Dizer o direito questão interessante sobre latrocínio que pode ser cobrada em uma prova prática ou de sentença
1. Apelação Cível n. 2014.060371-3, de Curitibanos
Relator: Des. Raulino Jacó Brüning
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DEÂ INVESTIGAÇÃO DE
PATERNIDADEÂ CUMULADA COM ALIMENTOS.
RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO E FIXAÇÃO DE
ALIMENTOS NO VALOR DEÂ 20% (VINTE POR CENTO) DOS
RENDIMENTOS DO GENITOR. RECURSO DA ALIMENTANDA
VISANDO À MAJORAÇÃO DO QUANTUM. 1. PEDIDO DE
JUSTIÇA GRATUITA DEFERIDO NO PRIMEIRO GRAU. FALTA
DE INTERESSE RECURSAL. 2. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DA
VERBA ALIMENTAR. OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO
NECESSIDADE E POSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 1.694,
§ 1º, DO CÓDIGO CIVIL. 2.1 NECESSIDADES PRESUMIDAS
DA INFANTE QUE CONTA UM ANO E SEIS MESES DE IDADE.
2.2 CONDIÇÃO FINANCEIRA DO PROVEDOR NÃO
DEMONSTRADA. SITUAÇÃO QUE NÃO PODE OBSTAR O
DIREITO ALIMENTAR. READEQUAÇÃO DO
PENSIONAMENTO. ALTERAÇÃO DO INDEXADOR. 3.
RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO,
PARCIALMENTE PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2014.060371-3, da Comarca de Curitibanos (Vara da Família Órfãos, Sucessões Inf e
Juventude), em que é apelante I. A. do A. R., representada por sua genitora L. A. do
A., e apelado F. R. J.:
A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime,
conhecer em parte do recurso e, nesta extensão, dar-lhe parcial provimento a fim de
readequar o encargo alimentar, para que incida sobre o salário mínimo, no percentual
de 30% (trinta por cento). Custas legais.
O julgamento, realizado no dia 26 de fevereiro de 2015, foi presidido por
este relator e dele participaram os Desembargadores Sebastião César Evangelista e
Domingos Paludo.
Funcionou como representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra.
Hercília Regina Lemke.
Florianópolis, 26 de fevereiro de 2015.
Raulino Jacó Brüning
PRESIDENTE E RELATOR
2. RELATÓRIO
Adoto o relatório da r. sentença de fls. 88/92, da lavra da Magistrada
Taynara Goessel, por refletir fielmente o contido no presente feito, in verbis:
L. A. do A. ajuizou a presente ação de investigação de paternidade cumulada
com alimentos gravídicos contra F. R. J., ambos qualificados nos autos.
Alegou, em síntese, que namorou com o requerido por um período de 2 (dois)
anos, interregno no qual engravidou, estando atualmente no 6º (sexto) mês de
gravidez.
Aduziu que o réu rompeu o relacionamento quando soube da gravidez, não lhe
ajudando economicamente e nem afetivamente.
Asseverou que o requerido exerce a função de chapeador na Chapeação
Bevilaqua, percebendo rendimentos mensais de R$ 2.000,00 (dois mil reais),
possuindo condições de auxiliar a autora durante a gestação e de prestar a alimentos
ao filho após o nascimento.
Ao final, pugnou pela procedência do pedido, com o reconhecimento da
paternidade e a fixação de alimentos gravídicos, devendo ser convertidos em
alimentos definitivos ao filho após o nascimento.
Os alimentos gravídicos foram fixados às fls. 22/23.
Designada audiência, a conciliação restou inexitosa (fl. 33).
No prazo de resposta, o requerido apresentou contestação, sustentando que
possui dúvidas acerca da paternidade, uma vez que a requerente não relacionava-se
exclusivamente com o requerido.
Disse ser imprescindível a realização do exame de DNA, bem como que os
alimentos devem ser fixados com moderação, já que possui outra família e seus
rendimentos são em média 1 (um) salário mínimo.
Por fim, pugnou pela improcedência do pedido, no caso de não ser o pai da
autora ou, alternativamente, sejam os alimentos arbitrados em 15% do salário
mínimo.
Houve réplica (fls. 47/49).
Com o nascimento da infante, foi designada audiência, ocasião em que foi
colhido o material genética para exame de DNA.
O exame de DNA aportou aos autos às fls. 67/69, manifestando-se a autora
acerca deste.
Designada audiência, novamente não foi obtida a conciliação, oportunidade em
que o requerido apresentou comprovante de rendimentos, manifestando-se a parte
autora em seguida.
A representante do Ministério Público opinou pela procedência do pedido,
mantendo-se os alimentos no importe fixado no despacho inicial.
Vieram-me os autos conclusos.
Acresço que a Togada a quo julgou procedente o pedido, nos seguintes
termos:
À vista do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, para
declarar o réu progenitor de I. A. do A., acrescentando, por consequência, ao nome
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3. desta, o sobrenome do demandado, passando o menor a se chamar I. A. do A. R..
Condeno o réu, ainda, a pagar mensalmente a quantia correspondente 20% dos
rendimentos do requerido, abstraindo-se os descontos obrigatórios, à título de
pensão alimentícia, com incidência retroativa à citação. A pensão terá incidência
também sobre férias e décimo terceiro salário. O valor da pensão alimentícia deve
ser descontada em folha de pagamento ou, quando impossível tal providência, será
depositada até o décimo dia do mês subsequente ao vencido em conta corrente
informada pela autora. Face ao princípio da sucumbência, condeno o réu ao
pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$
1.000,00, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC. Contudo, sendo este beneficiário da
justiça gratuita, para exigir-se o pagamento de tais ônus, haverá necessidade de se
demonstrar a sua capacidade econômica, segundo prevê o artigo 12, da Lei
1.060/50. Independentemente do trânsito em julgado, haja vista que houve
reconhecimento na audiência de fl. 82, expeça-se ofício ao Cartório de Registro Civil,
ex vi do disposto no art. 29, § 1º, "b", da Lei n. 6.015/73, a fim de que seja averbada
esta sentença, devendo ser incluído na certidão de nascimento da autora o nome do
réu F. R. J., como pai, e de F. R. e E. R., como avós paternos, passando a autora
chamar-se, então, I. A. do A. R.. P.R.I.
Inconformada, I. A. do A. R. recorre, sustentando que: (a) o alimentante
possui condição financeira melhor que aquela aduzida nos autos; e (b) o valor
equivalente a 20% (vinte por cento) dos rendimentos do genitor é irrisório, não
atendendo às necessidades básicas da menor. Requer a reforma da sentença, a fim
de que sejam majorados os alimentos para quantia de 60% (sessenta por cento) do
salário mínimo ou, no mínimo, 30% (trinta por cento) (fls. 95/100).
A parte apelada deixou de apresentar contrarrazões (fl. 110).
Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo conhecimento e
parcial provimento do recurso para "fixar os alimentos devidos pelo apelado em favor
da filha menor no percentual de 35,62% (trinta e cinco vírgula sessenta e dois por
cento) de um salário mínimo, incidentes, ainda, sobre a gratificação natalina e terço
constitucional de férias." (fls. 116/119).
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4. VOTO
O recurso deve ser conhecido, porquanto tempestivo (fl. 103), ficando
dispensado o preparo em razão da gratuidade judiciária deferida em primeiro grau (fl.
24).
Da justiça gratuita
Pugna a apelante pelo deferimento do benefício da justiça gratuita,
porém, o pedido não deve ser conhecido.
A Magistrada a quo deferiu a benesse almejada à fl. 24, razão pela qual,
nos termos do artigo 9º da Lei n. 1.060/1950, tal benefício perdura até decisão final do
litígio, em todas as instâncias.
Diante do aduzido, não se faz presente o interesse recursal do
recorrente em relação a este pleito.
Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart asseveram:
A fim de que possa o interessado socorrer-se do recurso, é fundamental que
possa antever algum interesse na utilização deste caminho. À semelhança do que
acontece com o interesse de agir (condição da ação), que engloba a adequação da
via eleita (traduzida, em termos de recursos, pela noção de cabimento, como visto), é
necessário que o interessado possa vislumbrar alguma utilidade na veiculação do
recurso, utilidade esta que somente possa ser obtida através da via recursal
(necessidade). (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do
processo de conhecimento. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 525).
Sobre o tema, colhe-se desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO DE
ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING) - TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDA
- RECURSO DO AUTOR. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA - FALTA DE
INTERESSE RECURSAL, PORQUANTO JÁ DEFERIDO PELA DECISÃO
RECORRIDA. Constitui-se o interesse recursal pressuposto geral de admissibilidade
de todo recurso, de forma que, para requerer a reforma da sentença, deve a
insurgente demonstrar o prejuízo advindo da manifestação judicial atacada [...]
(TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.089363-9, de São José, rel. Des. Robson Luz
Varella, j. 25-06-2013) (Grifo acrescido).
Logo, não se conhece do apelo neste ponto.
Dos alimentos
A apelante recorre da sentença que fixou o encargo alimentar em
quantia equivalente a 20% (vinte por cento) dos rendimentos do genitor, ao
argumento de que irrisório o importe, mormente porque o alimentante possui
capacidade financeira melhor que aquela aduzida nos autos.
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5. Com efeito, razão lhe assiste, senão vejamos.
Os alimentos constituem modalidade de assistência imposta por lei, e
representam "as prestações devidas, feitas para que aquele que as recebe possa
subsistir, isto é, manter sua existência, realizar o direito à vida, tanto física (sustento
do corpo) como intelectual e moral (cultivo e educação do espírito, do ser racional)"
(CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012,
p. 16). Trata-se, portanto, das prestações com as quais podem ser satisfeitas as
necessidades vitais daqueles que não podem provê-las por si.
Em relação aos filhos menores, incumbe a ambos os genitores
providenciar-lhes a subsistência material e moral, uma vez que a obrigação de
fornecer alimentos é um dos deveres inerentes ao poder familiar, nos termos do que
estabelece a Constituição Federal, em seu art. 229: "os pais têm o dever de assistir,
criar e educar os filhos menores".
Para se fixar um valor adequado à verba alimentar, porém, é preciso
ter-se em vista o binômio necessidade/possibilidade, o qual pressupõe que os
alimentos devem ser arbitrados na proporção das necessidades do reclamante e dos
recursos da pessoa obrigada, em consonância com a regra do § 1º do artigo 1.694 do
Código Civil, in verbis:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos
outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua
condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada (Grifo acrescido).
Desta forma, tais requisitos (necessidade e possibilidade) são
parâmetros nos quais deve inspirar-se o Juiz para fixar, à luz da razoabilidade, o valor
da pensão alimentícia, atentando-se que a obrigação de sustentar a prole compete a
ambos os genitores. É o que ensina Yussef Said Cahali:
Em geral, na determinação do quantum, há de se ter em conta as condições
sociais da pessoa que tem direito aos alimentos, a sua idade, saúde e outras
circunstâncias particulares de tempo e de lugar, que influem na própria
medida, tratando-se de descendentes, as aptidões, preparação e escolha de uma
profissão, atendendo-se ainda a que a obrigação de sustentar a prole compete a
ambos os genitores.
[...]
Mas se a obrigação alimentar não se presta somente aos casos de
necessidade, devendo-se considerar a condição social do alimentado, ter-se-á
em conta, porém que é imprescindível a observância da capacidade financeira
do alimentante, para que não haja desfalque do necessário ao seu próprio
sustento, advertindo-se, daí, que os alimentos devem ser fixados de forma tal que
as necessidades do filho sejam atendidas e ele possa desfrutar de um padrão de
vida compatível com o do genitor, sujeitando-se sempre ao princípio da
razoabilidade, visto que o filho não é sócio do pai, mas seu dependente (CAHALI,
Yussef Said. Dos alimentos. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 508)
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6. (Grifos acrescidos).
Na espécie, a alimentanda, nascida em 26/7/2013 (fl. 53), conta um ano
e seis meses de idade, de sorte que os gastos com alimentação, saúde, vestuário,
entre outros, são presumidos, porquanto inerentes à sua assistência e criação.
Relativamente à condição financeira do alimentante, os documentos dão
conta de que o recorrido exerce a função de chapeador, sendo controversa, tão
somente, sua condição de autônomo ou contratado.
Colhe-se dos elementos carreados aos autos que o recibo de
pagamento de salário de fl. 79, emitido por "Chapeação e Pintura Colaço e
Bevilaqua", tem sua veracidade duvidosa, porque não comprovada, através de
anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, a relação empregatícia
aventada. Bem ainda, importa destacar a declaração prestada por J. F. B. J., nos
seguintes termos: "Eu, J. F. B. J. [...], proprietário da Empresa Chapeação e Pintura
Colaço e Bevilaqua Ltda. Me., instalada na Av. Leoberto Leal 575, Bairro Bom Jesus,
declaro para os devidos fins que forneci o barracão e ferramentas de minha oficina à
F. R. J., [...] para exercer sua profissão sem um vínculo com a mesma." (fl. 44) (grifo
acrescido).
Desta feita, se realmente contratado, a remuneração mínima do apelado
é de R$875,00 (oitocentos e setenta e cinco reais), o que não se pode afirmar com
certeza, porque a declaração oferecida por aquele que supostamente emprega F. R.
J. dá a entender que o alimentante labora de forma autônoma, utilizando-se apenas
do espaço físico que lhe é fornecido.
Ademais, é de conhecimento de todos, por experiência comum, que a
profissão exercida pelo obrigado possibilita a obtenção de renda mais robusta que
aquela convenientemente aventada pela parte. Além disso, é possível inferir do
relatado no caderno processual que os ganhos do réu excedem o salário mínimo
mensal.
De outro vértice, sobre a realidade financeira da genitora da menor,
tem-se que, conforme relatado no processo, é estudante e desempregada, depende
da ajuda paterna para manutenção de seu sustento.
Diante deste cenário, havendo documentos e informações contraditórias
que não podem obstar o direito aos alimentos, consentânea é a majoração da
obrigação pretendida, destacando-se, por oportuno, os apontamentos feitos pelo
Ministério Público (fl. 119), in verbis:
Sendo assim, tenho que a pensão alimentícia fixada em percentual equivalente
a 20% (vinte por cento) dessa importância, em especial pela especificidade do caso
em relação a dúvida acerca da efetiva contratação do apelado, não tutela, de forma
suficiente, os interesses da apelante.
[...]
Contudo, tendo em vista a forma nebulosa com a qual se porta o apelado e
ainda o suposto empregador, entendo que aquele percentual deve ser convertido em
salários mínimos para se evitar prejuízos futuros à credora.
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7. Assim, entendo deva ser readequado o encargo alimentar, alterando-se,
também, o indexador, para que incida sobre o salário mínimo, no percentual de 30%
(trinta por cento).
CONCLUSÃO
Diante do exposto, o voto é no sentido de conhecer em parte do recurso
e, nesta extensão, dar-lhe parcial provimento a fim de readequar o encargo alimentar,
para que incida sobre o salário mínimo, no percentual de 30% (trinta por cento).
Gabinete Des. Raulino Jacó Brüning