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O Cotidiano Peculiar
                          Uma comunicação sobre o livro Os Bandidos
                                                             Por Taísa Ágatha C. da Silveira


       O livro de Aramis Ribeiro Costa Os Bandidos, é um conjunto de contos urbanos,
que nos leva a alguns pontos da cidade de Salvador. Através de uma descrição abrangente e
rica em detalhes, Aramis permite que o leitor reconstrua cada cenário, cada passo, e cada
movimento dos seus personagens.
A narrativa é sempre fluida, e, através de uma linguagem clara, o autor busca explorar as
diversas faces do cotidiano, explicitando as emoções humanas exacerbadas, como no conto
Inácio, que mostra a vida pacata e até mesmo desinteressante de um funcionário, que após
ser humilhado em público pelo chefe, passa a entrar em profunda crise e resolve se demitir.
Após a curta discussão que Inácio trava com o seu chefe, é tomado de uma raiva intensa :
“sentia-se aniquilado, impotente, cheio de ódio”(p.28). A partir deste momento, ele não
consegue pensar em mais nada : “na fila do ônibus, no longo trajeto até o largo do
papagaio, onde morava, Inácio apenas remoeu de forma insuportável a sua indignação a sua
vergonha, a sua cólera contra aquele homem estúpido” (p.29). Nas linhas seguintes somos
levados a acompanhar cada momento de agonia de Inácio, que não consegue fazer mais
nada depois do incidente com seu chefe: Inácio sentou-se diante do televisor, como sempre
fazia, e ali ficou quieto, mudo,olhando sem ver, escutando sem ouvir(...) todo ele
encolhido, o pensamento repetindo-se e repetindo-se, torturante e obsessivo, na cena da
humilhação”(p.30).
       O leitor mantêm-se na expectativa, esperando o desfecho daquela situação. É aí
então que o autor consegue com maestria prender o leitor, pois a reviravolta é quase sempre
o inesperado, mesmo quando o desfecho nos parece óbvio, que no caso de Inácio é a
entrega da sua carta de demissão.
       Através de seus doze contos, Aramis nos convida a questionar qual o lugar de cada
um na sociedade moderna e o que cada um de nós representa: um médico pode ser um
cliente, e um acompanhante de paciente um objeto sexual? O conto A mulher de Negro traz
à tona a vida de uma mulher do meretrício, e seu breve encontro com um estudante de
medicina do quinto ano, que ao atender uma criança levada por ela entra em contato com
sua realidade sofrida e sente-se mal ao utilizar seus serviços sexuais “ Não sei o que disse
eu, apenas me senti sórdido, como tudo ali (...)”(p.16).
Muitas vezes é através dos olhos do personagem que vemos o mundo construído pelo autor
e somos levados a observá-lo sob a lente de quem está na história. No conto Ofélia, por
exemplo, Aramis faz um jogo interessante entre a imagem refletida no espelho da
personagem principal, e sua relação obsessiva com a vizinha - que dá nome ao conto. A
observação é utilizada como forma de espelho que reflete quem observa, expondo suas
miséria intimas, seus medos: “Naquele momento, não me atrevi a olhar-me no espelho,
sabia que a imagem que ele me devolveria, no seu frio reflexo de prata seria assustadora”
(p.41).
          No conto Ofélia, somos levados a conviver no plano do pensamento da personagem
que narra a história, e nos vemos tragados pela sua idéia fixa sobre sua vizinha, num
binômio sentimental estranho, que vai do ódio à inveja “ O pensamento de Ofélia no
entanto, não se desgrudou de mim, como um vírus que toma o corpo e perturba os sentidos
(...) Ofélia, porém, tornara-se uma obsessão, que eu perseguia não apenas naqueles breves
momentos de fim de tarde, quando a observava da minha janela, mas de cada minuto da
minha vida.”(p.38). Aramis consegue fazer com que também sintamos repulsa por Ofélia,
compartilhando com a personagem principal suas angústias e sua imaginação acerca de
uma mulher com a qual ela sequer fala, sequer conhece, apenas observa às tardes sempre no
mesmo horário.
          O livro Os Bandidos explora as relações humanas e suas formas de comunicação
por vezes inexistente e/ou débeis, como no conto As últimas férias do Tio Edson. Tio Edson
morre de forma quase inexplicável, apenas sendo percebido além de suas anedotas e fala
divertida, pela sobrinha, que reflete “Mas quem era, na verdade o Tio Edson? O que sentia,
o que pensava, o que queria da vida? São as perguntas que inutilmente me faço.” Como a
velocidade da vida moderna é imensa muitas vezes não temos a possibilidade de falar e
ouvir verdadeiramente uns aos outros, como o Tio Edson, que aparentava levar a vida como
uma grande brincadeira e convencia a todos de tal. Mas pode causar conseqüências
trágicas, e é o que vemos no conto As últimas férias do Tio Edson.
Os Bandidos é um livro um tanto sombrio, pois em parte de seus contos, retrata a
obsessão humana, suas perversões e instintos sensações que perpassam por inúmeros contos
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          O prazer da leitura do livro Os Bandidos não está somente no fato de sentirmos que
o lugar descrito nos contos nos é familiar, mas pela naturalidade como as coisas acontecem.
São realmente situações cotidianas, que poderiam acontecer no prosseguir da vida urbana
contemporânea que é tão corrida e cheia de urgências. O autor nos faz parar e observar os
detalhes que estão nas entrelinhas do comum, e extrai dali situações que se desenrolam de
forma tal ao ponde de algumas vezes tornarem-se surpreendentes. A melancolia da solidão
das cidades grandes, o amor perdido sem maiores explicações, o ódio e a obsessão de
indivíduos que levam sua vida sem grandes sobressaltos, dá ao livro uma atmosfera
diferenciada, e traz à tona o que o cotidiano das grandes cidades muitas vezes suprime do
indivíduo: sua relação com sua própria subjetividade.
          Porém, muitas vezes essa subjetividade, que nos diferencia da multidão, faz com
que a realidade seja distorcida, como é o caso de Ofélia. Lembranças, tristeza e melancolia
por situações que não se resolveram, e mantiveram-se suspensas no ar, são retratadas com
muita sensibilidade, mas nem sempre são resolvidas, como no conto A imagem do espelho,
que termina sem sabermos onde está Rosa, personagem que o narrador-personagem busca
por anos e anos sem êxito: “Não eu não queria mais nada. Renunciaria, inclusive, de muito
bom brado, aos inúteis anos que me restam, apenas para saber o que houve com Rosa”
(p.83).
          Os Bandidos mantêm um bom fluxo da narrativa, apesar de nos últimos contos
perder um pouco do gancho proporcionado pelo suspense para a próxima cena, que Aramis
consegue manter nos contos anteriores, mas, que não prejudica em nada a fluidez do livro,
que termina com um conto forte, Os Bandidos, sem o final feliz clássico, nos dando a
sensação de proximidade com o real.

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  • 1. O Cotidiano Peculiar Uma comunicação sobre o livro Os Bandidos Por Taísa Ágatha C. da Silveira O livro de Aramis Ribeiro Costa Os Bandidos, é um conjunto de contos urbanos, que nos leva a alguns pontos da cidade de Salvador. Através de uma descrição abrangente e rica em detalhes, Aramis permite que o leitor reconstrua cada cenário, cada passo, e cada movimento dos seus personagens. A narrativa é sempre fluida, e, através de uma linguagem clara, o autor busca explorar as diversas faces do cotidiano, explicitando as emoções humanas exacerbadas, como no conto Inácio, que mostra a vida pacata e até mesmo desinteressante de um funcionário, que após ser humilhado em público pelo chefe, passa a entrar em profunda crise e resolve se demitir. Após a curta discussão que Inácio trava com o seu chefe, é tomado de uma raiva intensa : “sentia-se aniquilado, impotente, cheio de ódio”(p.28). A partir deste momento, ele não consegue pensar em mais nada : “na fila do ônibus, no longo trajeto até o largo do papagaio, onde morava, Inácio apenas remoeu de forma insuportável a sua indignação a sua vergonha, a sua cólera contra aquele homem estúpido” (p.29). Nas linhas seguintes somos levados a acompanhar cada momento de agonia de Inácio, que não consegue fazer mais nada depois do incidente com seu chefe: Inácio sentou-se diante do televisor, como sempre fazia, e ali ficou quieto, mudo,olhando sem ver, escutando sem ouvir(...) todo ele encolhido, o pensamento repetindo-se e repetindo-se, torturante e obsessivo, na cena da humilhação”(p.30). O leitor mantêm-se na expectativa, esperando o desfecho daquela situação. É aí então que o autor consegue com maestria prender o leitor, pois a reviravolta é quase sempre o inesperado, mesmo quando o desfecho nos parece óbvio, que no caso de Inácio é a entrega da sua carta de demissão. Através de seus doze contos, Aramis nos convida a questionar qual o lugar de cada um na sociedade moderna e o que cada um de nós representa: um médico pode ser um cliente, e um acompanhante de paciente um objeto sexual? O conto A mulher de Negro traz à tona a vida de uma mulher do meretrício, e seu breve encontro com um estudante de medicina do quinto ano, que ao atender uma criança levada por ela entra em contato com
  • 2. sua realidade sofrida e sente-se mal ao utilizar seus serviços sexuais “ Não sei o que disse eu, apenas me senti sórdido, como tudo ali (...)”(p.16). Muitas vezes é através dos olhos do personagem que vemos o mundo construído pelo autor e somos levados a observá-lo sob a lente de quem está na história. No conto Ofélia, por exemplo, Aramis faz um jogo interessante entre a imagem refletida no espelho da personagem principal, e sua relação obsessiva com a vizinha - que dá nome ao conto. A observação é utilizada como forma de espelho que reflete quem observa, expondo suas miséria intimas, seus medos: “Naquele momento, não me atrevi a olhar-me no espelho, sabia que a imagem que ele me devolveria, no seu frio reflexo de prata seria assustadora” (p.41). No conto Ofélia, somos levados a conviver no plano do pensamento da personagem que narra a história, e nos vemos tragados pela sua idéia fixa sobre sua vizinha, num binômio sentimental estranho, que vai do ódio à inveja “ O pensamento de Ofélia no entanto, não se desgrudou de mim, como um vírus que toma o corpo e perturba os sentidos (...) Ofélia, porém, tornara-se uma obsessão, que eu perseguia não apenas naqueles breves momentos de fim de tarde, quando a observava da minha janela, mas de cada minuto da minha vida.”(p.38). Aramis consegue fazer com que também sintamos repulsa por Ofélia, compartilhando com a personagem principal suas angústias e sua imaginação acerca de uma mulher com a qual ela sequer fala, sequer conhece, apenas observa às tardes sempre no mesmo horário. O livro Os Bandidos explora as relações humanas e suas formas de comunicação por vezes inexistente e/ou débeis, como no conto As últimas férias do Tio Edson. Tio Edson morre de forma quase inexplicável, apenas sendo percebido além de suas anedotas e fala divertida, pela sobrinha, que reflete “Mas quem era, na verdade o Tio Edson? O que sentia, o que pensava, o que queria da vida? São as perguntas que inutilmente me faço.” Como a velocidade da vida moderna é imensa muitas vezes não temos a possibilidade de falar e ouvir verdadeiramente uns aos outros, como o Tio Edson, que aparentava levar a vida como uma grande brincadeira e convencia a todos de tal. Mas pode causar conseqüências trágicas, e é o que vemos no conto As últimas férias do Tio Edson.
  • 3. Os Bandidos é um livro um tanto sombrio, pois em parte de seus contos, retrata a obsessão humana, suas perversões e instintos sensações que perpassam por inúmeros contos e personagens. O prazer da leitura do livro Os Bandidos não está somente no fato de sentirmos que o lugar descrito nos contos nos é familiar, mas pela naturalidade como as coisas acontecem. São realmente situações cotidianas, que poderiam acontecer no prosseguir da vida urbana contemporânea que é tão corrida e cheia de urgências. O autor nos faz parar e observar os detalhes que estão nas entrelinhas do comum, e extrai dali situações que se desenrolam de forma tal ao ponde de algumas vezes tornarem-se surpreendentes. A melancolia da solidão das cidades grandes, o amor perdido sem maiores explicações, o ódio e a obsessão de indivíduos que levam sua vida sem grandes sobressaltos, dá ao livro uma atmosfera diferenciada, e traz à tona o que o cotidiano das grandes cidades muitas vezes suprime do indivíduo: sua relação com sua própria subjetividade. Porém, muitas vezes essa subjetividade, que nos diferencia da multidão, faz com que a realidade seja distorcida, como é o caso de Ofélia. Lembranças, tristeza e melancolia por situações que não se resolveram, e mantiveram-se suspensas no ar, são retratadas com muita sensibilidade, mas nem sempre são resolvidas, como no conto A imagem do espelho, que termina sem sabermos onde está Rosa, personagem que o narrador-personagem busca por anos e anos sem êxito: “Não eu não queria mais nada. Renunciaria, inclusive, de muito bom brado, aos inúteis anos que me restam, apenas para saber o que houve com Rosa” (p.83). Os Bandidos mantêm um bom fluxo da narrativa, apesar de nos últimos contos perder um pouco do gancho proporcionado pelo suspense para a próxima cena, que Aramis consegue manter nos contos anteriores, mas, que não prejudica em nada a fluidez do livro, que termina com um conto forte, Os Bandidos, sem o final feliz clássico, nos dando a sensação de proximidade com o real.