No caso de permanência de estrangeiro no Brasil fundada em cônjuge brasileiro, o divórcio constitui causa para o cancelamento da permanência, ou seja, para o cancelamento do registro nacional de estrangeiro?
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Divórcio: Causa de cancelamento da permanência de estrangeiro no Brasil?
1. DIVÓRCIO: CAUSA DE CANCELAMENTO DO REGISTRO NACIONAL DE ESTRANGEIRO?
Paira, entre a comunidade estrangeira no Brasil e não só, uma ideia generalizada de que o
divórcio constitui motivo para o cancelamento do registro nacional de estrangeiro.
Estamos evidentemente a falar da situação de casamento entre cidadão brasileiro e pessoa de
nacionalidade estrangeira, através do que obteve esta a permanência definitiva no Brasil.
Com efeito, estabelece o artigo 4.º da Lei n.º 6.815, de 19/08/1980 – Estatuto do Estrangeiro –,
que ao estrangeiro que pretenda entrar no território nacional pode ser concedido visto
permanente, tendo este como pressuposto a intenção do mesmo de se fixar definitivamente no
Brasil, nos termos do disposto no artigo 16 da mesma Lei.
Na esteira da permissão aberta pela mencionada disposição legal, a concessão de visto
permanente com fundamento em casamento encontra-se regulamentada pela Resolução
Normativa n.º 108, de 12/02/2014, do Conselho Nacional de Imigração, cujo artigo 1.º
estabelece que “O Ministério das Relações Exteriores poderá conceder visto temporário ou
permanente, a título de reunião familiar, aos dependentes de cidadão brasileiro ou de
estrangeiro temporário ou permanente no Brasil”.
A concessão de um visto pressupõe que o interessado se encontre no exterior e que o requeira
junto de uma repartição consular brasileira, sendo, por outro lado, que, se o mesmo se
encontrar no Brasil, poderá requerer a permanência junto do Ministério da Justiça, nos termos
do disposto no artigo 9.º da referida Resolução Normativa.
Para o que agora releva, consideram-se dependentes, para efeitos de concessão de visto
permanente ou de permanência definitiva, de acordo com o artigo 2.º, inciso IV, da RN 108,
entre outros, o “cônjuge ou companheiro ou companheira, em união estável, sem distinção de
sexo, de cidadão brasileiro ou de estrangeiro temporário ou permanente no Brasil”.
Uma vez concedido o visto permanente ou a permanência definitiva, o estrangeiro requer o seu
registro junto do Ministério da Justiça, sendo-lhe atribuído um número de identidade,
conhecido como RNE – Registro Nacional de Estrangeiro –, e uma carteira de identidade onde
tal número fica a constar – Carteira de Identidade de Estrangeiro (artigos 30 e 33 do Estatuto do
Estrangeiro).
Por seu turno, as hipóteses de cancelamento do registro de estrangeiro encontram-se previstas
no artigo 49 do Estatuto do Estrangeiro, sendo de referir que o divórcio não consta no respectivo
elenco. Não existe, assim, previsão legal que autorize o cancelamento do registro nacional de
estrangeiro por motivo de divórcio, e tampouco alguma que condicione a validade e eficácia do
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2. DIVÓRCIO: CAUSA DE CANCELAMENTO DO REGISTRO NACIONAL DE ESTRANGEIRO?
visto permanente ou de permanência definitiva com fundamento em casamento na subsistência
da situação matrimonial.
Importa lembrar que estamos no domínio do direito público-administrativo, em que preside o
princípio da legalidade, o que significa que as autoridades administrativas devem obediência ao
estipulado na lei, podendo apenas recorrer a juízos de discricionariedade quando tal
possibilidade se encontrar expressamente prevista, o que não ocorre na situação sob análise.
Não ignoramos que o artigo 75, inciso II, alínea a), estabelece que não poderá ser expulso o
estrangeiro que tiver cônjuge brasileiro do qual não esteja divorciado ou separado, de fato ou
de direito, e desde que o casamento tenha sido celebrado há mais de cinco anos.
Acontece, porém, que esta norma em nada diz respeito à situação em análise. Efetivamente, a
expulsão é uma medida penalizante de um determinado comportamento culposo do
estrangeiro, o que resulta claramente do disposto no artigo 65 do Estatuto do Estrangeiro, nos
termos do qual:
“É passível e expulsão o estrangeiro que, de qualquer forma, atentar contra a segurança
nacional, a ordem política ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia
popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais.”
Mostra-se, portanto, totalmente incorreto proceder a uma interpretação a contrario sensu
desta norma, estendendo-a às situações de estrangeiro, com visto permanente ou permanência
definitiva com fundamento em casamento, que se divorcie do seu cônjuge brasileiro, pois o
respectivo campo de aplicação é estritamente circunscrito às situações de expulsão.
É a este nível consensual a jurisprudência da Justiça Federal, a qual não apenas censura o
cancelamento do registro de estrangeiro por motivo de divórcio como também determina que
qualquer reanálise da situação jurídica daquele no Brasil deverá obedecer aos princípios do
devido processo legal, contraditório e ampla defesa, consagrados no artigo 5.º, incisos LIV e LV,
da Constituição Federal de 1988.
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