Como estimular o empreendedorismo e a criação de emprego em Portugal
1.
Morte aos empresários !
Sabemos que o desemprego em Portugal e em grande parte da UE está neste momento a atingir e nalguns
casos a ultrapassar, máximos históricos. Sendo certo que na situação actual, parte deste fenómeno se deve à
chamada crise do Euro, é também certo que o flagelo do desemprego já existia antes da dita crise e que a
mesma só veio agravar uma situação pré-existente.
A questão do desemprego parece portanto ser bastante mais profunda do que à primeira vista poderíamos ser
levados a crer e a pergunta lógica é, onde podemos ir buscar dados que nos possam ajudar a compreender as
causas do fenómeno ‘desemprego’, bem como encontrar indícios que nos permitam identificar qual o melhor
modo de combater este tipo de problemas, quase crónicos na UE, sobretudo nos países do Sul.
Neste âmbito o gráfico que apresentamos é extremamente interessante, produzido com dados do GEM
(Global Entrepeneurship Monitor), um relatório anual que surge da colaboração entre a London Business
School (Londres) e o Babson College (Boston), que hoje analisa mais de 60 países anualmente, classificando-os
em relação ao empreendedorismo, que como sabemos é um dos motores principais da criação de postos de
trabalho, pela criação de novas empresas.
O gráfico mostra em abcissas
o GDP ‘per capita’ crescente
dos países e em ordenadas a
% de pessoas entre os 18 e
os 64 anos, envolvidos no
empreendedorismo, i.e. na
criação de novas empresas.
Como podemos observar
pela curva de tendência do
gráfico, a % de
empreendedores aumenta
progressivamente quando o
GDP/capita cai para valores
inferiores a 28K, aumentando
também progressivamente
para valores de GDP
superiores a
aproximadamente 40K.
Podemos também constatar
que a % de empreendedores
é mais baixa – na vizinhança
dos 5% - entre os valores de GDP de 28 e 40K, onde se encontram a maioria dos países da UE e da Europa.
Segundo o relatório, podemos considerar com base nos dados do GEM, que neste universo existem dois tipos
distintos de empreendedorismo:
a) Empreendedorismo 'por necessidade' - Este comportamento é característico dos países com GDPs mais
baixos, nos quais a melhor maneira de ter e de assegurar um emprego é fundar a sua própria empresa ou
negócio. A principal motivação dos empreendedores nestes países ‘mais pobres’, é a subsistência, a estabilidade
do emprego e o facto de terem com o seu próprio negócio maior liberdade e possibilidade de melhorarem o
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seu nível de vida, além da média do seu país. Nestes países, um controle do fisco local, potencialmente menos
apertado ou com regras menos estritas, pode aínda servir de incentivo extra, para a criação da sua própria
empresa. No Brasil por exemplo, os lucros de uma empresa estão sujeitos ao correspondente IRC, após o que
podem ser divididos pelos sócios sem que estes valores se encontrem sujeitos a uma 2ª tributação em sede de
IRS pessoal dos sócios, ao contrário do que acontece em Portugal. Este facto por si só, é um considerável
incentivo à criação de empresas e dos correspondents postos de trabalho, o que aliás ajuda a explicar o
excelente lugar do Brasil no referido gráfico, país no qual cerca de 18% da população no escalão etário
referido, se encontra envolvido em empreendedorismo e na criação de novas empresas. Evidentemente que
este efeito é contrário em Portugal, com a legislação actual, onde a mesma percentagem se situa abaixo dos
5%.
b) O Segundo tipo de chama-se empreendedorismo 'por oportunidade'. Neste género de empreendedorismo
predominante nos países com GDP´s mais elevados, o objectivo dos empreendedores é aproveitar as
consideráveis oportunidades que o mercado lhes proporciona, para melhorar a sua posição financeira e social.
Como tal, a principal motivação é ficarem 'milionários' no campo puramente material, ou em alternativa
ambicionar a ‘mudar o mundo’, no campo da gratificação pessoal.
Sabe-se também através deste relatório do GEM, que nos países de GDP alto, em cada 10 pessoas
empreendedoras, 9 empreende por oportunidade e uma por necessidade, enquanto que nos países de renda
média, em cada 4 pessoas, 3 empreendem por oportunidade e 1 por necessidade. Em Portugal, para cada 2
pessoas empreendendo por oportunidade, uma empreende por necessidade .
Dados adicionais de 2007 dizem aínda que cerca de 40% dos empreendedores portugueses desistem dos seus
negócios pela falta de resultados, o que era uma % de quase o dobro da media dos restantes países da UE.
Vemos aínda a posição neste gráfico que Portugal ocupava em 2007, com uma taxa de actividade
empreendedora na ordem dos 8,8% (a laranja) e a sua movimentação (seta laranja) no gráfico até atingir a sua
posição 3 anos depois, em 2010 (PT a preto), claramente abaixo dos 5%. Em relação a 2007, caiu para cerca de
metade a % de pessoas entre os 18 e os 64 anos que se encontram envolvidas em empreendedorismo e na
criação de novas empresas. Esta realidade só se explica com a tomada de um número considerável de medidas
que não favorecem, antes penalizam o empreendedorismo, comprometendo assim a criação de novas empresas
e de novos postos de trabalho.
Explica-se aqui e através do estudo do GEM, pelo menos em parte, a actual situação de estagnação na criação
de emprego na Europa em geral e em Portugal em particular e também o porquê da constante preocupação
dos EUA em facilitar a criação de novas empresas, como motor da criação de postos de trabalho e da
economia do país.
A diferença esmagadora na % de empreendedores entre os países europeus em geral (Portugal em particular) e
os restantes países, sobretudo os que têm GDP per capita inferiores, como por exemplo o Brasil (BR) do lado
esquerdo superior do gráfico, faz-nos pensar no porquê da localização da maioria dos países importantes da UE
na zona do gráfico onde existe uma menor % de empreendedores e consequentemente uma menor quantidade
de novas empresas. Outras perguntas pertinentes ou até impertinentes que se podem fazer com base nas
conclusões deste relatório são por exemplo: será que este posicionamento é alimentado pelas tradicionais
políticas de proteção social europeias ? Será que essas políticas incentivam o empreendedorismo? Será que o
empreendedorismo é alimentado pelas políticas fiscais europeias, que aliás se destinam em grande parte a
sustentar as politicas sociais? Como se pode estimular o empreendedorismo na Europa em geral e em Portugal
em particular? Será que a legislação fiscal e não só relativa às empresas, deveria ser ajustada para maximizar o
empreendedorismo e estimular a criação de novos postos de trabalho? Será por exemplo correcto que haja em
Portugal dupla tributação relativamente aos resultados das empresas? Será que empresas que apresentam
3.
resultados negativos devem ser penalizadas pelo fisco, como acontece em Portugal, quando se sabe que as
empresas novas apresentam quase sempre resultados negativos nos primeiros anos de vida? Parece-nos
francamente que o contexto legal e fiscal actual no nosso país ‘grita’ alto e bom som: Morte aos Empresários !
Parece-nos também que esta percepção do mercado não pode ser debelada com uma quantas medidas avulso,
mas sim com uma acção abrangente, compreensiva e concertada em diversos campos, estimulando desde o
empreendedorismo, à inovação, à criação de emprego de modo a que possa ter o impacto que todos
desejamos como motor da recuperação e desenvolvimento do País.
Por outro lado temos de ter a noção como país, que a inovação não é exclusiva propriedade das empresas de
tecnologia de topo, nem deve ser esse o único destino dos fundos estatais de desenvolvimento ou o único foco
das capitais de risco ou dos Business Angels que se disponibilizam para financiar projetos inovadores. Antes
pelo contrário. Há muitas empresas de ramos de negócio tradicionais que se assim decidirem e se se
reposicionarem convenientemente, podem ser inovadoras e disruptivas nos seus mercados e eventualmente
nos mercados internacionais, ao ponto de mudarem o ‘status quo’ da sua indústria ou serviço.
Se tal não for considerado, o impacto de uma eventual retoma da economia na zona Euro, na criação de
emprego e na recuperação do País num futuro próximo, afigura-se-nos extremamente duvidoso.
Para criar emprego numa situação eventual de retoma da economia na zona Euro, a mesma teria de ser
acompanhada por um lado, pela tomada de medidas radicais pelo Governo, que tornassem simultâneamente
muito mais apelativo e fácil o empreendedorismo, idealmente removendo os obstáculos, incluindo os
legislativos e fiscais, que possam demover ou suscitar dúvidas a eventuais empreendedores de investir nos seus
projetos e por outro promover um movimento nacional abrangente e inclusivo de inovação disruptiva, de
modo a que o país pudesse ampliar os seus esforços a um maior número de empresas e capitalizar nos seus
esforços de inovação, competitividade e consequente geração de postos de trabalho. Ou seja, não chega que se
apoie uma pequena percentagem de empresas inovadoras para que tal mude a economia do país. Para mudar o
país necessitamos de uma acção concertada inclusiva e não exclusiva até porque a maioria das empresas
portuguesas se encontram em sectores considerados tradicionais.
Se o ambiente se mantiver agressivo para os empreendedores como acontece actualmente, ou somente com
alguns ‘paleativos’ pouco convincentes, os potenciais investidores ou empreendedores não arriscarão, pois não
terão a confiança necessária para arriscar, mesmo que haja fundos disponíveis para o investimento. É aliás o que
se passou nos últimos anos, com grande parte dos fundos do Estado disponíveis a não serem empregues no
desenvolvimento de novos projectos empresariais. Os resultados estão à vista.
Só com uma acção abrangente, conjunta, concertada e nacional, com objectivos muito claros, poderemos
aspirar a começar a resolver os desafios do País nesta matéria e contribuir decisivamente para um futuro
melhor, criação de mais emprego e aumento consistente das nossas exportações, caso contrário a retoma será
sempre débil, lenta e muito abaixo do que o País necessita. Esperemos que haja tanta coragem política para
tomar essas medidas, quanto nos últimos tempos houve para adoptar e aplicar
o programa da Troika.
Jorge Possollo, Fevereiro de 2013.