O documento discute o fracasso do modelo econômico neoliberal no Brasil e sua incapacidade de superar a atual crise. Defende que o país adote o modelo de Estado de Bem-Estar Social dos países escandinavos, que combina elementos do capitalismo e socialismo e teve maior sucesso em promover desenvolvimento econômico e social. Aponta que este modelo baseia-se em investimentos estatais em serviços públicos universais que geram mais produtividade e qualidade de vida.
SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
O modelo de desenvolvimento requerido para o brasil superar a crise atual
1. 1
O MODELO DE DESENVOLVIMENTO REQUERIDO PARA O BRASIL
SUPERAR A CRISE ATUAL
Fernando Alcoforado*
A crise econômica que afeta todos os países do mundo na atualidade demonstra a
inviabilidade do modelo econômico neoliberal que foi implantado com base na
ofensiva das forças conservadoras do Reino Unido e dos Estados Unidos sob a liderança
da Primeira- Ministra britânica Margaret Thatcher e do Presidente dos Estados Unidos
Ronald Reagan na década de 1990 cuja doutrina econômica contempla a absoluta
liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal sobre a economia, só
devendo esta ocorrer em setores imprescindíveis e ainda assim num grau mínimo. No
Brasil os governos Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff assumiram o
poder com a adoção do receituário neoliberal.
O fracasso do capitalismo neoliberal se materializou com a crise mundial de 2008 que
eclodiu nos Estados Unidos no setor dos empréstimos hipotecários que, imediatamente,
se propagou para outras partes do sistema financeiro mundial, com uma rapidez e uma
amplitude que surpreenderam o mercado. O modelo econômico neoliberal faliu no
Brasil porque depois de provocar uma verdadeira devastação na economia brasileira de
1990 a 2015 configurada no crescimento econômico pífio, no descontrole da inflação,
nos gargalos existentes na infraestrutura econômica e social, na desindustrialização da
economia brasileira, na explosão da dívida pública interna e externa e na
desnacionalização da economia brasileira, não apresenta perspectivas de superação
desses problemas haja vista que o governo Dilma Rousseff decidiu adotar uma política
recessiva que está se traduzindo na estagnação da economia, no aumento da dívida
pública, no desequilíbrio das contas externas, na falência de empresas e também no
desemprego em massa.
Em artigo publicado no jornal britânico The Guardian em 16/04/2009, sob o título
Pressupostos teóricos da "economia mista", Eric Hobsbawn afirma que conhecemos
duas tentativas práticas de realizar ambos os sistemas, socialista e neoliberal, em sua
forma pura: por um lado, as economias de planificação estatal, centralizadas, de tipo
soviético; por outro, a economia capitalista de livre mercado isenta de qualquer restrição
e controle. As primeiras vieram abaixo na década de 1980, e com elas os sistemas
políticos comunistas europeus; a segunda está se decompondo diante de nossos olhos na
maior crise do capitalismo global ocorrida em 2008. Hobsbawm disse que não
conhecemos a duração da atual crise que eclodiu nos Estados Unidos, mas sem dúvida
ela vai marcar o final do tipo de capitalismo de livre mercado iniciado com Margareth
Thatcher e Ronald Reagan.
Hobsbawn afirma ainda que tanto o capitalismo de mercado, puro e desestatizado, uma
espécie de anarquismo burguês, quanto o socialismo planificado e descontaminado da
busca por lucros estão ambos quebrados. Hobsbawn é de opinião que o futuro pertence
às economias mistas nas quais o público e o privado estejam mutuamente vinculados de
uma ou outra maneira. Isto significa dizer que a Social Democracia com o Estado de
Bem-Estar social, que incorpora elementos tanto do socialismo como do capitalismo, o
mais bem sucedido sistema já implantado no mundo, especialmente nos países
escandinavos, poderá prevalecer no futuro após o “tsunami” neoliberal que avassala o
planeta em que vivemos. Cabe observar que o Estado de Bem-Estar Social é um tipo de
2. 2
organização política e econômica que coloca o Estado como agente da promoção
(protetor e defensor) social e organizador da economia. Nesta orientação, o Estado
assume o papel de agente regulamentador de toda vida social, política e econômica do
país em parceria com sindicatos de trabalhadores e empresas privadas. Cabe ao Estado
do Bem-Estar Social garantir serviços públicos e proteção à população.
O Estado de Bem-Estar Social se desenvolveu principalmente na Europa sendo
implementado com maior intensidade nos países escandinavos (ou Países Nórdicos) tais
como Suécia, Dinamarca, Noruega e Finlândia. Por isso mesmo, estes países possuem
os mais altos IDHs (Índices de Desenvolvimento Humano) do mundo. Esta forma
de organização político-social se originou da Grande Depressão de 1929.
Pelos princípios do Estado de Bem-Estar social, todo o indivíduo teria o direito, desde
seu nascimento até sua morte, a um conjunto de bens e serviços que deveriam ter seu
fornecimento garantido seja diretamente através do Estado ou indiretamente, mediante
seu poder de regulamentação sobre a sociedade civil. Esses direitos incluiriam a
educação em todos os níveis, a assistência médica gratuita, o auxílio ao desempregado,
a garantia de uma renda mínima, recursos adicionais para a criação dos filhos, etc.
A Escandinávia é o berço do modelo econômico e social mais igualitário que o
capitalismo já conheceu. Sua origem remonta à Suécia da década de 1930, quando se
concretizou a hegemonia social democrata no governo do país nórdico, dando início a
uma série de reformas sociais e econômicas que inauguraria um novo tipo de
capitalismo, em oposição ao liberalismo das décadas anteriores cujo ato final foi a
grande depressão de 1929. Nascia assim o chamado modelo escandinavo, que
rapidamente ultrapassaria as fronteiras suecas para se tornar influente no norte europeu,
mas também uma referência importante na formulação de políticas econômicas
heterodoxas em todo o planeta. O sucesso deste modelo se deveu à combinação de um
amplo Estado de Bem-Estar Social com rígidos mecanismos de regulação das forças de
mercado, capaz de colocar a economia em uma trajetória dinâmica, ao mesmo tempo
em que alcançava os melhores indicadores de bem-estar social nos países capitalistas.
Da mesma maneira que os mercados de trabalho e a mais ampla organização da
produção poderiam ser racionalizadas mediante a utilização de regulamentações sociais
para se obter um nível mais alto de produtividade, também a esfera social deveria ser
racionalizada através do uso de políticas sociais, como políticas familiares, sempre em
benefício de maior eficiência nacional. Esta noção de racionalização foi incorporada no
conceito de Política Social Produtiva. Em 1932 o sociólogo e economista sueco Gunnar
Myrdal, grande formulador do modelo escandinavo de Estado de Bem-Estar social,
escreveu que as modernas políticas sociais diferiam totalmente das antigas políticas de
auxílio à pobreza uma vez que deveriam ser consideradas como investimentos e não
custos. As políticas sociais modernas seriam eficientes e produtivas devido à sua ação
preventiva, direcionada para evitar o surgimento de problemas nos organismos político-
sociais.
Nesse sentido as novas políticas sugeridas por Myrdal contrastam fortemente com a
política de remediar a pobreza adotada pelos governos petistas de Lula e Dilma
Rousseff no Brasil com o programa de transferência de renda Bolsa Família que
demonstra ser insuficiente para cobrir as necessidades da população de mais baixa renda
de maneira a evitar a perpetuação dos bolsões de pobreza e, ao mesmo tempo, gerar
novas riquezas, no conceito originalmente proposto por Gunnar Myrdal, não somente
3. 3
em termos de quantidade, mas também de qualidade. Myrdal argumentava que as
políticas sociais não eram meramente uma questão de redistribuição de renda, mas eram
uma questão vital para o próprio desenvolvimento econômico e tinham como objetivo
principal o aumento do PIB. Estes conceitos de Myrdal sustentaram a defesa do Estado
de Bem-Estar Social que se expandiu, contra o desejo dos liberais e fundamentalistas de
livre mercado, que viam as políticas sociais como custos e não como investimentos.
Analisando o investimento em políticas sociais em 2007 como percentagem do PIB,
constata-se que os países que mais investem em políticas sociais (>30% do PIB
inclusive em educação) têm os maiores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH)
acima de 96%. Isto é, o país que mais investiu em políticas sociais é o melhor colocado
no IDH. Dos 9 países com investimento em políticas sociais acima de 30% do PIB (pela
ordem, Dinamarca, Suécia, França, Alemanha, Bélgica, Suiça, Áustria, Finlandia e
Noruega) 4 deles são países escandinavos. Dos 16 países com IDH superior a 0,96 (pela
ordem, Noruega, Austrália, Islândia, Canadá, Irlanda, Paises Baixos, Suécia, França,
Suiça, Japão, Luxemburgo, Finlândia, Estados Unidos, Áustria, Espanha e Dinamarca)
5 deles são países escandinavos.
Portanto, considerando o fracasso do modelo neoliberal no Brasil e no mundo, urge a
adoção no País do Estado de Bem-Estar Social nos moldes dos países escandinavos que
tem apresentado excelentes resultados econômicos e sociais. Foi a social democracia
construída até hoje, sobretudo nos países escandinavos, o único modelo de sociedade
que permitiu avanços econômicos, sociais e políticos simultâneos com o Estado atuando
como mediador dos conflitos entre os interesses do capital e da Sociedade Civil. Este
deveria ser o modelo econômico a ser adotado no Brasil para retirar o país da
estagnação econômica e da devastação social em que se encontra. A grave situação
vivida pelo Brasil no momento está a exigir não apenas a substituição dos atuais
detentores do poder, mas, sobretudo o fim do malfadado modelo neoliberal em vigor
com a implantação do Estado de Bem-Estar Social nos moldes escandinavos.
* Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor
universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo,
1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do
desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel,
São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era
Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG,
Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora,
Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global
(Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do
Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no Brasil-
Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).