1) A República no Brasil começou em 1889 após um golpe de estado que instalou um governo autoritário que protegia os interesses das elites em vez do povo.
2) Ao longo da história da República, os governos alternaram entre períodos democráticos e ditadurais, e os interesses privados frequentemente prevaleceram sobre o interesse público.
3) Atualmente, a democracia brasileira enfrenta desafios como a corrupção e o financiamento privado das campanhas eleitor
SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
Da coisa pública à privada: a história da República no Brasil
1. 1
REPÚBLICA NO BRASIL – DA COISA PÚBLICA À COISA PRIVADA
Fernando Alcoforado*
República é uma forma de organização do Estado cujo termo vem do latim res
publica que significa "coisa pública", "coisa do povo". Em tese, um governo
republicano é aquele que põe ênfase no interesse comum, no interesse da comunidade,
em oposição aos interesses particulares e aos negócios privados. Na história da
República no Brasil desde 1889, quando de sua proclamação através de um golpe de
estado, esses princípios não têm sido respeitados. A História da República Brasileira
iniciou-se em 1889 com a Proclamação da República e acompanhou todo o período
posterior, até o século XXI.
A difusão dos ideais republicanos remonta ao período colonial, como durante a
Inconfidência Mineira e a Conjuração Baiana, no final do século XVIII. Apesar dos
ideais e das revoltas buscarem a superação da monarquia, apenas no final do século
XIX, com o fim do escravismo, as elites agrárias do país aceitaram organizar o Estado
brasileiro nos moldes republicanos. O fato de a República ter nascido no Brasil sem a
efetiva participação popular, ter sido aceita pelas elites e ter sido realizada através da
espada do exército brasileiro conformou um caráter autoritário e excludente do Estado
brasileiro, garantindo os privilégios das classes dominantes e a negação de direitos à
maioria do povo brasileiro. A participação do exército na vida política nacional foi
também uma constante da história republicana do país até o final da ditadura militar em
1985.
A República Velha, ou Primeira República, é o primeiro estágio da história republicana
no Brasil, compreendida entre a Proclamação da República em 1889 e a Revolução de
1930. A elite rural paulista e mineira passaram a deter o poder do governo federal que
garantiu os interesses da oligarquia agrária. Foi nesse período que o país conheceu uma
série de revoltas urbanas e rurais decorrente das mudanças sociais e políticas pelas quais
passaram o país. É de se destacar entre as revoltas a Guerra de Canudos, de 1896-1897.
A Revolução de 1930 deu início à Era Vargas com a ascensão ao poder de Getúlio
Vargas que lá permaneceu até 1945. Durante seu Governo Provisório (1930-1934), o
novo presidente conseguiu contornar os conflitos entre as elites nacionais,
principalmente com a vitória sobre a oligarquia paulista durante a Revolução
Constitucionalista de 1932.
A promulgação da Constituição em 1934 e a abertura de um processo democrático
selaram o acordo entre as várias frações da classe dominante nacional que não puderam
conter a insatisfação dos setores populares. É nesse sentido que se pode entender a
tentativa de derrubar o governo de Vargas, através do que ficou conhecido como
Intentona Comunista de 1935. A Intentona Comunista serviu de pretexto para Vargas
dar um golpe de Estado em 1937 inaugurando o denominado Estado Novo que marcou
mais um período de extremo autoritarismo do Estado Brasileiro. Uma nova Constituição
foi adotada e o Congresso Nacional foi fechado. Como forma de conter a insatisfação
popular e conseguir aumentar o poder de consumo do mercado interno, Vargas
promulgou uma série de leis que garantia alguns direitos à classe trabalhadora urbana,
além de proporcionar um nível de renda que impulsionasse o esforço de
industrialização.
2. 2
A industrialização somada a medidas de racionalização da administração pública
caracterizou o esforço de modernizar o Estado brasileiro durante a Era Vargas,
garantindo as condições de fortalecimento tanto da burguesia industrial quanto da
tecnocracia das empresas estatais e da administração pública. Ao fim da Segunda
Guerra Mundial, em 1945, Vargas sofreu um golpe de estado pelas Forças Armadas
comandadas pelo general Eurico Gaspar Dutra pressionadas por forças políticas internas
e pelo governo norte-americano contrários a suas políticas nacionalistas e populistas.
Uma nova Constituição foi adotada em 1946, garantindo a realização de eleições diretas
para presidente da República e para os governos dos estados. O Congresso Nacional
voltou a funcionar e houve alternância no poder. Entretanto, foi um período de forte
instabilidade política.
As mudanças sociais decorrentes da urbanização e da industrialização projetavam novas
forças políticas que pretendiam aprofundar o processo de modernização da sociedade e
do Estado brasileiro, o que desagrava as elites conservadoras. Este período foi marcado
por várias tentativas de golpe de Estado, sendo que um deles levou ao suicídio de
Getúlio Vargas, em 1954. A partir de 1955, o governo de JK conseguiu imprimir um
acelerado desenvolvimento industrial no País mas ampliou o problema da exclusão
social na cidade e no campo. Medidas de mudança social e de emancipação nacional
iriam compor a base das propostas do Governo de João Goulart. O estado brasileiro
estava caminhando para resolver demandas há muito reprimidas, como a reforma
agrária.
Frente ao perigo que representava aos seus interesses econômicos e políticos, as classes
dominantes do País com o apoio do governo dos Estados Unidos mais uma vez
orquestraram um golpe de Estado, com a deposição pelo exército de João Goulart, em
1964. Iniciada em 01 de abril de 1964, a Ditadura Militar foi um dos períodos mais
repressivos da História da República. Inúmeros grupos políticos foram cassados, e
muitos de seus membros torturados e mortos. O que caracterizou este período foi a
sistematização da repressão estatal aliada ao incentivo ao desenvolvimento econômico.
A estrutura estatal repressiva, de impedimento do exercício da oposição política através
de instituições policiais, garantiu a estabilidade social necessária aos investimentos
estrangeiros durante a ditadura militar. Foi o período do milagre econômico brasileiro e
da tentativa de transformação do país em uma potência mundial.
A ditadura existiu até 1985 quando as pressões populares por abertura política tomaram
as ruas do país, principalmente na campanha das Diretas Já. Mesmo com milhares de
pessoas nas ruas, a reforma do Estado foi feita de forma “lenta e gradual”, como
queriam os militares. No lado da classe trabalhadora, surgiu um vigoroso movimento
sindical na década de 1970, principalmente depois das greves no ABC paulista, entre
1978 e 1980. A Nova República iniciou-se com o governo de José Sarney e permanece
até os dias atuais. Sarney foi eleito através do voto indireto e durante seu governo foi
elaborada uma nova Constituição, promulgada em 1988, que garantia eleições diretas e
livres a todos os cargos eletivos. A divisão dos poderes foi mantida e uma nova
perspectiva democrática liberal se abriu no País. O primeiro presidente eleito
diretamente desde 1960 foi Fernando Collor de Melo, em 1989. Porém, os escândalos
de corrupção o fizeram renunciar em 1992.
A partir da renúncia de Fernando Collor, marcaram a história política da República os
mandatos de três governantes. O primeiro foi Itamar Franco que com o Plano Real pôde
garantir a estabilidade econômica necessária aos investimentos estrangeiros. Esses
3. 3
investimentos foram possíveis em decorrência das privatizações realizadas em setores
específicos da economia, como telecomunicações, mineração e siderurgia. Por outro
lado, tais medidas representaram o enxugamento das funções do Estado brasileiro,
marcando o período do neoliberalismo no Brasil. Fernando Henrique Cardoso governou
de 1994 até 2002, quando foi substituído por Luiz Inácio Lula da Silva que buscou
caracterizar seu governo pela distribuição de renda possibilitada pela estabilidade
econômica do período anterior. A distribuição de renda ocorreu através de políticas
como Bolsa Família. Apesar da estabilidade política dos dois governos acima
mencionados, os casos de corrupção também se fizeram presentes, como as acusações
de compra de votos para a reeleição durante o governo FHC, em 1998, o escândalo do
mensalão, no governo Lula, em 2005 e o escândalo do petrolão no governo Dilma
Rousseff que se elegeu em 2010 e sofreu impeachment em 2016.
Durante o período republicano, os interesses particulares e os negócios privados têm
prevalecido sobre o interesse comum ao longo da história do Brasil. O sistema
republicano vigente no Brasil é, na verdade, uma democracia apenas para os ricos e
corruptos. Neste sistema, as eleições são uma farsa porque são controladas pelas
oligarquias que fazem com que vençam majoritariamente os candidatos a serviço das
grandes empresas. Trata-se de um jogo de cartas marcadas porque os grupos
econômicos nacionais e internacionais impulsionaram os grandes partidos financiando
suas eleições milionárias. Empresas e bancos sempre elegeram suas “bancadas” nos
diversos níveis do poder legislativo que aprovam leis em favor dos poderosos na base
da compra de votos e dos “lobbies”, e ainda faturam contratos milionários do Estado. O
assalto aos cofres públicos por parte de políticos e partidos e o aparelhamento da
máquina governamental a serviço dos partidos no poder se tornaram lugares comuns na
vida política brasileira.
A falência do modelo político do Brasil está configurada no fato do presidencialismo
em vigor desde 1889 ser gerador de crises políticas e institucionais como as que já
ocorreram no passado que resultaram em impeachments e golpes de estado. Além disso,
o sistema político do País está contaminado pela corrupção. A democracia
representativa no Brasil manifesta, também, sinais claros de esgotamento ao
desestimular a participação popular nas decisões do governo, reduzindo a atividade
política a meros processos eleitorais que se repetem periodicamente em que o povo
elege seus representantes os quais, com poucas exceções, após as eleições passam a
defender interesses de grupos econômicos em contraposição aos interesses daqueles que
os elegeram. No Brasil, não há motivos para comemorar os 127 anos de República.
*Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor
universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo,
1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do
desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento
(Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos
Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the
Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e
combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011),
Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012),
4. 4
Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV,
Curitiba, 2015) e As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo
(Editora CRV, Curitiba, 2016). Possui blog na Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail:
falcoforado@uol.com.br.