PUC Goiás
Departamento de Letras
Teoria da Literatura I
“O jarro de prata”, de Truman Capote
Profa. Gabriela Azeredo Santos
Características Essenciais do
Gênero Narrativo
1 - Foco narrativo: presença de um elemento que relata a história como
participante ou como observador.
2 - Enredo: seqüência de fatos, podendo seguir a ordem cronológica em
que eles ocorrem (sucessão temporal dos fatos), ou a ordem psicológica
(sucessão dos fatos, seguindo as lembranças ou evocações das
personagens).
3 - Personagem: seres criados pelo autor com características físicas e
psicológicas determinadas.
4 – Campo (tempo) e espaço: o momento e o local em que os fatores são
narrados e onde se desenrolam.
5 - Conflito: situação de tensão entre os elementos da narrativa.
6 - Clímax: ponto máximo de dramaticidade.
7 - Desfecho: momento no qual se finaliza a história e cada personagem
se encaminha para seu "destino".
Quais as Principais Características
de um Conto?
Entre suas principais características estão a
concisão, a precisão, a densidade, a unidade de
efeito ou impressão total – da qual falava Poe e
Tchekhov:
O conto precisa causar um efeito singular no
leitor: muita excitação e emotividade.
Isto é...
Desde as origens, o conto é definido, formalmente,
pela brevidade : uma narrativa curta e linear,
envolvendo poucas personagens; concentrada em uma
única ação, de curta duração temporal e situada num
só espaço.
Dessa necessidade de brevidade, deriva a grande arte
do conto, que, mais que qualquer outro gênero em
prosa, exige que o escritor seja um verdadeiro
alquimista na manipulação da palavra.
Especificidades do Gênero Conto
- Apresenta apenas uma célula dramática.
- Poucos personagens intervêm na narrativa.
- Cenário limitado, espaço restrito.
- Espaço de tempo curto.
- Diálogos sugestivos que permitem mostrar os
conflitos entre as personagens.
- Ação reduzida ao essencial, há um só conflito.
- Narrativa objetiva; por vezes, não há a
descrição.
Saiba mais em...
O Conto Brasileiro Contemporâneo, de Alfredo Bosi
Conto Contemporâneo Brasileiro, de António Hohlfeldt
Biologia do Conto, de Armando Moreno
O Conto Brasileiro e sua Crítica, de Celuta Moreira Gomes (Org.)
Teoria do Conto, de N.B. Gottlib
"What Makes a Short Story Short?", in Essentials of the Theory
of Fiction, ed. por Michael J. Hoffman e Patrick D. Murphy, de
Norman Friedman
A Arte do Conto, de Raimundo Magalhães Júnior
22 Diálogos sobre o Conto Brasileiro Contemporâneo , de
Temístocles Linhares
Short Story: a Critical Introduction, de Valerie Shaw
Morfologia do Conto, de V. Propp
Consulte, também, um Dicionário de Termos Literários
Algumas Considerações sobre
Truman Capote
Truman Capote é notoriamente reconhecido por suas
obras Bonequinha de luxo e A Sangue Frio. Com esta,
inicia um gênero por ele denominado non-fiction novel –
literatura de não ficção, jornalismo literário ou
romance-documento. Este é um projeto estilístico que
reúne jornalismo e literatura, cujo objetivo é
proporcionar um enfoque mais imaginativo e lírico à
reportagem, permitindo ao jornalista inserir-se na
narrativa, sem alterar a realidade da notícia sobre a
qual trabalha. Entretanto, deve-se observar que suas
histórias curtas são também esplêndidas.
As Estruturas Narrativas de “O
Jarro De Prata”, de Truman Capote
Local da trama: Wachata County, cidade pequena, ao sul
dos Estados Unidos (mais especificamente em Valhalla, a
drugstore do Sr. Marshall, tio do personagem-narrador)
O conto é narrado em primeira pessoa, por um
personagem secundário, que acompanha todos de perto.
Ele vive os acontecimentos, portanto, observa-os de
dentro e, assim, transmite-os de modo direto, mais
verossímil.
(Na classificação de Friedman (1967), trata-se de um “I”
as witness – “eu” como testemunha – e, por isso, seu
ângulo de visão é mais limitado.)
Presença X Ausência do Narrador
Tempo da Narrativa e Tempo dos Fatos
O leitor é colocado a uma certa distância do texto, visto
que a presença do narrador medeia os fatos narrados,
mas essa é uma questão de predominância e não de
exclusividade, pois o narrador tanto sintetiza a narrativa
quanto a apresenta em cenas. Além disso, o tempo da
narrativa é diferente do tempo dos fatos narrados.
A passagem de tempo dos fatos é marcada pelo Natal.
Há as ações que acontecem bem antes dele, aquelas que
acontecem pouco antes, as que se passam alguns dias
antes, até chegar às de sua véspera. O Natal marca o
tempo de duração da promoção do jarro de prata e,
simultaneamente, o tempo de duração da trama.
Equilíbrio X Desequilíbrio
Suspensão da Narrativa
Introdução de Personagem
A situação inicial de equilíbrio é rompida.
Nesse ponto, a narrativa é suspensa e o narrador
introduz uma nova personagem.
Para Todorov (2004, p. 123-124),
Toda nova personagem significa uma nova intriga. Estamos no reino
dos homens-narrativas.[...] A aparição de uma nova personagem
ocasiona infalivelmente a interrupção da história precedente, para
que uma nova história, a que explica o ‘eu estou aqui agora’ da nova
personagem, nos seja contada. [...] a presença dos homens-narrativas
é certamente a forma mais espetacular do encaixe.
Equilíbrio X Desequilíbrio
Introdução de Personagem
Suspense
A história encaixada encontra-se com a encaixante, e
o narrador retoma a narrativa, que segue um novo rumo.
Há o restabelecimento do equilíbrio.
Suspende-se novamente a narrativa para a introdução
de dois novos personagens. Como cada novo personagem
ocasiona uma nova história, surge um novo desequilíbrio.
Provocar suspense já era um recurso utilizado pelo
narrador; contudo, agora ele se estende até o final do
conto. Durante várias passagens o narrador reafirma o
suspense e até despista o leitor.
Suspense e Comoção
O narrador busca causar comoção: o leitor precisa ter pena de
Middy para se comover com o final.
Booth ([s.d.], p. 215) chama esse recurso narrativo de
manipulação do estado de espírito do leitor. Isso acontece quando
o narrador tenta fazer o leitor entrar em um determinado estado
de espírito antes de a história acontecer.
No caso de “O Jarro de prata”, a comoção é necessária,
também, para camuflar o fato de que, para Appleseed, o
importante não era ganhar o dinheiro. Sua obsessão era descobrir
quanto dele havia no jarro.
Desfecho
Real e Não-Real
O insólito desfecho da trama conduz a uma avaliação especial. Com
ele, surge o fantástico, que se dá por meio da hesitação do leitor em
decidir se aquilo que ele percebe – Appleseed acerta a quantia que há
no jarro – deve-se ou não à ‘realidade’, tal qual ela existe para a
opinião comum. Mas o que é real ou não em uma narrativa ficcional?
Para Todorov (2004, p. 165),
[...] a literatura, no sentido próprio, começa para além da oposição real e
irreal. Se certos acontecimentos no universo de um livro pretendem ser
explicitamente imaginários, contestam assim a natureza do imaginário no
resto do livro. Se tal aparição é apenas fruto de uma imaginação
superexcitada, é que tudo o que a cerca é verdadeiro, real.
Insólito/Fantástico/Sobrenatural/
Estranho Puro
Diante da hesitação do leitor, há duas possibilidades: decidir que
as leis da ‘realidade’ permaneceram inatas e que existe uma
explicação para o fenômeno descrito ou admitir novas leis da
natureza, pelas quais o fenômeno pode ser explicado. E o fantástico,
segundo Todorov (2004, p.156), dura apenas o tempo dessa
hesitação.
Em “O Jarro de prata”, a explicação sobrenatural é sugerida, e não
é necessário aceitá-la.
Todavia, é possível que, no caso do conto em tela, o fato de
Appleseed acertar a quantia exata contida no jarro seja um caso de
estranho puro.
Há um outro aspecto discutível na narrativa: a veracidade dos
fatos.
Considerações Finais
As verdades de um texto literário são subjetivas, meiasverdades, relativas, visto que, na literatura, impera a
ambigüidade.
De acordo com Vargas Llosa (2006, p. 24), tratam-se de verdades
literárias, as quais, freqüentemente, “constituem inexatidões
flagrantes ou mentiras históricas”.
Vargas Llosa (2006, p. 23) utiliza-se das palavras de Valle-Inclán,
“as coisas não são como as vemos, mas como as recordamos”, para
respaldar sua idéia de que a literatura é uma “irrealidade à qual o
poder de persuasão do bom escritor e a credulidade do bom leitor
conferem uma precária realidade”.
“A literatura existe pelas palavras; mas sua vocação dialética é dizer
mais do que a linguagem diz, ultrapassar as divisões verbais. Ela é, no
interior da linguagem, o que destrói a metafísica inerente a toda
linguagem. O próprio do discurso literário é ir além da linguagem.”
Tzvetan Todorov
REFERÊNCIAS
BARTHES, Roland. Introdução à análise estrutural da narrativa. In:
______. et al. Análise estrutural da narrativa: pesquisas semiológicas. 2.
ed. Petrópolis: Vozes, 1972. (Novas Perspectivas de Comunicação, 1).
BOOTH, Wayne C. A Retórica da ficção. 778.ed. Tradução de Maria
Teresa H. Guerreiro. Lisboa: Arcádia, s.d. (Artes e Letras).
CAPOTE, Truman. O Jarro de prata. Tradução de Sergio Tellaroli. In:
______. 20 contos. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
FRIEDMAN, Norman. Point of view in fiction: the development of a
critical concept. In: STEVICK, Philip. The Theory of the novel. New York:
The Free Press, 1967.
MANZANO, Rodrigo. Decifra-lhe, ou te devora. Cult, ano 9, n.109, p.1419, dez. 2006.
TODOROV, Tzvetan. As Estruturas narrativas. 4. ed. Tradução de Leyla
Perrone-Moisés. São Paulo: Perspectiva, 2004. (Debates, 14).
VARGAS LLOSA, Mario. A Verdade das mentiras. In: ______. A
Verdade das mentiras. 2. ed. Tradução de Cordelia Magalhães. São Paulo:
Arx, 2004.
Grata!
Profa. Gabriela Azeredo Santos
Graduada em Letras/Português e Literaturas
Correspondentes pela UCG, em 1992
Especialista em Literatura Brasileira pela
Universidade de São Gonçalo, Niterói, RJ, em
1993
Mestre em Letras: Literatura e Crítica
Literária pela UCG, em 2009
Professora Convidada do Departamento de
Letras da UCG, desde 1996
Professora no curso de Letras da UEG, na
Cidade de Goiás
Preparadora de Originais na Editora da UCG,
efetiva desde 1998
Contato: gabiazeredo@pucgoias.edu.br