1) O documento discute as figuras de linguagem da metáfora e metonímia, explicando seus conceitos e funcionalidade.
2) A metáfora transfere sentidos de um domínio concreto (fonte) para um domínio abstrato (alvo), baseando-se em similaridades entre os itens comparados. Isso permite falar de abstrações de forma mais tangível.
3) Já a metonímia substitui um termo por outro relacionado por contiguidade, inclusão ou implicação, como quando se usa uma parte para
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Leitura e Produção de Textos
A metáfora e a metonímia
Conceitos e funcionalidade das
figuras de linguagem.
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3. Leitura e Produção de Textos
1.4.1 A metáfora
1.4.2 A metonímia
SUMÁRIO
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Referências
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Na prática, faz-se corresponder, como em um mapa em
1.4.1 A METÁFORA
relação ao território que representa, o conhecimento que
se tem do pulmão sobre a função da Floresta Amazônica
na realidade climática do mundo contemporâneo.
Entre os processos que mais amplamente os homens
usam para a expressão de pensamentos em linguagem,
está a metáfora. Na verdade, ela se configura como um
Lakoff e Jonhson (1987/2002) ensinam que o processo
dos mais produtivos processos observáveis nas línguas
de transferência de sentidos na metáfora é feito a partir
humanas.
do mapeamento de entidades com aspectos que se
assemelham entre dois domínios de experiências: um
domínio fonte (ou base) sobre um domínio-alvo.
Metáforas permitem que se fale de abstrações usando
conhecimentos mais concretos advindos de experiências
As correspondências efetuadas estão fundadas na
físicas, psíquicas, sociais e culturais vivenciadas pelos
comparação entre os itens que apresentam aspectos
indivíduos e por suas comunidades.
similares entre os diferentes conhecimentos que se têm
arquivados em domínios de memória.
Elas tornam comunicáveis as realidades mais abstratas,
sobre as quais se pretende falar.
Em
Linguística
Cognitiva,
tais
domínios
de
A palavra metáfora vem do grego metaphora, que
conhecimentos são chamados de Modelos Cognitivos
significa transporte: uma expressão emprega os sentidos
Idealizados (MCI). Um MCI é um artifício teórico usado
vivenciados em experiências mais concretas para significar
para se tratar de arquivos de conhecimentos armazenados
“coisas” mais abstratas. Há um emparelhamento de itens
na memória por áreas temáticas.
que apresentam similaridades: equiparam-se entidades de
Tem-se MCI sobre Saúde, Educação, Transportes,
uma base de experiências mais concretas para significar
Utensílios, enfim, sobre as diferentes experiências que são
outras mais abstratas.
vivenciadas pelos humanos ao longo da vida.
Há uma comparação implícita, ou seja, as partículas
Nesses arquivos, armazenam-se todas as experiências
comparativas (como, tal qual, como tal etc.) não aparecem
vivenciadas e compartilhadas ao longo da vida.
nas expressões metafóricas: sua estrutura fundamental é
[S é P], ou seja, [Sujeito é Predicativo].
Tais arquivos são permanentes, mas parcialmente
estruturados: podem-se adicionar, modificar ou excluir
Em enunciados do tipo “João é um anjo” ou “Ana é uma
conhecimentos dos MCI.
flor”, as características de anjo e flor são transportadas
para os traços físicos e psíquicos das pessoas assim
metaforizadas: as características de anjo e de flor,
Os sentidos agregados aos conhecimentos do domínio
conhecidas pelos usuários da língua, aplicam-se aos que
base são empregados e transferidos nas correspondências
lhe foram equiparados na metáfora.
metafóricas: os itens com aspectos similares são aqueles
comparados nas metáforas.
Quando se diz que “A Amazônia é o pulmão do mundo”
(exemplo de Martins, UEAD), a experiência física de como
Observe-se a representação dos itens que são postos
um pulmão funciona serve para expressar o real papel que
em correspondência no enunciado “A Amazônia é o pulmão
a Região Amazônica exerce na oxigenação do mundo e
do mundo”.
no equilíbrio dos fenômenos climáticos a que a Terra está
sujeita.
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Quadro 1 – Similaridades em correspondência na
que se processam na mente, e, para ele, a própria
metáfora “A Amazônia é o pulmão do mundo”.
linguagem seria uma grande metáfora do pensamento.
Nos MCI, os arquivos são formados por experiências
MCI domínio-fonte
(+ concreto)
MCI domínio-alvo
(+ abstrato)
Experiência mais concreta
sobre os Pulmões
Experiência mais abstrata
(porque desconhecida)
sobre a Amazônia.
Órgão vital do
organismo humano
Floresta e bacia fluvial muito
ricas em biodiversidade
similaridades entre as entidades comparadas na metáfora,
Responde pelas trocas
respiratórias.
Permite as trocas de
gases na atmosfera.
como, por exemplo, a forma como estão organizadas as
partes de um ovo é semelhante à estrutura organizacional
Purifica o sangue.
Purificação da atmosfera.
de uma célula.
Regulariza as trocas venosas
no sangue dos organismos.
Regulariza os ciclos
climáticos.
Produz energia vital.
Produz um ar mais
limpo para o mundo.
que envolvem aspectos físicos, psíquicos, sociais e culturais
vivenciados pelos indivíduos em suas comunidades.
As
correspondências
efetuadas
baseiam-se
em
Daí são atualizadas expressões metafóricas para
explicar a abstração célula a partir do conhecimento que
os homens têm da constituição de um ovo.
Permite que os demais órgãos Produz energia vital para
do organismo funcionem.
que o mundo se sustente.
Quadro 2 – Similaridades entre itens comparáveis na
Iconicamente, se os pulmões fornecem a energia
metáfora “A célula é um ovo”
necessária para que os órgãos que constituem a máquina
Ovo
(como domínio-fonte)
adoece e morre; da mesma forma, se a Amazônia não
prover à Terra as trocas de carbono e oxigênio com a
vitalidade de sua vegetação, a vida na Terra corre o risco
de ser profundamente prejudicada.
Citoplasma (parte meio
líquida, meio viscosa,
que protege o núcleo
Gema (parte central ou
mais interna que contém
as propriedades do ovo)
a vida. Sem os pulmões exercendo seu papel, o homem
Membrana (parte envolvente
e mais externa da célula)
Clara (parte líquida, meio
viscosa, que protege a gema)
renovação do ar do planeta, ar que promove e sustenta
Célula
(como domínio-alvo)
Casca (parte envolvente
e mais externa do ovo)
humana funcionem, a Amazônia produz naturalmente a
Núcleo: parte mais
interna que contém os
genes das células
Assim, na representação do pensamento em linguagem,
mapeia-se o conhecimento concreto do funcionamento
Neste exemplo, tem-se o emprego de uma expressão
dos pulmões sobre o que, teoricamente, é o papel que
metafórica na linguagem científica: para se entender a
a Amazônia exerce na sustentabilidade da vida na Terra.
célula que não se vê a “olho nu”, emprega-se a constituição
de um ovo que é bem conhecido e mais concreto.
Na literatura tradicional sobre a metáfora, a figura é
vista como o “emprego de uma palavra fora de seu sentido
Assim, as correspondências nas metáforas permitem
normal, por efeito de analogia ou comparação” (Garcia
que o receptor da comunicação ative seu conhecimento
2001). Contudo, desde o final do século XX, essa visão
sobre as experiências-fonte empregadas e as use para
vem sendo modificada.
compreender os conceitos mais abstratos que estão sendo
representados.
A metáfora era conceituada como o uso de uma
expressão fora de seu sentido literal. Lakoff (1993), em
No processo metafórico, são ativados saberes que foram
estudo denominado A teoria da metáfora contemporânea,
armazenados na memória: as entidades emparelhadas
afirma que o sentido literal praticamente não existe. As
apresentam características que se assemelham.
construções linguísticas expressam relações metafóricas
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Os conhecimentos que se têm das experiências-fonte
Como a metáfora, a metonímia também é uma figura
servem para ampliar a compreensão dos fatos mais
de pensamento.
abstratos que estão sendo representados na metáfora.
Para Lakoff e Johnson (2002:127), o processo
Ela se processa quando se utiliza uma palavra em
metafórico é essencial para a construção dos sentidos na
lugar de outra para designar algum objeto ou aspecto
linguagem.
que se mantém com o termo escolhido uma relação
de contiguidade, de inclusão, de implicação ou de
interdependência.
Com o recurso ao processo metafórico, pode-se dizer
muito mais do que efetivamente se codificou por meio de
Para se compreender a metonímia, entende-se como
palavras: há conhecimentos, saberes, experiências que
se pode usar, por exemplo, a expressão popular pé-sujo.
vêm concorrer para a construção de sentidos.
Empregada
Eles conotam muito mais que denotam. Há um
para
designar
os
antigos
botecos
conhecimento de mundo que vem concorrer para a riqueza
populares, em pés-sujos, as pessoas tomam cafezinhos
de sentidos que as metáforas expressam:
ou cachacinhas em pé, quase sempre em copos, com
colheres dentro ou com xícaras de louça branca bem
grossa.
Argumentamos que a maior parte do nosso sistema
conceptual
é
metaforicamente
estruturado,
isto
é,
Pés-sujos são especialmente comuns nas esquinas do
que os conceitos , na sua maioria, são parcialmente
centro das grandes cidades.
compreendidos em termos de outros conceitos. Isso
levanta uma questão importante sobre os fundamentos do
São estabelecimentos não muito grandes, com balcões
nosso sistema conceptual.
altos, mesas pequenas encostadas nas paredes.
Afinal, há algum conceito que possamos compreender
diretamente sem recorrermos ao processo metafórico? Se
Nas estufas, encontram-se salgadinhos, ovos coloridos,
não há, como podemos compreender as coisas em geral?
sanduíches de pernil ou carne assada; seus frequentadores
( Lakoff E Johnson, 2002:127)
são, preferencialmente, homens que trabalham por perto,
vestidos para o trabalho e, muitos deles, com roupas
1.4.2 A metonímia
humildes.
Muitos trabalhadores não usavam sapatos, mas
Na teoria contemporânea da metáfora, a metonímia
chinelos, e seus pés mostravam o pó que vinha das ruas:
está hierarquicamente dependente dela.
aí estão os pés-sujos.
Na teoria retórica clássica, metáfora e metonímia estão
Vejamos como podemos representar os atributos
entre as principais figuras de retórica.
(partes) que servem para representar o todo (o botequim):
Já na teoria tradicional, a metonímia é conceituada
Quadro 3 – Atributos que servem nas representações
como a substituição de um nome por outro em virtude de
por deslocamentos metonímicos
haver entre eles algum relacionamento.
Um dos exemplos do processo metonímico é quando se
usa o autor pela obra como em “Ler Jorge Amado” ou em
“Ter um Picasso em casa”.
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3.
Modelo Cognitivo Idealizado (MCI)
de um “Botequim popular”
quando se usa o meio, o motivo ou o instrumento,
a causa pelo efeito, a consequência ou o resultado, como
Estabelecimentos pequenos, com balcões altos, mesas
pequenas de mármore ou com toalhas quadriculadas.
em “Viver de biscate”, por “Viver do produto de trabalhos
esporádicos, biscates”;
Servem-se bebidas como cafezinhos,
cervejas ou cachaças em pé.
4. quando se usa o nome do lugar de origem do
Nas estufas, encontram-se salgadinhos, ovos
coloridos, sanduíches de pernil ou carne assada.
prato, da marca ou do inventor pela coisa produzida ou
São bares frequentados, preferencialmente, por homens
que trabalham por perto ou são frequentadores habituais.
uma Napolitana”;
inventada, tal como em “Ligou para o restaurante e pediu
São frequentados, preferencialmente, por
pessoas humildes, muitos trabalhadores de ruas,
que não usavam sapatos, mas chinelos.
5. quando se usa o nome do inventor ou da marca
em lugar da invenção ou do produto, como em “Comprei
Por usarem chinelos e andarem nas ruas sujas, seus pés
apresentavam-se sujos de poeira: são pessoas de pés sujos.
uma Gillette” em lugar de “Comprei uma lâmina da marca
Gillette”;
Como esses botecos são frequentados, predominantemente,
por pessoas de pés sujos, passaram a ser chamados pela
característica que se sobressai entre seus frequentadores.
6. quando uma característica abstrata de um grupo
* Algo semelhante a chamar o “continente”
pelo “ conteúdo”: o boteco designado por
seus frequentadores, os “pés-sujos”.
de indivíduos é substituta do próprio grupo, como em “A
velhice é sábia” em lugar de “As pessoas mais velhas”,
ou em “A justiça é cega” em lugar de “Os juízes que
Assim, na metonímia, o continente – o botequim
julgam os casos não podem fazer distinções de pessoas”
popular – é designado por um dos seus conteúdos – os
(neste exemplo, vê-se como a metonímia subjaz a
frequentadores de pés-sujos.
uma grande metáfora: a experiência da cegueira – não
fazer distinção de pessoas – focaliza o aspecto de que,
Dessa forma, “Ir a um pé-sujo” é uma expressão
na hora do julgamento – os juízes não são guiados por
idiomática construída a partir do deslocamento de um dos
amizades, prestígios ou histórias pessoais que poderiam
elementos que constituem o conhecimento do todo para
interferir na aplicação da lei; devem se limitar a aplicá-la ,
designar o conjunto.
imparcialmente.
A metonímia é processada a partir da escolha de um
7. em “João é meu braço direito” ou “ Steve
dos elementos que compõem o MCI – os pés sujos – para
Jobs era o cérebro da Apple”, têm-se enunciados em
representar o todo – o boteco popular.
que partes concretas do corpo foram utilizadas para
representar qualidades abstratas atribuídas aos indivíduos
Têm-se metonímias nos deslocamentos que ocorrem
referenciados: há o deslocamento do concreto para
entre entidades que compõem um mesmo MCI, um
representar o abstrato, tal como ocorre nas transferências
elemento substituindo o todo. Assim:
metafóricas.
1. quando se usa o nome do autor pela obra, como
8. em “Marcus não tinha um vintém no bolso”, uma
em “Ler Graciliano Ramos” em vez de “Ler um livro de
parte do capital – um vintém (tipo de moeda antiga) é
Graciliano Ramos” ;
usado para representar o todo ou vice-versa;
2. quando se usa o continente pelo conteúdo, como
9. em “Ele não vale um tostão furado”, exemplo em
em “Tomar um cálice de vinho” por “Tomar o vinho que
que a matéria – tostão furado – é usada para representar
está servido no cálice”;
um produto;
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10. “Tomou umas Brahmas e saiu dirigindo como um
louco”, onde a marca é usada para substituir o tipo de
produto;
11. “O brasileiro é, antes de tudo, um forte”, frase na
qual Euclides da Cunha se refere a todos os brasileiros,
usando o singular para representar o plural, ou seja, todos
os brasileiros.
Referências
CHIAVEGATTO,
Valeria
Coelho.
Gramática:
uma
perspectiva sociocognitiva. In: ______. (Org.) Pistas
e Travessias II: bases para o estudo da gramática, da
cognição e da interação. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2002.
p. 131-212.
FAUCONNIER, Gilles. Mental Spaces: aspects of
meaning construction in natural language. Cambridge:
Cambridge University Press, 1994.
GARCIA, Othon Moacir. Comunicação em prosa
moderna. 18 ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas,
2001.
LAKOFF, G. The contemporary theory of metaphor. In:
ORTONY, Andrew (Org.) Metaphor and Thought. Nova
York: Cambridge University Press, 1993. p. 202-51.
LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Metaphors: We live By.
Chicago: University of Chicago Press, 1987.
______. Metáforas da vida cotidiana. Tradução de
Maria Sofia Zanoto. Campinas: Mercado das Letras; São
Paulo: Educ, 2002.
MARTINS, Eliane. Leitura e produção de Texto I: LET
101. Rio de Janeiro: Universidade
Gama Filho, UEAD. Disponível em: <http://www.
gamavirtual.ugf.br>, p. 22-4.
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