O contrabando de sementes de café brasileiras para outros países produtores, como Equador e Peru, vem crescendo, o que pode ameaçar a competitividade do Brasil. Representantes do setor afirmam que a exportação ilegal dessas sementes, desenvolvidas por institutos de pesquisa brasileiros, desrespeita a lei e não remunera os criadores.
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Cresce contrabando de sementes de café
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"Não é honesto os países utilizarem esse meio de contrabando", afirma Silas Brasileiro,
do Conselho Nacional do Café
17/04/2014 - 05:00
Cresce contrabando de sementes de café
Por Carine Ferreira
A extensa lista de produtos contrabandeados que preocupa autoridades e iniciativa privada em qualquer lugar do mundo
conta com um novo item. A Fundação Procafé e o Conselho Nacional do Café (CNC) informam que é crescente a exportação
ilegal de sementes da cultura do Brasil para nações produtoras "concorrentes", uma prática que começa a ser encarada como
uma ameaça à atividade no país.
Esse comércio ilegal normalmente envolve variedades que levaram anos para serem desenvolvidas por institutos de
pesquisa brasileiros e apresentam características como resistência a pragas ou maior produtividade. A ação criminosa não só
desrespeita a lei que protege a propriedade dessas cultivares como não remunera seus criadores por seu trabalho. De
quebra, pode ser considerada um fator de risco fitossanitário.
Uma parte do contrabando é creditada a representantes do segmento de outros países em visita ao Brasil inclusive para
participar de programas de cooperação, diz André Luiz Garcia, engenheiro agrônomo e pesquisador da Fundação Procafé.
Como "lembrança" de sua jornada, e no afã de plantar o mais rapidamente possível a variedade desejada em seu país, esses
turistas carregam as sementes na bagagem quando voltam de onde vieram.
E, segundo Garcia, não é difícil encontrar quem venda ilegalmente essas sementes, que, "inocentemente", saem do país sem
o devido Registro Nacional de Sementes e Mudas (RENASEM) do Ministério da Agricultura. Menos inocente é a exportação
das sementes brasileiras como se fossem café em grão para consumo.
Nesse caso, os criminosos são produtores de sementes que não querem cumprir os trâmites necessários para a obtenção dos
certificados de fitossanidade de origem e viabilidade. Um dos problemas para desmascarar esses contrabandistas é que não
existem marcadores moleculares que indiquem exatamente qual variedade está deixando o país.
Em 2013, segundo o pesquisador da Procafé, estima-se que foram exportadas "por baixo do pano" cerca de 30 toneladas de
sementes de café do Brasil, o equivalente a 120 milhões de sementes. Esse volume é suficiente para cultivar 30 mil hectares
- e, a partir de uma produtividade de 25 sacas por hectare, pode gerar 750 mil sacas de café. No mercado formal, um quilo de
sementes vale de R$ 25 a R$ 30, segundo Garcia.
Segundo um consultor que trabalha com projetos nas Américas Central e do Sul, o Equador adquiriu, no fim do ano
passado, cerca de 80 toneladas de sementes para um projeto de renovação de área no país.
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2. Sem entrar no mérito da legalidade desse comércio, por não ter informação sobre cada transação, o consultor confirmou,
por exemplo, que diversos países da América Central têm adquirido variedades brasileiras de café resistentes à ferrugem,
doença que provoca perdas significativas em lavouras de países da região, que é reconhecida globalmente como uma
fornecedora de café arábica de boa qualidade.
Silas Brasileiro, presidente do CNC, diz que a entidade fez um alerta sobre a prática ilegal na reunião anual da Organização
Internacional do Café (OIC) realizada no mês passado, em Londres. O tema deverá ser debatido novamente em setembro,
em outro encontro promovido pela entidade. De acordo com Brasileiro, as sementes contrabandeadas têm como destinos
principais países da América Central, Equador e Peru.
"Não é honesto os países utilizarem esse meio de contrabando", afirma. CNC e Procafé sustentam que o Brasil já tem
dificuldade em competir com esses países, que ainda têm mão de obra abundante e barata, e que um dos trunfos brasileiros
é justamente a tecnologia. Se nada for feito, no futuro a concorrência brasileira poderá contar com as mesmas certificações
internacionais que diferenciam o nosso café.
O Ministério da Agricultura informa que não foi notificado oficialmente sobre o assunto, mas garante que a fiscalização de
viveiros de produção de mudas de café é muito atuante nos Estados produtores de café. Em nota, diz que pode "estar
ocorrendo a exportação de café para consumo que, quando chega ao país de destino, é utilizado como semente. Nesse caso,
compete ao país importador a responsabilidade pela fiscalização dos materiais que são importados em seu território".
"Se o país importador não exige o certificado, o exportador brasileiro não é impedido de exportar grãos sem o certificado.
Não vejo como fiscalizar tal ação", afirma André Peralta da Silva, coordenador de sementes e mudas do Departamento de
Fiscalização de Insumos Agrícolas do ministério. Segundo ele, um número cada vez menor de países exige certificado
fitossanitário para grãos de café importados.
O Valor procurou a Anacafe, associação da Guatemala que representa a cafeicultura na América Central, para comentar o
assunto, mas foi informado que não havia porta-vozes disponíveis. Por outro lado, o Instituto Agronômico de Campinas
(IAC), que desenvolveu a maior parte das variedades de café arábica em uso comercial no Brasil, informou que está fazendo
adequações para rastrear seus sistemas de produção de sementes e transferência de tecnologia para coibir práticas ilegais.
Conforme o pesquisador Gerson Silva Giomo, o IAC tem priorizado a produção de "sementes genéticas" de café, obtidas a
partir de melhoramento. Nesse caso, as sementes de novas cultivares somente são transferidas ao setor produtivo por meio
de um termo de cooperação técnica que estabelece um elo entre a instituição e o usuário das cultivares. Ele ressalva que o
instituto não tem controle sobre cultivares lançadas antes dessa política, que são de domínio público.
Outro ponto a ser considerado, diz Garcia, da Procafé, é que uma instituição chamada "World Coffee Research", financiada
por indústrias de café de diversos países, está propagando o intercâmbio de variedades entre nações. Em seu site, a entidade
informa que sua missão é promover a ampliação do fornecimento de café arábica de forma sustentável, por meio de
pesquisa agrícola e "desenvolvimento colaborativo". Procurada, a WCR não respondeu aos pedidos de entrevista da
reportagem.
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