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SÍTIO CONCEIÇÃOZINHA EM GUARUJÁ


                                                        Carlos Eduardo Vicente




     A ATIVIDADE ECONÕMICA E SUBSISTÊNCIA



         A atividade econômica da comunidade esteve desde seu início,
como em todas as comunidades caiçaras, , fortemente vinculada à
pesca e coleta em mangues e zonas costeiras, porém com algumas
características            que   introduzem     um    diferencial:    a     produção      e
escoamento de bananas, o transporte de areia retirada do leito do
rio,      e   o     artesanato    (este   último     também      presente      em    outras
comunidades)1.             Com    o   intuito   de   aprofundar      um     pouco     mais
questões relativas à pesca e coleta e também da subsistência, é
interessante          uma    diferenciação      entre    esses    itens    e    as   outras
atividades, também importantes, porém com um vinculo menor.
Convém            então,    um   pequeno    sub-item      tratando    da       produção   e
escoamento de bananas, do transporte de areia e do artesanato.




         Atividades econômicas secundárias


         A primeira atividade a ultrapassar a questão da subsistência
foi a produção e escoamento de bananas, que, do início do século
XX até a década de setenta era feito em barcaças pelas “gamboas”
(braços de mar) do Sítio Conceiçãozinha “... foram invadindo,
foram entrando pelas águas, por que por aqui, trilha não tinha,
não tinha acesso, por que isso aqui era tudo mato, entendeu? Tinha

1
    Idem nota 23.

                                                                                          1
o canal, né?, depois a draga veio acabou de dragar esse canal
aqui, a gente tinha o canal, ali tinha um poço, onde entrava o
chatão2 de bananas pra pegar as bananas daí, já pegava daí, já
encostava no navio, né?, já desembarcava no navio, né?, pra levar
lá pra fora”.3
       Além do transporte de bananas nos “chatões”, durante algum
tempo      também         foi    utilizado       um     trem.      “...    o    trenzinho,        nós
chamávamos de Maria fumaça, outros chamava trole, era nessa
avenida, ainda o bananal, o trenzinho navegava só no bananal, o
trenzinho não vinha pra cá, pra cá era tudo mato [...] era aí, quem
vai do hospital Ana Costa até chegar mais ou menos onde é a
cutrale, ali era banana só [...] Tinha o trilho, tinha a linha, e o
trenzinho passava direto, os troles4, às vezes, passava remando
com aquelas varar em cima da linha, era pra cacho de banana, pra
trazer pra linha pra poder embarcar...”
       O    a   produção         e   escoamento          de    bananas         movimentou         um
pequeno comércio que, juntamente com a venda de pescados,
formou a base da pequena economia da comunidade (os bairros em
torno, também tiveram uma ligação com o comércio de bananas,
haja vista que havia poucas fontes de renda na área na primeira
metade do século XX, e os próprios limites entre bairros eram
muito        confusos,          impossibilitando               saber        quem         de      fato
comercializava algo seria deste ou de outro bairro)5.
       O nome como era conhecido esse veiculo sobre trilhos que
transportava bananas varia de acordo com o depoimento, porém é
indiscutível a existência de um veiculo que utilizasse a via férrea
para o transporte de bananas
       “Olha, tinha ali no, ali onde ta o hospital Ana Costa, ali era
um ponto mesmo do bondinho, né? Então era o Seu Adriano, tinha
vacarias, tinha tudo, né? Então o ponto era ali, aí também, pra cá,

2
   Chata ou chatão; barcaça de fundo largo, utilizada em transporte de mercadorias em rios de baixo
calado, e em áreas portuárias; chatões, plural de chata.
3
  Idem nota 12.
4
  Pequeno carro descoberto, montado nos trilhos das estradas de ferro e movido pelos operários por meio
de varas, como jangadas sobre trilhos.
5
  Idem nota 38.

                                                                                                     2
da casa dele pra cá, o seu Adriano, era tudo negócio do sítio dele,
sabe? Banana, essas coisas. O negócio mais, era banana, sabe?”6
         O comércio e transporte de bananas vieram declinando até
aproximadamente o inicio da década de setenta, quando foram
feitas as últimas viagens.
         “Pegava o Bonde e ia lá pro mercado, o bonde ia, então o
trenzinho, pra nós não sei se servia pra muita coisa, por exemplo,
meu pai vendia cana, banana, pro “Galhardo”, do lado de lá,
‘Galhardo’ era um local que meu pai vendia lá, vendia tudo,
levava um chatão grande, enchia um chatão levava pra vender lá,
abacaxi, mandioca, aqui dava muita mandioca por que a terra era
areia, né? Então não quebrava a mandioca, então era vendido lá,
agora, às vezes usava, agora eu não sei se pra gente aqui do sítio
tinha muita utilidade, porque a ligação nossa era mais pertinho,
daqui com o lado de lá. Essas gamboas aqui que você ta vendo, era
por essas gamboas que passava o chatão de banana que os
escravos carregavam, essa gamboa aqui chamava Gamboa do Juca,
o vô dele (aponta o Ranufinho), o Juca Pato, o Pato Tonto é que
era responsável pelo casarão, todos os casarões que existiam
daqui do Sítio Conceiçãozinha até lá no Morrinhos era o vô dele
que era responsável, então o pessoal chamava a Gamboa do Juca,
do Pato Tonto, passava aqui, levava as bananas pro píer do
Macuco, pra Bacia do Macuco, dali, os navios carregavam pra
Europa, banana, levava pra Europa, depois da década de setenta,
isso é, até a década de sessenta ainda saía banana daqui, em 69
ainda passava o chatão das bananas aqui, me lembro, porque meu
pai morreu em 66, eu to me lembrando das coisas, porque meu pai
morreu em 66, e minha mãe depois foi viver com um espanhol, e eu
me lembro, ele veio buscar um caminhão de bananas aqui, em 69,
então aqui, em 69 ainda passavam os chatões de banana que iam lá
pra Bacia do Macuco, pra ser embarcado pra Europa, a banana já
vinha embalada e tudo7.”

6
    Idem nota 1.
7
    Idem nota 27.

                                                                  3
É percebido também o transporte em pequena escala de outros
cultivos oriundos de uma pequena agricultura, porém, o produto
agrícola mais citado e provavelmente de real impacto econômico na
comunidade, foi à banana.
       “Em Santos. Naquele tempo eu tava com oito anos, oito pra
nove anos, aí meu pai morreu de pneumonia, porque meu pai era
estivador, aí ele tava doente, depois ele ficou melhorzinho, aí ele
foi trabalhar, mas não tava bem, muito bom, né? Aí ele foi
trabalhar, pegou uma chuva de repente, no chatão de areia, aí ele
já veio com aquela dor, aquela dor, dor foi essa que levou ele pro
buraco, meu pai morreu com 41 anos”8.
       “Aí começou a acabar com o cultivo da banana na década de
70, quando caiu o consumo da banana, o cara que tinha o sítio teve
uma      idéia      fantástica,    ele   começou       a    transportar     areia   de
construção de Santos pra construção civil que começou a se
desenvolver, hoje nem areia mais tem ...”9
       Após o ocaso do transporte de bananas, outra atividade surgiu.
Embalado na utilização dos “chatões” de bananas, e no inicio do
boom imobiliário principalmente na orla da praia em Santos, alguns
moradores reaproveitaram as embarcações no transporte de areia,
que era retirada dos leitos e laterais dos rios. Esse transporte de
areia terminaria com a diminuição das atividades na área da
construção civil, que se dá no final da década de oitenta.10
       A partir da década de 30 uma outra atividade vem implementar
o setor econômico da comunidade: o artesanato.
       O artesanato, ou a produção própria manual de artefatos que
eram utilizados no dia-dia, passa a ser também uma fonte de renda.
Diversos moradores para implementar seus proventos aliaram à
renda ganha com sua pesca e cultivo, as vendas de cestos para
transporte de camarão, (retangulares, com cerca de dois palmos de
largura       por    três   de    comprimento      e       um   palmo   e   meio    de

8
  Idem nota 1.
9
  Idem nota 27.
10
   Idem nota 38.

                                                                                     4
profundidade); balaios redondos e mais fundos (com mais ou menos
três palmos de profundidade também para transporte de camarão e
outros peixes); chapeis caipira, peneiras (para feijão, café, milho),
cestos redondos e rasos (para frutas), abajures, armadilhas para a
pesca como o Covo, (uma espécie de cesto por onde peixe entra e
na saída não consegue sair, pois tem uma pequena porta que abre
somente pra entrar), e o Jequi, (uma espécie de labirinto onde os
peixes entram e se prendem e não conseguem sair), que ficavam
amarrados nas beiras das Gamboas.11
       Todos esses utensílios eram feitos tendo como matéria prima
os cipós embira e guapé, e lascas de bambu para serem trançados e
amarrados com os cipós.12
       Até a década de setenta as famílias que produziam esses
utensílios, vendiam ou trocavam com embarcações que costeavam a
comunidade por bens de utilidade. Porém, no inicio da década de
70,    isso      relatado       por     moradores,          estiveram         na    comunidade
representantes          da indústria de barcos pesqueiros “Taio”, para
aprender        a    confecção          dos      cestos.       Ao      que      parece,       esses
representantes, num total de cinco, se hospedaram na casa de um
dos melhores cesteiros da comunidade por uma semana aprendendo
a técnica. Aproximadamente em 1974 começaram a aparecer cestos
de uma espécie de plástico (segundo moradores, parecia náilon
trançado). Esses cestos começam a ser vendidos em larga escala nos
estabelecimentos comerciais por um preço muito barato.13
       Os cesteiros tinham um trabalho completamente artesanal, e
por vezes demoravam horas para concluir um utensílio, logo, os
baixos preços com que eram vendidos os cestos, chapeis e balaios
sintéticos, começaram a inviabilizar a produção para venda por
parte dos cesteiros que foram mudando de atividade, até que hoje,
há somente um cesteiro, que é descendente do melhor cesteiro da


11
   Ibidem.
12
   Para conseguir um tamanho uniforme nos cipós, costumava-se furar latas com diferentes tamanhos, daí
então os cipós eram passados nos diversos furos, do maior para o menor, dando assim a espessura
desejada.
13
  Idem nota 38.

                                                                                                    5
época (o que ensinou os funcionários da Taio), e que hoje produz
apenas por lazer.14




       Da pesca e coleta


       Os depoimentos de moradores ligados à pesca (em sua maioria
moradores mais antigos) atestam para a quantidade e facilidade que
tinham outrora na obtenção de pesca e crustáceos no mar, mangue
ou mesmo nas gamboas em volta.
       “Olha eu e a minha senhora, a gente ia para o portinho ali,
levava dois, três pulsa15, uma garrafa de café e sentava em um
barranco na sombra, jogava a varinha e tinha corvina, carapéba,
tinha siri, caranguejo, esse ainda tem, mas já não é mais como era
[...] aqui dá pescada, robalo, parati, tainha, espada, peixe-galo,
paru, até sardinha, a legitima, a maromba, que chamam, nós
pegávamos um pouco, pegava os cardumes na barra, hoje não entra
mais por causa da poluição, de certo, sei lá [...] aqui já foi
matado baleia, tudo isso aqui na Conceiçãozinha, né, a baleia
chegava a entrar até aqui [...] de vez em quando “se arruma” uma
pra cá, então arpoava, agora hoje não tem mais nada disso, até os
botos, que tinha muito, era cardume de boto, sabe o que é boto?
Tinha cardume de boto, hoje você não vê mais um boto, hoje você
vai ver um boto aonde, lá pro lado da Bertioga, quando calha de
ver, virar cambalhota, né?”16
       “...peixinhos: Carapicus, manjubinhas, savelha, robalinhos,
carapebinhas, além de sirizinhos [...] Corvina, pescada, linguado,
robalo, cação, [...] vem enguia, vem siri, vem caracol, às vezes
vem golfinho [...] a anchova, pescadinha, o bagre, [...] Maria
14
   Ainda existe outro cesteiro, mais antigo e que era exímio artesão, porém este se encontra com parte de
suas faculdades mentais desequilibradas, o que o impossibilita de voltar a produzir seu artesanato.
15
   Espécie de rede para a pesca principalmente de siri, é formada por um circulo que pode ser de metal ou
um tipo de quadrado, no qual é trançado com uma linha bem forte, uma malha. Ele leva também quatro
linhas presas em suas extremidades. Esse instrumento é jogado no rio com algum tipo de isca dentro. Se
fica observando, quando o/os siris entram, recolhe-se o pulsa rapidamente com o que tiver dentro. Retira-
se o que foi pescado, e joga-se novamente o pulsa para nova pesca.
16
   Idem nota 4.

                                                                                                       6
Luiza que a              gente conhece aqui como as misturinhas, o que é
jogado de misturinha! Misturinha é tudo quanto é peixe que vem
[...] A sororoca é um peixe que dá no meio de junho, né? A tainha
tinha muita tainha aqui no estuário, ta? Tinha o bagre cabeçudo,
tinha muito, as guaivíras, tinha muito também, robalo que eu já
falei e a garoupa vinha desovar pra cá também, perna-de-moça,
espada, também tinha aqui o charéu, também o parú, tinha muito
parú também, o salgo, tinha [...] De tudo, tainha, robalo, bagre o
espada [...] De vez em quando a gente acerta, pega uma corvina,
uma pescada, uma espada, uns bagres magrinhos [...]o marisco
aqui mesmo se pegava, o marisco no mangue, se já não encontra
mais marisco, só encontra aquele marisco ‘unha de velho’, muito
pouco também, e quando se encontra, o marisco ta com um gosto
ruim,        com       gosto    de       óleo,    provavelmente      com     poluição,     né?
Caranguejo             também,       o    goiamum,       o   goiamum    era    um   tipo    de
caranguejo azul e tinha muito goiamum aqui, esses goiamum se
pegava com uma facilidade, aqui no quintal se pegava, no quintal
de casa, na época dele, que ele é um caranguejo do seco, né? E
esse goiamum desapareceu tem hoje uma quantidade muito pouca
de goiamum aqui dentro que a gente preserva, não deixa nem os
outros pegar, a gente fica – ‘ó, não pega o goiamum, deixa criar,
que é o que resta de beleza pra nós ainda é os goiamuns, tinha
muito goiamum aqui dentro’.17
          Até aproximadamente o final da década de setenta, a pesca e a
coleta eram em abundância e se pescava os variados peixes e
crustáceos denominados. Com o aumento da população da própria
comunidade e da região como um todo (gerando tanto um aumento
da concorrência, como da demanda) a produção pesqueira começou
a escassear (aqui se referindo a produção da comunidade). Isso,
aliado ao crescimento industrial, e por conseguinte dos dejetos
lançados no estuário, começou a tornar a vida dos pescadores e
coletores cada vez mais difícil. Os pescadores acabaram se fixando,
não        por       escolha,   e        sim     pela   diminuição     das    variedades     e
17
     Idem nota 27.

                                                                                             7
quantidades de peixe, na pesca da tainha e do camarão, e na coleta
de caranguejos, e siris.
         “Quando a Edméia vem com a idéia da agrovila, iniciam os
projetos. Pois ela nota alguns problemas: pesca predatória, mau
aproveitamento que os caiçaras faziam de seu material de pesca, e
as próprias condições dessa prática, tanto que éramos definidos
como pescadores artesanais, nós pescávamos com material feito
pelas nossas próprias mãos, armadilhas, redes. Por exemplo, a
pesca do tribombó18, era uma coisa fantástica, o pescador saía em
uma canoa, com um varão nas laterais, inclinado, uma rede
esticada, daí, uma pessoa saía pela margem batendo um tambor, os
peixes que estavam na margem se deslocavam em direção ao mar
aonde        a   canoa      ia    passando,       nessa    canoa   tinha    também    uma
lamparina na proa e outra na popa. Quando os peixes iam passar
por baixo da canoa eles se assustavam com as lâmpadas e tentavam
saltar por cima da canoa, nisso eles batiam na rede e caíam dentro
da embarcação. Esta era uma das pescas que a Edméia chegou a
ver, e que dava pra gente subsistir. Aí, eles (Projeto Rondon),
começaram            a    ensinar         diversas      técnicas   pra     gente,   menos
predatórias. Outro exemplo, a questão da tarrafa, a Edméia achava
um absurdo você lançar a tarrafa no mar e trazer camarão, pois
desse        jeito    você       trazia    mais       varias   espécies    de   peixinhos:
Carapicus, manjubinhas, savelha, robalinhos, carapebinhas, além
de sirizinhos. Mas depois das instruções começamos a aproveitar
esses restos de peixes como engodo pra pesca do camarão. Agora,
mesmo assim ela achava um absurdo, mas fazer o que? A gente
tinha que viver daquilo, né?”19
         Interessante é a auto-critica feita. O reconhecimento de que
uma parte da degradação da pesca foi, ou é, responsabilidade dos
próprios pescadores artesanais.
         “Hoje já reduziu, né? Se tu for por na caneta hoje, eu duvido
que durante esse ano já teve gente que pegou salgo aí dentro,

18
     Onomatopéia indicando o som emitido na margem.
19
     Idem nota 27.

                                                                                         8
salgo de dente que a gente chamava, o parú, não se encontra, a
sororoca nem pra remédio se pega ela aqui no canal, ela não entra
[...] então a sororoca não se encontra mais, o golfinho já não se
vê mais aí, o bagre, só se pega bagrezinho pequenininho, ta? Que é
os bagre mais resistente a poluição, o robalo, se pegava de dez
quilos aí. Não pega mais não, se pega um robalinho ali, o outro
aqui, e outro uma hora ou outra. Então, desses peixes que eu falei
pra ti, pode por aí que só existe hoje praticamente 10% deles [...]
o siri, a gente pescava por noite cinqüenta quilos de siri, pra fazer
no domingo, no campo, era cinqüenta quilos de siri. Nós saíamos
com gancho, não era com isca não, de gancho! Cada um pegava
uma lata de vinte e cinco litro, trazia cheinha!”20
       “Em 1974 a pesca do mar já era farta, mas nós estamos
falando de pesca no rio, pesca artesanal, que é com o caniço 21, a
isca, a rede o espinhel22. Quando o porto e a Cosipa se instalam
começa a escassez, os manguezais começam a ser invadidos pela
população, aí começa a sumir o caranguejo, o siri. Ainda existe a
pesca de maré, mas teve um desenvolvimento da pesca armadora,
da pesca de mar, sardinha e camarão em abundância. Eu me
lembro que o emprego na área de pesca cresceu bastante, com o
crescimento e atividade forte das indústrias de 1974 para cá,
começa a poluição, em 1977 vem à deficiência da pesca [...] a
pesca ficou escassa e a gente teve que sair pro mar também, e

20
   Ibidem.
21
    Vara flexível, atualmente de material sintético, que durante muito tempo foi de um bambu,
medianamente fino, e verde, portanto flexivel
22
   Segundo a antropóloga Gioconda MUSSOLINI, em Ensaios de Antropologia Indígena e Caiçara. São
Paulo: Paz e Terra, 1980, o espinhel é “forma de pescaria que se encontra desde o Amazonas até o
extremo sul do Brasil e que, de origem portuguesa, se conservou perfeitamente idêntico ao modelo
original, inclusive na designação de suas partes, nada mais é que um aparelho feito de cordas fortes, em
forma de H, sendo que da haste horizontal do centro pende uma porção de anzóis, que variam de
tamanho e número segundo a natureza do peixe a que se destinam. O espinhel é mantido fundeado por
meio de bóias na parte superior das duas hastes verticais e de poitas (pedra ou outro peso, [chumbo, por
exemplo] que serve de peso para manter redes, embarcações ou o próprio espinhel no fundo) na inferior.
Vai-se lançando o aparelho n’água, anzol por anzol, de dentro de uma canoa. Deixa-se, então, o
aparelho poitado e de vez em quando vai-se visita-lo, e fazer a despesca, isto é a coleta do peixe. Dois
homens bastam par ao manejo: enquanto um rema, o outro deita ou recolhe o aparelho”. De fato, a
definição dada pela antropóloga corresponde quase que na integra ao tipo de pesca por espinhel praticado
pelos pescadores da Conceiçãozinha, entretanto uma particularidade foi encontrada quando da pesquisa
de campo. O espinhel utilizado pelos pescadores, não tem, necessariamente o formato de H sendo
geralmente apenas uma corda grossa com os anzóis presos a ela.

                                                                                                      9
acaba         gastando   mais,   com   rede,   óleo,    extintor,   salva-vidas
(colete), ou seja, uma estrutura que antes não precisava, tem que
ter uma série de coisas que os pescadores não conseguem, e tem a
concorrência, tem a pratica do arrasto, a gente tentou fazer isso
com nossos barcos, e vai uma porta de cada lado, a rede aberta e
um saco, e vai levantando a lama e o camarão vai entrando pra
dentro da sacola, essa é uma pesca de costeira.”23
          “Dava para tirar cem quilos mais ou menos, agora não dá
mais, peixe fugiu tudo da água [...] a poluição, o peixe vai andar
na poluição? [...] lixo, água poluída, químicas, por isso o peixe
fugiu, água com lixo já atrapalha, água com química já atrapalha
mais ainda, e mata os peixes, cega os peixes, o peixe não vai ficar
onde a água ta podre. É que nem nós, a gente vai beber essa água
podre aí, é beber e morrer. Nós quer água limpa, nós não quer
água suja, água suja, nós corre dela, e o peixe é a mesma coisa,
pegou o peixe lá do alto mar, jogou ele aqui, ele ta morto, jogar
aí, ta morto, não fica dez minutos o coitado nadando aí, pode
trazer uma caixa aí de peixe especial, pode jogar o peixe aí, vai
dar uma hora ele bóia, morre, envenenado na própria água. É as
duas firmas aí, a Cargill e a Dow Química, que ta lascando a
gente, fora às outras de Cubatão que vem pelo rio, o veneno
também vem lá de cima, essas refinarias que jogam água suja na
nossa água limpa, e nossa água limpa vira podridão, que nós vai
comer? Pedra? Entendeu, nem caranguejo deu pra viver aí, que os
mangues tão tudo poluído também [...]                  Tu vem de madrugada,
pega uma embarcação, e fica ali, com a maré vazia, no píer da
Dow Química, tu vê quando eles estão lavando os ‘barcão’, a
podridão que cai dos barcos, que cai da tubulação, a tainha cega,
por quê? Poluição, nunca vi peixe cegar, cansamos de pegar tainha
cega, cega, os dois olhos brancos, os olhos do bichinho, do animal,
e peixe não é gente, é um inocente, um fruto de Deus, e eles
jogando química dentro da água, polietileno, esse bagulho que vira
vaselina, uns quadrados lá na água, trinta, quarenta centímetros
23
     Idem nota 27.

                                                                             10
quadrados de um produto perigoso, na água, brabo, sei lá, eu levo
qualquer um lá e mostro os pedaços, de vez em quando engata um
na rede, na rede, na tarrafa, Dow Química são cem anos de água
suja dentro da água, que nem isso aqui, nessa água, sem vida.”24
       O reconhecimento da quantidade de problemas oriundos da
poluição química é também latente em todos os depoimentos. Isso
se torna visível com a quantidade de criticas feitas às empresas
vizinhas à comunidade, como a Cargill, Cutrale e Dow Química,
por praticamente todos os moradores.
       Outro agravante na prática da pesca artesanal dos moradores é
o    crescente          numero         de     barcos        pesqueiros           dos      chamados
“armadores.”25
       “O peixe não entra mais por motivo também dessas parelhas 26,
essas parelhas, elas arrastam aí fora e acabam com tudo [...] não
deixa eles entrar, o peixe, que nem a tainha também, quando a
gente que é pescador pequeno, quando a gente vai atrás da tainha,
têm dez, doze barcos traineiras27 aí atrás, aí na Barra [...] é
grande, porque a rede da traineira é o seguinte, é uma rede só,
entendeu? Uma rede só, e ela sai assim arrastando, né? Um barco
de lá, outro de cá, com uma rede só [...] que nem picaré28, que nem
24
   Oswaldo Tomáz, conhecido como “gaúcho”, morador da comunidade a cerca de 25 anos, já pesca na
região à quase quarenta anos.
25
   Grandes empresas pesqueiras, muitas vezes japonesas ou de outros paises que possuem frotas de, por
vezes, dezenas de embarcações.
26
   Pares de barcos utilizados no arrastão, forma de pesca onde se emparelham dois barcos de médio porte,
tendo aproximadamente entre 15 e 20 metros, com cinco a sete pescadores em cada, e aparelhados
geralmente com os chamados guindastes (para levantar a rede), depósitos com gelo seco (para armazenar
o produto da pescaria) e sonares, (para localizar os cardumes). As redes, que variam de 150, 200, até 350
metros são presas nos guindastes e as embarcações passam de duas a quatro horas navegando em volta do
cardume até que acionam os guindastes e içam o produto daquelas horas, retiram o que julgam
aproveitável, jogam de volta no mar o que não seria rentável, e recomeçam a operação, assim ficando, por
vezes, durante dias até encher os depósitos das embarcações.
27
   Nome utilizado na região para designar os barcos de médio porte que são empregados principalmente
na pesca da tainha. Tecnicamente a traineira é uma espécie de barco que utiliza grandes redes, e é
empregado principalmente na pesca da sardinha. Neste caso á uma adaptação do nome para a realidade
regional (haja vista que, atualmente não há grande incidência de sardinhas na região).
28
   Forma de pescaria que, necessariamente, não utiliza barco. Normalmente tem-se uma rede de cerca de
30, 40 metros de comprimento por dois ou três de largura. Em cada uma das duas extremidades se prende
um grande bambu, ou uma vara de madeira não muito pesada. Dois homens vão segurando ela na beira da
praia com aproximadamente meio metro de água, e dois homens seguram a outra extremidade em uma
profundidade maior. Pelo motivo lógico de que esse tipo de pesca somente é viável em praias com um
declive extremamente suave, da areia para a água, por vezes, é necessário, no lugar de dois homens na
parte profunda da praia, a utilização de uma pequena embarcação, e se prende um lastro para manter a
extremidade que fica mais afastada da terra no fundo. Essa pesca também é utilizada em rios que não

                                                                                                      11
arrastão29 [...] deve ter uns cem, duzentos, até trezentos metros,
mais ou menos [...] eles vão arrastando, de quatro em quatro horas
eles viram [...] aí tira de novo a sacada, e larga de novo pra água,
e assim vai, e o “pau vai comendo”. Então os peixes que iam
entrar, os peixes que vão pra barra, eles catam tudo [...] eles vem
pra “Barra” pra comer, né? A tainha mesmo, ela vem de noite pra
praia, de madrugada ela vem comer na areia, ela vem pra terra,
então eles não deixam, entendeu? Eles mesmos cercam e acabam
com tudo, eles montam a rede grande, que eles tem a rede grande,
entendeu? Os próprios armadores grandes, porque os pequenos,
quando vão lá, já não têm mais nada, eles acabaram com tudo [...]
eles vêm e cercam a gente pra gente não poder pegar, porque além
deles buscar lá fora, eles vêm tirar o emprego da gente, trabalhar
aqui em terra, em cima da terra, na praia, e a gente fica sem,
entendeu? Aí fica com problema de rede, entendeu? Aí começa, e o
peixe não encosta, o peixe não encosta de jeito nenhum, porque os
próprios barcos grandes acabam com tudo ...”
       Além      da    competição         desigual,       devido       à   tecnologia        e   ao
tamanho dessas embarcações, que, portanto, fazem um tipo de pesca
mais predatória, os pescadores atentam para o desperdício que
essas embarcações fazem.
       “jogam o peixe aí fora, porque se der cem quilos de peixe
graúdo, vai trezentos quilos fora [...] porque, é o seguinte, o peixe
miúdo, eles mandam jogar tudo fora, entendeu? É trezentos quilos
fora, então é tudo peixe que morre, vem tudo na rede, já vem
morto, e vai tudo pra água, manda jogar tudo fora [...] o peixe
miúdo é corvina, cascotinha, esses peixes aí que eles vendem aqui,
entendeu? Que a gente pesca aqui mesmo, entendeu? Que a gente
pega aí, entendeu, as corvinas, cascotinha, eles jagam tudo fora,
se der cem quilos de peixe graúdo, eles jogam trezentos fora de pá
[...] o graúdo é a corvina graúda, entendeu? É a pescada graúda,
entendeu? É o peixe-espada que não joga fora, entendeu? Peixe
tenham grande quantidade de cascalho no fundo, e que possua margens razoavelmente próximas.
29
   As denominações de arrastão, ou picaré, no linguajar do pescador caiçara querem significar o mesmo
tipo de pesca.

                                                                                                  12
Maria-luiza, perna-de-moça, esses peixes que é tudo jogado fora
de pá, pra água [...] tem peixe que eles jogam fora lá que é
quinhentos, seiscentos gramas, e eles jogam tudo fora [...] se é a
gente, a gente pega aí o peixe miúdo pra vender, entendeu? Eles
acabam com tudo, porque a corvina não cria desse jeito mata os
filhotes todos, aí não criam, eles matam os filhotes todinhos eles
só querem os peixes graúdos, os peixes miúdos eles jogam tudo
fora.”30
          Um     certo   reconhecimento   da   legislação   ambiental,    e    da
necessidade de preservar o pouco que restou dos mangues e da
pesca também está presente na mentalidade do pescador artesanal
da Conceiçãozinha.
          É, só pra pegar o grande, mas não, eles pegam o miúdo, que é
a criação, pega a criação e pegam os grandes. Só que a criação, as
cascotinhas, espadas, perna-de-moça, esses peixes aí, eu trabalhei
em um barco e tem vários pescadores aí que não mentem, podem
fazer uma entrevista que no caso aí sabe, e joga tudo fora, pá e
mais pá pra fora, se der cem quilos de peixe por barco, de corvina
grande, o resto de miúdo vai tudo fora de pá, então mata toda a
criação, acaba com tudo, entendeu? Vai acabando, é por isso que
ta em falta de peixe, entendeu? Vai se acabando, porque os peixes
vão se criando e os próprios pescadores vão matando e vão
jogando fora, um bicho que sobrevive é a gaivota, que come os
peixes que ficam boiando, e a gente passa apuro aí rapaz! E os
armadores é que ganham dinheiro com isso, porque eles têm o
barco pra ir lá fora buscar e nós não temos, todo mundo com uns
barquinhos           pequenos,   então   tem   que   trabalhar   na   costa,   a
Capitânia já exige que a gente não trabalhe na costa porque o
barco é pequeno. A gente não pode passar daquele limite e a gente
fica numa situação que não tem pra onde correr, aí tem que parar
o barco, jogar o barco aí, quando quebra, entendeu?31



30
     Idem nota 11.
31
     Ibidem.

                                                                               13
Pega bastante lixo [...] é o lixo, tem gente que leva até pra
casa e bota pro lixeiro levar, sacos e sacos de lixo, ás vezes, vem
chapado de lixo [...] bem mais, trezentas vezes mais lixo, vem
trezentos quilos de lixo e um quilo de peixe [...] não, o que a gente
cata bota tudo num saco e trás pra fora em terra, porque se você
catar o lixo e jogar de volta aí que vai ter mais poluição ainda,
então o que a gente já cata nas nossas redes acomoda nos sacos
pra trazer pra terra e por pra rua e o lixeiro levar, tem lixeiro três
vezes por semana, sacos e sacos de lixo, não é um é não é dois é
todos        nós,    todos   os   pescador    da   Conceiçãozinha   fazem    isso,
limpeza própria, é que a gente não vai ficar tirando fotografia,
mostrando, mostra pra quem? Gastar mais dinheiro que não tem,
então a gente tem que trazer, o que acha a gente trás, engata na
rede, muita madeira velha jogada na água também a gente trás
fora, muitas vezes não dá pra gente trazer, né?32
          A pesca do camarão atualmente é a única que realmente
proporciona uma renda razoável, porém, há diversos aspectos que
dificultam a sobrevivência através da pesca do camarão.
          Primeiramente é um tipo de pesca que pode ser qualificado
como uma espécie de arrasto. As embarcações que vão para a pesca
do camarão utilizam um guindaste no qual são amarradas as duas
pontas da rede de nylon utilizada, deixando assim essa rede em
forma de um para quedas, debaixo d’água. Utiliza-se também o que
os pescadores classificam como “porta”, que é uma espécie de
madeira          pesada,     grossa,   de    aproximadamente   um    metro    por
cinqüenta centímetros. São utilizadas duas portas, que ficam na
frente da rede arrastando a lama do estuário tirando assim os
camarões que estão no fundo e fazendo então com que esses
camarões fiquem presos na rede.
          O primeiro fator que dificulta a pesca é a grande quantidade
de objetos no estuário, o que gera o risco da perda de todo o
material.


32
     Idem nota 87.

                                                                                14
“É, é fácil perder porque tem muito ‘engato’ aí pelos fundos,
tudo aí, tem coisa grande aí no fundo [...] não, não é galho, é
barco afundado, veleiro, esses bagulhos que afundam por aí, e a
gente arrasta, não sabe, e não sabe a posição, aí pega e perde
tudo, fica tudo, rede, porta, fica tudo, que nem aconteceu comigo,
perdi tudo aí, tem até um colega que vai me emprestar até as
portas pra eu trabalhar, que eu to ‘desarmado’, tenho só o
guincho, só. É uma situação da ‘porra’! Ele vai me emprestar às
portas,         os   guinchos,    tem    que       trabalhar,   do   jeito      que   ta   a
situação.”33
          “Quer dizer, quando tem muito camarão o preço chega até
oitenta centavos o quilo, quando tem bastante, entendeu? Aí a
‘praça cai’ e daí, ninguém quer, tem vez que ninguém quer, nem o
camarão, chega lá com o camarão e eles (os peixeiros, os Box da
Ponta da Praia) falam: ‘não quero não’.”34
          Um     outro     agravante    para   a    sobrevivência        dos    pescadores
através da pesca do camarão é o fato de que quando acaba o defeso
do camarão, que é de três meses, e é a época na qual o camarão
terá,       teoricamente,      um tempo        para a reprodução,              o preço     do
camarão pode atingir, nos entrepostos de venda cerca de dois a três
reais por quilo. Porém, esse preço cai rapidamente conforme as
grandes embarcações que passam vários dias pescando chegam, e
despejam toneladas e toneladas nos entrepostos.
          Essa é a lógica do mercado se aplicando nas relações de
subsistência          do    pescador    artesanal.      Enquanto     o    camarão        está
escasso, por causa da proibição, algumas vezes os pescadores saem,
ilegalmente pois a necessidade os impele, e nessa época o preço do
camarão compensa o risco.
          Porém logo que acaba o defeso, e a pesca é liberada, o preço
ainda permanece razoável por cerca de uma semana. Com a chegada
das grandes embarcações o preço vai caindo até se produzir a cena



33
     Idem nota 11.
34
     Ibidem.

                                                                                           15
relatada pelo pescador: tem-se o produto da pesca, entretanto não
se tem como vendê-lo.
          As outras formas de subsistência como a pesca da tainha e as
coletas estão praticamente inviabilizadas. A primeira, como já foi
abordado, principalmente pela grande incidência das traineiras
pertencentes aos grandes armadores e empresas de pesca que atuam
na região, e contra as quais os pequenos barcos dos pescadores da
comunidade não tem como competir. E as coletas, no entorno da
comunidade, por dois motivos: o primeiro é de fato a grande
escassez de siris, caranguejos e mariscos; o segundo é a poluição
oriunda do cais e das industrias vizinhas à comunidade. Poluição
esta que não só espantou e matou grande parte da diversidade da
região, como torna impensável o consumo de qualquer crustáceo
que por ventura seja capturado na área.
          “Caranguejo, siri, aí tinha muito caranguejo, agora não, ta
uma porcaria, né? Vai pegar um caranguejo daqui? Não dá, né?
Mas era cada caranguejo bonito, sabe? De vez em quando aparecia
goiamum”.35
          Ainda restam na baixada santista, alguns poços de camarão e
alguns pesqueiros, o que faz com que os pescadores artesanais
migrem cada vez mais freqüentementea para esses locais. No
entanto, se for mantido o ritmo da pesca e a incidência da poluição
continuar o mesma, é questionável a durabilidade desses últimos
refúgios dos seres marinhos.
          “Dava, agora acabou, só pequenininho, só os pequenininhos,
a gente pega e torna a largar, vou comer um peixinho desses? Não
tem nem carne, agora o que tem alguma coisa ainda de siri é na
Diana, atravessando a Piaçaguera, porque ninguém vai, a gente de
vez em quando vai lá, mas é muito longe, é duas horas de barco,
gasta uns dois litros de óleo pra chegar lá e pegar o que? Uma
caixa de siri, vinte conto, quando tu vai e acerta a pescaria de
siri, o siri ainda vai, né? E quando tu não acerta nada, que nem
semana passada, eu fui pra lá, não pegamos nada, nem pra come,
35
     Idem nota 1.

                                                                    16
nem pra fazer um pirão na água nós não peguemo, peguemos uns
mergulhado36 lá e comemos, e cozinhamos, é proibido, catamos ele
ali que tava na lateral escondido”.37




36
     O pescador se refere como mergulhador a uma garça.
37
     Idem nota 24.

                                                              17

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Atividades econômicas da comunidade Sítio Conceiçãozinha em Guarujá

  • 1. SÍTIO CONCEIÇÃOZINHA EM GUARUJÁ Carlos Eduardo Vicente A ATIVIDADE ECONÕMICA E SUBSISTÊNCIA A atividade econômica da comunidade esteve desde seu início, como em todas as comunidades caiçaras, , fortemente vinculada à pesca e coleta em mangues e zonas costeiras, porém com algumas características que introduzem um diferencial: a produção e escoamento de bananas, o transporte de areia retirada do leito do rio, e o artesanato (este último também presente em outras comunidades)1. Com o intuito de aprofundar um pouco mais questões relativas à pesca e coleta e também da subsistência, é interessante uma diferenciação entre esses itens e as outras atividades, também importantes, porém com um vinculo menor. Convém então, um pequeno sub-item tratando da produção e escoamento de bananas, do transporte de areia e do artesanato. Atividades econômicas secundárias A primeira atividade a ultrapassar a questão da subsistência foi a produção e escoamento de bananas, que, do início do século XX até a década de setenta era feito em barcaças pelas “gamboas” (braços de mar) do Sítio Conceiçãozinha “... foram invadindo, foram entrando pelas águas, por que por aqui, trilha não tinha, não tinha acesso, por que isso aqui era tudo mato, entendeu? Tinha 1 Idem nota 23. 1
  • 2. o canal, né?, depois a draga veio acabou de dragar esse canal aqui, a gente tinha o canal, ali tinha um poço, onde entrava o chatão2 de bananas pra pegar as bananas daí, já pegava daí, já encostava no navio, né?, já desembarcava no navio, né?, pra levar lá pra fora”.3 Além do transporte de bananas nos “chatões”, durante algum tempo também foi utilizado um trem. “... o trenzinho, nós chamávamos de Maria fumaça, outros chamava trole, era nessa avenida, ainda o bananal, o trenzinho navegava só no bananal, o trenzinho não vinha pra cá, pra cá era tudo mato [...] era aí, quem vai do hospital Ana Costa até chegar mais ou menos onde é a cutrale, ali era banana só [...] Tinha o trilho, tinha a linha, e o trenzinho passava direto, os troles4, às vezes, passava remando com aquelas varar em cima da linha, era pra cacho de banana, pra trazer pra linha pra poder embarcar...” O a produção e escoamento de bananas movimentou um pequeno comércio que, juntamente com a venda de pescados, formou a base da pequena economia da comunidade (os bairros em torno, também tiveram uma ligação com o comércio de bananas, haja vista que havia poucas fontes de renda na área na primeira metade do século XX, e os próprios limites entre bairros eram muito confusos, impossibilitando saber quem de fato comercializava algo seria deste ou de outro bairro)5. O nome como era conhecido esse veiculo sobre trilhos que transportava bananas varia de acordo com o depoimento, porém é indiscutível a existência de um veiculo que utilizasse a via férrea para o transporte de bananas “Olha, tinha ali no, ali onde ta o hospital Ana Costa, ali era um ponto mesmo do bondinho, né? Então era o Seu Adriano, tinha vacarias, tinha tudo, né? Então o ponto era ali, aí também, pra cá, 2 Chata ou chatão; barcaça de fundo largo, utilizada em transporte de mercadorias em rios de baixo calado, e em áreas portuárias; chatões, plural de chata. 3 Idem nota 12. 4 Pequeno carro descoberto, montado nos trilhos das estradas de ferro e movido pelos operários por meio de varas, como jangadas sobre trilhos. 5 Idem nota 38. 2
  • 3. da casa dele pra cá, o seu Adriano, era tudo negócio do sítio dele, sabe? Banana, essas coisas. O negócio mais, era banana, sabe?”6 O comércio e transporte de bananas vieram declinando até aproximadamente o inicio da década de setenta, quando foram feitas as últimas viagens. “Pegava o Bonde e ia lá pro mercado, o bonde ia, então o trenzinho, pra nós não sei se servia pra muita coisa, por exemplo, meu pai vendia cana, banana, pro “Galhardo”, do lado de lá, ‘Galhardo’ era um local que meu pai vendia lá, vendia tudo, levava um chatão grande, enchia um chatão levava pra vender lá, abacaxi, mandioca, aqui dava muita mandioca por que a terra era areia, né? Então não quebrava a mandioca, então era vendido lá, agora, às vezes usava, agora eu não sei se pra gente aqui do sítio tinha muita utilidade, porque a ligação nossa era mais pertinho, daqui com o lado de lá. Essas gamboas aqui que você ta vendo, era por essas gamboas que passava o chatão de banana que os escravos carregavam, essa gamboa aqui chamava Gamboa do Juca, o vô dele (aponta o Ranufinho), o Juca Pato, o Pato Tonto é que era responsável pelo casarão, todos os casarões que existiam daqui do Sítio Conceiçãozinha até lá no Morrinhos era o vô dele que era responsável, então o pessoal chamava a Gamboa do Juca, do Pato Tonto, passava aqui, levava as bananas pro píer do Macuco, pra Bacia do Macuco, dali, os navios carregavam pra Europa, banana, levava pra Europa, depois da década de setenta, isso é, até a década de sessenta ainda saía banana daqui, em 69 ainda passava o chatão das bananas aqui, me lembro, porque meu pai morreu em 66, eu to me lembrando das coisas, porque meu pai morreu em 66, e minha mãe depois foi viver com um espanhol, e eu me lembro, ele veio buscar um caminhão de bananas aqui, em 69, então aqui, em 69 ainda passavam os chatões de banana que iam lá pra Bacia do Macuco, pra ser embarcado pra Europa, a banana já vinha embalada e tudo7.” 6 Idem nota 1. 7 Idem nota 27. 3
  • 4. É percebido também o transporte em pequena escala de outros cultivos oriundos de uma pequena agricultura, porém, o produto agrícola mais citado e provavelmente de real impacto econômico na comunidade, foi à banana. “Em Santos. Naquele tempo eu tava com oito anos, oito pra nove anos, aí meu pai morreu de pneumonia, porque meu pai era estivador, aí ele tava doente, depois ele ficou melhorzinho, aí ele foi trabalhar, mas não tava bem, muito bom, né? Aí ele foi trabalhar, pegou uma chuva de repente, no chatão de areia, aí ele já veio com aquela dor, aquela dor, dor foi essa que levou ele pro buraco, meu pai morreu com 41 anos”8. “Aí começou a acabar com o cultivo da banana na década de 70, quando caiu o consumo da banana, o cara que tinha o sítio teve uma idéia fantástica, ele começou a transportar areia de construção de Santos pra construção civil que começou a se desenvolver, hoje nem areia mais tem ...”9 Após o ocaso do transporte de bananas, outra atividade surgiu. Embalado na utilização dos “chatões” de bananas, e no inicio do boom imobiliário principalmente na orla da praia em Santos, alguns moradores reaproveitaram as embarcações no transporte de areia, que era retirada dos leitos e laterais dos rios. Esse transporte de areia terminaria com a diminuição das atividades na área da construção civil, que se dá no final da década de oitenta.10 A partir da década de 30 uma outra atividade vem implementar o setor econômico da comunidade: o artesanato. O artesanato, ou a produção própria manual de artefatos que eram utilizados no dia-dia, passa a ser também uma fonte de renda. Diversos moradores para implementar seus proventos aliaram à renda ganha com sua pesca e cultivo, as vendas de cestos para transporte de camarão, (retangulares, com cerca de dois palmos de largura por três de comprimento e um palmo e meio de 8 Idem nota 1. 9 Idem nota 27. 10 Idem nota 38. 4
  • 5. profundidade); balaios redondos e mais fundos (com mais ou menos três palmos de profundidade também para transporte de camarão e outros peixes); chapeis caipira, peneiras (para feijão, café, milho), cestos redondos e rasos (para frutas), abajures, armadilhas para a pesca como o Covo, (uma espécie de cesto por onde peixe entra e na saída não consegue sair, pois tem uma pequena porta que abre somente pra entrar), e o Jequi, (uma espécie de labirinto onde os peixes entram e se prendem e não conseguem sair), que ficavam amarrados nas beiras das Gamboas.11 Todos esses utensílios eram feitos tendo como matéria prima os cipós embira e guapé, e lascas de bambu para serem trançados e amarrados com os cipós.12 Até a década de setenta as famílias que produziam esses utensílios, vendiam ou trocavam com embarcações que costeavam a comunidade por bens de utilidade. Porém, no inicio da década de 70, isso relatado por moradores, estiveram na comunidade representantes da indústria de barcos pesqueiros “Taio”, para aprender a confecção dos cestos. Ao que parece, esses representantes, num total de cinco, se hospedaram na casa de um dos melhores cesteiros da comunidade por uma semana aprendendo a técnica. Aproximadamente em 1974 começaram a aparecer cestos de uma espécie de plástico (segundo moradores, parecia náilon trançado). Esses cestos começam a ser vendidos em larga escala nos estabelecimentos comerciais por um preço muito barato.13 Os cesteiros tinham um trabalho completamente artesanal, e por vezes demoravam horas para concluir um utensílio, logo, os baixos preços com que eram vendidos os cestos, chapeis e balaios sintéticos, começaram a inviabilizar a produção para venda por parte dos cesteiros que foram mudando de atividade, até que hoje, há somente um cesteiro, que é descendente do melhor cesteiro da 11 Ibidem. 12 Para conseguir um tamanho uniforme nos cipós, costumava-se furar latas com diferentes tamanhos, daí então os cipós eram passados nos diversos furos, do maior para o menor, dando assim a espessura desejada. 13 Idem nota 38. 5
  • 6. época (o que ensinou os funcionários da Taio), e que hoje produz apenas por lazer.14 Da pesca e coleta Os depoimentos de moradores ligados à pesca (em sua maioria moradores mais antigos) atestam para a quantidade e facilidade que tinham outrora na obtenção de pesca e crustáceos no mar, mangue ou mesmo nas gamboas em volta. “Olha eu e a minha senhora, a gente ia para o portinho ali, levava dois, três pulsa15, uma garrafa de café e sentava em um barranco na sombra, jogava a varinha e tinha corvina, carapéba, tinha siri, caranguejo, esse ainda tem, mas já não é mais como era [...] aqui dá pescada, robalo, parati, tainha, espada, peixe-galo, paru, até sardinha, a legitima, a maromba, que chamam, nós pegávamos um pouco, pegava os cardumes na barra, hoje não entra mais por causa da poluição, de certo, sei lá [...] aqui já foi matado baleia, tudo isso aqui na Conceiçãozinha, né, a baleia chegava a entrar até aqui [...] de vez em quando “se arruma” uma pra cá, então arpoava, agora hoje não tem mais nada disso, até os botos, que tinha muito, era cardume de boto, sabe o que é boto? Tinha cardume de boto, hoje você não vê mais um boto, hoje você vai ver um boto aonde, lá pro lado da Bertioga, quando calha de ver, virar cambalhota, né?”16 “...peixinhos: Carapicus, manjubinhas, savelha, robalinhos, carapebinhas, além de sirizinhos [...] Corvina, pescada, linguado, robalo, cação, [...] vem enguia, vem siri, vem caracol, às vezes vem golfinho [...] a anchova, pescadinha, o bagre, [...] Maria 14 Ainda existe outro cesteiro, mais antigo e que era exímio artesão, porém este se encontra com parte de suas faculdades mentais desequilibradas, o que o impossibilita de voltar a produzir seu artesanato. 15 Espécie de rede para a pesca principalmente de siri, é formada por um circulo que pode ser de metal ou um tipo de quadrado, no qual é trançado com uma linha bem forte, uma malha. Ele leva também quatro linhas presas em suas extremidades. Esse instrumento é jogado no rio com algum tipo de isca dentro. Se fica observando, quando o/os siris entram, recolhe-se o pulsa rapidamente com o que tiver dentro. Retira- se o que foi pescado, e joga-se novamente o pulsa para nova pesca. 16 Idem nota 4. 6
  • 7. Luiza que a gente conhece aqui como as misturinhas, o que é jogado de misturinha! Misturinha é tudo quanto é peixe que vem [...] A sororoca é um peixe que dá no meio de junho, né? A tainha tinha muita tainha aqui no estuário, ta? Tinha o bagre cabeçudo, tinha muito, as guaivíras, tinha muito também, robalo que eu já falei e a garoupa vinha desovar pra cá também, perna-de-moça, espada, também tinha aqui o charéu, também o parú, tinha muito parú também, o salgo, tinha [...] De tudo, tainha, robalo, bagre o espada [...] De vez em quando a gente acerta, pega uma corvina, uma pescada, uma espada, uns bagres magrinhos [...]o marisco aqui mesmo se pegava, o marisco no mangue, se já não encontra mais marisco, só encontra aquele marisco ‘unha de velho’, muito pouco também, e quando se encontra, o marisco ta com um gosto ruim, com gosto de óleo, provavelmente com poluição, né? Caranguejo também, o goiamum, o goiamum era um tipo de caranguejo azul e tinha muito goiamum aqui, esses goiamum se pegava com uma facilidade, aqui no quintal se pegava, no quintal de casa, na época dele, que ele é um caranguejo do seco, né? E esse goiamum desapareceu tem hoje uma quantidade muito pouca de goiamum aqui dentro que a gente preserva, não deixa nem os outros pegar, a gente fica – ‘ó, não pega o goiamum, deixa criar, que é o que resta de beleza pra nós ainda é os goiamuns, tinha muito goiamum aqui dentro’.17 Até aproximadamente o final da década de setenta, a pesca e a coleta eram em abundância e se pescava os variados peixes e crustáceos denominados. Com o aumento da população da própria comunidade e da região como um todo (gerando tanto um aumento da concorrência, como da demanda) a produção pesqueira começou a escassear (aqui se referindo a produção da comunidade). Isso, aliado ao crescimento industrial, e por conseguinte dos dejetos lançados no estuário, começou a tornar a vida dos pescadores e coletores cada vez mais difícil. Os pescadores acabaram se fixando, não por escolha, e sim pela diminuição das variedades e 17 Idem nota 27. 7
  • 8. quantidades de peixe, na pesca da tainha e do camarão, e na coleta de caranguejos, e siris. “Quando a Edméia vem com a idéia da agrovila, iniciam os projetos. Pois ela nota alguns problemas: pesca predatória, mau aproveitamento que os caiçaras faziam de seu material de pesca, e as próprias condições dessa prática, tanto que éramos definidos como pescadores artesanais, nós pescávamos com material feito pelas nossas próprias mãos, armadilhas, redes. Por exemplo, a pesca do tribombó18, era uma coisa fantástica, o pescador saía em uma canoa, com um varão nas laterais, inclinado, uma rede esticada, daí, uma pessoa saía pela margem batendo um tambor, os peixes que estavam na margem se deslocavam em direção ao mar aonde a canoa ia passando, nessa canoa tinha também uma lamparina na proa e outra na popa. Quando os peixes iam passar por baixo da canoa eles se assustavam com as lâmpadas e tentavam saltar por cima da canoa, nisso eles batiam na rede e caíam dentro da embarcação. Esta era uma das pescas que a Edméia chegou a ver, e que dava pra gente subsistir. Aí, eles (Projeto Rondon), começaram a ensinar diversas técnicas pra gente, menos predatórias. Outro exemplo, a questão da tarrafa, a Edméia achava um absurdo você lançar a tarrafa no mar e trazer camarão, pois desse jeito você trazia mais varias espécies de peixinhos: Carapicus, manjubinhas, savelha, robalinhos, carapebinhas, além de sirizinhos. Mas depois das instruções começamos a aproveitar esses restos de peixes como engodo pra pesca do camarão. Agora, mesmo assim ela achava um absurdo, mas fazer o que? A gente tinha que viver daquilo, né?”19 Interessante é a auto-critica feita. O reconhecimento de que uma parte da degradação da pesca foi, ou é, responsabilidade dos próprios pescadores artesanais. “Hoje já reduziu, né? Se tu for por na caneta hoje, eu duvido que durante esse ano já teve gente que pegou salgo aí dentro, 18 Onomatopéia indicando o som emitido na margem. 19 Idem nota 27. 8
  • 9. salgo de dente que a gente chamava, o parú, não se encontra, a sororoca nem pra remédio se pega ela aqui no canal, ela não entra [...] então a sororoca não se encontra mais, o golfinho já não se vê mais aí, o bagre, só se pega bagrezinho pequenininho, ta? Que é os bagre mais resistente a poluição, o robalo, se pegava de dez quilos aí. Não pega mais não, se pega um robalinho ali, o outro aqui, e outro uma hora ou outra. Então, desses peixes que eu falei pra ti, pode por aí que só existe hoje praticamente 10% deles [...] o siri, a gente pescava por noite cinqüenta quilos de siri, pra fazer no domingo, no campo, era cinqüenta quilos de siri. Nós saíamos com gancho, não era com isca não, de gancho! Cada um pegava uma lata de vinte e cinco litro, trazia cheinha!”20 “Em 1974 a pesca do mar já era farta, mas nós estamos falando de pesca no rio, pesca artesanal, que é com o caniço 21, a isca, a rede o espinhel22. Quando o porto e a Cosipa se instalam começa a escassez, os manguezais começam a ser invadidos pela população, aí começa a sumir o caranguejo, o siri. Ainda existe a pesca de maré, mas teve um desenvolvimento da pesca armadora, da pesca de mar, sardinha e camarão em abundância. Eu me lembro que o emprego na área de pesca cresceu bastante, com o crescimento e atividade forte das indústrias de 1974 para cá, começa a poluição, em 1977 vem à deficiência da pesca [...] a pesca ficou escassa e a gente teve que sair pro mar também, e 20 Ibidem. 21 Vara flexível, atualmente de material sintético, que durante muito tempo foi de um bambu, medianamente fino, e verde, portanto flexivel 22 Segundo a antropóloga Gioconda MUSSOLINI, em Ensaios de Antropologia Indígena e Caiçara. São Paulo: Paz e Terra, 1980, o espinhel é “forma de pescaria que se encontra desde o Amazonas até o extremo sul do Brasil e que, de origem portuguesa, se conservou perfeitamente idêntico ao modelo original, inclusive na designação de suas partes, nada mais é que um aparelho feito de cordas fortes, em forma de H, sendo que da haste horizontal do centro pende uma porção de anzóis, que variam de tamanho e número segundo a natureza do peixe a que se destinam. O espinhel é mantido fundeado por meio de bóias na parte superior das duas hastes verticais e de poitas (pedra ou outro peso, [chumbo, por exemplo] que serve de peso para manter redes, embarcações ou o próprio espinhel no fundo) na inferior. Vai-se lançando o aparelho n’água, anzol por anzol, de dentro de uma canoa. Deixa-se, então, o aparelho poitado e de vez em quando vai-se visita-lo, e fazer a despesca, isto é a coleta do peixe. Dois homens bastam par ao manejo: enquanto um rema, o outro deita ou recolhe o aparelho”. De fato, a definição dada pela antropóloga corresponde quase que na integra ao tipo de pesca por espinhel praticado pelos pescadores da Conceiçãozinha, entretanto uma particularidade foi encontrada quando da pesquisa de campo. O espinhel utilizado pelos pescadores, não tem, necessariamente o formato de H sendo geralmente apenas uma corda grossa com os anzóis presos a ela. 9
  • 10. acaba gastando mais, com rede, óleo, extintor, salva-vidas (colete), ou seja, uma estrutura que antes não precisava, tem que ter uma série de coisas que os pescadores não conseguem, e tem a concorrência, tem a pratica do arrasto, a gente tentou fazer isso com nossos barcos, e vai uma porta de cada lado, a rede aberta e um saco, e vai levantando a lama e o camarão vai entrando pra dentro da sacola, essa é uma pesca de costeira.”23 “Dava para tirar cem quilos mais ou menos, agora não dá mais, peixe fugiu tudo da água [...] a poluição, o peixe vai andar na poluição? [...] lixo, água poluída, químicas, por isso o peixe fugiu, água com lixo já atrapalha, água com química já atrapalha mais ainda, e mata os peixes, cega os peixes, o peixe não vai ficar onde a água ta podre. É que nem nós, a gente vai beber essa água podre aí, é beber e morrer. Nós quer água limpa, nós não quer água suja, água suja, nós corre dela, e o peixe é a mesma coisa, pegou o peixe lá do alto mar, jogou ele aqui, ele ta morto, jogar aí, ta morto, não fica dez minutos o coitado nadando aí, pode trazer uma caixa aí de peixe especial, pode jogar o peixe aí, vai dar uma hora ele bóia, morre, envenenado na própria água. É as duas firmas aí, a Cargill e a Dow Química, que ta lascando a gente, fora às outras de Cubatão que vem pelo rio, o veneno também vem lá de cima, essas refinarias que jogam água suja na nossa água limpa, e nossa água limpa vira podridão, que nós vai comer? Pedra? Entendeu, nem caranguejo deu pra viver aí, que os mangues tão tudo poluído também [...] Tu vem de madrugada, pega uma embarcação, e fica ali, com a maré vazia, no píer da Dow Química, tu vê quando eles estão lavando os ‘barcão’, a podridão que cai dos barcos, que cai da tubulação, a tainha cega, por quê? Poluição, nunca vi peixe cegar, cansamos de pegar tainha cega, cega, os dois olhos brancos, os olhos do bichinho, do animal, e peixe não é gente, é um inocente, um fruto de Deus, e eles jogando química dentro da água, polietileno, esse bagulho que vira vaselina, uns quadrados lá na água, trinta, quarenta centímetros 23 Idem nota 27. 10
  • 11. quadrados de um produto perigoso, na água, brabo, sei lá, eu levo qualquer um lá e mostro os pedaços, de vez em quando engata um na rede, na rede, na tarrafa, Dow Química são cem anos de água suja dentro da água, que nem isso aqui, nessa água, sem vida.”24 O reconhecimento da quantidade de problemas oriundos da poluição química é também latente em todos os depoimentos. Isso se torna visível com a quantidade de criticas feitas às empresas vizinhas à comunidade, como a Cargill, Cutrale e Dow Química, por praticamente todos os moradores. Outro agravante na prática da pesca artesanal dos moradores é o crescente numero de barcos pesqueiros dos chamados “armadores.”25 “O peixe não entra mais por motivo também dessas parelhas 26, essas parelhas, elas arrastam aí fora e acabam com tudo [...] não deixa eles entrar, o peixe, que nem a tainha também, quando a gente que é pescador pequeno, quando a gente vai atrás da tainha, têm dez, doze barcos traineiras27 aí atrás, aí na Barra [...] é grande, porque a rede da traineira é o seguinte, é uma rede só, entendeu? Uma rede só, e ela sai assim arrastando, né? Um barco de lá, outro de cá, com uma rede só [...] que nem picaré28, que nem 24 Oswaldo Tomáz, conhecido como “gaúcho”, morador da comunidade a cerca de 25 anos, já pesca na região à quase quarenta anos. 25 Grandes empresas pesqueiras, muitas vezes japonesas ou de outros paises que possuem frotas de, por vezes, dezenas de embarcações. 26 Pares de barcos utilizados no arrastão, forma de pesca onde se emparelham dois barcos de médio porte, tendo aproximadamente entre 15 e 20 metros, com cinco a sete pescadores em cada, e aparelhados geralmente com os chamados guindastes (para levantar a rede), depósitos com gelo seco (para armazenar o produto da pescaria) e sonares, (para localizar os cardumes). As redes, que variam de 150, 200, até 350 metros são presas nos guindastes e as embarcações passam de duas a quatro horas navegando em volta do cardume até que acionam os guindastes e içam o produto daquelas horas, retiram o que julgam aproveitável, jogam de volta no mar o que não seria rentável, e recomeçam a operação, assim ficando, por vezes, durante dias até encher os depósitos das embarcações. 27 Nome utilizado na região para designar os barcos de médio porte que são empregados principalmente na pesca da tainha. Tecnicamente a traineira é uma espécie de barco que utiliza grandes redes, e é empregado principalmente na pesca da sardinha. Neste caso á uma adaptação do nome para a realidade regional (haja vista que, atualmente não há grande incidência de sardinhas na região). 28 Forma de pescaria que, necessariamente, não utiliza barco. Normalmente tem-se uma rede de cerca de 30, 40 metros de comprimento por dois ou três de largura. Em cada uma das duas extremidades se prende um grande bambu, ou uma vara de madeira não muito pesada. Dois homens vão segurando ela na beira da praia com aproximadamente meio metro de água, e dois homens seguram a outra extremidade em uma profundidade maior. Pelo motivo lógico de que esse tipo de pesca somente é viável em praias com um declive extremamente suave, da areia para a água, por vezes, é necessário, no lugar de dois homens na parte profunda da praia, a utilização de uma pequena embarcação, e se prende um lastro para manter a extremidade que fica mais afastada da terra no fundo. Essa pesca também é utilizada em rios que não 11
  • 12. arrastão29 [...] deve ter uns cem, duzentos, até trezentos metros, mais ou menos [...] eles vão arrastando, de quatro em quatro horas eles viram [...] aí tira de novo a sacada, e larga de novo pra água, e assim vai, e o “pau vai comendo”. Então os peixes que iam entrar, os peixes que vão pra barra, eles catam tudo [...] eles vem pra “Barra” pra comer, né? A tainha mesmo, ela vem de noite pra praia, de madrugada ela vem comer na areia, ela vem pra terra, então eles não deixam, entendeu? Eles mesmos cercam e acabam com tudo, eles montam a rede grande, que eles tem a rede grande, entendeu? Os próprios armadores grandes, porque os pequenos, quando vão lá, já não têm mais nada, eles acabaram com tudo [...] eles vêm e cercam a gente pra gente não poder pegar, porque além deles buscar lá fora, eles vêm tirar o emprego da gente, trabalhar aqui em terra, em cima da terra, na praia, e a gente fica sem, entendeu? Aí fica com problema de rede, entendeu? Aí começa, e o peixe não encosta, o peixe não encosta de jeito nenhum, porque os próprios barcos grandes acabam com tudo ...” Além da competição desigual, devido à tecnologia e ao tamanho dessas embarcações, que, portanto, fazem um tipo de pesca mais predatória, os pescadores atentam para o desperdício que essas embarcações fazem. “jogam o peixe aí fora, porque se der cem quilos de peixe graúdo, vai trezentos quilos fora [...] porque, é o seguinte, o peixe miúdo, eles mandam jogar tudo fora, entendeu? É trezentos quilos fora, então é tudo peixe que morre, vem tudo na rede, já vem morto, e vai tudo pra água, manda jogar tudo fora [...] o peixe miúdo é corvina, cascotinha, esses peixes aí que eles vendem aqui, entendeu? Que a gente pesca aqui mesmo, entendeu? Que a gente pega aí, entendeu, as corvinas, cascotinha, eles jagam tudo fora, se der cem quilos de peixe graúdo, eles jogam trezentos fora de pá [...] o graúdo é a corvina graúda, entendeu? É a pescada graúda, entendeu? É o peixe-espada que não joga fora, entendeu? Peixe tenham grande quantidade de cascalho no fundo, e que possua margens razoavelmente próximas. 29 As denominações de arrastão, ou picaré, no linguajar do pescador caiçara querem significar o mesmo tipo de pesca. 12
  • 13. Maria-luiza, perna-de-moça, esses peixes que é tudo jogado fora de pá, pra água [...] tem peixe que eles jogam fora lá que é quinhentos, seiscentos gramas, e eles jogam tudo fora [...] se é a gente, a gente pega aí o peixe miúdo pra vender, entendeu? Eles acabam com tudo, porque a corvina não cria desse jeito mata os filhotes todos, aí não criam, eles matam os filhotes todinhos eles só querem os peixes graúdos, os peixes miúdos eles jogam tudo fora.”30 Um certo reconhecimento da legislação ambiental, e da necessidade de preservar o pouco que restou dos mangues e da pesca também está presente na mentalidade do pescador artesanal da Conceiçãozinha. É, só pra pegar o grande, mas não, eles pegam o miúdo, que é a criação, pega a criação e pegam os grandes. Só que a criação, as cascotinhas, espadas, perna-de-moça, esses peixes aí, eu trabalhei em um barco e tem vários pescadores aí que não mentem, podem fazer uma entrevista que no caso aí sabe, e joga tudo fora, pá e mais pá pra fora, se der cem quilos de peixe por barco, de corvina grande, o resto de miúdo vai tudo fora de pá, então mata toda a criação, acaba com tudo, entendeu? Vai acabando, é por isso que ta em falta de peixe, entendeu? Vai se acabando, porque os peixes vão se criando e os próprios pescadores vão matando e vão jogando fora, um bicho que sobrevive é a gaivota, que come os peixes que ficam boiando, e a gente passa apuro aí rapaz! E os armadores é que ganham dinheiro com isso, porque eles têm o barco pra ir lá fora buscar e nós não temos, todo mundo com uns barquinhos pequenos, então tem que trabalhar na costa, a Capitânia já exige que a gente não trabalhe na costa porque o barco é pequeno. A gente não pode passar daquele limite e a gente fica numa situação que não tem pra onde correr, aí tem que parar o barco, jogar o barco aí, quando quebra, entendeu?31 30 Idem nota 11. 31 Ibidem. 13
  • 14. Pega bastante lixo [...] é o lixo, tem gente que leva até pra casa e bota pro lixeiro levar, sacos e sacos de lixo, ás vezes, vem chapado de lixo [...] bem mais, trezentas vezes mais lixo, vem trezentos quilos de lixo e um quilo de peixe [...] não, o que a gente cata bota tudo num saco e trás pra fora em terra, porque se você catar o lixo e jogar de volta aí que vai ter mais poluição ainda, então o que a gente já cata nas nossas redes acomoda nos sacos pra trazer pra terra e por pra rua e o lixeiro levar, tem lixeiro três vezes por semana, sacos e sacos de lixo, não é um é não é dois é todos nós, todos os pescador da Conceiçãozinha fazem isso, limpeza própria, é que a gente não vai ficar tirando fotografia, mostrando, mostra pra quem? Gastar mais dinheiro que não tem, então a gente tem que trazer, o que acha a gente trás, engata na rede, muita madeira velha jogada na água também a gente trás fora, muitas vezes não dá pra gente trazer, né?32 A pesca do camarão atualmente é a única que realmente proporciona uma renda razoável, porém, há diversos aspectos que dificultam a sobrevivência através da pesca do camarão. Primeiramente é um tipo de pesca que pode ser qualificado como uma espécie de arrasto. As embarcações que vão para a pesca do camarão utilizam um guindaste no qual são amarradas as duas pontas da rede de nylon utilizada, deixando assim essa rede em forma de um para quedas, debaixo d’água. Utiliza-se também o que os pescadores classificam como “porta”, que é uma espécie de madeira pesada, grossa, de aproximadamente um metro por cinqüenta centímetros. São utilizadas duas portas, que ficam na frente da rede arrastando a lama do estuário tirando assim os camarões que estão no fundo e fazendo então com que esses camarões fiquem presos na rede. O primeiro fator que dificulta a pesca é a grande quantidade de objetos no estuário, o que gera o risco da perda de todo o material. 32 Idem nota 87. 14
  • 15. “É, é fácil perder porque tem muito ‘engato’ aí pelos fundos, tudo aí, tem coisa grande aí no fundo [...] não, não é galho, é barco afundado, veleiro, esses bagulhos que afundam por aí, e a gente arrasta, não sabe, e não sabe a posição, aí pega e perde tudo, fica tudo, rede, porta, fica tudo, que nem aconteceu comigo, perdi tudo aí, tem até um colega que vai me emprestar até as portas pra eu trabalhar, que eu to ‘desarmado’, tenho só o guincho, só. É uma situação da ‘porra’! Ele vai me emprestar às portas, os guinchos, tem que trabalhar, do jeito que ta a situação.”33 “Quer dizer, quando tem muito camarão o preço chega até oitenta centavos o quilo, quando tem bastante, entendeu? Aí a ‘praça cai’ e daí, ninguém quer, tem vez que ninguém quer, nem o camarão, chega lá com o camarão e eles (os peixeiros, os Box da Ponta da Praia) falam: ‘não quero não’.”34 Um outro agravante para a sobrevivência dos pescadores através da pesca do camarão é o fato de que quando acaba o defeso do camarão, que é de três meses, e é a época na qual o camarão terá, teoricamente, um tempo para a reprodução, o preço do camarão pode atingir, nos entrepostos de venda cerca de dois a três reais por quilo. Porém, esse preço cai rapidamente conforme as grandes embarcações que passam vários dias pescando chegam, e despejam toneladas e toneladas nos entrepostos. Essa é a lógica do mercado se aplicando nas relações de subsistência do pescador artesanal. Enquanto o camarão está escasso, por causa da proibição, algumas vezes os pescadores saem, ilegalmente pois a necessidade os impele, e nessa época o preço do camarão compensa o risco. Porém logo que acaba o defeso, e a pesca é liberada, o preço ainda permanece razoável por cerca de uma semana. Com a chegada das grandes embarcações o preço vai caindo até se produzir a cena 33 Idem nota 11. 34 Ibidem. 15
  • 16. relatada pelo pescador: tem-se o produto da pesca, entretanto não se tem como vendê-lo. As outras formas de subsistência como a pesca da tainha e as coletas estão praticamente inviabilizadas. A primeira, como já foi abordado, principalmente pela grande incidência das traineiras pertencentes aos grandes armadores e empresas de pesca que atuam na região, e contra as quais os pequenos barcos dos pescadores da comunidade não tem como competir. E as coletas, no entorno da comunidade, por dois motivos: o primeiro é de fato a grande escassez de siris, caranguejos e mariscos; o segundo é a poluição oriunda do cais e das industrias vizinhas à comunidade. Poluição esta que não só espantou e matou grande parte da diversidade da região, como torna impensável o consumo de qualquer crustáceo que por ventura seja capturado na área. “Caranguejo, siri, aí tinha muito caranguejo, agora não, ta uma porcaria, né? Vai pegar um caranguejo daqui? Não dá, né? Mas era cada caranguejo bonito, sabe? De vez em quando aparecia goiamum”.35 Ainda restam na baixada santista, alguns poços de camarão e alguns pesqueiros, o que faz com que os pescadores artesanais migrem cada vez mais freqüentementea para esses locais. No entanto, se for mantido o ritmo da pesca e a incidência da poluição continuar o mesma, é questionável a durabilidade desses últimos refúgios dos seres marinhos. “Dava, agora acabou, só pequenininho, só os pequenininhos, a gente pega e torna a largar, vou comer um peixinho desses? Não tem nem carne, agora o que tem alguma coisa ainda de siri é na Diana, atravessando a Piaçaguera, porque ninguém vai, a gente de vez em quando vai lá, mas é muito longe, é duas horas de barco, gasta uns dois litros de óleo pra chegar lá e pegar o que? Uma caixa de siri, vinte conto, quando tu vai e acerta a pescaria de siri, o siri ainda vai, né? E quando tu não acerta nada, que nem semana passada, eu fui pra lá, não pegamos nada, nem pra come, 35 Idem nota 1. 16
  • 17. nem pra fazer um pirão na água nós não peguemo, peguemos uns mergulhado36 lá e comemos, e cozinhamos, é proibido, catamos ele ali que tava na lateral escondido”.37 36 O pescador se refere como mergulhador a uma garça. 37 Idem nota 24. 17