2. seus passeios concentrados, aos balcões de Palermo. […] Desenhe-se o mapa das
cafetarias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da ‘ideia de Europa’». Num
ambiente onde os cigarros já foram mais livres, os cafés europeus são o espaço do
poeta, do flâneur, do revolucionário. Das madrugadas de Praga ou dos finais de tarde
em Paris. Dos debates, das disputas intelectuais, das conspirações. De Lenine, que se
encontrava com Trotsky num café de Genebra para jogarem xadrez enquanto 1917 não
chegava. Tudo isto é Europa, uma latitude simbólica onde não se concebe integralmente
o bar americano ou os pubs ingleses e irlandeses.
O livro tem prefácio de Durão Barroso, um homem que dificilmente poderia
personificar menos o que tudo isto representa. Mas enquanto tivermos os nossos cafés,
poderemos estar seguros de um continente que contém em si o espírito de uma
civilização. E do seu inverso. O que até talvez seja dizer o mesmo sobre duas faces de
uma mesma possibilidade. Porque no tempo histórico recente, «com a queda do
marxismo na tirania bárbara e na nulidade económica, perdeu-se um grande sonho de
— como Trotsky proclamou — o homem comum seguir as pisadas de Aristóteles e
Goethe. Liberto de uma ideologia falida, o sonho pode, e deve, ser sonhado novamente.
É porventura apenas na Europa que as fundações necessárias de literacia e o sentido
da vulnerabilidade trágica da condition humaine poderiam constituir-se como base. É
entre os filhos frequentemente cansados, divididos e confundidos de Atenas e de
Jerusalém que poderíamos regressar à convicção de que ‘a vida não reflectida’ não é
efectivamente digna de ser vivida». Assim acaba Steiner o seu último axioma. Um
excelente ponto de partida.