1) São Paulo vem sofrendo com fortes chuvas que causam alagamentos e deixam a cidade no caos há mais de um mês.
2) Os motivos incluem um fluxo úmido da Amazônia, aquecimento do Atlântico e temperaturas mais altas em São Paulo.
3) A urbanização da cidade, com canalização de rios e falta de áreas permeáveis, dificulta o escoamento da água da chuva.
2. Dilúvio... 45ºdia
DEPOIS DA
CHUVA, O CAOS
O rastro de destruição
na Vila Guarani, na
Zona Leste
de São Paulo, onde a
enxurrada matou
duas pessoas:
a ocupação irregular
das margens de
córregos e rios
agrava o problema
das enchentes
3. • Há um mês e meio, os 11 milhões de habitantes
de São Paulo vivem um drama que parece não
ter fim – nem solução. Diariamente, a cidade é
castigada por temporais intensos, que duram
em torno de duas horas e instauram o caos. A
chuva causa congestionamentos monstruosos
no trânsito, deixa bairros inteiros alagados e
sem eletricidade, derruba casas e árvores e, até
a sexta-feira passada, havia provocado a morte
de 14 pessoas, carregadas pela
enxurrada, vítimas de desabamentos ou queda
4. • Em janeiro, o volume de água que se
abateu sobre São Paulo foi de 480,5
milímetros. Isso representa o dobro da
média histórica de janeiro e o maior
volume registrado desde 1947 nesse
mesmo mês. São Paulo é o epicentro
das chuvas torrenciais que atingiram
também outras áreas do Sul e do
Sudeste do país.
5. • No Rio Grande do Sul, cidades com
volume de chuva médio de 100 milímetros
no mês de janeiro, como Santa
Maria, Santiago e São Luiz
Gonzaga, foram castigadas com índices
de 400 milímetros. A lavoura de arroz
gaúcha sofreu perda de 1 milhão de
toneladas de grãos, o suficiente para
suprir a demanda do Brasil inteiro por um
mês.
8. • O brasileiro que vive no Sul ou no Sudeste
está habituado às previsíveis chuvas de
verão. A chuva que se repete dia após dia
como se fosse uma reedição do dilúvio
bíblico (que, por sinal, se prolongou por
quarenta dias, tempo já ultrapassado pelo
dilúvio paulistano). A pergunta que todos se
fazem é por que chove tanto em um único
lugar. A resposta mais curta é que existe
uma conjunção excepcional de fatores
meteorológicos, cada um deles contribuindo
para a continuidade do aguaceiro.
9. • Já a devastação que as águas
provocam, por meio de alagamentos e
enxurradas, é também consequência do
perfil geográfico da cidade e das
características da urbanização conduzida
através dos anos.
10. • No que diz respeito à meteorologia, a
chuva resultou de três fenômenos. O
primeiro é o fluxo de ar úmido que todo
ano segue da região amazônica em
direção ao Centro-Oeste, Sul e Sudeste
do Brasil.
11. • O segundo fator que concorreu para a
formação de temporais em São Paulo e
no Sudeste foi o aquecimento do Atlântico
– em 1,5 grau – na sua porção próxima à
costa do Sudeste brasileiro.
12. • O terceiro fator é o calor na cidade de São
Paulo em janeiro. As temperaturas foram
mais altas que a média do mês de janeiro
nas últimas seis décadas. O calor
favorece o aquecimento do solo, que por
sua vez esquenta o ar. Este fica mais leve
e sobe, formando nuvens carregadas. É
um ciclo infernal de retroalimentação.
14. • As chuvas fortes não causariam tantos
problemas em São Paulo caso a cidade
tivesse sido preparada para elas. Na
virada do século XIX para o
XX, impulsionada pela riqueza produzida
pelo café e pelas indústrias, São Paulo
deixou de ser uma vila provinciana para
assumir sua vocação de metrópole.
15. Problemas urbanísticos
• A partir daí, seus governantes optaram
por canalizar boa parte de seus córregos
e rios, transformando-os em galerias
pluviais no subsolo da cidade. Sobre
essas galerias foram construídas grandes
avenidas, como 9 de Julho, 23 de
Maio, Juscelino Kubitschek e Pacaembu.
As galerias subterrâneas coletam a água
da chuva dos bueiros e a levam para
galerias maiores, que a despejam no Rio
Tietê.
16. Causas
• A primeira é quando o volume de água é
maior do que aquele que as galerias
comportam. Nesse caso, a água volta à
superfície e causa alagamentos. A
segunda é quando os próprios rios não
comportam o volume de água despejado
em seus leitos, e transbordam.
17. • O lixo jogado nas ruas também colabora
para as enchentes, mas, segundo
especialistas, é um fator secundário. "O
problema real é o volume de chuvas em
tantos dias consecutivos, que satura o
solo e as galerias", diz o engenheiro
Aluisio Canholi, coordenador técnico do
Plano de Macrodrenagem da Bacia do
Alto Tietê e especialista em drenagem
urbana.
18. • O que os governos podem fazer – e
muitas vezes deixaram de fazer – é
encontrar meios de minimizar os
danos, evitar alagamentos prolongados e
garantir que a tormenta atrapalhe o
mínimo a vida de seus habitantes.
19. Alguns dados
• Os especialistas calculam que um único dia de
chuvas torrenciais em São Paulo, com
alagamentos, cause um prejuízo de 95 milhões
de reais só com engarrafamentos no trânsito. O
engenheiro Aluisio Canholi afirma que 80% do
total de perdas econômicas decorre dos
congestionamentos de trânsito.
Motoristas, mercadorias e bens ficam parados
no trânsito, ilhados em pontos de alagamento.
Nos outros 20% da conta entram fatores como
perdas materiais e desvalorização dos imóveis
situados em áreas sujeitas a inundações.
25. • aumentar a permeabilidade da cidade
ampliando suas áreas verdes. A terra dos
parques ao longo de córregos e rios absorve a
água caso o rio transborde.
• reforçar as galerias que transportam a água da
chuva. Em regiões antigas da cidade, elas são
muito estreitas porque foram construídas
quando a cidade era menos urbanizada e havia
mais solo para absorver a água.
26. • transferir para locais seguros os
moradores que vivem em áreas de
risco, como o Jardim Pantanal.
27. • usar mais pisos com capacidade de
drenagem. Estacionamentos e calçadas
podem ser construídos com pisos que
deixem a água da chuva ir para o lençol
freático, e não para os bueiros.
28. • O principal fator pelo qual os relatos de
tragédias em 1947 são menores que os
registrados hoje é a forma de ocupação
da cidade. Com ruas de terra, várzeas e
lagoas pluviais às margens do Tietê, a
água da chuva era mais facilmente
escoada e drenada. Poucas horas depois
da chuva, portanto, a cidade voltava ao
normal.
29. 1950
A HISTÓRIA SE REPETE
Alagamento na Rua 25 de Março,
no centro da cidade,...
1960
...no bairro do Cambuci, na
Zona Sul,..
31. "Embora a chuva causasse
danos, ela não criava pânico na
população, como acontece
hoje", diz o geógrafo Adler
Guilherme Viadana, da
Universidade Estadual Paulista.
Hoje, ao contrário, é
compreensível que os
paulistanos encurralados pela
água olhem em pânico para as
nuvens de chuva no céu.