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Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010
ONTOLOGIA DO MOVIMENTO HUMANO: TEORIA DO
“SE­MOVIMENTAR” HUMANO
O se­movimentar
Com base na revisão das teorias sobre o movimento humano, con­
sideramos que, para entender as premissas filosóficas de tal con­
ceito, é necessário, acima de tudo, percebê­lo na “relação
sujeito­mundo”, quando as ações do movimento e sua intencionalida­
de são interpretadas como distintas e coincidentes. Com base nessa
compreensão, Kunz (2000a) formula sua ideia sobre uma teoria do
“se­movimentar” humano, distinguindo­a, claramente, das teorias ci­
entíficas anteriores, especialmente daquelas que se valem de conceitos
somente físicos. A questão primordial, para esse autor, é interpretar o
movimento dos seres humanos como fenômeno fundamental da vida.
Uma existência sem movimento é impensável. Por isso, estudos que
se ocupam de forma tão abrangente do fenômeno do movimento hu­
Resumo
Este texto busca a revisão de teorias do movimento humano, para entender suas
premissas de argumentação filosófica “relação sujeito­mundo”. Com base na
compreensão filosófico­antropológica da corporeidade que se dá por meio do
conceito “se­movimentar”, pensado no Brasil por Kunz (2000a; 2000b), buscamos
refletir sobre trabalhos de autores cujas contribuições teóricas concebem o
movimento como fenômeno fundamental para a vida humana, aprofundando
análises sobre o diálogo entre ser humano e mundo e ressaltando análises
conclusivas sobre a relevância dos estudos do “se­movimentar” no processo de
ensino­aprendizagem humano.
Palavras­chave: Ontologia – Movimento Humano – Linguagem
Lísia Costa Gonçalves De Araújo
Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, Santa Catarina, Brasil
Soraya Corrêa Domingues
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
Elenor Kunz
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
Aguinaldo Cesar Surdi
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
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Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010
mano forçosamente devem encerrar uma compreensão filosófico­an­
tropológica da corporeidade.
Kunz e Trebels (2006) já ressaltaram a importância de um entendi­
mento fenomenológico do movimento humano. De um modo geral,
nesta publicação esses autores buscavam esclarecer a impossibilidade
de transformá­lo num simples objeto de pesquisa, como ocorre com os
estudos da física ou mesmo da psicologia. Muito mais que um “em
si”, o movimento constitui um meio e uma precondição para as expe­
riências objetivas na vida de pessoas. Na perspectiva de um “se­movi­
mentar”, a conduta dos sujeitos em ação deve ser analisada como um
acontecimento relacional numa referência situacional­pessoal.
Por isto, também, pode­se notar que a compreensão do “se­movi­
mentar” orienta­se pela qualidade do movimento, que está intimamen­
te relacionada às vivências, às emoções e à sensibilidade das ações
experimentadas, conforme os estudos de Kunz e Trebels (2006). Desse
ponto de partida, é possível desenvolver um estudo filosófico do mo­
vimento humano mais complexo e multidimensional em relação às
análises unilaterais anteriormente propostas, por exemplo, pela biome­
cânica. Este estudo deverá abranger perspectivas antropológicas, feno­
menológicas, sociológicas, estéticas e conhecimentos e teorias sobre a
linguagem; entretanto, as abordagens físicas e mecânicas não podem
ser simplesmente abandonadas, em favor da abordagem filosófica. É
importante o conhecimento que resulta da abordagem filosófica sobre
as diferentes concepções ou imagens dos seres humanos – perceptíveis
nas várias interpretações do movimento humano – ou, como prefere
Tamboer (1979), sobre as diversas imagens de seres humanos subja­
centes às imagens do movimento humano.
Dessa maneira, um melhor entendimento do “se­movimentar” hu­
mano pode ser encontrado nos estudos acerca do “movimento pró­
prio”, descoberto no significado existencial do agir, na própria
espontaneidade. Trata­se da relação sujeito­mundo e das relações de
seres humanos nas dimensões espaço­temporais. Porém, numa pers­
pectiva dialógica, não é possível fragmentar ser humano e mundo,
tempo e espaço. É preciso encontrar a “unidade primordial” (Merleau­
Ponty, 1999) de um “ser­estar­no­mundo”. Em seu racionalismo, a ci­
ência desconsidera essa unidade primordial entre ser humano e mun­
do, separando, por exemplo, sujeito do objeto. Assim, uma teoria para
o “se­movimentar” humano também não entende que movimento e
percepção sejam dois elementos de ação independentes. Movimento e
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percepção são de efeitos mútuos. Como ressalta Merleau­Ponty:
Se se restabelece esse ponto de vista vertical­perceptivo do
mundo e do ser, não há lugar para procurar construir no corpo
objetivo, como o faz a fisiologia nervosa, toda uma espessura
de fenômenos nervosos ocultos, graça as quais os stimuli defi­
nidos objetivamente seriam elaborados como percepção total.
(2000, p. 212).
Percepção tempo e espaço
A chave está na ideia de que a percepção é nela mesma ignorância
de si como percepção selvagem, impercepção, tende a ver­se como
ato e a esquecer­se como intencionalidade latente. A percepção é abor­
da aqui considerando a teoria da Gestalt, onde há uma relação entre fi­
gura e fundo, em que um não é o oposto do outro, mas ambos se
alicerçam oferecendo um sentido. Podemos observar as coisas no
mundo, e estas estão sempre em relação. Daí a diferença entre movi­
mento concreto e abstrato. O fundo do movimento concreto é o mun­
do dado e no movimento abstrato este fundo é construído. Quando
faço um sinal com as mãos me despedindo de um amigo, não o faço
como uma representação do meu pensamento ou como uma tradução
dos meus pensamentos em gestos, o faço espontaneamente, sem per­
ceber o sinal em meu corpo. Não há uma percepção e depois um mo­
vimento, a percepção está no próprio movimento. Ao contrário, o
movimento abstrato rompe sua inserção no mundo e constrói em torno
de nós um mundo fictício, assim como, por exemplo, executamos uma
série de flexões para fortalecimento da musculatura do braço, agora
diferentemente de antes o meu corpo é a sua meta, assim podemos di­
zer que o “movimento concreto é centrípeto e o abstrato é centrífugo;
o primeiro ocorre no ser ou no atual, o segundo no possível ou no não
ser, o primeiro adere a um fundo dado, o segundo desdobra ele mesmo
seu fundo. (MERLEAU­PONTY,1999, p. 160).
Isto resulta, também, em sérias consequências para a compreensão
das categorias tempo e espaço. Kunz e Trebels (2006, p. 26, 27) cha­
mam atenção para estudiosos da antropologia e filosofia, como Victor
von Wieizäcker, que preferem usar as expressões tempo e espaço vi­
tais para entender melhor um “se­movimentar” com vida, emoção,
sensibilidade, percepção e intuição. Foi certamente por isso que Buy­
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tendijk (1997) já ressaltava a questão da intencionalidade e da valora­
ção como características antropológicas fundamentais na teoria do
“se­movimentar” humano. Hoje é possível entender a sua insistência
em compreender esse fenômeno com base em sua “funcionalidade” ou
função, como afirmou, interpretada por ele como a indivisibilidade de
mudanças significativamente relacionadas com algo exterior a essas
mesmas mudanças.
Isto leva a entender que o significado de um movimento que acaba
de ser realizado não é o mesmo que se tem ao iniciá­lo. Porém Tambo­
er (1979) alerta que o significado desse movimento “só é significado
se for incorporado não como valor de uma escala” (1979, p. 8). Assim,
um se­movimentar, como função, refere­se à organização espontânea
que se constrói num contexto específico. Essa “função” de um “se­
movimentar” orienta­se num sentido teleológico para um “ponto futu­
ro”. Resultar daí uma estrutura espaço­temporal bem diferente daquele
que é possível encontrar na maioria das abordagens científicas que es­
tudam o movimento físico.
Além disso, numa visão filosófica, o movimento humano é com­
preendido mediante várias outras categorias, entre elas, as de percep­
ção, experiência, sensibilidade, intuição e promoção. O envolvimento
de todas essas categorias de forma objetiva surge com a concepção di­
alógica do movimento humano. Primeiramente autores holandeses,
como Buytendijk e Gordijin (apud KUNZ, 2001, p. 103, 104), traba­
lharam com essa ideia de movimento humano; na Alemanha, como
por exemplo, a publicação de Kunz e Trebels (2006) vem aprofundan­
do a teoria do movimento humano com base na fenomenologia, espe­
cialmente a partir de Merleau­Ponty (1999).
A tarefa principal de uma concepção dialógica é identificar as dife­
renças entre o “se­movimentar” de sujeitos e o movimento de objetos.
Seres humanos também podem, em determinados casos, ser objeto em
movimento, quando são transportados ou quando se tornam objeto de
análises. O “se­movimentar” trata, portanto, principalmente da expres­
são dos atores do movimento no contexto de uma situação concreta e
de um significado que orienta todas as ações e torna possível a apreen­
são de sua estrutura global.
Dessa forma, já se pode perceber que não é o movimento o objeto
de análise, mas aquele, da “relação sujeito­mundo”, que se­movimen­
ta. E quando alguém se movimenta livremente, de forma espontânea,
motivado por um significado que é constituído na ação, ocorre, então,
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uma relação dialógica nesse ato. É dialógica, segundo Kunz e Trebels
(2006), porque somente a partir desta relação podemos criar novas
possibilidades, com base numa linguagem junto do outro e do mundo.
Por meio da ontologia do humano, que se ocupa das dimensões quali­
tativas da experiência humana em ação, articula­se o interesse pedagó­
gico da experiência humana, que poderá ser de grande utilidade para
as transformações e redimensionamento dos temas relacionados à edu­
cação física, há tanto tempo discutidos.
Gorgijn (apud KUNZ, 2000a, 103) apresentou o conceito dialógico
do movimento humano: uma teoria não mecânica do movimento com
a qual buscou resgatar o sentido do “sujeito ativo”, marcando uma for­
te diferença entre o ser humano como objeto e como sujeito do movi­
mento. O holandês pautou seu estudo na ontologia da linguagem, com
a qual pôde desenvolver o conceito de diálogo, vinculado à ideia de
relação de ontogênese, na qual o binômio ser humano/mundo é cen­
tral. Com base na Teoria da Gestalt,esta relação busca valorizar o fun­
do que se exprime, numa dimensão temporal, que encontramos em
todos os nossos atos. Esse fundo está relacionado com os aspectos
subjetivos, imanentes, dos quais retomamos de maneira sempre inédi­
ta para, num contexto intersubjetivo, fazermos as aprendizagens. Mer­
leau­Ponty explica que
[...] o fundo do movimento não é uma representação associada
ou ligada exteriormente ao próprio movimento, ele o anima e o
mantém a cada momento; a iniciação cinética é para o sujeito
uma maneira original de referir­se a um objeto, assim como a
percepção. (1999, p. 159)
Na experiência perceptiva, vivemos fecundamente o fenômeno,
não há necessidade de reflexão, fazemos isto espontaneamente. Vamos
introduzindo­nos no mundo através de nossos sentidos, sem qualquer
diferenciação ontológica ou epistemológica. O mundo perceptivo nos
coloca diante de uma vida espontânea. Portanto, é preciso cuidado pa­
ra não nos rendermos ao paradigma social vigente d objetivismo, a
fim de não desvalorizarmos o caráter relacional e criativo que é ponto
fundamental do movimento humano. Com isso, existe a possibilidade
de respeitar os alunos por meio da “relação sujeito­mundo”.
É preciso esclarecer, contudo, que a crítica não busca desvalorizar
o conhecimento produzido pela perspectiva empírico­analítica; entre­
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tanto, alerta principalmente para as condições de análise dos resulta­
dos, nas quais o que se coloca como figura é absolutizado, abandonan­
do­se o fundo, no qual se encontra a dimensão relacional e
significativa dos sujeitos, gerando a deturpação da compreensão dos
próprios movimentos analisados. O movimento é uma manifestação
primeira, é a nossa entrada no mundo, tem um significado de vida,
ressalta Kunz (2000a), afirmando que o se­movimentar é uma ação re­
lacional do ser humano, que se mistura ao mundo construindo­se co­
mo sujeito, sendo o mundo a sua contraface imaginária.
Dialógica – linguagem e significado
A concepção dialógica do movimento humano procura um entendi­
mento não mecânico do mesmo. Essa teoria se orienta para a relação
entre ser humano e mundo por meio da ação, que corresponde exata­
mente ao diálogo que o ser humano desenvolve com o mundo em seu
“se­movimentar” (KUNZ, 2000a). Esse “se­movimentar”, como a im­
bricação entre pensar e falar, é uma das múltiplas formas nas quais a
unidade primordial do ser humano com o mundo se manifesta.
É preciso que nos misturemos àquilo que pretendemos conhecer. E
isso pode ser feito – de forma oblíqua, pelo canto do olho, como Mer­
leau­Ponty (2000) costumava dizer – por meio da linguagem. “A lin­
guagem é por si oblíqua e autônoma e se lhe acontece significar
diretamente um pensamento ou uma coisa, trata­se apenas de um po­
der secundário de sua vida interior” (MERLEAU­PONTY, 2004, p.
73). A linguagem carrega um fundo inacabado que só permite sentir
veladamente, obliquamente. Consideramos a função objetiva como se­
cundária na linguagem. É uma porta de entrada para que possamos de­
terminar o que antes estava indeterminado. Contudo, é preciso que se
estabeleça uma relação dialética, pois, quando somente olhamos de
frente, absolutizamos as coisas e ficamos muito longe de compreendê­
las numa relação que não deixe lacunas e que, portanto, não deixe es­
paços para as significações, enfim, para as nossas aprendizagens.
O movimento humano está inserido num contexto relacional que
torna possível um diálogo incessante entre os sujeitos e o mundo, esta­
belecendo um embate no qual os sujeitos se revelam e são revelados
pelo próprio movimento, atualizando­se e transformando­se junto ao
mundo.
Kunz (2000a) analisa a abordagem de Trebels sobre o movimento
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num contexto significativo, destacando­o em seu “significado motriz”,
no qual o movimento significativo é a própria expressão da “relação
sujeito­mundo”, aliando­se ao seu aspecto intencional e subjetivo os
aspectos objetivos do mundo percebido. Esses aspectos estão, assim,
numa relação de imbricação a qual permite a atualização constante
dos sujeitos no mundo. Nesse sentido, o autor apresenta a concepção
dialógica do movimento destacando o seu aspecto simbólico, expressi­
vo e significativo. Os significados nascem por meio de relações cria­
das em contextos específicos e que geram um conteúdo específico. É
na ação que são possíveis as atualizações desses conteúdos. É por in­
termédio das novas experiências, das inter­relações que podemos mo­
dificar os contextos, criando, assim, novos sentidos.
Kunz e Trebels (2006) propõem a mediação pedagógica mediante
o movimento significativo ou intencional. Os autores definem o “se­
movimentar” como um comportamento pleno de sentido, como algo
que acontece no interior de uma interdependência (diálogo sujei­
to/mundo) relacionada ao sentido. Assim, ao congelarmos nossos
olhares no movimento humano como algo exclusivamente físico ou
exclusivamente “espiritual”, estamos fora do contexto educacional,
pois
[...] o físico não é algo que possamos ensinar, educar, formar.
Não podemos abstraí­lo do nosso ser­ser humano, como uma
coisa [...]. Na observação dos alunos em uma aula de ginástica,
a tentativa de tentar enxergá­los como físicos que se movem só
poderá acontecer uma única vez. É que, simplesmente, isto não
é possível: não são os físicos que correm, saltam ou se lançam;
são os alunos que estão ocupados em fazer alguma coisa.
(TAMBOER, 1979 apud KUNZ, 2000a, p. 3).
Gordijn (apud KUNZ, 1991, p. 176), com base na concepção dialó­
gica do movimento humano, apresenta três modos de diálogo entre ser
humano e mundo por meio do movimento:
1) forma direta: o sentido de unidade é experimentado no próprio mo­
vimento, viabilizando­o. São respostas dos sujeitos ao mundo em ní­
vel pré­reflexivo. Como exemplo, podemos dar a uma criança várias
bolas e ela, ao manipulá­las, brincando, percebe não ser possível em­
pilhá­las. Essa experiência de ordem pré­reflexiva forma o fundo de
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todas as outras. Associa­se a uma intuição fenomênica, que preenche o
ato, compreendendo­se numa intencionalidade espontânea. É uma
possibilidade que exprime um todo espontâneo, relacionado com nos­
sos sentimentos e ações de forma abrangente e irrefletida. Nesse senti­
do, pode­se dizer que a forma direta do movimento é um ato intuitivo;
2) forma aprendida: compreendida como uma tensão entre o físico co­
mo o objeto e o corpo como sujeito. Gordjin relaciona essa forma com
uma “transcendência de limites de aprendizagem, na base de uma in­
tencionalidade que se forma pela ideia ou imagem do movimento”. A
concordância entre saber e poder somente será recuperada após um
período de exercícios, depois de se encontrar a solução adequada para
o problema do movimento proposto verbalmente. Há aqui uma experi­
ência irrefletida que, mediante um ato indicativo ou significativo –
uma essência categorial, um “querer dizer” –, exprime um todo inde­
terminado, perfazendo um conceito ou categoria. O autor também cha­
ma esse processo de “aprendizado por imitação”. Tamboer (apud
KUNZ, 1991) estabelece também uma diferença entre imitação da in­
tenção (movimento aberto) e imitação da forma (movimento fechado),
ressaltando que essa não compreende um sentido de aprendizagem,
pois o movimento é encarado como um “em si”, como um fim nele
mesmo e perde seu sentido relacional. Portanto, podemos encontrar na
“imitação da intenção” o sentido de aprendizagem, de relação e signi­
ficado. Merleau­Ponty fala sobre a diferença entre a imitação da inten­
ção e a imitação da forma quando diz que “não se pode imitar a voz de
alguém sem retomar alguma coisa de sua fisionomia e, enfim, de seu
estilo pessoal” (2002, p. 34). Nada nos resta senão ser linguagem, e
com ela criarmos um diálogo, nos metamorfosearmos, misturando­nos
ao mundo para nele fazermos significações e aprendizagens. Merleau­
Ponty (2004) menciona inúmeras vezes a experiência da pintura como
um caso de experiência perceptiva. Para oferecer sentido, é preciso
que estejamos diante da obra, estar em relação. O sentido não se sepa­
ra do contexto. Não por acaso muitos pintores iniciantes imitam os
clássicos. Saber como se faz é descobrir o estilo que está em cada tra­
ço, os vestígios de sua linguagem, de sua fala. Saber como se faz é
compreender a obra, a partir de uma intencionalidade operante, que é
um sentido nascente. A própria recriação não é exatamente uma cópia,
mas uma nova significação. O pintor aprende com o outro copiando
suas obras, os traços, as cores, são a obra visível, o esboço de um mo­
vimento total que é a pintura. Essa cópia é o que podemos chamar de
imitação da intenção, é o movimento de abertura, possibilitador de no­
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vas aprendizagens. É ele que nos leva a fazer parte e compreender o
contexto em que já estamos inseridos;
3) forma criativa ou inventiva: corresponde à experiência de unidade
obtida por meio do próprio movimento, num engajamento profundo do
sujeito com algo no mundo. Criadora de possibilidades de significa­
ções numa abertura constante para o mundo. Na transcendência criati­
va ou inventiva estamos numa atitude reflexiva. O sentido do
movimento se encontra já redimensionado, ressignificado, num movi­
mento de mão dupla, contínuo e incessante em direção ao mundo. Há
aqui uma nítida apropriação do conhecimento, no qual um vivido in­
tencional foi preenchido por um vivido intuitivo, num contexto inter­
subjetivo, tornando aquilo que antes estava obscuro e indeterminado
em claro e determinado, caracterizando assim o próprio conhecimento.
A aprendizagem acontece na medida em que nos tornamos capazes de
criar e recriar nossos próprios sentidos com base numa concepção
aberta de movimento. Merleau­Ponty aborda o movimento no sentido
de expressão e de relação. Diz ele:
Se admitimos que o próprio do gesto humano é significar para
além de sua simples existência de fato, inaugurar um sentido,
disso resulta que todo gesto é comparável a qualquer outro, que
ambos pertencem a uma única sintaxe, que cada um deles é um
começo, comporta uma sequência ou recomeços na medida em
que não é, como o acontecimento, opaco e fechado em si mes­
mo, e acabado de uma vez por todas; resulta que vale para além
de sua simples presença de fato, e que nisso ele é de antemão
aliado ou cúmplice de todas as outras tentativas de expressão.
(2002, p. 106).
A forma inventiva do movimento humano se confunde com o mo­
mento da significação, da beleza, da descoberta, da liberdade, quando
se torna possível fazer algo novo, criativo ou, ainda, algo próprio com
aquilo que aprendemos. Eis aqui uma significação ou algo que se ex­
prime para além das explicações, uma eidos (HUSSERL, 2001), uma
apropriação do conhecimento, enfim, a possibilidade de aprendiza­
gem.
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Análises conclusivas: aprendizagem e o “se­movimentar”
É importante ressaltar que é por meio da relação de diálogo com o
mundo que fazermos nossas aprendizagens, quando a intuição feno­
mênica preenche o ato intuitivo ou operativo, gerador de uma essência
operativa. O ato operativo é vivido de maneira irrefletida, orientando­
se para um outro ato indicativo. Esse se dá a partir de uma intenciona­
lidade operativa formadora de uma essência categorial. O ato indicati­
vo baseado numa intencionalidade de ato aponta para uma atitude
transcendental, pois, embora seja vivido de forma ainda obscura, dire­
ciona­se para constituir um objeto transcendente. Esse objeto é a apro­
priação do conhecimento, que se faz na intersubjetividade – uma
idealidade que revela as nossas essências e que possibilita nosso pró­
prio reconhecimento no mundo, e que, portanto, nos permite transcen­
der e refletir sobre as nossas vivências, tornando­as claras e
determinadas. É o que Husserl (apud MERLEAU­PONTY, 2004, p.
12) aborda quando trata da consciência transcendental, vendo a trans­
cendência como uma identidade na diferença, como uma subjetividade
intersubjetiva, pois somente na relação somos capazes de nos reconhe­
cer e de tornar o que antes era obscuro e imanente em claro e transcen­
dente. A experiência do movimento do meu próprio corpo acompanha
a experiência do outro, como o outro lado de um mesmo ser. O outro é
o outro lado desta minha experiência. Nesse sentido, o conhecimento
nasce das relações, do diálogo, da intersubjetividade numa perspectiva
dinâmica, e as significações feitas são baseadas nos contextos que se
apresentam e se modificam, momento a momento, deixando de lado a
ideia de que o conhecimento está fundado numa coisa em si, seja ela a
consciência ou um objeto. O horizonte de idealidades não está posto
de forma unilateral, não é propriedade de uma consciência “em si”; ele
se mistura por meio da linguagem ao mundo. É generalidade, plurali­
dade e carrega a profundidade que se traduz no tempo. Misturando­se
ao mundo pelo diálogo, pouco a pouco vai se abrindo a novas possibi­
lidades de aprendizagem, pois somos feitos pelo tecido do mundo, fa­
zemos parte de uma trama geral que tem caráter dinâmico e que se faz
na linguagem. Podemos nos reconhecer apenas na medida em que nos
relacionamos com o outro, quando podemos nos desdobrar e copartici­
par das significações que, pelos movimentos, vão sendo refeitas ou re­
criadas. Nesse descentramento, já não somos localizáveis, não estamos
nem aqui nem ali, porque somos seres de generalidade e, por isso mes­
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Referências
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P. (org.). Nova antropologia: o homem em sua existência biológica,
social e cultural. São Paulo: EPU, 1997.
HUSSERL, E. Meditações cartesianas. São Paulo: Madras, 2001.
KUNZ, E. Educação Física: ensino & mudanças. Unijuí: Ijuí, 1991.
______. Esporte: uma abordagem com a fenomenologia. Revista Mo­
Ontology of human movement: theory of "serf­move"
Abstract
This text seeks to revise theories of Human Movement, to understand their as­
sumptions of philosophical argument "the relation between subject­world relati­
ons". From the philosophical­anthropological understanding of embodiment of the
concept “self­move”, designed in Brazil for Kunz, we reflect on the work of
authors with contributions of theories that include the movement as a essential phe­
nomenon to the human life, deepening analysis of the dialogue between human
beings and the world. Indicating conclusive analysis about the relevance of studies
of "self­move" to the process of human teaching­learning.
Keywords: Ontology, human movement, language
Ontología del movimiento humano: teoría del “moverse”
Resumen
Este texto tiene como objetivo revisar las teorías del movimiento humano, para en­
tender los supuestos de la argumentación filosófica “relación sujeto­mundo”. Con
base en el entendimiento filosófico­antropológico de la materialización del concep­
to “moverse”, desarrollado en Brasil por Kunz (2000a; 2000b), reflexionamos so­
bre la obra de autores cuyas contribuciones teóricas incluyen el movimiento como
fenómeno esencial para la vida humana, la profundización del análisis del diálogo
entre los seres humanos y el mundo, señalando análisis conclusivos acerca de la
pertinencia de los estudios del “si­mover” para la enseñanza y el aprendizaje huma­
no.
Palabras clave: Ontología – Movimiento Humano – Lenguaje
mo, torna­se possível nosso reconhecimento através desse outro, que
estabelece uma diferença entre nós. “Porque sou totalidade é que sou
capaz de colocar o outro no mundo e de me ver limitado por ele.”
(MERLEAU­PONTY, 2002, p. 169).
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Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010
vimento, ESEF/UFRGS, Porto Alegre, n. 12, p. 19­27, 2000a.
______. Kinein: o movimento humano como tema. Revista Kinein,
UFSC, Florianópolis, v. 1, n. 1, dez. 2000b.
______; TREBELS, A. H. Educação física crítico­emancipatória. Ijuí,
Unijuí, 2006.
MERLEAU­PONTY, M. Fenomenologia da percepção. Rio de Ja­
neiro: Freitas Bastos, 1999.
______. O visível e o invisível. São Paulo: Perspectiva, 2000.
______. A prosa do mundo. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
______. O olho e o espírito. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.
TAMBOER, J. Philosophie der Bewegungswissenschaft. Hannover:
Afra, 1979.
Recebido em: 04/05/2010
Revisado em: 25/06/2010
Aprovado em: 07/07/2010
Endereço para correspondência
kunz@cds.ufsc.br
Elenor Kunz
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro de Desportos, Departamento de Educação Física
CDS­UFSC
Trindade
88040­900 ­ Florianopolis, SC ­ Brasil

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  • 1. 1 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 ONTOLOGIA DO MOVIMENTO HUMANO: TEORIA DO “SE­MOVIMENTAR” HUMANO O se­movimentar Com base na revisão das teorias sobre o movimento humano, con­ sideramos que, para entender as premissas filosóficas de tal con­ ceito, é necessário, acima de tudo, percebê­lo na “relação sujeito­mundo”, quando as ações do movimento e sua intencionalida­ de são interpretadas como distintas e coincidentes. Com base nessa compreensão, Kunz (2000a) formula sua ideia sobre uma teoria do “se­movimentar” humano, distinguindo­a, claramente, das teorias ci­ entíficas anteriores, especialmente daquelas que se valem de conceitos somente físicos. A questão primordial, para esse autor, é interpretar o movimento dos seres humanos como fenômeno fundamental da vida. Uma existência sem movimento é impensável. Por isso, estudos que se ocupam de forma tão abrangente do fenômeno do movimento hu­ Resumo Este texto busca a revisão de teorias do movimento humano, para entender suas premissas de argumentação filosófica “relação sujeito­mundo”. Com base na compreensão filosófico­antropológica da corporeidade que se dá por meio do conceito “se­movimentar”, pensado no Brasil por Kunz (2000a; 2000b), buscamos refletir sobre trabalhos de autores cujas contribuições teóricas concebem o movimento como fenômeno fundamental para a vida humana, aprofundando análises sobre o diálogo entre ser humano e mundo e ressaltando análises conclusivas sobre a relevância dos estudos do “se­movimentar” no processo de ensino­aprendizagem humano. Palavras­chave: Ontologia – Movimento Humano – Linguagem Lísia Costa Gonçalves De Araújo Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, Santa Catarina, Brasil Soraya Corrêa Domingues Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil Elenor Kunz Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil Aguinaldo Cesar Surdi Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
  • 2. 2 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 mano forçosamente devem encerrar uma compreensão filosófico­an­ tropológica da corporeidade. Kunz e Trebels (2006) já ressaltaram a importância de um entendi­ mento fenomenológico do movimento humano. De um modo geral, nesta publicação esses autores buscavam esclarecer a impossibilidade de transformá­lo num simples objeto de pesquisa, como ocorre com os estudos da física ou mesmo da psicologia. Muito mais que um “em si”, o movimento constitui um meio e uma precondição para as expe­ riências objetivas na vida de pessoas. Na perspectiva de um “se­movi­ mentar”, a conduta dos sujeitos em ação deve ser analisada como um acontecimento relacional numa referência situacional­pessoal. Por isto, também, pode­se notar que a compreensão do “se­movi­ mentar” orienta­se pela qualidade do movimento, que está intimamen­ te relacionada às vivências, às emoções e à sensibilidade das ações experimentadas, conforme os estudos de Kunz e Trebels (2006). Desse ponto de partida, é possível desenvolver um estudo filosófico do mo­ vimento humano mais complexo e multidimensional em relação às análises unilaterais anteriormente propostas, por exemplo, pela biome­ cânica. Este estudo deverá abranger perspectivas antropológicas, feno­ menológicas, sociológicas, estéticas e conhecimentos e teorias sobre a linguagem; entretanto, as abordagens físicas e mecânicas não podem ser simplesmente abandonadas, em favor da abordagem filosófica. É importante o conhecimento que resulta da abordagem filosófica sobre as diferentes concepções ou imagens dos seres humanos – perceptíveis nas várias interpretações do movimento humano – ou, como prefere Tamboer (1979), sobre as diversas imagens de seres humanos subja­ centes às imagens do movimento humano. Dessa maneira, um melhor entendimento do “se­movimentar” hu­ mano pode ser encontrado nos estudos acerca do “movimento pró­ prio”, descoberto no significado existencial do agir, na própria espontaneidade. Trata­se da relação sujeito­mundo e das relações de seres humanos nas dimensões espaço­temporais. Porém, numa pers­ pectiva dialógica, não é possível fragmentar ser humano e mundo, tempo e espaço. É preciso encontrar a “unidade primordial” (Merleau­ Ponty, 1999) de um “ser­estar­no­mundo”. Em seu racionalismo, a ci­ ência desconsidera essa unidade primordial entre ser humano e mun­ do, separando, por exemplo, sujeito do objeto. Assim, uma teoria para o “se­movimentar” humano também não entende que movimento e percepção sejam dois elementos de ação independentes. Movimento e
  • 3. 3 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 percepção são de efeitos mútuos. Como ressalta Merleau­Ponty: Se se restabelece esse ponto de vista vertical­perceptivo do mundo e do ser, não há lugar para procurar construir no corpo objetivo, como o faz a fisiologia nervosa, toda uma espessura de fenômenos nervosos ocultos, graça as quais os stimuli defi­ nidos objetivamente seriam elaborados como percepção total. (2000, p. 212). Percepção tempo e espaço A chave está na ideia de que a percepção é nela mesma ignorância de si como percepção selvagem, impercepção, tende a ver­se como ato e a esquecer­se como intencionalidade latente. A percepção é abor­ da aqui considerando a teoria da Gestalt, onde há uma relação entre fi­ gura e fundo, em que um não é o oposto do outro, mas ambos se alicerçam oferecendo um sentido. Podemos observar as coisas no mundo, e estas estão sempre em relação. Daí a diferença entre movi­ mento concreto e abstrato. O fundo do movimento concreto é o mun­ do dado e no movimento abstrato este fundo é construído. Quando faço um sinal com as mãos me despedindo de um amigo, não o faço como uma representação do meu pensamento ou como uma tradução dos meus pensamentos em gestos, o faço espontaneamente, sem per­ ceber o sinal em meu corpo. Não há uma percepção e depois um mo­ vimento, a percepção está no próprio movimento. Ao contrário, o movimento abstrato rompe sua inserção no mundo e constrói em torno de nós um mundo fictício, assim como, por exemplo, executamos uma série de flexões para fortalecimento da musculatura do braço, agora diferentemente de antes o meu corpo é a sua meta, assim podemos di­ zer que o “movimento concreto é centrípeto e o abstrato é centrífugo; o primeiro ocorre no ser ou no atual, o segundo no possível ou no não ser, o primeiro adere a um fundo dado, o segundo desdobra ele mesmo seu fundo. (MERLEAU­PONTY,1999, p. 160). Isto resulta, também, em sérias consequências para a compreensão das categorias tempo e espaço. Kunz e Trebels (2006, p. 26, 27) cha­ mam atenção para estudiosos da antropologia e filosofia, como Victor von Wieizäcker, que preferem usar as expressões tempo e espaço vi­ tais para entender melhor um “se­movimentar” com vida, emoção, sensibilidade, percepção e intuição. Foi certamente por isso que Buy­
  • 4. 4 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 tendijk (1997) já ressaltava a questão da intencionalidade e da valora­ ção como características antropológicas fundamentais na teoria do “se­movimentar” humano. Hoje é possível entender a sua insistência em compreender esse fenômeno com base em sua “funcionalidade” ou função, como afirmou, interpretada por ele como a indivisibilidade de mudanças significativamente relacionadas com algo exterior a essas mesmas mudanças. Isto leva a entender que o significado de um movimento que acaba de ser realizado não é o mesmo que se tem ao iniciá­lo. Porém Tambo­ er (1979) alerta que o significado desse movimento “só é significado se for incorporado não como valor de uma escala” (1979, p. 8). Assim, um se­movimentar, como função, refere­se à organização espontânea que se constrói num contexto específico. Essa “função” de um “se­ movimentar” orienta­se num sentido teleológico para um “ponto futu­ ro”. Resultar daí uma estrutura espaço­temporal bem diferente daquele que é possível encontrar na maioria das abordagens científicas que es­ tudam o movimento físico. Além disso, numa visão filosófica, o movimento humano é com­ preendido mediante várias outras categorias, entre elas, as de percep­ ção, experiência, sensibilidade, intuição e promoção. O envolvimento de todas essas categorias de forma objetiva surge com a concepção di­ alógica do movimento humano. Primeiramente autores holandeses, como Buytendijk e Gordijin (apud KUNZ, 2001, p. 103, 104), traba­ lharam com essa ideia de movimento humano; na Alemanha, como por exemplo, a publicação de Kunz e Trebels (2006) vem aprofundan­ do a teoria do movimento humano com base na fenomenologia, espe­ cialmente a partir de Merleau­Ponty (1999). A tarefa principal de uma concepção dialógica é identificar as dife­ renças entre o “se­movimentar” de sujeitos e o movimento de objetos. Seres humanos também podem, em determinados casos, ser objeto em movimento, quando são transportados ou quando se tornam objeto de análises. O “se­movimentar” trata, portanto, principalmente da expres­ são dos atores do movimento no contexto de uma situação concreta e de um significado que orienta todas as ações e torna possível a apreen­ são de sua estrutura global. Dessa forma, já se pode perceber que não é o movimento o objeto de análise, mas aquele, da “relação sujeito­mundo”, que se­movimen­ ta. E quando alguém se movimenta livremente, de forma espontânea, motivado por um significado que é constituído na ação, ocorre, então,
  • 5. 5 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 uma relação dialógica nesse ato. É dialógica, segundo Kunz e Trebels (2006), porque somente a partir desta relação podemos criar novas possibilidades, com base numa linguagem junto do outro e do mundo. Por meio da ontologia do humano, que se ocupa das dimensões quali­ tativas da experiência humana em ação, articula­se o interesse pedagó­ gico da experiência humana, que poderá ser de grande utilidade para as transformações e redimensionamento dos temas relacionados à edu­ cação física, há tanto tempo discutidos. Gorgijn (apud KUNZ, 2000a, 103) apresentou o conceito dialógico do movimento humano: uma teoria não mecânica do movimento com a qual buscou resgatar o sentido do “sujeito ativo”, marcando uma for­ te diferença entre o ser humano como objeto e como sujeito do movi­ mento. O holandês pautou seu estudo na ontologia da linguagem, com a qual pôde desenvolver o conceito de diálogo, vinculado à ideia de relação de ontogênese, na qual o binômio ser humano/mundo é cen­ tral. Com base na Teoria da Gestalt,esta relação busca valorizar o fun­ do que se exprime, numa dimensão temporal, que encontramos em todos os nossos atos. Esse fundo está relacionado com os aspectos subjetivos, imanentes, dos quais retomamos de maneira sempre inédi­ ta para, num contexto intersubjetivo, fazermos as aprendizagens. Mer­ leau­Ponty explica que [...] o fundo do movimento não é uma representação associada ou ligada exteriormente ao próprio movimento, ele o anima e o mantém a cada momento; a iniciação cinética é para o sujeito uma maneira original de referir­se a um objeto, assim como a percepção. (1999, p. 159) Na experiência perceptiva, vivemos fecundamente o fenômeno, não há necessidade de reflexão, fazemos isto espontaneamente. Vamos introduzindo­nos no mundo através de nossos sentidos, sem qualquer diferenciação ontológica ou epistemológica. O mundo perceptivo nos coloca diante de uma vida espontânea. Portanto, é preciso cuidado pa­ ra não nos rendermos ao paradigma social vigente d objetivismo, a fim de não desvalorizarmos o caráter relacional e criativo que é ponto fundamental do movimento humano. Com isso, existe a possibilidade de respeitar os alunos por meio da “relação sujeito­mundo”. É preciso esclarecer, contudo, que a crítica não busca desvalorizar o conhecimento produzido pela perspectiva empírico­analítica; entre­
  • 6. 6 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 tanto, alerta principalmente para as condições de análise dos resulta­ dos, nas quais o que se coloca como figura é absolutizado, abandonan­ do­se o fundo, no qual se encontra a dimensão relacional e significativa dos sujeitos, gerando a deturpação da compreensão dos próprios movimentos analisados. O movimento é uma manifestação primeira, é a nossa entrada no mundo, tem um significado de vida, ressalta Kunz (2000a), afirmando que o se­movimentar é uma ação re­ lacional do ser humano, que se mistura ao mundo construindo­se co­ mo sujeito, sendo o mundo a sua contraface imaginária. Dialógica – linguagem e significado A concepção dialógica do movimento humano procura um entendi­ mento não mecânico do mesmo. Essa teoria se orienta para a relação entre ser humano e mundo por meio da ação, que corresponde exata­ mente ao diálogo que o ser humano desenvolve com o mundo em seu “se­movimentar” (KUNZ, 2000a). Esse “se­movimentar”, como a im­ bricação entre pensar e falar, é uma das múltiplas formas nas quais a unidade primordial do ser humano com o mundo se manifesta. É preciso que nos misturemos àquilo que pretendemos conhecer. E isso pode ser feito – de forma oblíqua, pelo canto do olho, como Mer­ leau­Ponty (2000) costumava dizer – por meio da linguagem. “A lin­ guagem é por si oblíqua e autônoma e se lhe acontece significar diretamente um pensamento ou uma coisa, trata­se apenas de um po­ der secundário de sua vida interior” (MERLEAU­PONTY, 2004, p. 73). A linguagem carrega um fundo inacabado que só permite sentir veladamente, obliquamente. Consideramos a função objetiva como se­ cundária na linguagem. É uma porta de entrada para que possamos de­ terminar o que antes estava indeterminado. Contudo, é preciso que se estabeleça uma relação dialética, pois, quando somente olhamos de frente, absolutizamos as coisas e ficamos muito longe de compreendê­ las numa relação que não deixe lacunas e que, portanto, não deixe es­ paços para as significações, enfim, para as nossas aprendizagens. O movimento humano está inserido num contexto relacional que torna possível um diálogo incessante entre os sujeitos e o mundo, esta­ belecendo um embate no qual os sujeitos se revelam e são revelados pelo próprio movimento, atualizando­se e transformando­se junto ao mundo. Kunz (2000a) analisa a abordagem de Trebels sobre o movimento
  • 7. 7 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 num contexto significativo, destacando­o em seu “significado motriz”, no qual o movimento significativo é a própria expressão da “relação sujeito­mundo”, aliando­se ao seu aspecto intencional e subjetivo os aspectos objetivos do mundo percebido. Esses aspectos estão, assim, numa relação de imbricação a qual permite a atualização constante dos sujeitos no mundo. Nesse sentido, o autor apresenta a concepção dialógica do movimento destacando o seu aspecto simbólico, expressi­ vo e significativo. Os significados nascem por meio de relações cria­ das em contextos específicos e que geram um conteúdo específico. É na ação que são possíveis as atualizações desses conteúdos. É por in­ termédio das novas experiências, das inter­relações que podemos mo­ dificar os contextos, criando, assim, novos sentidos. Kunz e Trebels (2006) propõem a mediação pedagógica mediante o movimento significativo ou intencional. Os autores definem o “se­ movimentar” como um comportamento pleno de sentido, como algo que acontece no interior de uma interdependência (diálogo sujei­ to/mundo) relacionada ao sentido. Assim, ao congelarmos nossos olhares no movimento humano como algo exclusivamente físico ou exclusivamente “espiritual”, estamos fora do contexto educacional, pois [...] o físico não é algo que possamos ensinar, educar, formar. Não podemos abstraí­lo do nosso ser­ser humano, como uma coisa [...]. Na observação dos alunos em uma aula de ginástica, a tentativa de tentar enxergá­los como físicos que se movem só poderá acontecer uma única vez. É que, simplesmente, isto não é possível: não são os físicos que correm, saltam ou se lançam; são os alunos que estão ocupados em fazer alguma coisa. (TAMBOER, 1979 apud KUNZ, 2000a, p. 3). Gordijn (apud KUNZ, 1991, p. 176), com base na concepção dialó­ gica do movimento humano, apresenta três modos de diálogo entre ser humano e mundo por meio do movimento: 1) forma direta: o sentido de unidade é experimentado no próprio mo­ vimento, viabilizando­o. São respostas dos sujeitos ao mundo em ní­ vel pré­reflexivo. Como exemplo, podemos dar a uma criança várias bolas e ela, ao manipulá­las, brincando, percebe não ser possível em­ pilhá­las. Essa experiência de ordem pré­reflexiva forma o fundo de
  • 8. 8 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 todas as outras. Associa­se a uma intuição fenomênica, que preenche o ato, compreendendo­se numa intencionalidade espontânea. É uma possibilidade que exprime um todo espontâneo, relacionado com nos­ sos sentimentos e ações de forma abrangente e irrefletida. Nesse senti­ do, pode­se dizer que a forma direta do movimento é um ato intuitivo; 2) forma aprendida: compreendida como uma tensão entre o físico co­ mo o objeto e o corpo como sujeito. Gordjin relaciona essa forma com uma “transcendência de limites de aprendizagem, na base de uma in­ tencionalidade que se forma pela ideia ou imagem do movimento”. A concordância entre saber e poder somente será recuperada após um período de exercícios, depois de se encontrar a solução adequada para o problema do movimento proposto verbalmente. Há aqui uma experi­ ência irrefletida que, mediante um ato indicativo ou significativo – uma essência categorial, um “querer dizer” –, exprime um todo inde­ terminado, perfazendo um conceito ou categoria. O autor também cha­ ma esse processo de “aprendizado por imitação”. Tamboer (apud KUNZ, 1991) estabelece também uma diferença entre imitação da in­ tenção (movimento aberto) e imitação da forma (movimento fechado), ressaltando que essa não compreende um sentido de aprendizagem, pois o movimento é encarado como um “em si”, como um fim nele mesmo e perde seu sentido relacional. Portanto, podemos encontrar na “imitação da intenção” o sentido de aprendizagem, de relação e signi­ ficado. Merleau­Ponty fala sobre a diferença entre a imitação da inten­ ção e a imitação da forma quando diz que “não se pode imitar a voz de alguém sem retomar alguma coisa de sua fisionomia e, enfim, de seu estilo pessoal” (2002, p. 34). Nada nos resta senão ser linguagem, e com ela criarmos um diálogo, nos metamorfosearmos, misturando­nos ao mundo para nele fazermos significações e aprendizagens. Merleau­ Ponty (2004) menciona inúmeras vezes a experiência da pintura como um caso de experiência perceptiva. Para oferecer sentido, é preciso que estejamos diante da obra, estar em relação. O sentido não se sepa­ ra do contexto. Não por acaso muitos pintores iniciantes imitam os clássicos. Saber como se faz é descobrir o estilo que está em cada tra­ ço, os vestígios de sua linguagem, de sua fala. Saber como se faz é compreender a obra, a partir de uma intencionalidade operante, que é um sentido nascente. A própria recriação não é exatamente uma cópia, mas uma nova significação. O pintor aprende com o outro copiando suas obras, os traços, as cores, são a obra visível, o esboço de um mo­ vimento total que é a pintura. Essa cópia é o que podemos chamar de imitação da intenção, é o movimento de abertura, possibilitador de no­
  • 9. 9 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 vas aprendizagens. É ele que nos leva a fazer parte e compreender o contexto em que já estamos inseridos; 3) forma criativa ou inventiva: corresponde à experiência de unidade obtida por meio do próprio movimento, num engajamento profundo do sujeito com algo no mundo. Criadora de possibilidades de significa­ ções numa abertura constante para o mundo. Na transcendência criati­ va ou inventiva estamos numa atitude reflexiva. O sentido do movimento se encontra já redimensionado, ressignificado, num movi­ mento de mão dupla, contínuo e incessante em direção ao mundo. Há aqui uma nítida apropriação do conhecimento, no qual um vivido in­ tencional foi preenchido por um vivido intuitivo, num contexto inter­ subjetivo, tornando aquilo que antes estava obscuro e indeterminado em claro e determinado, caracterizando assim o próprio conhecimento. A aprendizagem acontece na medida em que nos tornamos capazes de criar e recriar nossos próprios sentidos com base numa concepção aberta de movimento. Merleau­Ponty aborda o movimento no sentido de expressão e de relação. Diz ele: Se admitimos que o próprio do gesto humano é significar para além de sua simples existência de fato, inaugurar um sentido, disso resulta que todo gesto é comparável a qualquer outro, que ambos pertencem a uma única sintaxe, que cada um deles é um começo, comporta uma sequência ou recomeços na medida em que não é, como o acontecimento, opaco e fechado em si mes­ mo, e acabado de uma vez por todas; resulta que vale para além de sua simples presença de fato, e que nisso ele é de antemão aliado ou cúmplice de todas as outras tentativas de expressão. (2002, p. 106). A forma inventiva do movimento humano se confunde com o mo­ mento da significação, da beleza, da descoberta, da liberdade, quando se torna possível fazer algo novo, criativo ou, ainda, algo próprio com aquilo que aprendemos. Eis aqui uma significação ou algo que se ex­ prime para além das explicações, uma eidos (HUSSERL, 2001), uma apropriação do conhecimento, enfim, a possibilidade de aprendiza­ gem.
  • 10. 10 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 Análises conclusivas: aprendizagem e o “se­movimentar” É importante ressaltar que é por meio da relação de diálogo com o mundo que fazermos nossas aprendizagens, quando a intuição feno­ mênica preenche o ato intuitivo ou operativo, gerador de uma essência operativa. O ato operativo é vivido de maneira irrefletida, orientando­ se para um outro ato indicativo. Esse se dá a partir de uma intenciona­ lidade operativa formadora de uma essência categorial. O ato indicati­ vo baseado numa intencionalidade de ato aponta para uma atitude transcendental, pois, embora seja vivido de forma ainda obscura, dire­ ciona­se para constituir um objeto transcendente. Esse objeto é a apro­ priação do conhecimento, que se faz na intersubjetividade – uma idealidade que revela as nossas essências e que possibilita nosso pró­ prio reconhecimento no mundo, e que, portanto, nos permite transcen­ der e refletir sobre as nossas vivências, tornando­as claras e determinadas. É o que Husserl (apud MERLEAU­PONTY, 2004, p. 12) aborda quando trata da consciência transcendental, vendo a trans­ cendência como uma identidade na diferença, como uma subjetividade intersubjetiva, pois somente na relação somos capazes de nos reconhe­ cer e de tornar o que antes era obscuro e imanente em claro e transcen­ dente. A experiência do movimento do meu próprio corpo acompanha a experiência do outro, como o outro lado de um mesmo ser. O outro é o outro lado desta minha experiência. Nesse sentido, o conhecimento nasce das relações, do diálogo, da intersubjetividade numa perspectiva dinâmica, e as significações feitas são baseadas nos contextos que se apresentam e se modificam, momento a momento, deixando de lado a ideia de que o conhecimento está fundado numa coisa em si, seja ela a consciência ou um objeto. O horizonte de idealidades não está posto de forma unilateral, não é propriedade de uma consciência “em si”; ele se mistura por meio da linguagem ao mundo. É generalidade, plurali­ dade e carrega a profundidade que se traduz no tempo. Misturando­se ao mundo pelo diálogo, pouco a pouco vai se abrindo a novas possibi­ lidades de aprendizagem, pois somos feitos pelo tecido do mundo, fa­ zemos parte de uma trama geral que tem caráter dinâmico e que se faz na linguagem. Podemos nos reconhecer apenas na medida em que nos relacionamos com o outro, quando podemos nos desdobrar e copartici­ par das significações que, pelos movimentos, vão sendo refeitas ou re­ criadas. Nesse descentramento, já não somos localizáveis, não estamos nem aqui nem ali, porque somos seres de generalidade e, por isso mes­
  • 11. 11 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 Referências BUYTENDIJK, F. J. J. O jogo humano. In: GADAMER, H.­G.; VOGLER, P. (org.). Nova antropologia: o homem em sua existência biológica, social e cultural. São Paulo: EPU, 1997. HUSSERL, E. Meditações cartesianas. São Paulo: Madras, 2001. KUNZ, E. Educação Física: ensino & mudanças. Unijuí: Ijuí, 1991. ______. Esporte: uma abordagem com a fenomenologia. Revista Mo­ Ontology of human movement: theory of "serf­move" Abstract This text seeks to revise theories of Human Movement, to understand their as­ sumptions of philosophical argument "the relation between subject­world relati­ ons". From the philosophical­anthropological understanding of embodiment of the concept “self­move”, designed in Brazil for Kunz, we reflect on the work of authors with contributions of theories that include the movement as a essential phe­ nomenon to the human life, deepening analysis of the dialogue between human beings and the world. Indicating conclusive analysis about the relevance of studies of "self­move" to the process of human teaching­learning. Keywords: Ontology, human movement, language Ontología del movimiento humano: teoría del “moverse” Resumen Este texto tiene como objetivo revisar las teorías del movimiento humano, para en­ tender los supuestos de la argumentación filosófica “relación sujeto­mundo”. Con base en el entendimiento filosófico­antropológico de la materialización del concep­ to “moverse”, desarrollado en Brasil por Kunz (2000a; 2000b), reflexionamos so­ bre la obra de autores cuyas contribuciones teóricas incluyen el movimiento como fenómeno esencial para la vida humana, la profundización del análisis del diálogo entre los seres humanos y el mundo, señalando análisis conclusivos acerca de la pertinencia de los estudios del “si­mover” para la enseñanza y el aprendizaje huma­ no. Palabras clave: Ontología – Movimiento Humano – Lenguaje mo, torna­se possível nosso reconhecimento através desse outro, que estabelece uma diferença entre nós. “Porque sou totalidade é que sou capaz de colocar o outro no mundo e de me ver limitado por ele.” (MERLEAU­PONTY, 2002, p. 169).
  • 12. 12 DOI: 10.5216/rpp.v13i3.9782 Pensar a Prática, Goiânia, v. 13, n. 3, p. 1­12, set./dez. 2010 vimento, ESEF/UFRGS, Porto Alegre, n. 12, p. 19­27, 2000a. ______. Kinein: o movimento humano como tema. Revista Kinein, UFSC, Florianópolis, v. 1, n. 1, dez. 2000b. ______; TREBELS, A. H. Educação física crítico­emancipatória. Ijuí, Unijuí, 2006. MERLEAU­PONTY, M. Fenomenologia da percepção. Rio de Ja­ neiro: Freitas Bastos, 1999. ______. O visível e o invisível. São Paulo: Perspectiva, 2000. ______. A prosa do mundo. São Paulo: Cosac & Naify, 2002. ______. O olho e o espírito. São Paulo: Cosac & Naify, 2004. TAMBOER, J. Philosophie der Bewegungswissenschaft. Hannover: Afra, 1979. Recebido em: 04/05/2010 Revisado em: 25/06/2010 Aprovado em: 07/07/2010 Endereço para correspondência kunz@cds.ufsc.br Elenor Kunz Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Desportos, Departamento de Educação Física CDS­UFSC Trindade 88040­900 ­ Florianopolis, SC ­ Brasil