social (ARIÈS, 1981; BADINTER, 1985). Segundo Ariès (1981) apesar da instituição família sempre ter existido, por muito tempo ela não existia como sentimento ou valor. Portanto, se torna imprescindível entender o processo de transformação da família para se compreender seu significado atual e suas formas de interação social. Apesar de não se adentrar a fundo na questão da família no presente artigo, considera-se importante mencioná-la uma vez que tais transformações e os 3
  • 4. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 papéis femininos estão diretamente relacionados: essa duas histórias, a da mulher e a da família, e suas transformações se entrelaçam constantemente (BADINTER, 1985). Em concordância com o pensamento de Badinter(1985) Oliveira (2007) aponta que além das reformulações, também vêm se desconstruindo os papéis da mulher que vão alterando- se e adaptando-se ao cenário histórico social de cada época. Todas essas mudanças e adaptações que afetam a vida da mulher repercutem na representação social da maternidade. Principalmente, com a chegada da modernidade torna-se mais evidente essas mudanças (OLIVEIRA, 2007; MANSUR, 2003). Tais mudanças e representações sociais tornam-se ainda mais marcantes na sociedade pós-moderna, época atual e na qual se encontram as mulheres da presente pesquisa. A pós-modernidade é um aspecto cultural da sociedade pós-industrial influenciado pelos movimentos democráticos em vários setores de sua esfera (ex: tecnologia, teorias, valores e costumes) e essas influências apontam para novas possibilidades e formas de relações dos sujeitos com o mundo, com os outros e consigo próprios (PAIVA,2006). Dentre todas as funções sociais exercidas pela mulher, a maternidade é pontuadamente a que adquiriu maior valor social (GRANT, 2002). Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, o advento dos métodos anticoncepcionais e o divórcio colocou-se a mulher diante de novas possibilidades de realização e passou-se a olhá-la de uma com uma nova conotação no meio social. A mulher pôde se questionar a respeito do que realmente deseja a despeito de sua condição feminina e fazer opções mesmo em alguns casos tendo que sacrificar-se social e subjetivamente (BARBOSA E ROCHA-COITINHO, 2007). O século XXI e seus avanços teóricos, tecnológicos e no campo do trabalho, trouxeram novas possibilidades para as mulheres, deslocando a sexualidade feminina da maternidade, redefinindo as fronteiras nos espaços familiares e do trabalho, o que promoveu aos poucos o enfraquecimento dos modelos estabelecidos, inclusive o da conjugalidade tradicional. As transformações apresentam-se no campo social e no campo dos desejos, que se encontrava mais reprimido anteriormente, os lugares pré-determinados deixaram de ordenar o destino e as escolhas femininas, e seus caminhos tornaram-se imprevisíveis (MANSUR, 2003; BARBOSA E ROCHA-COITINHO, 2007). GRANT (2002) aponta que na sociedade contemporânea, ou seja, na atualidade, observa- se uma forte valorização da mulher no mercado de trabalho, ainda assim, há uma constante dificuldade, partindo da sociedade e da própria mulher, na conjunção dos diversos papéis exercidos por ela na esfera pública e privada. Apesar da conquista de novos espaços, as exigências domésticas não deixaram de fazer parte da vida das mulheres, pelo contrário, se sobrepõem às novas exigências de profissionalização e autonomia. Há portanto uma 4
  • 5. Universidade Presbiteriana Mackenzie sobreposição de papéis, além de ter que ser uma boa mãe, a mulher tem que ser também uma boa profissional. Os significados desses desdobramentos aparecem não só na vida social das mulheres mas também na sua vida psíquica. Badinter (1985) em suas considerações sobre a mulher e a maternidade nega o conceito de amor materno, ou seja, nega o amor materno como uma condição inerente à mulher. Para a autora ele é adquirido e transformado ao longo da evolução social do sujeito. O amor materno, nesse sentido, é um mito e sua constituição deriva de ideias especializadas que ao longo dos séculos se projetaram no meio social de forma arrebatadora, muitas vezes se sobrepondo e confundindo com os reais desejos dos sujeitos. Apesar das contradições em relação à figura feminina e à constituição da condição de maternagem, não se pode negar a relevância da mãe na vida da criança, o que inevitavelmente aponta para o lugar da mulher como mãe(OLIVEIRA, 2007). Podemos obter na literatura referências de grandes pesquisadores que ao se lançar sobre a questão da constituição do sujeito dão ênfase na mulher em sua função materna, oferecendo posicionamentos bem definidos sobre essa função no contexto da relação mãe-bebê, inclusive apontando consequências na vida da criança e posteriormente do adulto da não efetividade - ou de falhas e desencontros– no processo de construção dessa relação (TOURINHO, 2006; BARROS, 2010). Podemos constatar esse posicionamento nas considerações de Winnicott (2000)quando afirma que: “(...)há uma continuidade no desenvolvimento do indivíduo, iniciando na concepção, prossegue através da fase de latência e a primeira infância, e alcança o estado adulto, sendo a criança o pai do homem. O objetivo da criação de filhos não é apenas produzir crianças saudáveis, mas também o de permitir o desenvolvimento posterior de um adulto saudável (...) a saúde do adulto é constituída ao longo dos vários estágios da infância” (WINNICOTT, 2000. pg. 306). Para Winnicott (2006), é a mãe que através de seus cuidados oferece as bases para o desenvolvimento e consequentemente uma vida mental saudável para o filho. Esses cuidados, no entanto, funcionam dentro de um limite que não pode ser ultrapassado em excesso nem ficar aquém das necessidades do bebê uma vez que, para se constituir de forma saudável o bebê precisa de um objeto que atenda suas necessidades mas que aos poucos permita que ele possa diferenciá-las e administrá-las por si só. Nesse sentido, a mãe ao segurar e prover adequadamente seu bebê, funciona como ego auxiliar que possibilita uma forma muito pessoal e frágil de ego para o bebê, o que só é possível, segundo ele, pela capacidade que a mãe possui de identificar-se com suas necessidades básicas (WINNICOTT, 2006). 5
  • 6. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 Ao se levar em conta as características próprias do momento do nascimento de um bebê e as alterações que estas podem ocasionar na vida da mãe pode-se constatar o quanto é delicado assegurar os cuidados sob a perspectiva Winnicotianna, principalmente numa sociedade em que a todo momento se é convocado a dar conta de um número maior de atividades, a ter mais para gastar mais, e ter mais implica em mais atividades. Nessa realidade como garantir que os cuidados com o bebê não serão de mais ou de menos? (GRANT, 2002). Na sociedade contemporânea, preza-se os atributos profissionais e econômicos dos sujeitos, ou seja, se prima pela competência e autonomia, o que caracteriza uma constante pressão sobre a mulher-profissional (SOCORRO, 2007). Vale ressaltar que a mulher profissional não deixou de ser também, no ideal social, a mulher-mãe, dona de casa e esposa. Com tantos papéis a mulher não pode ter limites, pois caso contrário, não daria conta de tantas funções ( GRANT, 2002). Com a diversidade de papéis e as novas possibilidades a que as mulheres se permitem, elas acabam ou optando por alguma(s) em detrimento de outras ou sobrecarregando-se com todas elas. Mesmo que secularmente o olhar para a mulher indique que ela já nasceu com o potencial para a maternidade (BADINTER, 1985) atualmente considera-se, ou impõe- se, que ela também tenha potencial profissional. Na impossibilidade de executar satisfatoriamente as duas e as demais funções, sutilmente é sugerido o adiamento de uma, ou uma opção definitiva (BARBOSA E ROCHA-COUTINHO, 2007). Em estudo realizado com mulheres que não tiveram filhos Mansur (2003) aponta que a opção por uma carreira profissional em detrimento da maternidade pode indicar que esta foi se tornando uma prioridade na vida das mulheres, ou ainda que não há nelas recursos afetivos desenvolvidos para a finalidade da maternidade. Contudo, a autora não considera essa ausência de recursos afetivos para a maternidade como uma patologia, mas sim como mais uma possibilidade de escolha ou um direcionamento dos desejos femininos que, de certa forma, deixaram de seguir o padrão social estabelecido. Apesar da possibilidade de redirecionamento das perspectivas e desejos percebe-se a existência de modelos, antigos e recentes, que atuam fortemente sobre o universo feminino gerando conflitos entre os velhos paradigmas e as novas possibilidades. Pensando na imposição, seja ela da maternidade ou da carreira profissional (Barbosa e Rocha-Coutinho, 2007) É importante ressaltar que, além das mudanças sócio-culturais no papel feminino, não se pode desconsiderar as fantasias, expectativas e os desejos existentes no consciente e inconsciente feminino acerca da gravidez e do nascimento de um filho. Barros(2010) e Mansur (2003) afirmam que há uma diferença importante entre o desejo de engravidar e o desejo de ter e cuidar de um filho. Muitas dúvidas, fantasias e ambivalências permeiam o psiquismo feminino em relação a estes dois eventos e influenciam significativamente a 6
  • 7. Universidade Presbiteriana Mackenzie decisão de dar ou não lugar para a maternidade e a forma como isto se realiza. Por vezes as expectativas da mulher, principalmente numa sociedade onde tantas escolhas são possíveis, podem estar voltadas ou mais direcionadas para outras possibilidades e não para a maternidade e isso não representa em si mesmo uma patologia (MANSUR, 2003). Considerando todas as colocações feitas pelos autores citados, cabe perguntar como as mulheres se colocam em relação a seus diversos papéis. Este estudo investigará o lugar da maternidade na vida da mulher contemporânea, considerando também os demais papéis femininos e a vivência de todos eles, a partir da fala de seis mulheres. Considerar-se-á também os fatores sociais próprios da nossa época tecendo reflexões sobre suas características e efeitos históricos e subjetivos. MÉTODO A pesquisa realizada foi do tipo exploratória (CERVO E BERVIAN,1983) e de caráter qualitativo (MINAYO, 2002). Para coleta de dados foram entrevistadas seis mulheres entre 25 e 35 anos, dentre elas quatro casadas com filhos e duas solteiras sem filhos, todas desempenhando atividades profissionais. Procurou-se para a composição da amostra mulheres que manifestassem claro interesse pelo tema para alcançarmos maior fidedignidade dos dados. Estas foram indicadas por colegas e conhecidos, tendo como exigência que as mesmas não fizessem parte do ciclo de convivência das pesquisadoras. Foram utilizados para coleta dos dados dois instrumentos: uma entrevista semi-dirigida e a aplicação do Procedimento de Desenho-Estória de Walter Trinca (1984). As duas técnicas foram aplicadas em um único encontro foi realizado na residência das mulheres, dentro de todo sigilo necessário para a pesquisa científica. Após a coleta de dados foi realizada a categorização das entrevistas e análise dos desenhos e estórias dentro das categorias propostas por Trinca (1984). Posteriormente os dados obtidos por meio dos dois instrumentos foram analisados conjuntamente objetivando-se a melhor compreensão dos mesmos. Este procedimento foi realizado para cada colaboradora separadamente, Em um segundo momento os dados foram cruzados entre si e com o referencial teório de embasamento da pesquisa para a compreensão final e conclusões do estudo realizado. Por tratar-se de uma pesquisa envolvendo seres humanos algumas providências no sentido de preservar a integridade psicológica das colaboradoras foram tomadas. Não fizeram parte da amostra mulheres grávidas, mulheres com histórico de gravidez de risco, estéreis ou inférteis (ou com marido nessas condições), mulheres que tivessem sofrido aborto recentemente, que tivessem feito laqueadura por risco de morte e mulheres esquizofrênicas e depressivas com diagnóstico medico. Foi apresentado para cada sujeito a Carta de Informação sobre a pesquisa e o Termo de Consentimento livre e Esclarecido foi assinado 7
  • 8. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 por todos. Deixou-se explícito para as colaboradoras a possibilidade de desistência ou suspensão da sua participação caso emergissem sofrimentos ou constrangimentos decorrentes do processo da coleta de dados. Além disso, colocou-se à disposição os contatos das pesquisadoras para possíveis orientações se assim se fizesse necessário. Tendo em vista a extensão do material obtido, optou-se neste artigo por discutir apenas um caso dentre todos os analisados procurando melhor ilustrar as questões levantadas ao longo da pesquisa. Contudo, salienta-se a riqueza e importância de todo material coletado. RESULTADOS Será apresentado o sujeito 5, escolhido para um estudo de caso com o intuito de ilustrar os principais resultados da pesquisa. Trata-se de uma mulher de 33 anos, casada, que tem um filho ainda pequeno. Cursou o ensino superior e hoje administra o próprio negócio. Mora com o marido e o filho. Dados da entrevista. Tabela 1: Respostas fornecidas para as perguntas da entrevista semi-dirigida. Categorias Respostas do sujeito. Infância. Minha mãe sempre foi muito cuidadosa, muito presente. Transformações na vida da mulher. Eram mais donas de casa, que viviam pros maridos e filhos e hoje as mulheres são mais independentes. Importância da profissão para a mulher. Quero que meu filho tenha orgulho de mim, que ele fale “nossa ela teve sucesso!’. Importância da maternidade para a mulher. A maternidade só agrega , só faz crescer mesmo. É importante sim. Ser mãe no passado e ser mãe hoje. As mulheres estão mais independentes, muitas vezes até têm filhos solteiras porque não precisa mais daquela coisa da família. Maternidade é... É uma coisa especial! Condição para a maternidade. A pessoa tem que tá preparada para uma mudança geral e tem que querer mesmo. Idealização para o futuro (antes dos filhos). Sempre falei que quando tivesse meu filho a prioridade seria ele, mas também não abandonaria minha vida profissional porque meu filho iria crescer. A sociedade espera da mulher. As primeiras mulheres revolucionaram e as que vieram depois tiveram que acompanhar. Elas têm que se sustentar e às vezes abrem mão da maternidade para isso. Dificuldades da maternidade. Adaptação inicial desse momento. Muda tudo na vida. Amor materno: inato ou construído? Algumas mulheres nascem para ser mães. Mulheres que postergam ou não têm filho. Acho que o ideal é você procurar conciliar a vida profissional com a maternidade para não deixar para tão tarde. 8
  • 9. Universidade Presbiteriana Mackenzie Espaço para a maternidade. Eu sempre quis e pretendo ter mais um filho, se eu pudesse teria três mas como hoje em dia é meio complicado eu acho que vou ficar no segundo. Os dados da entrevista foram organizados em categorias para facilitar a análise e a compreensão do leitor. Dados do Desenho-Estória Serão apresentados os desenhos do sujeito e suas respectivas estórias. Desenho 1 Título: Transformação “No momento da transformação quando você sai da maternidade e vai para casa. É quando muda tudo... lá tem médico, enfermeiras... o peso vem quando você chega em casa... esse é o momento”. Desenho 2 Título: Felicidade “O prazer de você zelar pelo seu filho, olhar ele no berço, que lindo! Dá uma sensação de prazer, felicidade. É um momento de felicidade. Aqui ele tá no quarto dele”. 9
  • 10. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 Desenho 3 Título: Multitarefas “Eu e as minhas funções. Profissional, casa, marido, filho. Tá feliz! Dividida, mas feliz”. Desenho 4 Título: Jantar em família: situação de prazer. “Eu servindo a pizza no jantar. É um momento que adoro, gosto de comer. Agreguei o prato de P. (filho). É um momento dona de casa, o marido esperando, o filho tá brincando em casa... a TV mostra que estamos em casa. É o momento que gosto!” Desenho 5 Título: Tempinho para mim. “Um tempinho para mim. Sou eu deitada na minha cama lendo um livro, esse eu adoro ler antes de dormir. Tô tranquila... casa arrumada... momento para dar uma centrada”. 10
  • 11. Universidade Presbiteriana Mackenzie Síntese das interpretações das categorias de análise. Tabela 2: Critérios apresentados nas Categorias de Análise do Procedimento Desenho-Estória (Trinca,1984). Categorias do Análise das respostas emitidas pelo sujeito durante a narrativa. D-E Atitudes Identificação positiva: auto-imagem real e valorizada. básicas Figuras Fraternas positivas significativas Sentimentos Derivados do instinto de vida: alegria expressos Tendências e Construtivas: de crescimento. desejos Impulsos Amorosos Ansiedades Depressivas Mecanismos de Identificação projetiva defesa Sintomas Ausente expressos Simbolismos Ausente apresentados Outras áreas Funções femininas da experiência A tabela acima mostra de forma sintética a prevalência dos dados obtidos nas categorias de análise das cinco unidades de produção, ou seja, nos cinco desenhos e estórias do sujeito. Síntese final das Categorias e itens do Desenho- Estória elaborada a partir da análise de cada unidade de produção. As produções do sujeito indicaram atitudes de aceitação diante das experiências desafiadoras que se lhe apresentam, apesar do medo inicial que tais experiências podem gerar. As produções indicam também uma aceitação positiva e de auto-realização por meio de suas experiências, que em todas as estórias estiveram relacionadas com a vida doméstica, com os papéis femininos e com a maternidade. Aparentemente as estórias foram construídas a partir das vivências reais do sujeito, e em alguns momentos indicaram uma certa idealização por apresentarem somente seu lado positivo, ou seja, ela provavelmente projeta aquilo que faz para o marido e o filho mas que também gostaria que lhe fizessem, o que por fim aparece claramente na estória frente ao desenho 5. No entanto, pode-se supor, considerando a coerência em todas as unidades e entre os itens analisados, que o sujeito não apresenta conflitos mais significativos na realização de seus papéis, no entanto apresenta necessidade de um tempo para si mesma, como ela coloca, “um tempo para se centrar em si mesma” (sic). As ansiedades predominantes nas suas produções estão relacionadas à posição depressiva, posição em que o sujeito funciona de forma mais integrada com a realidade, reconhecendo as características ambivalentes dos objetos e desenvolvendo mecanismos de defesa, como a identificação positiva* que prevaleceu dentre todas as defesas apresentadas, que são mais elaborados para lidar com suas angústias maternas e necessidades não satisfeitas. Tendo em vista a análise final de todas as produções 11
  • 12. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 (desenhos e estórias) integrada aos dados das entrevistas percebeu-se que, apesar de inicialmente o bebê ter sido percebido como um representante do falo, ou seja, como algo que a completou, assim como o trabalho, manter-se nesta posição fálica por um tempo prolongado a leva por vezes a um sentimento de desamparo muito grande quando seus recursos são levados à falência por não conseguir dar conta de tudo o que se propõe. Este funcionamento psíquico é marcante no sujeito em questão. DISCUSSÃO Pensar o lugar da maternidade na vida da mulher na contemporaneidade pressupõe uma reflexão sobre a história da mulher e da própria maternidade sem esquecer-se que estas encontram-se mergulhadas na história de sua cultura. Aspectos da transformação social que englobam desde os valores e a economia até os costumes mais rotineiros, como a forma de se portar, da vida cotidiana das mulheres precisa ser considerado se pretende-se uma aproximação do significado que a experiência da maternidade tem para cada mulher. Observando-se as respostas do sujeito às perguntas da entrevista realizada, suas produções gráficas e as narrativas pode-se identificar pontos importantes que foram apontados no referencial teórico que embasou a pesquisa. Percebe-se que o sujeito não só aponta as transformações no papel feminino como parece estar ciente dos efeitos delas sobre as mulheres. Isto pode ser constatado quando em sua fala aponta que “antigamente as mulheres viviam mais para a casa, o marido e os filhos e que na atualidade elas mostram-se mais independentes”(sic). Esse dado aparece também nas falas de outras mulheres que participaram da pesquisa. Falas como: “antes elas ficava muito à margem”, “antigamente era dona de casa e tinha que ficar calada”, mostram a percepção das mulheres colaboradoras da pesquisa sobre o lugar que durante muito tempo foi ocupado pela mulher. Badinter (1985), Mansur (2003) e Chodorow (1990) discorrem em seus trabalhos sobre este lugar que durante um longo período histórico foi ocupado pela mulher na família e na sociedade. Segundo as autoras, as mulheres eram tidas como reprodutoras e mantenedoras do lar, não podendo participar de decisões importantes, que muitas vezes diziam respeito à elas mesmas, tendo que negar seus desejos e necessidades em função das imposições que lhes eram feitas. Elas apontam além dos aspectos de submissão das mulheres, suas lutas psíquicas e sociais para alcançar um lugar de sujeito dos próprios desejos. As entrevistas mostraram que a maioria das participantes tiveram mães (5 entre 6) que já participaram de um momento em que as mulheres começaram a sair de casa e ingressar no mercado de trabalho. Estes dados ajudam a pensar qual o registro que os sujeitos têm sobre o papel da profissionalização na vida da mulher. Segundo o sujeito do estudo de caso 12
  • 13. Universidade Presbiteriana Mackenzie aqui apresentado, sua mãe esteve muito presente na sua infância, o que remete ao lugar da mulher como dona de casa e cuidadora do lar, mas o sujeito apontou também que sua mãe além de cuidar dos filhos também trabalhava fora para ajudar nas despesas da casa, o que certamente influencia na importância que o sujeito atribui tanto à maternidade e os cuidados do lar, como à sua carreira profissional. Estes dados são observados em suas produções, especialmente no desenho 3 em que põe o trabalho como um dos elementos de seus pensamentos. Ela expressa também durante a entrevista o desejo de ser reconhecida pelo filho não somente como mãe mas também como profissional bem sucedida: “quero que meu filho tenha orgulho de mim, que ele fale ‘nossa ela teve sucesso!’’’(sic). A maternidade como se apresenta nas falas do sujeito, indica os desafios e ambigüidades já discutidos em estudos que também trataram deste fenômeno tais como Grant (2002), Mansur (2003), Socorro (2007), Barros (2010). A primeira produção do desenho-estória (desenho número1) traz o momento do nascimento do filho as emoções vivenciadas nesse momento pelo sujeito. Sua produção oferece uma amostra importante de como este momento pode gerar sentimentos e moções intensas e contraditórias que podem culminar em angústias e desconfortos para as mulheres. Como aponta o sujeito em estudo, e os outros 5 sujeitos que participaram deste estudo, a maternidade não gera somente sentimentos bons, esse momento em que “muda tudo”(sic), (estória 1) é quando a mulher pode sentir todas as contingências, sejam agradáveis ou desagradáveis, da maternidade. Observando-se os desdobramentos emocionais de gerar e cuidar de um bebê, pode-se compreender melhor o que este momento pode provocar nas mulheres e porque em muitos casos as demais possibilidades existentes no mundo e no universo feminino acabam ocupando espaço sem deixar lugar para a maternidade. Mansur (2003) em seu estudo com mulheres que optaram pela carreira em detrimento da maternidade, aponta que ao fazer essa escolha a mulher pode indicar que não há nela recursos afetivos desenvolvidos para este fim ou que simplesmente a carreira profissional foi tornando-se a prioridade para tais mulheres. Outra constatação a respeito do não lugar, ou da postergação da maternidade é que, com os movimentos em prol dos direitos das mulheres e o surgimento da pílula anticoncepcional as mulheres assumiram o poder sobre o próprio corpo e sobre a decisão de ter ou não filhos (BADINTER, 1985; CHODOROW, 1990; MANSUR, 2003; BARBOSA E ROCHA-COUTINHO, 2007). Analisando o posicionamento do sujeito aqui estudado há indícios de que a maternidade sempre esteve em seus planos, o que indica uma predisposição psicológica para esse fim, ou seja, ela construiu durante sua vida recursos afetivos que possibilitaram a abertura, dentro de todas as outras possibilidades que se lhe apresentaram, para ser mãe. Contudo, a predisposição psicológica para a maternidade não garante a ausência de ambigüidades e 13
  • 14. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 conflitos em relação à ela. Barros (2010) e Mansur (2003) chamam atenção para a distinção entre o desejo de engravidar e o desejo de tornar-se mãe. Este dado apareceu na fala do sujeito quando apontou que encontrou dificuldade logo do nascimento de seu filho. Houve, segundo suas palavras, dificuldade na “adaptação inicial a esse momento. Muda tudo na vida”(sic). Muitas vezes as expectativas das mulheres encontram-se relacionadas somente à gestação e quando o bebê nasce elas se deparam com dificuldades que podem até mesmo dificultar seu contato com o bebê e com as próprias emoções. Em relação ao sujeito de pesquisa, a forma como conta sua história da maternidade e demais funções, por meio dos desenhos, indica que apesar das dificuldades ela soube encontrar formas de lidar com este momento sem que tais dificuldades se tornassem mais fortes do que sua capacidade de oferecer amparo para o bebê. Pensando a relação mãe-bebê da perspectiva de Winnicott (2000) o que ocorre, geralmente, com a mulher-mãe com a chegada do bebê é que ela desenvolve uma capacidade de relacionar-se com ele que a permite desligar-se do resto do mundo e viver para atender as necessidades do filho. Pode-se, no entanto, considerar que nem sempre ocorre desta forma para todas as mulheres e que este momento pode ser, para algumas, muito angustiante. Winnicott (2000) aponta ainda para a importância do papel materno para o desenvolvimento psíquico saudável do bebê. Considerando-se que, para além das construções teóricas, no imaginário popular as mulheres foram e continuam sendo responsáveis e responsabilizadas na maioria das vezes pelo que acontece com os filhos, este sentimento de responsabilidade e o desafio de dar conta de gerar filhos saudáveis, física e emocionalmente, também pode causar temores nas mulheres que as distanciam da maternidade. Vale ressaltar que os conflitos provenientes do sentimento materno refletem a internalização inconsciente das normas sociais que se reproduzem através das gerações e passam a integrar a subjetividade feminina, modelando seus papéis e seus comportamentos. Segundo Tourinho (2007) é a partir dessas introjeções que as mulheres passam a atribuir sentimentos negativos ao fato de não corresponderem aos ideais normatizados, como não amarem incondicionalmente seus filhos, sentirem frustração pelo seu nascimento, etc. O sujeito desta pesquisa indica que seu desejo pela maternidade não impossibilitou sua realização profissional, pelo contrário, mesmo antes de ter o filho parecia já ter refletido sobre uma forma de poder desempenhar as duas funções concomitantemente. Isso fica entendido quando ela afirma: “sempre falei que quando tivesse meu filho a prioridade seria ele, mas também não abandonaria minha vida profissional porque meu filho iria crescer”(sic). Sua fala indica que manter a carreira profissional também era parte de seus 14
  • 15. Universidade Presbiteriana Mackenzie desejos e que seu posicionamento foi no sentido da realização dos seus desejos e não no sentido de dedicar-se somente a um deles. Pode-se constatar que a normatização do amor materno totalmente abnegado não imperou na sua subjetividade, deixando espaço para outras realizações. É importante ressaltar que este modo de funcionamento em que a mãe permite um espaço de diferenciação entre ela e o bebê é entendido como o mais saudável para a constituição psíquica do filho como sujeito uma vez que ela inicialmente oferece os cuidados necessários para seu desenvolvimento físico e psicológico e, posteriormente em outro momento oferece um espaço para que este se constitua como ser diferenciado dela. Este movimento de alternância entre presença e ausência materna permite que o filho se constitua psiquicamente de forma mais saudável pois permite que ele se reconheça como sujeito desejante, ou seja, se reconheça para além do desejo da mãe (BARROS, 2010). O último desenho do sujeito deixa explícito que a saúde psíquica do indivíduo precisa ser preservada, independentemente das suas escolhas, para que ele possa manter-se disponível e disposto para suas atividades no mundo. O “tempinho para mim”(sic) sugerido pelo sujeito pode ser entendido como a forma como a mulher, que realiza estas funções sem se deixar sobrecarregar pelos excessos negativos que elas podem causar, encontra para manter-se disposta para a realização no dia a dia de inúmeras atividades. Vale ressaltar que ao longo do presente estudo encontrou-se mulheres nas quais esta diversidade de papéis gera desconfortos e a tentativa de encaixar o papel materno entre os demais apareceu sempre muito carregada de idealizações e angústias, elementos estes que apontam na direção do descompasso emocional gerado pelo esforço em atender as demandas contemporâneas e os próprios desejos. Estes dados podem ser constatados na fala de algumas mulheres: “É muita coisa... Sou muito nervosa porque não sei equilibrar isso”(sic), “Cansaço... muito tempo para se dedicar ao filho e conseguir ser mulher para o marido”(sic), “As dificuldades são muitas, a mulher além de cuidar de outro ser, deixa de cuidar dela, é muito difícil ficar inteirona, bonitona e ter uma criança arrumadinha, bonitinha e cheirosinha...”(sic). Percebe-se que os conflitos apontam em direções muito abrangentes e de grande significado no psiquismo feminino. O corpo, a relação amorosa, o campo emocional, são aspectos do feminino que estão diretamente relacionados com a maternidade e que precisam ser considerados para entender a relação da mulher com o papel de mãe. A sobreposição dos papéis femininos é considerada como um dos fatores geradores de angústias e esforços permanentes da mulher no sentido de dar conta do que é esperado dela socialmente (CHODOROW, 1990; GRANT, 2002; MANSUR, 2003; SOCORRO, 2007). A maternidade ainda parece ser a função feminina mais carregada de idealização, contudo, o exercício de novas possibilidades se faz cada vez mais presente no nosso meio cultural 15
  • 16. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 levando a mulher a questionar-se sobre seu desejo de ter ou não filhos e a hora que deve se dedicar a esse fim. A despeito da sua condição feminina, o questionamento e a decisão por ser ou não mãe são legítimos e precisam ser respeitados. Os desenhos 3 e 4 do sujeito mostram como estes diversos papéis estão presentes na atualidade e como ela busca atender à todos eles. No seu caso parece haver um equilíbrio na “dosagem” da energia psíquica destinada para cada uma dessas atividades, uma vez que afirma, por meio da sua narrativa que a mulher encontra-se “dividida, mas feliz”(sic). Socialmente criou-se um conceito de maternidade como uma condição inerente à mulher. Esse conceito internalizado e transmitido de geração para geração tornou-se tão poderoso, que todas as transformações vividas pelas mulheres parecem não ser suficientes para desmistificá-lo, pois a crença na maternidade como dom indiscutível da mulher continua presente na sociedade e muitas vezes nas próprias mulheres (BADINTER, 1985; CHODOROW,1990; TOURINHO, 2006). Afirmar que a falta de espaço para a maternidade na vida da mulher indica distúrbios ou anormalidades é retomar uma forma muito simplista de ver este fenômeno e deixa claro a reprodução de uma forma de pensar o feminino que enjaula todas as possibilidades às quais as mulheres têm direito. Na tentativa de compreender os desejos dos sujeitos, para ir além das velhas e novas imposições e cobranças sociais, é imprescindível que se procure entender como elas repercutem na vida subjetiva de cada um levando a esta ou aquela decisão. Em detrimento do que se encontra no externo, tem-se que considerar que o sujeito tem no seu funcionamento psicológico as próprias razões para querer ou não a maternidade. Pode ser exatamente nesse contexto que resida a necessidade de se estudar quais os efeitos da aceleração das transformações culturais e tecnológicas e dos imperativos sociais que tais avanços geram na vida da mulher. Se em outros momentos históricos teve-se como imperativo, o que ainda não foi bem assimilado até os dias atuais, a maternidade abnegada, o imperativo da profissionalização feminina da atualidade também pode ser gerador de grandes conflitos psíquicos se não atribuir-se o devido valor ao que ele pode provocar nas mulheres. Por outro lado, se se pensar que os indivíduos evoluem no sentido de adaptar-se às transformações da sociedade, pode ser que a nova mulher tenha desenvolvido condições psíquicas que permitam que ela realize todas as atividades sem necessariamente se sentir mal por isso. O que também não representaria necessariamente uma patologia da atualidade, pois em todas as épocas as mulheres e demais indivíduos tiveram que se adaptar as condições externas. Obviamente não são todos que conseguem realizar essa 16
  • 17. Universidade Presbiteriana Mackenzie adaptação sem sofrimentos psicológicos, daí a necessidade de se considerar os sujeitos individualmente, considerando-se que o que pode ser realizado com extrema facilidade por alguns pode gerar o adoecimento de outros. CONCLUSÃO Considerando-se que o objetivo geral desta pesquisa foi o de investigar o lugar designado para a maternidade na atualidade, pode-se constatar que ele divide espaço com os demais papéis femininos na vida prática e psíquica das mulheres entrevistadas. Percebeu-se uma certa idealização da maternidade no discurso das colaboradoras, tanto as com filhos quanto as sem filhos, que pode ser relacionada com um resultado ou reprodução das construções sociais discutidas ao longo do trabalho. No entanto, os resultados apontaram que ao deparar-se com a situação de maternidade e maternagem as mulheres que já passaram por esta experiência apontam claramente as dificuldades e desafios que ficam velados e que podem ser o extremo contrário de toda a idealização feita anteriormente. As dificuldades inerentes à maternidade apontadas pelas mulheres-mães do pressente estudo referem-se à relação entre as idealizações anteriores à chegada do filho e a nova realidade; à nova posição de ser cuidadora e não mais totalmente independente para a realização desde ações simples, como sair de casa sem carregar uma mochila, como as mais complexas, como sair para se distrair quando algo aborrece; à relação entre marido e mulher que muitas vezes pode ficar restrita; à conciliação entre o papel de mãe e profissional; aos imperativos e apelos sociais em relação ao que os pais têm que oferecer aos filhos; e à adaptação a nova configuração física e emocional de suas vidas. Percebeu-se que as possíveis razões para a não maternidade advêm de uma sobredeterminação de variáveis externas e internas que envolvem a maternidade tais como os conflitos e ansiedades pessoais e o não encontro com um parceiro que tenha o mesmo objetivo. Contudo, estas variáveis se configuram de formas específicas para cada sujeito que precisa ser olhado na sua singularidade. A forma como o papel materno é negociado diante dos demais papéis exercidos pelas mulheres também depende da forma como cada mulher experiencia a maternidade. Percebeu-se durante as entrevistas que as mulheres que ainda não têm filhos afirmam o desejo de abrir mão de suas carreiras depois da maternidade, contudo, as que já os têm apontam não só o desejo como a necessidade de conciliar o exercício da função maternal e da maternagem com a vida profissional. Concluiu-se a partir dos dados levantados que o lugar da maternidade na vida da mulher contemporânea, que tem semelhanças nos diversos momentos históricos, traz o grande 17
  • 18. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 desafio da conciliação de papéis uma vez que a mulher encontra-se mergulhada em um espaço social de inúmeras possibilidades. Ficou claro que a maternidade não ocupa o lugar primordial na vida e nos desejos femininos. Apesar da idealização da maternidade/ maternagem como função primeira da mulher, que em vários momentos apareceu na fala de todas as colaboradoras da pesquisa, ela está sempre acompanhada e dividindo seu lugar com outras funções que na prática acabam se tornando mais presentes na vida das mulheres entrevistadas. Foi importante perceber que para as mulheres/mães da presente pesquisa (4 das 6 entrevistadas) são as diversas funções, especialmente a ambição profissional e econômica que acabaram se revelando em primeiro lugar. Já as mulheres sem filhos (2 das 6 entrevistadas) mesmo que projetivamente, apresentaram algumas pré-condições imaginárias para a maternidade como: ter uma formação acadêmica, vida financeira estabilizada, ter reconhecimento profissional e estar ao lado do parceiro ideal. Percebeu-se que nos dois casos, tanto para as mulheres com filhos quanto para as sem filhos, a profissionalização e a carreira aparecem fortemente colocadas em primeiro plano mesmo que negadas conscientemente ou escamoteadas pela idealização da maternidade. Vale ressaltar que tais ambições e desejos não significam que tais mulheres não apresentem desejos e aptidões pela maternidade ou que não sejam “mães suficientemente boas”(WINNICOTT, 2006). Também não se pode afirmar que as que ainda não tiveram filhos não venham a colocar a maternidade em primeiro lugar. O que se constata no momento, porém, é que todas elas têm outras funções que não a maternidade, como estando em primeiro lugar em suas vidas. Considera-se, por fim, que as questões levantadas nesse estudo foram aprofundadas e estas mesmas e novas perguntas podem ser investigadas em futuras pesquisas. Questões como: o desejo materno e a relação com a experiência filial; as ansiedades geradas pelos novos modelos de constituição familiar; a diferença entre os desejos e idealizações e a condição real da maternidade e os adoecimentos psíquicos causados pela frustração diante da maternidade desejada e da maternidade não realizada, podem ser temas de novas pesquisas que muito podem colaborar com o tema aqui estudado. As dificuldades encontradas para a realização desta pesquisa foram no sentido de encontrar na agenda das mulheres (colaboradoras e pesquisadoras) tempo para a realização dos encontros, o que mais uma vez aponta para a multiplicidade dos papéis femininos. Ressalta-se aqui a importância e os agradecimentos pela contribuição do programa de bolsas para pesquisas do Programa de Iniciação Científica da Universidade Presbiteriana 18
  • 19. Universidade Presbiteriana Mackenzie Mackenzie para a realização deste estudo. A realização da pesquisa possibilitou para a pesquisadora a aproximação do campo da pesquisa científica e a familiarização e compreensão do tema estudado. Ressaltou também o desejo de realizar novas pesquisas que venham contribuir com a temática, entendida pelas pesquisadoras como de grande importância. REFERÊNCIAS ARIÈS,P. História Social da Criança e da Família. Tradução: Dora Flaksman. 2ª edição. Rio de Janeiro: LTC editora, 1981. p. 95-274 BADINTER, E. Um Amor Conquistado: o Mito do Amor materno. Tradução: Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. BARBOSA,P. Z e ROCHA-COITINHO, M. L. Maternidade: Novas Possibilidades, Antigas Visões. Psicologia clínica [online].vol. 19, n.1, p. 163-185. Rio de Janeiro, 2007. BARDIN,L. Análise de Conteúdo. Tradução: Luís Antero reto e Augusto Pinheiro. SL. Edições 70, Lda. Fevereiro de 2000. p. 117-120, 169-184. BARROS, I.P.M. Movimentos do Desejo Materno Antes e Após o Nascimento do Filho: um estudo longitudinal. Tese de Doutorado em Psicologia. Universidade São Paulo, São Paulo, 2010. CERVO, A. L. e BERVIAN, P.A. Metodologia Científica: para uso dos estudantes universitários. 5ª ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1983. p. 63- 77. GRANT, H.W. A Maternidade, o Trabalho e a Mulher An. 3 Col. LEPSI IP/FE-USP. São Paulo, 2002. MANSUR, L.H.B. Sem filhos: a mulher singular no plural. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. MINAYO, M. C. S, DESLANDES, S. F, NETO, O.T, GOMES,R. Pesquisa Social: teoria, Método e criatividade. 20ª ed. São Paulo: Vozes. 2002. OLIVEIRA, P. B. A mulher Atual e a Representação da Maternidade. Mestrado em Psicologia Clínica. Universidade Católica de Pernambuco. Recife, 2007. SOCORRO. T. C ; LIMA, F. P; AZEVEDO, R. L E MATOS, S. M. A Nova Configuração Familiar e Sua Repercussão no Estresse feminino na Contemporaneidade. Instituto Avançado de Ensino Superior de Barreiras – IAESB. Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB. Programa Institucional de Iniciação Cientifica, Barreiras, 2007. 19
  • 20. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011 TOURINHO, J. G. A Mãe Perfeita: Idealização e Realidade - Algumas Reflexões Sobre a Maternidade. UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2006. TRINCA,W. e colaboradores. Diagnóstico psicológico: A Prática Clínica. São Paulo, EPU, 1984. WINNICOTT, D.W. Da Pediatria `a Psicanálise. Tradução: Davy Bogomoletz. Rio de Janeiro: Imago, 2000. p. 163-167, 306-315. WINNICOTT, D.W. Os Bebês e Suas Mães. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. 3ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2006. Contato: betaniafarias@yahoo.com.br e izabella@mackenzie.br 20