Este documento propõe um novo modelo global para explicar a chamada Revolução Agrícola, questionando as explicações tradicionais. Sugere que contatos com civilizações extraterrestres podem ter influenciado a emergência da agricultura, propondo a hipótese "Paleo-SETI". Discute como uma história aberta a contatos cósmicos pode revolucionar a interpretação do passado humano.
Jardins Alienígenas: Uma nova teoria para a Revolução Agrícola
1. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s
Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para
explicar os paradoxos da chamada Revolução Agrícola.
Alien Gardens: The Paleo-SETI hypothesis as a Global model to explain the paradoxes of the so called Agricultural Revolution.
Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva ¹*
¹* Bacharelando em Arqueologia e Preservação Patrimonial da Universidade Federal do Vale do São Francisco.
Forma de citar ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para ex-
plicar os paradoxos da chamada Revolução Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do
Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
RESUMO
Este artigo sugere um esboço teórico de um novo modelo global explicativo para
a emergência da domesticação das espécies durante a transição Pleistoceno-
Holoceno. Trata-se de uma análise sumária dos problemas relacionados à origem
da chamada Revolução Agrícola, tendo em vista uma postura crítica sobre a
insuficiência teórica das explicações arqueológicas tradicionais – difusionistas;
geológico/climáticas; ecológico/ambientais e simbólico/rituais. Propõe como
alternativa uma reflexão teórica sob o contexto das possibilidades de explicação
oferecidas pela hipótese Paleo-SETI para o surgimento da agricultura.
ABSTRACT This article suggests an theoretical outline of a new global model for explaining the
emergence of the domestication of the species during the Pleistocene / Holocene transition.
This is a summary analysis of issues relating to origins of the so called Agricultural
Revolution in view of a critical stance on the lack of traditional archaeological
theoretical explanations - diffusion, geological / climatic, ecological / environmental
and symbolic / ritual. Proposes an alternative theoretical possibility in the context of
the explanation offered by the Paleo-SETI hypothesis for the emergence of agriculture.
Palavras chave
paleo-SETI, agricultura, modelo global,
domesticação, cereais, extraterrestres.
Key Words
paleo-SETI, agriculture, global model, do-
mestication, crops, extraterrestrials.
contexto enfadonho em dois tipos, no estavam os estudos ou correntes e pensadores
primeiro, havia uma escola preocupada com históricos muito preocupados com as noções
Introdução descrições factuais da história “uma ladainha de progressistas, derivadas do cartesianismo
de sequências de acontecimentos onde pouca e do evolucionismo darwiniano, que
O “verdadeiramente novo”: atenção é dada ao que Teggard chamava de envisavam uma mudança social lenta e
estudo ‘científico’ das causas subjacentes gradual, e mais do que isto, inevitável. Nesta,
O notável historiador F.J Teggart, já em aos estudos históricos” (ELDREDGE a realidade fugia aos fatos, e a teoria, numa
1925, pensava ser a história de sua época & TATTERSALL, 1982). Esta, que via abordagem evolucionista tinha quase sempre
mais como um exercício literário, cheio apenas os acontecimentos e produzia vagas uma pobre utilidade para os acontecimentos,
de especulações sobre as motivações de explicações sobre as causas, era segundo ele, para os dados reais da história.
pesonalidaes históricas e vazia em uma “a-científica”.
investigação dos porquês e comos por taz Sabemos hoje, o que Teggart já
do desenvolvimento de “como as coisas Na outra ponta, como decreve em vislumbrava: Que os acontecimentos
chegaram a ser como são”. Dividiu este seu ensaio intitulado “Theory of History”, históricos, os eventos da história, como ela
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2. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
nos apresenta, frustram a espectativa de um ao “realmente novo”? extraterrestres, de eventos de uma esfera
desenvolvimento lento e gradual; a noção exossociológica1, exopolítica. Estamos certos
progressivista evolutiva é mera ilusão: Para este último, Teggart previa de imaginar o impacto que tais proposições
acontecimentos que ele denominava Paleo-SETI, em uma história aberta, podem
“Num nível mais geral, o quadro da “intromissões” e “rupturas”. A estase causar nas teorias arqueológicas e que
experiência humana apresentado pelos social histórica de mudanças rápidas revolução podem realizar na interpretação da
evolucionistas sociais e pelos sociobiólogos pontilhadas e “episodicamente deflagradas” história humana; reflexos de uma mudança
é a própria antítese do que mostram os por “intromissões fundamentais” e “raras, mais importante impulsionada por uma
registros históricos. Em lugar de um progresso “geralmente vindas do exterior” (TEGGART, transformação profunda na visão cosmológica
contínuo de mudança sociocultural, os [1925] apud ELDREDGE & TATTERSALL, que os homens tem de si mesmos.
registros indicam claramente longos períodos 1982, p. 144).
de relativa inatividade entre os povos, Não é facil, nem econômico, tratar de
pontuados por interrupções ocasionais de Assim como Teggart, neste trabalho, assuntos não consensuais, a exposição de uma
ação.” (BOCK, 1980). traremos da identificação das causas de uma argumentação nunca é suficientemente clara
destas rápidas mudanças históricas criativas: ou suscinta para satisfazer as pré-concepções
“[...] achamos que a história humana A mudança envolvida na chamada “revolução e esquivar-se dos preconceitos, se assim não
nesses últimos 6.000 anos, aproximadamente, agrícola”. Esta, como um movimento fosse, não teriamos o inpacto desejado.
revela uma continuação do mesmo padrão histórico de “grande ruptura” e que assim,
básico de inovações rápidas, seguidas por requer explicações não só raras, mas que Porque devemos considerar seriamente
períodos mais longos de pouca ou nenhuma revelem um padrão global que se coadune a possibilidade de uma história aberta de
mudança.” (ELDREDGE & TATTERSALL, com os dados arqueológicos e históricos contatos com outras civilizações do cosmo?
1982, p. 141). para a emergência deste novo fenômeno. Primeiramente porque não podemos mais nos
Propomos aqui uma temática teórica e esquivar, como arqueólogos de reconhecer
A história em verdade, é a “não mudança”, assim, trataremos de discutir a possibilidade os estudos Exobiológicos formais, as
e a preocupação “exagerada com os ‘fatos’ da origem da mudança histórica ter sido evidências da Panspermia moderna, os
obscurece o pradrão global (ELDREDGE & influenciada por uma difusão de saberes estudos Ovniológicos - e contemplar uma
TATTERSALL, 1982, p. 142). A fixidez como oriúndos de um fenômeno paleo-SETI, enormidade de problemas que podem ser
uma espectativa da história, assim, segundo ou seja, do contato pretérito das culturas solucionados por essa abertura epistemica,
Teggart, se reflete numa “estabilidade” que humanas com sociedades extraplanetárias. torna-se uma postura inevitavel. Além disso,
significa a expressão das pressões sociais percebemos que a arqueologia só enriquecerá
que conspiram para manter a persistência; a Idéias triviais e problemas que persistem: as possibilidades do homem, seja em sua
imitação, o hábito, a solidariedade. Assim: cultura material ou imaterial, seja no passado
Não foram só o descritivismo e as ou para o futuro.
“certas atividades - ou seja, maneiras de premissas de padrões históricos evolucionistas
se fazer coisas e formas de pensamento - foram que obscureceram as visões teóricas sobre Como epistene arqueológica, estes
mantidas com uniformidade reconhecível de as mudanças históricas. Durante todo o saberes, estudados à luz de uma interação
época para época.” (TEGGART, 1925) percurso da construção da história humana, com as possibilidades advindas do contato
levantamos modelos teóricos como se a com civilizações extraterrestres; sociedades
Teggart se perguntou como faremos história ontológica do planeta Terra estivesse extraterrestres; culturas do cosmo, podem
para estudar os processos subjacentes da isolada do restante do Cosmos. Como se estar na vanguarda de uma mudança
história? Sugeriu uma terceira epistemologia existíssemos durante estes quatro bilhões de histórico-cosmológica em curso, necessária,
que pudesse ajustar-se melhor as realidades anos, fechados dentro de uma redoma. que nos remeta e nos reuna em profundidade
dessa história da mudança cultural ao às sociedades do passado. Se já estivemos
utilizar-se da filosofia de David Hume - “Através de todo o seu passado, a durante muitos milênios, como acreditamos,
Para Teggart, em sua concepção, haviam humanidade acreditou na intervenção, na em contato aberto com estes visitantes, talvez
três componentes na mudança cultural: 1- História, de causas exteriores [...] Foi no um reconhecimento maior desse passado
estabilidade; 2- modificação lenta e 3 - o séc.XIX que o conceito de uma história sem para uma mudança cosmológica seja o que
aparecimento do “verdadeiramente novo”. qualquer intervenção exterior e cujas causas tais sociedades aguardam pacientemente
A abordagem adequada da história deveria se linitem unicamente ao nosso planeta, para intensificar novamente suas trocas
se focar num estudo comparativo nas/e entre conseguiu se impor. Mas, como muitas idéias culturais numa história aberta. Precisamos
as sociedades para verificar como operam do século XIX, ela é discutivel.” (BERGIER no momento, portanto, definir um conceito
estes componentes na produção cultural e o [1970], 1981). exossocial para uma História Aberta, pois,
alcance e influência que tem estes três fatores mais do que qualquer “fato” ou pormenor,
na mudança histórica. Vivemos até hoje os efeitos ilusórios esse é o centro teórico deste trabalho, o padrão
dessa construção cosmológica de uma história que procuramos: Pensar assim, nos possibilita
A estabilidade, como vimos, é fruto fechada. Somando-se isto à lógica positivista, uma quebra necessária na interpretação dos
da repetição, da initação, da tradição; as que narrativas modernas poderíamos esperar
mudanças graduais seriam inerentes a todas emergir dessas premissas epistemês a partir 1 “O nascimento da exossociologia reflete uma conjuntura
de fatores: O amadurecimento do clima cultural contempo-
as culturas como uma tendência que não leva do séc. XIX? Ora, que todas as causas são râneo; o avanço observado em certas técnicas e ramos do
a nada “radicalmente novo”. Um exemplo que atribuídas ou ao homem ou a natureza conhecimento; a crise filosófica atual. A exossociologia es-
tuda precipuamente o problema da origem e evolução das
Teggart se utiliza são as alterações linguísticas próxima e trivial. À essa última, vestida civilizações cósmicas, tratando a terrestre como um caso
de geração à geração, que são sutis, e que com a roupa do evolucionismo, damos o não isolado, provavelmente pertencente a um conjunto de
mesmo cumulativas não formam uma base de nome de naturalismo metodológico. Na dimensões ainda indefinidas mais de grande abrangência.
O interesse humano pelas civilizações extraterrestres é
mudança revolucionária que pudesse ser lida arqueologia, filha desta razão, essa realidade muito antigo é, apesar de grandes dificuldades inerentes
como progresso nos grandes movimentos soube se manifestar hegemônica. Quando a essa análise, as literaturas filosóficas e cientificas – para
erráticos da história. O que levaria então ao pensamos em considerar a história humana não mencionar as metapsíquicas e metafísicas – são abun-
dantes em sugestões, hipóteses e idéias, todas partindo do
terceiro componente, a inovação verdadeira, pontilhada pela intervenção de “civilizações” pressuposto lógico da pluralidade cósmica de sociedades
civilizadas.” (PEREIRA, 1978)
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3. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
eventos empíricos e do pensamento científico explicativas, como na crítica de Teggart, que corroboradas as afirmações pela arqueologia
como indissociáveis da fenomenologia unicamente descrevem eventos cronológicos tradicional, de que o fenômeno humano pode
Cósmica - assim como houve ruptura com um em uma seqüência pouco parcimoniosa, ou ser reduzido a estas relações.
tempo em que os arqueólogos trabalhavam esvaziam-se em modelos evolucionistas sem
os sítios como isolados de seu entorno e as corroboração. Assim, dentre as perguntas que Uma das perguntas mais importantes
civilizações isoladas em seus territórios. inquietam a arqueologia há um conjunto de que não pode ser convenientemente ignorada
problemas relacionados ao surgimento da sobre o surgimento da agricultura é: Como
Em pouco menos de seis mil anos de agricultura que parecem totalmente insolúveis afinal, os homens de dez milênios atrás foram
nossa história de duzentos mil(?) fomos da pelas explicações ortodoxas: Porque a capazes de realizar processos de cruzamento
roda ao espaço, dos registros cuneiformes agricultura se tornou o meio preferencial específicos e de modificação genética para
aos computadores quânticos. Historicamente, para a subsistência humana no final do produzir novas espécies, híbridos férteis
apenas uma ínfima parte de nossas tradições Pleistoceno? Porque o processo da revolução que atendiam as demandas do que viria ser a
narrativas humanas vêem nesse percurso agrícola ocorre cronologicamente como um revolução agrícola? Esta não é uma questão
uma realização de obstinadas e improváveis fenômeno global? Que fator teria levado fácil de ser explicada pelos cenários que
criaturas solitárias. Sem dúvida, ainda hoje, sociedades tão distantes e diferentes ao mesmo foram construídos pelo evolucionismo sobre
estudamos os grandes saltos realizados pelo padrão simultaneamente? Como foi possível os contextos do passado. De onde veio o
homem dos últimos dez mil anos como ao homem do paleolítico domesticar espécies conhecimento e a técnica? Essa é a pergunta
assunto sem relação alguma com o resto do selvagens “transformando-as” em novas que fundamenta o modelo que irei propor
universo. espécies domésticas? Como este processo e que identifica o fator global que melhor
pode ter sido realizado tão rapidamente? explica essa revolução agrícola.
Numa destas narrativas espetaculares,
Entre tantas outras perguntas que geram
nos é explicado que logo após ao término do Proporei aqui, dentro de um cenário
outros grandes problemas: Se houve uma
período Pleistoceno, há cerca de 12,000 B.P, de “intromissões” e “rupturas”, portanto,
simultaneidade global no surgimento da
os registros arqueológicos revelam uma das que tais conquistas não foram “descobertas”
agricultura, por que as civilizações do Novo
principais mudanças na história humana. Após pelo homem do paleolítico, mas ensinadas a
Mundo demoraram tanto para emergir?
centenas de milhares de anos forrageando ele através do contato direto com sociedades
para obter alimentos, o “realmente novo” extraterrestres. Nossos ancestrais, em várias
Podem parecer perguntas ingênuas
apareceu: Sociedades começaram a estimular partes do globo, não foram precursores,
e redutivas, generalizantes perante a
o cultivo de algumas plantas escolhidas. Não inovadores, mas desenvolvedores. Que foram
especificidade dos contextos, porém, como
é um evento simples, gradualmente inicia- estes mesmos “visitantes” que realizaram a
veremos, são perguntas que persistem. Temos
se um processo de limpeza de áreas para o manipulação genética necessária ao processo.
neste emaranhado, diferentes problemas que
plantio, a seleção de matrizes e sementes, É claro que uma teoria como esta, que afirma
envolvem áreas muito distintas: A questão da
num processo novo de manipulação e seleção a existência de sociedades extraterrestres
mudança comportamental; da manipulação
através de cruzamentos, produz-se híbridos que visitam nosso planeta e interferem na
genética; da origem do conhecimento; da
que se tornarão a nova geração de plantas, cultura e na biologia, é anômala e certamente
transformação cultural - e todas elas têm,
que propiciarão por sua vez, o fenômeno em devastadora para os modelos evolutivos
entretanto, que responder a algum tipo de
larga escala da chamada revolução agrícola tradicionais. Mas o que é uma anomalia
sistema ou padrão global que proporcionou
- uma mudança brusca não só na alimentação senão isso: sua inadequação a um modelo.
senão toda, parte da mudança, que introduziu
como em todos os aspectos da existência
o “verdadeiramente novo”. Enfim, a questão
humana dando início à civilização, através do Uma inadequação ao modelo, entretanto
principal gira em torno do que teria acontecido,
processo da revolução neolítica. Nos 8,000 não significa uma inadequação aos dados e
globalmente, para mudar a vida milenar de
anos subseqüentes, este processo se inicia o seu valor como explicação cientifica do
nossos ancestrais tão bem adaptados em um
independentemente no sudoeste da Ásia, processo histórico. A arqueologia nasce
sistema de subsistência altamente eficiente de
na Mesoamérica, na África, na América do em meados do século XIX, pode-se dizer
caça/coleta em uma direção totalmente nova
Norte e na América do Sul. que é uma disciplina evolucionista. Assim,
que viria a mudar de forma tão profunda a
própria natureza da existência material e do evidências “anômalas” ao evolucionismo
Temos certamente que tal fenômeno, na arqueologia são anoma-las à própria
pensamento sociedade?
a história da domesticação das plantas, arqueologia e ideologicamente escrutinadas
nunca esteve tão longe de uma explicação ao limite senão negadas sumariamente
Este fator global nunca foi encontrado.
simples, é um assunto que oferece uma pelo pensamento positivista do consenso
Se pensarmos que o conhecimento somado
pauta de controvérsias para a arqueologia e arqueológico construído no darwinismo.
de áreas como a arqueologia moderna, a
a antropologia, tão cheio de “elos perdidos” Noções históricas se desenvolvem ao redor
antropologia, a genética e da botânica (da
e inconsistências lógicas e de problemas de idéias mais do que de dados, lembremos
paleobotânica) possuem respostas totalmente
técnicos, que desafiam o conhecimento, que disciplinas de difícil constatação
satisfatórias à essas perguntas fundamentais
como de mistérios que rondam o próprio experimental, como a arqueologia, a paleo-
sobre como nossos ancestrais na pré-história
nascimento das civilizações; acontecimento antropologia ou astronomia, “manufaturam
domesticaram as plantas selvagens tornado-
este revolucionário, ocorrido num “piscar o conhecimento”, construindo sistemas
as variantes de cultivo e mudaram os rumos
de olhos” para uma visão evolucionista de representação locais, instrumentos
do homem, seremos vítima de uma das
da história de nossa espécie. Infelizmente, práticos e sistemas políticos para tornar
grandes ilusões do reducionismo moderno
tais controvérsias são uma temática que suas descobertas fenomenalmente visíveis,
sobre as origens. A superfície deste assunto
raramente é bem compreendida e divulgada, representativas, e sobre tudo consensuais com
nem sequer foi arranhada; a resposta está
e o que se apresenta nos livros texto é a a maioria das vertentes teóricas aceitas por
longe de ser clara o suficiente; não somente
impressão de que a história da agricultura não tradição através de ferramentas consensuais
pela falta de dados, mas pela presunção
guarda nenhum problema de grande impacto como a propaganda. Proposições “anômalas”
de que existe uma resposta simples ligada
paradigmático a ser resolvido. revolucionárias são integrantes de seu próprio
à lógica do evolucionismo, das relações
naturais entre o homem e seu ambiente. Esta tempo - o intuito deste trabalho é fomentar a
O que possuímos hoje, para muitos,
premissa epistemológica é parte da mesma reflexão e a crítica que põe em movimento
são meras conjecturas que pretendem-se
ilusão teórica simplista que assume como a história. Bergier (em 1970) afirmava
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4. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
que: “Entretanto, é necessário que alguém abundancia dos dois fundou uma profunda do estudo da cultura material (WATSON,
comece...”, hoje precisanos continuar. desigualdade entre os homens. 2006). Segundo este paradigma o centro era
o cotidiano e a sobrevivência, a luta ente o
Por fim desta introdução, é importante que Para Rosseau, é quase impossível uma homem e o meio; a idéia da domesticação
ressaltemos que as explicações arqueológicas conjectura sobre os contextos em que o das plantas e animais, a agricultura2 assume-
que versam sobre a interferência extraterrestre homem conhece o uso do ferro. “porque se assim como a invenção mais importante
são assim revolucionárias, mas não são novas não é crível que tenham imaginado por si da história, pois ela produziu as mudanças
de modo algum, consideradas explicações mesmos tirar a matéria da mina e lhes dar mais profundas nos modos de vida humanos.
inadequadas, têm sido em verdade por si mesmos as preparações necessárias Como legado deste tempo, pode parecer ao
“desconsideradas” pela arqueologia da para por em fusão antes de saber o que olhar contemporâneo que a emergência da
modernidade, muito mais pelo seu valor anti- disso resultaria” (ROSSEAU, [1755], grifo agricultura é a transição entre a “selvageria”
evolucionista, do que por uma inconsistência meu). As minas eram em geral, lugares e a “civilização; porém como veremos este
epistemológica. Porém, fora deste valor protegidos de incêndios naturais e como é um processo longo e controverso. E que
ideológico-político da ciência arqueológica única alternativa, sobram os exemplos de melhor método para se entender tal processo
como uma disciplina da manifestação fenômenos raros como os vulcões a inspirar complexo que contrastando as diferentes
evolucionista, as proposições sobre “antigos nos homens tal idéia; ainda que esta fosse explicações sobre sua origem.
astronautas” têm oferecido explicações uma empreitada árdua, demorada e penosa de
e respostas importantes para muitos dos trabalho que seria estranho pensar que alguém Curiosamente, a domesticação agrícola
problemas da arqueologia moderna. Quanto se submeteria a tal sem antes conhecer as foi o foco das primeiras investigações
à revolução agrícola, como veremos, as vantagens que dele podiam tirar (ROSSEAU, arqueológicas cientificamente orientadas;
explicações Paleo-SETI resolvem boa parte [1755]). tal fato se deu através das escavações de
dos problemas que se apresentam hoje. Raphael Pumpelly´s no sítio de Anau no
Para a agricultura, Rosseau considera esta Turkemenistão durante a virada do séculos
Pensando numa “revolução agrícola” uma atividade conhecida muito antes de sua XIX e XX. O objetivo de Pumpelly´s era testar
pratica: “não é possível que os homens, sem hipóteses acerca da influencia do clima no
Segundo Jean-Jacques Rosseau, em seu cessar ocupados em tirar sua subsistência surgimento da agricultura (PUMPERLLY´S
Discours sur l´origine et lês fondements de das árvores e das plantas, não tivessem [1905] apud ZEDER; BRADLEY; SMITH;
l´inégalité parmi lês homis, ou Discurso Sobre bastante prontamente a idéia dos caminhos EMESHWILLER, 2006). O trabalho de
a Origem e os Fundamentos da Desigualdade que a natureza emprega para a geração dos Pumpelly´s teria um impacto muito grande
entre os Homens, são a Metalurgia e a vegetais.” (ROSSEAU, [1755]). Porém, no trabalho de outro pesquisador que afirmou
Agricultura, as duas “artes” cuja “invenção” considera que o homem caçador coletor, não como Rosseau, ser a origem da agricultura
produziu a grande revolução nas relações de possuía necessidade nenhuma, nem recursos, uma das grandes revoluções da história.
dependência entre os homens. para efetuar tal mudança; se pergunta, quando
e por que, surgiram às condições sociais e Assim, não poderíamos passar por esta
“[...] Mas desde o instante em que o tecnológicas que propiciaram a necessidade etapa sem pelo menos citar proeminentemente
homem teve necessidade do socorro do da agricultura: Very Gordon Childe3, que em 1941 cunha a
outro; desde que perceberam que era útil a expressão conceitual “revolução neolítica”
um só ter provisões para dois, a igualdade O “homem selvagem [...] tinha para se referir aos processos derivado da
desapareceu, a propriedade se introduziu, muita dificuldade de pensar de manha as revolução agrícola, dois deles já citados aqui
o trabalho tornou-se necessário e as vastas necessidades da noite [...]” “A invenção de por Rosseau. Childe afirma que a agricultura
florestas se transformaram em campos outras artes foi, pois, necessária para forçar provocou o desenvolvimento das primeiras
risonhos que foi preciso regar com o suor o gênero humano a se aplicar a agricultura. aldeias, como conseqüência, o sedentarismo,
dos homens, e nos quais, em breve, se viram Desde que eram precisos homens para fundir o aparecimento da cerâmica, e em alguns
germinar a escravidão e a miséria, a crescer e forjar o ferro, eram necessários outros para poucos milhares de anos depois, a civilização
com as colheitas.” (ROSSEAU, [1755]) nutrir os primeiros.” (ROSSEAU, [1755]). (CHILDE, 1941 apud WATSON). É
interessante que de imediato, nos desfaçamos
Na visão iluminista de Rosseau, para Temos assim, no pensamento de dessa noção agregada e interdependente
opoeta, o ouro e a prata foram os responsáveis Rosseau, uma teoria social do surgimento entre agricultura/sedentarismo /civilização,
pela queda do homem; mas, para o filosofo, da agricultura. Uma mudança brutal na pois esta idéia já há muito foi superada pela
foram o ferro e o trigo que civilizaram os lógica das relações de sobrevivência e de evidência de que esta ligação não existe.
homens e perderam o gênero humano. Em organização social desencadeia a necessidade O sedentarismo, como o abandono da vida
sua argumentação, ele clama por uma época que culmina na “revolução agrícola”. Os
em que os homens se contentavam com suas eventos que se seguiram: o sedentarismo; a 2A agricultura neste trabalho será conceituada não
cabanas simples, fabricavam roupas rústicas propriedade privada, o trabalho involuntário; como o início da atividade simples de cultivo de espécies
vegetais. Esta atividade de simples cultivo pré-existiu ao
com a pele de animais, se pintavam de a divisão em castas ou classes a valoração sedentarismo. Temos na etnografia que as populações silví-
diversas cores e enfeitavam seus corpos com das coisas mundo como mercadoria, toda esta colas possuem esta atividade de maneira bem estabelecida
conchas e plumas; confeccionavam para si lógica fez aumentar a desigualdade entre os e ancestral, com o plantio de algumas culturas no meio da
floresta, mas mantendo sua condição econômica centrada
suas ferramentas de líticas, entalhavam suas homens. na caça e coleta. Aqui, a chamada “revolução agrícola” é o
próprias armas e instrumentos musicais. Para processo de domesticação de espécies (com seleção e cruza-
mento) (Harris, 1996; Hather, 1996; Ingold, 1996; Spriggs,
ele, estas eram tarefas que um só homem Para aqueles que se aproveitaram das 1996), para que estas produzam uma base de alimentação
poderia realizar, um “homem livre”, “artes idéias de Rosseau e impingiram a ela a lógica para as populações e uma nova lógica de organização (por
que não necessitavam do concurso de muitas do progresso e da evolução, essa mudança exemplo: das relações espaciais, como o sedentarismo e das
sociais como o trabalho), o que leva a emergência civili-
mãos”. Os nativos “selvagens” viveram assim, foi inevitável devido a uma seqüência de zacional.
livres, sãos, bons e felizes. Na América, ele eventos alheios a vontade humana. Segundo
argumenta, os que não conheceram nem o a história das idéias contemporânea, e assim, 3 Outros que contribuíram grandemente para a forma-
ferro nem o trigo permaneceram assim. Os para a maioria dos arqueólogos, a “revolução ção deste campo importante da arqueologia foram Robert
que conheceram e desenvolveram um dos agrícola” foi a idéia humana mais grandiosa Braidwood, trabalhando no Crescente Fértil, e Richard
Macneish, no México central.
dois, tornaram-se bárbaros, na Europa a numa perspectiva antes de tudo Pragmática
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5. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
nômade e seminômade dos caçadores coletores sobre a multiplicidade dos centros de origem5 grande tema da origem e do valor social da
já havia se iniciado antes do aparecimento da da agricultura, a primeira vista inviabilizariam agricultura, ela versa sobre os motivos e os
revolução agrícola4. Também não podemos ter a teoria difusionista (FLEM-ATH, 1981). porquês de tal acontecimento, porém, não
uma leitura pobre de Childe, que entende bem importando sob qual foco, o cultural ou o
os limites de aplicação de suas proposições, Hoje, através do consenso, se admite ambiental, essa discussão nos últimos três
os cultivos de espécies diferentes segundo ele que houve uma seqüência de domesticação séculos têm-se mantido em um único enfoque
demandavam métodos apropriados, o clima e das espécies naturais, começa com a criação do determinismo, dos porquês até os dias de
a qualidade do solo também eram fatores a de animais de porte médio, que teriam tido hoje, o naturalismo adaptativo, como vemos
serem apreciados e logo fiou muito claro que sucesso durante a transição do Pleistoceno/ em autores modernos como Cohen (1977).
o sedentarismo dependia de vários fatores. Holoceno, época marcada pela extinção em
No Irã, por exemplo, temos climas mais massa dos ainda não compreendida dos mega- Neste trabalho, enfatizo a construção
quentes e pouca oferta de água, na Europa mamíferos. O sedentarismo e a construção de de uma hipótese alternativa à arqueologia
a situação se inverte e quanto à umidade, aldeias por volta de 12,00 - 10,000 anos B.P tradicional, que também busca responder sobre
mas o solo natural geralmente não permite se mescla com o cultivo de espécies selvagens as causas, porém sob uma lógica diferente
manter a média de colheitas por mais de três de plantas, principalmente grãos no que ficou que pretende explicar não só as necessidades,
anos, a solução era encontrar terras novas conhecido como “jardins selvagens”. O mas os processos, assim, percebo que para
perto da aldeia ou migrar para terras virgens, próximo passo foi através da seleção artificial justificar a relevância de qualquer proposição
segundo ele essa ultima estratégia foi adotada “acidental” que teria produzido as plantas no entendimento de um fenômeno como
pelos danubianos da Europa. Esta situação domesticadas (HARRIS, 2002). Em verdade, a revolução agrícola, precisamos entender
incentivou sistemas de troca e a economia poucas evidências, algumas isolada temos primeiramente o “Como” poderia ter se dado
da auto-suficiência também desaparece dessa seqüência, ademais, irei me concentrar tais processos. Que condições tornaram tal
junto com o sedentarismo absoluto. “O auto aqui no evento da domesticação das plantas e fenômeno possível. Sem esse entendimento
abastecimento da comunidade neolítica era a explicação para esse fenômeno fundamental não poderemos testar hipóteses num contexto
antes potencial do que real, sendo também que muda a base alimentar e assim é o marco histórico ainda tão vazio de corroborações.
raro que ele fosse estritamente sedentário” de transformação social mais importante para Tentarei demonstrar com isso, sem precisar me
(CHILDE, 1942). este trabalho. estender demasiadamente, que as explicações
tradicionais tornam-se essencialmente
Geralmente ainda admite-se por tradição Entre Porquês e Comos: insuficientes para o entendimento destes
na arqueologia e antropologia que foram as fenômenos. A reflexão sobre natureza e a
primeiras civilizações humanas através de Segundo Cohen, não é mais adequado profundidade das questões que enunciei no
processos difusionistas, as responsáveis pela para a história explicar apenas o “Onde” e inicio deste texto, assim como dos processos
chamada “revolução agrícola”, vimos que estas “Quando” se originou a agricultura. Muito envolvidos nestas questões fundamentais
idéias prendem-se provavelmente a leitura mais importante segundo este autor é o são essenciais para irmos além do que já foi
de Gordon Childe e sua visão romântica de “Porque” da questão. Como vimos, uma das dito por muitos, para além de conjecturas
periodista da chamada “revolução neolítica”. perguntas fundamentais centra-se nas causas derivadas de hipóteses adaptativas sobre as
Hoje sabemos através dos consensos que esta que levaram a humanidade, simultaneamente, necessidades e as causas.
teria se originado muito antes de qualquer tanto no Velho quanto no Novo Mundo à
civilização conhecida existir, em um contexto mudar o padrão de sucesso de sobrevivência Breves Contextos:
cronológico entre 14,000 e 6,500 anos B.P. de caçadores coletores para agricultores
(WATSON, 2006). Ora, neste período ainda (COHEN, 1977). Diante desta situação, a Apesar das datações sobre quando
não existiam civilizações em nenhum lugar arqueologia como pensamento evolutivo exatamente ocorreram as domesticações
do globo. Tal fato levou ao questionamento tradicional propôs teorias que tentaram serem muito controversas - como vimos entre
das ligações não tão “óbvias” que foram estabelecer modelos globais para explicar 14,000 e 6,500 B.P., num período de intervalo
construídas pela história entre o inicio da tal questão, estes, caem em três categorias de 7,500 anos entre o máximo e o mínimo
agricultura e o processo civilizacional, mas propositivas como veremos: 1) modelos aceito, ainda assim a arqueologia tem-se
podemos também questionar se de fato de pressão Ecologico-populacionais; 2) fixado muito na certeza empírica sobre a
sabemos quando se originaram as primeiras modelos difusionistas. 3) modelos de cambio localização dos centros onde esse processo
civilizações, se nossas cronologias estão climáticos tradicionais. Podemos adientar teria ocorrido pela primeira vez. Temos
corretas. Tais fatos associados às evidencias que todos têm falhado como explicação assim, nestes modelos dois centros principais
frente à maioria das evidências arqueológicas e vários secundários, considerarei aqui
(FLEM-ATH, 1981). cinco destes. As duas primeiras regiões são
4 Entre aproximadamente 12.500 e 10.000 a.C. surge ditas separadas, paralelas ou independentes
à cultura Natufiense em Israel (teriam sido as primeiras Como podemos entender, estas em relação à questão origem. A primeira é
comunidades sedentárias que se difundiram por todo o proposições tradicionais de modelos
Levante, desde o Eufrates até o Sinai. Como dados arqueo-
composta pelos sítios do sudoeste asiático, no
lógicos temos o sítio Eynan-Mallah no vale do Jordão onde explicativos para a revolução agrícola são Oriente Próximo, em particular no “crescente
há a presença de fossos de armazenamento e as estruturas derivações da lógica evolutiva. Esta é uma fértil” que se estendem desde as montanhas
de moradias indicando que a cultura natufiense já possuía
casas organizadas geralmente em grupos de seis, forman-
questão histórica transformada em uma Zagros no Iraque e no Irã onde foi a região da
do pequenas aldeias. Eram moradias semi-subterrâneas e barreira epistemológica. No início, inseri aqui Mesopotâmia. O crescente fértil certamente
circulares com muros de contenção feitos de pedra. Foram as reflexões do pensamento de Rosseau, para foi a área mais estudada quanto à transição
também achados enterramentos individuais ou coletivos,
podendo estes ser cerimônias já que há a presença de de- que fique claro que a busca pelo entendimento entre forrageamento e plantio. Muitas
corados com conchas e pedras polidas. Nestas aldeias já da revolução agrícola sempre foi uma matéria variedades de trigo foram recuperadas em
se encontram peças artísticas, feitas em ossos, geralmente
com motivos zoomórficos. Temos, assim também, o nasci-
presa grandemente às interpretações sociais sitios como o de Aswad, Syria, Ali Kosh,
mento de outras culturas agrícolas importantes como entre das necessidades naturais do homem, assim Iran, e Çayönü, Turquia, tendo sido datados
10.000 e 9.500 a.C. - cultura Khiamiense, localizada a oeste cunhou-se o termo “revolução agricola” de mais de 10,000 B.P. A importância que
do extremo norte do Mar Morto e entre 9.500 e 9.000 a.C.
- cultura Mureybetiense, a cerca do Eufrates, na atual Síria. como uma cisão espetacular. Rosseau propõe se tem dado aos sitios destas regiões é sua
Um marco cultural importante destas, seriam os supostos uma das primeiras reflexões sobre este inserção nas áreas em que ainda se encontram
primeiros ritos envolvendo a fertilidade das colheitas e seu
valor simbólico. (CHAUVIN apud WATSON, 2006).
variedades selvagens supostamente
5 Levantadas por Vavilov (1950) e Harlan, (1971). ancestrais. Cultivos mais recentes como de
5
6. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
variedades de lentilhas também “associadas” diferenças culturais e a diversidade entre as Independentes de Origem e desenvolvimento
à repositórios selvagens foram descritas sociedades neolíticas, pois, se pensarmos nos da agricultura. Tais primeiros pólos agrícolas
principalmente em Çayönü, Jericho, e Aswad termos do difusionismo direto da revolução estavam relacionados às regiões de grande
(COWAN, 1992). agricola e na migração populacional sob a altitude, ligados geograficamente sempre às
perspectiva evolucionista adaptativa à partir maiores cadeias de montanhas do globo. Para
Acredita-se que nesta região do Levante, de poucos centros, teremos que enfrentar um Vavilov, um padrão emergia, estes centros
as comunidades sedentárias precedentes as paradoxo temporal, pelo simples fato de que se distribuíam em uma latitude de 20° à 45°
agricultoras já colhiam variedades específicas tal difusão teria de ter ocorrido muito antes graus norte, nas regiões altas, principalmente
de plantas selvagens valendo-se de uma gama do que podemos aceitar hoje pela evidência dos Himalaias, do Kush indiano, no Oriente
considerável de ferramentas líticas polidas, cronológica consensual para que possamos próximo, nos Balkans e nos Pirineus. No
assim como foram descobertas sementes acomodar tamanha diversidade (CHILDE, velho mundo, seguindo um padrão de
como no caso dos sítios Natifienses. (YOSEF, 1942). Assim, pela falta de evidências de distribuição horizontal enquanto no novo
1998). Predecessoras das chamadas “Neolitic migração direta e por outras criticas que mundo, vertical, nos dois casos, entretanto,
Farmming Comunities” (Comunidades veremos ao modelo difusionista, considerarei seguindo os padrões de formação das cadeias
Agrícolas Neolíticas), estas iniciaram a todos os primeiros centros da revolução montanhosas (FLEM-ATH, Rose e FLEM-
exploração de uma grande variedade de agrícola considerados aqui, a priori como focos ATH, Rand, 1995).7
recursos selvagens, desde plantas, cereais independentes e que são aproximadamente
e frutas, à inúmeras espécies de animais simultâneos. Fora de um cenário de negação Este exemplo importa-nos aqui devido
locais e migratórios. Sitios natufienses puramente cojectural desta globalidade, esta a sua repercussão paradigmática, pois a
como o Ain Mallaha e Wadi Hammeh 27, é ainda hoje, a única proposta corroborada necessidade histórica de ligar a revolução
revelaram estruturas fixas de moradia, pelas evidências empíricas. agrícola ao inicio da civilização, fez com que
possíveis estruturas funerárias de tradições as descobertas como as de Vavilov fossem
rituais, pequena estratificação social e raras Como estivemos sempre presos à própria adormecidas por muitas décadas, e a pesquisa
estruturas de armazenagem. As comunidades lógica do surgimento da agricultura apenas concentrada nos vales fluviais do Oriente
neolíticas agrícolas que supostamente as dentro de premissas paradigmáticas evolutivas Próximo. Porém, assim como para Vavilov,
substituíram na região como Çayönü e das quais se derivaram naturalmente leituras muitas pesquisas recentes demonstraram
Jericho , mantiveram muitas das estratégias ambientais/adaptativas, análises climático/ - apesar de muitos sítios terem apresentado
e características forrageiras, estruturais e de geológicas, muitos fatos se tornaram mais de inicio uma datação holocenica de baixas
moradia, porém sendo assentamentos bem visíveis do que outros, portanto, podemos altitudes devido ao direcionamento da
maiores que apresentam pontos de distinção sempre nos questionar qual é o valor coleta de dados - quando bem investigados
como a presença de grande quantidade da evidência que hoje temos em mãos - de maneira ampla tais Centros de Origem
de materia vegetal carbonizada, grandes principalmente quando discursamos sobre das plantas domesticadas revelaram novas
estruturas de armazenagem e melhorias nas o espaço e o tempo/cronologias e lugares. localizações, mais antigas, estas em altas
superestruturas das fundações já construídas Além do que, a própria coleta de evidências, altitudes, do período da transição Pleistoceno-
em tijolos de barro. Segundo Ofer Bar- Yosef na ciência normal, foi sempre presa aos Holoceno, corroborando os trabalhos de
(1998), as estratégias de sobrevivência problemas oferecidos pelas hipóteses de Vavilov; como nos trabalhos realizados na
durante a origem da agricultura não são um trabalho. A pesquisa de Andrew Sherrat, por Nova Guiné (GOLSON, 1990); (DENHAN,
rompimento, permanecem muito similares exemplo, oferece um cenário que ilustra bem 2004).
as dos Natufienses só que com a adição do esta situação teórica amarrada ao paradigma:
cultivo das plantas. Pretendendo explicar a simultaneidade dos Surge assim, mais uma questão
locais onde se supõe ter surgido à agricultura, problemática: Por que a revolução agrícola
A segunda área principal de origem, no Oriente próximo, na Meso-américa e nos nasceria globalmente, simultaneamente e
simultânea, foi certamente a Mesoamérica, arquipélagos do Sudoeste Asiático, Sherrat em regiões de altas altitudes, das cadeias de
entre o que hoje é o Panamá e o norte do assume a existência de condições ambientais montanhosas?
México. Temos ainda outras cinco áreas que determinantes, lugares que chama de hotspots-
ainda não se provaram como desenvolvimento pontos quentes, estes caracterizados como Quanto aos homens, o discurso evolutivo
espontâneo, independente dos centro do geográfica e geológicamente6 condicionantes também direcionou a pesquisa, apresentou
Oriente Médio, são elas: A China, onde a ao surgimento da agricultura, são, portanto, nossos longínquos ancestrais que habitaram
domesticação do arroz parece ter uma história “áreas nucleares” preferenciais para o um “longo e tedioso” período Paleolítico
própria; nas terras altas da Nova Guiné; estabelecimento da domesticação das plantas como caçadores coletores que não faziam uso
África subsaariana; Os Andes amazônicos (SHERRAT apud WATSON, 2006). Tal dos grãos/sementes de gramíneas, para sua
e na América do Norte, no oriente dos determinação explicativa esta profundamente dieta básica; subsistiam de outra forma, há
Estados Unidos (HARRIS, 1996). Para estes ligada ao modelo do stress de Harris (1977), muito, bem adaptados em sua dieta de carne,
outros centros, admite-se tradicionalmente como veremos. frutos, folhas e nozes. Questionamentos
que tenham sido influenciados pelos dois sobre tais conjecturas, sobre como sabemos
primeiros, embora não haja evidências Pesquisas tradicionais nos revelam que as muitas e diversas gerações de nossos
suficientes sobre tal influência difusionista outras situações interessantes sobre a predecessores não se alimentavam de grãos
(WATSON, 2006). valorização do determinismo ambiental, selvagens como sua fonte primária de
como no caso do Botânico e Geneticista alimento, antes do surgimento da agricultura,
Um consenso da controvérsia: russo Nicholai Ivanivich Vavilov, este que são sempre bem vindas. Para o consenso,
localiza e demonstra a partir da coleta e que abusa de termos somente biológicos,
Tem-se gerado muita controvérsia estudo de mais de cinqüenta mil plantas haveriam poucos indícios de um contexto
sobre como a agricultura teria se difundido. ao redor do globo, cerca de oito Centros contrário: Afirma-se, por exemplo, que para
Pelo estudo das migrações de populações
do Oriente Próximo para o mediterrâneo 6 Andrew Sherrat é do Oxford Ashmolean Museum. Se- 7 Como vimos, a criação de animais teria sido a primeira
aventou-se que foram os homens e não as gundo ele, relevos como “justaposição de colinas”, “de- do mesticação de espécies. As datas mais antigas para este
idéias da agricultura que se difundiram. sertos” e “terrenos de aluvião”; estreitas franjas de terra evento são, porém, de apenas 9.000 anos B.P. colhidas no
que com o aumento populacional não puderam suportar as Iraque, Irã e Turquia.
Tal hipótese foi proposta para explicar as populações apenas na caça e a coleta.
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7. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
que possamos hoje digerir grãos, temos que profundo, mais complexo do que os cambios en que surgió la agricultura, así como las
colhe-los de maneira muito especial pois em adaptativos, temos que explicar afinal: Como plantas y animales en los que ésta se basó
sua grande maioria, as variedades selvagens teria ocorrido; e qual a origem da mudança originalmente. Además, hay un acuerdo
oferecem sementes muitos pequenas e de cognitiva e técnológica; como afinal se general entre los paleobiólogos de que la
difícil remoção que lhe valesse o esforço; além originou o conhecimento da domesticação domesticación se inventó solo una vez y luego
disso, precizariam ser cozidas ou brotadas das plantas e animais para que estas por fim se difundió por Europa occidental e India.”
para que pudessem ser digeridas, construir se tornassem a fonte primaria da alimentação, (WATSON, 2006).
armazens e processá-las se quiséssemos tão necessária a adaptação à cerca de 9.000.
aproveitar seu potencial para a alimentação. B.P9. Embora o paradigma evolutivo tenha Apesar deste “acordo geral”, velado, é
Assim, para que toda essa lógica pudesse convenientemente se concentrado em hoje, factual, que a agricultura como uma
propiciar um bom aproveitamento dessa elaborar conjecturas para responder ao revolução, não é um evento pontuado em um
fonte alimentar de grãos, seria necessário, primeiro tipo de pergunta, nenhuma destas único lugar e que se difunde. Este fenômeno
portanto, mais do que uma “nova” gama de duas grandes questões foi até hoje respondida começa, portanto, mais de uma vez, em
invenções, de utensílios e ferramentas. Para satisfatoriamente por modelos tradicionais. lugares diferentes e simultaneamente. Temos,
tal transformação, seria necessária também pelo menos, consensos de que tal evento
Assim, a arqueologia têm grandemente
uma mudança na organização social que aconteceu simultaneamente nos dois grandes
seguido este paradigma evolucionista dentro
só teria, assim surgido, se houvesse uma centros principais; no chamado Crescente
de uma história fechada e oferecido apenas
radical mudança nas ideias, uma revolução Fértil e na Mesoamérica.
uma contrapartida unilateral10, limitando-se
cosmológica, como vemos pelas evidências
à explicações adaptativas behavioristas que Por quanto tempo os comos podem ser
do que identificamos como revolução
nutrem e mantém o enfoque darwinista11 ignorados? Estes processos são considerados
neolítica. Quando se deu esta mudança,
sobre as relações entre as condições do meio, e explicados ainda hoje, curiosamente, como
porque e principalmente como, são perguntas
a demografia e a oferta de alimentos. Tem-se “invenções paralelas” grandes coincidências.
que precisam se relacionar num modelo
levantado explicações reduzidas a inferências Porém, coincidências podem explicar qualquer
global. Ainda não temos uma resposta
principalmente sobre os câmbios climáticos coisa e assim, acabam por não explicar
ao quando, apesar das datas expressas
da transição entre a Era do gelo e o inter- nada. Ainda que houvessem evidências ou
hoje nos sítios mais antigos portadores
glacial (WATSON, 2006) 12. Estas respostas mesmo que admitamos teoricamente que foi
destas tecnologias estarem sempre sendo
“evolutivas”, entretanto, não explicam a inicialmente um processo de difusão a partir
revisadas para uma maior antiguidade, para a
natureza vital de tais “revoluções” como a de um centro único, a questão de como surgiu
arqueologia, parte-se do indicativo temporal
agrícola, que são essencialmente como vimos a domesticação permanece.
de cerca de aproximadamente 12,000 anos
revoluções radicais das idéias.
B.P para o aparecimento destas plantas
domésticas8 e cerca de 6,500 B.P para tais Assim, podemos entender o porque
As explicações sobre como se deram os de uma valoração de muitas proposições
condições culturais. Os porquês, são hoje, e processos aparentemente não preocupam o
serão no futuro, apenas conjecturas se não conjectutrais climático-comportamentais.
“consenso da controvérsia” - na imaginação Estas são elencadas para que possam servir
considerarmos os comos. dos os autores que concordam com um a uma segunda função teórica: Preencher
Assim, a fenomenologia da revolução adaptacionismo que culmina em invenções a lacuna explicativa não só da “revolução
agrícola, guarda uma questão poucoquíssimo paralelas determinadas pelo ambiente; ou nos agrícola” como fenômeno histórico, mas
explorada que pode ser essencial ao que se utilizam-se da lógica preservacionista como um processo evolutivo. Para justificar
entendimento, questionamento ou da evolução com relação à origem da a própria improbabilidade de sua repetição
aceitabilidade de tais conjecturas: O processo agricultura mas que pretendem muitas vezes, como história simultânea de “invenção
que descrevemos não foi apenas a troca da como único argumento, negar a globalidade paralela” em civilizações consideradas
dieta alimentar associada ao cultivo das dos cenários que envolveram a revolução tão distantes em tempo e espaço, anula-
plantas e a criação de animais derivada da agrícola, como o da simultaneidade e a se a explicação sobre os “comos” ao
transformação cosmológica. Para que se domesticação abraçando um retorno teórico imaginar cenários evolutivos que nunca são
obtivessem as quantidades necessárias para ao difusionismo direto - Em qualquer um corroborados ou que são essencialmente
que esses novos alimentos pudessem compor dos casos, o discurso parece estar fechado impossiveis de se testar pelo próprio
uma troca na base alimentar, nossos ancestrais num positivismo que aposta no valor dos paradigma evolutivo. Assim, as explicações
tiveram de “modificar os espécimes” e de dados empiricos cronológico-espaciais como ambientais colocam o centro da discussões
“introduzir novas tecnologias” em quase corroboração suficiente à uma explicação em detalhes imaginários dos diferentes
todos os aspectos da vida prática. Assim final: contextos para e assim surjam diferentes
temos que perceber que o problema é “Por tanto, en el caso del Viejo explicações, uma para cada caso, uma para
muito complexo e consiste em como afinal Mundo, conocemos el lugar y el momento cada necessidade consensual. O padrão
isso foi possível. De onde vieram, rápida e global se torna a própria evolução como
pontuadamente tais conhecimentos, e que 9 Uma data que teria se iniciado também a criação e do- lei natural. Com o desenvolvimento desta
modelo global podemos propor para explicar mesticação de animais.
discussão veremos o quão profundamente
esse acontecimento? insatisfatórias são estas explicações.
10 Por um lado temos teorias ambientais econômicas,
que são várias, por outro temos apenas uma de cunho reli-
Assim, temos um jogo entre dois tipos gioso (WATSON, 2006). Neste contexto, a idéia da agricultura como
de perguntas que podemos fazer: Por que padrão global, teria surgido em última análise,
tal mudança tão drástica pôde ocorrer em 11 Numa apoteose Malthusiana literal, convenientemente simultaneamente, por diferentes motivos e
nosso comportamento alimentar? Essa, que “adaptada” a própria lógica em que nasce e se desenvolve a em diferentes contextos. A unificação global
pode ter uma resposta adaptativa. E outras arqueologia como ciência de meados do sec.XIX.
destes eventos é assim amarrada ao papel
que possuem um sentido maior e mais do clima na transição pleistoceno-holoceno.
12 A emergência da agricultura fica localizada assim Assim, os paleoecologistas têm-se dedicado
entre 14.00 e 6.500 a.C. Essa origem estaria intimamente
8 Em trabalhos de Palinologia no Sudoeste da Ásia, estes ligada ás mudanças climáticas (final da última Era do Gelo a interpretação hegemônica da evolução que
com datações por rádio-carbono do que pode ser o primei- o planeta estava esquentando e se estabilizando (WATSON, sustenta várias explicações sobre a adaptação
ro local onde houve domesticação de plantas aproximada- 2006), novos ambientes estavam se formando enquanto os
mente 10.000 a.C. (WATSON, 2006). antigos se extinguiam. e a mudança climática como sendo o motivo
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8. Teorias Arqueológicas / Archaeological Theory´s ANDRADA, A.C. de. Jardins Alienígenas: A hipótese paleo-SETI como modelo global para explicar os paradoxos da chamada Revolução
Agrícola. In: I Encontro de História do Sudeste do Piauí - U.E.S.P.I., 23 de Setembro de 2011.
principal para o inicio deste processo. Sabemos, entretanto que até cerca 12,000 anos conhecimento que em momentos como estes
Justifica-se na conclusão desses estudos que B.P, a temperatura do planeta ainda estava de “colapso” ambiental, elevam os homens
revelam que em alguns casos existe uma muito mais baixa do que a atual, e não é só rapidamente a patamares de desenvolvimento
correspondência entre os eventos de maior isso, a variação da temperatura influenciada cultural altamente improváveis? Afinal
mudança climática ocorridos no passado e pelos processos de re-estabilização geo- esta é a questão primeira que realmente nos
as mudanças no próprio “desenvolvimento” climática poderia atingir cerca de 7 graus em maravilha sobre estes “saltos” históricos que
das sociedades. Em outras palavras, discutiu- uma década. Para se ter uma idéia do contraste realizamos, o que os torna tão incomuns é
se durante as últimas décadas o papel e da instabilidade do clima e a implicação a nossa própria estranheza as explicações
determinista da mudança climática nos deste, os problemas ecológico climáticos que convencionais que podemos formular. Assim
estudos da história da cultura humana. Hoje, estamos enfrentando hoje foram ocasionados como Teggart, pensamos que estes demandam
tais estudos parecem ser a fonte de toda a por uma mudança de 3 graus em cem anos. explicações extraordinárias. Não se trata de
explicação tradicional sobre o surgimento Um cenário pouco provável para o lento uma única questão extraordinária, mas de
da revolução agrícola e de outros cenários desenvolvimento de uma prática estável várias; aqui, podemos ainda indagar sobre
importantes da “evolução humana” que de de re-adaptação como requer qualquer “ outro mistério: Por que caçadores coletores
outra forma não teriam sentido. Podemos narrativa evolucionista” da domesticação mudaram de atividade e viraram agricultores?
citar quatro casos bem conhecidos em que se das plantas. Apenas a partir de 12,000 anos Parece um caminho simples, por que colocada
propôs esse mesmo tipo lógica envolvendo a é que teríamos presenciado um aumento desta maneira a pergunta, parece haver uma
explicação ambiental de mudança climática considerável da temperatura do planeta e uma simplicidade óbvia, e assim a questão pode ser
para assim “resolver” problemas sobre a estabilização em milênios posteriores. Essa respondida por questões adaptativas somente.
história humana: A evolução humana na situação claramente trás uma crítica forte para Agora tentemos responder a uma formulação
África, o desenvolvimento da agricultura o estabelecimento da da prática da agricultura diferente: Como caçadores coletores em
na Nova Guiné, o colapso das civilizações em períodos superiores a 9,000 anos, e uma vários lugares do mundo, e na mesma época,
Meso e Sul-americanas pré-colombianas e a crítica devastadora para o desenvolvimento conseguiram não só ter as mesmas idéias
ocupação das ilhas do pacífico. (HABERLE desta prática. Uma multiplicidade de cenários revolucionárias - como afinal, adquiriram
e CHEPSTOW, 2000) simultâneos em diferentes ambientes só estes conhecimentos, principalmente para
multiplica esta complexidade. É claro modificar geneticamente espécies silvestres
Porém, o que significa atribuir apenas que toda esta situação depende de várias através de tecnologias que não possuíam,
às mudanças climáticas a resolução destas especificidades e da localização geográfica, totalmente alheias a sua lógica técnica. Aqui,
quatro grandes “anomalias” da arqueologia porém não esqueçamos que a agricultura a necessidade, os “porquês” adaptativos não
e da história humana? Evidentemente que as como conhecemos, em termos biológicos, respondem aos “Comos”.
mudanças no clima afetam a adaptabilidade de como atividade, depende muito de estações
qualquer sociedade, porém, responde a apenas do ano bem definidas e da estabilidade destas Vemos que as explicações tradicionais são
isso, um rompimento com a estabilidade, uma (MITHEN, 2003). dirigidas nesse sentido apenas aos “porquês”
mudança nas práticas culturais anteriores - o surgimento “espontâneo” da tecnologia e
relacionadas às estratégias de sobrevivência, Assim, atribuir mudanças ao estresse do conhecimento é visto como algo natural
quanto ao aspecto biológico, menos flexível, climático da transição Pleistoceno/Holoceno e pode ser negligenciado. Isto nos leva a
isto pode significar a morte, a menos que revela-se também uma generalização, pois outro conjunto de explicações, às conjecturas
se introduza a mágica da evolução, que sabemos que os climas não eram iguais sobre o aumento das pressões demográficas.
positivamente prevê sempre a sobrevivência em todos os centros de origem agrícola, Por exemplo, foi E. Boserup em 1965, quem
através da “modificação”. Mas de onde já identificados. Como vimos, isso é primeiro teria avançado a idéia de que o
vem a novidade criativa, seja cultural, interessante para a explicação evolucionista aumento na densidade populacional seria a
seja biológica? Como isto ocorre? - Uma até certo ponto, pois a diversidade de causa da mudança tecnológica (BOSERUP,
“mutação aqui”, “um acidente químico ali”, explicações conjecturais retira o foco de um 1965), revertendo assim o modelo tradicional
uma “idéia genial aqui”, uma “coincidência único modelo global que expõe o problema Malthusiano que previa a extinção e não
ali”. Explicar por que algo surge, quando da corroboração dos detalhes, onde a falta de a adaptação. Depois de Boserup, segue-se
surge pela necessidade de “surgir”, não explicação sobre a origem da modificação Mark Nathan Cohen, com “The Food Crisis
explica nada. evolutiva seria evidente. Assim, a primeira in Prehistory” (1977) que argumenta que o
conclusão é que tais teorias climáticas podem crescimento das populações alcançam uma
Neste contexto específico, estes modelos lidar apenas com abrangências regionais, o saturação mundial que teria criado uma
tradicionais, ou teorias climáticas, falham que dificulta imensamente, senão inviabiliza, situação de estresse, forçando a adoção da
ao explicarem o surgimento da agricultura, a explicação da simultaneidade da agricultura. agricultura como nova estratégia de obtenção
pois não conseguem resolver dois problemas: O segundo problema é que o clima é sempre de suprimentos alimentares (COHEN, 1977).
Primeiro, apontam a mudança climática uma mudança constante e muitas vezes Para Cohen, a vantagem da agricultura é
acontecida no final da última era glacial cíclica, o que nos deixa imaginando que se propiciar a manutenção de muitas pessoas
como o gatilho para explicar a mudança foram apenas a mudança e a adaptação as em uma quantidade pequena de terra, logo, a
global simultânea que vemos na “revolução causas do processo, se é essa a explicação, pressão demografica seria a única explicação
agrícola” - o problema surge quando porque eventos similares no passado também para a “escolha” pelo plantio. Estudando
percebemos que as datas não se coadunam não levaram a outras “revoluções agrícolas” dados principalmente da costa do Perú, Cohen
e que a invocação do inter-glacial é assim anteriores. (FLEM-ATH, 1981) gera um modelo local que busca refletir esta
uma grande generalização explicativa, uma hipótese, uma abordagem sem dúvida local.
ilusão. Os sítios mais antigos datados hoje Por estas razões, percebemos que o Quanto ao fenômeno ter uma dimensão
pela palinologia (e não há razão para acreditar terceiro tipo de pergunta fundamental que global, Cohen inclusive destaca a hipótese de
que datas mais recuadas não aparecerão no elenquei - o “Como” pode ter ocorrido o que há uma “coincidência” (em suas próprias
futuro) apontam para uma data de cronologia processo da revolução agrícola - é na verdade palavras) cronológica entre o aparecimento
de 14,00013 anos para o início da agricultura. a primeira pergunta que precisamos responder da agricultura e a extinção da mega-fauna,
adequadamente, e essa questão principal sendo esta mesma, também um processo
13 Muito embora a maioria das datações mais antigas nunca foi respondida pelas conjecturas global. Uma das conclusões do autor não é
estão entre 12,000 e 10,000 B.P. tradicionais: De onde vem a força inventiva, o
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