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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO - PRPPG
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS – CCHL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO HISTÓRIA DO BRASIL - PPGHB

MESTRADO EM HISTÓRIA DO BRASIL - MHB

Jomard Muniz de Britto e “O Palhaço Degolado”: laboratório
de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós 64.

Francisco Aristides de O. Santos Filho.
Orientador: Paulo Ângelo de Meneses Sousa.

TERESINA-PI.
Março 2012
3

FRANCISCO ARISTIDES DE OLIVEIRA SANTOS FILHO

Jomard Muniz de Britto e “O Palhaço Degolado”: laboratório
de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós-64.

Dissertação apresentada à Coordenação do
Programa de Pós-Graduação em História
do Brasil, do Centro de Ciências Humanas
e Letras, da Universidade Federal do
Piauí, para obtenção do grau de Mestre em
História do Brasil.
Orientador: Paulo Ângelo Meneses Sousa.

TERESINA-PI
2012
4

FICHA CATALOGRÁFICA

Universidade Federal do Piauí
Serviço de Processamento Técnico
Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco

S237j

Santos Filho, Francisco Aristides de Oliveira
Jomard Muniz de Britto e o palhaço degolado: laboratório
de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós 64 /
Francisco Aristides de Oliveira Santos Filho.--2012.
302 f.: il

Dissertação (Mestrado em História do
Universidade Federal do Piauí, Teresina, 2012.

Brasil)

Orientação: Prof. Dr. Paulo Ângelo Meneses Sousa.

1.Cultura brasileira. 2. Cinema Super- 8. 3. Pernambucália.
I. Título.
CDD: 301.298 1

–
5

FRANCISCO ARISTIDES DE OLIVEIRA SANTOS FILHO

Jomard Muniz de Britto e “O Palhaço Degolado”: laboratório
de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós-64.

Dissertação apresentada à Coordenação do
Programa de Pós-Graduação em História
do Brasil, do Centro de Ciências Humanas
e Letras, da Universidade Federal do
Piauí, para obtenção do grau de Mestre em
História do Brasil.
Orientador: Paulo Ângelo Meneses Sousa.

Aprovada em: 13/04/2012.
BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________
Prof. Dr. Paulo Ângelo Meneses Sousa (Orientador)
Universidade Federal do Piauí

____________________________________________________________
Prof. Dr. Paulo Marcondes Ferreira Soares (Examinador Externo)
Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco

_____________________________________________________________
Professor Dr. Edwar de Alencar Castelo Branco (Examinador Interno)
Universidade Federal do Piauí

_____________________________________________________________
Professor Dr. Denilson Botelho (Suplente)
Universidade Federal do Piauí
6

Para a amizade construída na rota Piauí - Pernambuco, entre as caminhadas que cercam o
Recife Antigo e o Mustang, é pra ti JMB, que dedico este texto, pela atenção e ensinamento
eterno do sentido poético da gentileza como performance diária. Entre os risos,
esculhambações e sensibilidades, que faço desse texto um espaço de agradecimento para os
amigos-irmãos João Paulo, Landerson e Kim. Pelas noites sem dormir, pela mão que acaricia
as tensões, tem um cantinho especialíssimo para Meire, nessa trajetória longa de
companheirismo apaixonante. E acima de tudo, meu obrigado à mulher mais incrível desse
reino Luso-Tropical, Maria do Carmo, que acorda todos os dias para trabalhar...
7

AGRADECIMENTOS:

Primeiramente gostaria de agradecer pelo apoio e orientação do prof. Paulo
Ângelo e toda a atenção na banca de qualificação e defesa, com Edwar de Alencar C.
Branco e Denilson Botelho.
Paulo Marcondes: seus comentários e críticas concretas, amizade e disposição
para ampliar meus conhecimentos... te agradeço muito!
Meu obrigado também vai para todos os amigos que construí na sala de aula do
mestrado, em especial ao Gisvaldo, Aelson, Laécio, Thiago (esse Zara vai dar o que
falar...), Ozael e Nercinda.
Sem Jonas Souza e Gabriela Uchôa, minha ponte afetiva com Recife em 2011
não seria possível. Jonas foi e é o amigo fundamental no processo de levantamento de
dados no arquivo público, pois foi ele quem me abrigou carinhosamente na sua casa,
abriu os caminhos para a construção de uma grande amizade (centro de alegria e RPG) e
deu abertura para que eu pudesse conhecer três pessoas maravilhas, que devo meus
agradecimentos: Giliane Cordeiro (uma menina que tem os olhos brilhantes), Pablo
Valle e Diogo Diniz, vocês são ótimos (os filmes de zumbis oitentistas precisam ser
revisitados com urgência!). As viradas culturais e as caminhadas por Recife na
madrugada me deixam com saudades do carinho de vocês e dessa terra linda!
Na Recinfernália, agradeço também aos novos projetos a serem realizados com o
amigo-parceiro-pesquisador Amilcar Bezerra, que desde 2008 vem tramando comigo
artigos e pesquisas no âmbito da Pernambucália. Pelos encontros valiosos no Delta
Expresso é que nossos textos se espalham por aí.
Nessa caminhada pelo Nordeste, encontro em Campina Grande minha querida e
psicanalista transcendental Saionara, que é responsável pelos meus momentos de riso e
reflexão sobre temas que se estendem desde os caminhos do fazer historiográfico às
posturas corretas na alimentação. No meio do trajeto, encontro lá em João Pessoa, meu
amigo conciliador de sarrafos do Marco Zero, Huoxito Luiz, o homem que me libertou
de um quebra-pau, nos pipocos da Nação Zumbi em plena ovulação musical...
A Bahia é a terra da moça que sabe mostrar o que é ser carinhosa e gentil, a
grande Izabel de Fátima, minha amiga-pesquisadora, que navega comigo nos mares do
curta-metragem e pela escatologia poética de Edgard Navarro.
Voltando ao Piauí, desço rapidinho na rodoviária de Picos e corro até a casa da
Marylu Oliveira e deixo aquele abraço grande, cheio de energia para enfrentar a correria
8

do dia-dia. Aproveito e chamo para sair comigo, pois lá no “Rei do Cangaço” estão
esperando a gente para matar um prato de carne-de-sol com a Olívia Candeia, a
Nilsângela Cardoso, o Francisco Nascimento, Jaislan Monteiro e o Mairton Celestino,
para se rachar de rir e não ter hora para acabar.
Para terminar, não posso me esquecer da CAPES/CNPq (pelo financiamento),
Dimas Brasileiro Veras, “6ção”, Rafaela Fernandes, Iara, Hérida Jayne, Maria do
Carmo Veloso (pessoa incrível que conheci nos batuques do Tambor de Crioula) Lêda
Vieira (sempre atenciosa comigo), Celso Marconi, Carlos Cordeiro, Mara Lígia, Marina
Vieira, Marília Santos, Padre Erinaldo, Lyndon Jonhson (pela oportunidade que me deu
em 2012, na Escola que estou adorando lecionar!), Jeferson, Ernani, Cleto Sandys,
Alcides, Teresinha Queiroz, Nina Caminha, Eliane, Denise Veras, Ricardo Maia (que
desde 2007, dialoga comigo e colabora na minha pesquisa efetivamente), Demétrios
Galvão, Décio Braga, Nalva, Lindalva, Thiago E., Mayra Brandt, Joniel Veras, Wesley
Veloso, Benone, Telma Franco (pela atenciosa leitura e comentários firmes), Nayhd,
Padre Álvaro (pela confiança), PC, Carlota Lina, Charles Bicalho, Cibelle Leal, Narciso
Sousa, Denes Filho, Renata Flávia, Vanderli Silva (pelos preciosos documentos da
PNC, que você me enviou de Sampa!), Áurea Paz Pinheiro, Wesley, Jordana, o cara
(como era o nome dele?) que tirava as xerox lá em Recife e aguentou as minhas
chateações diárias, os dois colegas do arquivo que me abusaram de tanto mandar voltar
os jornais... tem muita gente que passou por mim nesses anos de mestrado, agradeço a
todos, com ou sem nomeações... vocês estão nessas páginas!
Trilha sonora que define cada linha: Neil Young... Mirror Ball.
9

RESUMO
O presente trabalho visa estudar os conflitos e confrontos que se estabeleceram em
torno da noção de “Cultura Brasileira”, em Pernambuco, durante a década de 70 do
século passado. O principal argumento do estudo é a suposição de que as obras de
intelectuais tradicionais como Gilberto Freyre e Ariano Suassuna irão conviver, no seu
oposto, com uma interlocução radical que encontrará em Jomard Muniz de Britto e em
obras como “O Palhaço Degolado” (1976/77) uma de suas maiores expressões póstropicalistas. O filme atua enquanto laboratório experimental de crítica cultural aos
“monstros sagrados” da cultura oficial, em tempos de repressão às vozes dissonantes e
dessacralizadoras da identidade Brasil, vista na perspectiva de trânsito permanente,
rompendo o conservadorismo secular, restrita à sombra dos canaviais.
Palavras-chave:
Cultura Brasileira, Cinema, Pernambucália.

ABSTRACT
The present work is intended to study the conflicts and confrontations that were
established through the idea of Brazilian Culture, in Pernambuco, during the 1970’s of
the last century. The main argument of this study lays on the supposition that the
traditional intellectuals’ works such as Gilberto Freyre e Ariano Suassuna may stay side
by side, on their opposite, with a radical interlocution criticism which will find through
Jomard Muniz de Britto and some works such as O Palhaço Degolado (1976/77) one of
his greatest ways of expression in the period after the Tropicalia movement. The movie
acts as an experimental study about cultural criticism related to the “sacred monsters” of
the official culture during the time of repression to the dissonant and unholy voices,
which is seen though a perspective of permanent transition, breaking the
secular conservatism restricted to the shadow of the cane plantations.
Keywords:
Brazilian Culture, Cinema, Pernambucalia.
10

LISTA DE ILUSTRAÇÕES:

Fotografia 1 – Diário de Pernambuco.............................................................................51
Fotografia 2 – Cena Filme..............................................................................................66
Fotografia 3 – Cena Filme..............................................................................................70
Fotografia 4 – Cena Filme..............................................................................................74
Fotografia 5 – Cena Filme..............................................................................................91
Fotografia 6 – Cena Filme............................................................................................102
Fotografia 7 – Cena Filme............................................................................................158
11

SUMÁRIO:

RESUMO.............................................................................................................09
INTRODUÇÃO:
Lutar
com
o
Super-8
é
a
Luta
mais
vã.....................................................................................................................................14
1. PRIMEIRA ENTRADA: Do super-8 ao circo jomardiano, em busca do “Palhaço
Degolado”.......................................................................................................................23

1.1.
O
cinema
brasileiro
do
ponto
de
vista
da
grua......................................................................................................................23
1.2.

A potência do Super-8 em Pernambuco...................................................39

1.3. Jomard Muniz de Britto: travessuras de um palhaço sob lona de
concreto................................................................................................................45

2.
SEGUNDA ENTRADA: Gilberto Freyre e a Casa de Detenção da
Cultura......................................................................................................................73
2.1.
2.2.

Gilberto Freyre e a fase pré-mestiçagem................................................75

2.3.

Da fase à face regionalista......................................................................87

2.4.

A Casa Grande de Gilberto Freyre.......................................................104

2.5.
3.

As palavras lançadas e a primeira marcação do debate..........................73

Afrontar as fronteiras............................................................................128

TERCEIRA ENTRADA: A cultura é uma ordem? O Palhaço nos Trópicos
Entrópicos da Pernambucália...........................................................................139
3.1.

As intimidades dos “fora” do poder: fora dos empoderamentos.......139

3.2.

O Palhaço diante das cercas e planilhas político-culturais................141

3.3.

O Movimento Armorial: Disposições Gerais....................................157

3.4.

O Palhaço tira a máscara: Jomard do visual ao textual....................176
12

4. ENTRADA FINAL: As pontes que constroem a cultura em trânsito: as
Contradições
do
Homem
Brasileiro
diante
dos
bordéis
brasilíricos..........................................................................................................189
4.1.
Anos
60:
a
cultura
brasileira
posta
em
questão...............................................................................................................189
4.2. O Palhaço na cela como desdobramento do educador: lembranças do
livro negro da UFPB..........................................................................................209
4.3.

Se joga para o mundo Palhaço! Faz a bailarina tropicalista dançar!.....215

4.4.

Considerações Finais? Até Quando?......................................................235

“O Palhaço Degolado” (texto)...........................................................................239
Bibliografia e fontes..........................................................................................243
Anexos...............................................................................................................262
Fragmentos de um diálogo jomardiano.............................................................263
Bate-papo cinematográfico com Carlos Cordeiro.............................................290
Documentos interessantes..................................................................................298
13

Qualquer coisa tem que pedir autorização [...],
esse processo eu acho que é um equívoco que está acontecendo,
é uma ditadura, é uma nova ditadura da assinatura, da autorização.
(Jomard Muniz de Britto, 2010)
14

INTRODUÇÃO:
Lutar com o Super-8 é a Luta mais vã.1
Atualmente, é possível afirmar que o campo da História aproxima-se
positivamente dos estudos ligados a reflexões em torno do filme enquanto documento
relevante na pesquisa acadêmica, mesmo sabendo que a utilização do filme como objeto
de estudo seja pouco explorada pelos historiadores.
Desde 2006 – quando iniciei minhas primeiras leituras sobre a história do
audiovisual brasileiro – venho percebendo a importância da relação História-Filme nos
meus exercícios criativos e estudos culturais, pois olhar o passado a partir das imagens
em movimento possibilita-nos ampliar as perspectivas sobre uma época, através de uma
articulação relativamente nova, produzindo resultados que enriquecem o diálogo com as
fontes escritas.
Nesse sentido, o trabalho que desenvolvi no mestrado, volta-se a um conjunto de
preocupações que envolvem minha busca e experimentos de leitura para não tornar o
filme um mero objeto ilustrativo, e sim explorar seu elemento estético e narrativo, para
responder às provocações lançadas por ele, atentando para as especificidades da obra,
em diálogo com a ambiência histórica presente na literatura.
O filme, ao ser analisado pelo historiador, não pode ser visto isoladamente –
focando apenas seus componentes estéticos – mas dentro de um complexo que dialogue
a representação visual com as angústias sentidas no campo social, tornando o objeto
fílmico um vestígio que auxilie a iluminar parcela das inquietações históricas de um
período.
Através deste esforço de conjugação entre o visual e o social, esta pesquisa
acredita no recurso fílmico como campo de exploração significativa na pesquisa
histórica, ao adentrar pelas imagens:

[...] que este mundo [...] contém, para chegar à sociedade e à cultura
que são parte dele, produzindo conhecimento histórico de fato novo
[...] compreendendo que o filme não é somente um reflexo de um
mundo pré-existente, não é apenas um resultado ou um pálido reflexo
de um contexto, mas produtor de um contexto próprio.2

1

Jomard Muniz de Britto, no filme “O Palhaço Degolado”, 1977.
SILVA, Jaison Castro. Urbes Negra: melancolia e representação urbana em Noite Vazia (1964), de
Walter Hugo Khouri. 2007. Dissertação de Mestrado (História). Universidade Federal do Piauí, Teresina,
2007, p. 20.
2
15

Meu interesse por essas questões e relações (História-Filme) começou em 2004,
quando participei de um mini-curso de direção cinematográfica realizada por Juliana
Lima e Luciana Baptista. Nessa experiência, pude conhecer o processo de construção de
um filme, sua estrutura de criação estética e a relação afetiva entre os realizadores.
Ao finalizar meu primeiro curta coletivo (“Mundo Mercado Central”), senti que a
partir daquele momento, o caminho a ser seguido era aquele: nas trilhas incertas do
audiovisual. De lá até aqui, tornei-me um videomaker amador e ama-dor, produzindo na
medida do impossível, vídeos experimentais que representam fragmentos-posição e
visão de mundo expresso pelas imagens, que dialogam com minhas angústias pessoais
compartilhadas.
O ato de fazer levou-me ao ato de ler e descobrir minhas referências fundamentais
no cinema brasileiro, investigando novas fontes que foram trazidas por pesquisadores
ímpares nesse processo de INformação, FORmação e DEformação artísticouniversitária: Edwar Castelo Branco, Flávio Reis e Jaislan Monteiro, que me capturaram
para o caos “udigrudi”3 e me apresentaram um universo rico de imagens inicialmente
confusas, dispersas e quase intragáveis à primeira leitura, mas que foram indispensáveis
a minha formação cultural hoje: o Cinema Marginal.
Lentamente fui mergulhando na violência contida no horror e sujeira daquelas
imagens, e o tom grotesco que arrebenta nos “Monstros de Babaloo” e nas piruetas
regadas a coca-cola e macarrão sem tempero, que é engolido vorazmente por Analu
Prestes em “A$suntina das Amérikas” me DEformaram por completo. Desde então,
considero a melhor coisa que já aconteceu aos meus olhos, antes vítima do padrão e
senso comum cinematográfico...
Navegando por outros cinemas brasileiros – de preferência aquelas imagens que
navegam nas bordas do circuito comercial – encontrei no caminho Jomard Muniz de
Britto, artista pernambucano de força estético-política admirável, que dirigiu um variado
conjunto de filmes produzidos em bitola superoito nos anos 70, hoje, amigo de muitas
caminhadas valiosas na Boa Vista, entre o Mustang e os laboratórios de crítica cultural
da Recinfernália.
Dizer quem ele é fica difícil, pois é “tudo junto e misturado ao mesmo tempo”,
mas poderia pretensiosamente enquadrá-lo no que senti em trinta dias de convivência

3

Referente a cinema underground, alternativo, à margem do circuito oficial.
16

diária, mesmo sob os protestos do próprio, na recusa por rótulos e clichês... em uma
palavra: Gentileza.
Além dessa qualidade conquistada por poucos, Jomard tem formação em Filosofia
na Universidade do Recife, trabalhou como professor da Universidade Federal de
Pernambuco e da Universidade Federal da Paraíba, na equipe do educador Paulo Freire,
durante a fase inicial do programa de alfabetização de adultos. Perseguido pelas suas
posições “subversivas”, seu livro “Contradições do Homem Brasileiro” (1964) foi
retirado de circulação e Jomard preso4, no Forte das Cinco Pontas, em Recife.
Nos anos 60, foi afastado das universidades que lecionava. Durante seu
isolamento da academia, ensinou na Escola Superior de Relações Públicas do Recife e
coordenou treinamentos sobre comunicação e criatividade em corporações públicas e
privadas. Com a anistia em 1984, recuperou seu posto universitário.5
Com fortes ligações com a música popular brasileira, escreveu em 1966 o livro
“Do Modernismo à Bossa Nova”, também foi diretor de shows com canções de protesto
e teve vinculação com o Grupo “Construção” e aos atores do grupo teatral “Vivencial
Diversiones”, em Pernambuco.
Considerado um representante vivo-ativo do Tropicalismo no Nordeste, foi autor
de manifestos e textos com forte teor crítico sobre a cultura pernambucano-brasileira,
como “Porque somos e não somos tropicalistas” (1968) e “Inventário do Nosso
Feudalismo Cultural”, este em parceria com Caetano Veloso, Aristides Guimarães,
Gilberto Gil e outros artistas ligados ao movimento.
Jomard sentiu atração pelo tropicalismo devido sua força dessacralizante e
renovadora da cultura brasileira naquele momento, movida por um conjunto de novas
propostas e experimentos provocadores nos campos de atuação cultural.
Sua aproximação com o movimento Tropicalista se deu quando:

Glauber me anunciou, com sua ênfase natural: vem por aí uma nova
turma da Bahia para fazer uma revolução musical... Com essas e
outras palavras. O sinal estava alardeado. Depois, a pedido do Lúcio
Flávio, então diretor de cultura do JC [Jornal do Commércio], escrevi
um longo artigo sobre o primeiro disco individual de Caetano.

4

Disponível em: <http://www.revistaogrito.com/page/blog/2008/09/16/jomard-muniz-de-britto/>. Acesso
em: 04 mar. 2011, às 10h58.
5
Disponível em: <http://pphp.uol.com.br/tropico/html/textos/2604,1.shl>. Acesso em: 05 mar. 2011, às
12h07.
17
Estavam seladas (in) correspondências. Vieram os Manifestos, irados
e alegres.6

Atualmente trabalha com os “Atentados Poéticos”, poemas produzidos
periodicamente e distribuídos em forma de panfletos (distribuídos por ele mão a mão) e
via internet que, segundo Carlos Adriano, é seu suporte para criticar “o panorama
provinciano das mentalidades acomodadas em preconceitos e atrasos. A dura busca da
equação entre invenção e intervenção”.7 Em 2010, foi sujeito-objeto do documentário
“JMB, o Famigerado”, dirigido pela cineasta Luci Alcântara.
Sua relação com o superoito e o vídeo (na década de 80) se deu através da câmera
trazida dos Estados Unidos por uma amiga, que o possibilitou realizar seus primeiros
passos com produção de imagens.
Em depoimento, ele nos conta que o:

[...] caminho para o super 8 foi através de minhas aulas. Não as aulas
da universidade, mas os treinamentos intensivos de comunicação,
principalmente para a Secretaria de Educação, que nós chamávamos
de dinâmica de grupo ou de comunicação criativa. O trabalho que
desenvolvia era fruto de minha formação anterior ligada a Paulo Freire
e da ligação com o Tropicalismo e admiração pela Nouvelle Vague,
mas precisamente Jean-Luc Godard. [...] Assim toda minha transação
de cinema é fruto de um trabalho de professor e de agitador cultural8.

Além de poeta e escritor de livros como: “Terceira aquarela do Brasil” (1982),
“Bordel Brasilírico Bordel” (1992), “Arrecife do desejo” (1994), “Atentados Poéticos”
(2002), coordenador da revista “Marca de Fantasia” (1984), crítico de cinema,
participante de projetos musicais como “Pop Filosofia: o que é isto?” (1997) e “JMB em
Comuna” (2007), atuou como cineclubista (Cine Clube Vigilanti Cura, em Recife,
escrevendo crônicas e ensaios sobre cinema) e crítico de cinema em vários festivais de
superoito pelo país.
Para o pesquisador Rubens Machado, Jomard Muniz de Britto:

6

BRITTO. Jomard Muniz de. Atentados Poéticos. Recife: Edições Bagaço, 2002. p. 329.
Disponível em: <http://www.revistaogrito.com/page/blog/2008/09/16/jomard-muniz-de-britto/>. Acesso
em 04 mar 2011, às 10h58.
8
Depoimento colhido em 02 de janeiro de 1989. In: FIGUEIRÔA, Alexandre. O Cinema Super 8 em
Pernambuco: do lazer doméstico à resistência cultural. Recife: Fundarpe. 1994. p. 46.
7
18
É uma figura que começa a ser lentamente descoberta ou redescoberta
fora de um raio recifense depois de certo ostracismo que, aliás, é
parente do mesmo ostracismo a que ficou relegada toda uma produção
marginal, ligada à contracultura ou à resistência política, e que tem na
realização Super-8 parte bastante expressiva.9

No conjunto multifacetado de filmes realizados por Jomard nos anos 70, a
pesquisa dedica-se ao estudo do mais conhecido deles: “O Palhaço Degolado”,
produzido em Recife, entre 1976/1977. O interesse deu-se devido à abertura que o
audiovisual provocou em mim na compreensão dos conflitos que se estabeleceram em
torno da noção de “Cultura Brasileira”, atravessando o período de radicalização política
nos anos de chumbo10 até a gradual abertura democrática.
Narrado por Jomard Muniz de Britto (que é o personagem central da obra), o
autor veste-se de palhaço e faz uma série de provocações aos “mestres” da cultura
pernambucana, situados nas imagens de Gilberto Freyre e Ariano Suassuna, bem como
às vanguardas artísticas nacionais e internacionais.
Atuando no interior da Casa da Cultura de Recife, suas provocações
concentram-se entre gritos, sussurros e deboches no espaço, locação apropriada pelo
Palhaço para fazer suas declamações, que vai do ataque ao universo contido no
pensamento de Gilberto Freyre, passando pela arqueologia Armorial, até atingir às
esferas “pioneiríssimas” da vanguarda, resultando na sua melancólica prisão.
O Palhaço grita, perambula, rodopia diante da Casa da Cultura pernambucana
(símbolo do patrimônio histórico-cultural estatal) recheando a narrativa com momentos
de carnavalização e chistes, para se contrapor às engrenagens discursivas legitimadoras
da noção de Cultura Brasileira, por parte do estado autoritário.
O que nos constitui enquanto brasileiros? Os discursos em torno da “identidade
nacional” são produzidos no fazer cultural democrático ou por instâncias intelectuais
dominantes? O riso é um agente dessacralizador dos monumentos impenetráveis? Essas
9

Depoimento de Rubens Machado Jr, no debate entre Adilson Ruiz, Antonio C. Fontoura, Miriam
Chnaiderman, José Martinez Corrêa e Poliana Paiva. In: Eu não vim para explicar, eu vim para
confundir. VII ARARIBÓIA: Eu quero é botar meu bloco na rua. Festival de Niterói. Cine Art UFF. 29
nov. 2008. p. 45.
10
Os Anos de Chumbo foram o período mais repressivo da ditadura militar no Brasil, estendendo-se
basicamente do fim de 1968, com a edição do AI-5 em 13 de dezembro daquele ano, até o final do
governo Médici, em março de 1974. Alguns, reservam a expressão "anos de chumbo" especificamente
para o governo Médici. O período se destaca pelo feroz combate entre a extremaesquerda versus extrema-direita, de um lado, e de outro, o aparelho repressivo policial-militar do Estado,
eventualmente apoiado por organizações paramilitares e grandes empresas, tendo como pano de fundo, o
contexto
da Guerra
Fria.
Disponível
em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Anos_de_chumbo#Os_anos_de_chumbo_no_Brasil> Acesso em 02 mar.
2012 às 15h06.
19

foram as primeiras perguntas que me fizeram adentrar o universo jomardiano, depois de
assistir ao filme que compõe esta pesquisa.
A inquietação que o filme causa estimulou a leitura e aprofundamento dos
estudos que investigam a relação entre cultura brasileira, tradição e autoritarismo nos
anos 60/70 no Brasil. Após o levantamento bibliográfico sobre o tema, foi possível
perceber as conexões existentes entre a crítica fílmica e o debate cultural no período em
análise.
Na escrita do texto, decidi mudar o nome de “Capítulos” para “Entradas”, pois,
pelo fato do filme estar atravessado pela temática circense, achei interessante apropriarme da linguagem do circo nas aberturas, para dar significado a cada aprofundamento
temático formulado pela aparição do Palhaço no filme em questão.
O filme é dividido em uma estrutura que remete às esquetes guiadas pelos
palhaços, as cenas ou “entradas” podem se referir – segundo Mário Fernando Bolognesi
– “às paradas circenses, efetuadas como forma de divulgação do espetáculo, quando os
artistas exibem uma síntese dos seus talentos na porta de entrada dos circos”11,
semelhante ao que o palhaço de Jomard realiza em sua performance: anuncia, lança,
provoca, questiona o espectador diante do debate sobre o “Ser” da Cultura Brasileira.
Para colorir o picadeiro, busquei analisar o tema explorando um conjunto
selecionado de cenas que me informam sobre o debate cultural da época, olhando
atentamente para o significado da locação onde foi realizada a filmagem, as citaçõeschave lançados pelo Palhaço e seus movimentos corporais.
Desse modo, esse complexo performático nos indica alguns caminhos possíveis
para compreender em profundidade os degolamentos de Jomard, provocando no
espectador o desejo pela transdegolagem vivencial. Assim, vale lembrar que minha
pesquisa não se apropria somente do filme, como também do cruzamento entre textos,
biografia, ensaios e mapas críticos-conceituais elaborados por Jomard em torno da
cultura brasileira – antes e depois do audiovisual em destaque – pois seus outros
trabalhos possuem estreita relação com o filme, o que torna inviável uma análise isolada
da película, tornando-o uma obra fechad(a)berta, uma extensão experimental de crítica
cultural em processo, que necessita dialogar com outras referências que o constrói e nos
informa historicamente.

11

BOLOGNESI, Mário Fernando. Palhaços. São Paulo. Ed. UNESP. 2003. p. 103.
20

Assim, as “Entradas” que compõem esta pesquisa estão organizadas inicialmente
em quatro momentos:
A primeira Entrada nos leva ao estudo do processo de fortalecimento industrial
cinematográfico brasileiro nos anos 60/70, articulado ao rígido controle do Estado sobre
parcela dos bens culturais produzidos no país. Dedico minha atenção ao estudo sobre os
departamentos criados para fiscalização e promoção do cinema nacional no regime
militar, para compreender como os cineastas circulavam neste contexto, e que
posicionamentos críticos sobre o setor eram tomados no auge da repressão cultural pós64.
Paralelo ao rígido sistema de controle do fazer artístico, a pesquisa esclarece
que, mesmo com os esforços para disciplinar o processo criativo dos cineastas no Brasil,
nem todos vão se adequar ao ritmo do mercado e buscarão caminhos que trafegam na
contramão do circuito exibidor oficial, produzindo filmes em películas mais baratas,
distante das exigências do nacionalismo cultural.
Destaco a força que a bitola superoito provocou na revolução cinematográfica
brasileira, adentrando o debate para a cena pernambucana, expondo primeiramente os
fatos que levaram à construção de um circuito superoitista em Recife, até mergulhar no
universo jomardiano – especificamente no filme em questão – expondo sua relação com
a sociedade recifense e sua elaboração estética.
A segunda Entrada trabalha a análise interna de “O Palhaço Degolado”, a partir
da exploração das cenas iniciais do filme. O primeiro eixo temático exibido está
vinculado à crítica ao sociólogo Gilberto Freyre, onde podemos verificar na fala do
personagem, a construção de um mosaico de referências e conceitos que remetem a
teoria freyreana da cultura brasileira.
Misturando citações e desconstruções paródicas em torno da obra de Freyre, o
Palhaço desafia e desfia as camadas que informam a cultura pela ótica tropicológica.
Sua performance questiona tal visão, em que tomo como ponto de análise o
reagrupamento das concepções que definem o olhar de Gilberto Freyre sobre a cultura
no Brasil, na busca pela compreensão da crítica jomardiana naquele período.
Decidi realizar uma investigação sobre as principais fases intelectuais de
Gilberto Freyre para compreender como sua trajetória política/intelectual influenciou na
legitimação da noção de “Cultura Brasileira” nos anos de Chumbo.
21

O que move o Palhaço no enfrentamento ao universo tropicológico? Por que a
visão freyreana de cultura é o principal alvo de Jomard na produção do filme? Qual a
relação entre Gilberto Freyre e o autoritarismo cultural no regime militar?
A Terceira “Entrada” visa aprofundar as reflexões envolvendo a apropriação do
Estado brasileiro com os discursos que informam a noção de “cultura brasileira” –
marcada por uma perspectiva tradicionalista, inspirada na concepção freyreana de
Brasil.
Busco trabalhar a articulação entre a herança do pensamento de Gilberto Freyre
e os grupos artísticos pós-regionalismo – defensores da preservação da cultura popular –
e sua relação com as novas diretrizes culturais definidas pelo Estado brasileiro (por
meio dos Conselhos Estaduais e Federal de Cultura, bem como a Política Nacional de
Cultura) na década de 70.
Nesse momento do filme, o “Palhaço” encerra suas provocações a Gilberto
Freyre e se desloca para outro campo do debate: a cultura popular nos anos 70 e o
Movimento Armorial. Esta Entrada será dedicada a estudar os elementos estéticopolíticos que constituem o grupo, traçando os caminhos de continuidade e diferença
com a tropicologia, explorada anteriormente, associando tradicionalismo e Estado nos
anos de chumbo.
A Entrada final nos leva ao momento dos embates culturais entre a vanguarda
Tropicalista e os grupos conservadores ligados à esfera estatal pernambucana. O
fechamento do texto é marcado pelo mergulho entre a crítica fílmica e a vida do
cineasta entre os anos 60 e 70 – revelando as pontes que ligam a experiência com Paulo
Freire ao contato com a Pernambucália – expondo as principais razões para filmagem da
obra e seu argumento final, articulado às suas concepções de cultura na fase pré e pós
golpe militar.
O que o “Palhaço Degolado” nos revela para entender a ligação entre tradição e
autoritarismo no Brasil pós-64? O que falta para o riso auto-crítico entrar na pauta dos
conflitos crítico-culturais contemporâneos? Até quando seremos impedidos de pintar
nosso nariz de vermelho e se lambuzar nas páginas canônicas da cultura brasileira? Até
quando os monumentos serão nossos porta-vozes?
22
23

1. PRIMEIRA ENTRADA
DO SUPER-8 AO CIRCO JOMARDIANO: EM BUSCA DO “PALHAÇO
DEGOLADO”
1.1. O cinema brasileiro do ponto de vista da grua12
O processo de engajamento artístico no campo cultural brasileiro nos anos 60/70
possui estreita relação com a consolidação do mercado de bens culturais no regime
militar (1964-1985). Vários segmentos artísticos e industriais ganharam força e
visibilidade nesse período, aliando-se aos pressupostos ideológicos do Estado recéminstaurado.
Enquanto isso, outros grupos foram marginalizados do circuito oficial de
produção e exibição, por não dialogarem com as ideias e projetos impostos pelo
pensamento autoritário. Os vestígios que pulsam neste debate cultural serão expostos ao
longo da pesquisa.
Podemos afirmar inicialmente, que esta polaridade marca uma tensão políticocultural estendida nos anos de chumbo, redefinindo os espaços de disputa simbólica e
produção audiovisual. Tomaremos como objeto de nossa investigação, para que seja
possível compreender a problemática relação entre cinema, identidade cultural brasileira
e Estado, o filme “O Palhaço Degolado”, produzido em 1976-77, pelo cineasta
pernambucano Jomard Muniz de Britto (1937-).
O ponto central que nos leva a refletir sobre o período (1966-1977) está situado
no quadro contextual a seguir, em que podemos visualizar no Brasil, um significativo
crescimento da indústria fonográfica, editorial, automobilística, cinematográfica,
eletroeletrônica, expansão das salas de cinema, entre outras transformações que marcam
um novo sentido em relação às práticas de consumo no país.
Para Renato Ortiz, essa fase é caracterizada pela “expansão, a nível de
produção, de distribuição e de consumo da cultura; é nesta fase que se consolidam os
grandes conglomerados que controlam os meios de comunicação e da cultura popular de
massa”.13 As rápidas mudanças vivenciadas nas produções culturais – ligadas a
execução, distribuição e consumo

–

do período passam pelo filtro e vigilância

constante do Estado, pois, com o advento do regime militar, podemos encontrar ações
que possuem significados distintos, que, por um lado, acaba definindo sua amplitude
12

Consiste de um sistema de guindaste onde a câmera é instalada em uma extremidade e na outra
extremidade é inserido pesos que servem para equilibrar a câmera, criando-se um sistema de gangorra.
13
ORTIZ, Renato. A Moderna Tradição Brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo:
Brasiliense, 2001. p. 121.
24

política, por outro, indica mudanças significativas que se concretizam no nível da
economia e cultura.
Renato Ortiz afirma que a situação histórica naquela época foi marcada pela
repressão, censura, prisões, exílios, mas o autor alerta que, além disso, é preciso mostrar
que o ano de 64 foi também “um momento de reorganização da economia nacional, que
cada vez mais se insere no processo de internacionalização do capital: o Estado
autoritário permite consolidar no Brasil o capitalismo tardio”. 14
A modernização econômica vincula-se ao ideal de “integração nacional”, a partir
da necessidade em ampliar sua rede de influência por meio do “intercâmbio”
ideológico-cultural entre as diversas regiões brasileiras. Para que seja possível alcançar
um nível de circulação das informações, padronizadas no consumo dos produtos
culturais, foi preciso o Estado tomar medidas urgentes para manutenção da ordem
sócio-cultural do país, para evitar que a “massificação” dos produtos estrangeiros
descaracterizassem a “identidade” cultural brasileira.15
A década de 60 foi o período em que podemos encontrar uma clara intenção do
Estado em formalizar as propostas de “planejamento” da cultura, no qual, após a fase
getulista, viveu-se outro momento na história em que ocorreu uma intervenção
sistemática do Estado no campo cultural, a saber: o regime militar instaurado em 1964.
A partir daí, a preocupação dos políticos e intelectuais dirigentes não era em
torno da “criação da nação”, e sim sua integração. No entanto, a cultura é compreendida
como nervo central na “segurança” da nacionalidade. Nesse sentido, o regime militar
planeja não se posicionar como ruptura radical com o passado, se propondo a investir
“na continuidade ao pensamento sobre a cultura nacional, estabelecido durante o
governo Vargas, mantendo certa tradição conservadora e ligando um momento ao
outro”. 16
Em 1966, as diretrizes culturais são reorganizadas em nome da “segurança
nacional”, com o objetivo de mapear as manifestações artísticas no país, em uma
fiscalização rigorosa dos investimentos direcionados à arte, cerceando qualquer
atividade que esteja fora das exigências culturais da “nação”.

14

ORTIZ, 2001. pp. 113-114.
BARBALHO, Alexandre. Estado autoritário brasileiro e cultura nacional: entre a tradição e a
modernidade. In: Brasil, Psicanálise, Ficção e Memória. Revista da Associação Psicanalítica de Porto
Alegre. nº 19. Porto Alegre: APPOA, Out/2000.
16
BARBALHO, 2000, p. 75.
15
25

Todos os setores culturais passam pelo controle estatal, a partir da formação de
departamentos reguladores dos investimentos federais no campo da cultura, para
sistematizar o fluxo de recursos encaminhados do governo para os artistas e instituições.
No amplo conjunto de linguagens artísticas “contempladas” pelo governo,
podemos tomar o cinema como área que vivenciou no país o processo de
institucionalização e reordenamento financeiro no regime militar, a partir da formulação
do Instituto Nacional de Cinema (INC), em novembro de 1966.17
Na forma de “autarquia federal subordinada ao MEC”, o instituto aparece nos
planos de ação do governo para “centralizar a administração do desenvolvimento
cinematográfico, criar normas e recursos, e respeitar uma ‘política liberal’ para a
importação de filmes”.18
O INC é projetado pelo governo para substituir o INCE (Instituto Nacional do
Cinema Educativo), pois este órgão era voltado para difundir o cinema como
instrumento pedagógico, o que diminuía significativamente sua área de atuação no
mercado externo.
Interessado em se desvencilhar desta perspectiva meramente educacional, o
Estado analisa as possibilidades de tornar o cinema uma ferramenta que amplie a área
de influência nas ações político-culturais, que visavam “uma integração cultural a nível
nacional”, e traça medidas que deem chances reais do campo audiovisual tornar-se uma
indústria cinematográfica no Brasil, para concorrer com o mercado estrangeiro.19
A orientação ideológica do INC estava ligada ao industrialismo, através da
“necessidade de a indústria cinematográfica brasileira possuir um eficiente instrumento
de harmonização” na produção do país. Nesse sentido, o INC atuava como instrumento
disciplinador, buscando meios legais de “profissionalizar”

20

a produção audiovisual, a

fim de “valorizar” o papel do cineasta, oferecendo a possibilidade da conquista de seus
direitos fundamentais no mercado.
De acordo com a filosofia do INC, “num país como o nosso, cultural e
etnicamente sincrético, a livre circulação de produtos culturais é um dos imperativos
para que ele se desenvolva”.21 O “Projeto de Criação do Instituto Nacional de Cinema” é
17

Criado em 18 de novembro de 1966, pelo Decreto-lei nº 43, regulamentado pelo Decreto n 60.220, de
15 de fevereiro de 1967.
18
RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, Estado e Lutas Culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1983. p. 51.
19
ORTIZ, Renato. Cultura Brasileira & Identidade Nacional. São Paulo. Ed. Brasiliense, 2006. p. 109.
20
Ibidem, p. 109.
21
Filme & Cultura 5, 1967, pp. 2-4.
26

resultado do esforço estatal em centralizar a administração dos recursos destinados ao
cinema brasileiro.22
Podemos encontrar nos artigos que legitimam sua fundação, os seguintes dados,
que caracterizam sua linha de atuação:

Artigo 4ª, inciso III: regular a produção, distribuição e a exibição de
filmes nacionais;
Capítulo V, artigo 19: o Poder Executivo definirá em decreto, por
proposta do INC, o que é o filme nacional de curta e longa-metragem.
Parágrafo único – Cabe ao INC conceder o certificado correspondente
de cidadania brasileira ao filme produzido no País, nos termos da
definição a que se refere o presente artigo.
Capítulo VII, artigo 28: A censura de filmes cinematográficos, para
todo o território nacional, tanto para exibição em cinemas, como para
exibição em televisão, é da exclusiva competência da União.
Artigo 35: Os produtores, distribuidores e exibidores só poderão
exercer atividades no país depois de registrados no INC.23

A partir do fragmento exposto acima, é possível afirmar que este conjunto de
medidas faz com que o Estado tenha controle na produção, distribuição e exibição dos
filmes. Um meio legal de ampliar a vigilância sobre os produtos audiovisuais
distribuídos para consumo do público em geral, fazendo do INC o responsável pela
liberação de recursos que possibilitem o desenvolvimento do cinema brasileiro.
O levantamento de dados realizado por Renato Ortiz expõe que a presença do
INC foi marcada por fortes mudanças estruturais, bem como na circulação de filmes nas
salas de exibição do país. O autor mostra que, o controle do órgão neste setor se deu
principalmente, na padronização da venda de ingressos nas salas, para intensificar a
fiscalização de parte da receita para o INC, bem como o recolhimento de 40% do
imposto de renda da arrecadação dos filmes estrangeiros.24
A intervenção do Estado no mercado cinematográfico brasileiro altera o ritmo de
produtividade dos filmes neste período. Ortiz afirma que, entre 1957-1966, o número de
longas-metragens lançados no país estava situado numa faixa média de 32 filmes/ano,
enquanto podemos verificar que entre 1967/1969, o número subiu para a média de 50
filmes/ano, fazendo do Brasil, nos anos 70, “o quinto produtor de filmes
cinematográficos”.25
22

Filme & Cultura 1, 1966, p. 61.
Filme & Cultura 2, 1966, pp. 57-59.
24
ORTIZ, 2006, p. 109.
25
Ibidem, pp. 109-110.
23
27

Muitos cineastas – sem opções e espaço para atuarem de modo independente –
acabam por aceitar as determinações impostas pelo INC, na esperança de que o governo
federal se sensibilize com a questão industrial e mercadológica do cinema, exigindo a
criação de leis que protegessem os interesses dos cineastas, para o mercado audiovisual
interno se fortalecer em longo prazo.
Desse modo, o Estado assume a responsabilidade em gerenciar as demandas do
campo cinematográfico, mas este posicionamento só foi viável numa época em que a
crise política do período 60/64 já estava controlada. Assim foi possível criar um órgão
rígido, que não escapava dos planos articulados pelo regime.
Nessa perspectiva, o grupo que atuou na formação do INC, se constituiu a partir
de uma visão empreendedora, em busca do desenvolvimento cinematográfico “oriundo
do período anterior, com uma proposta de cinema brasileiro definida: um cinema de
dimensões industriais, associação com co-produções, com empresas estrangeiras, e
medidas modestamente disciplinadoras da penetração do filme estrangeiro”.26
A linha de produção dos filmes financiados pelo Estado obriga os cineastas “a
trabalhar em conjunto com empresas estrangeiras, no centro de uma realidade capitalista
que se transformava rapidamente”, numa perspectiva que incentiva o crescimento dos
filmes produzidos em larga escala27, mas que em muitos casos gerava confronto entre
cineastas, produtores e o Estado.
O órgão atuava com uma proposta voltada para concretizar a indústria
cinematográfica – ligada ao pensamento racional-desenvolvimentista – movimentandose na rede de contatos e compromissos que se aliava aos interesses do mercado
internacional, procurando estratégias viáveis para a manutenção das produções
cinematográficas no Brasil.
Nesse sentido, a orientação do INC volta-se para promoção do “cinema de
entretenimento, [...] adequado ao mercado consumidor”,28 combatendo qualquer postura
artística que negasse o desenvolvimento do cinema comercial, principalmente os
posicionamentos esteticistas e do chamado “cinema ideológico” em que:

26

RAMOS, 1983, pp. 53-54.
Se no decênio 56-66, [...] dificilmente atingia-se a cifra de 40 filmes anuais, entre 67 e 74 (ano da
mudança de direção e atuação da Embrafilme) chega-se a alcançar a marca dos 80 filmes. Conferir:
RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, Estado e Lutas Culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1983.
28
Ibidem, 1983.
27
28
O esteticismo é atribuído ao cinema de autor, e se encarnaria em
movimentos como a nouvelle vague e o cinema novo. A crítica visa
neste caso toda uma vertente que em princípio, privilegiaria a
qualidade artística da obra em detrimento de sua comunicação.
Também o cinema ideológico, ao se concentrar nas mensagens
políticas, tornar-se-ia hermético e de difícil compreensão do grande
público.29

Segundo Durval Gomes Garcia, diretor responsável pela edição da Revista
“Filme Cultura 9”, o Brasil vive a hora do “cinema total”, sentida “no espírito de soma
dos estímulos do INC” na produção de um “novo cinema brasileiro”30, resultante da
experiência acumulada em todas as fases e ciclos históricos audiovisuais.
Para ele, o “Cinema Total” deve ser “realístico”, pois este elemento revela que o
filme não é apenas um “veículo de comunicação cultural”, e sim um “produto
industrial”. Para que um filme seja reconhecido enquanto obra de arte, ele deve receber
“um bom número de ingressos”, ou será um fracasso industrial, cultural e artístico, pois,
nessas condições, significa que o mesmo não conseguiu estabelecer comunicação direta
com o público. Afirma que a “primeira tarefa do Cinema Total é aproximar o grande
público sem sacrifício do nível qualitativo que já alcançou”.31
O “realístico” faz uma combinação com o caráter exportável, pois os filmes
realizados pelo INC procuram “falar uma linguagem universal e dominar os segredos do
mercado externo, ao criar condições para divulgação e a venda em escala mundial,
através do Plano de Promoção Externa do Cinema Brasileiro”.32
O INC acabou não dialogando com o pensamento de vários cineastas envolvidos
no Cinema Novo, movimento cinematográfico em que os principais artistas estavam
envolvidos em um tipo de linguagem articulada na escavação das bases imagéticas da
cultura brasileira, para imprimi-las de modo crítico-realista no cinema. Seus anseios
entram em sintonia com o desejo de levar ao povo uma imagem em que estes se
identifiquem e reflitam sobre sua condição social, agindo contra o pensamento
mercadológico “alienante”, que estava se configurando naquele momento.
Os cinemanovistas estavam situados no campo de tensão com o INC. Na
tentativa de criar produtoras independentes como a DILFILM (1967) – para não fazer
parte do “cinema burocrático” – na maioria das vezes resultavam em fracasso, pois não

29

ORTIZ, 2006, p. 111.
Filme Cultura 9, Abril de 1968.
31
Filme Cultura 9. A Hora do Cinema Total. Instituto Nacional de Cinema. Abril de 1968. p. 1.
32
Ibidem, p. 1.
30
29

tinham força de concorrência com o mercado estrangeiro e sustentação financeira
sólida.33
Através do artigo de Carlos Guimarães de Mattos Júnior, é possível
compreender como o INC se posiciona diante dos grupos que não se adequam às
exigências do Estado. Em “Diálogos de Planejamento”, publicado na Revista “Filme
Cultura 21”, Carlos critica os chamados filmes experimentais e contestatórios, ao
afirmar que este tipo de linguagem não chama a atenção do público.
Nesta perspectiva, em vez atender os interesses de uma minoria intelectual de
cineastas autorais, o Brasil deveria valorizar a fase onde:

[...] há uma franca procura de narrativas de fácil aceitação popular. O
mais importante é que as diversas tendências da produção
mantenham-se ligadas a capacidade de absorção do público,
reconheçam que as platéias cinematográficas se mostram dia a dia
mais exigentes quanto ao nível técnico e espetacular [...]. 34

Contrapondo este argumento, podemos expor a tensão entre parte dos cineastas
nacionalistas-culturalistas e o Estado, com o depoimento de Glauber Rocha a Frederico
de Cardenas e René Capriles, registrado em 196935, contra as diretrizes comerciais e
posicionamentos do INC em relação ao espectador brasileiro e ao mercado:

O INC tem uma visão colonial do cinema, quer que o cinema
brasileiro seja a imitação do cinema americano, e isto não pode ser. O
cinema brasileiro, posto que cinema oprimido, é oponente natural do
cinema dos EUA. O INC é um órgão ligado ao Ministério da
Educação e Cultura, quando devia ser um órgão independente, do
Ministério da Indústria, e dirigido por economistas e não por
intelectuais. [...] o que queremos é que o Cinema Novo seja o cinema
brasileiro: comunicado-se com o público, tendo seu próprio mercado,
exportando. Que o Cinema Novo seja indústria, com nova
mentalidade, onde o diretor tenha liberdade de criação, em que o
produtor seja técnico em economia, em que a criação se desenvolva
num clima saudável, em que o comercialismo não participe como
usura, [...] em síntese: uma indústria moderna que funcione bem hoje
ou amanhã e com regime político que o Brasil venha a ter.36 (grifos
meus)

33

ORTIZ, 2006, p. 113.
Filme Cultura 21. Diálogos de Planejamento. Instituto Nacional de Cinema. Julho/Agosto de 1972. p.
07.
35
O Transe da América Latina.
36
ROCHA, Glauber. Revolução do Cinema Novo. São Paulo. Cosac Naify, 2004. pp. 185-186.
34
30

Tomando a afirmação de Glauber Rocha como vestígio para compreender o
debate naquela época, é possível visualizar no trecho supracitado as fissuras existentes
entre o Estado e os cineastas, pois não serão todos que aceitaram as ideias estabelecidas
em torno dos investimentos na cultura.
Para garantir a presença do Estado nas decisões no campo audiovisual, as bases
institucionais do cinema serão concretizadas a partir da fundação da Empresa Brasileira
de Filmes (Embrafilme), em setembro de 196937, mudando o quadro de produção
audiovisual no começo dos anos 70. Com a fundação desse órgão, estabelece-se uma
política de atuação estatal responsável pelo aumento das ações de proteção no mercado
e pelo maior espaço para o incentivo da produção nacional.
Criada no auge da repressão do regime militar, a Embrafilme aparece com a
proposta de penetrar no mercado cinematográfico para promover o filme brasileiro no
exterior, fortalecendo sua influência sobre a atividade cinematográfica no país,
principalmente quando seu discurso em torno da integração nacional é intensificado,
juntamente com os outros departamentos ligados à cultura no governo.38
Segundo Lia Bahia, o plano montado para fomentar a cultura audiovisual no
governo militar estava centrado numa perspectiva nacionalista. Isso significa que “a
cultura e os meios de comunicação de massa foram vistos como peças fundamentais
para a integração nacional”, refletindo diretamente “no campo cinematográfico, uma
vez que se vislumbrou uma proposta de indústria [...] para ocupar o mercado de filmes e
estar combinada com o projeto cultural brasileiro”. 39
A Embrafilme se torna uma instituição que centraliza os investimentos
cinematográficos, com o poder de intervenção direta, resultando na extinção do INC em
1975 e criando o Conselho Nacional de Cinema (CONCINE), órgão que atuou no
campo normativo e regulador, fazendo a Embrafilme uma instituição operativa, no
sistema produtivo do cinema brasileiro de forma ampla.
Nesse sentido, a instituição se responsabilizaria pelo financiamento das
produções, distribuindo filmes e garantindo sua exibição, articulando-se conjuntamente
com os exibidores. As medidas ampliam as possibilidades de popularizar o cinema

37

Foi extinta em 16 de março de 1990, pelo Programa Nacional de Desestatização (PND) do governo de
Fernando Collor de Mello.
38
CESÁRIO, Lia Bahia. Uma Análise do campo cinematográfico brasileiro sob a perspectiva industrial.
Universidade Federal Fluminense. Dissertação de Mestrado (Comunicação), 2009. p. 39.
39
Ibidem, pp. 40-41.
31

brasileiro no mercado interno e externo.40 Renato Ortiz afirma que “em 1975 são
produzidos 89 filmes, em 1980, 103 películas e o fluxo de espectadores nas salas de
cinema cresce consideravelmente: em 1971, 203 milhões; atinge em 1976 um pico de
250 milhões”.41
A presença do INC e da Embrafilme pode ser considerada bem sucedida no
crescimento quantitativo das produções audiovisuais no circuito exibidor brasileiro dos
anos 70, mas deve ser enfatizado que, para além desse “sucesso”, existe em suas
dinâmicas operacionais a face autoritária do regime, fazendo do cinema brasileiro não
somente uma manifestação artística, mas também “instrumento de integração nacional.
O cinema neste momento tinha uma função estrutural na cultura, seguindo diretrizes
ideológicas do governo militar”.42
Face exposta por Glauber Rocha, em 1979, quando opina e mostra no programa
“Abertura”, da TV Tupi, todo o inconformismo e diagnóstico de uma crise na cultura,
sentida por muitos artistas desde o golpe militar, afirmação que demonstra claramente o
período em que vamos mergulhar daqui em diante, no filme de Jomard Muniz do Britto.

Estão exercendo terrorismo cultural no meio do cinema, da cultura
toda, da crítica literária, do teatro, da música... quem não estiver
segundo a flauta do MDB, está cortado! Não tem abertura não! [...]
Não tem abertura para os verdadeiros pensadores brasileiros! Há uma
grande chantagem também dentro das Universidades! [...] Me
encontro no Brasil marginalizado e sem ver nenhuma perspectiva de
saída para o cinema, porque eu não vejo nenhuma perspectiva de saída
para o atual sistema econômico que rege o Brasil.43

Apesar do forte aparato técnico-financeiro centralizado nas mãos de instituições
responsáveis por direcionar o processo de investimento no campo cinematográfico e
artístico em geral, de acordo com as regras do jogo impostas pelo Estado, é preciso
enfatizar que “a censura não se define exclusivamente pelo veto a todo e qualquer
produto cultural”.44
Para Ortiz, “ela age como repressão seletiva que impossibilita a emergência de
um determinado pensamento ou obra artística” e não da generalidade de sua produção,

40

CESÁRIO, 2009, pp. 42-45.
ORTIZ, 2001, pp. 124-125.
42
CESÁRIO, p. 46, 2009.
43
Programa Abertura, 1979.
44
ORTIZ, 2001, p. 115.
41
32

portanto, nem sempre os lugares e obras são vigiados por todos os olhos.45 Nesse
sentido, podemos afirmar que o pós-64 se forma como um “momento da história
brasileira onde mais são produzidos e difundidos os bens culturais” 46, caracterizando a
situação cultural por possuir um amplo espaço na circulação desse mercado.
Além de instituições como o Instituto Nacional de Cinema (1966), Conselho
Federal de Cultura (1966) e Embrafilme (1969), instrumentos reguladores do Estado
que visavam implantar, planejar, decidir, julgar, mediar e impor suas forças diante do
corpo social, outro percurso estava sendo trilhado no campo cinematográfico, no qual o
Estado não conseguiu penetrar na sua totalidade.
Em pleno endurecimento do regime político e das instituições que coordenavam
o processo cultural nos anos 60/70, é possível visualizar um conjunto de práticas
culturais que ultrapassam a coerção estatal e as definições políticas no campo
audiovisual.
Nesse período, o Brasil passa pelo processo de diálogo e incorporação de
influências das vanguardas culturais estrangeiras, resultante do intenso encontro entre
artistas brasileiros, europeus e norte-americanos, com exposições de projetos e ideias,
que promovem um contato mais acessível com as novas tendências artísticas, ampliando
as possibilidades de troca e consumo cultural por um público mais amplo.
Cristina Freire aponta que, “com a fuga do mercado, especialmente para os
latinos americanos, [gerou-se] a oportunidade [nos artistas em] subverter a repressão
política e participar do debate internacional”, assegurando até “aos correios o papel
difusor de operações artísticas. [...] Em suma, não apenas as instituições museais, mas
também as linguagens tradicionais se tornam inadequadas frente às proposições de
arte”.47
As transformações no modo em que os artistas percebiam a cultura no país
deram-se pelo avanço acelerado da tecnologia e o aumento da incerteza perante o rumo
que tais novidades iriam tomar, trazendo como consequência a problematização dos
sistemas de pensamento “tradicionais e essencialistas e a crescente perda de sentido de
continuidade entre passado, presente e futuro. O sujeito, nesse cenário, começa a
experimentar uma angústia existencial seguida de profunda crise de identidade”.48
45

ORTIZ, 2001, pp. 114.
Idem, p. 115.
47
FREIRE. Cristina. Poéticas do Processo. São Paulo: Iluminuras, 1999. p. 35.
48
CASTELO BRANCO, Edwar de A. Todos os Dias de Paupéria: Torquato Neto e a Invenção da
Tropicália. São Paulo: Anna Blume, 2005. p. 66.
46
33

O ano de 1967 será marcado pelo fortalecimento e pela livre troca de
informações, entre artistas de diversas áreas, contribuindo para formar um mapa rico de
manifestações voltadas para experimentar novas linguagens e romper com os limites da
esfera artística oficial. Assim, muitos artistas vivenciaram um processo de
desprendimento dos laços que amarravam sua expressão somente a leis de incentivo e as
burocracias de financiamento.
Pensar a prática cultural como algo fechado a decisão dos investimentos do
Estado torna-se cada vez mais complexo, em virtude do rico processo de globalização e
a proximidade dos corpos que se tocam. Corpos que experimentam novas possibilidades
de geração de sentido na arte brasileira.
Apesar do exaustivo esforço de cerceamento elaborado pela política cultural do
regime militar, será ineficaz impedir o aparecimento de novos espaços, suportes e
elementos de criação artística.
Nesse contexto, podemos afirmar que “arte e existência deveriam se sobrepor,
promovendo uma politização do cotidiano e rompendo com as conexões binárias que
pensariam o homem estético e o homem político como instâncias impossíveis em um
mesmo palco”.49 Muitos artistas contemporâneos, frustrados com o processo de
“burocratização das diversas instâncias políticas e até mesmo de setores de esquerda” 50,
sentem a “necessidade de romper com o modo tradicional de definir e fazer política”.51
Desse modo, vários jovens começam a intensificar seus questionamentos e
negações à “racionalidade das formas dominantes de pensamento”.52 E este grito de
discórdia transforma-se no “instrumento desta nova linguagem” 53, em que esses sujeitos
passam a olhar “com desconfiança para o mundo nomeado, problematizando não apenas
categorias objetivas, como o progresso, mas rebelando-se contra os costumes”.54
Podemos verificar que os estilhaços crítico-criativos serão sentidos a partir do
momento em que uma série de elementos misturam-se, através de um variado conjunto
de mecanismos e técnicas expressivas, que serão apropriadas e reinventadas por artistas
ligados à condição poética contemporânea, incorporando à sua prática outros suportes
de expressão.

49

CASTELO BRANCO, 2005.
Ibidem.
51
Ibidem.
52
Ibidem.
53
Ibidem.
54
Ibidem, pp. 71-95.
50
34

Assim, a fotografia, xerox, performance, instalação, música, poesia, vídeo,
superoito serão hibridizados e tratados como recursos voltados para a transitoriedade –
questionando sua própria duração enquanto objeto, arremessando “contra o cotidiano,
procurando desvelar a inconsciência de nossas ações rotineiras”.55 A arte contemporânea
coloca em crise a hegemonia dos monumentos e discursos que impõem sentido
monolítico para as noções de arte e política.
Sobre esse aspecto, Christine Mello nos conta que entre o final dos anos 60 e
início dos 70, “começa a se esboçar outra mentalidade com relação à produção cultural,
em virtude principalmente do aparecimento de obras que transbordam para fora das
especialidades, obras que poderíamos caracterizar como cross-media”,56 a partir da
noção de que elas cruzam “todos os meios de expressão artística, mas sem se limitar a
eles”.57
Para ela, os artistas não se conceituam mais por mídias/suportes, mas através de
“tecnologias, ou por campos artísticos específicos, ou seja, eles já não são mais artistas
plásticos, fotógrafos, cineastas ou videoartistas simplesmente. Pelo contrário, eles
trabalham com conceitos ou projetos que atravessam todas as especificidades” 58, nos
quais as formas utilizadas nas expressões se diversificam “de acordo com as exigências
de cada projeto e são sempre múltiplos ou associados uns ao outros”.59
Essa possibilidade tem início, a partir do momento em que o manuseio das novas
ferramentas de criação são alcançados pelos artistas que ousam experimentar outras
técnicas, descompromissadas com políticas de distribuição, recepção e circulação no
mercado, principalmente no que se refere ao meio cinematográfico profissional.
Suas produções caracterizavam-se na maioria das vezes a um ataque direto às
instituições culturais, ao negar a noção de obra de arte como artefato a ser consumido
passivamente pelo público, promovendo a circulação de informações paralelas ao
campo cultural oficial. A inspiração brotava na “força subversiva da arte e, ao mesmo
tempo, [pelo desejo em] romper o mercantilismo ao tentar compartilhar criações com o
maior número possível de pessoas”.60

55

FREIRE, 1999, p. 28.
MELLO, Christine. Extremidades do Vídeo. São Paulo: Editora Senac, 2008. p. 11.
57
Ibidem, p. 11.
58
Ibidem, p. 11.
59
Ibidem, p. 11.
60
FREIRE, 1999, p. 31.
56
35

Podemos perceber que, além dos filmes financiados pelo Estado, outras obras
audiovisuais são desenvolvidas em suportes mais baratos e de fácil circulação, que irão
também compor o complexo cenário cinematográfico brasileiro. A maioria desses
filmes surge como resultado da democratização e acessibilidade de bitolas e câmeras
portáteis, que se expandem rapidamente no país pelo fato dos novos suportes de registro
cinematográfico (tripés, filtros, lentes, etc.) estarem atrelados a um processo de
inovação tecnológica acelerada.
Desse modo, os artistas têm a possibilidade de construir novas leituras e
experiências audiovisuais, bem como o manuseio de materiais mais leves, em espaços
livres dos estúdios, o que redimensionou a porção criativa das expressões artísticas
contemporâneas.
Com filmes marcados pela radicalidade formal, o experimentalismo brasileiro
traça uma rota alternativa de produção, tomando como suporte fundamental de atuação
e produção, a película 8 mm. Nesse sentido, “a bitola de superoito, espécie de musa e
síntese desses novos equipamentos de filmagem, estimulou o surgimento de novíssimos
‘cineastas’” 61, que iniciam um longo processo de ação fílmica subterrânea em relação
ao circuito cinematográfico comercial.
Os filmes aparecem livres “para olhar o mundo exterior sem pestanejar e para o
mundo interior em moldes complexos e místicos” 62, com imagens livres para serem
poéticas e obscuras. “É livre até mesmo para ensandecer”63, construindo um tipo de
cinema que é possível utilizar:
[...] todos os recursos existentes e os transfigura em novos signos em
alta rotação estética: é um cinema interessado em novas formas para
novas ideias, novos processos narrativos para novas percepções, que
conduzam ao inesperado, explorando novas áreas de consciência,
revelando novos horizontes do improvável.64

A popularidade da película super-8 deu-se a partir da mudança de bitola na
década de sessenta, anteriormente dominada no circuito pelo filme standart 8mm, muito
usada por cineastas amadores, pessoas interessadas em fazer registros caseiros, para

61

SANTOS FILHO, Francisco Aristides de Oliveira; CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar.
Desencantos modernos no cinema brasileiro: contrações e disritmias na filmografia dos anos 60/70. In:
CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho (Org.). História e Ficção. Imperatriz – MA: Ética, 2009. p.63.
62
RENAN, Sheldon. Underground: introdução ao cinema/underground. Tradução de Sérgio Maracajá.
Rio de Janeiro: Lidador, 1970. p. 23.
63
RENAN, 1970. p. 23.
64
FERREIRA, Jairo. Cinema de invenção. São Paulo: Max Limoad, 1986. p. 23.
36

guardar de recordação. Segundo David Beal, “não havia razão para duvidar da
triunfante liderança do 8mm tradicional em popularidade entre amadores”.65
Introduzido no mercado internacional em 1965, a bitola superoito provocou um
conjunto de benefícios e otimização técnica, que amplia para o público consumidor uma
série de novidades para seu uso, substituindo:
[...] quase que completamente o 8 mm tradicional, no que se refere à
manufatura de câmaras cinematográficas para cineasta amador. O
replanejamento do formato do filme tornou possível conseguir um
aumento de aproximadamente 50% na área da imagem [...] o que
permitiu melhor qualidade de imagem sem qualquer aumento no
tamanho da câmara. As perfurações foram colocadas em posição mais
racional, ao lado dos fotogramas e não perto do estreito espaço entre
eles, de modo que, quando um filme é cortado e colado, a emenda fica
mais forte, por não ser sobre a perfuração. O espaço para trilha sonora
foi deixado na margem oposta à das perfurações, proporcionando
melhor qualidade de som. Uma posição de garra padronizada em
câmaras e projetores, e espaço para uma pista de compensação
contribuíram para melhorar a nitidez da imagem66.

As significativas melhorias nas técnicas de filmagem e produção promovidas
pelos filmes superoito geram o aumento da procura deste recurso, principalmente pelo
barateamento dos custos operacionais. O acesso direto no uso do suporte pode ser
exemplificado por Beal, quando afirma que nos anos 70, as “câmaras cinematográficas e
projetores de 8mm tradicional, de segunda mão, podem agora ser adquiridos por uma
fração de seu preço original”.67
Para Sheldon Renan, “o baixo custo de filmes de 8 mm e de 16 mm permite que
qualquer um faça um filme. As câmaras pequenas e os filmes rápidos da década de 60
permitem que se faça a tomada de um filme quase que em qualquer lugar”68, devido a
democratização do acesso, que resulta em produções livres do circuito comercial. “Isso
representa não só a liberdade para fazer filmes, mas também a liberdade de fazê-los
simplesmente por satisfação pessoal e simplesmente em função de padrões estéticos” 69.
Vários cineastas profissionais negaram a importância de seu uso, bem como
tentaram impedir a circulação dos filmes em eventos na área. Essa atitude nos mostra
65

BEAL, John David. Super 8 e outras bitolas em ação. 3ª Ed. Adaptação de Abrão Berman. São Paulo:
Summus, 1976. p. 14.
66
Ibidem, p. 14.
67
Ibidem, p. 14.
68
RENAN, 1970. p. 23.
69
Ibidem, p. 2.
37

que o superoito causou instabilidade na linguagem cinematográfica dos anos 60/70,
pondo em xeque toda uma ordem de coisas que representariam, em última instância, o
cinema brasileiro como patrimônio simbólico da Nação.70
Os filmes de Jomard Muniz de Britto resultam do desejo de experimentar,
através do exercício permanente de crítica cultural, utilizando o recurso audiovisual –
como um dos vários suportes por ele manuseados – para colocar em questão o próprio
cinema enquanto complexo industrial, movido pelas engrenagens que vão desde a
espera na fila ao sistema de comunicação e marketing, para promover o produto
cultural.
Aqui, os filmes circulam em espaços que margeiam os interesses comerciais da
Embrafilme, que planejou “vender” as imagens ideais do Brasil para o mundo, de
acordo com as estratégias da propaganda do serviço de inteligência do governo. Isso nos
leva a entender que este estudo é baseado numa relação história-filme, trabalhando sua
especificidade em diálogo com outros caminhos de escoamento expressivo, ao negar o
oficialismo do cinema-estatal, na busca por vias demarcadoras de tensão e desvio das
estruturas engessantes: “é sempre bom suspeitar da euforia em torno dos prêmios
oferecidos [...] [eles] substituíram o desejo dos debates. É possível utilizar as
premiações para desarticular essas engrenagens oficiosas?” 71
Sobre essas tensões, o multiartista Paulo Bruscky relata que:

Existia [um conflito] entre o pessoal do 16 mm e do super 8 que,
Daniel Santiago fez até um filme sobre essa questão que chama-se O
Duelo, que eu sou um dos protagonistas do filme, só é eu e ele, que é
um duelo mesmo...eu com uma 16 mm e ele com uma super 8, no
jardim botânico onde termina a duas máquinas encontram e ...
(explodem) fica tudo escuro e o barulho de vidro... e o pessoal do 16
mm dizia que o que a gente fazia não era cinema, mas realmente a
gente não tava fazendo cinema, a gente tava fazendo experimento, pra
gente não existia preocupação de fazer cinema, por isso que é uma
coisa mais solta, mais legal por que a gente não fazia questão de ser
chamado cineasta, a gente era experimentalista, a gente não
trabalhava com a questão que eu volto a falar do convencional no
cinema. O pessoal de televisão [atuavam com 16 mm], o pessoal de
publicidade que ficava naquele gueto deles que não admitia que as
brincadeiras da gente fosse levado como cinema entendeu? A

70

CRUZ, 2005, p. 35.
BRITTO, Jomard Muniz de. Há uma borboleta ou uma Gota de Sangue no Super-8? Sem
Identificação. 25/11/77.
71
38
produção do super 8 em Pernambuco, apesar de ser importante,
profícua, eram poucos, não eram muitos não72.

Diante do sistema cinematográfico nacional e internacional – voltado para
interesses comerciais – as produções superoitistas caminhavam na trilha à margem
desse processo, as quais podemos chamar de filmes subterrâneos. Apesar do superoito
ganhar popularidade e receber apoio de algumas instituições para sua realização, os
filmes eram exibidos num circuito paralelo, distante dos processos de distribuição e
comercialização, movidos pelo desinteresse dos órgãos culturais em promover os
filmes, priorizando comercialmente o longa-metragem.
A respeito dessa questão, o cineasta Silvio Back, coordenador do I Festival
Brasileiro do Filme Superoito (1974), em Curitiba, critica a situação em que a bitola se
encontrava nos circuitos de exibição do país:

[...] há a considerar que embora negligenciado pelo cinema
profissional, e assumindo em relação a ele uma posição tanto
falsamente submissa como falsamente superior – o Super 8 [...] deu a
nítida impressão de que, por inocência ou alienação mesmo da maioria
de seus autores, ignora quase todo o complexo econômico-cultural
opressivo que envolve o nosso cinema. Como a sua pedra de toque
principal ainda é a da circulação dos filmes num segmento familiar,
esse avanço entre o que o cinema brasileiro vem produzindo nos
últimos anos e essa produção de laboratório descompromissada de um
retorno financeiro, embora substancial no plano de indagação, é
muitas vezes inócuo, e ele, no fundo, vem a ser mais um dado triste da
conformação cultural a que estamos submetidos. [...] suas sensíveis
conquistas no campo da prática ainda são vegetativas e exigem dos
realizadores uma melhor definição institucional e uma posição mais
articulada com a realidade atual do cinema brasileiro.73

Back destaca a falta de articulação dos superoitistas na cena cultural do período,
ao expor que o nível de produções se torna inócua, pela falta de compromisso com o
fortalecimento de uma ação política que valorize o suporte, carente de representação
institucional que defenda os interesses deste grupo no mercado audiovisual brasileiro,
situação que sofrerá significativas mudanças em Pernambuco e Salvador, como veremos
a seguir.
Independente das críticas e perseguições à bitola, seja no depoimento exposto
por Paulo Bruscky ou Sílvio Back, sua expansão no país foi bastante significativa. No
Nordeste, o boom na produção de filmes neste tipo de película nos anos 70 destacou-se
72

Entrevista realizada por Aristides Oliveira, na tarde de 08 de agosto de 2008, no Real Palace Hotel, às
14h30 em Teresina-PI.
73
Filme Cultura 26, 1974, p. 47.
39

na Bahia e em Pernambuco. Nesse contexto, a cidade de Recife será o espaço a ser
explorado na pesquisa, a fim de situar historicamente a articulação entre os cineastas
que utilizaram a bitola como ferramenta de documentação e resistência cultural.
Inicialmente, realizaremos um levantamento histórico da cena superoitista
pernambucana, para em seguida ver em close a obra fílmica e textual de Jomard Muniz
de Britto, centro de nossas atenções. Após o passeio em cima da grua, mergulharemos
numa seqüência imprevisível de planos médios, planos gerais, planos de conjunto,
contra-plongeés, para visualizar os rodopios e escutar os gritos de um palhaço que
degola e redegola as veredas da tradição cultural brasileira.

1.2. A potência do Superoito em Pernambuco
A cena audiovisual em Recife dos anos 1970 – espaço em que as diretrizes da
Embrafilme não impediam o fluxo criativo das ideias e muito menos a produção de
obras fílmicas em superoito – estava gradativamente fortalecendo-se numa pluralidade
de tendências, estilos e temáticas abordadas na tela.
Segundo Alexandre Figueirôa, o início da década de 70 é marcado por certo
marasmo na produção de filmes. Nesse momento, poucos filmes foram finalizados,
apesar de vários cineastas – no final dos anos 60 – terem articulado projetos
audiovisuais que acabaram “em roteiros não filmados ou obras inacabadas”.74
Necessitava-se com certa urgência – além de coragem e disposição para fazer
financiamentos pessoais na produção dos filmes – criar um espaço para que os mesmos
fossem vistos e difundidos ao público em formação. A preocupação em fazer cinema
superoito de qualidade em Recife fez com que “alguns praticantes do registro amador
[fossem] transcendendo da descontração para a pretensão de trabalhos nitidamente mais
autorais. O lazer doméstico passava a dividir espaço com olhares mais inquietos por trás
do visor”.75
O desejo maior estava na busca de realizar intercâmbio com outros Estados e
artistas, para efetivação de uma rota alternativa ao circuito oficial, que eram dominados
pelas políticas culturais militares integradas ao INC ou a Embrafilme. Nessas condições,
foi fundamental tornar a bitola, além de simples meio de comunicação, um símbolo da
resistência cultural de cineastas engajados na produção que:
74

FIGUEIRÔA, Alexandre. O Cinema Super 8 em Pernambuco: do lazer doméstico à resistência cultural.
Recife. Fundarpe, 1994. p. 43.
75
CRUZ, Marcos Pierry Pereira da. O Super-8 na Bahia: História e Análise. São Paulo: Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Dissertação de mestrado. 2005. p. 14.
40
Dentro da história cinematográfica brasileira, os filmes super-8
reencenaram tanto a tragédia hamletiana quanto as chanchadas da
Atlântida, a cartase pelo sufoco, o gozo e mais gozar dentro das
repressões do AI-5, a sátira pela margem das violentações,
terror/terrir. Ingenuidades. Heterodoxias.76

A luta pelo reconhecimento do superoito como linguagem cinematográfica faz
do ano de 1973 um momento de grande importância para levantar a autoestima dos
cineastas pernambucanos, a partir da aproximação com o circuito superoitista baiano, na
participação da II Jornada Nordestina de Curta Metragem 77, em Salvador nos dias 9 a 15
de setembro.
Para Marcos Pierry, a Jornada é historicamente importante por configurar a
condição geradora de um “marco fundador do superoitismo local, simultaneamente
pavimentam-lhe um circuito específico e consolidam a bitola ao nível de categoria
expressiva”.78
Alexandre Figueirôa traça em sua pesquisa – através de um vasto levantamento
documental – os caminhos e descaminhos que o cinema superoitista em Recife trilhou
para se constituir enquanto circuito em destaque nos anos 70. Aponta que a participação
dos pernambucanos na II Jornada baiana foi bastante positiva, prova disso é a presença
de sete filmes na competição oficial, onde “Missa do Vaqueiro”, de Hugo Caldas leva o
2º lugar no evento.
A notícia estimulou outros cineastas a produzirem filmes, pois agora era possível
que os produtores nordestinos tivessem acesso e posicionamento crítico diante das
“grandes questões do cinema nacional em que se incluía a crescente produção
alternativa com o super-8 que se verificava por todo o país”.79

76

BRITTO, Jomard Muniz de. Vanguarda: um tigre de papel? Superoito: uma onça de celulóide? In:
VERRI, Gilda Maria Whitaker. Registros do passado no presente (Org.). Recife: Bagaço, 2008. p. 275.
77
Em “O Curta-Metragem Brasileiro e as Jornadas de Salvador”, Bráulio Tavares refere-se [...], sem
indicar os realizadores e/ou signatários das proposições resultantes do encontro, resumidas a seguir, que,
em pouco tempo, se revelariam ambíguas, contraditórias e, no limite, preconceituosas: 1. Aumentar a
circulação de filmes em Super-8, sem tentar institucionalizar essa circulação. Não tentar fazer com o
Super-8 um mini-circuito 35 mm, mas aproveitar suas possibilidades para divulgar o cinema fora das
salas tradicionais [...]; Galerias de arte e tevê apontadas como outras possibilidades de circulação dos
filmes; [...] o Super-8 não é considerado como um trampolim para outras bitolas (embora também possa
sê-lo), mas um veículo válido em si. Decorre dessa posição a importância de se procurar fazer produções
baratas, cujos gastos possam ser cobertos com facilidade. Cf: CRUZ, Marcos Pierry Pereira da. O Super-8
na Bahia: História e Análise. São Paulo: Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo,
2005. pp. 17-18.
78
CRUZ, 2005, p. 16.
79
FIGUEIRÔA, 1994, p. 34.
41

A articulação não se deu apenas com filmes inscritos, mas com a presença de
críticos e produtores audiovisuais participando diretamente dos debates desenvolvidos
na Jornada. Podemos citar a apresentação da comunicação de Celso Marconi com o
trabalho intitulado: “Uma experiência: o Cinema de Arte do Recife” e a atuação de
Jomard Muniz de Britto como integrante do júri, gerando um forte interesse nos
jornalistas e artistas em acompanhar a contribuição dos superoitistas na construção de
uma cena alternativa de âmbito nacional.80
O contexto foi marcado pelo desejo de fazer cinema independente, a partir do
“final da década de 1973 ao início de 1974. Em novembro, os filmes participantes da
Jornada de Salvador, são exibidos pela primeira vez para o público de Recife, numa
mostra realizada na Universidade Católica de Pernambuco”.81
Envolvido nos debates superoitistas, Jomard escreve no começo de 1974 “um
artigo no Diário de Pernambuco, que vislumbra o aparecimento de um novo cinema
pernambucano”. Jomard afirma que os cineastas “tinham capacidade de realizar bons
trabalhos e não apenas roteiros que não seriam filmados, afastando assim a ideia do
‘cinema espiritual’ que rondava o cinema pernambucano”.82
O entusiasmo faz o superoito ser visto pelo público como uma bitola respeitada e
muito defendida pelos seus simpatizantes, fazendo de Pernambuco o Estado no
Nordeste com maior produção de filmes nesse formato em 1975, legitimando-o no
campo da produção cinematográfica independente.
Já em 1976, Figueirôa nos mostra que este ano é emblemático para o
amadurecimento do cinema pernambucano, pois, “boa parte dos realizadores [...] já
tinha uma concepção diferente do que significava fazer cinema mesmo com uma bitola
amadora. A euforia da realização continuou, mas a participação de discussões sobre a
situação do cinema brasileiro”

83

possibilitou aos artistas o amadurecimento em torno

das dificuldades na produção dos filmes, “ao mesmo tempo em que lhes dava elementos
de reflexão sobre” a realização dos mesmos.
Nesse período, várias tentativas de implantar espaços e infraestrutura para
incentivar as produções audiovisuais resultaram em fracasso, como a promessa não
cumprida do núcleo de produção ligado ao Cinema Educativo, patrocinado pelo INC,
que nunca foi concretizado.
80

FIGUEIRÔA, 1994, p. 36.
Ibidem, p. 36.
82
Ibidem, p. 37.
83
Ibidem, p. 36.
81
42

Outro empreendimento não realizado foi a criação de um Cinecentro, que
disponibilizaria equipamentos, laboratórios de montagem e assistência técnica, ideia
“presa ao papel”. Diante das dificuldades, os cineastas buscaram outros meios de se
fortalecer artisticamente, pois a falta de apoio era uma realidade que dificultava a
materialização de um cenário cultural duradouro em Recife.
A necessidade de criar uma entidade que defendesse o interesse dos realizadores,
nas suas condições mínimas de produção, além do desejo de organizar um festival na
cidade, surgiu com a fundação do “Grupo 8 de Pernambuco”, em 23 de novembro de
1976 que, um ano depois, ganhou repercussão como entidade aliada ao cinema
superoito. Figuerôa afirma que a criação do grupo84 ajudou a consolidar parcela da
produção dos filmes, bem como o benefício dos cineastas envolvidos com uma
representação constituída.85
Muitos participantes do grupo produziam filmes-documentários, ao registrar as
tradições culturais do Estado, valorizando os aspectos que particularizam a cultura
pernambucana. Os filmes tinham um compromisso realista, com temas voltados para as
festas populares, folclore, artesanato, nomes importantes da cena local, frevo, carnaval,
etc.
O Grupo 8 trabalhou com o objetivo de transformar a entidade num veículo de
representação do cinema superoito em Pernambuco, o que acabou gerando o
afastamento de outros superoitistas dedicados a um processo de trabalho mais estéticoexperimental independente, sem pretensões de associação e obediência aos estatutos
oficiais.
Para Jomard Muniz de Britto:

Ao contrário dos acima descritos, que se notabilizaram por esta
seriedade documental, existiram outros que enveredaram pelos
descaminhos da experimentação. Talvez menos no sentido formal e
muito mais pelo atrevimento das problemáticas, onde fatores eróticos
se misturavam às marcas políticas da oficialidade repressora. Eles
persistiram no slogan: para nada salvar.86

Alexandre Figueirôa aponta que alguns cineastas destacam-se na produção
fílmica experimental, como Amin Stepple, Paulo Cunha, Geneton Moraes, Jomard
Muniz de Britto e Paulo Bruscky. Para Jomard, os filmes produzidos por esse pequeno
84

Os estatutos foram fixados em 11 de janeiro de 1977.
FIGUEIRÔA, 1994, p. 85.
86
BRITTO, 2008, p. 277.
85
43

grupo “se insurgiam e sugeriam uma perspectiva anarco-experimental87, trabalhando a
imagem com um olhar crítico, sem explorá-la somente como um objeto, mas como
acontecimento, campo de forças, sistema de relações que coloca em jogo diferentes
instâncias enunciativas, figurativas e perceptivas”.88
Criticando a institucionalização dos festivais superoitistas e o peso da estética
regionalista em torno da cultura audiovisual nordestina, Jomard Muniz de Britto não
poupa ironia ao comentar na imprensa que o Grupo 8:

[...] precisa ser mimado, curtido e mamado pelos seus abnegados
fundadores. [...] assim sendo, tem um futuro promissor na cultura
pernambucana tão decantada em prosa verso, filme e folia. Através
das alternâncias institucionais com seus inadiáveis oba-obas, se
vislumbra como capital finalidade: sugar as primeiras migalhas da
Grande Mãe Embrafilme. E todo mundo querendo mamar no primeiro
cordão mamesco que aparecer89.

O posicionamento de Jomard Muniz de Britto deixa claro que a cena superoitista
em Recife não era uniforme. Após a III Jornada de Curta Metragem (1974), é visível
que o circuito é dividido pelo grupo ligado ao cineasta Fernando Spencer, “preocupada
em dar ao superoito representatividade cultural”90 oficial e pelos experimentalistas,
desvinculados do cinema sócio-antropológico.91
Esse período também é marcado pela convivência entre rebeldia e censura,
ligadas por uma relação tensa, mesmo com todas as táticas em burlar os instrumentos de
controle da produção cultural. Nesse sentido, a censura trilha novos caminhos de
atuação, “reprimindo e limitando o espaço de criatividade de parcela da juventude que
atuavam no campo artístico, à margem das concepções culturais aceitas no regime
político autoritário”.92
O debate em torno do uso da bitola é intensificado, provocando uma divisão
entre os cineastas ligados ao cinema social, que “refletem a nossa realidade, não se
arriscando desagradar a censura”

93

e os cineastas atuantes numa linha estética mais

radical, experimentando novas possibilidades e rotas do fazer artístico, que desviassem
87

BRITTO, 2008, p. 276.
PARENTE, André; CARVALHO, Victa de. Entre cinema e arte contemporânea. Revista Galáxia. São
Paulo, nº 17, p. 27-40, jun. 2009. p. 3.
89
FIGUEIRÔA, 1994, p. 130.
90
Ibidem, p. 130.
91
Ibidem, p. 53.
92
CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Táticas Caminhantes: cinema marginal e flanâncias juvenis
pela cidade. In: Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 27, nº 53, p. 177-194. 2007. p. 179.
93
FIGUEIRÔA, 1994, p. 126.
88
44

a “sensibilidade ferida dos mais legítimos representantes da sociedade patriarcal
repressora”.94
Atuando como crítico de cinema polêmico nas Jornadas baianas e do circuito
pernambucano, Jomard Muniz de Britto inicia sua produção cinematográfica na década
de 1970, realizando um conjunto de filmes que não fazia parte da configuração
superoitista pernambucana convencional. Preocupado em filmar outras paisagens, que
se distanciavam do documentário expositivo95 tradicional, vinculadas ao desejo de
“preservar”, Jomard seguia à contramão das catalogações salvacionistas da cultura
nordestina:

Seja na crueldade inocente das brigas de galo, mesmo repulsiva apesar
da inédita musicalização, inédita e super cansativa. Seja a previsão
estalinista da chegada de um Papa ao Recife [...]. Entre a dispersão e a
redundância das imagens, o que salvar ou ressalvar? As belas
intenções superoitistas96.

Podemos considerar que a expressão crítica de Jomard Muniz de Britto no
circuito audiovisual pernambucano está diretamente relacionada a uma época em que,
muitos artistas promovem uma rota de navegação à contramão do discurso oficial –
sintonizada com as estratégias de controle da produção cultural – no ritmo gerado pelo
impulso das vanguardas artísticas que anunciam:

[...] coisas inovadoras, [...] no próprio ato diccional, escavando formas
alternativas de se comunicarem. Desse modo, grande parte da energia
crítica dessa geração de descontentes seria canalizada para atividades
até então não utilizadas pelas formas tradicionais de luta política.
Pode-se mesmo dizer que, sob a pressão da mundialização, esses
jovens redescobriram a política forçando-a a escorregar do macro para
o micro, encontrando em diferentes formas de expressão artística os
instrumentos de sua dicção97.

Jomard percebe que o cinema superoito amplia o leque de possibilidades para
refletir sobre o papel do cinema experimental enquanto prática artística, que não se
limita ao circuito exibidor de sua época. Desse modo, “O Palhaço Degolado” redefine e
94

Ibidem, p. 126.
Nesta linha de documentário, há um viés extremamente informativo, onde todo sinal de autoria é
encoberto, bem como o processo de produção. Além disso, sua montagem serve mais para uma
continuidade do argumento do que para estabelecer um ritmo ou padrão formal. Cf: SALES LIMA, Caio
Mário José. O filme dispositivo no contexto da produção do documentário brasileiro nos anos 2000.
Monografia (Comunicação). Faculdade Maurício de Nassau. Recife, 2010, p. 25.
96
BRITTO, 2008, p. 277.
97
CASTELO BRANCO, 2007, p. 179.
95
45

problematiza amplamente o debate cultural em torno do “Ser” da cultura brasileira nos
anos 70, sob o impacto pós-tropicalista98 em Recife.

1.3. Jomard Muniz de Britto: travessuras sob lona de concreto
Dentro do amplo conjunto de artistas ligados ao cinema superoito na década de 70
em Pernambuco, iremos destacar a presença de Jomard Muniz de Britto e aprofundar
suas contribuições na produção cinematográfica brasileira, explorando inicialmente os
caminhos que o levam a participar da cena audiovisual naquele período.
Suas experiências fílmicas iniciam com a produção de três curtas em: “Ensaio de
Androginia”, “Infernolento” e “Babalorixá Mário Miranda”, “Maria Aparecida no
Carnaval”, exibidos na Sala Sérgio Porto, em junho de 1974.99 Longe de captar o
“realismo nordestino”, seus primeiros filmes foram marcados pela falta de preocupação
técnica, mas após o contato com os cinegrafistas Carlos Cordeiro e Rucker Vieira,
houve uma valorização com a captação e montagem, orientados pela experiência
construída entre eles.100
No final de 1974, o número de filmes realizados por ele cresce
significativamente com: “Uma Experiência Didática: o corpo humano”, “Mito e
Contramito da Família Pernambucanobaiana”, “Lixo ou Lixo Cultural” e “Vivencial I”.
O estímulo na produção o mobiliza a organizar o “Festival JMB”, exibindo-os no
auditório do DER (Departamento de Estradas e Rodagem).
Luta contra uma das maiores dificuldades vivenciadas pelo cinema superoito
naquele momento: a falta de circuito exibidor, pois não fazia sentido para os artistas
envolvidos nesse processo finalizarem seus filmes e não ter espaço de exposição e
debate.101

98

Apesar de Jomard Muniz de Britto ter uma participação efetiva no Tropicalismo já na década de
sessenta, decidimos escolher a expressão de Heloísa Buarque de Holanda, por considerar o ano de 1977
(“O Palhaço Degolado”) um momento de extensão e desdobramento do Tropicalismo nas criações
artísticas de Jomard, desse modo, nos apropriamos da noção pós-tropicalista para pensar a ambiência
temporal do filme explorado. Nesse sentindo, a autora afirma que “o fragmento, o mundo espedaçado e a
descontinuidade marcaram definitivamente a produção cultural e a experiência de vida tanto dos
integrantes do movimento tropicalista, quanto daqueles que nos anos imediatamente seguintes
aprofundam essa tendência, num momento que, por conveniência expositiva, chamaremos de póstropicalismo (fins dos anos 60, princípios dos anos 70)”. Cf: HOLANDA, Heloísa Buarque de.
Impressões de Viagem, CPC, vanguarda e desbunde: 1960/1970. 3ª ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. p.
56.
99
FIGUEIRÔA, 1994, pp. 45-46.
100
Ibidem, p. 72.
101
FIGUEIRÔA, 1994, p. 56.
46

Havia uma preocupação com a formação de plateia, pois muitos dos filmes
superoito eram exibidos em mostras particulares, na casa dos realizadores. Promover
exibições restritas não interessava aos cineastas engajados no circuito, que escreviam
nos jornais para mobilizar o máximo de pessoas a comparecerem aos eventos abertos
em andamento na cidade. O Jornal do Commercio foi o espaço mais utilizado para
concretizar as convocações e reflexões em torno da cena audiovisual pernambucana.
No artigo “Amin/que o super 8 saiam das saletas”, publicado na coluna “Arte
Viva”, Celso Marconi afirma que:

Não é nenhuma novidade afirmar que a obra fílmica só se completa
quando é assistida por cem milhões de espectadores. Portanto, é
preciso levar o super 8 aos bordéis, escolas, fábricas, bares, enfim, a
todos os lugares. Logo, é preciso exibir os filmes e não apenas em
saletas. Outra coisa: nossos filmes, não-profissionais, não devem estar
submetidos à mesma norma aplicada (se bem que indevidamente) ao
cinema comercial.102

Jomard sempre trabalhou seus filmes dentro da perspectiva não comercial,
utilizando o recurso audiovisual como poeticidade em trânsito, juntamente com outras
linguagens artísticas (poesia, fotografia, bricolagens textuais, performance) para ensaiar
novos caminhos dentro dos impasses da crítica cultural contemporânea.
Em fevereiro de 1975, o filme “Babalorixá Mário Miranda”, “Maria Aparecida
no Carnaval” e “Vivencial I” são exibidos na I Mostra Recifense do Filme Super 8. A
Mostra obteve repercussão positiva no meio artístico local, já que os filmes
pernambucanos até então só tinham sido vistos em eventos fora da cidade ou apenas
entre os próprios cineastas.103
No festival organizado pelo DCE (Diretório Central dos Estudantes) da
Universidade Federal de Pernambuco, em julho de 1977, seus filmes “Alto Nível
Baixo” e “Discurso Classe Média” são exibidos juntamente com trabalhos de Celso
Marconi e Geneton Moraes.
Após a exibição, foi realizado um debate em torno do conteúdo fílmico, da
relação dos superoitistas com a censura e os aspectos de realização, com ele e outros

102

MARCONI, Celso. Jornal do Commercio. 27 jul. 1977. Amin/que o super 8 saiam das saletas. Coluna
Arte Viva.
103
FIGUEIRÔA, 1994, pp. 57-58.
47

cineastas: Fernando Spencer, Geneton Moraes Neto, Paulinho Menelau, Celso Marconi
e Raimundo Vidarico.104
A necessidade em fazer circular seus trabalhos é concretizada na elaboração de
um programa audiovisual itinerante chamado “Cinevivendo”, que percorria diversos
lugares da cidade para projetar seus filmes e de outros cineastas. O programa tinha
como atividade principal a realização de cine-debates com o público presente, como os
frequentadores de cineclubes, universitários e nos espaços públicos em geral,
esforçando-se para diminuir as lacunas do circuito exibidor superoitista local.
O objetivo do programa “Cinevivendo” era aumentar o acesso às novas
produções realizadas, o que oportunizou a gradativa aproximação de cinéfilos, que antes
desconheciam a cena audiovisual. O estímulo trouxe bons resultados, pois, juntamente
com outros trabalhos paralelos de superoitistas, também interessados na popularização
das exibições de filmes superoito, foi possível fortalecer temporariamente o circuito
superoitista recifense.105
Jomard polemizava as intenções do programa audiovisual no Jornal do
Commercio, por onde transitava seus textos, a partir do contato articulado com o
jornalista e crítico de cinema, Celso Marconi, que trabalhava na empresa. A respeito
deste projeto, Jomard deixa claro que o “Cinevivendo” era um trabalho para expor:

[...] uma realidade cultural em conflito, em debate, em contradição.
Nenhuma pretensão de criar movimento, desde que ‘faz movimento
cultural na província quem dispõe de verbas oficiais e cargos públicos
para seus amigos-discípulos [...]. Nenhum movimento, escola, ou
grupo, embora todas as mo-vi-men-ta-ções para sacudir o puxasaquismo, o ‘calaboquismo’ e o cabotinismo de nossos artistas e
intelectuais muito bem comportados, aliás, ‘nordestinados’. A
Associação dos Servidores da Sudene, através do seu departamento
cultural, vai exibir hoje, a partir das 20 horas em ponto, algumas
dessas experiências filmadas por mim em parceria com Carlos
Cordeiro e Celso Brandão. [...] O PALHAÇO DEGOLADO: [...] um
filme muito “falado” em todos os sentidos da palavra; em síntese, uma
louvação descarada aos Mestres da Cultura Nordestina, Deus e o
Diabo sejam louvados!106

Tal iniciativa nos mostra que, “com tantas exibições e os filmes pernambucanos
alcançando um público cada vez mais interessado, os superoitistas, em especial os do
104

FIGUEIRÔA, 1994, p. 96.
Ibidem, p. 72.
106
BRITTO, Jomard Muniz de. Jornal do Commercio. 14 out. 1977. Jomard Cinevivendo na Sudene.
Coluna Arte Viva.
105
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Dissertação de francisco aristides de oliveira santos filho na ufpi em 2012

  • 1. 1
  • 2. 2 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO - PRPPG CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS – CCHL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO HISTÓRIA DO BRASIL - PPGHB MESTRADO EM HISTÓRIA DO BRASIL - MHB Jomard Muniz de Britto e “O Palhaço Degolado”: laboratório de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós 64. Francisco Aristides de O. Santos Filho. Orientador: Paulo Ângelo de Meneses Sousa. TERESINA-PI. Março 2012
  • 3. 3 FRANCISCO ARISTIDES DE OLIVEIRA SANTOS FILHO Jomard Muniz de Britto e “O Palhaço Degolado”: laboratório de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós-64. Dissertação apresentada à Coordenação do Programa de Pós-Graduação em História do Brasil, do Centro de Ciências Humanas e Letras, da Universidade Federal do Piauí, para obtenção do grau de Mestre em História do Brasil. Orientador: Paulo Ângelo Meneses Sousa. TERESINA-PI 2012
  • 4. 4 FICHA CATALOGRÁFICA Universidade Federal do Piauí Serviço de Processamento Técnico Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco S237j Santos Filho, Francisco Aristides de Oliveira Jomard Muniz de Britto e o palhaço degolado: laboratório de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós 64 / Francisco Aristides de Oliveira Santos Filho.--2012. 302 f.: il Dissertação (Mestrado em História do Universidade Federal do Piauí, Teresina, 2012. Brasil) Orientação: Prof. Dr. Paulo Ângelo Meneses Sousa. 1.Cultura brasileira. 2. Cinema Super- 8. 3. Pernambucália. I. Título. CDD: 301.298 1 –
  • 5. 5 FRANCISCO ARISTIDES DE OLIVEIRA SANTOS FILHO Jomard Muniz de Britto e “O Palhaço Degolado”: laboratório de crítica cultural em tempos de repressão no Brasil pós-64. Dissertação apresentada à Coordenação do Programa de Pós-Graduação em História do Brasil, do Centro de Ciências Humanas e Letras, da Universidade Federal do Piauí, para obtenção do grau de Mestre em História do Brasil. Orientador: Paulo Ângelo Meneses Sousa. Aprovada em: 13/04/2012. BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Ângelo Meneses Sousa (Orientador) Universidade Federal do Piauí ____________________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Marcondes Ferreira Soares (Examinador Externo) Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco _____________________________________________________________ Professor Dr. Edwar de Alencar Castelo Branco (Examinador Interno) Universidade Federal do Piauí _____________________________________________________________ Professor Dr. Denilson Botelho (Suplente) Universidade Federal do Piauí
  • 6. 6 Para a amizade construída na rota Piauí - Pernambuco, entre as caminhadas que cercam o Recife Antigo e o Mustang, é pra ti JMB, que dedico este texto, pela atenção e ensinamento eterno do sentido poético da gentileza como performance diária. Entre os risos, esculhambações e sensibilidades, que faço desse texto um espaço de agradecimento para os amigos-irmãos João Paulo, Landerson e Kim. Pelas noites sem dormir, pela mão que acaricia as tensões, tem um cantinho especialíssimo para Meire, nessa trajetória longa de companheirismo apaixonante. E acima de tudo, meu obrigado à mulher mais incrível desse reino Luso-Tropical, Maria do Carmo, que acorda todos os dias para trabalhar...
  • 7. 7 AGRADECIMENTOS: Primeiramente gostaria de agradecer pelo apoio e orientação do prof. Paulo Ângelo e toda a atenção na banca de qualificação e defesa, com Edwar de Alencar C. Branco e Denilson Botelho. Paulo Marcondes: seus comentários e críticas concretas, amizade e disposição para ampliar meus conhecimentos... te agradeço muito! Meu obrigado também vai para todos os amigos que construí na sala de aula do mestrado, em especial ao Gisvaldo, Aelson, Laécio, Thiago (esse Zara vai dar o que falar...), Ozael e Nercinda. Sem Jonas Souza e Gabriela Uchôa, minha ponte afetiva com Recife em 2011 não seria possível. Jonas foi e é o amigo fundamental no processo de levantamento de dados no arquivo público, pois foi ele quem me abrigou carinhosamente na sua casa, abriu os caminhos para a construção de uma grande amizade (centro de alegria e RPG) e deu abertura para que eu pudesse conhecer três pessoas maravilhas, que devo meus agradecimentos: Giliane Cordeiro (uma menina que tem os olhos brilhantes), Pablo Valle e Diogo Diniz, vocês são ótimos (os filmes de zumbis oitentistas precisam ser revisitados com urgência!). As viradas culturais e as caminhadas por Recife na madrugada me deixam com saudades do carinho de vocês e dessa terra linda! Na Recinfernália, agradeço também aos novos projetos a serem realizados com o amigo-parceiro-pesquisador Amilcar Bezerra, que desde 2008 vem tramando comigo artigos e pesquisas no âmbito da Pernambucália. Pelos encontros valiosos no Delta Expresso é que nossos textos se espalham por aí. Nessa caminhada pelo Nordeste, encontro em Campina Grande minha querida e psicanalista transcendental Saionara, que é responsável pelos meus momentos de riso e reflexão sobre temas que se estendem desde os caminhos do fazer historiográfico às posturas corretas na alimentação. No meio do trajeto, encontro lá em João Pessoa, meu amigo conciliador de sarrafos do Marco Zero, Huoxito Luiz, o homem que me libertou de um quebra-pau, nos pipocos da Nação Zumbi em plena ovulação musical... A Bahia é a terra da moça que sabe mostrar o que é ser carinhosa e gentil, a grande Izabel de Fátima, minha amiga-pesquisadora, que navega comigo nos mares do curta-metragem e pela escatologia poética de Edgard Navarro. Voltando ao Piauí, desço rapidinho na rodoviária de Picos e corro até a casa da Marylu Oliveira e deixo aquele abraço grande, cheio de energia para enfrentar a correria
  • 8. 8 do dia-dia. Aproveito e chamo para sair comigo, pois lá no “Rei do Cangaço” estão esperando a gente para matar um prato de carne-de-sol com a Olívia Candeia, a Nilsângela Cardoso, o Francisco Nascimento, Jaislan Monteiro e o Mairton Celestino, para se rachar de rir e não ter hora para acabar. Para terminar, não posso me esquecer da CAPES/CNPq (pelo financiamento), Dimas Brasileiro Veras, “6ção”, Rafaela Fernandes, Iara, Hérida Jayne, Maria do Carmo Veloso (pessoa incrível que conheci nos batuques do Tambor de Crioula) Lêda Vieira (sempre atenciosa comigo), Celso Marconi, Carlos Cordeiro, Mara Lígia, Marina Vieira, Marília Santos, Padre Erinaldo, Lyndon Jonhson (pela oportunidade que me deu em 2012, na Escola que estou adorando lecionar!), Jeferson, Ernani, Cleto Sandys, Alcides, Teresinha Queiroz, Nina Caminha, Eliane, Denise Veras, Ricardo Maia (que desde 2007, dialoga comigo e colabora na minha pesquisa efetivamente), Demétrios Galvão, Décio Braga, Nalva, Lindalva, Thiago E., Mayra Brandt, Joniel Veras, Wesley Veloso, Benone, Telma Franco (pela atenciosa leitura e comentários firmes), Nayhd, Padre Álvaro (pela confiança), PC, Carlota Lina, Charles Bicalho, Cibelle Leal, Narciso Sousa, Denes Filho, Renata Flávia, Vanderli Silva (pelos preciosos documentos da PNC, que você me enviou de Sampa!), Áurea Paz Pinheiro, Wesley, Jordana, o cara (como era o nome dele?) que tirava as xerox lá em Recife e aguentou as minhas chateações diárias, os dois colegas do arquivo que me abusaram de tanto mandar voltar os jornais... tem muita gente que passou por mim nesses anos de mestrado, agradeço a todos, com ou sem nomeações... vocês estão nessas páginas! Trilha sonora que define cada linha: Neil Young... Mirror Ball.
  • 9. 9 RESUMO O presente trabalho visa estudar os conflitos e confrontos que se estabeleceram em torno da noção de “Cultura Brasileira”, em Pernambuco, durante a década de 70 do século passado. O principal argumento do estudo é a suposição de que as obras de intelectuais tradicionais como Gilberto Freyre e Ariano Suassuna irão conviver, no seu oposto, com uma interlocução radical que encontrará em Jomard Muniz de Britto e em obras como “O Palhaço Degolado” (1976/77) uma de suas maiores expressões póstropicalistas. O filme atua enquanto laboratório experimental de crítica cultural aos “monstros sagrados” da cultura oficial, em tempos de repressão às vozes dissonantes e dessacralizadoras da identidade Brasil, vista na perspectiva de trânsito permanente, rompendo o conservadorismo secular, restrita à sombra dos canaviais. Palavras-chave: Cultura Brasileira, Cinema, Pernambucália. ABSTRACT The present work is intended to study the conflicts and confrontations that were established through the idea of Brazilian Culture, in Pernambuco, during the 1970’s of the last century. The main argument of this study lays on the supposition that the traditional intellectuals’ works such as Gilberto Freyre e Ariano Suassuna may stay side by side, on their opposite, with a radical interlocution criticism which will find through Jomard Muniz de Britto and some works such as O Palhaço Degolado (1976/77) one of his greatest ways of expression in the period after the Tropicalia movement. The movie acts as an experimental study about cultural criticism related to the “sacred monsters” of the official culture during the time of repression to the dissonant and unholy voices, which is seen though a perspective of permanent transition, breaking the secular conservatism restricted to the shadow of the cane plantations. Keywords: Brazilian Culture, Cinema, Pernambucalia.
  • 10. 10 LISTA DE ILUSTRAÇÕES: Fotografia 1 – Diário de Pernambuco.............................................................................51 Fotografia 2 – Cena Filme..............................................................................................66 Fotografia 3 – Cena Filme..............................................................................................70 Fotografia 4 – Cena Filme..............................................................................................74 Fotografia 5 – Cena Filme..............................................................................................91 Fotografia 6 – Cena Filme............................................................................................102 Fotografia 7 – Cena Filme............................................................................................158
  • 11. 11 SUMÁRIO: RESUMO.............................................................................................................09 INTRODUÇÃO: Lutar com o Super-8 é a Luta mais vã.....................................................................................................................................14 1. PRIMEIRA ENTRADA: Do super-8 ao circo jomardiano, em busca do “Palhaço Degolado”.......................................................................................................................23 1.1. O cinema brasileiro do ponto de vista da grua......................................................................................................................23 1.2. A potência do Super-8 em Pernambuco...................................................39 1.3. Jomard Muniz de Britto: travessuras de um palhaço sob lona de concreto................................................................................................................45 2. SEGUNDA ENTRADA: Gilberto Freyre e a Casa de Detenção da Cultura......................................................................................................................73 2.1. 2.2. Gilberto Freyre e a fase pré-mestiçagem................................................75 2.3. Da fase à face regionalista......................................................................87 2.4. A Casa Grande de Gilberto Freyre.......................................................104 2.5. 3. As palavras lançadas e a primeira marcação do debate..........................73 Afrontar as fronteiras............................................................................128 TERCEIRA ENTRADA: A cultura é uma ordem? O Palhaço nos Trópicos Entrópicos da Pernambucália...........................................................................139 3.1. As intimidades dos “fora” do poder: fora dos empoderamentos.......139 3.2. O Palhaço diante das cercas e planilhas político-culturais................141 3.3. O Movimento Armorial: Disposições Gerais....................................157 3.4. O Palhaço tira a máscara: Jomard do visual ao textual....................176
  • 12. 12 4. ENTRADA FINAL: As pontes que constroem a cultura em trânsito: as Contradições do Homem Brasileiro diante dos bordéis brasilíricos..........................................................................................................189 4.1. Anos 60: a cultura brasileira posta em questão...............................................................................................................189 4.2. O Palhaço na cela como desdobramento do educador: lembranças do livro negro da UFPB..........................................................................................209 4.3. Se joga para o mundo Palhaço! Faz a bailarina tropicalista dançar!.....215 4.4. Considerações Finais? Até Quando?......................................................235 “O Palhaço Degolado” (texto)...........................................................................239 Bibliografia e fontes..........................................................................................243 Anexos...............................................................................................................262 Fragmentos de um diálogo jomardiano.............................................................263 Bate-papo cinematográfico com Carlos Cordeiro.............................................290 Documentos interessantes..................................................................................298
  • 13. 13 Qualquer coisa tem que pedir autorização [...], esse processo eu acho que é um equívoco que está acontecendo, é uma ditadura, é uma nova ditadura da assinatura, da autorização. (Jomard Muniz de Britto, 2010)
  • 14. 14 INTRODUÇÃO: Lutar com o Super-8 é a Luta mais vã.1 Atualmente, é possível afirmar que o campo da História aproxima-se positivamente dos estudos ligados a reflexões em torno do filme enquanto documento relevante na pesquisa acadêmica, mesmo sabendo que a utilização do filme como objeto de estudo seja pouco explorada pelos historiadores. Desde 2006 – quando iniciei minhas primeiras leituras sobre a história do audiovisual brasileiro – venho percebendo a importância da relação História-Filme nos meus exercícios criativos e estudos culturais, pois olhar o passado a partir das imagens em movimento possibilita-nos ampliar as perspectivas sobre uma época, através de uma articulação relativamente nova, produzindo resultados que enriquecem o diálogo com as fontes escritas. Nesse sentido, o trabalho que desenvolvi no mestrado, volta-se a um conjunto de preocupações que envolvem minha busca e experimentos de leitura para não tornar o filme um mero objeto ilustrativo, e sim explorar seu elemento estético e narrativo, para responder às provocações lançadas por ele, atentando para as especificidades da obra, em diálogo com a ambiência histórica presente na literatura. O filme, ao ser analisado pelo historiador, não pode ser visto isoladamente – focando apenas seus componentes estéticos – mas dentro de um complexo que dialogue a representação visual com as angústias sentidas no campo social, tornando o objeto fílmico um vestígio que auxilie a iluminar parcela das inquietações históricas de um período. Através deste esforço de conjugação entre o visual e o social, esta pesquisa acredita no recurso fílmico como campo de exploração significativa na pesquisa histórica, ao adentrar pelas imagens: [...] que este mundo [...] contém, para chegar à sociedade e à cultura que são parte dele, produzindo conhecimento histórico de fato novo [...] compreendendo que o filme não é somente um reflexo de um mundo pré-existente, não é apenas um resultado ou um pálido reflexo de um contexto, mas produtor de um contexto próprio.2 1 Jomard Muniz de Britto, no filme “O Palhaço Degolado”, 1977. SILVA, Jaison Castro. Urbes Negra: melancolia e representação urbana em Noite Vazia (1964), de Walter Hugo Khouri. 2007. Dissertação de Mestrado (História). Universidade Federal do Piauí, Teresina, 2007, p. 20. 2
  • 15. 15 Meu interesse por essas questões e relações (História-Filme) começou em 2004, quando participei de um mini-curso de direção cinematográfica realizada por Juliana Lima e Luciana Baptista. Nessa experiência, pude conhecer o processo de construção de um filme, sua estrutura de criação estética e a relação afetiva entre os realizadores. Ao finalizar meu primeiro curta coletivo (“Mundo Mercado Central”), senti que a partir daquele momento, o caminho a ser seguido era aquele: nas trilhas incertas do audiovisual. De lá até aqui, tornei-me um videomaker amador e ama-dor, produzindo na medida do impossível, vídeos experimentais que representam fragmentos-posição e visão de mundo expresso pelas imagens, que dialogam com minhas angústias pessoais compartilhadas. O ato de fazer levou-me ao ato de ler e descobrir minhas referências fundamentais no cinema brasileiro, investigando novas fontes que foram trazidas por pesquisadores ímpares nesse processo de INformação, FORmação e DEformação artísticouniversitária: Edwar Castelo Branco, Flávio Reis e Jaislan Monteiro, que me capturaram para o caos “udigrudi”3 e me apresentaram um universo rico de imagens inicialmente confusas, dispersas e quase intragáveis à primeira leitura, mas que foram indispensáveis a minha formação cultural hoje: o Cinema Marginal. Lentamente fui mergulhando na violência contida no horror e sujeira daquelas imagens, e o tom grotesco que arrebenta nos “Monstros de Babaloo” e nas piruetas regadas a coca-cola e macarrão sem tempero, que é engolido vorazmente por Analu Prestes em “A$suntina das Amérikas” me DEformaram por completo. Desde então, considero a melhor coisa que já aconteceu aos meus olhos, antes vítima do padrão e senso comum cinematográfico... Navegando por outros cinemas brasileiros – de preferência aquelas imagens que navegam nas bordas do circuito comercial – encontrei no caminho Jomard Muniz de Britto, artista pernambucano de força estético-política admirável, que dirigiu um variado conjunto de filmes produzidos em bitola superoito nos anos 70, hoje, amigo de muitas caminhadas valiosas na Boa Vista, entre o Mustang e os laboratórios de crítica cultural da Recinfernália. Dizer quem ele é fica difícil, pois é “tudo junto e misturado ao mesmo tempo”, mas poderia pretensiosamente enquadrá-lo no que senti em trinta dias de convivência 3 Referente a cinema underground, alternativo, à margem do circuito oficial.
  • 16. 16 diária, mesmo sob os protestos do próprio, na recusa por rótulos e clichês... em uma palavra: Gentileza. Além dessa qualidade conquistada por poucos, Jomard tem formação em Filosofia na Universidade do Recife, trabalhou como professor da Universidade Federal de Pernambuco e da Universidade Federal da Paraíba, na equipe do educador Paulo Freire, durante a fase inicial do programa de alfabetização de adultos. Perseguido pelas suas posições “subversivas”, seu livro “Contradições do Homem Brasileiro” (1964) foi retirado de circulação e Jomard preso4, no Forte das Cinco Pontas, em Recife. Nos anos 60, foi afastado das universidades que lecionava. Durante seu isolamento da academia, ensinou na Escola Superior de Relações Públicas do Recife e coordenou treinamentos sobre comunicação e criatividade em corporações públicas e privadas. Com a anistia em 1984, recuperou seu posto universitário.5 Com fortes ligações com a música popular brasileira, escreveu em 1966 o livro “Do Modernismo à Bossa Nova”, também foi diretor de shows com canções de protesto e teve vinculação com o Grupo “Construção” e aos atores do grupo teatral “Vivencial Diversiones”, em Pernambuco. Considerado um representante vivo-ativo do Tropicalismo no Nordeste, foi autor de manifestos e textos com forte teor crítico sobre a cultura pernambucano-brasileira, como “Porque somos e não somos tropicalistas” (1968) e “Inventário do Nosso Feudalismo Cultural”, este em parceria com Caetano Veloso, Aristides Guimarães, Gilberto Gil e outros artistas ligados ao movimento. Jomard sentiu atração pelo tropicalismo devido sua força dessacralizante e renovadora da cultura brasileira naquele momento, movida por um conjunto de novas propostas e experimentos provocadores nos campos de atuação cultural. Sua aproximação com o movimento Tropicalista se deu quando: Glauber me anunciou, com sua ênfase natural: vem por aí uma nova turma da Bahia para fazer uma revolução musical... Com essas e outras palavras. O sinal estava alardeado. Depois, a pedido do Lúcio Flávio, então diretor de cultura do JC [Jornal do Commércio], escrevi um longo artigo sobre o primeiro disco individual de Caetano. 4 Disponível em: <http://www.revistaogrito.com/page/blog/2008/09/16/jomard-muniz-de-britto/>. Acesso em: 04 mar. 2011, às 10h58. 5 Disponível em: <http://pphp.uol.com.br/tropico/html/textos/2604,1.shl>. Acesso em: 05 mar. 2011, às 12h07.
  • 17. 17 Estavam seladas (in) correspondências. Vieram os Manifestos, irados e alegres.6 Atualmente trabalha com os “Atentados Poéticos”, poemas produzidos periodicamente e distribuídos em forma de panfletos (distribuídos por ele mão a mão) e via internet que, segundo Carlos Adriano, é seu suporte para criticar “o panorama provinciano das mentalidades acomodadas em preconceitos e atrasos. A dura busca da equação entre invenção e intervenção”.7 Em 2010, foi sujeito-objeto do documentário “JMB, o Famigerado”, dirigido pela cineasta Luci Alcântara. Sua relação com o superoito e o vídeo (na década de 80) se deu através da câmera trazida dos Estados Unidos por uma amiga, que o possibilitou realizar seus primeiros passos com produção de imagens. Em depoimento, ele nos conta que o: [...] caminho para o super 8 foi através de minhas aulas. Não as aulas da universidade, mas os treinamentos intensivos de comunicação, principalmente para a Secretaria de Educação, que nós chamávamos de dinâmica de grupo ou de comunicação criativa. O trabalho que desenvolvia era fruto de minha formação anterior ligada a Paulo Freire e da ligação com o Tropicalismo e admiração pela Nouvelle Vague, mas precisamente Jean-Luc Godard. [...] Assim toda minha transação de cinema é fruto de um trabalho de professor e de agitador cultural8. Além de poeta e escritor de livros como: “Terceira aquarela do Brasil” (1982), “Bordel Brasilírico Bordel” (1992), “Arrecife do desejo” (1994), “Atentados Poéticos” (2002), coordenador da revista “Marca de Fantasia” (1984), crítico de cinema, participante de projetos musicais como “Pop Filosofia: o que é isto?” (1997) e “JMB em Comuna” (2007), atuou como cineclubista (Cine Clube Vigilanti Cura, em Recife, escrevendo crônicas e ensaios sobre cinema) e crítico de cinema em vários festivais de superoito pelo país. Para o pesquisador Rubens Machado, Jomard Muniz de Britto: 6 BRITTO. Jomard Muniz de. Atentados Poéticos. Recife: Edições Bagaço, 2002. p. 329. Disponível em: <http://www.revistaogrito.com/page/blog/2008/09/16/jomard-muniz-de-britto/>. Acesso em 04 mar 2011, às 10h58. 8 Depoimento colhido em 02 de janeiro de 1989. In: FIGUEIRÔA, Alexandre. O Cinema Super 8 em Pernambuco: do lazer doméstico à resistência cultural. Recife: Fundarpe. 1994. p. 46. 7
  • 18. 18 É uma figura que começa a ser lentamente descoberta ou redescoberta fora de um raio recifense depois de certo ostracismo que, aliás, é parente do mesmo ostracismo a que ficou relegada toda uma produção marginal, ligada à contracultura ou à resistência política, e que tem na realização Super-8 parte bastante expressiva.9 No conjunto multifacetado de filmes realizados por Jomard nos anos 70, a pesquisa dedica-se ao estudo do mais conhecido deles: “O Palhaço Degolado”, produzido em Recife, entre 1976/1977. O interesse deu-se devido à abertura que o audiovisual provocou em mim na compreensão dos conflitos que se estabeleceram em torno da noção de “Cultura Brasileira”, atravessando o período de radicalização política nos anos de chumbo10 até a gradual abertura democrática. Narrado por Jomard Muniz de Britto (que é o personagem central da obra), o autor veste-se de palhaço e faz uma série de provocações aos “mestres” da cultura pernambucana, situados nas imagens de Gilberto Freyre e Ariano Suassuna, bem como às vanguardas artísticas nacionais e internacionais. Atuando no interior da Casa da Cultura de Recife, suas provocações concentram-se entre gritos, sussurros e deboches no espaço, locação apropriada pelo Palhaço para fazer suas declamações, que vai do ataque ao universo contido no pensamento de Gilberto Freyre, passando pela arqueologia Armorial, até atingir às esferas “pioneiríssimas” da vanguarda, resultando na sua melancólica prisão. O Palhaço grita, perambula, rodopia diante da Casa da Cultura pernambucana (símbolo do patrimônio histórico-cultural estatal) recheando a narrativa com momentos de carnavalização e chistes, para se contrapor às engrenagens discursivas legitimadoras da noção de Cultura Brasileira, por parte do estado autoritário. O que nos constitui enquanto brasileiros? Os discursos em torno da “identidade nacional” são produzidos no fazer cultural democrático ou por instâncias intelectuais dominantes? O riso é um agente dessacralizador dos monumentos impenetráveis? Essas 9 Depoimento de Rubens Machado Jr, no debate entre Adilson Ruiz, Antonio C. Fontoura, Miriam Chnaiderman, José Martinez Corrêa e Poliana Paiva. In: Eu não vim para explicar, eu vim para confundir. VII ARARIBÓIA: Eu quero é botar meu bloco na rua. Festival de Niterói. Cine Art UFF. 29 nov. 2008. p. 45. 10 Os Anos de Chumbo foram o período mais repressivo da ditadura militar no Brasil, estendendo-se basicamente do fim de 1968, com a edição do AI-5 em 13 de dezembro daquele ano, até o final do governo Médici, em março de 1974. Alguns, reservam a expressão "anos de chumbo" especificamente para o governo Médici. O período se destaca pelo feroz combate entre a extremaesquerda versus extrema-direita, de um lado, e de outro, o aparelho repressivo policial-militar do Estado, eventualmente apoiado por organizações paramilitares e grandes empresas, tendo como pano de fundo, o contexto da Guerra Fria. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Anos_de_chumbo#Os_anos_de_chumbo_no_Brasil> Acesso em 02 mar. 2012 às 15h06.
  • 19. 19 foram as primeiras perguntas que me fizeram adentrar o universo jomardiano, depois de assistir ao filme que compõe esta pesquisa. A inquietação que o filme causa estimulou a leitura e aprofundamento dos estudos que investigam a relação entre cultura brasileira, tradição e autoritarismo nos anos 60/70 no Brasil. Após o levantamento bibliográfico sobre o tema, foi possível perceber as conexões existentes entre a crítica fílmica e o debate cultural no período em análise. Na escrita do texto, decidi mudar o nome de “Capítulos” para “Entradas”, pois, pelo fato do filme estar atravessado pela temática circense, achei interessante apropriarme da linguagem do circo nas aberturas, para dar significado a cada aprofundamento temático formulado pela aparição do Palhaço no filme em questão. O filme é dividido em uma estrutura que remete às esquetes guiadas pelos palhaços, as cenas ou “entradas” podem se referir – segundo Mário Fernando Bolognesi – “às paradas circenses, efetuadas como forma de divulgação do espetáculo, quando os artistas exibem uma síntese dos seus talentos na porta de entrada dos circos”11, semelhante ao que o palhaço de Jomard realiza em sua performance: anuncia, lança, provoca, questiona o espectador diante do debate sobre o “Ser” da Cultura Brasileira. Para colorir o picadeiro, busquei analisar o tema explorando um conjunto selecionado de cenas que me informam sobre o debate cultural da época, olhando atentamente para o significado da locação onde foi realizada a filmagem, as citaçõeschave lançados pelo Palhaço e seus movimentos corporais. Desse modo, esse complexo performático nos indica alguns caminhos possíveis para compreender em profundidade os degolamentos de Jomard, provocando no espectador o desejo pela transdegolagem vivencial. Assim, vale lembrar que minha pesquisa não se apropria somente do filme, como também do cruzamento entre textos, biografia, ensaios e mapas críticos-conceituais elaborados por Jomard em torno da cultura brasileira – antes e depois do audiovisual em destaque – pois seus outros trabalhos possuem estreita relação com o filme, o que torna inviável uma análise isolada da película, tornando-o uma obra fechad(a)berta, uma extensão experimental de crítica cultural em processo, que necessita dialogar com outras referências que o constrói e nos informa historicamente. 11 BOLOGNESI, Mário Fernando. Palhaços. São Paulo. Ed. UNESP. 2003. p. 103.
  • 20. 20 Assim, as “Entradas” que compõem esta pesquisa estão organizadas inicialmente em quatro momentos: A primeira Entrada nos leva ao estudo do processo de fortalecimento industrial cinematográfico brasileiro nos anos 60/70, articulado ao rígido controle do Estado sobre parcela dos bens culturais produzidos no país. Dedico minha atenção ao estudo sobre os departamentos criados para fiscalização e promoção do cinema nacional no regime militar, para compreender como os cineastas circulavam neste contexto, e que posicionamentos críticos sobre o setor eram tomados no auge da repressão cultural pós64. Paralelo ao rígido sistema de controle do fazer artístico, a pesquisa esclarece que, mesmo com os esforços para disciplinar o processo criativo dos cineastas no Brasil, nem todos vão se adequar ao ritmo do mercado e buscarão caminhos que trafegam na contramão do circuito exibidor oficial, produzindo filmes em películas mais baratas, distante das exigências do nacionalismo cultural. Destaco a força que a bitola superoito provocou na revolução cinematográfica brasileira, adentrando o debate para a cena pernambucana, expondo primeiramente os fatos que levaram à construção de um circuito superoitista em Recife, até mergulhar no universo jomardiano – especificamente no filme em questão – expondo sua relação com a sociedade recifense e sua elaboração estética. A segunda Entrada trabalha a análise interna de “O Palhaço Degolado”, a partir da exploração das cenas iniciais do filme. O primeiro eixo temático exibido está vinculado à crítica ao sociólogo Gilberto Freyre, onde podemos verificar na fala do personagem, a construção de um mosaico de referências e conceitos que remetem a teoria freyreana da cultura brasileira. Misturando citações e desconstruções paródicas em torno da obra de Freyre, o Palhaço desafia e desfia as camadas que informam a cultura pela ótica tropicológica. Sua performance questiona tal visão, em que tomo como ponto de análise o reagrupamento das concepções que definem o olhar de Gilberto Freyre sobre a cultura no Brasil, na busca pela compreensão da crítica jomardiana naquele período. Decidi realizar uma investigação sobre as principais fases intelectuais de Gilberto Freyre para compreender como sua trajetória política/intelectual influenciou na legitimação da noção de “Cultura Brasileira” nos anos de Chumbo.
  • 21. 21 O que move o Palhaço no enfrentamento ao universo tropicológico? Por que a visão freyreana de cultura é o principal alvo de Jomard na produção do filme? Qual a relação entre Gilberto Freyre e o autoritarismo cultural no regime militar? A Terceira “Entrada” visa aprofundar as reflexões envolvendo a apropriação do Estado brasileiro com os discursos que informam a noção de “cultura brasileira” – marcada por uma perspectiva tradicionalista, inspirada na concepção freyreana de Brasil. Busco trabalhar a articulação entre a herança do pensamento de Gilberto Freyre e os grupos artísticos pós-regionalismo – defensores da preservação da cultura popular – e sua relação com as novas diretrizes culturais definidas pelo Estado brasileiro (por meio dos Conselhos Estaduais e Federal de Cultura, bem como a Política Nacional de Cultura) na década de 70. Nesse momento do filme, o “Palhaço” encerra suas provocações a Gilberto Freyre e se desloca para outro campo do debate: a cultura popular nos anos 70 e o Movimento Armorial. Esta Entrada será dedicada a estudar os elementos estéticopolíticos que constituem o grupo, traçando os caminhos de continuidade e diferença com a tropicologia, explorada anteriormente, associando tradicionalismo e Estado nos anos de chumbo. A Entrada final nos leva ao momento dos embates culturais entre a vanguarda Tropicalista e os grupos conservadores ligados à esfera estatal pernambucana. O fechamento do texto é marcado pelo mergulho entre a crítica fílmica e a vida do cineasta entre os anos 60 e 70 – revelando as pontes que ligam a experiência com Paulo Freire ao contato com a Pernambucália – expondo as principais razões para filmagem da obra e seu argumento final, articulado às suas concepções de cultura na fase pré e pós golpe militar. O que o “Palhaço Degolado” nos revela para entender a ligação entre tradição e autoritarismo no Brasil pós-64? O que falta para o riso auto-crítico entrar na pauta dos conflitos crítico-culturais contemporâneos? Até quando seremos impedidos de pintar nosso nariz de vermelho e se lambuzar nas páginas canônicas da cultura brasileira? Até quando os monumentos serão nossos porta-vozes?
  • 22. 22
  • 23. 23 1. PRIMEIRA ENTRADA DO SUPER-8 AO CIRCO JOMARDIANO: EM BUSCA DO “PALHAÇO DEGOLADO” 1.1. O cinema brasileiro do ponto de vista da grua12 O processo de engajamento artístico no campo cultural brasileiro nos anos 60/70 possui estreita relação com a consolidação do mercado de bens culturais no regime militar (1964-1985). Vários segmentos artísticos e industriais ganharam força e visibilidade nesse período, aliando-se aos pressupostos ideológicos do Estado recéminstaurado. Enquanto isso, outros grupos foram marginalizados do circuito oficial de produção e exibição, por não dialogarem com as ideias e projetos impostos pelo pensamento autoritário. Os vestígios que pulsam neste debate cultural serão expostos ao longo da pesquisa. Podemos afirmar inicialmente, que esta polaridade marca uma tensão políticocultural estendida nos anos de chumbo, redefinindo os espaços de disputa simbólica e produção audiovisual. Tomaremos como objeto de nossa investigação, para que seja possível compreender a problemática relação entre cinema, identidade cultural brasileira e Estado, o filme “O Palhaço Degolado”, produzido em 1976-77, pelo cineasta pernambucano Jomard Muniz de Britto (1937-). O ponto central que nos leva a refletir sobre o período (1966-1977) está situado no quadro contextual a seguir, em que podemos visualizar no Brasil, um significativo crescimento da indústria fonográfica, editorial, automobilística, cinematográfica, eletroeletrônica, expansão das salas de cinema, entre outras transformações que marcam um novo sentido em relação às práticas de consumo no país. Para Renato Ortiz, essa fase é caracterizada pela “expansão, a nível de produção, de distribuição e de consumo da cultura; é nesta fase que se consolidam os grandes conglomerados que controlam os meios de comunicação e da cultura popular de massa”.13 As rápidas mudanças vivenciadas nas produções culturais – ligadas a execução, distribuição e consumo – do período passam pelo filtro e vigilância constante do Estado, pois, com o advento do regime militar, podemos encontrar ações que possuem significados distintos, que, por um lado, acaba definindo sua amplitude 12 Consiste de um sistema de guindaste onde a câmera é instalada em uma extremidade e na outra extremidade é inserido pesos que servem para equilibrar a câmera, criando-se um sistema de gangorra. 13 ORTIZ, Renato. A Moderna Tradição Brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo: Brasiliense, 2001. p. 121.
  • 24. 24 política, por outro, indica mudanças significativas que se concretizam no nível da economia e cultura. Renato Ortiz afirma que a situação histórica naquela época foi marcada pela repressão, censura, prisões, exílios, mas o autor alerta que, além disso, é preciso mostrar que o ano de 64 foi também “um momento de reorganização da economia nacional, que cada vez mais se insere no processo de internacionalização do capital: o Estado autoritário permite consolidar no Brasil o capitalismo tardio”. 14 A modernização econômica vincula-se ao ideal de “integração nacional”, a partir da necessidade em ampliar sua rede de influência por meio do “intercâmbio” ideológico-cultural entre as diversas regiões brasileiras. Para que seja possível alcançar um nível de circulação das informações, padronizadas no consumo dos produtos culturais, foi preciso o Estado tomar medidas urgentes para manutenção da ordem sócio-cultural do país, para evitar que a “massificação” dos produtos estrangeiros descaracterizassem a “identidade” cultural brasileira.15 A década de 60 foi o período em que podemos encontrar uma clara intenção do Estado em formalizar as propostas de “planejamento” da cultura, no qual, após a fase getulista, viveu-se outro momento na história em que ocorreu uma intervenção sistemática do Estado no campo cultural, a saber: o regime militar instaurado em 1964. A partir daí, a preocupação dos políticos e intelectuais dirigentes não era em torno da “criação da nação”, e sim sua integração. No entanto, a cultura é compreendida como nervo central na “segurança” da nacionalidade. Nesse sentido, o regime militar planeja não se posicionar como ruptura radical com o passado, se propondo a investir “na continuidade ao pensamento sobre a cultura nacional, estabelecido durante o governo Vargas, mantendo certa tradição conservadora e ligando um momento ao outro”. 16 Em 1966, as diretrizes culturais são reorganizadas em nome da “segurança nacional”, com o objetivo de mapear as manifestações artísticas no país, em uma fiscalização rigorosa dos investimentos direcionados à arte, cerceando qualquer atividade que esteja fora das exigências culturais da “nação”. 14 ORTIZ, 2001. pp. 113-114. BARBALHO, Alexandre. Estado autoritário brasileiro e cultura nacional: entre a tradição e a modernidade. In: Brasil, Psicanálise, Ficção e Memória. Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre. nº 19. Porto Alegre: APPOA, Out/2000. 16 BARBALHO, 2000, p. 75. 15
  • 25. 25 Todos os setores culturais passam pelo controle estatal, a partir da formação de departamentos reguladores dos investimentos federais no campo da cultura, para sistematizar o fluxo de recursos encaminhados do governo para os artistas e instituições. No amplo conjunto de linguagens artísticas “contempladas” pelo governo, podemos tomar o cinema como área que vivenciou no país o processo de institucionalização e reordenamento financeiro no regime militar, a partir da formulação do Instituto Nacional de Cinema (INC), em novembro de 1966.17 Na forma de “autarquia federal subordinada ao MEC”, o instituto aparece nos planos de ação do governo para “centralizar a administração do desenvolvimento cinematográfico, criar normas e recursos, e respeitar uma ‘política liberal’ para a importação de filmes”.18 O INC é projetado pelo governo para substituir o INCE (Instituto Nacional do Cinema Educativo), pois este órgão era voltado para difundir o cinema como instrumento pedagógico, o que diminuía significativamente sua área de atuação no mercado externo. Interessado em se desvencilhar desta perspectiva meramente educacional, o Estado analisa as possibilidades de tornar o cinema uma ferramenta que amplie a área de influência nas ações político-culturais, que visavam “uma integração cultural a nível nacional”, e traça medidas que deem chances reais do campo audiovisual tornar-se uma indústria cinematográfica no Brasil, para concorrer com o mercado estrangeiro.19 A orientação ideológica do INC estava ligada ao industrialismo, através da “necessidade de a indústria cinematográfica brasileira possuir um eficiente instrumento de harmonização” na produção do país. Nesse sentido, o INC atuava como instrumento disciplinador, buscando meios legais de “profissionalizar” 20 a produção audiovisual, a fim de “valorizar” o papel do cineasta, oferecendo a possibilidade da conquista de seus direitos fundamentais no mercado. De acordo com a filosofia do INC, “num país como o nosso, cultural e etnicamente sincrético, a livre circulação de produtos culturais é um dos imperativos para que ele se desenvolva”.21 O “Projeto de Criação do Instituto Nacional de Cinema” é 17 Criado em 18 de novembro de 1966, pelo Decreto-lei nº 43, regulamentado pelo Decreto n 60.220, de 15 de fevereiro de 1967. 18 RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, Estado e Lutas Culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. p. 51. 19 ORTIZ, Renato. Cultura Brasileira & Identidade Nacional. São Paulo. Ed. Brasiliense, 2006. p. 109. 20 Ibidem, p. 109. 21 Filme & Cultura 5, 1967, pp. 2-4.
  • 26. 26 resultado do esforço estatal em centralizar a administração dos recursos destinados ao cinema brasileiro.22 Podemos encontrar nos artigos que legitimam sua fundação, os seguintes dados, que caracterizam sua linha de atuação: Artigo 4ª, inciso III: regular a produção, distribuição e a exibição de filmes nacionais; Capítulo V, artigo 19: o Poder Executivo definirá em decreto, por proposta do INC, o que é o filme nacional de curta e longa-metragem. Parágrafo único – Cabe ao INC conceder o certificado correspondente de cidadania brasileira ao filme produzido no País, nos termos da definição a que se refere o presente artigo. Capítulo VII, artigo 28: A censura de filmes cinematográficos, para todo o território nacional, tanto para exibição em cinemas, como para exibição em televisão, é da exclusiva competência da União. Artigo 35: Os produtores, distribuidores e exibidores só poderão exercer atividades no país depois de registrados no INC.23 A partir do fragmento exposto acima, é possível afirmar que este conjunto de medidas faz com que o Estado tenha controle na produção, distribuição e exibição dos filmes. Um meio legal de ampliar a vigilância sobre os produtos audiovisuais distribuídos para consumo do público em geral, fazendo do INC o responsável pela liberação de recursos que possibilitem o desenvolvimento do cinema brasileiro. O levantamento de dados realizado por Renato Ortiz expõe que a presença do INC foi marcada por fortes mudanças estruturais, bem como na circulação de filmes nas salas de exibição do país. O autor mostra que, o controle do órgão neste setor se deu principalmente, na padronização da venda de ingressos nas salas, para intensificar a fiscalização de parte da receita para o INC, bem como o recolhimento de 40% do imposto de renda da arrecadação dos filmes estrangeiros.24 A intervenção do Estado no mercado cinematográfico brasileiro altera o ritmo de produtividade dos filmes neste período. Ortiz afirma que, entre 1957-1966, o número de longas-metragens lançados no país estava situado numa faixa média de 32 filmes/ano, enquanto podemos verificar que entre 1967/1969, o número subiu para a média de 50 filmes/ano, fazendo do Brasil, nos anos 70, “o quinto produtor de filmes cinematográficos”.25 22 Filme & Cultura 1, 1966, p. 61. Filme & Cultura 2, 1966, pp. 57-59. 24 ORTIZ, 2006, p. 109. 25 Ibidem, pp. 109-110. 23
  • 27. 27 Muitos cineastas – sem opções e espaço para atuarem de modo independente – acabam por aceitar as determinações impostas pelo INC, na esperança de que o governo federal se sensibilize com a questão industrial e mercadológica do cinema, exigindo a criação de leis que protegessem os interesses dos cineastas, para o mercado audiovisual interno se fortalecer em longo prazo. Desse modo, o Estado assume a responsabilidade em gerenciar as demandas do campo cinematográfico, mas este posicionamento só foi viável numa época em que a crise política do período 60/64 já estava controlada. Assim foi possível criar um órgão rígido, que não escapava dos planos articulados pelo regime. Nessa perspectiva, o grupo que atuou na formação do INC, se constituiu a partir de uma visão empreendedora, em busca do desenvolvimento cinematográfico “oriundo do período anterior, com uma proposta de cinema brasileiro definida: um cinema de dimensões industriais, associação com co-produções, com empresas estrangeiras, e medidas modestamente disciplinadoras da penetração do filme estrangeiro”.26 A linha de produção dos filmes financiados pelo Estado obriga os cineastas “a trabalhar em conjunto com empresas estrangeiras, no centro de uma realidade capitalista que se transformava rapidamente”, numa perspectiva que incentiva o crescimento dos filmes produzidos em larga escala27, mas que em muitos casos gerava confronto entre cineastas, produtores e o Estado. O órgão atuava com uma proposta voltada para concretizar a indústria cinematográfica – ligada ao pensamento racional-desenvolvimentista – movimentandose na rede de contatos e compromissos que se aliava aos interesses do mercado internacional, procurando estratégias viáveis para a manutenção das produções cinematográficas no Brasil. Nesse sentido, a orientação do INC volta-se para promoção do “cinema de entretenimento, [...] adequado ao mercado consumidor”,28 combatendo qualquer postura artística que negasse o desenvolvimento do cinema comercial, principalmente os posicionamentos esteticistas e do chamado “cinema ideológico” em que: 26 RAMOS, 1983, pp. 53-54. Se no decênio 56-66, [...] dificilmente atingia-se a cifra de 40 filmes anuais, entre 67 e 74 (ano da mudança de direção e atuação da Embrafilme) chega-se a alcançar a marca dos 80 filmes. Conferir: RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, Estado e Lutas Culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. 28 Ibidem, 1983. 27
  • 28. 28 O esteticismo é atribuído ao cinema de autor, e se encarnaria em movimentos como a nouvelle vague e o cinema novo. A crítica visa neste caso toda uma vertente que em princípio, privilegiaria a qualidade artística da obra em detrimento de sua comunicação. Também o cinema ideológico, ao se concentrar nas mensagens políticas, tornar-se-ia hermético e de difícil compreensão do grande público.29 Segundo Durval Gomes Garcia, diretor responsável pela edição da Revista “Filme Cultura 9”, o Brasil vive a hora do “cinema total”, sentida “no espírito de soma dos estímulos do INC” na produção de um “novo cinema brasileiro”30, resultante da experiência acumulada em todas as fases e ciclos históricos audiovisuais. Para ele, o “Cinema Total” deve ser “realístico”, pois este elemento revela que o filme não é apenas um “veículo de comunicação cultural”, e sim um “produto industrial”. Para que um filme seja reconhecido enquanto obra de arte, ele deve receber “um bom número de ingressos”, ou será um fracasso industrial, cultural e artístico, pois, nessas condições, significa que o mesmo não conseguiu estabelecer comunicação direta com o público. Afirma que a “primeira tarefa do Cinema Total é aproximar o grande público sem sacrifício do nível qualitativo que já alcançou”.31 O “realístico” faz uma combinação com o caráter exportável, pois os filmes realizados pelo INC procuram “falar uma linguagem universal e dominar os segredos do mercado externo, ao criar condições para divulgação e a venda em escala mundial, através do Plano de Promoção Externa do Cinema Brasileiro”.32 O INC acabou não dialogando com o pensamento de vários cineastas envolvidos no Cinema Novo, movimento cinematográfico em que os principais artistas estavam envolvidos em um tipo de linguagem articulada na escavação das bases imagéticas da cultura brasileira, para imprimi-las de modo crítico-realista no cinema. Seus anseios entram em sintonia com o desejo de levar ao povo uma imagem em que estes se identifiquem e reflitam sobre sua condição social, agindo contra o pensamento mercadológico “alienante”, que estava se configurando naquele momento. Os cinemanovistas estavam situados no campo de tensão com o INC. Na tentativa de criar produtoras independentes como a DILFILM (1967) – para não fazer parte do “cinema burocrático” – na maioria das vezes resultavam em fracasso, pois não 29 ORTIZ, 2006, p. 111. Filme Cultura 9, Abril de 1968. 31 Filme Cultura 9. A Hora do Cinema Total. Instituto Nacional de Cinema. Abril de 1968. p. 1. 32 Ibidem, p. 1. 30
  • 29. 29 tinham força de concorrência com o mercado estrangeiro e sustentação financeira sólida.33 Através do artigo de Carlos Guimarães de Mattos Júnior, é possível compreender como o INC se posiciona diante dos grupos que não se adequam às exigências do Estado. Em “Diálogos de Planejamento”, publicado na Revista “Filme Cultura 21”, Carlos critica os chamados filmes experimentais e contestatórios, ao afirmar que este tipo de linguagem não chama a atenção do público. Nesta perspectiva, em vez atender os interesses de uma minoria intelectual de cineastas autorais, o Brasil deveria valorizar a fase onde: [...] há uma franca procura de narrativas de fácil aceitação popular. O mais importante é que as diversas tendências da produção mantenham-se ligadas a capacidade de absorção do público, reconheçam que as platéias cinematográficas se mostram dia a dia mais exigentes quanto ao nível técnico e espetacular [...]. 34 Contrapondo este argumento, podemos expor a tensão entre parte dos cineastas nacionalistas-culturalistas e o Estado, com o depoimento de Glauber Rocha a Frederico de Cardenas e René Capriles, registrado em 196935, contra as diretrizes comerciais e posicionamentos do INC em relação ao espectador brasileiro e ao mercado: O INC tem uma visão colonial do cinema, quer que o cinema brasileiro seja a imitação do cinema americano, e isto não pode ser. O cinema brasileiro, posto que cinema oprimido, é oponente natural do cinema dos EUA. O INC é um órgão ligado ao Ministério da Educação e Cultura, quando devia ser um órgão independente, do Ministério da Indústria, e dirigido por economistas e não por intelectuais. [...] o que queremos é que o Cinema Novo seja o cinema brasileiro: comunicado-se com o público, tendo seu próprio mercado, exportando. Que o Cinema Novo seja indústria, com nova mentalidade, onde o diretor tenha liberdade de criação, em que o produtor seja técnico em economia, em que a criação se desenvolva num clima saudável, em que o comercialismo não participe como usura, [...] em síntese: uma indústria moderna que funcione bem hoje ou amanhã e com regime político que o Brasil venha a ter.36 (grifos meus) 33 ORTIZ, 2006, p. 113. Filme Cultura 21. Diálogos de Planejamento. Instituto Nacional de Cinema. Julho/Agosto de 1972. p. 07. 35 O Transe da América Latina. 36 ROCHA, Glauber. Revolução do Cinema Novo. São Paulo. Cosac Naify, 2004. pp. 185-186. 34
  • 30. 30 Tomando a afirmação de Glauber Rocha como vestígio para compreender o debate naquela época, é possível visualizar no trecho supracitado as fissuras existentes entre o Estado e os cineastas, pois não serão todos que aceitaram as ideias estabelecidas em torno dos investimentos na cultura. Para garantir a presença do Estado nas decisões no campo audiovisual, as bases institucionais do cinema serão concretizadas a partir da fundação da Empresa Brasileira de Filmes (Embrafilme), em setembro de 196937, mudando o quadro de produção audiovisual no começo dos anos 70. Com a fundação desse órgão, estabelece-se uma política de atuação estatal responsável pelo aumento das ações de proteção no mercado e pelo maior espaço para o incentivo da produção nacional. Criada no auge da repressão do regime militar, a Embrafilme aparece com a proposta de penetrar no mercado cinematográfico para promover o filme brasileiro no exterior, fortalecendo sua influência sobre a atividade cinematográfica no país, principalmente quando seu discurso em torno da integração nacional é intensificado, juntamente com os outros departamentos ligados à cultura no governo.38 Segundo Lia Bahia, o plano montado para fomentar a cultura audiovisual no governo militar estava centrado numa perspectiva nacionalista. Isso significa que “a cultura e os meios de comunicação de massa foram vistos como peças fundamentais para a integração nacional”, refletindo diretamente “no campo cinematográfico, uma vez que se vislumbrou uma proposta de indústria [...] para ocupar o mercado de filmes e estar combinada com o projeto cultural brasileiro”. 39 A Embrafilme se torna uma instituição que centraliza os investimentos cinematográficos, com o poder de intervenção direta, resultando na extinção do INC em 1975 e criando o Conselho Nacional de Cinema (CONCINE), órgão que atuou no campo normativo e regulador, fazendo a Embrafilme uma instituição operativa, no sistema produtivo do cinema brasileiro de forma ampla. Nesse sentido, a instituição se responsabilizaria pelo financiamento das produções, distribuindo filmes e garantindo sua exibição, articulando-se conjuntamente com os exibidores. As medidas ampliam as possibilidades de popularizar o cinema 37 Foi extinta em 16 de março de 1990, pelo Programa Nacional de Desestatização (PND) do governo de Fernando Collor de Mello. 38 CESÁRIO, Lia Bahia. Uma Análise do campo cinematográfico brasileiro sob a perspectiva industrial. Universidade Federal Fluminense. Dissertação de Mestrado (Comunicação), 2009. p. 39. 39 Ibidem, pp. 40-41.
  • 31. 31 brasileiro no mercado interno e externo.40 Renato Ortiz afirma que “em 1975 são produzidos 89 filmes, em 1980, 103 películas e o fluxo de espectadores nas salas de cinema cresce consideravelmente: em 1971, 203 milhões; atinge em 1976 um pico de 250 milhões”.41 A presença do INC e da Embrafilme pode ser considerada bem sucedida no crescimento quantitativo das produções audiovisuais no circuito exibidor brasileiro dos anos 70, mas deve ser enfatizado que, para além desse “sucesso”, existe em suas dinâmicas operacionais a face autoritária do regime, fazendo do cinema brasileiro não somente uma manifestação artística, mas também “instrumento de integração nacional. O cinema neste momento tinha uma função estrutural na cultura, seguindo diretrizes ideológicas do governo militar”.42 Face exposta por Glauber Rocha, em 1979, quando opina e mostra no programa “Abertura”, da TV Tupi, todo o inconformismo e diagnóstico de uma crise na cultura, sentida por muitos artistas desde o golpe militar, afirmação que demonstra claramente o período em que vamos mergulhar daqui em diante, no filme de Jomard Muniz do Britto. Estão exercendo terrorismo cultural no meio do cinema, da cultura toda, da crítica literária, do teatro, da música... quem não estiver segundo a flauta do MDB, está cortado! Não tem abertura não! [...] Não tem abertura para os verdadeiros pensadores brasileiros! Há uma grande chantagem também dentro das Universidades! [...] Me encontro no Brasil marginalizado e sem ver nenhuma perspectiva de saída para o cinema, porque eu não vejo nenhuma perspectiva de saída para o atual sistema econômico que rege o Brasil.43 Apesar do forte aparato técnico-financeiro centralizado nas mãos de instituições responsáveis por direcionar o processo de investimento no campo cinematográfico e artístico em geral, de acordo com as regras do jogo impostas pelo Estado, é preciso enfatizar que “a censura não se define exclusivamente pelo veto a todo e qualquer produto cultural”.44 Para Ortiz, “ela age como repressão seletiva que impossibilita a emergência de um determinado pensamento ou obra artística” e não da generalidade de sua produção, 40 CESÁRIO, 2009, pp. 42-45. ORTIZ, 2001, pp. 124-125. 42 CESÁRIO, p. 46, 2009. 43 Programa Abertura, 1979. 44 ORTIZ, 2001, p. 115. 41
  • 32. 32 portanto, nem sempre os lugares e obras são vigiados por todos os olhos.45 Nesse sentido, podemos afirmar que o pós-64 se forma como um “momento da história brasileira onde mais são produzidos e difundidos os bens culturais” 46, caracterizando a situação cultural por possuir um amplo espaço na circulação desse mercado. Além de instituições como o Instituto Nacional de Cinema (1966), Conselho Federal de Cultura (1966) e Embrafilme (1969), instrumentos reguladores do Estado que visavam implantar, planejar, decidir, julgar, mediar e impor suas forças diante do corpo social, outro percurso estava sendo trilhado no campo cinematográfico, no qual o Estado não conseguiu penetrar na sua totalidade. Em pleno endurecimento do regime político e das instituições que coordenavam o processo cultural nos anos 60/70, é possível visualizar um conjunto de práticas culturais que ultrapassam a coerção estatal e as definições políticas no campo audiovisual. Nesse período, o Brasil passa pelo processo de diálogo e incorporação de influências das vanguardas culturais estrangeiras, resultante do intenso encontro entre artistas brasileiros, europeus e norte-americanos, com exposições de projetos e ideias, que promovem um contato mais acessível com as novas tendências artísticas, ampliando as possibilidades de troca e consumo cultural por um público mais amplo. Cristina Freire aponta que, “com a fuga do mercado, especialmente para os latinos americanos, [gerou-se] a oportunidade [nos artistas em] subverter a repressão política e participar do debate internacional”, assegurando até “aos correios o papel difusor de operações artísticas. [...] Em suma, não apenas as instituições museais, mas também as linguagens tradicionais se tornam inadequadas frente às proposições de arte”.47 As transformações no modo em que os artistas percebiam a cultura no país deram-se pelo avanço acelerado da tecnologia e o aumento da incerteza perante o rumo que tais novidades iriam tomar, trazendo como consequência a problematização dos sistemas de pensamento “tradicionais e essencialistas e a crescente perda de sentido de continuidade entre passado, presente e futuro. O sujeito, nesse cenário, começa a experimentar uma angústia existencial seguida de profunda crise de identidade”.48 45 ORTIZ, 2001, pp. 114. Idem, p. 115. 47 FREIRE. Cristina. Poéticas do Processo. São Paulo: Iluminuras, 1999. p. 35. 48 CASTELO BRANCO, Edwar de A. Todos os Dias de Paupéria: Torquato Neto e a Invenção da Tropicália. São Paulo: Anna Blume, 2005. p. 66. 46
  • 33. 33 O ano de 1967 será marcado pelo fortalecimento e pela livre troca de informações, entre artistas de diversas áreas, contribuindo para formar um mapa rico de manifestações voltadas para experimentar novas linguagens e romper com os limites da esfera artística oficial. Assim, muitos artistas vivenciaram um processo de desprendimento dos laços que amarravam sua expressão somente a leis de incentivo e as burocracias de financiamento. Pensar a prática cultural como algo fechado a decisão dos investimentos do Estado torna-se cada vez mais complexo, em virtude do rico processo de globalização e a proximidade dos corpos que se tocam. Corpos que experimentam novas possibilidades de geração de sentido na arte brasileira. Apesar do exaustivo esforço de cerceamento elaborado pela política cultural do regime militar, será ineficaz impedir o aparecimento de novos espaços, suportes e elementos de criação artística. Nesse contexto, podemos afirmar que “arte e existência deveriam se sobrepor, promovendo uma politização do cotidiano e rompendo com as conexões binárias que pensariam o homem estético e o homem político como instâncias impossíveis em um mesmo palco”.49 Muitos artistas contemporâneos, frustrados com o processo de “burocratização das diversas instâncias políticas e até mesmo de setores de esquerda” 50, sentem a “necessidade de romper com o modo tradicional de definir e fazer política”.51 Desse modo, vários jovens começam a intensificar seus questionamentos e negações à “racionalidade das formas dominantes de pensamento”.52 E este grito de discórdia transforma-se no “instrumento desta nova linguagem” 53, em que esses sujeitos passam a olhar “com desconfiança para o mundo nomeado, problematizando não apenas categorias objetivas, como o progresso, mas rebelando-se contra os costumes”.54 Podemos verificar que os estilhaços crítico-criativos serão sentidos a partir do momento em que uma série de elementos misturam-se, através de um variado conjunto de mecanismos e técnicas expressivas, que serão apropriadas e reinventadas por artistas ligados à condição poética contemporânea, incorporando à sua prática outros suportes de expressão. 49 CASTELO BRANCO, 2005. Ibidem. 51 Ibidem. 52 Ibidem. 53 Ibidem. 54 Ibidem, pp. 71-95. 50
  • 34. 34 Assim, a fotografia, xerox, performance, instalação, música, poesia, vídeo, superoito serão hibridizados e tratados como recursos voltados para a transitoriedade – questionando sua própria duração enquanto objeto, arremessando “contra o cotidiano, procurando desvelar a inconsciência de nossas ações rotineiras”.55 A arte contemporânea coloca em crise a hegemonia dos monumentos e discursos que impõem sentido monolítico para as noções de arte e política. Sobre esse aspecto, Christine Mello nos conta que entre o final dos anos 60 e início dos 70, “começa a se esboçar outra mentalidade com relação à produção cultural, em virtude principalmente do aparecimento de obras que transbordam para fora das especialidades, obras que poderíamos caracterizar como cross-media”,56 a partir da noção de que elas cruzam “todos os meios de expressão artística, mas sem se limitar a eles”.57 Para ela, os artistas não se conceituam mais por mídias/suportes, mas através de “tecnologias, ou por campos artísticos específicos, ou seja, eles já não são mais artistas plásticos, fotógrafos, cineastas ou videoartistas simplesmente. Pelo contrário, eles trabalham com conceitos ou projetos que atravessam todas as especificidades” 58, nos quais as formas utilizadas nas expressões se diversificam “de acordo com as exigências de cada projeto e são sempre múltiplos ou associados uns ao outros”.59 Essa possibilidade tem início, a partir do momento em que o manuseio das novas ferramentas de criação são alcançados pelos artistas que ousam experimentar outras técnicas, descompromissadas com políticas de distribuição, recepção e circulação no mercado, principalmente no que se refere ao meio cinematográfico profissional. Suas produções caracterizavam-se na maioria das vezes a um ataque direto às instituições culturais, ao negar a noção de obra de arte como artefato a ser consumido passivamente pelo público, promovendo a circulação de informações paralelas ao campo cultural oficial. A inspiração brotava na “força subversiva da arte e, ao mesmo tempo, [pelo desejo em] romper o mercantilismo ao tentar compartilhar criações com o maior número possível de pessoas”.60 55 FREIRE, 1999, p. 28. MELLO, Christine. Extremidades do Vídeo. São Paulo: Editora Senac, 2008. p. 11. 57 Ibidem, p. 11. 58 Ibidem, p. 11. 59 Ibidem, p. 11. 60 FREIRE, 1999, p. 31. 56
  • 35. 35 Podemos perceber que, além dos filmes financiados pelo Estado, outras obras audiovisuais são desenvolvidas em suportes mais baratos e de fácil circulação, que irão também compor o complexo cenário cinematográfico brasileiro. A maioria desses filmes surge como resultado da democratização e acessibilidade de bitolas e câmeras portáteis, que se expandem rapidamente no país pelo fato dos novos suportes de registro cinematográfico (tripés, filtros, lentes, etc.) estarem atrelados a um processo de inovação tecnológica acelerada. Desse modo, os artistas têm a possibilidade de construir novas leituras e experiências audiovisuais, bem como o manuseio de materiais mais leves, em espaços livres dos estúdios, o que redimensionou a porção criativa das expressões artísticas contemporâneas. Com filmes marcados pela radicalidade formal, o experimentalismo brasileiro traça uma rota alternativa de produção, tomando como suporte fundamental de atuação e produção, a película 8 mm. Nesse sentido, “a bitola de superoito, espécie de musa e síntese desses novos equipamentos de filmagem, estimulou o surgimento de novíssimos ‘cineastas’” 61, que iniciam um longo processo de ação fílmica subterrânea em relação ao circuito cinematográfico comercial. Os filmes aparecem livres “para olhar o mundo exterior sem pestanejar e para o mundo interior em moldes complexos e místicos” 62, com imagens livres para serem poéticas e obscuras. “É livre até mesmo para ensandecer”63, construindo um tipo de cinema que é possível utilizar: [...] todos os recursos existentes e os transfigura em novos signos em alta rotação estética: é um cinema interessado em novas formas para novas ideias, novos processos narrativos para novas percepções, que conduzam ao inesperado, explorando novas áreas de consciência, revelando novos horizontes do improvável.64 A popularidade da película super-8 deu-se a partir da mudança de bitola na década de sessenta, anteriormente dominada no circuito pelo filme standart 8mm, muito usada por cineastas amadores, pessoas interessadas em fazer registros caseiros, para 61 SANTOS FILHO, Francisco Aristides de Oliveira; CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Desencantos modernos no cinema brasileiro: contrações e disritmias na filmografia dos anos 60/70. In: CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho (Org.). História e Ficção. Imperatriz – MA: Ética, 2009. p.63. 62 RENAN, Sheldon. Underground: introdução ao cinema/underground. Tradução de Sérgio Maracajá. Rio de Janeiro: Lidador, 1970. p. 23. 63 RENAN, 1970. p. 23. 64 FERREIRA, Jairo. Cinema de invenção. São Paulo: Max Limoad, 1986. p. 23.
  • 36. 36 guardar de recordação. Segundo David Beal, “não havia razão para duvidar da triunfante liderança do 8mm tradicional em popularidade entre amadores”.65 Introduzido no mercado internacional em 1965, a bitola superoito provocou um conjunto de benefícios e otimização técnica, que amplia para o público consumidor uma série de novidades para seu uso, substituindo: [...] quase que completamente o 8 mm tradicional, no que se refere à manufatura de câmaras cinematográficas para cineasta amador. O replanejamento do formato do filme tornou possível conseguir um aumento de aproximadamente 50% na área da imagem [...] o que permitiu melhor qualidade de imagem sem qualquer aumento no tamanho da câmara. As perfurações foram colocadas em posição mais racional, ao lado dos fotogramas e não perto do estreito espaço entre eles, de modo que, quando um filme é cortado e colado, a emenda fica mais forte, por não ser sobre a perfuração. O espaço para trilha sonora foi deixado na margem oposta à das perfurações, proporcionando melhor qualidade de som. Uma posição de garra padronizada em câmaras e projetores, e espaço para uma pista de compensação contribuíram para melhorar a nitidez da imagem66. As significativas melhorias nas técnicas de filmagem e produção promovidas pelos filmes superoito geram o aumento da procura deste recurso, principalmente pelo barateamento dos custos operacionais. O acesso direto no uso do suporte pode ser exemplificado por Beal, quando afirma que nos anos 70, as “câmaras cinematográficas e projetores de 8mm tradicional, de segunda mão, podem agora ser adquiridos por uma fração de seu preço original”.67 Para Sheldon Renan, “o baixo custo de filmes de 8 mm e de 16 mm permite que qualquer um faça um filme. As câmaras pequenas e os filmes rápidos da década de 60 permitem que se faça a tomada de um filme quase que em qualquer lugar”68, devido a democratização do acesso, que resulta em produções livres do circuito comercial. “Isso representa não só a liberdade para fazer filmes, mas também a liberdade de fazê-los simplesmente por satisfação pessoal e simplesmente em função de padrões estéticos” 69. Vários cineastas profissionais negaram a importância de seu uso, bem como tentaram impedir a circulação dos filmes em eventos na área. Essa atitude nos mostra 65 BEAL, John David. Super 8 e outras bitolas em ação. 3ª Ed. Adaptação de Abrão Berman. São Paulo: Summus, 1976. p. 14. 66 Ibidem, p. 14. 67 Ibidem, p. 14. 68 RENAN, 1970. p. 23. 69 Ibidem, p. 2.
  • 37. 37 que o superoito causou instabilidade na linguagem cinematográfica dos anos 60/70, pondo em xeque toda uma ordem de coisas que representariam, em última instância, o cinema brasileiro como patrimônio simbólico da Nação.70 Os filmes de Jomard Muniz de Britto resultam do desejo de experimentar, através do exercício permanente de crítica cultural, utilizando o recurso audiovisual – como um dos vários suportes por ele manuseados – para colocar em questão o próprio cinema enquanto complexo industrial, movido pelas engrenagens que vão desde a espera na fila ao sistema de comunicação e marketing, para promover o produto cultural. Aqui, os filmes circulam em espaços que margeiam os interesses comerciais da Embrafilme, que planejou “vender” as imagens ideais do Brasil para o mundo, de acordo com as estratégias da propaganda do serviço de inteligência do governo. Isso nos leva a entender que este estudo é baseado numa relação história-filme, trabalhando sua especificidade em diálogo com outros caminhos de escoamento expressivo, ao negar o oficialismo do cinema-estatal, na busca por vias demarcadoras de tensão e desvio das estruturas engessantes: “é sempre bom suspeitar da euforia em torno dos prêmios oferecidos [...] [eles] substituíram o desejo dos debates. É possível utilizar as premiações para desarticular essas engrenagens oficiosas?” 71 Sobre essas tensões, o multiartista Paulo Bruscky relata que: Existia [um conflito] entre o pessoal do 16 mm e do super 8 que, Daniel Santiago fez até um filme sobre essa questão que chama-se O Duelo, que eu sou um dos protagonistas do filme, só é eu e ele, que é um duelo mesmo...eu com uma 16 mm e ele com uma super 8, no jardim botânico onde termina a duas máquinas encontram e ... (explodem) fica tudo escuro e o barulho de vidro... e o pessoal do 16 mm dizia que o que a gente fazia não era cinema, mas realmente a gente não tava fazendo cinema, a gente tava fazendo experimento, pra gente não existia preocupação de fazer cinema, por isso que é uma coisa mais solta, mais legal por que a gente não fazia questão de ser chamado cineasta, a gente era experimentalista, a gente não trabalhava com a questão que eu volto a falar do convencional no cinema. O pessoal de televisão [atuavam com 16 mm], o pessoal de publicidade que ficava naquele gueto deles que não admitia que as brincadeiras da gente fosse levado como cinema entendeu? A 70 CRUZ, 2005, p. 35. BRITTO, Jomard Muniz de. Há uma borboleta ou uma Gota de Sangue no Super-8? Sem Identificação. 25/11/77. 71
  • 38. 38 produção do super 8 em Pernambuco, apesar de ser importante, profícua, eram poucos, não eram muitos não72. Diante do sistema cinematográfico nacional e internacional – voltado para interesses comerciais – as produções superoitistas caminhavam na trilha à margem desse processo, as quais podemos chamar de filmes subterrâneos. Apesar do superoito ganhar popularidade e receber apoio de algumas instituições para sua realização, os filmes eram exibidos num circuito paralelo, distante dos processos de distribuição e comercialização, movidos pelo desinteresse dos órgãos culturais em promover os filmes, priorizando comercialmente o longa-metragem. A respeito dessa questão, o cineasta Silvio Back, coordenador do I Festival Brasileiro do Filme Superoito (1974), em Curitiba, critica a situação em que a bitola se encontrava nos circuitos de exibição do país: [...] há a considerar que embora negligenciado pelo cinema profissional, e assumindo em relação a ele uma posição tanto falsamente submissa como falsamente superior – o Super 8 [...] deu a nítida impressão de que, por inocência ou alienação mesmo da maioria de seus autores, ignora quase todo o complexo econômico-cultural opressivo que envolve o nosso cinema. Como a sua pedra de toque principal ainda é a da circulação dos filmes num segmento familiar, esse avanço entre o que o cinema brasileiro vem produzindo nos últimos anos e essa produção de laboratório descompromissada de um retorno financeiro, embora substancial no plano de indagação, é muitas vezes inócuo, e ele, no fundo, vem a ser mais um dado triste da conformação cultural a que estamos submetidos. [...] suas sensíveis conquistas no campo da prática ainda são vegetativas e exigem dos realizadores uma melhor definição institucional e uma posição mais articulada com a realidade atual do cinema brasileiro.73 Back destaca a falta de articulação dos superoitistas na cena cultural do período, ao expor que o nível de produções se torna inócua, pela falta de compromisso com o fortalecimento de uma ação política que valorize o suporte, carente de representação institucional que defenda os interesses deste grupo no mercado audiovisual brasileiro, situação que sofrerá significativas mudanças em Pernambuco e Salvador, como veremos a seguir. Independente das críticas e perseguições à bitola, seja no depoimento exposto por Paulo Bruscky ou Sílvio Back, sua expansão no país foi bastante significativa. No Nordeste, o boom na produção de filmes neste tipo de película nos anos 70 destacou-se 72 Entrevista realizada por Aristides Oliveira, na tarde de 08 de agosto de 2008, no Real Palace Hotel, às 14h30 em Teresina-PI. 73 Filme Cultura 26, 1974, p. 47.
  • 39. 39 na Bahia e em Pernambuco. Nesse contexto, a cidade de Recife será o espaço a ser explorado na pesquisa, a fim de situar historicamente a articulação entre os cineastas que utilizaram a bitola como ferramenta de documentação e resistência cultural. Inicialmente, realizaremos um levantamento histórico da cena superoitista pernambucana, para em seguida ver em close a obra fílmica e textual de Jomard Muniz de Britto, centro de nossas atenções. Após o passeio em cima da grua, mergulharemos numa seqüência imprevisível de planos médios, planos gerais, planos de conjunto, contra-plongeés, para visualizar os rodopios e escutar os gritos de um palhaço que degola e redegola as veredas da tradição cultural brasileira. 1.2. A potência do Superoito em Pernambuco A cena audiovisual em Recife dos anos 1970 – espaço em que as diretrizes da Embrafilme não impediam o fluxo criativo das ideias e muito menos a produção de obras fílmicas em superoito – estava gradativamente fortalecendo-se numa pluralidade de tendências, estilos e temáticas abordadas na tela. Segundo Alexandre Figueirôa, o início da década de 70 é marcado por certo marasmo na produção de filmes. Nesse momento, poucos filmes foram finalizados, apesar de vários cineastas – no final dos anos 60 – terem articulado projetos audiovisuais que acabaram “em roteiros não filmados ou obras inacabadas”.74 Necessitava-se com certa urgência – além de coragem e disposição para fazer financiamentos pessoais na produção dos filmes – criar um espaço para que os mesmos fossem vistos e difundidos ao público em formação. A preocupação em fazer cinema superoito de qualidade em Recife fez com que “alguns praticantes do registro amador [fossem] transcendendo da descontração para a pretensão de trabalhos nitidamente mais autorais. O lazer doméstico passava a dividir espaço com olhares mais inquietos por trás do visor”.75 O desejo maior estava na busca de realizar intercâmbio com outros Estados e artistas, para efetivação de uma rota alternativa ao circuito oficial, que eram dominados pelas políticas culturais militares integradas ao INC ou a Embrafilme. Nessas condições, foi fundamental tornar a bitola, além de simples meio de comunicação, um símbolo da resistência cultural de cineastas engajados na produção que: 74 FIGUEIRÔA, Alexandre. O Cinema Super 8 em Pernambuco: do lazer doméstico à resistência cultural. Recife. Fundarpe, 1994. p. 43. 75 CRUZ, Marcos Pierry Pereira da. O Super-8 na Bahia: História e Análise. São Paulo: Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Dissertação de mestrado. 2005. p. 14.
  • 40. 40 Dentro da história cinematográfica brasileira, os filmes super-8 reencenaram tanto a tragédia hamletiana quanto as chanchadas da Atlântida, a cartase pelo sufoco, o gozo e mais gozar dentro das repressões do AI-5, a sátira pela margem das violentações, terror/terrir. Ingenuidades. Heterodoxias.76 A luta pelo reconhecimento do superoito como linguagem cinematográfica faz do ano de 1973 um momento de grande importância para levantar a autoestima dos cineastas pernambucanos, a partir da aproximação com o circuito superoitista baiano, na participação da II Jornada Nordestina de Curta Metragem 77, em Salvador nos dias 9 a 15 de setembro. Para Marcos Pierry, a Jornada é historicamente importante por configurar a condição geradora de um “marco fundador do superoitismo local, simultaneamente pavimentam-lhe um circuito específico e consolidam a bitola ao nível de categoria expressiva”.78 Alexandre Figueirôa traça em sua pesquisa – através de um vasto levantamento documental – os caminhos e descaminhos que o cinema superoitista em Recife trilhou para se constituir enquanto circuito em destaque nos anos 70. Aponta que a participação dos pernambucanos na II Jornada baiana foi bastante positiva, prova disso é a presença de sete filmes na competição oficial, onde “Missa do Vaqueiro”, de Hugo Caldas leva o 2º lugar no evento. A notícia estimulou outros cineastas a produzirem filmes, pois agora era possível que os produtores nordestinos tivessem acesso e posicionamento crítico diante das “grandes questões do cinema nacional em que se incluía a crescente produção alternativa com o super-8 que se verificava por todo o país”.79 76 BRITTO, Jomard Muniz de. Vanguarda: um tigre de papel? Superoito: uma onça de celulóide? In: VERRI, Gilda Maria Whitaker. Registros do passado no presente (Org.). Recife: Bagaço, 2008. p. 275. 77 Em “O Curta-Metragem Brasileiro e as Jornadas de Salvador”, Bráulio Tavares refere-se [...], sem indicar os realizadores e/ou signatários das proposições resultantes do encontro, resumidas a seguir, que, em pouco tempo, se revelariam ambíguas, contraditórias e, no limite, preconceituosas: 1. Aumentar a circulação de filmes em Super-8, sem tentar institucionalizar essa circulação. Não tentar fazer com o Super-8 um mini-circuito 35 mm, mas aproveitar suas possibilidades para divulgar o cinema fora das salas tradicionais [...]; Galerias de arte e tevê apontadas como outras possibilidades de circulação dos filmes; [...] o Super-8 não é considerado como um trampolim para outras bitolas (embora também possa sê-lo), mas um veículo válido em si. Decorre dessa posição a importância de se procurar fazer produções baratas, cujos gastos possam ser cobertos com facilidade. Cf: CRUZ, Marcos Pierry Pereira da. O Super-8 na Bahia: História e Análise. São Paulo: Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, 2005. pp. 17-18. 78 CRUZ, 2005, p. 16. 79 FIGUEIRÔA, 1994, p. 34.
  • 41. 41 A articulação não se deu apenas com filmes inscritos, mas com a presença de críticos e produtores audiovisuais participando diretamente dos debates desenvolvidos na Jornada. Podemos citar a apresentação da comunicação de Celso Marconi com o trabalho intitulado: “Uma experiência: o Cinema de Arte do Recife” e a atuação de Jomard Muniz de Britto como integrante do júri, gerando um forte interesse nos jornalistas e artistas em acompanhar a contribuição dos superoitistas na construção de uma cena alternativa de âmbito nacional.80 O contexto foi marcado pelo desejo de fazer cinema independente, a partir do “final da década de 1973 ao início de 1974. Em novembro, os filmes participantes da Jornada de Salvador, são exibidos pela primeira vez para o público de Recife, numa mostra realizada na Universidade Católica de Pernambuco”.81 Envolvido nos debates superoitistas, Jomard escreve no começo de 1974 “um artigo no Diário de Pernambuco, que vislumbra o aparecimento de um novo cinema pernambucano”. Jomard afirma que os cineastas “tinham capacidade de realizar bons trabalhos e não apenas roteiros que não seriam filmados, afastando assim a ideia do ‘cinema espiritual’ que rondava o cinema pernambucano”.82 O entusiasmo faz o superoito ser visto pelo público como uma bitola respeitada e muito defendida pelos seus simpatizantes, fazendo de Pernambuco o Estado no Nordeste com maior produção de filmes nesse formato em 1975, legitimando-o no campo da produção cinematográfica independente. Já em 1976, Figueirôa nos mostra que este ano é emblemático para o amadurecimento do cinema pernambucano, pois, “boa parte dos realizadores [...] já tinha uma concepção diferente do que significava fazer cinema mesmo com uma bitola amadora. A euforia da realização continuou, mas a participação de discussões sobre a situação do cinema brasileiro” 83 possibilitou aos artistas o amadurecimento em torno das dificuldades na produção dos filmes, “ao mesmo tempo em que lhes dava elementos de reflexão sobre” a realização dos mesmos. Nesse período, várias tentativas de implantar espaços e infraestrutura para incentivar as produções audiovisuais resultaram em fracasso, como a promessa não cumprida do núcleo de produção ligado ao Cinema Educativo, patrocinado pelo INC, que nunca foi concretizado. 80 FIGUEIRÔA, 1994, p. 36. Ibidem, p. 36. 82 Ibidem, p. 37. 83 Ibidem, p. 36. 81
  • 42. 42 Outro empreendimento não realizado foi a criação de um Cinecentro, que disponibilizaria equipamentos, laboratórios de montagem e assistência técnica, ideia “presa ao papel”. Diante das dificuldades, os cineastas buscaram outros meios de se fortalecer artisticamente, pois a falta de apoio era uma realidade que dificultava a materialização de um cenário cultural duradouro em Recife. A necessidade de criar uma entidade que defendesse o interesse dos realizadores, nas suas condições mínimas de produção, além do desejo de organizar um festival na cidade, surgiu com a fundação do “Grupo 8 de Pernambuco”, em 23 de novembro de 1976 que, um ano depois, ganhou repercussão como entidade aliada ao cinema superoito. Figuerôa afirma que a criação do grupo84 ajudou a consolidar parcela da produção dos filmes, bem como o benefício dos cineastas envolvidos com uma representação constituída.85 Muitos participantes do grupo produziam filmes-documentários, ao registrar as tradições culturais do Estado, valorizando os aspectos que particularizam a cultura pernambucana. Os filmes tinham um compromisso realista, com temas voltados para as festas populares, folclore, artesanato, nomes importantes da cena local, frevo, carnaval, etc. O Grupo 8 trabalhou com o objetivo de transformar a entidade num veículo de representação do cinema superoito em Pernambuco, o que acabou gerando o afastamento de outros superoitistas dedicados a um processo de trabalho mais estéticoexperimental independente, sem pretensões de associação e obediência aos estatutos oficiais. Para Jomard Muniz de Britto: Ao contrário dos acima descritos, que se notabilizaram por esta seriedade documental, existiram outros que enveredaram pelos descaminhos da experimentação. Talvez menos no sentido formal e muito mais pelo atrevimento das problemáticas, onde fatores eróticos se misturavam às marcas políticas da oficialidade repressora. Eles persistiram no slogan: para nada salvar.86 Alexandre Figueirôa aponta que alguns cineastas destacam-se na produção fílmica experimental, como Amin Stepple, Paulo Cunha, Geneton Moraes, Jomard Muniz de Britto e Paulo Bruscky. Para Jomard, os filmes produzidos por esse pequeno 84 Os estatutos foram fixados em 11 de janeiro de 1977. FIGUEIRÔA, 1994, p. 85. 86 BRITTO, 2008, p. 277. 85
  • 43. 43 grupo “se insurgiam e sugeriam uma perspectiva anarco-experimental87, trabalhando a imagem com um olhar crítico, sem explorá-la somente como um objeto, mas como acontecimento, campo de forças, sistema de relações que coloca em jogo diferentes instâncias enunciativas, figurativas e perceptivas”.88 Criticando a institucionalização dos festivais superoitistas e o peso da estética regionalista em torno da cultura audiovisual nordestina, Jomard Muniz de Britto não poupa ironia ao comentar na imprensa que o Grupo 8: [...] precisa ser mimado, curtido e mamado pelos seus abnegados fundadores. [...] assim sendo, tem um futuro promissor na cultura pernambucana tão decantada em prosa verso, filme e folia. Através das alternâncias institucionais com seus inadiáveis oba-obas, se vislumbra como capital finalidade: sugar as primeiras migalhas da Grande Mãe Embrafilme. E todo mundo querendo mamar no primeiro cordão mamesco que aparecer89. O posicionamento de Jomard Muniz de Britto deixa claro que a cena superoitista em Recife não era uniforme. Após a III Jornada de Curta Metragem (1974), é visível que o circuito é dividido pelo grupo ligado ao cineasta Fernando Spencer, “preocupada em dar ao superoito representatividade cultural”90 oficial e pelos experimentalistas, desvinculados do cinema sócio-antropológico.91 Esse período também é marcado pela convivência entre rebeldia e censura, ligadas por uma relação tensa, mesmo com todas as táticas em burlar os instrumentos de controle da produção cultural. Nesse sentido, a censura trilha novos caminhos de atuação, “reprimindo e limitando o espaço de criatividade de parcela da juventude que atuavam no campo artístico, à margem das concepções culturais aceitas no regime político autoritário”.92 O debate em torno do uso da bitola é intensificado, provocando uma divisão entre os cineastas ligados ao cinema social, que “refletem a nossa realidade, não se arriscando desagradar a censura” 93 e os cineastas atuantes numa linha estética mais radical, experimentando novas possibilidades e rotas do fazer artístico, que desviassem 87 BRITTO, 2008, p. 276. PARENTE, André; CARVALHO, Victa de. Entre cinema e arte contemporânea. Revista Galáxia. São Paulo, nº 17, p. 27-40, jun. 2009. p. 3. 89 FIGUEIRÔA, 1994, p. 130. 90 Ibidem, p. 130. 91 Ibidem, p. 53. 92 CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Táticas Caminhantes: cinema marginal e flanâncias juvenis pela cidade. In: Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 27, nº 53, p. 177-194. 2007. p. 179. 93 FIGUEIRÔA, 1994, p. 126. 88
  • 44. 44 a “sensibilidade ferida dos mais legítimos representantes da sociedade patriarcal repressora”.94 Atuando como crítico de cinema polêmico nas Jornadas baianas e do circuito pernambucano, Jomard Muniz de Britto inicia sua produção cinematográfica na década de 1970, realizando um conjunto de filmes que não fazia parte da configuração superoitista pernambucana convencional. Preocupado em filmar outras paisagens, que se distanciavam do documentário expositivo95 tradicional, vinculadas ao desejo de “preservar”, Jomard seguia à contramão das catalogações salvacionistas da cultura nordestina: Seja na crueldade inocente das brigas de galo, mesmo repulsiva apesar da inédita musicalização, inédita e super cansativa. Seja a previsão estalinista da chegada de um Papa ao Recife [...]. Entre a dispersão e a redundância das imagens, o que salvar ou ressalvar? As belas intenções superoitistas96. Podemos considerar que a expressão crítica de Jomard Muniz de Britto no circuito audiovisual pernambucano está diretamente relacionada a uma época em que, muitos artistas promovem uma rota de navegação à contramão do discurso oficial – sintonizada com as estratégias de controle da produção cultural – no ritmo gerado pelo impulso das vanguardas artísticas que anunciam: [...] coisas inovadoras, [...] no próprio ato diccional, escavando formas alternativas de se comunicarem. Desse modo, grande parte da energia crítica dessa geração de descontentes seria canalizada para atividades até então não utilizadas pelas formas tradicionais de luta política. Pode-se mesmo dizer que, sob a pressão da mundialização, esses jovens redescobriram a política forçando-a a escorregar do macro para o micro, encontrando em diferentes formas de expressão artística os instrumentos de sua dicção97. Jomard percebe que o cinema superoito amplia o leque de possibilidades para refletir sobre o papel do cinema experimental enquanto prática artística, que não se limita ao circuito exibidor de sua época. Desse modo, “O Palhaço Degolado” redefine e 94 Ibidem, p. 126. Nesta linha de documentário, há um viés extremamente informativo, onde todo sinal de autoria é encoberto, bem como o processo de produção. Além disso, sua montagem serve mais para uma continuidade do argumento do que para estabelecer um ritmo ou padrão formal. Cf: SALES LIMA, Caio Mário José. O filme dispositivo no contexto da produção do documentário brasileiro nos anos 2000. Monografia (Comunicação). Faculdade Maurício de Nassau. Recife, 2010, p. 25. 96 BRITTO, 2008, p. 277. 97 CASTELO BRANCO, 2007, p. 179. 95
  • 45. 45 problematiza amplamente o debate cultural em torno do “Ser” da cultura brasileira nos anos 70, sob o impacto pós-tropicalista98 em Recife. 1.3. Jomard Muniz de Britto: travessuras sob lona de concreto Dentro do amplo conjunto de artistas ligados ao cinema superoito na década de 70 em Pernambuco, iremos destacar a presença de Jomard Muniz de Britto e aprofundar suas contribuições na produção cinematográfica brasileira, explorando inicialmente os caminhos que o levam a participar da cena audiovisual naquele período. Suas experiências fílmicas iniciam com a produção de três curtas em: “Ensaio de Androginia”, “Infernolento” e “Babalorixá Mário Miranda”, “Maria Aparecida no Carnaval”, exibidos na Sala Sérgio Porto, em junho de 1974.99 Longe de captar o “realismo nordestino”, seus primeiros filmes foram marcados pela falta de preocupação técnica, mas após o contato com os cinegrafistas Carlos Cordeiro e Rucker Vieira, houve uma valorização com a captação e montagem, orientados pela experiência construída entre eles.100 No final de 1974, o número de filmes realizados por ele cresce significativamente com: “Uma Experiência Didática: o corpo humano”, “Mito e Contramito da Família Pernambucanobaiana”, “Lixo ou Lixo Cultural” e “Vivencial I”. O estímulo na produção o mobiliza a organizar o “Festival JMB”, exibindo-os no auditório do DER (Departamento de Estradas e Rodagem). Luta contra uma das maiores dificuldades vivenciadas pelo cinema superoito naquele momento: a falta de circuito exibidor, pois não fazia sentido para os artistas envolvidos nesse processo finalizarem seus filmes e não ter espaço de exposição e debate.101 98 Apesar de Jomard Muniz de Britto ter uma participação efetiva no Tropicalismo já na década de sessenta, decidimos escolher a expressão de Heloísa Buarque de Holanda, por considerar o ano de 1977 (“O Palhaço Degolado”) um momento de extensão e desdobramento do Tropicalismo nas criações artísticas de Jomard, desse modo, nos apropriamos da noção pós-tropicalista para pensar a ambiência temporal do filme explorado. Nesse sentindo, a autora afirma que “o fragmento, o mundo espedaçado e a descontinuidade marcaram definitivamente a produção cultural e a experiência de vida tanto dos integrantes do movimento tropicalista, quanto daqueles que nos anos imediatamente seguintes aprofundam essa tendência, num momento que, por conveniência expositiva, chamaremos de póstropicalismo (fins dos anos 60, princípios dos anos 70)”. Cf: HOLANDA, Heloísa Buarque de. Impressões de Viagem, CPC, vanguarda e desbunde: 1960/1970. 3ª ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. p. 56. 99 FIGUEIRÔA, 1994, pp. 45-46. 100 Ibidem, p. 72. 101 FIGUEIRÔA, 1994, p. 56.
  • 46. 46 Havia uma preocupação com a formação de plateia, pois muitos dos filmes superoito eram exibidos em mostras particulares, na casa dos realizadores. Promover exibições restritas não interessava aos cineastas engajados no circuito, que escreviam nos jornais para mobilizar o máximo de pessoas a comparecerem aos eventos abertos em andamento na cidade. O Jornal do Commercio foi o espaço mais utilizado para concretizar as convocações e reflexões em torno da cena audiovisual pernambucana. No artigo “Amin/que o super 8 saiam das saletas”, publicado na coluna “Arte Viva”, Celso Marconi afirma que: Não é nenhuma novidade afirmar que a obra fílmica só se completa quando é assistida por cem milhões de espectadores. Portanto, é preciso levar o super 8 aos bordéis, escolas, fábricas, bares, enfim, a todos os lugares. Logo, é preciso exibir os filmes e não apenas em saletas. Outra coisa: nossos filmes, não-profissionais, não devem estar submetidos à mesma norma aplicada (se bem que indevidamente) ao cinema comercial.102 Jomard sempre trabalhou seus filmes dentro da perspectiva não comercial, utilizando o recurso audiovisual como poeticidade em trânsito, juntamente com outras linguagens artísticas (poesia, fotografia, bricolagens textuais, performance) para ensaiar novos caminhos dentro dos impasses da crítica cultural contemporânea. Em fevereiro de 1975, o filme “Babalorixá Mário Miranda”, “Maria Aparecida no Carnaval” e “Vivencial I” são exibidos na I Mostra Recifense do Filme Super 8. A Mostra obteve repercussão positiva no meio artístico local, já que os filmes pernambucanos até então só tinham sido vistos em eventos fora da cidade ou apenas entre os próprios cineastas.103 No festival organizado pelo DCE (Diretório Central dos Estudantes) da Universidade Federal de Pernambuco, em julho de 1977, seus filmes “Alto Nível Baixo” e “Discurso Classe Média” são exibidos juntamente com trabalhos de Celso Marconi e Geneton Moraes. Após a exibição, foi realizado um debate em torno do conteúdo fílmico, da relação dos superoitistas com a censura e os aspectos de realização, com ele e outros 102 MARCONI, Celso. Jornal do Commercio. 27 jul. 1977. Amin/que o super 8 saiam das saletas. Coluna Arte Viva. 103 FIGUEIRÔA, 1994, pp. 57-58.
  • 47. 47 cineastas: Fernando Spencer, Geneton Moraes Neto, Paulinho Menelau, Celso Marconi e Raimundo Vidarico.104 A necessidade em fazer circular seus trabalhos é concretizada na elaboração de um programa audiovisual itinerante chamado “Cinevivendo”, que percorria diversos lugares da cidade para projetar seus filmes e de outros cineastas. O programa tinha como atividade principal a realização de cine-debates com o público presente, como os frequentadores de cineclubes, universitários e nos espaços públicos em geral, esforçando-se para diminuir as lacunas do circuito exibidor superoitista local. O objetivo do programa “Cinevivendo” era aumentar o acesso às novas produções realizadas, o que oportunizou a gradativa aproximação de cinéfilos, que antes desconheciam a cena audiovisual. O estímulo trouxe bons resultados, pois, juntamente com outros trabalhos paralelos de superoitistas, também interessados na popularização das exibições de filmes superoito, foi possível fortalecer temporariamente o circuito superoitista recifense.105 Jomard polemizava as intenções do programa audiovisual no Jornal do Commercio, por onde transitava seus textos, a partir do contato articulado com o jornalista e crítico de cinema, Celso Marconi, que trabalhava na empresa. A respeito deste projeto, Jomard deixa claro que o “Cinevivendo” era um trabalho para expor: [...] uma realidade cultural em conflito, em debate, em contradição. Nenhuma pretensão de criar movimento, desde que ‘faz movimento cultural na província quem dispõe de verbas oficiais e cargos públicos para seus amigos-discípulos [...]. Nenhum movimento, escola, ou grupo, embora todas as mo-vi-men-ta-ções para sacudir o puxasaquismo, o ‘calaboquismo’ e o cabotinismo de nossos artistas e intelectuais muito bem comportados, aliás, ‘nordestinados’. A Associação dos Servidores da Sudene, através do seu departamento cultural, vai exibir hoje, a partir das 20 horas em ponto, algumas dessas experiências filmadas por mim em parceria com Carlos Cordeiro e Celso Brandão. [...] O PALHAÇO DEGOLADO: [...] um filme muito “falado” em todos os sentidos da palavra; em síntese, uma louvação descarada aos Mestres da Cultura Nordestina, Deus e o Diabo sejam louvados!106 Tal iniciativa nos mostra que, “com tantas exibições e os filmes pernambucanos alcançando um público cada vez mais interessado, os superoitistas, em especial os do 104 FIGUEIRÔA, 1994, p. 96. Ibidem, p. 72. 106 BRITTO, Jomard Muniz de. Jornal do Commercio. 14 out. 1977. Jomard Cinevivendo na Sudene. Coluna Arte Viva. 105