SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 34
Downloaden Sie, um offline zu lesen
FILOSOFIA DA CIÊNCIA
A Racionalidade Científico-
Tecnológica
1. Conhecimento Vulgar (senso
comum) e Conhecimento Científico
2. Ciência e Construção – Validade e
Verificabilidade das Hipóteses
3. Racionalidade Científica e a Questão
da Objetividade
“O maior inimigo do conhecimento
não é a ignorância, mas sim a ilusão
da verdade” – Stephen Hawking
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Conhecimento Vulgar ou Senso Comum
O conhecimento vulgar ou senso comum
resulta das experiências e vivências
quotidianas – é subjetivo, concreto e
empírico
Não procura explicar
a realidade, mas sim
enquadrá-la num
todo social coerente
e estável
É formulado numa
linguagem corrente,
originando
ambiguidades
Limita-se a
constatar o que
existe, sem se
preocupar com
explicações
É um conhecimento
prático, superficial,
espontâneo, acrítico
e assistemático
O conhecimento vulgar ou senso comum está ligado à apreensão imediata da realidade.
É, por essa mesma razão, um conhecimento baseado na experiência vivida, sem
demasiadas preocupações com o rigor, mas, ainda assim, ferramenta fundamental do saber
viver, pois é a partir dele que orientamos a nossa vida quotidiana.
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Acumula conhecimentos dispersos sem exigência de rigor e
sistematicidade
É particular, marcado pela subjetividade e pela ausência de
método
É superficial, pois diz como as coisas são (ou parecem ser), sem
se preocupar com justificação ou explicação
É acrítico, sendo pouco atreito ao questionamento e à revisão
Comunica através de uma linguagem natural, sem grandes
preocupações com a eliminação da ambiguidade
Conhecimento Vulgar (senso comum)
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Conhecimento Vulgar (senso comum)
“Senso comum - conjunto mais alargado de crenças que uma comunidade tem
por verdadeiras e partilha durante um certo período de tempo. O senso comum
é um "saber" que resulta da experiência de vida individual e coletiva. Os hábitos
e costumes, as tradições e rituais, os "ditos" e provérbios, as opiniões
populares, etc., são habitualmente referidos como manifestações do senso
comum. A sua aprendizagem é uma condição necessária para a socialização de
cada membro da comunidade, funcionando como um mecanismo regulador do
seu pensamento e da sua ação. Do ponto de vista da ciência e da filosofia, os
processos de justificação das crenças de senso comum afiguram-se muitíssimo
superficiais e falíveis, e é frequente tais crenças resistirem mal a um exame
crítico mais minucioso, pelo que a sua ampla aceitação não é uma garantia de
que sejam verdadeiras”.
António Costa, Dicionário Escolar de Filosofia
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Conhecimento Científico
O conhecimento científico é metódico,
objetivo e sistemático
Expressa-se numa
linguagem específica,
mais técnica e exata, o
que evita a
ambiguidade
É crítico e revisível
Descreve e explica
fenómenos, o que lhe
garante capacidade
preditiva
É experimental e/ou
possui métodos
formais de prova
Ao conhecimento científico importam, sobretudo, os aspetos mensuráveis e quantificáveis da
realidade: quantos ossos tem o esqueleto humano? Qual a velocidade da luz? Como se
transmitem as características biológicas de pais para filhos? Portanto, partindo de hipóteses
explicativas e estabelecendo relações de causalidade entre os fenómenos observados, o cientista
pretende prever a ocorrência de novos fenómenos.
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Formula leis e teorias fundadas na experimentação ou em meios
formais de prova. É rigoroso e sistemático
É universal e aspira à objetividade, apoiando-se num método
Tem um poder explicativo que ultrapassa, em larga medida, a
superficialidade das aparências
Sujeita constantemente as suas teorias ao escrutínio crítico e à
revisão
Utiliza uma linguagem técnica, no sentido de evitar ambiguidades
Conhecimento Científico
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Conhecimento Científico
“A ciência não é apenas uma coleção de leis, um catálogo de factos não
relacionados. É uma criação do espírito humano, com ideias e conceitos
livremente inventados. As teorias físicas experimentam traçar um quadro da
realidade e estabelecer liames com o nosso mundo de impressões. (…)
Ulteriores desenvolvimentos destruíram os velhos conceitos e criaram novos. (…)
com a ajuda das teorias físicas, experimentamos encontrar caminho através do
nevoeiro dos factos observados, de modo a ordenar e compreender o mundo das
nossas impressões sensoriais. Queremos que os factos observados decorram
logicamente do nosso conceito de realidade. Sem a fé na possibilidade de
apreender a realidade por meio das nossas construções teóricas, sem a fé na
harmonia do nosso mundo, impossível a ciência. Esta fé é, e permanecerá
sempre, o motivo fundamental de todas as criações científicas. Através de todos
os nossos esforços e em cada luta entre as ideias novas e velhas, percebemos o
eterno anseio pela compreensão, a inabalável fé na harmonia do mundo,
continuamente fortificada pelos obstáculos que cada vez mais se erguem ante a
nossa compreensão.”
Einstein e Infeld, A Evolução da Física
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
Filosofia – 11.º ano
Serão o conhecimento vulgar e o conhecimento científico opostos?
» O conhecimento científico e o conhecimento vulgar são, em primeiro
lugar, formas diferentes de conhecer, que respondem a objetivos
claramente distintos, mas, de alguma forma, complementares, não se
podendo, no entanto, substituir um ao outro.
» O conhecimento vulgar, à semelhança do que acontece com o
conhecimento científico, vai-se alterando ao longo dos tempos, ou
seja, muitos dos conhecimentos que outrora foram científicos são hoje
de senso comum (ex.: saber que a Terra está em movimento).
1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico
 O conhecimento vulgar (senso
comum) e o conhecimento
científico são distintos. O facto
de o segundo assentar em
pressupostos (experimentação,
por exemplo), que faltam ao
primeiro estabelece uma relação
que é, em muitos aspetos, de
oposição e rutura. Todavia, existe
também uma certa continuidade
e complementaridade entre estas
duas formas de conhecimento.
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 Uma das características diferenciadoras do conhecimento
científico é o seu caráter metódico.
Perguntar pelas metodologias científicas é colocar a questão de saber
como se estabelecem as verdades (ou leis) em ciência. Todavia, não há
um método científico único, mas vários:
 Método Indutivo
 Método Hipotético-Dedutivo
 Método Experimental
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 MÉTODO INDUTIVO
 Embora remonte à Antiguidade, a primeira sistematização de um
método para fazer ciência surge na Modernidade, com o filósofo
inglês Francis Bacon.
 Bacon sustentou que o conhecimento científico é adquirido e
confirmado por um processo de indução.
 O autor fundamenta o conhecimento humano na base de uma
metodologia sistemática de indagação empírica assente na
observação, experimentação e indução.
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 O método indutivo, na perspetiva de Francis Bacon, parte do
pressuposto de que a ciência tem o objetivo de estabelecer leis. Em
função deste mesmo objetivo, o cientista deve observar os
fenómenos e realizar uma enumeração exaustiva das suas
manifestações. Os resultados que daqui emergem são, depois,
sujeitos a testes experimentais.
Filosofia – 11.º ano
Por exemplo, observar muitos cisnes
brancos confirmaria:
- A hipótese de que todos os cisnes são
brancos (generalização)
- A hipótese de que o próximo cisne a ser
observado será branco (previsão)
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 No fundo, é possível sintetizar o método indutivo, defendido por
Bacon, do seguinte modo:
Filosofia – 11.º ano
.
• Observação
dos
fenómenos a
investigar
..
• Descoberta de
relações entre os
fenómenos, a partir da
análise e interpretação
dos dados observados
…
• Generalizaçã
o dessas
relações
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 MÉTODO HIPOTÉTICO-DEDUTIVO
Astrónomo, matemático e físico italiano, Galileu Galilei combinou a
observação empírica com a dedução matemática, sendo considerado
um dos principais defensores do método hipotético-dedutivo.
Filosofia – 11.º ano
Galileu Galilei ficou
mundialmente
conhecido pela sua
defesa do
Heliocentrismo e pelas
inovações técnicas que
introduziu
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 Etapas do Método Hipotético-Dedutivo:
Filosofia – 11.º ano
.
Formula-se uma
hipótese ou teoria
geral, como por
exemplo: “Todos os
planetas têm órbitas
elípticas.”
..
Deduz-se dela uma
afirmação particular,
como por exemplo:
“Dada a informação
que Mercúrio é um
planeta, podemos
deduzir que a sua
órbita é elíptica.”
..
A afirmação é testada
por observação ou
experimentação. Se o
resultado for negativo,
a hipótese geral tem
de ser abandonada.
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 No fundo, Galileu adota uma postura verificacionista: confronta as
hipóteses com os factos e verifica a sua verdade
 Quando, no teste experimental, a hipótese se confirma, o enunciado
transforma-se em lei universal
 Quando, porém, o resultado é negativo, a hipótese terá de ser
abandonada (ou reformulada)
O método Hipotético-Dedutivo pressupõe, portanto, uma hipótese como
ponto de partida, a partir da qual se deduzem certas consequências, que
depois são testadas (para verificar a hipótese)
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 MÉTODO EXPERIMENTAL (ou
método científico simples)
O método experimental começa pelas
observações, a partir das quais se
constroem hipóteses ou teoria, que são
explicações para os fenómenos
observados. A partir delas, deduzem-se
as suas consequências que, se
confirmadas pela experimentação,
produzem uma generalização ou um
enunciado universal que permitirá fazer
previsões precisas, a lei. Se a
experimentação não confirmar a
hipótese, esta é abandonada e tem de se
construir uma outra que passará pelo
mesmo processo.
Filosofia – 11.º ano
Observação
Hipótese
Deduçã
o
Experimentação
LEI
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 Algumas críticas ao método experimental:
 A observação não é o ponto de partida da ciência
 A observação nunca é completamente neutra e objetiva
 A observação é seletiva
 Problema da indução (não é porque observamos muitos casos
“iguais” que esteja garantido que “todos são iguais”). Apesar dos
indiscutíveis benefícios do raciocínio indutivo - permite, por exemplo,
descobrir regularidades na natureza e prever resultados - as suas
conclusões não são absolutamente fidedignas, pois uma hipótese,
enquanto enunciado universal, não pode ser justificada por casos
particulares
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 KARL POPPER E O FALSIFICACIONISMO
 Popper defende a visão falsificacionista do método científico,
segundo a qual o método da ciência é o das conjeturas e
refutações.
 O ponto de partida da investigação científica é a colocação de
problemas. Depois, o cientista propõe uma teoria para resolver os
problemas que lhe interessam. Essa teoria é uma conjetura.
 De seguida, importa testes a teoria. Os testes sérios consistem em
tentativas de refutação, e não na procura de confirmações.
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 KARL POPPER E O FALSIFICACIONISMO
Filosofia – 11.º ano
Karl Popper (1902-1994)
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 KARL POPPER E O FALSIFICACIONISMO
 Por conseguinte, para testar a teoria, deduzem-se dela certas
previsões empíricas.
 Se algumas das previsões fracassarem, a teoria fica refutada e será
necessário encontrar uma conjetura melhor.
 Se as previsões se revelarem corretas, isso significa apenas que a
teoria foi corroborada. Uma teoria corroborada é aquela que
sobrevive aos testes, mas o sucesso que teve no passado não
nos permite concluir que ela é verdadeira.
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 Para Popper, a aceitação de uma teoria é sempre provisória; mas, por outro
lado, a rejeição de uma teoria por ser concludente.
 Este autor defende que uma teoria que não é suscetível de refutação não
pode ser considerada científica.
 Todo o teste é uma tentativa de refutar a teoria; neste sentido, a testabilidade
equivale à refutabilidade.
 A descoberta de novos factos, que estão de acordo com a teoria, não a
confirmam mas corroboram. Popper chama corroborada a toda a hipótese
que, sujeita às provas mais exigentes, resiste.
A ciência progride, segundo Karl Popper, mediante o ensaio e o erro,
hipóteses (conjeturas) e refutações. Logo, o método da ciência é o método
das hipóteses, seguidas da tentativa de falseá-las.
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 ATENÇÃO, para Popper:
 Uma teoria falsificável ou refutável é uma teoria que tem
uma propriedade de poder ser sujeita a testes e de ser
verdadeira ou falsa. Uma teoria falsificada ou refutada é uma
teoria que já se provou ser falsa, ou seja, foi sujeita a testes e
não resistiu.
 Verdade e corroboração não são a mesma coisa. Ou seja,
uma teoria que passa nos testes a que foi sujeita encontra-se,
tão somente, corroborada e não se pode afirmar que é
verdadeira.
Filosofia – 11.º ano
2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese
 Para Popper, uma teoria só tem estatuto de científica se for
falsificável, isto é, se puder ser colocada à prova através de um
teste que torne possível a sua refutação (Critério da Demarcação).
Filosofia – 11.º ano
“Um enunciado é científico se, e somente se, for falsificável.”
Karl Popper
Exemplo: Imagine que eu digo que tenho um gnomo
invisível que me ajuda a elaborar respostas durante
os testes e que, por conseguinte, os gnomos existem.
Como posso, segundo Popper, recusar cientificidade
a este enunciado? Usando o critério de
falsificabilidade: não há maneira de demonstrar que
a afirmação é falsa. Se a minha afirmação é
infalsificável, então não é científica.
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
 THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA
CIÊNCIA
Thomas Kuhn, filósofo norte-americano do século
XX, propõe uma conceção radicalmente nova
acerca da ciência e do próprio progresso
científico:
 Rejeita que a ciência progrida por simples
acumulação de conhecimentos e sem conflitos;
 Afirma que a evolução do conhecimento
científico ocorre por solavancos, por abalos
sucessivos, isto é, por meio de revoluções
científicas.
Filosofia – 11.º ano
Thomas Kuhn (1922-1996)
“A
ciência
progride
por
revoluções
científicas”
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
 THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA
Ciência Normal
Período em que um determinado paradigma é aceite por toda uma
comunidade científica.
Paradigma
* Conjunto de princípios, teorias, conceitos e metodologias que orientam a
investigação e a prática científica e são aceites por uma determinada
comunidade de cientistas;
* Conceção do mundo que, pressupondo um modo de ver e de praticar,
engloba todo um conjunto de teorias, conceitos, instrumentos e métodos;
* O que os membros de uma comunidade científica compartilham
(suposições teóricas gerais, leis e técnicas para a explicação dessas leis,
bem como os instrumentos necessários).
Filosofia – 11.º ano
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
 THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA
Comunidade Científica
Cientistas cujas investigações se baseiam em paradigmas partilhados.
Empenham-se em seguir as mesmas regras e critérios de prática científica.
Anomalia
* Problema e/ou dificuldade que o paradigma não consegue resolver;
* Facto que os cientistas não conseguem resolver dentro do paradigma tradicional;
* Falhanços na prática científica normal que, quando em grande número e grau,
põem em causa o paradigma.
Crise
Período em que a acumulação de anomalias é elevada e em que o paradigma
entra em rutura. Pode tornar-se definitivamente séria quando, paralelamente, um
novo paradigma começa a surgir.
Filosofia – 11.º ano
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
 THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA
Ciência Extraordinária
Prática científica que, durante os períodos de crise, se desenvolve à
margem do paradigma dominante.
Revolução Científica
Episódio de um desenvolvimento científico não cumulativo, no qual um
paradigma mais antigo é substituído, total ou parcialmente, por um novo,
com ele incompatível.
Filosofia – 11.º ano
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
 THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA
Todas as crises terminam, segundo Kuhn, de uma de três maneiras:
 A ciência normal acaba por ser capaz de lidar com o problema que gerou a
crise;
 O problema é etiquetado, mas abandonado e deixado para uma geração futura;
 Emerge um novo candidato a paradigma e batalha-se pela sua aceitação.
Filosofia – 11.º ano
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
 THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA
O novo paradigma será muito diferente do antigo (incompatível). Os paradigmas
confrontam-se, possuindo diferentes visões do mundo, e são, segundo Kuhn,
incomensuráveis. Não podem ser comparados objetivamente, de modo a
determinar qual é o melhor ou qual está mais próximo da verdade. No fundo, a
incomensurabilidade dos paradigmas é uma consequência de eles serem
radicalmente diferentes: cada paradigma tem os seus próprios conceitos,
problemas e regras.
Filosofia – 11.º ano
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
Filosofia – 11.º ano
Thomas
Kuhn
» Segundo Thomas Kuhn, o progresso científico dá-se de um
modo descontínuo, mediante saltos qualitativos e mudanças
de paradigma. O surgimento de uma anomalia, que o
paradigma tradicional não consegue solucionar, permitirá
que se dê a rutura, com o paradigma tradicional, e um novo
se instale. Logo, a ciência, para este autor, progride segundo
um processo de três fases: fase normal, fase crítica e fase
revolucionária.
» A comunidade científica resiste à mudança de paradigma;
vai tentando solucionar as sucessivas anomalias que vão
surgindo, de forma a manter o paradigma tradicional. Por
conseguinte, nem todas as anomalias conduzem a uma
crise; a anomalia só é verdadeiramente séria e grave se
resistir a todas as tentativas, empreendidas pela comunidade
científica, de a removerem.
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
THOMAS KUHN E A OBJETIVIDADE CIENTÍFICA
 Os critérios que Kuhn considera para avaliar uma teoria são de dois
tipos:
 Os critérios objetivos são partilhados por toda a comunidade científica
e são os seguintes: exatidão, consistência, alcance, simplicidade e
fecundidade.
 Os critérios subjetivos, dada a natureza humana dos cientistas,
também devem ser considerados, pois, perante uma mesma realidade, a
interpretação e as convicções podem fazer dois cientistas trabalharem
de maneira diversa e adotarem paradigmas diferentes. Pelo facto de a
escolha entre paradigmas estar sujeita a critérios subjetivos relevantes,
não é possível falar em objetividade em ciência.
Filosofia – 11.º ano
3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade
THOMAS KUHN Vs. KARL POPPER
Filosofia – 11.º ano

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

Conhecimento Científico - Kuhn
Conhecimento Científico - KuhnConhecimento Científico - Kuhn
Conhecimento Científico - KuhnJorge Barbosa
 
11º b final
11º b   final11º b   final
11º b finalj_sdias
 
Comparação_Popper_kuhn
Comparação_Popper_kuhn Comparação_Popper_kuhn
Comparação_Popper_kuhn Isabel Moura
 
Conhecimento vulgar e conhecimento cientifico
Conhecimento vulgar e conhecimento cientificoConhecimento vulgar e conhecimento cientifico
Conhecimento vulgar e conhecimento cientificoanabelamatosanjos
 
Sermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixesSermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixesAnaGomes40
 
Objectividade científica e racionalidade científica
Objectividade científica e racionalidade científicaObjectividade científica e racionalidade científica
Objectividade científica e racionalidade científicaAMLDRP
 
Quadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartesQuadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartesIsabel Moura
 
Sermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixesSermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixesvermar2010
 
3_contraexemplos_cvj
3_contraexemplos_cvj3_contraexemplos_cvj
3_contraexemplos_cvjIsabel Moura
 
Filosofia e Conhecimento 1
Filosofia e Conhecimento 1Filosofia e Conhecimento 1
Filosofia e Conhecimento 1Jorge Barbosa
 
Teoria racionalista de Descartes
Teoria racionalista de DescartesTeoria racionalista de Descartes
Teoria racionalista de DescartesElisabete Silva
 
conhecimento_crença_verdadeira
conhecimento_crença_verdadeiraconhecimento_crença_verdadeira
conhecimento_crença_verdadeiraIsabel Moura
 
Objeções_falsificacionismo
Objeções_falsificacionismoObjeções_falsificacionismo
Objeções_falsificacionismoIsabel Moura
 
Teoria da justiça rawls
Teoria da justiça rawlsTeoria da justiça rawls
Teoria da justiça rawlsFilazambuja
 
Resumos filosofia 11
Resumos filosofia 11Resumos filosofia 11
Resumos filosofia 11Dylan Bonnet
 

Was ist angesagt? (20)

Conhecimento Científico - Kuhn
Conhecimento Científico - KuhnConhecimento Científico - Kuhn
Conhecimento Científico - Kuhn
 
A incomensurabilidade dos paradigmas
A incomensurabilidade dos paradigmasA incomensurabilidade dos paradigmas
A incomensurabilidade dos paradigmas
 
11º b final
11º b   final11º b   final
11º b final
 
Comparação_Popper_kuhn
Comparação_Popper_kuhn Comparação_Popper_kuhn
Comparação_Popper_kuhn
 
Comparação descartes hume
Comparação descartes   humeComparação descartes   hume
Comparação descartes hume
 
Conhecimento vulgar e conhecimento cientifico
Conhecimento vulgar e conhecimento cientificoConhecimento vulgar e conhecimento cientifico
Conhecimento vulgar e conhecimento cientifico
 
Sermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixesSermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixes
 
Objectividade científica e racionalidade científica
Objectividade científica e racionalidade científicaObjectividade científica e racionalidade científica
Objectividade científica e racionalidade científica
 
Popper – o problema da demarcação
Popper – o problema da demarcaçãoPopper – o problema da demarcação
Popper – o problema da demarcação
 
Tipos de conhecimento
Tipos de conhecimentoTipos de conhecimento
Tipos de conhecimento
 
Quadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartesQuadro_hume vs descartes
Quadro_hume vs descartes
 
Sermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixesSermão de santo antónio aos peixes
Sermão de santo antónio aos peixes
 
3_contraexemplos_cvj
3_contraexemplos_cvj3_contraexemplos_cvj
3_contraexemplos_cvj
 
Filosofia e Conhecimento 1
Filosofia e Conhecimento 1Filosofia e Conhecimento 1
Filosofia e Conhecimento 1
 
Teoria racionalista de Descartes
Teoria racionalista de DescartesTeoria racionalista de Descartes
Teoria racionalista de Descartes
 
conhecimento_crença_verdadeira
conhecimento_crença_verdadeiraconhecimento_crença_verdadeira
conhecimento_crença_verdadeira
 
Objeções_falsificacionismo
Objeções_falsificacionismoObjeções_falsificacionismo
Objeções_falsificacionismo
 
Teoria da justiça rawls
Teoria da justiça rawlsTeoria da justiça rawls
Teoria da justiça rawls
 
Método indutivo - Filosofia
Método indutivo - FilosofiaMétodo indutivo - Filosofia
Método indutivo - Filosofia
 
Resumos filosofia 11
Resumos filosofia 11Resumos filosofia 11
Resumos filosofia 11
 

Ähnlich wie o-estatuto-do-conhecimento-cientifico-filosofia-da-ciencia_compress.pdf

Filosofia da ciência 1º ano do ensino medio
Filosofia da ciência 1º ano do ensino medioFilosofia da ciência 1º ano do ensino medio
Filosofia da ciência 1º ano do ensino medioThiagoDionsioPedra
 
Apostila do projeto integrador i
Apostila do projeto integrador iApostila do projeto integrador i
Apostila do projeto integrador iElizabete Dias
 
perspectivas epidemiologicas tradicionais
perspectivas epidemiologicas tradicionaisperspectivas epidemiologicas tradicionais
perspectivas epidemiologicas tradicionaisthemis dovera
 
Apresentação e Aula Introdutória.pptx
Apresentação e Aula Introdutória.pptxApresentação e Aula Introdutória.pptx
Apresentação e Aula Introdutória.pptxLuiz Eduardo
 
Texto ciencia e conhecimento
Texto ciencia e conhecimentoTexto ciencia e conhecimento
Texto ciencia e conhecimentoDarkArkangel
 
MIC-Métodos-2021.pptx
MIC-Métodos-2021.pptxMIC-Métodos-2021.pptx
MIC-Métodos-2021.pptxVenncioCorreia
 
O conhecimento do conhecimento científico(Morin)
O conhecimento do conhecimento científico(Morin)O conhecimento do conhecimento científico(Morin)
O conhecimento do conhecimento científico(Morin)Francione Brito
 
Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01
Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01
Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01Alberto Nhatirre
 
Curso de Epidtrmologia 1/6
Curso de Epidtrmologia 1/6Curso de Epidtrmologia 1/6
Curso de Epidtrmologia 1/6Luiz Miranda-Sá
 
Aula 1.introdução a conceitos
Aula 1.introdução a conceitosAula 1.introdução a conceitos
Aula 1.introdução a conceitosBianca Chersoni
 
Filosofia 2º bimestre -1ª série - o conhecimento
Filosofia   2º bimestre -1ª série - o conhecimentoFilosofia   2º bimestre -1ª série - o conhecimento
Filosofia 2º bimestre -1ª série - o conhecimentomtolentino1507
 
Ciência e conhecimento científico.pdf
Ciência e conhecimento científico.pdfCiência e conhecimento científico.pdf
Ciência e conhecimento científico.pdfAkilesPudim
 
DIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdf
DIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdfDIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdf
DIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdfAteliAryPersonalizad
 
Material impresso filosofia 2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe Assunção
Material impresso filosofia   2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe AssunçãoMaterial impresso filosofia   2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe Assunção
Material impresso filosofia 2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe AssunçãoProf. Noe Assunção
 
Diferentes modos de conhecer
Diferentes modos de conhecerDiferentes modos de conhecer
Diferentes modos de conhecerJulhinha Camara
 

Ähnlich wie o-estatuto-do-conhecimento-cientifico-filosofia-da-ciencia_compress.pdf (20)

Resumo
ResumoResumo
Resumo
 
Aula 01 e 02
Aula 01 e 02Aula 01 e 02
Aula 01 e 02
 
Filosofia da ciência 1º ano do ensino medio
Filosofia da ciência 1º ano do ensino medioFilosofia da ciência 1º ano do ensino medio
Filosofia da ciência 1º ano do ensino medio
 
Apostila do projeto integrador i
Apostila do projeto integrador iApostila do projeto integrador i
Apostila do projeto integrador i
 
perspectivas epidemiologicas tradicionais
perspectivas epidemiologicas tradicionaisperspectivas epidemiologicas tradicionais
perspectivas epidemiologicas tradicionais
 
Apresentação e Aula Introdutória.pptx
Apresentação e Aula Introdutória.pptxApresentação e Aula Introdutória.pptx
Apresentação e Aula Introdutória.pptx
 
Texto ciencia e conhecimento
Texto ciencia e conhecimentoTexto ciencia e conhecimento
Texto ciencia e conhecimento
 
MIC-Métodos-2021.pptx
MIC-Métodos-2021.pptxMIC-Métodos-2021.pptx
MIC-Métodos-2021.pptx
 
O conhecimento do conhecimento científico(Morin)
O conhecimento do conhecimento científico(Morin)O conhecimento do conhecimento científico(Morin)
O conhecimento do conhecimento científico(Morin)
 
Verificab..
Verificab..Verificab..
Verificab..
 
Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01
Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01
Alberto antonio nhatirre, turma r9, numero 01
 
Aula 1
Aula 1Aula 1
Aula 1
 
Curso de Epidtrmologia 1/6
Curso de Epidtrmologia 1/6Curso de Epidtrmologia 1/6
Curso de Epidtrmologia 1/6
 
Aula 1.introdução a conceitos
Aula 1.introdução a conceitosAula 1.introdução a conceitos
Aula 1.introdução a conceitos
 
Filosofia 2º bimestre -1ª série - o conhecimento
Filosofia   2º bimestre -1ª série - o conhecimentoFilosofia   2º bimestre -1ª série - o conhecimento
Filosofia 2º bimestre -1ª série - o conhecimento
 
Ciência e conhecimento científico.pdf
Ciência e conhecimento científico.pdfCiência e conhecimento científico.pdf
Ciência e conhecimento científico.pdf
 
DIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdf
DIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdfDIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdf
DIFERENTES FORMAS CONHECIMENTO CIENTIFICO.pdf
 
Material impresso filosofia 2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe Assunção
Material impresso filosofia   2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe AssunçãoMaterial impresso filosofia   2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe Assunção
Material impresso filosofia 2 ano - ensino regular - Prof Ms. Noe Assunção
 
A atitude científica
A atitude científicaA atitude científica
A atitude científica
 
Diferentes modos de conhecer
Diferentes modos de conhecerDiferentes modos de conhecer
Diferentes modos de conhecer
 

o-estatuto-do-conhecimento-cientifico-filosofia-da-ciencia_compress.pdf

  • 1. FILOSOFIA DA CIÊNCIA A Racionalidade Científico- Tecnológica 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico 2. Ciência e Construção – Validade e Verificabilidade das Hipóteses 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade “O maior inimigo do conhecimento não é a ignorância, mas sim a ilusão da verdade” – Stephen Hawking
  • 2. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Conhecimento Vulgar ou Senso Comum O conhecimento vulgar ou senso comum resulta das experiências e vivências quotidianas – é subjetivo, concreto e empírico Não procura explicar a realidade, mas sim enquadrá-la num todo social coerente e estável É formulado numa linguagem corrente, originando ambiguidades Limita-se a constatar o que existe, sem se preocupar com explicações É um conhecimento prático, superficial, espontâneo, acrítico e assistemático O conhecimento vulgar ou senso comum está ligado à apreensão imediata da realidade. É, por essa mesma razão, um conhecimento baseado na experiência vivida, sem demasiadas preocupações com o rigor, mas, ainda assim, ferramenta fundamental do saber viver, pois é a partir dele que orientamos a nossa vida quotidiana.
  • 3. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Acumula conhecimentos dispersos sem exigência de rigor e sistematicidade É particular, marcado pela subjetividade e pela ausência de método É superficial, pois diz como as coisas são (ou parecem ser), sem se preocupar com justificação ou explicação É acrítico, sendo pouco atreito ao questionamento e à revisão Comunica através de uma linguagem natural, sem grandes preocupações com a eliminação da ambiguidade Conhecimento Vulgar (senso comum)
  • 4. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Conhecimento Vulgar (senso comum) “Senso comum - conjunto mais alargado de crenças que uma comunidade tem por verdadeiras e partilha durante um certo período de tempo. O senso comum é um "saber" que resulta da experiência de vida individual e coletiva. Os hábitos e costumes, as tradições e rituais, os "ditos" e provérbios, as opiniões populares, etc., são habitualmente referidos como manifestações do senso comum. A sua aprendizagem é uma condição necessária para a socialização de cada membro da comunidade, funcionando como um mecanismo regulador do seu pensamento e da sua ação. Do ponto de vista da ciência e da filosofia, os processos de justificação das crenças de senso comum afiguram-se muitíssimo superficiais e falíveis, e é frequente tais crenças resistirem mal a um exame crítico mais minucioso, pelo que a sua ampla aceitação não é uma garantia de que sejam verdadeiras”. António Costa, Dicionário Escolar de Filosofia
  • 5. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Conhecimento Científico O conhecimento científico é metódico, objetivo e sistemático Expressa-se numa linguagem específica, mais técnica e exata, o que evita a ambiguidade É crítico e revisível Descreve e explica fenómenos, o que lhe garante capacidade preditiva É experimental e/ou possui métodos formais de prova Ao conhecimento científico importam, sobretudo, os aspetos mensuráveis e quantificáveis da realidade: quantos ossos tem o esqueleto humano? Qual a velocidade da luz? Como se transmitem as características biológicas de pais para filhos? Portanto, partindo de hipóteses explicativas e estabelecendo relações de causalidade entre os fenómenos observados, o cientista pretende prever a ocorrência de novos fenómenos.
  • 6. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Formula leis e teorias fundadas na experimentação ou em meios formais de prova. É rigoroso e sistemático É universal e aspira à objetividade, apoiando-se num método Tem um poder explicativo que ultrapassa, em larga medida, a superficialidade das aparências Sujeita constantemente as suas teorias ao escrutínio crítico e à revisão Utiliza uma linguagem técnica, no sentido de evitar ambiguidades Conhecimento Científico
  • 7. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Conhecimento Científico “A ciência não é apenas uma coleção de leis, um catálogo de factos não relacionados. É uma criação do espírito humano, com ideias e conceitos livremente inventados. As teorias físicas experimentam traçar um quadro da realidade e estabelecer liames com o nosso mundo de impressões. (…) Ulteriores desenvolvimentos destruíram os velhos conceitos e criaram novos. (…) com a ajuda das teorias físicas, experimentamos encontrar caminho através do nevoeiro dos factos observados, de modo a ordenar e compreender o mundo das nossas impressões sensoriais. Queremos que os factos observados decorram logicamente do nosso conceito de realidade. Sem a fé na possibilidade de apreender a realidade por meio das nossas construções teóricas, sem a fé na harmonia do nosso mundo, impossível a ciência. Esta fé é, e permanecerá sempre, o motivo fundamental de todas as criações científicas. Através de todos os nossos esforços e em cada luta entre as ideias novas e velhas, percebemos o eterno anseio pela compreensão, a inabalável fé na harmonia do mundo, continuamente fortificada pelos obstáculos que cada vez mais se erguem ante a nossa compreensão.” Einstein e Infeld, A Evolução da Física
  • 8. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico Filosofia – 11.º ano Serão o conhecimento vulgar e o conhecimento científico opostos? » O conhecimento científico e o conhecimento vulgar são, em primeiro lugar, formas diferentes de conhecer, que respondem a objetivos claramente distintos, mas, de alguma forma, complementares, não se podendo, no entanto, substituir um ao outro. » O conhecimento vulgar, à semelhança do que acontece com o conhecimento científico, vai-se alterando ao longo dos tempos, ou seja, muitos dos conhecimentos que outrora foram científicos são hoje de senso comum (ex.: saber que a Terra está em movimento).
  • 9. 1. Conhecimento Vulgar (senso comum) e Conhecimento Científico  O conhecimento vulgar (senso comum) e o conhecimento científico são distintos. O facto de o segundo assentar em pressupostos (experimentação, por exemplo), que faltam ao primeiro estabelece uma relação que é, em muitos aspetos, de oposição e rutura. Todavia, existe também uma certa continuidade e complementaridade entre estas duas formas de conhecimento. Filosofia – 11.º ano
  • 10. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  Uma das características diferenciadoras do conhecimento científico é o seu caráter metódico. Perguntar pelas metodologias científicas é colocar a questão de saber como se estabelecem as verdades (ou leis) em ciência. Todavia, não há um método científico único, mas vários:  Método Indutivo  Método Hipotético-Dedutivo  Método Experimental Filosofia – 11.º ano
  • 11. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  MÉTODO INDUTIVO  Embora remonte à Antiguidade, a primeira sistematização de um método para fazer ciência surge na Modernidade, com o filósofo inglês Francis Bacon.  Bacon sustentou que o conhecimento científico é adquirido e confirmado por um processo de indução.  O autor fundamenta o conhecimento humano na base de uma metodologia sistemática de indagação empírica assente na observação, experimentação e indução. Filosofia – 11.º ano
  • 12. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  O método indutivo, na perspetiva de Francis Bacon, parte do pressuposto de que a ciência tem o objetivo de estabelecer leis. Em função deste mesmo objetivo, o cientista deve observar os fenómenos e realizar uma enumeração exaustiva das suas manifestações. Os resultados que daqui emergem são, depois, sujeitos a testes experimentais. Filosofia – 11.º ano Por exemplo, observar muitos cisnes brancos confirmaria: - A hipótese de que todos os cisnes são brancos (generalização) - A hipótese de que o próximo cisne a ser observado será branco (previsão)
  • 13. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  No fundo, é possível sintetizar o método indutivo, defendido por Bacon, do seguinte modo: Filosofia – 11.º ano . • Observação dos fenómenos a investigar .. • Descoberta de relações entre os fenómenos, a partir da análise e interpretação dos dados observados … • Generalizaçã o dessas relações
  • 14. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  MÉTODO HIPOTÉTICO-DEDUTIVO Astrónomo, matemático e físico italiano, Galileu Galilei combinou a observação empírica com a dedução matemática, sendo considerado um dos principais defensores do método hipotético-dedutivo. Filosofia – 11.º ano Galileu Galilei ficou mundialmente conhecido pela sua defesa do Heliocentrismo e pelas inovações técnicas que introduziu
  • 15. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  Etapas do Método Hipotético-Dedutivo: Filosofia – 11.º ano . Formula-se uma hipótese ou teoria geral, como por exemplo: “Todos os planetas têm órbitas elípticas.” .. Deduz-se dela uma afirmação particular, como por exemplo: “Dada a informação que Mercúrio é um planeta, podemos deduzir que a sua órbita é elíptica.” .. A afirmação é testada por observação ou experimentação. Se o resultado for negativo, a hipótese geral tem de ser abandonada.
  • 16. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  No fundo, Galileu adota uma postura verificacionista: confronta as hipóteses com os factos e verifica a sua verdade  Quando, no teste experimental, a hipótese se confirma, o enunciado transforma-se em lei universal  Quando, porém, o resultado é negativo, a hipótese terá de ser abandonada (ou reformulada) O método Hipotético-Dedutivo pressupõe, portanto, uma hipótese como ponto de partida, a partir da qual se deduzem certas consequências, que depois são testadas (para verificar a hipótese) Filosofia – 11.º ano
  • 17. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  MÉTODO EXPERIMENTAL (ou método científico simples) O método experimental começa pelas observações, a partir das quais se constroem hipóteses ou teoria, que são explicações para os fenómenos observados. A partir delas, deduzem-se as suas consequências que, se confirmadas pela experimentação, produzem uma generalização ou um enunciado universal que permitirá fazer previsões precisas, a lei. Se a experimentação não confirmar a hipótese, esta é abandonada e tem de se construir uma outra que passará pelo mesmo processo. Filosofia – 11.º ano Observação Hipótese Deduçã o Experimentação LEI
  • 18. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  Algumas críticas ao método experimental:  A observação não é o ponto de partida da ciência  A observação nunca é completamente neutra e objetiva  A observação é seletiva  Problema da indução (não é porque observamos muitos casos “iguais” que esteja garantido que “todos são iguais”). Apesar dos indiscutíveis benefícios do raciocínio indutivo - permite, por exemplo, descobrir regularidades na natureza e prever resultados - as suas conclusões não são absolutamente fidedignas, pois uma hipótese, enquanto enunciado universal, não pode ser justificada por casos particulares Filosofia – 11.º ano
  • 19. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  KARL POPPER E O FALSIFICACIONISMO  Popper defende a visão falsificacionista do método científico, segundo a qual o método da ciência é o das conjeturas e refutações.  O ponto de partida da investigação científica é a colocação de problemas. Depois, o cientista propõe uma teoria para resolver os problemas que lhe interessam. Essa teoria é uma conjetura.  De seguida, importa testes a teoria. Os testes sérios consistem em tentativas de refutação, e não na procura de confirmações. Filosofia – 11.º ano
  • 20. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  KARL POPPER E O FALSIFICACIONISMO Filosofia – 11.º ano Karl Popper (1902-1994)
  • 21. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  KARL POPPER E O FALSIFICACIONISMO  Por conseguinte, para testar a teoria, deduzem-se dela certas previsões empíricas.  Se algumas das previsões fracassarem, a teoria fica refutada e será necessário encontrar uma conjetura melhor.  Se as previsões se revelarem corretas, isso significa apenas que a teoria foi corroborada. Uma teoria corroborada é aquela que sobrevive aos testes, mas o sucesso que teve no passado não nos permite concluir que ela é verdadeira. Filosofia – 11.º ano
  • 22. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese Filosofia – 11.º ano
  • 23. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  Para Popper, a aceitação de uma teoria é sempre provisória; mas, por outro lado, a rejeição de uma teoria por ser concludente.  Este autor defende que uma teoria que não é suscetível de refutação não pode ser considerada científica.  Todo o teste é uma tentativa de refutar a teoria; neste sentido, a testabilidade equivale à refutabilidade.  A descoberta de novos factos, que estão de acordo com a teoria, não a confirmam mas corroboram. Popper chama corroborada a toda a hipótese que, sujeita às provas mais exigentes, resiste. A ciência progride, segundo Karl Popper, mediante o ensaio e o erro, hipóteses (conjeturas) e refutações. Logo, o método da ciência é o método das hipóteses, seguidas da tentativa de falseá-las. Filosofia – 11.º ano
  • 24. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  ATENÇÃO, para Popper:  Uma teoria falsificável ou refutável é uma teoria que tem uma propriedade de poder ser sujeita a testes e de ser verdadeira ou falsa. Uma teoria falsificada ou refutada é uma teoria que já se provou ser falsa, ou seja, foi sujeita a testes e não resistiu.  Verdade e corroboração não são a mesma coisa. Ou seja, uma teoria que passa nos testes a que foi sujeita encontra-se, tão somente, corroborada e não se pode afirmar que é verdadeira. Filosofia – 11.º ano
  • 25. 2. Ciência e Construção - Validade e Verificabilidade das Hipótese  Para Popper, uma teoria só tem estatuto de científica se for falsificável, isto é, se puder ser colocada à prova através de um teste que torne possível a sua refutação (Critério da Demarcação). Filosofia – 11.º ano “Um enunciado é científico se, e somente se, for falsificável.” Karl Popper Exemplo: Imagine que eu digo que tenho um gnomo invisível que me ajuda a elaborar respostas durante os testes e que, por conseguinte, os gnomos existem. Como posso, segundo Popper, recusar cientificidade a este enunciado? Usando o critério de falsificabilidade: não há maneira de demonstrar que a afirmação é falsa. Se a minha afirmação é infalsificável, então não é científica.
  • 26. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade  THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA Thomas Kuhn, filósofo norte-americano do século XX, propõe uma conceção radicalmente nova acerca da ciência e do próprio progresso científico:  Rejeita que a ciência progrida por simples acumulação de conhecimentos e sem conflitos;  Afirma que a evolução do conhecimento científico ocorre por solavancos, por abalos sucessivos, isto é, por meio de revoluções científicas. Filosofia – 11.º ano Thomas Kuhn (1922-1996) “A ciência progride por revoluções científicas”
  • 27. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade  THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA Ciência Normal Período em que um determinado paradigma é aceite por toda uma comunidade científica. Paradigma * Conjunto de princípios, teorias, conceitos e metodologias que orientam a investigação e a prática científica e são aceites por uma determinada comunidade de cientistas; * Conceção do mundo que, pressupondo um modo de ver e de praticar, engloba todo um conjunto de teorias, conceitos, instrumentos e métodos; * O que os membros de uma comunidade científica compartilham (suposições teóricas gerais, leis e técnicas para a explicação dessas leis, bem como os instrumentos necessários). Filosofia – 11.º ano
  • 28. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade  THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA Comunidade Científica Cientistas cujas investigações se baseiam em paradigmas partilhados. Empenham-se em seguir as mesmas regras e critérios de prática científica. Anomalia * Problema e/ou dificuldade que o paradigma não consegue resolver; * Facto que os cientistas não conseguem resolver dentro do paradigma tradicional; * Falhanços na prática científica normal que, quando em grande número e grau, põem em causa o paradigma. Crise Período em que a acumulação de anomalias é elevada e em que o paradigma entra em rutura. Pode tornar-se definitivamente séria quando, paralelamente, um novo paradigma começa a surgir. Filosofia – 11.º ano
  • 29. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade  THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA Ciência Extraordinária Prática científica que, durante os períodos de crise, se desenvolve à margem do paradigma dominante. Revolução Científica Episódio de um desenvolvimento científico não cumulativo, no qual um paradigma mais antigo é substituído, total ou parcialmente, por um novo, com ele incompatível. Filosofia – 11.º ano
  • 30. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade  THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA Todas as crises terminam, segundo Kuhn, de uma de três maneiras:  A ciência normal acaba por ser capaz de lidar com o problema que gerou a crise;  O problema é etiquetado, mas abandonado e deixado para uma geração futura;  Emerge um novo candidato a paradigma e batalha-se pela sua aceitação. Filosofia – 11.º ano
  • 31. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade  THOMAS KUHN E O PROGRESSO DA CIÊNCIA O novo paradigma será muito diferente do antigo (incompatível). Os paradigmas confrontam-se, possuindo diferentes visões do mundo, e são, segundo Kuhn, incomensuráveis. Não podem ser comparados objetivamente, de modo a determinar qual é o melhor ou qual está mais próximo da verdade. No fundo, a incomensurabilidade dos paradigmas é uma consequência de eles serem radicalmente diferentes: cada paradigma tem os seus próprios conceitos, problemas e regras. Filosofia – 11.º ano
  • 32. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade Filosofia – 11.º ano Thomas Kuhn » Segundo Thomas Kuhn, o progresso científico dá-se de um modo descontínuo, mediante saltos qualitativos e mudanças de paradigma. O surgimento de uma anomalia, que o paradigma tradicional não consegue solucionar, permitirá que se dê a rutura, com o paradigma tradicional, e um novo se instale. Logo, a ciência, para este autor, progride segundo um processo de três fases: fase normal, fase crítica e fase revolucionária. » A comunidade científica resiste à mudança de paradigma; vai tentando solucionar as sucessivas anomalias que vão surgindo, de forma a manter o paradigma tradicional. Por conseguinte, nem todas as anomalias conduzem a uma crise; a anomalia só é verdadeiramente séria e grave se resistir a todas as tentativas, empreendidas pela comunidade científica, de a removerem.
  • 33. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade THOMAS KUHN E A OBJETIVIDADE CIENTÍFICA  Os critérios que Kuhn considera para avaliar uma teoria são de dois tipos:  Os critérios objetivos são partilhados por toda a comunidade científica e são os seguintes: exatidão, consistência, alcance, simplicidade e fecundidade.  Os critérios subjetivos, dada a natureza humana dos cientistas, também devem ser considerados, pois, perante uma mesma realidade, a interpretação e as convicções podem fazer dois cientistas trabalharem de maneira diversa e adotarem paradigmas diferentes. Pelo facto de a escolha entre paradigmas estar sujeita a critérios subjetivos relevantes, não é possível falar em objetividade em ciência. Filosofia – 11.º ano
  • 34. 3. Racionalidade Científica e a Questão da Objetividade THOMAS KUHN Vs. KARL POPPER Filosofia – 11.º ano