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A BUSCA DA EXCITAÇÃO
                      NO MAIOR ESPETÁCULO DA TERRA

          Marlise Mônica Araújo (UFPR/CEPELS) – marlise_13@yahoo.com.br
            Rodrigo de França (UFPR/CEPELS) – rodrigofranca@yahoo.com.br



Resumo


O presente trabalho procurou abordar um importante elemento presente na condição
humana: a busca da excitação através do risco, relacionada às artes circenses. O risco
sempre acompanhou historicamente esta prática, garantindo, inclusive, sua
manutenção e perpetuação em alguns momentos. Entretanto atualmente o circo está se
equilibrando sobre outras manifestações como a Dança e o Teatro, relativizando a
tensão e o perigo ainda inerentes. O Circo conseguirá sobreviver desse modo? Como
fica o aspecto mimético neste contexto? Sem dúvida são questões pertinentes durante o
trabalho, onde a luz no fim do túnel pode estar naquilo que fez a prática circense
ascender ao nível da arte: o belo.
Palavras-chave: risco; circo; belo.




INTRODUÇÃO


       O que nos vêm à mente quando se pensa na palavra circo? Corajosos
atiradores de facas de olhos vendados? Talvez sagazes engolidores de fogo e de
espadas? Inescrupulosos domadores em jaulas repletas de tigres e leões? Ou
intrépidos equilibristas à 20 metros de altura, literalmente por um fio?
       Esse conjunto de performances mencionado – e que pode, de certa forma,
condensar o imaginário social dos sujeitos a respeito desse fenômeno – está
intimamente conectado por um eixo condutor, a saber: o risco. Todos os
indicativos parecem apontar para a seguinte problemática: É o risco um fator vital
na expressão, manutenção e perpetuação desta prática milenar? Por que o medo, a
tensão, a apreensão, a excitação da façanha, o temor da morte, sempre foram as
emoções que levaram os artistas circenses a se aventurarem debaixo das lonas? E
por que tais emoções são mimeticamente experimentadas pelos espectadores que
consomem o espetáculo?
       Assim, este trabalho busca compreender e explicitar, a partir da perspectiva
e imaginação sociológica, tais problemáticas a respeito do Circo, sua intrínseca
relação com o risco e as mudanças observadas no habitus acerca deste fenômeno.
Para tanto, num primeiro momento, buscou-se mapear o contexto no qual surgem
as artes circenses, suas manifestações ao longo da história e como esta prática se
apresenta atualmente. Em seguida dá-se a exploração desse eixo condutor, à luz
dos conceitos de Norbert Elias, em sua obra A Busca da Excitação. À guisa da
conclusão, procurar-se-á traçar elementos que contribuam para uma apreciação
diferenciada da arte, para além dos limites da excitação. Então que comece o
show!


1. PRIMEIRO ATO


1.1 QUANDO E ONDE COMEÇA A HISTÓRIA DO CIRCO?


       O circo é uma atividade corporal secular com difícil precisão de origem dos
espetáculos, mas traz no seu histórico a hipótese de que: “o remoto ancestral do
artista de circo deve ter sido aquele troglodita que, num dia de caça
surpreendentemente farta, entrou na caverna dando pulos de alegria e despertando,
com suas caretas, o riso de seus companheiros de dificuldades”. (RUIZ apud
TORRES 1998, p.13).
       Segundo a pesquisadora Castro (1997), pode-se dizer que as artes circenses
surgiram na China, onde foram descobertas pinturas de quase 5.000 anos em que
aparecem acrobatas, contorcionistas e equilibristas. A acrobacia era uma forma de
treinamento para os guerreiros de quem se exigia agilidade, flexibilidade e força.
Com o tempo, a essas qualidades se somou a graça, a beleza e a harmonia.
       Há registros, segundo Torres (1998), em seu livro O circo no Brasil, de que
as raízes da arte circense estão nos hipódromos da Grécia antiga e no grande
Império Egípcio. De acordo com Lewbel (1995) e Zeithen (citado por CONWAY,
1994), os primeiros sinais da arte circense estão gravados nas pirâmides, com
desenhos de domadores, equilibristas, malabaristas e contorcionistas. Os
espetáculos desse período eram como as procissões, que tinham o objetivo de
saudar os generais vitoriosos. Nesses cortejos, havia a doma, o desfile de animais
exóticos e soldados conduzindo os novos escravos, além de apresentações em
argolas e barras, que lembravam números da moderna ginástica olímpica.
       Mas foi na Europa que o circo ganhou força e se desenvolveu. Para Castro
(1997) os espetáculos tomaram impulso ainda no Império Romano, quando seus
anfiteatros recebiam apresentações de habilidades (mais tarde classificadas como
circenses). A importância e a grandiosidade desse espetáculo pode ser atestada
pelo Circo Máximo de Roma, o qual apareceu pouco depois, mas foi destruído em
um incêndio. Em 40 a.C., no mesmo local foi construído o Coliseu, onde cabiam
87 mil espectadores. Segundo a autora, lá eram apresentadas excentricidades como
homens louros nórdicos, animais exóticos, engolidores de fogo e gladiadores, entre
outros. Porém, entre 54 e 68 d.C., as arenas passaram a ser ocupadas por
espetáculos sangrentos, com a perseguição aos cristãos, que eram atirados às feras,
distorcendo a proposta circense e diminuindo o interesse pela arte.
Com a decadência do Império Romano, os artistas circenses ganham espaço
nas praças públicas, nos adros das igrejas e, sobretudo, nas feiras. "[...] ela (a feira)
foi o lugar onde a arte circense permaneceu, de Roma a Philip Astley" (CASTRO,
1997, p.17). Esses circos, agrupados em pequenas companhias, rodavam vilas,
cidades e castelos, em busca de público e de sustento.
       Conforme aponta Torres (1998), o primeiro circo europeu moderno, o
Astley's Amphitheatre, foi inaugurado em Londres por volta de 1770 por Philip
Astley, um oficial inglês da Cavalaria Britânica. O circo de Astley tinha um
picadeiro circular com uma espécie de arquibancada perto. Ele percebeu que seria
bem mais fácil “[...] manter-se de pé, sobre um cavalo, a galope, dentro de um
círculo perfeito. Questão de lei física: a força centrífuga” (TORRES, 1998, p. 16).
Astley organizou um espetáculo eqüestre, com rigor e estrutura militares, mas
percebeu que para segurar o público, teria que reunir outras atrações e juntou
saltimbancos, equilibristas, saltadores e palhaço. Ao longo dos anos, Astley
acrescentou saltos acrobáticos, dança com laços e malabarismo.
       De acordo com Torres (1998, p. 18), este primeiro circo funcionava como
um quartel: os uniformes, o rufar dos tambores, as vozes de comando para a
execução dos números de risco. O próprio Astley dirigia e apresentava o
espetáculo, criando assim, a figura do mestre de cerimônias. Astley começou a
difundir o circo moderno e abriu uma filial em Paris, após convite para apresentar-
se para o rei da França. Só mais tarde, alguns países da Europa como Suécia,
Espanha, Alemanha, Rússia e a própria França, começaram a desenvolver sua arte
circense. Em apenas cinqüenta anos o circo moderno já tinha se espalhado por
todo o mundo.


1.2 O CIRCO NO BRASIL


       Para Torres (1998), documentos apontam que no século XVIII, antes
mesmo da criação do circo moderno, já havia grupos circenses no Brasil.
Normalmente, essas companhias eram formadas por ciganos, expulsos da
Península Ibérica. Tendo em vista que “[...] sempre houve ligação dos ciganos com
o circo” (CASTRO apud TORRES 1998, p. 20). Entre suas especialidades
incluíam-se a doma de ursos, o ilusionismo e as exibições com cavalos. Há relatos
de que eles usavam tendas e nas festas sacras, havia bagunça, bebedeira, e
exibições artísticas, incluindo teatro de bonecos. A autora conta que eles viajavam
de cidade em cidade, e adaptavam seus espetáculos ao gosto da população local,
ou seja, números que não faziam sucesso na cidade eram tirados do programa.
       Ainda segundo Torres (1998), o circo moderno só chegou ao Brasil a partir
de 1830. Incentivadas pelos ciclos econômicos do café, borracha e cana-de-açúcar,
grandes companhias européias vinham apresentar-se nas cidades brasileiras.
Foram essas companhias que ajudaram a formar as primeiras famílias de circo, que
passaram a ser as responsáveis pelo desenvolvimento do circo moderno no Brasil.
       Eram realmente famílias, com laços consangüíneos, que sustentavam esta
atividade. Pai, avô, filho, sobrinhos e netos eram responsáveis por tudo, desde a
infra-estrutura e montagem do circo, até o espetáculo.
Uma questão interessante e que vai de encontro a esse trabalho é o fato de
que o público que ia aos espetáculos também apresentava características
diferentes, ou seja, um habitus próprio. Segundo Eduardo Oliveira da Silva, que
foi aluno da segunda turma da escola nacional de circo (conforme TORRES, 1998,
p. 25), os europeus iam ao circo apreciar a arte, a estética das apresentações e a
beleza do espetáculo; já no Brasil, os números perigosos eram as atrações:
trapézio, animais selvagens e ferozes, engolidores de fogo, entre outros. Sempre o
elemento risco em questão.
       Até a pouco tempo, esta era a situação dos circos no Brasil. Mas diversos
fatores levaram a uma mudança na sua organização e administração. A primeira
mudança foi na relação familiar. Agora, alguns pais preferem que seus filhos se
dediquem aos estudos, ao invés de se dedicarem apenas à arte circense. Para
Torres (1998), esta atitude acabou trazendo, com o tempo, duas conseqüências: a
primeira, diz respeito à visão que estes "novos empresários" têm do circo. Nesta
nova roupagem do circo fica mais evidente a figura do capitalista, o dono do circo.
O objetivo não poderia ser outro senão o lucro.
       A segunda é que, para suprir a demanda de artistas, surgiram as escolas de
circo, que formam novos artistas. Eles não fazem parte da família. A relação é
apenas de patrão e empregado.
       As mudanças ocorridas na administração do circo moderno ajudaram a criar
também uma nova categoria de circo. Conhecidas como "circo novo", estas
companhias não têm picadeiro, nem lona, nem arquibancadas e se apresentam, na
maioria das vezes, em teatros ou casas de espetáculo, embora possam utilizar
qualquer espaço. Também chamado de Circo Contemporâneo (procurando evitar
assim a idéia de que existe um circo “velho”), este conceito surgiu para revitalizar
e dar um ar de modernidade às artes circenses. Firmado com base na libertação e
negação de práticas até então bastante difundidas, mas que agora pareciam um
tanto quanto equivocadas. Pode-se citar como exemplo a utilização e exploração
de animais sob as lonas.
        Outra mudança diz respeito ao desvio dos holofotes do principal elemento
condutor desta arte ao longo dos tempos: o risco. Desse modo voltam-se os
olhares para a estética e a plasticidade corporal. Há o enriquecimento da arte a
partir de outros elementos culturais, como a Dança e o Teatro. Nesse sentido os
espetáculos passaram de um conjunto de apresentações variadas para um show
temático com começo, meio e fim. Ou seja, desde então os artistas passam a ser
também atores e surgiu a idéia de performance.
        Um exemplo típico desse tipo de circo é o Cirque du Soleil, do Canadá. No
Brasil, há vários grupos desse gênero, como o Intrépida Trupe, Fratellis, Teatro de
Anônimos e Nau de Ícaros.
2. SEGUNDO ATO


2.1 EMOÇÃO E MIMESIS NA PRÁTICA CIRCENSE


        Feita a primeira “apresentação”, cabe agora traçar um paralelo com a teoria
elisiana, afim de compreender alguns conceitos que permeiam essa diferenciada
manifestação da Cultura Corporal1, a qual pode garantir individualização. A
individualização na visão de Elias é entendida como um processo móvel, mutável e
diferenciador. Já a individualidade surge com a burguesia e se traduz por um modo de ser
característico. Individualização é uma questão de relação e, portanto, um modo de ser
construído a partir da crescente relação e de uma mútua dependência.
        Segundo Lucena (2001, p.123), individualidade é o “dever–ser” que denota um
comportamento previsto; já a individualização é o “sendo”. Na história da humanidade, é
possível notar-se que, quanto mais o homem era regido pelas forças da natureza, menos
diferenciadas eram suas atitudes e seus comportamentos para com os demais.
       Nesse sentido, fica evidente a relação que se estabelece entre homem e sociedade
em busca de uma diferenciação individual, ou seja, na busca do seu espaço historicamente
construído. Não é uma escolha do indivíduo, mas um comportamento socialmente exigido.
          Por isso, Elias (apud LUCENA, 2002, p.122) explica:
                                 Só a conscientização da autonomia relativa dos planos e ações individuais que se
                                 entrelaçam, da maneira como o indivíduo é ligado pela vida social a outros,
                                 permite uma compreensão mais profunda do próprio fato da individualidade. A
                                 coexistência de pessoas, o emaranhamento de suas intenções e planos, os laços
                                 com que se prendem mutuamente, tudo isso, muito longe de destruir a
                                 individualidade, proporciona um meio no qual ela pode desenvolver-se.
        Nessa perspectiva, o imaginário social dos atores que desempenham seus papéis na
arte circense é altamente intrínseca e complexa, ao se depararem com a diversidade de
emoções que são despertadas e disseminadas no momento em que interagem com o
público, ou seja, quando passam os sentimentos do eu para o nós e do individual para o
social, através do espetáculo. É essa individualização que vai permitir o aparecimento de
práticas como a arte circense nas sociedades cada vez mais diferenciadas. Ou seja, um
estilo de vida que se caracteriza por um comportamento mais civilizado e que passa a ditar
as normas de conduta. Nesse viés, o lazer e o esporte também são pautados por modelos de
condutas e o (des)controle das atitudes. Portanto, por mais diferenciada que seja uma
pessoa das demais, há uma composição social que ela compartilha com os outros. Esse
compartilhamento, Elias denomina habitus social.
       Nesse contexto a arte circense – também marcada pelas várias mudanças ocorridas
no decorrer da história – traz consigo toda uma simbologia e especificidade e, portanto, a
sua própria configuração. Estabelecendo relações entre os atores pertencentes a este meio,
criando e recriando a cultura existente dentro do seu grupo social e transmitindo, ora de
geração em geração, ora na lógica do mercado.


1
  Materialidade corpórea, resultado de conhecimentos socialmente produzidos e historicamente acumulados pela humanidade
(COLETIVO DE AUTORES, 1992, p.39).
Essa conduta de valores adquirida através de um conjunto de emoções provenientes
do risco, é um dos fatores que perpetuaram esse tipo de prática ao longo da história e que,
até certo ponto, se mantém nos dias atuais. A qual desperta também o imaginário social
dos telespectadores que se sentem atraídos, ou melhor, fascinados em poder ter a
possibilidade de compartilhar (consumir) esse tipo de emoção. É essa tensão-excitação que
move o circo. É a expectativa do salto mortal do equilibrista, da cabeça do domador dentro
da boca do leão, dos motoqueiros no Globo da Morte, enfim, do medo do erro, da
satisfação do acerto. É a busca da excitação que faz o homem se libertar do seu eu,
procurando despertar os seus anseios mais íntimos e encontrando uma maneira de se sentir
vivo com todas as suas potencialidades.
        Esse modo de se expressar, trazer à tona os sentimentos (emoções) que
correspondem e transcendem à vida real é que Elias denomina de ação mimética. As
práticas esportivas e de lazer (e especificamente as práticas circenses) possuem
características miméticas, de tensão-excitação nos indivíduos, representadas através de
suas ações.
        A variedade de atividades de lazer e esportivas na sociedade possui características
estruturais básicas. Enquanto que o cotidiano exige que as pessoas mantenham um perfeito
domínio sobre os seus estados de espírito e sobre os seus impulsos, afetos e emoções,
algumas ocupações de lazer e atividades esportivas vêm propiciar formas de libertar esse
mundo imaginário através de suas possibilidades de aliviar o “stress” do mundo real. A
excitação, até este momento reprimida, propicia nas atividades de lazer e esportivas o
encontro com esse mundo imaginário de emoções.
       E a prática circense é um eixo condutor para esse mundo imaginário das emoções –
através dos seus malabares, acrobacias de solo e aéreas, palhaços – as quais podem
proporcionam a “arte do sorrir” e o encontro do seu eu imaginário, buscando manter
relações e pertencendo aquele determinado grupo social.
       Para Elias & Dunning (1992, p.71),
                       [...] se perguntarmos de que modo é que se animam os sentimentos, como é que
                       a excitação é favorecida pelas atividades de lazer, descobrimos que isso é
                       dinamizado, habitualmente, por meio da criação de tensões. Perigo imaginário,
                       medo ou prazer mimético, tristeza e alegria são produzidos e diferentes estados
                       de espíritos são evocados e talvez colocados em contraste, como a angústia e a
                       exaltação, a agitação e a paz de espírito.
        Deste modo, se estabelece uma relação direta entre os sentimentos desencadeados
numa situação imaginária de uma atividade de lazer como a circense ou esportiva e as
situações reais da vida, que são designadas como ações miméticas que rodeiam a existência
humana.
        Por exemplo, na prática circense tradicional, observa-se a íntima relação
estabelecida entre o domador e a fera. O imaginário social perpassa pela dominação do
homem sobre o animal, ou seja, usar a inteligência, a força, a audácia em manter o animal
sob controle. E ao mesmo tempo a tensão causada por não saber até que ponto realmente o
animal está controlado. Vivencia-se o que Elias denomina de descontrole-controlado das
emoções através das suas ações miméticas.
        São essas tensões miméticas, agradáveis ou desagradáveis, que conduzem a uma
excitação crescente e a um clímax de sentimentos de êxtase as quais ocorrem na realização
desse tipo de atividades.
Compreender esse jogo entre as práticas corporais e o controle social e individual
crescente, pertencentes em sociedades diversas, é fundamental para averiguar que a busca
dessa excitação, essa tensão é, em certo modo, complementar em relação ao controle e
restrição “da emotividade manifesta na nossa vida ordinária” (ELIAS & DUNNING, 1992,
p.105). Pois, o homem como ser social vive em sociedade a partir de regras e condutas
altamente regulamentadas e que são determinantes na manutenção dos níveis de ações
toleráveis. Na temática de Elias tanto o lazer quanto as atividades esportivas são
componentes capazes de mostrar os limites das formações sociais que construídos através
do controle das nossas emoções.
        Nessa perspectiva, é possível perceber a relevância que esse aspecto mimético (de
prazer) possui na prática circense, onde as pessoas que optam pela prática e fruição dessa
arte procuram incessantemente superar os seus limites na busca dessa excitação entre
tensão-prazer, onde o homem e seu corpo em contato com a arte passa por várias emoções
ao mesmo tempo como alegria, tristeza, medo, frustração, desconforto, insegurança,
perseverança, esperança, superação. Todos esses sentimentos, muitas vezes, imperceptíveis
para o artista, fazem parte de toda uma representação social que o mesmo imagina, vive
nessa ação mimética específica do lazer e entretenimento, transcendendo para a vida real.
Essa experiência vivida, através das emoções junto a prática circense passa a permear
vários valores de vida, pois as relações humanas passam a todo momento por tensões e
excitações, as quais precisam ser limitadas buscando o equilíbrio emocional e social.


3. CONSIDERAÇÕES FINAIS


       Essas considerações finais não se tratam de apresentar conclusões acerca da
temática. Fica neste momento a possibilidade de aparar as possíveis arestas deixadas no
decorrer do texto.
        Historicamente, o fator risco sempre foi o alicerce principal no contexto da arte
circense onde, quanto mais perigosa e tensa fosse a performance, maior era seu sucesso
entre os artistas e admiradores. Apenas recentemente a prática circense foi buscar em
outras áreas elementos que relativizassem o imaginário social ligado ao risco dos sujeitos,
nascendo desse modo novas formas de manifestação corporal e enriquecendo a cultura dos
picadeiros.
        Entretanto, cabe aqui ainda alguns questionamentos: Se for excluído o fator risco
dos espetáculos, ou melhor, se as pessoas tiverem a consciência de que as apresentações
arriscadas, os números mortais, as performances de tirar o fôlego, são todos descontroles
controlados (isto é, um artista normalmente não executaria um número e poria sua vida em
risco se ele não tivesse exaustivamente treinado e ensaiado a seqüência), enfim, se os
espectadores fossem aos espetáculos pensando que tudo é minimamente calculado, onde
estaria a graça? Qual então seria a motivação da arte circense, a mola propulsora dessa
cultura a partir de então?
        Com tantas perguntas abre-se, portanto, um profícuo campo de análise. Longe da
pretensa intenção de responder a tais indagações, e abusando da imaginação sociológica,
acreditamos que o caminho talvez seja ou possa estar naquilo que fez a prática circense
ascender ao nível da arte: o belo. A tarefa pode estar, portanto, na luta pelo
reconhecimento da beleza e satisfação que a prática circense – reconhecida em seu sentido
mais amplo (vivenciada ou fruída) – pode proporcionar aos sujeitos. Não se quer aqui
negar a exploração das emoções, mas buscar na arte circense a valorização pelo que ela,
isto é, transcender a excitação que o risco desperta sob as lonas.


                              THE QUEST FOR EXCITEMENT
                       IN THE GREATER SPECTACLE ON EARTH


Abstract


The present work intended to board an important element present in the human condition:
the quest for excitement through the risk, connected with the circus art. The risk always
historically escorted this practice, guaranteeing, also, it maintenance and perpetuation at
some moments. However, currently the circus is balancing on other manifestations as
Dance and Theater, relativizing the tension and danger. Will the circus survive this way?
How about the mimetic aspect in this context? Without a doubt they are pertinent
questions during the work, where the light in the end of the tunnel can be in that it made
the circus practice to ascend to the level of art: the beauty.
Keywords: risk, circus, beauty.


Referências


CASTRO, A. V. O circo conta sua história. Museu dos Teatros – FUNARJ, RJ, 1997.
CONWAY, A. A history of juggling – 1994 (setembro) disponível em http://www.jugglindb.com.
Acessado em Janeiro de 2005.
ELIAS, N. & DUNNING, E. A busca da excitação. Lisboa, Difel. 1992
LUCENA, R. Elias: Individualização e mimesis do esporte. In: PRONI, M; LUCENA, R. Esporte História e
Sociedade. Campinas/SP. Editora Autores Associados, 2002.
FONSECA, M. A. Palhaço da Burguesia. São Paulo. Editora Polis ltda., 1979.
TORRES, A. O Circo no Brasil. Rio de Janeiro. FUNARTE Editora Atrações, 1998.

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A busca da excitação no circo

  • 1. A BUSCA DA EXCITAÇÃO NO MAIOR ESPETÁCULO DA TERRA Marlise Mônica Araújo (UFPR/CEPELS) – marlise_13@yahoo.com.br Rodrigo de França (UFPR/CEPELS) – rodrigofranca@yahoo.com.br Resumo O presente trabalho procurou abordar um importante elemento presente na condição humana: a busca da excitação através do risco, relacionada às artes circenses. O risco sempre acompanhou historicamente esta prática, garantindo, inclusive, sua manutenção e perpetuação em alguns momentos. Entretanto atualmente o circo está se equilibrando sobre outras manifestações como a Dança e o Teatro, relativizando a tensão e o perigo ainda inerentes. O Circo conseguirá sobreviver desse modo? Como fica o aspecto mimético neste contexto? Sem dúvida são questões pertinentes durante o trabalho, onde a luz no fim do túnel pode estar naquilo que fez a prática circense ascender ao nível da arte: o belo. Palavras-chave: risco; circo; belo. INTRODUÇÃO O que nos vêm à mente quando se pensa na palavra circo? Corajosos atiradores de facas de olhos vendados? Talvez sagazes engolidores de fogo e de espadas? Inescrupulosos domadores em jaulas repletas de tigres e leões? Ou intrépidos equilibristas à 20 metros de altura, literalmente por um fio? Esse conjunto de performances mencionado – e que pode, de certa forma, condensar o imaginário social dos sujeitos a respeito desse fenômeno – está intimamente conectado por um eixo condutor, a saber: o risco. Todos os indicativos parecem apontar para a seguinte problemática: É o risco um fator vital na expressão, manutenção e perpetuação desta prática milenar? Por que o medo, a tensão, a apreensão, a excitação da façanha, o temor da morte, sempre foram as emoções que levaram os artistas circenses a se aventurarem debaixo das lonas? E por que tais emoções são mimeticamente experimentadas pelos espectadores que consomem o espetáculo? Assim, este trabalho busca compreender e explicitar, a partir da perspectiva e imaginação sociológica, tais problemáticas a respeito do Circo, sua intrínseca relação com o risco e as mudanças observadas no habitus acerca deste fenômeno.
  • 2. Para tanto, num primeiro momento, buscou-se mapear o contexto no qual surgem as artes circenses, suas manifestações ao longo da história e como esta prática se apresenta atualmente. Em seguida dá-se a exploração desse eixo condutor, à luz dos conceitos de Norbert Elias, em sua obra A Busca da Excitação. À guisa da conclusão, procurar-se-á traçar elementos que contribuam para uma apreciação diferenciada da arte, para além dos limites da excitação. Então que comece o show! 1. PRIMEIRO ATO 1.1 QUANDO E ONDE COMEÇA A HISTÓRIA DO CIRCO? O circo é uma atividade corporal secular com difícil precisão de origem dos espetáculos, mas traz no seu histórico a hipótese de que: “o remoto ancestral do artista de circo deve ter sido aquele troglodita que, num dia de caça surpreendentemente farta, entrou na caverna dando pulos de alegria e despertando, com suas caretas, o riso de seus companheiros de dificuldades”. (RUIZ apud TORRES 1998, p.13). Segundo a pesquisadora Castro (1997), pode-se dizer que as artes circenses surgiram na China, onde foram descobertas pinturas de quase 5.000 anos em que aparecem acrobatas, contorcionistas e equilibristas. A acrobacia era uma forma de treinamento para os guerreiros de quem se exigia agilidade, flexibilidade e força. Com o tempo, a essas qualidades se somou a graça, a beleza e a harmonia. Há registros, segundo Torres (1998), em seu livro O circo no Brasil, de que as raízes da arte circense estão nos hipódromos da Grécia antiga e no grande Império Egípcio. De acordo com Lewbel (1995) e Zeithen (citado por CONWAY, 1994), os primeiros sinais da arte circense estão gravados nas pirâmides, com desenhos de domadores, equilibristas, malabaristas e contorcionistas. Os espetáculos desse período eram como as procissões, que tinham o objetivo de saudar os generais vitoriosos. Nesses cortejos, havia a doma, o desfile de animais exóticos e soldados conduzindo os novos escravos, além de apresentações em argolas e barras, que lembravam números da moderna ginástica olímpica. Mas foi na Europa que o circo ganhou força e se desenvolveu. Para Castro (1997) os espetáculos tomaram impulso ainda no Império Romano, quando seus anfiteatros recebiam apresentações de habilidades (mais tarde classificadas como circenses). A importância e a grandiosidade desse espetáculo pode ser atestada pelo Circo Máximo de Roma, o qual apareceu pouco depois, mas foi destruído em um incêndio. Em 40 a.C., no mesmo local foi construído o Coliseu, onde cabiam 87 mil espectadores. Segundo a autora, lá eram apresentadas excentricidades como homens louros nórdicos, animais exóticos, engolidores de fogo e gladiadores, entre outros. Porém, entre 54 e 68 d.C., as arenas passaram a ser ocupadas por espetáculos sangrentos, com a perseguição aos cristãos, que eram atirados às feras, distorcendo a proposta circense e diminuindo o interesse pela arte.
  • 3. Com a decadência do Império Romano, os artistas circenses ganham espaço nas praças públicas, nos adros das igrejas e, sobretudo, nas feiras. "[...] ela (a feira) foi o lugar onde a arte circense permaneceu, de Roma a Philip Astley" (CASTRO, 1997, p.17). Esses circos, agrupados em pequenas companhias, rodavam vilas, cidades e castelos, em busca de público e de sustento. Conforme aponta Torres (1998), o primeiro circo europeu moderno, o Astley's Amphitheatre, foi inaugurado em Londres por volta de 1770 por Philip Astley, um oficial inglês da Cavalaria Britânica. O circo de Astley tinha um picadeiro circular com uma espécie de arquibancada perto. Ele percebeu que seria bem mais fácil “[...] manter-se de pé, sobre um cavalo, a galope, dentro de um círculo perfeito. Questão de lei física: a força centrífuga” (TORRES, 1998, p. 16). Astley organizou um espetáculo eqüestre, com rigor e estrutura militares, mas percebeu que para segurar o público, teria que reunir outras atrações e juntou saltimbancos, equilibristas, saltadores e palhaço. Ao longo dos anos, Astley acrescentou saltos acrobáticos, dança com laços e malabarismo. De acordo com Torres (1998, p. 18), este primeiro circo funcionava como um quartel: os uniformes, o rufar dos tambores, as vozes de comando para a execução dos números de risco. O próprio Astley dirigia e apresentava o espetáculo, criando assim, a figura do mestre de cerimônias. Astley começou a difundir o circo moderno e abriu uma filial em Paris, após convite para apresentar- se para o rei da França. Só mais tarde, alguns países da Europa como Suécia, Espanha, Alemanha, Rússia e a própria França, começaram a desenvolver sua arte circense. Em apenas cinqüenta anos o circo moderno já tinha se espalhado por todo o mundo. 1.2 O CIRCO NO BRASIL Para Torres (1998), documentos apontam que no século XVIII, antes mesmo da criação do circo moderno, já havia grupos circenses no Brasil. Normalmente, essas companhias eram formadas por ciganos, expulsos da Península Ibérica. Tendo em vista que “[...] sempre houve ligação dos ciganos com o circo” (CASTRO apud TORRES 1998, p. 20). Entre suas especialidades incluíam-se a doma de ursos, o ilusionismo e as exibições com cavalos. Há relatos de que eles usavam tendas e nas festas sacras, havia bagunça, bebedeira, e exibições artísticas, incluindo teatro de bonecos. A autora conta que eles viajavam de cidade em cidade, e adaptavam seus espetáculos ao gosto da população local, ou seja, números que não faziam sucesso na cidade eram tirados do programa. Ainda segundo Torres (1998), o circo moderno só chegou ao Brasil a partir de 1830. Incentivadas pelos ciclos econômicos do café, borracha e cana-de-açúcar, grandes companhias européias vinham apresentar-se nas cidades brasileiras. Foram essas companhias que ajudaram a formar as primeiras famílias de circo, que passaram a ser as responsáveis pelo desenvolvimento do circo moderno no Brasil. Eram realmente famílias, com laços consangüíneos, que sustentavam esta atividade. Pai, avô, filho, sobrinhos e netos eram responsáveis por tudo, desde a infra-estrutura e montagem do circo, até o espetáculo.
  • 4. Uma questão interessante e que vai de encontro a esse trabalho é o fato de que o público que ia aos espetáculos também apresentava características diferentes, ou seja, um habitus próprio. Segundo Eduardo Oliveira da Silva, que foi aluno da segunda turma da escola nacional de circo (conforme TORRES, 1998, p. 25), os europeus iam ao circo apreciar a arte, a estética das apresentações e a beleza do espetáculo; já no Brasil, os números perigosos eram as atrações: trapézio, animais selvagens e ferozes, engolidores de fogo, entre outros. Sempre o elemento risco em questão. Até a pouco tempo, esta era a situação dos circos no Brasil. Mas diversos fatores levaram a uma mudança na sua organização e administração. A primeira mudança foi na relação familiar. Agora, alguns pais preferem que seus filhos se dediquem aos estudos, ao invés de se dedicarem apenas à arte circense. Para Torres (1998), esta atitude acabou trazendo, com o tempo, duas conseqüências: a primeira, diz respeito à visão que estes "novos empresários" têm do circo. Nesta nova roupagem do circo fica mais evidente a figura do capitalista, o dono do circo. O objetivo não poderia ser outro senão o lucro. A segunda é que, para suprir a demanda de artistas, surgiram as escolas de circo, que formam novos artistas. Eles não fazem parte da família. A relação é apenas de patrão e empregado. As mudanças ocorridas na administração do circo moderno ajudaram a criar também uma nova categoria de circo. Conhecidas como "circo novo", estas companhias não têm picadeiro, nem lona, nem arquibancadas e se apresentam, na maioria das vezes, em teatros ou casas de espetáculo, embora possam utilizar qualquer espaço. Também chamado de Circo Contemporâneo (procurando evitar assim a idéia de que existe um circo “velho”), este conceito surgiu para revitalizar e dar um ar de modernidade às artes circenses. Firmado com base na libertação e negação de práticas até então bastante difundidas, mas que agora pareciam um tanto quanto equivocadas. Pode-se citar como exemplo a utilização e exploração de animais sob as lonas. Outra mudança diz respeito ao desvio dos holofotes do principal elemento condutor desta arte ao longo dos tempos: o risco. Desse modo voltam-se os olhares para a estética e a plasticidade corporal. Há o enriquecimento da arte a partir de outros elementos culturais, como a Dança e o Teatro. Nesse sentido os espetáculos passaram de um conjunto de apresentações variadas para um show temático com começo, meio e fim. Ou seja, desde então os artistas passam a ser também atores e surgiu a idéia de performance. Um exemplo típico desse tipo de circo é o Cirque du Soleil, do Canadá. No Brasil, há vários grupos desse gênero, como o Intrépida Trupe, Fratellis, Teatro de Anônimos e Nau de Ícaros.
  • 5. 2. SEGUNDO ATO 2.1 EMOÇÃO E MIMESIS NA PRÁTICA CIRCENSE Feita a primeira “apresentação”, cabe agora traçar um paralelo com a teoria elisiana, afim de compreender alguns conceitos que permeiam essa diferenciada manifestação da Cultura Corporal1, a qual pode garantir individualização. A individualização na visão de Elias é entendida como um processo móvel, mutável e diferenciador. Já a individualidade surge com a burguesia e se traduz por um modo de ser característico. Individualização é uma questão de relação e, portanto, um modo de ser construído a partir da crescente relação e de uma mútua dependência. Segundo Lucena (2001, p.123), individualidade é o “dever–ser” que denota um comportamento previsto; já a individualização é o “sendo”. Na história da humanidade, é possível notar-se que, quanto mais o homem era regido pelas forças da natureza, menos diferenciadas eram suas atitudes e seus comportamentos para com os demais. Nesse sentido, fica evidente a relação que se estabelece entre homem e sociedade em busca de uma diferenciação individual, ou seja, na busca do seu espaço historicamente construído. Não é uma escolha do indivíduo, mas um comportamento socialmente exigido. Por isso, Elias (apud LUCENA, 2002, p.122) explica: Só a conscientização da autonomia relativa dos planos e ações individuais que se entrelaçam, da maneira como o indivíduo é ligado pela vida social a outros, permite uma compreensão mais profunda do próprio fato da individualidade. A coexistência de pessoas, o emaranhamento de suas intenções e planos, os laços com que se prendem mutuamente, tudo isso, muito longe de destruir a individualidade, proporciona um meio no qual ela pode desenvolver-se. Nessa perspectiva, o imaginário social dos atores que desempenham seus papéis na arte circense é altamente intrínseca e complexa, ao se depararem com a diversidade de emoções que são despertadas e disseminadas no momento em que interagem com o público, ou seja, quando passam os sentimentos do eu para o nós e do individual para o social, através do espetáculo. É essa individualização que vai permitir o aparecimento de práticas como a arte circense nas sociedades cada vez mais diferenciadas. Ou seja, um estilo de vida que se caracteriza por um comportamento mais civilizado e que passa a ditar as normas de conduta. Nesse viés, o lazer e o esporte também são pautados por modelos de condutas e o (des)controle das atitudes. Portanto, por mais diferenciada que seja uma pessoa das demais, há uma composição social que ela compartilha com os outros. Esse compartilhamento, Elias denomina habitus social. Nesse contexto a arte circense – também marcada pelas várias mudanças ocorridas no decorrer da história – traz consigo toda uma simbologia e especificidade e, portanto, a sua própria configuração. Estabelecendo relações entre os atores pertencentes a este meio, criando e recriando a cultura existente dentro do seu grupo social e transmitindo, ora de geração em geração, ora na lógica do mercado. 1 Materialidade corpórea, resultado de conhecimentos socialmente produzidos e historicamente acumulados pela humanidade (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p.39).
  • 6. Essa conduta de valores adquirida através de um conjunto de emoções provenientes do risco, é um dos fatores que perpetuaram esse tipo de prática ao longo da história e que, até certo ponto, se mantém nos dias atuais. A qual desperta também o imaginário social dos telespectadores que se sentem atraídos, ou melhor, fascinados em poder ter a possibilidade de compartilhar (consumir) esse tipo de emoção. É essa tensão-excitação que move o circo. É a expectativa do salto mortal do equilibrista, da cabeça do domador dentro da boca do leão, dos motoqueiros no Globo da Morte, enfim, do medo do erro, da satisfação do acerto. É a busca da excitação que faz o homem se libertar do seu eu, procurando despertar os seus anseios mais íntimos e encontrando uma maneira de se sentir vivo com todas as suas potencialidades. Esse modo de se expressar, trazer à tona os sentimentos (emoções) que correspondem e transcendem à vida real é que Elias denomina de ação mimética. As práticas esportivas e de lazer (e especificamente as práticas circenses) possuem características miméticas, de tensão-excitação nos indivíduos, representadas através de suas ações. A variedade de atividades de lazer e esportivas na sociedade possui características estruturais básicas. Enquanto que o cotidiano exige que as pessoas mantenham um perfeito domínio sobre os seus estados de espírito e sobre os seus impulsos, afetos e emoções, algumas ocupações de lazer e atividades esportivas vêm propiciar formas de libertar esse mundo imaginário através de suas possibilidades de aliviar o “stress” do mundo real. A excitação, até este momento reprimida, propicia nas atividades de lazer e esportivas o encontro com esse mundo imaginário de emoções. E a prática circense é um eixo condutor para esse mundo imaginário das emoções – através dos seus malabares, acrobacias de solo e aéreas, palhaços – as quais podem proporcionam a “arte do sorrir” e o encontro do seu eu imaginário, buscando manter relações e pertencendo aquele determinado grupo social. Para Elias & Dunning (1992, p.71), [...] se perguntarmos de que modo é que se animam os sentimentos, como é que a excitação é favorecida pelas atividades de lazer, descobrimos que isso é dinamizado, habitualmente, por meio da criação de tensões. Perigo imaginário, medo ou prazer mimético, tristeza e alegria são produzidos e diferentes estados de espíritos são evocados e talvez colocados em contraste, como a angústia e a exaltação, a agitação e a paz de espírito. Deste modo, se estabelece uma relação direta entre os sentimentos desencadeados numa situação imaginária de uma atividade de lazer como a circense ou esportiva e as situações reais da vida, que são designadas como ações miméticas que rodeiam a existência humana. Por exemplo, na prática circense tradicional, observa-se a íntima relação estabelecida entre o domador e a fera. O imaginário social perpassa pela dominação do homem sobre o animal, ou seja, usar a inteligência, a força, a audácia em manter o animal sob controle. E ao mesmo tempo a tensão causada por não saber até que ponto realmente o animal está controlado. Vivencia-se o que Elias denomina de descontrole-controlado das emoções através das suas ações miméticas. São essas tensões miméticas, agradáveis ou desagradáveis, que conduzem a uma excitação crescente e a um clímax de sentimentos de êxtase as quais ocorrem na realização desse tipo de atividades.
  • 7. Compreender esse jogo entre as práticas corporais e o controle social e individual crescente, pertencentes em sociedades diversas, é fundamental para averiguar que a busca dessa excitação, essa tensão é, em certo modo, complementar em relação ao controle e restrição “da emotividade manifesta na nossa vida ordinária” (ELIAS & DUNNING, 1992, p.105). Pois, o homem como ser social vive em sociedade a partir de regras e condutas altamente regulamentadas e que são determinantes na manutenção dos níveis de ações toleráveis. Na temática de Elias tanto o lazer quanto as atividades esportivas são componentes capazes de mostrar os limites das formações sociais que construídos através do controle das nossas emoções. Nessa perspectiva, é possível perceber a relevância que esse aspecto mimético (de prazer) possui na prática circense, onde as pessoas que optam pela prática e fruição dessa arte procuram incessantemente superar os seus limites na busca dessa excitação entre tensão-prazer, onde o homem e seu corpo em contato com a arte passa por várias emoções ao mesmo tempo como alegria, tristeza, medo, frustração, desconforto, insegurança, perseverança, esperança, superação. Todos esses sentimentos, muitas vezes, imperceptíveis para o artista, fazem parte de toda uma representação social que o mesmo imagina, vive nessa ação mimética específica do lazer e entretenimento, transcendendo para a vida real. Essa experiência vivida, através das emoções junto a prática circense passa a permear vários valores de vida, pois as relações humanas passam a todo momento por tensões e excitações, as quais precisam ser limitadas buscando o equilíbrio emocional e social. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Essas considerações finais não se tratam de apresentar conclusões acerca da temática. Fica neste momento a possibilidade de aparar as possíveis arestas deixadas no decorrer do texto. Historicamente, o fator risco sempre foi o alicerce principal no contexto da arte circense onde, quanto mais perigosa e tensa fosse a performance, maior era seu sucesso entre os artistas e admiradores. Apenas recentemente a prática circense foi buscar em outras áreas elementos que relativizassem o imaginário social ligado ao risco dos sujeitos, nascendo desse modo novas formas de manifestação corporal e enriquecendo a cultura dos picadeiros. Entretanto, cabe aqui ainda alguns questionamentos: Se for excluído o fator risco dos espetáculos, ou melhor, se as pessoas tiverem a consciência de que as apresentações arriscadas, os números mortais, as performances de tirar o fôlego, são todos descontroles controlados (isto é, um artista normalmente não executaria um número e poria sua vida em risco se ele não tivesse exaustivamente treinado e ensaiado a seqüência), enfim, se os espectadores fossem aos espetáculos pensando que tudo é minimamente calculado, onde estaria a graça? Qual então seria a motivação da arte circense, a mola propulsora dessa cultura a partir de então? Com tantas perguntas abre-se, portanto, um profícuo campo de análise. Longe da pretensa intenção de responder a tais indagações, e abusando da imaginação sociológica, acreditamos que o caminho talvez seja ou possa estar naquilo que fez a prática circense ascender ao nível da arte: o belo. A tarefa pode estar, portanto, na luta pelo reconhecimento da beleza e satisfação que a prática circense – reconhecida em seu sentido
  • 8. mais amplo (vivenciada ou fruída) – pode proporcionar aos sujeitos. Não se quer aqui negar a exploração das emoções, mas buscar na arte circense a valorização pelo que ela, isto é, transcender a excitação que o risco desperta sob as lonas. THE QUEST FOR EXCITEMENT IN THE GREATER SPECTACLE ON EARTH Abstract The present work intended to board an important element present in the human condition: the quest for excitement through the risk, connected with the circus art. The risk always historically escorted this practice, guaranteeing, also, it maintenance and perpetuation at some moments. However, currently the circus is balancing on other manifestations as Dance and Theater, relativizing the tension and danger. Will the circus survive this way? How about the mimetic aspect in this context? Without a doubt they are pertinent questions during the work, where the light in the end of the tunnel can be in that it made the circus practice to ascend to the level of art: the beauty. Keywords: risk, circus, beauty. Referências CASTRO, A. V. O circo conta sua história. Museu dos Teatros – FUNARJ, RJ, 1997. CONWAY, A. A history of juggling – 1994 (setembro) disponível em http://www.jugglindb.com. Acessado em Janeiro de 2005. ELIAS, N. & DUNNING, E. A busca da excitação. Lisboa, Difel. 1992 LUCENA, R. Elias: Individualização e mimesis do esporte. In: PRONI, M; LUCENA, R. Esporte História e Sociedade. Campinas/SP. Editora Autores Associados, 2002. FONSECA, M. A. Palhaço da Burguesia. São Paulo. Editora Polis ltda., 1979. TORRES, A. O Circo no Brasil. Rio de Janeiro. FUNARTE Editora Atrações, 1998.