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Curso Ciência e Fé
Módulo IIIB – Ciência Medieval
© Bernardo Motta
bmotta@observit.pt
http://espectadores.blogspot.com
Curso Ciência e Fé
I – Introdução
II – Filosofia Grega e Cosmologia Grega
III – Filosofia Medieval e Ciência Medieval
IV – Inquisição e Ciência
V e VI – O Caso Galileu
VII – A Revolução Científica
VIII – Darwin e a Igreja Católica
IX – Os Argumentos Cosmológico e Teleológico
X – Filosofia da Mente e Inteligência Artificial
XI – Milagres e Ciência
XII – Concordância entre Cristianismo e Ciência
3
1. Introdução
2. O cristianismo primitivo e o conhecimento grego
3. Santo Agostinho
4. Ciência Medieval
5. São Tomás de Aquino
6. Conclusão
Índice
3
Boécio e Cassiodoro
Âncio Mânlio Severino Boécio (c. 480-525 d.C.), nascido em Roma logo após a
deposição do último Imperador Romano do Ocidente, Rómulo Augusto (476 d.C.)
Boécio foi um dos maiores enciclopedistas latinos
Deixou ampla obra sobre o “quadrivium” (termo seu), as quarto “artes liberais”
de base matemática: álgebra, geometria, música e astronomia
Sobreviveram tratados sobre música, aritmética e geometria, traduções e
comentários de tratados lógicos de Aristóteles
Boécio é considerado o “professor de lógica” da Idade Média até ao séc. XIII
Deixou uma forma rigorosa de fazer teologia (ex. “De Trinitate”), conciliada
sempre que possível com a razão: “fidem si poteris rationemque conjuge”
“A consolação da Filosofia”, obra muito influente em toda a Idade Média
Cassiodoro (c. 488-575 d.C.), estadista romano, nascido na Calábria
Depois de uma longa vida pública, funda o mosteiro de Vivarium
Institutiones Divinarum et Saecularium Litterarum (543-555)
Obra pedagógica, serviu como programa de ensino para os monges de Vivarium
O livro II, uma enciclopédia das “artes”, marcou o ensino monástico medieval
Surge mais tarde em obra separada: De Artibus ac Disciplinis Liberalium Litterarum
Ciência Medieval
44
Santo Isidoro, Bispo de Sevilha (c. 560-636 d.C.)
Recebe a sua educação (“trivium” e “quadrivium”) na Catedral de Sevilha
Papel central na conversão dos visigodos (arianos) ao catolicismo
Com a ocupação visigótica da Hispânia (séc. V), as estruturas romanas
de educação e cultura estavam em erosão
No Quarto Concílio de Toledo (5 de Dezembro de 633), estando presentes
todos os Bispos da Hispânia, Isidoro conseguiu:
Que todas as catedrais da Hispânia tivessem um seminário
O modelo escolar seria o mesmo do da Catedral de Sevilha
A sua obra Etimologias (20 volumes) era um compêndio do saber clássico
Esse compêndio era uma “colagem” de conteúdos cristãos e pagãos
As Etimologias foram muito populares durante nove séculos, até ao século XV
Escreveu De natura rerum, obra dedicada ao rei visigodo Sisebuto, sobre
astronomia e filosofia natural
Santo Isidoro de Sevilha é o patrono dos estudantes
A sua obra sobre teologia moral e dogmática apoia-se em São Gregório
Magno (Gregório I) e em Santo Agostinho
Ciência Medieval
5
Primeira edição impressa das
Etimologias – 1472 (Augsburgo)
5
São Beda, o Venerável
Beda (c. 672-735 d.C.) foi monge dos mosteiros gémeos de São Pedro e
São Paulo de Wearmouth-Jarrow (Sunderland e Newcastle, Inglaterra)
Teólogo, historiador, filósofo, foi declarado Doutor da Igreja (Leão XIII)
As ilhas britânicas nunca foram bem integradas no Império, e são os
missionários e os monges quem leva para lá a cultura clássica grego-romana
O fundador dos mosteiros, Benedict Biscop (c. 628-690), trouxe de Roma
uma importante biblioteca, “ad instructionem ecclesiae necessariam”
Com base nela, Beda escreve Historia ecclesiastica gentis Anglorum (c. 731)
Escreveu três obras sobre o tempo as suas divisões, contendo:
Cálculo da data da Páscoa com base na astronomia
Ciclos das marés e sua relação com as fases da Lua
Nessas obras, Beda defende a tese clássica (grega) da Terra esférica
Escreve a enciclopédia De rerum natura, ou “Sobre a natureza das coisas”
Ciência Medieval
6
Da Crónica de Nuremberga (1493)
6
Alcuíno e o “Renascimento Carolíngio”
Alcuíno de York (c.730/740-804 d.C.)
Figura de proa do “renascimento carolíngio”
Formou-se na escola da Catedral de York
Convidado por Carlos Magno para ser o mestre da corte carolíngia
Carlos Magno (742-814) promoveu um importante “renascimento” cultural:
Na língua, unificando a escrita através do carolíngio minúsculo
Na música, unificando o canto litúrgico e a escrita musical
Na arquitectura, criando um estilo próprio (carolíngio)
Nas artes decorativas (mosaicos, iluminuras, esculturas, frescos, etc.)
Em 782, Alcuíno reorganiza a escola do palácio de Carlos Magno, em Aachen
Alcuíno introduz as artes liberais (o “trivium” e o “quadrivium”) e revoluciona o ensino da corte carolíngia
Alcuíno foi o mestre de Carlos Magno, e dos seus dois filhos, Pepino e Luís
Ele trouxe a cultura latina, preservada em Inglaterra, para o reino Franco
Homem de forte fé cristã, convenceu Carlos Magno a abandonar a prática de conversões forçadas (797)
Ciência Medieval
7
Manuscriptum Fuldense (c. 831/40)
7
Silvestre II (c. 946-1003), o Papa matemático
Gerberto de Aurillac nasceu em Belliac (hoje em Saint-Simon, França)
963: entra no mosteiro de São Geraldo de Aurillac
967-969: está em Barcelona, onde terá obtido os seus conhecimentos de
matemática, astronomia e de cultura árabe a partir de professores árabes
969: está em Roma onde conhece o Papa João XIII e o Imperador Otto I
Gerberto é nomeado tutor do futuro Imperador Otto II, filho de Otto I
995: Gerberto parte para Itália para ser o tutor de Otto III (980-1002)
999: por escolha de Otto III, Gerberto é eleito Papa
Enquanto Papa, tomou medidas enérgicas contra a simonia e o concubinato
Em 1001, a população de Roma revolta-se contra Otto III e Silvestre II
foge para Ravena juntamente com Otto III
Contribuições de Gerberto de Aurillac:
Adopção da numeração árabe
Adopção de um ábaco árabe, que se divulgou em toda a Europa
Reintrodução da esfera armilar, desaparecida desde a queda de Roma
Escreveu várias obras sobre temas do quadrivium (aritmética, geometria, astronomia e música)
Ciência Medieval
8
De Geometria, Baviera, Séc. XII
8
Anselmo de Cantuária (c. 1033-1109 d.C.)
Nasceu em Aosta (Alpes italianos), monge beneditino, filósofo e teólogo
Arcebispo de Cantuária (1093-1109), Doutor da Igreja (Clemente XI, 1720)
Defende a visão agostiniana da relação entre fé e razão
Procura demonstrar racionalmente a existência de Deus
Argumento “a priori”, ou “ontológico”:
1. Definição: Deus é o ser maior que se pode conceber
2. Deus, assim concebido, existe como ideia no intelecto
3. Algo é maior se existir realmente, e não apenas no intelecto
4. Logo, pela definição, Deus existe realmente, e não apenas no intelecto
Os argumentos ontológicos, apesar da avalanche de críticas, ainda hoje são defendidos por filósofos
Versões famosas do argumento: Descartes, Leibniz, Gödel, Plantinga (1974)
Ciência Medieval
9
«Na verdade, não procuro antes compreender para crer, mas creio
para compreender. Pois também creio nisto: “se não acreditar, não
compreenderei”» - Proslogion, I
9
As traduções medievais do “corpus aristotelicum” (séc. XII)
Contexto (séculos X e XI):
Fim das invasões Viking (últimas incursões no século XI)
Prosperidade agrícola e comercial, invenções importantes (ferradura, arado com cunha em ferro)
Maturidade teológica:
Deus cria a Natureza como entidade auto-operante, uma “machina” seguindo o seu curso normal
O “Corpus Aristotelicum”
Lógica (“Organon”): o “órgão” que permite “trabalhar” as restantes áreas do saber
Até ao século XII apenas chegaram as obras “Categorias” e “Da interpretação” (trad. Boécio)
Tudo o resto desapareceu, à medida que cada vez menos pessoas sabiam ler grego (>séc. V)
Os Analíticos Posteriores são traduzidos do grego e do árabe no séc. XII
Física
Metafísica
Ética e Política
Retórica e Poética
 E Platão?
Durante toda a Idade Média, só estava disponível a tradução de metade do Timeu
Ciência Medieval
1010
As traduções medievais do “corpus aristotelicum” (séc. XII)
As traduções árabes de textos gregos só foram terminadas no século X
A larga maioria foi feita na parte oriental do Islão (sobretudo Bagdade)
As traduções entraram na Europa pelo Sul, mas a Reconquista (séc. XI) atrasou o processo
Física: predominam as traduções do grego (fontes bizantinas, mais fiáveis) para o latim
Physica: 371 manuscritos do grego e 134 do árabe
De Caelo: 190 manuscritos do grego e 173 do árabe
De Generatione et Corruptione: 308 manuscritos do grego e 48 do árabe
Meteorologica: 175 manuscritos do grego e 113 do árabe
De Anima: 423 manuscritos do grego e 118 do árabe
Importantes tradutores do grego para o latim
Séc. VI: Boécio (Roma)
Séc. XII: Jaime de Veneza (Constantinopla), Henrique Arístipo (Catânia, Sicília), “Ioannes
Hispanicus” e Domingos Gundisalvo (Toledo)
Séc. XIII: Roberto Grosseteste (Oxford), Guilherme de Moerbeke (Corinto, Grécia)
Importantes tradutores do árabe para o latim
Gerardo de Cremona (séc. XII, Toledo) e Miguel Escoto (séc. XIII, Toledo)
Ciência Medieval
1111
Ibn Rushd (1126-1198), ou Averróis
Natural de Córdova, no Al-Andalus, morreu em Marraquexe, Marrocos
Fiel seguidor de Aristóteles, escreveu vários comentários à sua obra
São Tomás de Aquino chamava-o “O Comentador”
Averróis considerava perfeita e completa a obra de Aristóteles
O averroísmo teve enorme peso no Ocidente e quase nenhum no Islão
Ideias-chave do averroísmo
Eternidade do Mundo (de acordo com a Física, de Aristóteles)
A alma individual não é imortal (a opinião de Aristóteles é incerta)
O intelecto humano é uno (“monopsiquismo”, que Aristóteles nunca defendeu)
Averroístas importantes
Sigério de Brabante, professor em Paris, acusado de defender a “dupla verdade”
Boécio de Dácia, colega de Sigério, também professor em Paris
O averroísmo, pelo que teve de servilismo nocivo, levou Duhem a adoptar esta posição radical:
Ciência Medieval
12
Estátua de Averróis em Córdova
«Não há ciência Árabe (…) eles [os sábios árabes] não acrescentaram nada de essencial às teorias
astronómicas (…) Em Física, os sábios Árabes limitaram-se a comentários às afirmações de
Aristóteles, sendo por vezes a sua atitude de absoluto servilismo.» - Pierre Duhem
12
As primeiras Universidades (c. 1200 d.C.)
Bolonha
Paris (população de cerca de 1.000-1.200 alunos)
Oxford
Aproximadamente 750.000 alunos entre 1350 e 1500
Mais de 700 universidades por volta do ano 1500
Grau de Mestre em Artes:
Trivium: Dialéctica (Lógica), Retórica, Gramática
As “três filosofias”: Natural, Moral, Metafísica
Quadrivium: Aritmética, Geometria, Música, Astronomia
Grau de Doutor:
Teologia
Medicina
Direito
Ciência Medieval
13
O Hortus Deliciarum, de Herrad von Landsberg (1130-1195)
13
As condenações de Etienne Tempier (?-1279), Bispo de Paris
Antecedentes: 1210
Sínodo diocesano (Sens) decreta que as obras de Filosofia Natural de
Aristóteles não podem ser lidas, sob pena de excomunhão
Âmbito do decreto: Paris (era então Bispo Pedro de Nemours)
1215: a interdição é especificada para a Universidade de Paris
1255: fim da interdição
Antecedentes: 1270
Por esta altura, já ninguém ligava ao decreto de Sens, e o averroísmo tinha grande peso em Paris
Etienne Tempier, em reunião com vários teólogos, condena treze proposições aristotélicas e averroístas
Unidade do intelecto humano
Eternidade do mundo
Eternidade do género humano, entre outras
Alvos? Sigério de Brabante e Boécio de Dácia, figuras de proa do averroísmo parisiense
Estes argumentavam que as polémicas proposições filosóficas podiam ser “verdadeiras em Filosofia”
Tempier acusava (com alguma razão) os averroístas de defenderem a “dupla verdade” (contraditória)
Ciência Medieval
14
Etienne Tempier
14
As condenações de Etienne Tempier (?-1279), Bispo de Paris
1277 (7 de Março)
O Papa João XXI (n. Lisboa, c. 1215-1277) escreve a Tempier, em Fevereiro,
preocupado com as controvérsias em Paris
Tempier já estava a preparar, com um grupo de consultores, a condenação
de 219 teses, que ocorre em Março, pouco depois da carta de João XXI
Algumas das condenações pretendem vincar o poder absoluto de Deus:
Que nada acontece por acaso, mas que tudo ocorre necessariamente (21)
Que a primeira causa [Deus] não poderia fazer vários mundos (34)
Que Deus não pode ser a causa de um novo acto [ou coisa] (48)
Que Deus não poderia mover os céus num movimento rectilíneo, porque deixaria um vácuo (49)
Algumas das condenações visam a astrologia e a adivinhação
Algumas das condenações atacam o desprezo que alguns filósofos tinham por teologia (152-154)
Ciência Medieval
15
Papa João XXI
Pluralidade dos mundos (34)
• Aristóteles negava-a por causa da sua teoria da
gravidade; abre-se a via para uma nova teoria
Possibilidade teórica do vácuo (49)
• Aristóteles dizia que o movimento rectilíneo
celestial era impossível pois criaria vácuo
Importância para a Física
15
Ciência Medieval
Cronologia resumida da Universidade de Paris na Idade Média
1200 1210 1220 1230 1240 1250 1260 1270 1280
1200: Reconhecimento
papal da Universidade
(existiria pelo menos desde
1170 como uma “guilda” –
“universitas” – de mestres e
alunos erigida em torno de
Notre Dame)
Início das traduções de
Aristóteles
1210: Proibição do Sínodo
Provincial de Sens
O Sínodo proíbe a leitura pública
ou privada das obras de Filosofia
Natural de Aristóteles. O âmbito
da proibição era local, restringia
os mestres e alunos da
Faculdade de Artes de Paris.
1245-48: São Tomás de
Aquino é aluno de São
Alberto Magno em Paris
1252: São Tomás de
volta a Paris
1256: Grau de Mestre
1258-1268: São
Tomás escreve a
Suma contra os
Gentios
1277: 219 proposições
condenadas por Tempier
A pedido do Papa João XXI,
Tempier investiga as polémicas
na Universidade de Paris e
publica uma enorme lista de
proposições condenadas
16
1270: Treze proposições
condenadas por Tempier
O Bispo Étienne Tempier
condena treze proposições
aristotélicas e averroístas, entre
elas a da unidade do intelecto
humano (contra os averroístas), e
a da eternidade do mundo
1266-1273: São Tomás escreve
a Suma Teológica (†1274)
1269-1272: São
Tomás regente da
Universidade de
Paris; redige:
De unitate intellectu
De aeternitate mundi
Buridan e Alberto da Saxónia: uma nova física nasce na Universidade de Paris
Para Aristóteles, a velocidade de um corpo em movimento violento era proporcional à força que o movia
e inversamente proporcional à resistência ao movimento:
Esta relação implicava imediatamente que o vazio (resistência nula, R=0) geraria velocidades infinitas !
Aristóteles explicava o movimento continuado dos projécteis pela propulsão exercida pelo meio (ar)
O filósofo e teólogo João Filopono de Alexandria (490-570 d.C) sugere, no seu Comentário à Física de
Aristóteles, que o movimento continuado dos projécteis se deve a uma energia impressa ao projéctil pelo
propulsor, energia essa que se esgotava ao fim de algum tempo, mesmo sem resistência ao movimento
Ibn Sīnā, ou Avicena (c. 980-1037 d.C.), desenvolve a ideia: o “mayl” é uma “inclinação” proporcional ao
peso do projéctil transferida do propulsor para este, e que é inesgotável na ausência de resistência
Jean Buridan (c.1300-1358) estabelece uma relação matemática correcta para o “impetus”:
Alberto da Saxónia (1320-1390), aluno de Buridan, desenvolve a teoria do ímpeto e explica o
movimento violento em termos muito semelhantes ao conceito moderno de inércia:
A-B: O ímpeto horizontal domina e a acção da gravidade é insignificante
B-C: A resistência abranda a velocidade (e o ímpeto horizontal)
C-D: Sem ímpeto horizontal, a gravidade gera ímpeto vertical (queda acelerada)
Ciência Medieval
17
R
F
V 
VMI 
17
Campano de Novara e os Elementos de Euclides
Euclides de Alexandria (c. 300 a.C.) é o autor dos Elementos, o
tratado matemático e geométrico mais influente de todos os tempos
Boécio terá traduzido os Elementos, mas a tradução não sobreviveu
c. 1120, Adelardo de Bath traduz os Elementos a partir do árabe
Campano de Novara (c. 1220-1296), foi matemático, astrónomo, astrólogo
e médico; a sua obra mais famosa é a revisão da tradução de Adelardo
Foi capelão dos Papas Urbano IV, Adriano V, Nicolau IV e Bonifácio VIII
Obras de Campano de Novara:
Elementa [de Euclides], 1255–1259
Theorica planetarum 1261–1264
Computus maior, 1268
Tractatus de sphera, depois de 1268
De quadratura circuli
De quadrante
Tres circulos in astrolapsu descriptos
Tractatus de astrologia indicaria
Ciência Medieval
1818
O Tratado da Esfera de Sacrobosco
João de Holywood, "Johannes de Sacrobosco", (c. 1195 – c. 1256)
Matemático, Professor na Universidade de Paris
A sua obra mais conhecida, o Tratado da Esfera, é uma síntese do Almagesto, de Ptolomeu
Obras de Sacrobosco:
De sphera mundi, c. 1230
Foi de leitura obrigatória em todas as Universidades europeias durante quatro séculos
Usado na Aula da Esfera (Colégio de Santo Antão, Lisboa)
De arte numerandi, c. 1225–1230
Importante obra sobre os algarismos indo-árabes e os métodos árabes de computação
De anni ratione, 1235
Obra crítica sobre o calendário juliano, apontando-lhe os erros acumulados (c. de 10 dias)
Ciência Medieval
19
Grosseteste e a ciência experimental
Robert Grosseteste, Bispo de Lincoln (c.1168-1253)
Filósofo, teólogo, matemático, astrónomo
1229/30-1235: professor no convento dos Franciscanos, em Oxford
Expõe o método experimental, no comentário aos Analíticos Posteriores
Como Aristóteles e Boécio, defende os dois sentidos do método:
Indutivo: das experiências às teorias
Dedutivo: das teorias às experiências (ex. Elementos de Euclides)
Subordinação das ciências à Matemática (“De lineis…”)
Contribuições para a Óptica (“De iride”)
Obras (aplicações práticas do método experimental):
De sphera (astronomia)
De luce
De accessu et recessu maris
De lineis, angulis et figuris *
De iride [i.e., do arco-íris] *
* Grosseteste conhecia as leis da reflexão e da refracção (via Ptolomeu, Algazel e Al-Kindi)
Ciência Medieval
20
Roger Bacon (c. 1214-1294), “doctor mirabilis”
Natural de Ilchester, Somerset, aos treze anos, matricula-se em Oxford
ca. 1237-1245, mestre na Universidade de Paris
ca. 1249: já mestre, terá entrado no “círculo” oxfordiano de Grosseteste
1256: torna-se frade franciscano e deixa de ensinar
1260: um novo estatuto franciscano impede que os frades ensinem sem
permissão prévia, mas Bacon será toda a vida um franciscano convicto
1265: Clemente IV, que já era amigo de Bacon, é eleito Papa
Clemente IV encomenda uma obra a Bacon, a Opus Majus (1267) →
Parte I: obstáculos à verdade
Parte II: relação entre filosofia e teologia (a base de todas as ciências)
Parte III: linguística, línguas bíblicas, gramática
Partes IV, V, VI: matemática, óptica e ciência experimental
Parte VII: filosofia moral e ética
No séc. XIX, a “tese do conflito” faz dele um “mártir” às mãos da Igreja
Bacon deverá ter estado preso ou em prisão domiciliária (1277-1279)
As razões são incertas, mas é consensual que não seriam científicas
Ciência Medieval
2121
Roger Bacon (c.1214-1294), “doctor mirabilis”
Ciência Medieval
22
«Quero agora apresentar os princípios da ciência experimental, pois sem experiência
nada pode ser suficientemente conhecido. Pois há dois modos de adquirir
conhecimento, pelo raciocínio e pela experiência. Raciocinar leva a uma conclusão e
faz-nos aceitar a conclusão, mas não torna certa a conclusão, e não remove a dúvida
de forma a que a mente possa descansar na intuição da verdade, a não ser que a
mente a descubra pelo método da experiência (via experientiae); pois muitos têm
argumentos relacionados com o que pode ser conhecido, mas porque não têm a
experiência, negligenciam os argumentos, e não só não evitam o que é danoso, como
não seguem o que é bom.
Pois se um homem que nunca viu um fogo provasse através de raciocínio adequado
que o fogo queima e fere as coisas e as destrói, a sua mente não ficaria satisfeita
com isso, nem esse homem evitaria o fogo, de forma a que ele pudesse provar pela
experiência que aquilo que o raciocínio ensinou. Mas quando ele tem a experiência
actual da combustão a sua mente torna-se certa e permanece na plena luz da
verdade. Assim, o raciocínio não chega, mas a experiência sim… O que Aristóteles
diz, então, de que a demonstração é um silogismo que nos faz conhecer, deve ser
entendido se a experiência dele acompanhar a demonstração, e não deve ser
entendido como [se tratasse da] mera demonstração.» Opus Majus, VI, I
22
Guilherme de Ockham (c.1288-c.1348)
Frade franciscano inglês e filósofo escolástico
Terá estudado em Oxford entre 1319 e 1321, sem completar o mestrado
Em 1323, alguém viajou de Inglaterra para a corte Papal em Avignon, para o
denunciar como herege
Em 1324, Ockham tem que se deslocar a Avignon para ser interrogado
Permanece em Avignon entre 1324 e 1328, e envolve-se em controvérsias
Em 1328, foge para Pisa com o seu superior, Miguel de Cesena, e outros
Em 1329, sob a protecção do Imperador Luís da Baviera, seguem para Munique
Excomungado por ter fugido de Avignon, Guilherme fica em Munique até à sua morte em 1347
Legado:
A “navalha de Ockham”: não se devem multiplicar as entidades para lá do necessário
A expressão é atribuída a Ockham, mas não surge na sua obra
O também chamado “princípio da economia, ou da parcimónia” é muito antigo e comum
A sua Suma de Lógica faz dele um dos mais importantes lógicos medievais
Por negar os universais, Ockham é considerado o pai do nominalismo *
Céptico acerca das causas finais: “todas as causas são imediatas”
Céptico acerca da eficácia da razão em Teologia: tendia para o fideísmo
Ciência Medieval
2323
Pierre de Maricourt (fl. 1269), “Petrus Peregrinus”
Autor do melhor exemplo de uso do método experimental no séc. XIII
Carta de Pedro Peregrino de Maricourt a Sigério de Foucaucourt,
soldado, acerca do Íman; terá sido escrita por volta de 1269
Maricourt foi o primeiro a aplicar o termo “pólo” num íman
Conteúdo:
Como identificar os pólos de um íman
Propriedades da magnetite
Efeito magnetizador da magnetite sobre o ferro
Leis da atracção e repulsão magnética
Aplicação dos conceitos a bússolas “secas” e “húmidas”
Sugestão de uma máquina de perpétuo movimento
Primeira edição impressa: 1558, Augsburgo (ed. Achilles Gasser)
William Gilbert (1554-1603) reconhece a sua dívida a Maricourt
Gilbert publica em 1600 a sua importante obra, De magnete
A medalha Petrus Peregrinus é atribuída, hoje em dia, pela European Geosciences Union (EGU) a quem
se destacar por contribuições científicas no campo do magnetismo
Ciência Medieval
2424
Os “calculadores” de Merton College, Oxford
Activos no segundo quartel do século XIV
Thomas Bradwardine (c.1290-1349)
William Heytesbury (c.1313-1372/3)
Richard Swineshead (fl. c. 1340-1354)
John Dumbleton (fl. c. 1338-1349)
Distinguiram a cinemática da dinâmica, e focaram-se a primeira
Descobriram o teorema da velocidade média, no contexto do movimento uniformemente acelerado:
Ciência Medieval
25
«As fontes até hoje publicadas provam, sem dúvida, que as principais propriedades cinemáticas dos movimentos
uniformemente acelerados, ainda [hoje] atribuídos a Galileu nos textos sobre física, foram descobertos e demonstrados
pelos académicos de Merton College… As qualidades da física Grega foram substituídas, pelo menos para os
movimentos, por quantidades numéricas que reinaram na ciência Ocidental desde então. O [seu] trabalho foi rapidamente
difundido por França, Itália, e outras partes da Europa. Quase imediatamente, Giovanni di Casale e Nicole Oresme
encontraram forma de representar os resultados geometricamente, introduzindo a ligação entre geometria e o mundo
físico que se tornou num segundo hábito característico do pensamento Ocidental...» - Clifford Truesdell
tvtvvtvattvxxx fifiiif
2
1
)(
2
1
2
1 2

25
Nicole Oresme, Bispo de Lisieux (c. 1320-1382)
Formula a demonstração geométrica do teorema da velocidade média
Na obra “Sobre as Configurações de Qualidades e Movimentos” (1350)
A velocidade está nas abcissas e o tempo nas ordenadas:
A área do triângulo CBA é igual à área do rectângulo AFGB
Compare-se com a mesma demonstração, feita por Galileu Galilei em 1638 →
Ao contrário de Galileu, Oresme nunca passou da demonstração geométrica
à sua aplicação a problemas reais, como ao problema dos corpos em queda
Ciência Medieval
2626
Nicole Oresme, Bispo de Lisieux (c. 1320-1382)
Quando em escolástica se discutiam as qualidades ou formas acidentais,
usavam-se os termos intensio vs. extensio, ou latitudo vs. longitudo
Na sua obra “Tratado da forma latitudinal”, Oresme introduz a representação
em sistemas de coordenadas ortogonais: latitudo = ordenadas, longitudo = abcissas
“Latitudo uniformis” é uma linha paralela às longitudes (abcissas)
Mostrou que o espaço percorrido por um ponto em velocidade constante
corresponde à área v x t
Ciência Medieval
27
t
v
)( ifif ttvxxx 
27
Buridan e Oresme sobre a rotação da Terra
Jean Buridan, no seu comentário ao De Caelo, sugere que os fenómenos
celestes podem ser explicados com a Terra parada e os céus em rotação, ou
inversamente, com a Terra em rotação e os céus parados
Sugeriu que seria mais simples se a Terra girasse, em vez dos céus
No entanto, apesar desta intuição, e devido às suas convicções físicas
(aristotélicas), rejeitou a rotação da Terra:
Oresme, comentando o De Caelo (1377), rejeita a rotação da Terra, mas dá argumentos em contrário:
1. Se a Terra rodasse, arrastaria todas as coisas terrestres com ela, incluindo o ar
2. Se a Terra rodasse, uma flecha lançada na vertical cairia na vertical (movimento composto)
3. A rotação diária da Terra far-se-ia a velocidades bem menores que as rotações celestes
Copérnico aproveitou estes argumentos na sua “Sobre as Revoluções dos Orbes Celestes” (1543)
Oresme menciona o milagre de Josué (10, 12-14): seria mais simples para Deus parar a Terra
Ciência Medieval
28
«É mais fácil mover um corpo pequeno do que [um] grande. Mas as coisas não são todas iguais, porque os corpos
terrestres, pesados, não estão adaptados ao movimento. Seria mais fácil mover água do que terra; e ainda mais fácil
mover ar; e ao ascendermos assim, os corpos celestes são, pela sua natureza, os mais fáceis de mover.»
28
O grande cisma do Ocidente (1378-1417)
Ciência Medieval
2929
O grande cisma do Ocidente (1378-1417)
Ciência Medieval
3030
Henrique de Langenstein
Paris → Viena (1384)
A transmissão do conhecimento medieval
Ciência Medieval
31
Marsílio de Inghem
Paris → Heidelberg (1386)
Paulo Nicoletti de Veneza
Paris (1393?-1395?)
Oxford → Pádua (1405?-1420?)
Leva a nova física parisiense
(dinâmica do ímpeto) para Pádua
31
A “biblioteca medieval” de Leonardo da Vinci (1452-1519)
Obras de Alberto da Saxónia (aluno de Jean Buridan, em Paris)
A obra De Meteora, de Themon, o Judeu (Mestre em Artes, Paris, 1349)
Obras de Jordão de Nemore (séc. XIII), autor de importantes obras científicas:
Não se sabe nada da sua nacionalidade e formação académica
As suas obras surgem pela primeira vez na Biblionomia de Ricardo de Fournival (c. 1246-70)
Elementa super demonstrationem ponderum, De ratione ponderis, Liber de ponderibus
Jordão de Nemore demonstra a lei da alavanca, e estuda os pesos em planos inclinados
Escreve vários tratados de Aritmética, Álgrebra e Geometria
Obras de Marsílio de Inghem, o professor que leva a ciência parisiense para Heidelberg (1386)
Obras do Cardeal Nicolau de Cusa (1401-1464), filósofo, teólogo, jurista, matemático e astrónomo
Ciência Medieval
3232
Conclusão
Traduções
Durante os séculos XII e XIII o Ocidente cristão fez a tradução da ciência e da filosofia
natural greco-árabe para latim, sem a qual não haveria grande parte do material de ensino
para os currículos preparatórios das universidades medievais.
Condições contextuais para a Revolução Científica (cfr. Edward Grant)
No início do século XIII, em Paris, Oxford e Bolonha, foram fundadas as primeiras
universidades, pouco depois de concluída a maioria das traduções; o seu currículo
preparatório (Bacharel e Mestre em Artes) incluía Lógica, Filosofia Natural, Geometria,
Aritmética, Música e Astronomia. Os graus de Doutoramento: Direito, Medicina e Teologia.
Universidades
Nas universidades medievais, não era possível obter o grau de Doutor em Teologia sem o
grau de Mestre em Artes. Este requisito produziu gerações de teólogos-filósofos, cujo
trabalho teológico exigia uma sólida competência nas Artes. Estes teólogos-filósofos
consideravam essa formação essencial para o exercício da Teologia.
Teólogos-
filósofos
3333
Conclusão
34
Porque falhou a Ciência noutras culturas? (cfr. Toby Huff, Edward Grant)
O problema da ciência árabe
Como é que a ciência não progrediu numa cultura tão rica em ideias científicas?
Falta de estruturas académicas autónomas e “neutras” (livres do poder político e religioso)
As “madrassas” servem o fito de preservar a tradição do Islão: a Sharia (lei), os Hadiths
(ditos do Profeta), a recitação do Corão e outras áreas do saber religioso islâmico
Os professores do Islão podiam estudar, em privado, o “saber estrangeiro” (p. ex.: a filosofia
grega), e transmiti-lo de forma particular e individual a certos alunos seus, mas não o
ensinavam de forma generalizada e sistemática
Os livros do “saber estrangeiro” podiam ser preservados nas bibliotecas das “madrassas”,
mas para uso exclusivo e privado dos professores
Nunca houve uma tradição académica de conciliação da filosofia grega com o Corão, ou de
defesa filosófica da teologia islâmica: essa conciliação era tida como impossível
Todavia, os hospitais islâmicos representaram um progresso civilizacional importante
Contexto filosófico e teológico desfavorável:
Voluntarismo de Alá: o Deus do Islão não está “limitado” pela razão (cfr. Bento XVI, 2006)
Al-Gazali (1058-1111) ou Algazel: afirma que a pesquisa da verdade filosófica ou científica é
perigosa; a única verdade sólida, fora do Corão e da tradição, é a demonstrada pela Lógica
34
Conclusão
35
Porque falhou a Ciência noutras culturas? (cfr. Toby Huff, Joseph Needham)
O problema da ciência chinesa
Joseph Needham (1900-1995), autor da monumental obra
“Science and Civilization in China” (27 volumes, entre 1954-2008)
A história da China medieval atesta uma série de proezas técnicas
No entanto, a China não conseguiu desenvolver uma cultura científica
Uma importante razão pode estar na falta de convicção teológica na racionalidade do Cosmos
«(…) não existia a convicção de que seres pessoais e racionais seriam
capazes de soletrar, na sua inferior linguagem terrena, o divino código
de leis que ele [o Criador] tinha decretado outrora.» - Joseph Needham
35
Revisão gráfica: Maria Ana Motta
Bibliografia recomendada
Edward Grant,
Os Fundamentos da Ciência
Moderna na Idade Média
(Porto Editora, 2002)
36
Régine Pernoud,
O mito da Idade Média
(Europa-América, 1989)
Etienne Gilson,
A Filosofia na Idade
Média
(São Paulo: Martins
Fontes, 1998)
Vários,
Enciclopédia Interdisci-
plinar de Ciência e Fé
(Verbo, 2009)
36

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Ciência Medieval

  • 1. Curso Ciência e Fé Módulo IIIB – Ciência Medieval © Bernardo Motta bmotta@observit.pt http://espectadores.blogspot.com
  • 2. Curso Ciência e Fé I – Introdução II – Filosofia Grega e Cosmologia Grega III – Filosofia Medieval e Ciência Medieval IV – Inquisição e Ciência V e VI – O Caso Galileu VII – A Revolução Científica VIII – Darwin e a Igreja Católica IX – Os Argumentos Cosmológico e Teleológico X – Filosofia da Mente e Inteligência Artificial XI – Milagres e Ciência XII – Concordância entre Cristianismo e Ciência
  • 3. 3 1. Introdução 2. O cristianismo primitivo e o conhecimento grego 3. Santo Agostinho 4. Ciência Medieval 5. São Tomás de Aquino 6. Conclusão Índice 3
  • 4. Boécio e Cassiodoro Âncio Mânlio Severino Boécio (c. 480-525 d.C.), nascido em Roma logo após a deposição do último Imperador Romano do Ocidente, Rómulo Augusto (476 d.C.) Boécio foi um dos maiores enciclopedistas latinos Deixou ampla obra sobre o “quadrivium” (termo seu), as quarto “artes liberais” de base matemática: álgebra, geometria, música e astronomia Sobreviveram tratados sobre música, aritmética e geometria, traduções e comentários de tratados lógicos de Aristóteles Boécio é considerado o “professor de lógica” da Idade Média até ao séc. XIII Deixou uma forma rigorosa de fazer teologia (ex. “De Trinitate”), conciliada sempre que possível com a razão: “fidem si poteris rationemque conjuge” “A consolação da Filosofia”, obra muito influente em toda a Idade Média Cassiodoro (c. 488-575 d.C.), estadista romano, nascido na Calábria Depois de uma longa vida pública, funda o mosteiro de Vivarium Institutiones Divinarum et Saecularium Litterarum (543-555) Obra pedagógica, serviu como programa de ensino para os monges de Vivarium O livro II, uma enciclopédia das “artes”, marcou o ensino monástico medieval Surge mais tarde em obra separada: De Artibus ac Disciplinis Liberalium Litterarum Ciência Medieval 44
  • 5. Santo Isidoro, Bispo de Sevilha (c. 560-636 d.C.) Recebe a sua educação (“trivium” e “quadrivium”) na Catedral de Sevilha Papel central na conversão dos visigodos (arianos) ao catolicismo Com a ocupação visigótica da Hispânia (séc. V), as estruturas romanas de educação e cultura estavam em erosão No Quarto Concílio de Toledo (5 de Dezembro de 633), estando presentes todos os Bispos da Hispânia, Isidoro conseguiu: Que todas as catedrais da Hispânia tivessem um seminário O modelo escolar seria o mesmo do da Catedral de Sevilha A sua obra Etimologias (20 volumes) era um compêndio do saber clássico Esse compêndio era uma “colagem” de conteúdos cristãos e pagãos As Etimologias foram muito populares durante nove séculos, até ao século XV Escreveu De natura rerum, obra dedicada ao rei visigodo Sisebuto, sobre astronomia e filosofia natural Santo Isidoro de Sevilha é o patrono dos estudantes A sua obra sobre teologia moral e dogmática apoia-se em São Gregório Magno (Gregório I) e em Santo Agostinho Ciência Medieval 5 Primeira edição impressa das Etimologias – 1472 (Augsburgo) 5
  • 6. São Beda, o Venerável Beda (c. 672-735 d.C.) foi monge dos mosteiros gémeos de São Pedro e São Paulo de Wearmouth-Jarrow (Sunderland e Newcastle, Inglaterra) Teólogo, historiador, filósofo, foi declarado Doutor da Igreja (Leão XIII) As ilhas britânicas nunca foram bem integradas no Império, e são os missionários e os monges quem leva para lá a cultura clássica grego-romana O fundador dos mosteiros, Benedict Biscop (c. 628-690), trouxe de Roma uma importante biblioteca, “ad instructionem ecclesiae necessariam” Com base nela, Beda escreve Historia ecclesiastica gentis Anglorum (c. 731) Escreveu três obras sobre o tempo as suas divisões, contendo: Cálculo da data da Páscoa com base na astronomia Ciclos das marés e sua relação com as fases da Lua Nessas obras, Beda defende a tese clássica (grega) da Terra esférica Escreve a enciclopédia De rerum natura, ou “Sobre a natureza das coisas” Ciência Medieval 6 Da Crónica de Nuremberga (1493) 6
  • 7. Alcuíno e o “Renascimento Carolíngio” Alcuíno de York (c.730/740-804 d.C.) Figura de proa do “renascimento carolíngio” Formou-se na escola da Catedral de York Convidado por Carlos Magno para ser o mestre da corte carolíngia Carlos Magno (742-814) promoveu um importante “renascimento” cultural: Na língua, unificando a escrita através do carolíngio minúsculo Na música, unificando o canto litúrgico e a escrita musical Na arquitectura, criando um estilo próprio (carolíngio) Nas artes decorativas (mosaicos, iluminuras, esculturas, frescos, etc.) Em 782, Alcuíno reorganiza a escola do palácio de Carlos Magno, em Aachen Alcuíno introduz as artes liberais (o “trivium” e o “quadrivium”) e revoluciona o ensino da corte carolíngia Alcuíno foi o mestre de Carlos Magno, e dos seus dois filhos, Pepino e Luís Ele trouxe a cultura latina, preservada em Inglaterra, para o reino Franco Homem de forte fé cristã, convenceu Carlos Magno a abandonar a prática de conversões forçadas (797) Ciência Medieval 7 Manuscriptum Fuldense (c. 831/40) 7
  • 8. Silvestre II (c. 946-1003), o Papa matemático Gerberto de Aurillac nasceu em Belliac (hoje em Saint-Simon, França) 963: entra no mosteiro de São Geraldo de Aurillac 967-969: está em Barcelona, onde terá obtido os seus conhecimentos de matemática, astronomia e de cultura árabe a partir de professores árabes 969: está em Roma onde conhece o Papa João XIII e o Imperador Otto I Gerberto é nomeado tutor do futuro Imperador Otto II, filho de Otto I 995: Gerberto parte para Itália para ser o tutor de Otto III (980-1002) 999: por escolha de Otto III, Gerberto é eleito Papa Enquanto Papa, tomou medidas enérgicas contra a simonia e o concubinato Em 1001, a população de Roma revolta-se contra Otto III e Silvestre II foge para Ravena juntamente com Otto III Contribuições de Gerberto de Aurillac: Adopção da numeração árabe Adopção de um ábaco árabe, que se divulgou em toda a Europa Reintrodução da esfera armilar, desaparecida desde a queda de Roma Escreveu várias obras sobre temas do quadrivium (aritmética, geometria, astronomia e música) Ciência Medieval 8 De Geometria, Baviera, Séc. XII 8
  • 9. Anselmo de Cantuária (c. 1033-1109 d.C.) Nasceu em Aosta (Alpes italianos), monge beneditino, filósofo e teólogo Arcebispo de Cantuária (1093-1109), Doutor da Igreja (Clemente XI, 1720) Defende a visão agostiniana da relação entre fé e razão Procura demonstrar racionalmente a existência de Deus Argumento “a priori”, ou “ontológico”: 1. Definição: Deus é o ser maior que se pode conceber 2. Deus, assim concebido, existe como ideia no intelecto 3. Algo é maior se existir realmente, e não apenas no intelecto 4. Logo, pela definição, Deus existe realmente, e não apenas no intelecto Os argumentos ontológicos, apesar da avalanche de críticas, ainda hoje são defendidos por filósofos Versões famosas do argumento: Descartes, Leibniz, Gödel, Plantinga (1974) Ciência Medieval 9 «Na verdade, não procuro antes compreender para crer, mas creio para compreender. Pois também creio nisto: “se não acreditar, não compreenderei”» - Proslogion, I 9
  • 10. As traduções medievais do “corpus aristotelicum” (séc. XII) Contexto (séculos X e XI): Fim das invasões Viking (últimas incursões no século XI) Prosperidade agrícola e comercial, invenções importantes (ferradura, arado com cunha em ferro) Maturidade teológica: Deus cria a Natureza como entidade auto-operante, uma “machina” seguindo o seu curso normal O “Corpus Aristotelicum” Lógica (“Organon”): o “órgão” que permite “trabalhar” as restantes áreas do saber Até ao século XII apenas chegaram as obras “Categorias” e “Da interpretação” (trad. Boécio) Tudo o resto desapareceu, à medida que cada vez menos pessoas sabiam ler grego (>séc. V) Os Analíticos Posteriores são traduzidos do grego e do árabe no séc. XII Física Metafísica Ética e Política Retórica e Poética  E Platão? Durante toda a Idade Média, só estava disponível a tradução de metade do Timeu Ciência Medieval 1010
  • 11. As traduções medievais do “corpus aristotelicum” (séc. XII) As traduções árabes de textos gregos só foram terminadas no século X A larga maioria foi feita na parte oriental do Islão (sobretudo Bagdade) As traduções entraram na Europa pelo Sul, mas a Reconquista (séc. XI) atrasou o processo Física: predominam as traduções do grego (fontes bizantinas, mais fiáveis) para o latim Physica: 371 manuscritos do grego e 134 do árabe De Caelo: 190 manuscritos do grego e 173 do árabe De Generatione et Corruptione: 308 manuscritos do grego e 48 do árabe Meteorologica: 175 manuscritos do grego e 113 do árabe De Anima: 423 manuscritos do grego e 118 do árabe Importantes tradutores do grego para o latim Séc. VI: Boécio (Roma) Séc. XII: Jaime de Veneza (Constantinopla), Henrique Arístipo (Catânia, Sicília), “Ioannes Hispanicus” e Domingos Gundisalvo (Toledo) Séc. XIII: Roberto Grosseteste (Oxford), Guilherme de Moerbeke (Corinto, Grécia) Importantes tradutores do árabe para o latim Gerardo de Cremona (séc. XII, Toledo) e Miguel Escoto (séc. XIII, Toledo) Ciência Medieval 1111
  • 12. Ibn Rushd (1126-1198), ou Averróis Natural de Córdova, no Al-Andalus, morreu em Marraquexe, Marrocos Fiel seguidor de Aristóteles, escreveu vários comentários à sua obra São Tomás de Aquino chamava-o “O Comentador” Averróis considerava perfeita e completa a obra de Aristóteles O averroísmo teve enorme peso no Ocidente e quase nenhum no Islão Ideias-chave do averroísmo Eternidade do Mundo (de acordo com a Física, de Aristóteles) A alma individual não é imortal (a opinião de Aristóteles é incerta) O intelecto humano é uno (“monopsiquismo”, que Aristóteles nunca defendeu) Averroístas importantes Sigério de Brabante, professor em Paris, acusado de defender a “dupla verdade” Boécio de Dácia, colega de Sigério, também professor em Paris O averroísmo, pelo que teve de servilismo nocivo, levou Duhem a adoptar esta posição radical: Ciência Medieval 12 Estátua de Averróis em Córdova «Não há ciência Árabe (…) eles [os sábios árabes] não acrescentaram nada de essencial às teorias astronómicas (…) Em Física, os sábios Árabes limitaram-se a comentários às afirmações de Aristóteles, sendo por vezes a sua atitude de absoluto servilismo.» - Pierre Duhem 12
  • 13. As primeiras Universidades (c. 1200 d.C.) Bolonha Paris (população de cerca de 1.000-1.200 alunos) Oxford Aproximadamente 750.000 alunos entre 1350 e 1500 Mais de 700 universidades por volta do ano 1500 Grau de Mestre em Artes: Trivium: Dialéctica (Lógica), Retórica, Gramática As “três filosofias”: Natural, Moral, Metafísica Quadrivium: Aritmética, Geometria, Música, Astronomia Grau de Doutor: Teologia Medicina Direito Ciência Medieval 13 O Hortus Deliciarum, de Herrad von Landsberg (1130-1195) 13
  • 14. As condenações de Etienne Tempier (?-1279), Bispo de Paris Antecedentes: 1210 Sínodo diocesano (Sens) decreta que as obras de Filosofia Natural de Aristóteles não podem ser lidas, sob pena de excomunhão Âmbito do decreto: Paris (era então Bispo Pedro de Nemours) 1215: a interdição é especificada para a Universidade de Paris 1255: fim da interdição Antecedentes: 1270 Por esta altura, já ninguém ligava ao decreto de Sens, e o averroísmo tinha grande peso em Paris Etienne Tempier, em reunião com vários teólogos, condena treze proposições aristotélicas e averroístas Unidade do intelecto humano Eternidade do mundo Eternidade do género humano, entre outras Alvos? Sigério de Brabante e Boécio de Dácia, figuras de proa do averroísmo parisiense Estes argumentavam que as polémicas proposições filosóficas podiam ser “verdadeiras em Filosofia” Tempier acusava (com alguma razão) os averroístas de defenderem a “dupla verdade” (contraditória) Ciência Medieval 14 Etienne Tempier 14
  • 15. As condenações de Etienne Tempier (?-1279), Bispo de Paris 1277 (7 de Março) O Papa João XXI (n. Lisboa, c. 1215-1277) escreve a Tempier, em Fevereiro, preocupado com as controvérsias em Paris Tempier já estava a preparar, com um grupo de consultores, a condenação de 219 teses, que ocorre em Março, pouco depois da carta de João XXI Algumas das condenações pretendem vincar o poder absoluto de Deus: Que nada acontece por acaso, mas que tudo ocorre necessariamente (21) Que a primeira causa [Deus] não poderia fazer vários mundos (34) Que Deus não pode ser a causa de um novo acto [ou coisa] (48) Que Deus não poderia mover os céus num movimento rectilíneo, porque deixaria um vácuo (49) Algumas das condenações visam a astrologia e a adivinhação Algumas das condenações atacam o desprezo que alguns filósofos tinham por teologia (152-154) Ciência Medieval 15 Papa João XXI Pluralidade dos mundos (34) • Aristóteles negava-a por causa da sua teoria da gravidade; abre-se a via para uma nova teoria Possibilidade teórica do vácuo (49) • Aristóteles dizia que o movimento rectilíneo celestial era impossível pois criaria vácuo Importância para a Física 15
  • 16. Ciência Medieval Cronologia resumida da Universidade de Paris na Idade Média 1200 1210 1220 1230 1240 1250 1260 1270 1280 1200: Reconhecimento papal da Universidade (existiria pelo menos desde 1170 como uma “guilda” – “universitas” – de mestres e alunos erigida em torno de Notre Dame) Início das traduções de Aristóteles 1210: Proibição do Sínodo Provincial de Sens O Sínodo proíbe a leitura pública ou privada das obras de Filosofia Natural de Aristóteles. O âmbito da proibição era local, restringia os mestres e alunos da Faculdade de Artes de Paris. 1245-48: São Tomás de Aquino é aluno de São Alberto Magno em Paris 1252: São Tomás de volta a Paris 1256: Grau de Mestre 1258-1268: São Tomás escreve a Suma contra os Gentios 1277: 219 proposições condenadas por Tempier A pedido do Papa João XXI, Tempier investiga as polémicas na Universidade de Paris e publica uma enorme lista de proposições condenadas 16 1270: Treze proposições condenadas por Tempier O Bispo Étienne Tempier condena treze proposições aristotélicas e averroístas, entre elas a da unidade do intelecto humano (contra os averroístas), e a da eternidade do mundo 1266-1273: São Tomás escreve a Suma Teológica (†1274) 1269-1272: São Tomás regente da Universidade de Paris; redige: De unitate intellectu De aeternitate mundi
  • 17. Buridan e Alberto da Saxónia: uma nova física nasce na Universidade de Paris Para Aristóteles, a velocidade de um corpo em movimento violento era proporcional à força que o movia e inversamente proporcional à resistência ao movimento: Esta relação implicava imediatamente que o vazio (resistência nula, R=0) geraria velocidades infinitas ! Aristóteles explicava o movimento continuado dos projécteis pela propulsão exercida pelo meio (ar) O filósofo e teólogo João Filopono de Alexandria (490-570 d.C) sugere, no seu Comentário à Física de Aristóteles, que o movimento continuado dos projécteis se deve a uma energia impressa ao projéctil pelo propulsor, energia essa que se esgotava ao fim de algum tempo, mesmo sem resistência ao movimento Ibn Sīnā, ou Avicena (c. 980-1037 d.C.), desenvolve a ideia: o “mayl” é uma “inclinação” proporcional ao peso do projéctil transferida do propulsor para este, e que é inesgotável na ausência de resistência Jean Buridan (c.1300-1358) estabelece uma relação matemática correcta para o “impetus”: Alberto da Saxónia (1320-1390), aluno de Buridan, desenvolve a teoria do ímpeto e explica o movimento violento em termos muito semelhantes ao conceito moderno de inércia: A-B: O ímpeto horizontal domina e a acção da gravidade é insignificante B-C: A resistência abranda a velocidade (e o ímpeto horizontal) C-D: Sem ímpeto horizontal, a gravidade gera ímpeto vertical (queda acelerada) Ciência Medieval 17 R F V  VMI  17
  • 18. Campano de Novara e os Elementos de Euclides Euclides de Alexandria (c. 300 a.C.) é o autor dos Elementos, o tratado matemático e geométrico mais influente de todos os tempos Boécio terá traduzido os Elementos, mas a tradução não sobreviveu c. 1120, Adelardo de Bath traduz os Elementos a partir do árabe Campano de Novara (c. 1220-1296), foi matemático, astrónomo, astrólogo e médico; a sua obra mais famosa é a revisão da tradução de Adelardo Foi capelão dos Papas Urbano IV, Adriano V, Nicolau IV e Bonifácio VIII Obras de Campano de Novara: Elementa [de Euclides], 1255–1259 Theorica planetarum 1261–1264 Computus maior, 1268 Tractatus de sphera, depois de 1268 De quadratura circuli De quadrante Tres circulos in astrolapsu descriptos Tractatus de astrologia indicaria Ciência Medieval 1818
  • 19. O Tratado da Esfera de Sacrobosco João de Holywood, "Johannes de Sacrobosco", (c. 1195 – c. 1256) Matemático, Professor na Universidade de Paris A sua obra mais conhecida, o Tratado da Esfera, é uma síntese do Almagesto, de Ptolomeu Obras de Sacrobosco: De sphera mundi, c. 1230 Foi de leitura obrigatória em todas as Universidades europeias durante quatro séculos Usado na Aula da Esfera (Colégio de Santo Antão, Lisboa) De arte numerandi, c. 1225–1230 Importante obra sobre os algarismos indo-árabes e os métodos árabes de computação De anni ratione, 1235 Obra crítica sobre o calendário juliano, apontando-lhe os erros acumulados (c. de 10 dias) Ciência Medieval 19
  • 20. Grosseteste e a ciência experimental Robert Grosseteste, Bispo de Lincoln (c.1168-1253) Filósofo, teólogo, matemático, astrónomo 1229/30-1235: professor no convento dos Franciscanos, em Oxford Expõe o método experimental, no comentário aos Analíticos Posteriores Como Aristóteles e Boécio, defende os dois sentidos do método: Indutivo: das experiências às teorias Dedutivo: das teorias às experiências (ex. Elementos de Euclides) Subordinação das ciências à Matemática (“De lineis…”) Contribuições para a Óptica (“De iride”) Obras (aplicações práticas do método experimental): De sphera (astronomia) De luce De accessu et recessu maris De lineis, angulis et figuris * De iride [i.e., do arco-íris] * * Grosseteste conhecia as leis da reflexão e da refracção (via Ptolomeu, Algazel e Al-Kindi) Ciência Medieval 20
  • 21. Roger Bacon (c. 1214-1294), “doctor mirabilis” Natural de Ilchester, Somerset, aos treze anos, matricula-se em Oxford ca. 1237-1245, mestre na Universidade de Paris ca. 1249: já mestre, terá entrado no “círculo” oxfordiano de Grosseteste 1256: torna-se frade franciscano e deixa de ensinar 1260: um novo estatuto franciscano impede que os frades ensinem sem permissão prévia, mas Bacon será toda a vida um franciscano convicto 1265: Clemente IV, que já era amigo de Bacon, é eleito Papa Clemente IV encomenda uma obra a Bacon, a Opus Majus (1267) → Parte I: obstáculos à verdade Parte II: relação entre filosofia e teologia (a base de todas as ciências) Parte III: linguística, línguas bíblicas, gramática Partes IV, V, VI: matemática, óptica e ciência experimental Parte VII: filosofia moral e ética No séc. XIX, a “tese do conflito” faz dele um “mártir” às mãos da Igreja Bacon deverá ter estado preso ou em prisão domiciliária (1277-1279) As razões são incertas, mas é consensual que não seriam científicas Ciência Medieval 2121
  • 22. Roger Bacon (c.1214-1294), “doctor mirabilis” Ciência Medieval 22 «Quero agora apresentar os princípios da ciência experimental, pois sem experiência nada pode ser suficientemente conhecido. Pois há dois modos de adquirir conhecimento, pelo raciocínio e pela experiência. Raciocinar leva a uma conclusão e faz-nos aceitar a conclusão, mas não torna certa a conclusão, e não remove a dúvida de forma a que a mente possa descansar na intuição da verdade, a não ser que a mente a descubra pelo método da experiência (via experientiae); pois muitos têm argumentos relacionados com o que pode ser conhecido, mas porque não têm a experiência, negligenciam os argumentos, e não só não evitam o que é danoso, como não seguem o que é bom. Pois se um homem que nunca viu um fogo provasse através de raciocínio adequado que o fogo queima e fere as coisas e as destrói, a sua mente não ficaria satisfeita com isso, nem esse homem evitaria o fogo, de forma a que ele pudesse provar pela experiência que aquilo que o raciocínio ensinou. Mas quando ele tem a experiência actual da combustão a sua mente torna-se certa e permanece na plena luz da verdade. Assim, o raciocínio não chega, mas a experiência sim… O que Aristóteles diz, então, de que a demonstração é um silogismo que nos faz conhecer, deve ser entendido se a experiência dele acompanhar a demonstração, e não deve ser entendido como [se tratasse da] mera demonstração.» Opus Majus, VI, I 22
  • 23. Guilherme de Ockham (c.1288-c.1348) Frade franciscano inglês e filósofo escolástico Terá estudado em Oxford entre 1319 e 1321, sem completar o mestrado Em 1323, alguém viajou de Inglaterra para a corte Papal em Avignon, para o denunciar como herege Em 1324, Ockham tem que se deslocar a Avignon para ser interrogado Permanece em Avignon entre 1324 e 1328, e envolve-se em controvérsias Em 1328, foge para Pisa com o seu superior, Miguel de Cesena, e outros Em 1329, sob a protecção do Imperador Luís da Baviera, seguem para Munique Excomungado por ter fugido de Avignon, Guilherme fica em Munique até à sua morte em 1347 Legado: A “navalha de Ockham”: não se devem multiplicar as entidades para lá do necessário A expressão é atribuída a Ockham, mas não surge na sua obra O também chamado “princípio da economia, ou da parcimónia” é muito antigo e comum A sua Suma de Lógica faz dele um dos mais importantes lógicos medievais Por negar os universais, Ockham é considerado o pai do nominalismo * Céptico acerca das causas finais: “todas as causas são imediatas” Céptico acerca da eficácia da razão em Teologia: tendia para o fideísmo Ciência Medieval 2323
  • 24. Pierre de Maricourt (fl. 1269), “Petrus Peregrinus” Autor do melhor exemplo de uso do método experimental no séc. XIII Carta de Pedro Peregrino de Maricourt a Sigério de Foucaucourt, soldado, acerca do Íman; terá sido escrita por volta de 1269 Maricourt foi o primeiro a aplicar o termo “pólo” num íman Conteúdo: Como identificar os pólos de um íman Propriedades da magnetite Efeito magnetizador da magnetite sobre o ferro Leis da atracção e repulsão magnética Aplicação dos conceitos a bússolas “secas” e “húmidas” Sugestão de uma máquina de perpétuo movimento Primeira edição impressa: 1558, Augsburgo (ed. Achilles Gasser) William Gilbert (1554-1603) reconhece a sua dívida a Maricourt Gilbert publica em 1600 a sua importante obra, De magnete A medalha Petrus Peregrinus é atribuída, hoje em dia, pela European Geosciences Union (EGU) a quem se destacar por contribuições científicas no campo do magnetismo Ciência Medieval 2424
  • 25. Os “calculadores” de Merton College, Oxford Activos no segundo quartel do século XIV Thomas Bradwardine (c.1290-1349) William Heytesbury (c.1313-1372/3) Richard Swineshead (fl. c. 1340-1354) John Dumbleton (fl. c. 1338-1349) Distinguiram a cinemática da dinâmica, e focaram-se a primeira Descobriram o teorema da velocidade média, no contexto do movimento uniformemente acelerado: Ciência Medieval 25 «As fontes até hoje publicadas provam, sem dúvida, que as principais propriedades cinemáticas dos movimentos uniformemente acelerados, ainda [hoje] atribuídos a Galileu nos textos sobre física, foram descobertos e demonstrados pelos académicos de Merton College… As qualidades da física Grega foram substituídas, pelo menos para os movimentos, por quantidades numéricas que reinaram na ciência Ocidental desde então. O [seu] trabalho foi rapidamente difundido por França, Itália, e outras partes da Europa. Quase imediatamente, Giovanni di Casale e Nicole Oresme encontraram forma de representar os resultados geometricamente, introduzindo a ligação entre geometria e o mundo físico que se tornou num segundo hábito característico do pensamento Ocidental...» - Clifford Truesdell tvtvvtvattvxxx fifiiif 2 1 )( 2 1 2 1 2  25
  • 26. Nicole Oresme, Bispo de Lisieux (c. 1320-1382) Formula a demonstração geométrica do teorema da velocidade média Na obra “Sobre as Configurações de Qualidades e Movimentos” (1350) A velocidade está nas abcissas e o tempo nas ordenadas: A área do triângulo CBA é igual à área do rectângulo AFGB Compare-se com a mesma demonstração, feita por Galileu Galilei em 1638 → Ao contrário de Galileu, Oresme nunca passou da demonstração geométrica à sua aplicação a problemas reais, como ao problema dos corpos em queda Ciência Medieval 2626
  • 27. Nicole Oresme, Bispo de Lisieux (c. 1320-1382) Quando em escolástica se discutiam as qualidades ou formas acidentais, usavam-se os termos intensio vs. extensio, ou latitudo vs. longitudo Na sua obra “Tratado da forma latitudinal”, Oresme introduz a representação em sistemas de coordenadas ortogonais: latitudo = ordenadas, longitudo = abcissas “Latitudo uniformis” é uma linha paralela às longitudes (abcissas) Mostrou que o espaço percorrido por um ponto em velocidade constante corresponde à área v x t Ciência Medieval 27 t v )( ifif ttvxxx  27
  • 28. Buridan e Oresme sobre a rotação da Terra Jean Buridan, no seu comentário ao De Caelo, sugere que os fenómenos celestes podem ser explicados com a Terra parada e os céus em rotação, ou inversamente, com a Terra em rotação e os céus parados Sugeriu que seria mais simples se a Terra girasse, em vez dos céus No entanto, apesar desta intuição, e devido às suas convicções físicas (aristotélicas), rejeitou a rotação da Terra: Oresme, comentando o De Caelo (1377), rejeita a rotação da Terra, mas dá argumentos em contrário: 1. Se a Terra rodasse, arrastaria todas as coisas terrestres com ela, incluindo o ar 2. Se a Terra rodasse, uma flecha lançada na vertical cairia na vertical (movimento composto) 3. A rotação diária da Terra far-se-ia a velocidades bem menores que as rotações celestes Copérnico aproveitou estes argumentos na sua “Sobre as Revoluções dos Orbes Celestes” (1543) Oresme menciona o milagre de Josué (10, 12-14): seria mais simples para Deus parar a Terra Ciência Medieval 28 «É mais fácil mover um corpo pequeno do que [um] grande. Mas as coisas não são todas iguais, porque os corpos terrestres, pesados, não estão adaptados ao movimento. Seria mais fácil mover água do que terra; e ainda mais fácil mover ar; e ao ascendermos assim, os corpos celestes são, pela sua natureza, os mais fáceis de mover.» 28
  • 29. O grande cisma do Ocidente (1378-1417) Ciência Medieval 2929
  • 30. O grande cisma do Ocidente (1378-1417) Ciência Medieval 3030
  • 31. Henrique de Langenstein Paris → Viena (1384) A transmissão do conhecimento medieval Ciência Medieval 31 Marsílio de Inghem Paris → Heidelberg (1386) Paulo Nicoletti de Veneza Paris (1393?-1395?) Oxford → Pádua (1405?-1420?) Leva a nova física parisiense (dinâmica do ímpeto) para Pádua 31
  • 32. A “biblioteca medieval” de Leonardo da Vinci (1452-1519) Obras de Alberto da Saxónia (aluno de Jean Buridan, em Paris) A obra De Meteora, de Themon, o Judeu (Mestre em Artes, Paris, 1349) Obras de Jordão de Nemore (séc. XIII), autor de importantes obras científicas: Não se sabe nada da sua nacionalidade e formação académica As suas obras surgem pela primeira vez na Biblionomia de Ricardo de Fournival (c. 1246-70) Elementa super demonstrationem ponderum, De ratione ponderis, Liber de ponderibus Jordão de Nemore demonstra a lei da alavanca, e estuda os pesos em planos inclinados Escreve vários tratados de Aritmética, Álgrebra e Geometria Obras de Marsílio de Inghem, o professor que leva a ciência parisiense para Heidelberg (1386) Obras do Cardeal Nicolau de Cusa (1401-1464), filósofo, teólogo, jurista, matemático e astrónomo Ciência Medieval 3232
  • 33. Conclusão Traduções Durante os séculos XII e XIII o Ocidente cristão fez a tradução da ciência e da filosofia natural greco-árabe para latim, sem a qual não haveria grande parte do material de ensino para os currículos preparatórios das universidades medievais. Condições contextuais para a Revolução Científica (cfr. Edward Grant) No início do século XIII, em Paris, Oxford e Bolonha, foram fundadas as primeiras universidades, pouco depois de concluída a maioria das traduções; o seu currículo preparatório (Bacharel e Mestre em Artes) incluía Lógica, Filosofia Natural, Geometria, Aritmética, Música e Astronomia. Os graus de Doutoramento: Direito, Medicina e Teologia. Universidades Nas universidades medievais, não era possível obter o grau de Doutor em Teologia sem o grau de Mestre em Artes. Este requisito produziu gerações de teólogos-filósofos, cujo trabalho teológico exigia uma sólida competência nas Artes. Estes teólogos-filósofos consideravam essa formação essencial para o exercício da Teologia. Teólogos- filósofos 3333
  • 34. Conclusão 34 Porque falhou a Ciência noutras culturas? (cfr. Toby Huff, Edward Grant) O problema da ciência árabe Como é que a ciência não progrediu numa cultura tão rica em ideias científicas? Falta de estruturas académicas autónomas e “neutras” (livres do poder político e religioso) As “madrassas” servem o fito de preservar a tradição do Islão: a Sharia (lei), os Hadiths (ditos do Profeta), a recitação do Corão e outras áreas do saber religioso islâmico Os professores do Islão podiam estudar, em privado, o “saber estrangeiro” (p. ex.: a filosofia grega), e transmiti-lo de forma particular e individual a certos alunos seus, mas não o ensinavam de forma generalizada e sistemática Os livros do “saber estrangeiro” podiam ser preservados nas bibliotecas das “madrassas”, mas para uso exclusivo e privado dos professores Nunca houve uma tradição académica de conciliação da filosofia grega com o Corão, ou de defesa filosófica da teologia islâmica: essa conciliação era tida como impossível Todavia, os hospitais islâmicos representaram um progresso civilizacional importante Contexto filosófico e teológico desfavorável: Voluntarismo de Alá: o Deus do Islão não está “limitado” pela razão (cfr. Bento XVI, 2006) Al-Gazali (1058-1111) ou Algazel: afirma que a pesquisa da verdade filosófica ou científica é perigosa; a única verdade sólida, fora do Corão e da tradição, é a demonstrada pela Lógica 34
  • 35. Conclusão 35 Porque falhou a Ciência noutras culturas? (cfr. Toby Huff, Joseph Needham) O problema da ciência chinesa Joseph Needham (1900-1995), autor da monumental obra “Science and Civilization in China” (27 volumes, entre 1954-2008) A história da China medieval atesta uma série de proezas técnicas No entanto, a China não conseguiu desenvolver uma cultura científica Uma importante razão pode estar na falta de convicção teológica na racionalidade do Cosmos «(…) não existia a convicção de que seres pessoais e racionais seriam capazes de soletrar, na sua inferior linguagem terrena, o divino código de leis que ele [o Criador] tinha decretado outrora.» - Joseph Needham 35
  • 36. Revisão gráfica: Maria Ana Motta Bibliografia recomendada Edward Grant, Os Fundamentos da Ciência Moderna na Idade Média (Porto Editora, 2002) 36 Régine Pernoud, O mito da Idade Média (Europa-América, 1989) Etienne Gilson, A Filosofia na Idade Média (São Paulo: Martins Fontes, 1998) Vários, Enciclopédia Interdisci- plinar de Ciência e Fé (Verbo, 2009) 36