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Iniciativa doa estudantes UM INFORMATIVO INOVADOR da Paraíba. Maior –Junho (modificada). Ano 1. N 2.
                                   de Direito da Universidade Federal PARA NOVOS TEMPOS



O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
                                                                                Por: Igor Isídio e Yulgan Tenno

                                                             “(...) Em meio à preparação das comemorações dos 60 anos
                                                             da Faculdade de Direito, deve subsistir a vergonha de brin-
                                                             dar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desa-
                                                             ba sobre nossas cabeças”. P.8 , P.9.




   Infiltrações no teto da Faculdade de Direito JP (UFPB).


 Direito vs Direito     P.11

 Veja as opiniões opostas
 de dois grandes juristas a
                                                                                      JOSÉ TARGINO
 respeito da decisão do
 STF em aplicar a lei do                                                               MARANHÃO
 “Ficha Limpa” nas elei-
 ções de 2010. Por: LEO-                                                             ―Eu cumpri meu dever, fiz o que era
 NARDO WRIGHT.                                                                             possível e importante‖
                                                                                    O ex-Governador da Paraíba dá sua primeira
 Internacional                                                                      entrevista após as eleições de 2010. Em meio a
                        P.4.
                                                                                    um espetáculo de confissões, Maranhão comenta
                                                                                    o Golpe Militar de 64, sua posições políticas e
 A morte de Osama Bin
 Laden marca o início de                                                            ideológicas e fala da gratidão de fazer parte da
 uma nova era para a hu-                                                            construção histórico-política do Estado da Paraí-
 manidade. Estamos a                                                                ba. P8 , P.9.
 salvos do terrorismo in-
 ternacional? A análise
 dos fatos: TERRORIS-
 MO. Por JAN MARCELL.
                                  PEDRO LENZA
                                 A pedido da TRIBUNA, um dos maiores
Saber Direito           P.6                                              Criminal
                                 autores em Direito Constitucional do Bra-
                                 sil, Pedro Lenza, comenta o caso Manoel
10%, ilegal ou imoral?
Saiba qual o grau de lega-
                                 Mattos à luz da constitucionalidade da
lidade na cobrança dos           EC.45 e sua repercussão para o meio jurí-
10% nos restaurantes e           dico. Além de atentar para o novo espaço
bares da capital e para          de aplicação dos direitos sociais frente a
onde vai o excedente. POR        jurisprudência do STF. P1O.
MATHEUS CHAVES.



                                    UM INFORMATIVO INOVADOR PARA NOVOS TEMPOS
2                        IGOR
                                       ISÍDIO
                                 AMANDA GURGEL E OS INTERNAUTAS LEGIFERANTES

               “Como sempre colocam que os números são irrefutáveis, eu sociais, que deve ser o ambiente onde a sociedade civil e a esfera
    gostaria de apresentar um número composto por três algarismos ape- pública florescem.” Em termos de mobilização política, a grande rede
    nas, (...) que é o número do meu salário: um nove, um três e um zero. tem hoje um poder de contaminação tão proeminente que já existem
    Novecentos e trinta: meu salário-base. (...) Certamente esse salário não empresas especializadas em canalizar esse potencial. É o caso da Avaaz,
    é suficiente para pagar nem a indumentária que os senhores e as se- uma organização de mobilização online, atuante em 193 países, que
    nhoras utilizam para poder frequentar esta Casa.”                         ganhou espaço no Brasil após coordenar a bem-sucedida campanha pela
               Foram estas as primeiras palavras do depoimento da professo- aprovação da Lei da Ficha Limpa. Utilizando-se da velocidade de
    ra Amanda Gurgel, proferido em audiência pública da Assembléia Le- comunicação típica da web para catalizar suas ações, a organização
    gislativa do Rio Grande do Norte, sobre o cenário
    real da educação naquele estado. Diante do silenci- ―(...) um simples clique, reverberado no gigantesco universo
    oso constrangimento dos parlamentares, ela inter- da internet, passou a ser um ato político tão importante
    rogou: “Estão me colocando dentro de uma sala de quanto transformador‖
    aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil,
    é isso?” O vídeo do discurso, postado no Youtube há apenas três sema- trabalha basicamente com a coleta de assinaturas e envio de petições
    nas, já foi assistido por quase dois milhões de internautas. Não só por aos congressistas. Em seu site, acessado mundialmente por mais de
    ser mais um dos muitos “virais” que alçam desconhecidos à fama com a nove milhões de pessoas, conclama a adesão dos internautas brasileiros
    instantaneidade de um clique, o depoimento da professora potiguar a campanhas como “Proteja o Brasil do Bolsonaro” ou “Pare Belo
    chama a atenção por evidenciar um fenômeno recente, potencializado Monte - Não à Mega Usina na Amazônia”.
    pelo avanço das ferramentas de comunicação: o ativismo político onli-               As novas tecnologias na comunicação vêm contribuindo,
    ne.                                                                       sobretudo, no fortalecimento da sociedade civil organizada perante o
               Tuitado e retuitado milhares de vezes - na mesma velocidade Legislativo. A vontade popular manifesta-se agora de forma mais orga-
    com que estes novos verbos foram absorvidos - o vídeo deflagrou a nizada, pois interesses semelhantes rapidamente se aglutinam e se mo-
    campanha que atualmente reúne assinaturas para uma petição pública bilizam a partir do ambiente virtual, exercendo sobre as ações dos parla-
    em favor do aumento de recursos destinados à educação. A mobilização mentares uma pressão, por uníssona, mais homogênea. Pode parecer
    em muito nos lembra a que levou à aprovação da “Lei da Ficha Limpa”, assustador àqueles que ainda não internalizaram os sentimentos de de-
    iniciada com um projeto de lei de iniciativa popular, fortalecido pela mocracia, mas, no frenético ritmo da atualidade, o postar de um simples
    reunião de mais de dois milhões de assinaturas. Tamanha força acelerou vídeo no Youtube ou de um texto em um blog passou a ter tanta relevân-
    sobremaneira a tramitação do projeto, em ambas as Casas do Congresso cia política quanto qualquer pronunciamento nas sessões solenes do
    Nacional, que em menos de um ano passou a vigorar como Lei Comple- Congresso Nacional. Um anônimo (mesmo uma professora primária)
    mentar nº 135/2010. E a grande maioria dos signatários tomou conheci- pode, instantaneamente, tornar-se político; os internautas, organizados,
    mento, aderiu e deu suporte à campanha através da internet.               podem ser verdadeiros legisladores; um simples clique, reverberado no
               Ainda são escassos e incipientes os estudos da Ciência Políti- gigantesco universo da internet, passou a ser um ato político tão impor-
    ca brasileira sobre esse tipo de ativismo político, conhecido internacio- tante quanto transformador.
    nalmente como cyberativismo (ou E-activism), mas o fenômeno já é
    estudado há quase uma década por pesquisadores europeus e norte-                           IGOR ISÍDIO. Acadêmico da Faculdade de Direito
    americanos. Desde 2002, por exemplo, o havardiano Pippa Norris já                          em João Pessoa (UFPB).
    dizia que, “em suma, as tecnologias digitais facilitam a maior das redes



    CONSELHO CONSULTIVO




    Dr. Delosmar Mendonça          Dr. Marcílio Franca            Dr. Solon Benevides             Leia TRIBUNA, promova JUSTIÇA
                                                                                                           @tribunajustica
    CONSELHO EDITORIAL




        HENRIQUE LENON                   IGOR ISÍDIO               MIGUEL CÂMARA                  PEDRO ATAÍDE                  YULGAN TENNO
CARTA                                                                                                                                  3

                        AO LEITOR
   A TRIBUNA E A JUSTIÇA ENTRE TRADIÇÃO E INOVAÇÃO
                 Este informativo, como espaço de difusão de ideais e      direitos, cada indivíduo é também um ponto de emergência de opini-
de instrução acadêmica, acende o farol da justeza em uma cultura           ões próprias e soberanas. Eis por que os autores dos textos que publi-
mundial de novidade. Os povos se inserem, há algum tempo, em uma           camos têm liberdade ideológica e desembaraço criativo.
cadeia de progresso ordenado, que tem a inovação como regra.                                Entre tradição e inovação, este informativo firma-se
                 Essa pulverização do novo só é possível por meio da       sob o signo duplo da competência e da independência. Nestas páginas,
difusão do indivíduo, que hoje com-                                                                                                     falam
põe, nas palavras de Rodriguez Ibarra,                                                                                                  nomes
uma “sociedade invisível” – além da
institucionalizada – e, para nós, quebra
                                         ―Nosso trabalho busca a mudança,                                                               históricos
                                                                                                                                        da Paraí-
as barreiras da invisibilidade social.
Usando o Twitter, o Facebook e o         mas não renegamos princípios...‖                                                               ba, como
                                                                                                                                        Ronaldo
Google, Um com Outro provam que a                                                                                                       Cunha
liderança não está apenas configurada no corpo social subordinado,         Lima e José Maranhão, alternam-se juristas consagrados, como Dr.
pelo contrato político, a representantes constituídos. Líderes emergem     Genival Veloso e nossos conselheiros, e publicam-se escritos de estu-
da população-em-si; pactos e acordos institucionais renovam-se; criam      dantes universitários. Promovemos ainda debates com figuras inova-
-se novas linguagens e tecnologias do poder.                               doras do cenário nacional, como Maria Berenice Dias e Marianna
                 Se, nas sociedades feu-                                                                                                Chaves,
dais, a individualização estava apenas
nas regiões altaneiras da autoridade –    ―Nosso norte é a grandeza, mas sem a                                                          membros
                                                                                                                                        do Insti-
sendo sua medida –, atualmente, a indi-                                                                                                 tuto Bra-
vidualidade volta a acompanhar o po-
der, desta maneira: cada indivíduo po-
                                          arrogância de outrora.‖                                                                       sileiro de
                                                                                                                                        Direito de
de, a partir de si, inovar e transformar. Esse foi o exemplo das recen-    Família.
tes revoluções árabes, que obedeceram à potência virtual do Eu e de                         Nesse sentido, é alvissareiro sermos procurados por
seus Followers.                                                            acadêmicos e por profissionais do direito, por leigos e por mestres, os
                 Por outro lado, também a política ocidental se recons-    quais querem colaborar, ou trabalhar conosco. Nosso trabalho busca a
trói. O nacionalista Humala vence no Peru, reforçando uma aliança          mudança, mas não renegamos princípios, tampouco nos subordinamos
continental, e o PSD português – tendo um homônimo brasileiro em           integralmente a eles. Nosso norte é a grandeza, sem a arrogância do
gestação acelerada – toma dos socialistas o Governo luso. A nova           século XX.
direita francesa, com Marie Le Pen, advoga o fim da globalização,
enquanto a esquerda acadêmica propõe a construção de uma contra-
hegemonia dentro do sistema globalizado.                                                   HENRIQUE LENON FARIAS GUEDES
                 Nesses novos tempos, reforçar bens tradicionais, como                      Presidente do Conselho Editorial
o “justo”, parece contraditório, mas não embarcamos na estática esté-
tica do valor imutável, e sim na dinâmica que busca um conceito. A
tradição nos envolve e dela absorvemos o que é necessário, porquanto
a estrutura de nossa perspectiva é cognitiva.
                 Afinal, a proposta da Tribuna da Justiça não é a verti-
calidade travestida de vanguardismo libertador, mas a horizontalidade
dos que se submetem coordenadamente a pressupostos de investiga-
ção da verdade. Se o sujeito social é um ponto de convergência de


COMISSÃO
JORNALÍSTICA
       DIRETOR-GERAL                     DIRETORIA DE REDAÇÃO     DIRETORIA EXECUTIVA
        YULGAN TENNO                            IGOR ISÍDIO    PEDRO ATAÍDE E RAFAEL MENEZES
    yulganfarias@hotmail.com              Vice: MATHEUS CHAVES     pedrinhoataide@hotmail.com                               Leia TRIBUNA, promova JUSTIÇA

                                               igor.isidio@gmail.com                       foirafa@gmail.com                Tribuna da Justiça é uma
                                                                                                                            publicação dos estudantes
                                                                                                                              de Direito da UFPB.
DIRETORIA DE REPORTAGEM                    DIRETORIA COMERCIAL                      DIRETORIA DO TESOURO
                                                                                                                            tribunajustica@gmail.com
      NAYANNA SABIÁ                            VINICIUS PAIVA                           ILDECI TAVARES                          @TribunaJustica
    nayannasabia@hotmail.com                vinicius@ejaconsultoria.com.br               ildeci_filha@hotmail.com
                                                                                                                                 Fundadores:
                                                                                                                            Henrique Lenon e Yulgan
 Redator: Guilherme Anacleto;                                                                                                        Tenno
 Colunistas: Caroline Falcão, Danilo Moura, Heitor Toscanos, Jan Marcel, Matheus Chaves, Rafael Menezes;                        Projeto Gráfico:
 Repórteres: Ítalo Di Lucena; Uane Junilhia;                                                                                     Sérgio Sombra
 Consultores Comerciais: Thiago Lima, Ygor Fernandes, Yure Tenno;                                                               Tiragem Mensal:
                                                                                                                                 Mil exemplares
 Colaboraram nesta edição: Larissa Maranhão, Leonardo Wright, Nathan Wanderley, Ingride Ferreira, Luana Vas-
 conelos,
 Fotografia: Yulgan Tenno
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                  INTERNACIONAL                                                                                      Por: Jan Marcell

                 ANÁLISE DOS FATOS: MORTE DE OSAMA BIN LADEN E O TERRORISMO
                             INTERNACIONAL NO PÓS-11 DE SETEMBRO

          Os atentados terroristas de 11 de setembro,   a reeleição.                                        Advogados do Brasil, Cezar Britto, releva que há a
nos Estados Unidos, trouxeram um sentimento de                                                              predominância da concepção da “Teoria Bush”, cuja
vulnerabilidade em nível internacional. A tolerância    Um inimigo a menos: análise e críticas à ofensiva   idéia é que: “para combater crime, tudo é possível,
dos países diminuiu, consideravelmente, em especial,    norte-americana                                     inclusive violações a normas internacionais”. Ele
a norte-americana, o que levou o presidente George                                                          ainda conclui que: "a não submissão à legislação dos
W. Bush a declarar guerra a todos os grupos terroris-               Na madrugada do dia 2 de maio de 2011,  tribunais internacionais e o ato patriótico formam um
tas. A primeira atitude do governo norte-americano      Obama anunciou a morte do principal idealizador do  sistema de auto-proteção dos EUA".
foi planejar a derrubada do regime Talibã, no Afega-    terrorismo internacional, responsável pelo atentado           A decisão de não divulgação de imagens da
nistão, e capturar Osama Bin Laden.                     de 11 de setembro de 2001 e líder da rede terroristamorte do terrorista, como exemplo do auto-sistema
            Em consequência do conhecimento adqui-      Al-Qaeda. Através de uma articulada ofensiva da     norte-americano, gerou ceticismo de grande parte do
rido em outras experiências no oriente médio, a         força armada norte-americana, tropa Seal, melhor    mundo, principalmente do Oriente Médio. Com a
política norte-americana objetivou melhorar sua         tropa de operações dos EUA, os militares invadiram  justificativa de não incitar grupos terroristas, o go-
imagem no exterior e ter uma relação pública de         o complexo que abrigava Bin Laden, na cidade de     verno dos EUA aumentou a insatisfação quanto à
combate aos terroristas. Conforme aponta Fraser         Abbotabad, Paquistão. Em confronto direto, ao che-  arbitrariedade das suas decisões, como de declarou
Cameron, em sua obra sobre a Política Externa Ame-      garem ao quarto do terrorista, os norte-americanos  Ismail Haniyeh, líder do movimento palestino Ha-
ricana no Pós-Guerra Fria, em 2003, os estaduniden-     atiraram contra Bin Laden e sua esposa.             mas: "Se esta notícia é verdade, pensamos que se
ses, apoiados no patriotismo e na opinião pública,                  Segundo informações norte-americanas, o trata da continuidade da política de opressão ameri-
fizeram com que o olhar do mundo para o país se         terrorista morreu com um tiro na cabeça e outro no  cana baseada no derramamento de sangue dos árabes
tornasse uma forma de cooperação contra possíveis       peito. E, ao se colocar a frente do marido, a esposae dos muçulmanos". Já o padre Frederico Lombardi,
ameaças terroristas.                                    do terrorista foi ferida com um tiro na perna. Após porta-voz do vaticano, criticou a polêmica comemo-
            Nesse contexto, é importante lembrar que    exames de DNA, o corpo do terrorista foi sepultado eração dos norte-americanos à morte do terrorista.
o terrorismo não é um fenômeno novo. Enquanto           atirado ao mar, seguindo tradições islâmicas. No    Para ele, não deviam se alegrar, pois há a
expressão política, por exemplo, o termo “terror”       entanto, como aponta Noam Chomsky, em artigo        "responsabilidade de cada pessoa perante Deus e
surgiu com a Revolução Francesa, em seu período de      para a revista “Guernica”: “em sociedades que pro-  homens". Espera ainda que: "não seja uma ocasião
maior violência. No entanto, nos últimos tempos,        fessam certo respeito pela lei, os suspeitos são deti-
                                                                                                            para mais ódio, mas para paz."
pelos impactos provocados, esse termo vem ganhan-       dos e passam por processo justo”. A morte do terro-           A segurança internacional vive um momen-
do maior destaque. Embora haja a percepção de que,      rista, realizada de forma planejada pelos norte-    to problemático, pois se questiona como será a reper-
cada vez mais, o tema é estudado e debatido, ainda      americanos, fere diversas normas de Direito Interna-cussão da morte do principal articulador do Terroris-
não há um consenso acerca de sua definição oficial.     cional. Por ter sido uma ofensiva em solo paquista- mo Internacional. Em pronunciamento oficial após a
Segundo Raymond Aron, no livro “Paz e Guerra            nês sem a autorização desse país, viola principalmen-
                                                                                                            morte de Bin Laden, Obama fala ao povo norte-
entre as Nações”, em 1962: “Uma ação violenta é         te o princípio da soberania dos Estados.            americano como se a morte do terrorista fosse um
chamada de terrorismo quando os seus efeitos psico-                 Como membro da ONU, outra infração      ato derradeiro do terrorismo internacional. Contudo,
lógicos são desproporcionais ao seu resultado pura-     norte-americana foi o não respeito às normas de     o ato do governo americano pode incitar outras célu-
mente físico”. Ou seja, os efeitos psicológicos dos     Direitos Humanos, cujo princípio básico é o direito à
                                                                                                            las da Al-qaeda a promover atentados contra seu
atentados de 11 de setembro, entendidos como contra     vida, como bem destaca Paulo Luiz de Toledo Piza,   próprio território e aliados. A imprevisibilidade do
todo o povo norte-americano ou até a civilização        professor da GVLaw. Para ele, o direito ao julga-   terrorismo, portanto, põe em xeque o futuro da segu-
ocidental, foram bem maiores que os efeitos físicos     mento também é violado pelos norte-americanos.      rança internacional.
(Ataque às duas torres gêmeas do World Trade Cen-       Contudo, o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon,
ter, ao Pentágono e a morte de aproximadamente          declarou que: "A morte de Osama Bin Laden, anun-
3000 pessoas).                                          ciada pelo presidente Obama, na última noite, é um JAN MARCELL . Mestrando em Relações Interna-
            Com a eleição de Barack Obama, em           momento divisor de águas em nossa luta global cionais (UEPB ) e acadêmico da Faculdade de
2009, oposição ao governo de Bush, há uma pressão       comum contra o terrorismo". Na mesma linha, serviu Direito em João Pessoa (UFPB).
por uma nova estratégia política contra o terrorismo.   de alívio e reafirmação para diversos representantes
Contudo, Obama manteve alguns nomes da gestão           internacionais.
do governo anterior, como o secretário de Defesa,                   Ao mesmo tempo, a ofensiva norte-
Robert Gates. Conseqüentemente, Gates foi respon-       americana contra o terrorista traz uma problemática
sável por uma estratégia de continuidade e ruptura      maior do que os princípios da lei, pois envolve patri-
com a gestão de Bush, objetivando o controle do         otismo, a moral e a ética não só do povo estaduni-
Afeganistão e da região fronteiriça com o Paquistão.    dense, mas também da civilização ocidental. Ou seja,
Em 2011, em um momento de contestação ao gover-         a morte de Bin Laden nos mostra ainda a fragilidade
no Obama, essa estratégia consolidou a morte do         de normas de Direito Internacional. Em matéria do
terrorista Osama Bin Laden, no Paquistão, e repercu-    site Consultor Jurídico, o presidente da Comissão
tiu no fortalecimento da campanha de Barack Obama       Nacional de Relações Internacionais da Ordem dos
RAMON
                         CAVALCANTI
                                                                                                                                                              5


                                                         O DIREITO À LITERATURA
            O utilitarismo é o princípio hegemônico na contemporaneidade.          pessoas, mormente por causa da estrutura que a caracteriza, daquilo que Anto-
Com o estabelecimento do primado da técnica, depois da Revolução Industrial,       nio Candido denomina “força da palavra organizada”. A obra literária, como
o valor dos objetos, das ideias e das pessoas passou a ser determinado, em         objeto construído, transfigura a realidade e permite aos indivíduos que travam
grande medida, pela utilidade e pela aplicabilidade imediata. Nesse contexto, a    contato com ela experimentar algo que poderia ser chamado de experiência
Literatura, como a Filosofia e as demais artes, foi, sistematicamente, desafiada   concentradora de vida. Não menos importante, na efetivação da função
a justificar sua existência e sua continuidade, com fundamento em algum uso        humanizadora da Literatura, é a contribuição dela à capacidade de os
objetivo, verificável pelos métodos tecnocientíficos. O literário, em sentido      seres humanos representarem e comunicarem suas subjetividades, bem
amplo, nunca deixou de ser buscado pelas pessoas, como uma necessidade,            como a realidade, conforme eles a assimilam. A Literatura humaniza, por-
apesar das contestações utilitaristas. A obra literária é um constructo que, por   que, ao mesmo tempo, potencializa a vida e porque torna mais acessível a
meio, principalmente, de sua estrutura e de seu significado, exerce poderosa       complexidade do real.
função humanizadora nos indivíduos.                                                            Em virtude do efeito humanizador exercido pela Literatura, Antonio
            Malgrado a Literatura consista, ao mesmo tempo, em uma forma de        Candido considera que o acesso a ela deveria ser um direito humano. Na medi-
expressão e em um meio de conhecimento, o aspecto que define o literário é         da em que a busca do literário, da fabulação, é uma necessidade perceptível em
sua condição de constructo, com uma estrutura e com um significado integra-        todos os seres humanos, a fruição da Literatura deve ser garantida. Essa busca
dos. A obra literária pode comportar qualquer conteúdo, desde que esse esteja      comum a todos é explicável, pelo fato de que a ampliação da capacidade de
ordenado e articulado de maneira particular, caracterizada pela exploração         representação da realidade e de apreensão da complexidade da existência con-
intensa dos meios expressivos de uma língua. Diferentemente do que muitos          fere às pessoas meios essenciais à consecução da felicidade. Essa proposta
pensam, o objeto da obra literária não é, necessariamente, a ficção, como é        coaduna-se com a tendência de reconhecimento de que o que deve ser concebi-
possível verificar em obras memorialistas, como Minha formação e Baú de            do como necessidade humana primordial ultrapassa os aspectos meramente
ossos, ou em ensaios, como Os sertões e Casa-grande & senzala, todos, de           materiais que possibilitam a sobrevivência do organismo biológico do ser hu-
modo inequívoco, detentores de um nível elevado de literariedade, em decor-        mano.
rência da maneira como são estruturados.                                                       As possibilidades que o contato com a Literatura oferece aos indiví-
            Concebido de forma ampla, o literário pode manifestar-se não ape-      duos, as quais apresentam riscos e perigos, como a vida de que ela é imagem,
nas por meio dos gêneros tradicionais, como conto, romance, poesia, mas tam-       são inúmeras. Sem distinção de classe social ou de idade, a experiência do
bém por filmes, por telenovelas, por músicas ou por outros modos. De acordo        literário, em suas amplas possibilidades de manifestação, é uma necessidade
com a opinião expressa por Antonio Candido, no ensaio “Direitos humanos e          dos seres humanos, o que decorre do efeito humanizador que a obra literária,
literatura”, embora não se deixem de reconhecer as especificidades de cada         como objeto construído, provoca neles, por meio de sua forma de estruturação.
linguagem, há literariedade nessas manifestações, inclusive, porque usam, em       O referido efeito, por constituir um meio essencial à realização plena do ser
sua elaboração, a palavra organizada. O teatro, de forma geral, filmes como        humano, deve ser considerado um direito fundamental, garantido a todos indis-
Laranja mecânica, em que há intensa estilização da linguagem verbal, assim         tintamente.
como músicas de compositores como Caetano Veloso, Chico Buarque e Arnal-
do Antunes, corroboram a ideia de que o literário permeia, além da Literatura      Ramon Limeira Cavalcanti de Arruda. Bacharel em Filosofia pela
em sentido estrito, outras formas de expressão humana.                             UFPB. Oficial de Chancelaria.
            A Literatura, em todas as suas maneiras de existência, humaniza as



                        IMAGEM DO MÊS                                                                        @TRIBUNAJUSTICA
ACESSO: 09 DE JUNHO DE 2011


                                                                                                       Matar só não é desumano quando a vida sacri-
                                                                                                       ficada menos desumana for.



                                                                                                       Ele merecia ter sido julgados pelos seus cri-
                                                                                                       mes e não ser motivo de festa por sua morte...



                                                                                                       A morte de Osama Bin Laden é um exemplo
                                                                                                       típico de se fazer um mal necessário a fim de
                                                                                                       assegurar um bem maior.


                                                                                                       “Olho por olho, World Trade Center por Bin
                                                                                                       Laden. É ou não é uma guerra de símbolos?”


                                                                                                      A alegria regada de sangue, deixa de lado os
                                                                                                      D.Humanos, fato lamentável.



                                                                                                       além da arbitrariedade do ato, é revoltante a
                                                                                                       felicidade burra do povo mostrada na imagem.
6                   SABER
                                  DIREITO                                                            Por: Matheus Chaves
                                                                                                                   João pessoa, 11 de abril de 2011
                         A NÃO OBRIGATORIEDADE DA GORJETA E OS GARÇONS
         Idas a bares e restaurantes são momentos, em geral, marcados                Quanto à cobrança obrigatória aos consumidores, entende-se
pela descontração e tranquilidade. Entretanto, algumas práticas nestes      que há ofensa clara ao princípio da legalidade, inscrito no inciso II, do
locais despertam dúvidas e questionamentos, a exemplo da cobrança           artigo 5º da Constituição Federal, que manifesta que "ninguém será
de gorjeta, taxa de serviço, ou o popular "10%", bem como a sua obri-       obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de
gatoriedade.                                                                lei". Tal cobrança também é considerada abusiva, implicando em in-
         As gorjetas encontram previsão legal no caput do artigo 457        compatibilidade como Código de Defesa do Consumidor que veda
da Consolidação das Leis do Trabalho, que destaca que                       práticas e cláusulas abusivas nas relações de consumo.
"compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efei-                     No que diz respeito ao salário dos trabalhadores que recebem
tos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador,      pagamento variável, sejam por comissões, porcentagens, prêmios ou
como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber". O parágra-       gorjetas, a Constituição Federal de 1988 trouxe como inovação para a
fo terceiro do referido artigo também destaca que é considerada             ordem jurídica nacional: o inciso VII do artigo 7º que estabelece a
"gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao          "garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem
empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao               remuneração variável". Ou seja, os empregados, ainda que não tenham
cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à        salário fixo, possuem uma garantia mínima salarial.
distribuição aos empregados".                                                        Corroborando a não obrigatoriedade do pagamento das gorje-
         Analisando os citados dispositivos legais, a doutrina do direito   tas pelos consumidores, inúmeras decisões judiciais ratificam estes
do trabalho entende que por opção de política legislativa a gorjeta é       entendimentos. Nestas circunstâncias, reforçamos a não obrigatorieda-
considerada como parte do salário, mais precisamente da remuneração.        de do pagamento de gorjeta aos garçons pelos consumidores. Entretan-
Entende-se também que esse artigo é importante na proteção do direito       to, sendo possível, exercitemos nossa cortesia e façamos sim o paga-
dos trabalhadores, entretanto, não vincula, nem obriga o consumidor a       mento das taxas de serviço, pois é delas que se valem os funcionários
pagar gorjeta, mas se este o fizer, diretamente a quem o atender ou         de bares e restaurantes para complementar seu (geralmente ínfimo)
indiretamente por meio de cobrança do estabelecimento, esta gratifica-      salário.
ção deve pertencer aos empregados e não aos empregadores.
                                                                                               MATHEUS CHAVES. Acadêmico da Faculdade de
                                                                                               Direito em João Pessoa (UFPB).



                           REGIONAL                                                                  Por: Heitor Henriques

         CHICO CÉSAR, A PROTEÇÃO DA CULTURA E OS DISCURSOS PLASTIFICADOS
    Tenho acompanhado toda essa discussão sobre o corte de investi-            Antes que se monte um cavalo-de-batalha em torno desse corte,
 mento por parte da secretaria de cultura da Paraíba, capitaneada por       atitude corrente de uma oposição tradicionalmente panfletária e plas-
 Chico César, ao São João de Campina Grande e os tais “forrós de            tificada tal qual o forró em questão, é bom lembrar-se da difícil situa-
 plástico”. Mais do que observado, tenho me espantado com alguns            ção financeira em que se encontra nosso orçamento. Não é só a preo-
 posicionamentos de parte da imprensa paraibana, principalmente no          cupação com a preservação cultural que está em jogo, mas sim a vida
 meio eletrônico. Decerto que poucos são os segmentos comunicativos         financeira de um Estado que não anda lá bem das pernas.
 que gozam de imparcialidade, contudo há de se resguardar um míni-             Foi anunciado que o FENART, evento realizado anualmente no
 mo de bom senso para avaliar a questão.                                    Espaço Cultural (que em 2010 homenageou Sivuca) foi cancelado
    Muita gente falou que o secretário/músico catoleense queria impor,      para esse ano. Motivo: o governo passado não quitou a dívida com os
 tal qual um ditador, o gosto dos paraibanos, reforçando a ideia de que     artistas que fizeram os shows do evento. Se nem mesmo um soldado
 essa intransigência acarretaria em uma diminuição do potencial lucra-      de reserva cultural mais tradicional como é o FENART não vai ser
 tivo do evento.                                                            realizado devido a questões financeiras, quem dirá patrocinar as ban-
    É importante lembrar que o governo não pronunciou que vai deixar        das de forró plastificado/estilizado que, além de publicar o total desa-
 Campina Grande e seu maior evento cultural, que gera gordas rendas         pego às raízes, nos brinda com belíssimos versos como:
 através do turismo, à míngua. Somente foi dito que o parco dinheiro                         “Cachaça, cachaça, cachaça eu te amo
 de nosso pobre Estado não será utilizado para contratar bandas de                          Cachaça, cachaça, cachaça eu te adoro
 “forró” que se distanciam bastante do grave do zabumba e do agudo                             Cachaça, cachaça você é meu vício
 do triângulo e cobram valores exorbitantes por cada apresentação.                         Preciso te dizer que sem você eu não vivo.”
    A produção musical brasileira, em tempos negros de censura e               Aceitar novas tendências não significa virar refém de um único
 opressão, resistiu poeticamente, propagando os mais belos ideais de        estilo musical. Todos os ritmos que agradem podem ser aceitos. Mas
 liberdade. O tempo passou, a Constituição veio e a liberdade tão so-       o Estado tem direito sim de forjar o aperfeiçoamento cultural do pró-
 nhada está aí. Mas e agora? O Estado deve ser absenteísta a ponto de       prio povo, como forma de educá-lo. Como bem falou Ariano Suassu-
 não se importar com a identidade cultural do seu povo? Sinceramente,       na, quando perguntado sobre a polêmica: “hoje em dia, o papel do
 não é possível entender a opinião de quem carrega a bandeira dessa         Estado equivale ao papel da Igreja, no sentido de criar condições para
 liberdade musical desenfreada e desse “new forró”, que faz apologias       os verdadeiros artistas.‖
 descaradas à coisificação da mulher e ao alcoolismo. São apenas pas-          Caso contrário, em breve esqueceremos nomes como Domingui-
 tiches dessas bandas estrangeiras, que estão bem distantes do nosso        nhos, Santana, Flávio José, Geraldo Azevedo, Os Três do Forró,
 forró verdadeiro.                                                          Nordestinos do Ritmo, Aldemário Coelho, Alcymar Monteiro,
    A tese do respeito aos mais diversos estilos é válida e essencial       Aleijadinho de Pombal, Pinto do Monteiro, entre outros.
 para a consolidação do ideal democrático da sociedade. Todavia, o
 Estado não pode fechar os olhos para a sua cultura e tem todo direito                HEITOR HENRIQUES . Acadêmico da Faculdade
 de direcionar seus investimentos no sentido da valorização do seu
 povo, das suas raízes e tradições.                                                   de Direito em Guarabira (UEPB).
YURE                                                                                                                 7
                                       ORDEM
                                      TENNO
                    PRATICANDO A ―INCLUSÃO DO OUTRO‖: UMA OBSERVAÇÃO QUANTO A
                             RETÓRICA DOS DEBATES POLÍTICOS
         A relação política e pública entre dois sujeitos políticos que   cepção de pessoas não participantes (crianças, mulheres) gradativa-
representam interesses, pontos de vista e ideologias antagônicas ou       mente se perde toda a atenção para suas características humanas; no
diferentes, que dividem o mesmo espaço público, de onde emanam as         final, todos os membros dos grupos que presuntivamente são atribuí-
decisões, torna-se deficiente quando ocorre o fechamento de um sujei-     dos ao inimigo são considerados apenas como objetos inanimados,
to em relação ao outro, fenômeno esse conhecido como “reificação”         coisificados.”
entre os sujeitos políticos que compõem o debate público.                          Em um mundo reificado ocorre isso, não sabemos quem o
         Isso ocorre quando o sujeito “A” não reconhece o sujeito “B”,    outro é, vemos o que ele faz, vemos se oporem contra nós, vemos eles
não tenta compreender nem entender as razões e contrarrazões das          reagindo contra nossas ofensivas, mas não perguntamos, não nos en-
propostas. O sujeito “B” torna-se para o sujeito “A”, opaco e incom-      volvemos com sua humanidade e com a humanidade de nossas razões.
preensivo. Axel Honnet concebe esta relação como um estado de au-         A afecção existencial possibilitada pelo reconhecimento elementar de
tismo: pois assim, como no mundo dos autistas, o outro não é visto        que nos fala Honneth impossibilita a atitude ética que deveríamos ter.
com a devida empatia humana, de seres que se reconhecem como                       Fechar-se ao outro nos coloca na complicada situação de pre-
iguais e que por isso possuem a mesma dignidade. Para ele “a reifica-     sunção sobre o outro, como não nos envolvemos pelas entrelinhas de
ção pressupõe que nós nem percebamos mais nas outras pessoas as           uma abertura existencial que seria compartilhada, não podemos fazer
suas características que as tornam propriamente exemplares do gênero      outra coisa senão absorver as ações de uma “coisa”, presumindo todas
humano: tratar alguém como uma “coisa” significa justamente tomá-la       as razões, essa é a perspectiva do observador e não do partícipe. De-
(o) como “algo”, despido de quaisquer características ou habilidades      mocracia se consolida com essa aprendizagem de participação, que só
humanas.”                                                                 se realiza na abertura existencial, na (re-)educação sentimental para o
         Esse modo de proceder cria a necessidade de segregação e a       discurso heurístico e não para o erística.
tentativa de criar fronteiras bem definidas, como se nada fosse idênti-            A presunção pode nos levar ao maniqueísmo improprio e des-
co entre as duas perspectivas. É ilustrativa a predisposição que temos    proporcional, que poderia ser resolvido apenas perguntando ao “auter”
de tentar colocar politicamente todo mundo no saco da esquerda ou da      quem ele é e o que propõe. Ocorre toda uma estruturação de pré-
direita. Em termos definitivos não temos critérios para a decisão, mas    conceitos (no sentido hermenêutico) sem que esses pré-conceitos se-
os efeitos psicológicos da rotulação é sentido por quem sofre e por       jam construídos com a participação desses sujeitos. É a figura do índio
quem age de acordo com a mesma.                                           descrita pelo europeu sem se perguntar o que o índio pode contribuir
         A grande questão que defendo, é que o fechamento ao outro        para sua conceituação.
também implica no fechamento de dimensões do diálogo que são de                    Em termos de danos à práxis democrática, o perigo se realiza
extrema importância para as ponderações e os convencimentos, que          pelo déficit de racionalidade nas decisões, como foi dito. O déficit é
aquilatam as duas versões da história com o mesmo tratamento refle-       mehor compreendido com a perspectiva do problema da verdade. A
xivo. Significa o fechamento a uma perspectiva participante no diálo-     verdade lógica não coincide com a verdade psicológica. Para se con-
go.                                                                       vencer alguém, não podemos usar apenas a lógica. Porque o homem
         Assim como um dado viciado tende a determinados resulta-         não é apenas feito de lógica, mas também de paixões. Então para con-
dos, também o diálogo entre os sujeitos reificados tende a certas con-    vencer o homem é necessário um envolvimento completo do ser. O
clusões. O discurso sofre uma interferência que se torna independente     envolvimento do homem com seu mundo “se realiza no reconhecer
das capacidades do orador. E isso é venenoso para a democracia, pois      (Anerkennen) e conhecer (Erkennen), de tal modo que por
decisões que independem (ao menos em parte) dos discursos são em          “reificação” devemos entender uma violação contra esta ordem de
maior ou menor medida voluntarista. A democracia tem a vantagem           precedência” (Honneth). A teoria do discurso retórico mantem sua
de proporcionar decisões politicas por meio do embate dos melhores        base não há apenas no logos, mas no Ethos e no Phatos. Assim, pode
argumentos e dos argumentos moralmente adequados à comunidade.            ser incluído na dimensão discursiva o reconhecer, por meio da pers-
E um reconhecimento apenas institucional, ou seja, a inclusão no de-      pectiva do Phatos e do Ethos, que são respectivamente uma atitude
bate político ou o reconhecimento de voz no debate, não é uma garan-      ética em relação a uma abertura participativa da mensagem e uma
tia de reconhecimento psicológico da comunidade (linguística), que        atitude ética sobre o sujeito que discursa, ambas posições complemen-
pode continuar surda ao argumento, ignorando-o. Significa está no         tares da abertura existencial da linguagem para uma perspectiva parti-
poder de argumentar, mas não com o poder de argumentar.                   cipante sobre o texto. Seria necessária uma explanação maior sobre as
         É necessário que se esclareça que na política podem ser trava-   relações não-epistêmicas com o Texto, que abrem variações interpre-
das relações de força, ou simples negociações, sobre o qual é indife-     tativas em nível epistêmico (locucional) e não-epistêmico
rente a figura reificada, mas há assuntos que necessitam de um trata-     (ilocucional). Essas variações ou desentendimentos têm potenciais
mento diferenciado. Sobre isso, é ilustrativo o debate sobre as células   perigosos na democracia.
tronco, a pornografia, o terrorismo, o Estado de Bem-Estar etc. São                Em termos de política democrática a perda do elemento racio-
assuntos que pressupõem uma condição argumentativa não epistêmi-          nal da democracia, a luta dos melhores argumentos, traz a perda de
ca, que é a possibilidade de se orientar pelos motivos do outro. O que    sua legitimidade, que acarretaria num voluntarismo das decisões da
Honneth tenta deixar evidente é isso, que “nós só podemos assumir a       maioria e de seus representantes. E essa forma de governo tem outro
perspectiva do outro depois que previamente reconhecemos no outro         nome, ela se chama Plutocracia, e isso independe do grupo que esteja
uma intencionalidade que nos é familiar – isto, como tal, não é um ato    governando. Portanto, as reflexões apontadas indicam um caminho
racional, nem uma tomada qualquer de consciência de motivos, mas          único de que em democracia não se pode esquecer o adversário, mas
realização pré-cognitiva do ato de assumir uma determinada postura.”      compreender sua posição diferente e fazer com que o outro também o
         O mundo reificado por excelência é o mundo Hobbesiano,           compreenda, de modo a abrirem-se ambos, para as opiniões diferentes
pois ele afirmava: homo homini lúpus, já que, segundo ele, um sujeito     que a retórica politica poderá permitir.
é opaco ao outro. As sujeições históricas que influenciaram a vida de
Hobbes corroboram com essa perspectiva. A Inglaterra de sua época
foi envolvida por uma práxis “reificantes”, como também foi à práxis      YURE TENNO: Acadêmico da
nacionalista do século XIX com as guerras de expansão napoleônicas.       Faculdade de Direito em João
Como assevera Honneth sobre o ideia de guerra: “a finalidade da des-      Pessoa (UFPB).
truição do adversário se autonomiza a tal ponto, que mesmo na per-
8            REPORTAGEM
                    ESPECIAL                                                        I. ISÍDIO & Y. TENNO
       O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
               A tradicional Faculdade de Direito da Paraíba
    responde hoje pelo nome de Centro de Ciências Jurídicas da
    UFPB e aninha dois cursos: um no campus I da Universida-
    de, em João Pessoa, outro no
    “campus virtual” de Santa Rita,           DESCASO: Teto da
    que funciona provisoriamente no
    Centro de nossa capital. Estes          Faculdade de Direito de
    dois cursos conseguem, de ma-              João Pessoa com
    neira muito peculiar, fundir histó-
    ria e contemporaneidade, tradici- infiltrações sérias depois
    onalismo e inovação. Mas hoje há de menos de dois anos de
    uma marca por ambos comparti-
    lhada com tristeza: a má conser-
                                                 inauguração .
    vação de suas instalações.
               Situado por quase 60 anos na Praça dos Três Po-
    deres, em João Pessoa, o curso de Direito foi transferido para
    o campus I da Universidade Federal da Paraíba, no qual
    passou ocupar um majestoso edifício, projetado em linhas
    arquitetônicas visivelmente modernas, de uma beleza sóbria, elegante- biblioteca, mas lá não haviam chegado devido à falta de um ambiente
    mente emolduradas pelos vestí-                                         adequado para abrigá-los. Em síntese: a biblioteca do curso de João
    gios da Mata Atlântica. Mas a                                          Pessoa ficou ainda menor, para que a de Santa Rita pudesse ao menos
    beleza das linhas modernas e o                                         começar a existir. E não obstante os estudantes de lá já tivessem pas-
    frescor da construção – motivo                                         sado quase dois anos prejudicados pela sua inexistência, a biblioteca
    de admiração aos transeuntes –                                                    tinha que existir – ao menos agora, aos olhos criteriosos
    conspiram para esconder os                                          SORTE: dos avaliadores do MEC.
    graves problemas estruturais                                                      Tornar-se-ia maçante a escrita ou leitura de um longo texto
    por que passa o edifício.                                           Cardeira que versasse sobre a fundamental importância das boas
             Muito mais do que os                                       queimada bibliotecas nos cursos de Direito. Análogo a este seria o
    corredores estreitos ou o péssi-                                                  trabalho de um agrônomo que resolvesse tecer considera-
    mo isolamento termoacústico                                         após a        ções a respeito da importância da água nas plantações de
    das salas, outros problemas                                         queda de abobrinha. Eis a ululante obviedade em tintas de compara-
    parecem mais graves aos olhos
    do corpo discente, usuário mais
                                                                        ventilador ção grosseira: a leitura está para o bom jurista assim como
                                                                                      a água está para o vegetal. A nossa Faculdade de Direito,
    direto e cativo das instalações.                                                  como centro de construção jurídico-intelectual de qualida-
    Há não muito, o ventilador de                                          de, deve ter sua biblioteca tal qual um santuário: um espaço amplo
    uma das salas caiu em cima de                                          onde seja possível o acesso silencioso aos melhores títulos da doutrina
    uma carteira, pegando fogo. Na                                         nacional e estrangeira. A cada visita às nossas bibliotecas, seja em
    ocasião, ninguém saiu ferido: o                                        João Pessoa ou em Santa Rita, o estudante de Direito da UFPB pode,
    estudante que comumente ocupava a carteira, por sorte, havia faltado com tristeza, constatar a abissal diferença entre o dever ser e o ser. Ao
    à aula. Mas não são apenas os eventos imprevisíveis que põem risco à som de discussões exaltadas, vozes incessantes e um concerto de ruí-
    integridade física dos estudantes. As últimas chuvas revelaram vaza- dos que oscila de uma tranquila sonoridade vinda das estantes a um
    mentos em diversos pontos do teto, fragilizando as placas de gesso agudo som do balançar das mesas e cadeiras, os alunos são obrigados
    que, úmidas, rachadas e emboloradas, ameaçam desabar. Os alunos, a buscar por conhecimento em meio ao escasso e antiqüíssimo acervo
    felizmente, agora não correm mais tantos riscos: uma funcionária – bibliográfico que não corresponde com a demanda doutrinária moder-
    designada especialmente para este fim – posiciona-se no pátio e, vez na. E todas as reivindicações por melhorias na educação - sejam elas
    por outra, prestimosamente alerta um estudante: “Ei menino, saia daí pela educação básica ou superior, feitas a qualquer patamar da admi-
    que o teto vai cair!” Ainda assim, o transeunte continua a admirar as nistração – até aqui têm recebido uma mesma resposta: abobrinhas.
    invejadas linhas modernas do novíssimo prédio: “Esses juristas são
    mesmo privilegiados...”
               Nos últimos dias, alunos desse mesmo curso também foram
    surpreendidos pela repentina retirada de dezenas de volumes da bibli-
    oteca. Ficaram sabendo depois, por vias trans-
    versas, que os livros retirados tinham como
    destino a biblioteca do curso-irmão de Santa            REPENTINO:
    Rita, no qual seria realizada, muito em breve, Ação de retirada dos
    uma visita de avaliadores do MEC (Ministério livros da biblioteca
    da Educação e Cultura). Um dos objetivos da
    visita seria conferir se as instalações do curso        do CCJ de João
    (incluindo a biblioteca) obedecem a condições Pessoa, no início da
    mínimas de funcionamento.                            manhã. Foto: Luana
             Do já minguado acervo com o qual se
    contentava o estudante de Direito de João Pes-
    soa saíram, pois, vários livros. Eles foram “emprestados” à ainda mais
    precária biblioteca do curso santa-ritense. Alguns deles teriam sido,
    aliás, comprados havia quase dois anos, tendo como destino a referida
REPORTAGEM                                                                                                                           9
                  ESPECIAL                                                           I. ISÍDIO João Pessoa, 28 de abril de 2011
                                                                                               & Y. TENNO
          Ao nascer, o curso de Santa Rita herdou o antigo prédio da         oferta de vagas, seja pela
Faculdade de Direito, uma construção em que se respira história. Por lá      melhor distribuição geográ-               ―SE VIRA‖
passaram grandes nomes da jurisprudência, da cultura, da política            fica delas, uma quantidade "Problemas das mais diversificadas
(alguns raros, de todas estas), tais como Luiz Augusto Crispim, Tarcísio     bem maior de alunos teria a naturezas deixam a uniformidade do
Burity, Ronaldo Cunha Lima, José Maranhão, Dorgival Terceiro Neto,           oportunidade de cursar Di- prédio comprometida, somado à inani-
Carlos Coelho e uma vasta lista de notáveis. Em visita recente às instala-   reito em uma respeitada e ção intelectual que a nossa biblioteca,
ções do novo curso de Direito, pôde-se constatar que, ao menos na anti-      bem avaliada instituição infelizmente, nos proporciona. Este
                                                                             federal. Até o momento, a último problema causa certa indignação
                                                                             implantação do curso pas- por parte dos discentes, que se vêem
                                                                             sou ao largo de um dos seus obrigados a disputar os pouquíssimos
                                                                             objetivos primordiais, pois livros lá existentes ou buscar outros
                                                                             em muito pouco vem bene- meios para suprir um serviço que deve-
                                                                             ficiando a cidade para a ria ser prestado, com eficiência, pela
                                                                             qual foi projetado. Dos biblioteca setorial do nosso CCJ, a qual
                                                                             alunos atualmente matricu- ainda “compartilha” sua defasagem com
                                                                             lados no curso, menos de o curso de Santa Rita. E o problema não
                                                                             cinco por cento são de Santa se resume apenas à falta de livros, por-
                                                                             Rita. Apesar de contraditó- que a própria acessibilidade física (ou
                                                                             rio, o número não represen- ausência dela) não nos oferece condi-
                                                                             ta um problema tão grave, ções. Mas como fica a situação daquele
                                                                             uma vez que não é comum que não tem condições financeiras para
                                                                             nem desejável destinarem- comprar livros? Como fica a situação
                                                                             se todas as vagas a estudan- daquele que não tem acesso aos livros
                                                                             tes de uma mesma naturali- de outras instituições? É, o famoso “se
                                                                             dade. O problema está em vira” cabe bem ao nosso decorrer aca-
                                                                             negar à cidade de Santa Rita dêmico."
                                                                             todos os benefícios sociais, NATHAN WANDERLEY: Acadêmico da
                                                                             educacionais e econômicos Faculdade de Direito em João Pessoa
                                                                             que a implantação de um
                                                                             campus universitário traria (UFPB).
                                                                             consigo. Não se trata apenas
                                                                             de poder ostentar o belo brasão da Universidade Federal da Paraíba, mas
                                                                             sim de ter a população contemplada, por exemplo, pelos projetos de
                                                                             extensão desenvolvidos pela Academia e pelo próprio florescimento
                                                                             intelectual que a acompanha.
                                                                                       O prédio onde funcionará o curso, quando for finalmente
   INDIFERENÇA: Livros da antiga biblioteca de Santa Rita (foto              transferido para a sua cidade-sede, teve sua construção iniciada recente-
   acima) embolorados no ambiente úmido do local, onde centenas de           mente – quase dois anos após a admissão da turma pioneira. A falta de
   exemplares se encontram da mesma forma. Embora uma nova bi-               instalações adequadas não foi empecilho à oferta de vagas aos vestibu-
   blioteca provisória tenha sido instalada na Faculdade, os livros          landos, feita a toque de caixa para dar prosseguimento à política do
                                                                             REUNI e atingir as metas por ele traçadas. Dentre estas metas, reside a
   históricos continuam perecendo nessa condição.                            intenção de frear a atual explosão de cursos superiores, grande parte de
                                                                             baixíssima qualidade, por que passa nosso país. Até aqui, muito deve-
ga biblioteca, não se pode mais respirar história. Aliás, lá não se pode     mos ao rigor, felizmente mantido, dos concursos públicos e dos vestibu-
respirar: as goteiras, em pingar constante por sobre centenas de livros      lares, pois não fosse o notável engajamento e qualificação do corpo
históricos, formam uma poça que toma todo o chão da sala. Alguns             docente do novo curso de Direito, somados às potencialidades de seu
exemplares já se apresentam completamente tomados pelo bolor; outros,        alunado, o REUNI teria indubitavelmente falhado em seu propósito de
depois de tanta resistência ao tempo e de tanto serviço prestado a tantos    barrar tal explosão. E pior, auxiliaria o nefasto fenômeno ao criar um
muitos valorosos juristas, jazem ali, condenados pela umidade, pelo ar       curso de qualidade questionável sob a justificativa de ampliar, a todo
miasmático, pela indiferença
de uma má administração.          ―(...) não fosse o notável engajamento e qualificação do corpo docente do curso
        O curso de Direito de
Santa Rita, como já se perce-
                                  de Direito de Santa Rita, somados às potencialidades de seu alunado, o REUNI
be, guarda algumas caracterís- teria indubitavelmente falhado em seu propósito‖
ticas bem diversas de seu
“irmão mais velho” pessoense. Nascido há apenas dois anos, deveria custo, a oferta de vagas em universidades federais.
funcionar em um campus na cidade vizinha, Santa Rita, cuja construção              O primeiro curso de Direito da Paraíba, vetusta Faculdade
ainda não saiu do papel. Não deixou, entretanto, de oferecer vagas aos donde frutificaram os mais ilustres juristas de nossa terra, está prestes a
vestibulandos – nas linhas do Plano de Reestruturação e Expansão das atingir a emblemática marca de 60 anos. Em meio à preparação das
Universidades Federais (REUNI) – e passou a funcionar, provisoriamen- devidas solenidades e eventos comemorativos, deve subsistir a vergonha
te, no antigo prédio da Faculdade de Direito. Cerca de três meses antes, de brindar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desaba
porém, este mesmo prédio havia sido desocupado, por falta de condições sobre nossas cabeças. Há também a esperança de que as vozes miúdas,
estruturais, pelos estudantes do curso que passou a funcionar no campus vindas da indignação do corpo discente de hoje, possa reverberar em
I da UFPB.                                                                vozes mais fortes, igualmente indignadas, do corpo discente de ontem.
           Um dos principais objetivos pretendidos com a criação de um
curso jurídico em Santa Rita foi o de descentralizar as atividades educa- IGOR ISÍDIO E YULGAN TENNO: Acadêmicos da Faculdade de Direito em
cionais da capital, bem como facilitar o acesso - sobretudo dos santa- João Pessoa (UFPB).
ritenses – a um curso geralmente tido como “elitizado”. Seja pela maior Fotografia: YULGAN TENNO
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                OPINIÃO
                            PEDRO LENZA FALA À TRIBUNA
Um dos mais conceituados constitucionalistas do Brasil comenta a constitucionalidade do Incidente de Deslocamento de Compe-
 tência no caso Manoel Mattos e demonstra sua opinião sobre a atual perspectiva dos direitos sociais na doutrina constitucional.


TRIBUNA—Recentemente, foi aplicado o Incidente
de Deslocamento de Competência (IDC) da Justiça
comum para a Justiça Federal ao caso Manoel Mat-
tos, reavivando a discussão sobre a constitucionalida-
de do IDC. Qual sua opinião sobre o assunto?                     ―O STJ reconheceu
           Realmente o caso do IDC é bastante emblemá-            a incapacidade das
tico e relevante em termos de concretização desse novo
instituto, na análise dos fatos que caracterizaram o ho-          autoridades locais,
micídio de Manoel Bezerra de Mattos Neto, advogado e
Vereador pernambucano, que foi assassinado, o que leva
                                                                 na apuração do caso
a crer, em razão de sua pública e conhecida atuação
contra os grupos de extermínio.
                                                                   Manoel Mattos‖
           O que o Superior Tribunal de Justiça entendeu
foi que havia uma reconhecida incapacidade das autori-
dades locais, para oferecer respostas efetivas para a
apuração desse crime. Então, foi a primeira decisão de
deslocamento de competência. Esse instituto busca fazer
com que a Justiça brasileira, em especial, o Estado brasi-
leiro, dê respostas efetivas aos tratados internacionais de direitos hu-            Hoje, fala-se muito na concretização dos direitos sociais e
manos, em que o Brasil se compromete a internamente punir a grave          especialmente na questão de implementação de políticas públicas. Nós
violação a esses direitos.                                                 poderíamos observar que existia uma tendência, cada vez mais forte
           Acontecia que o Brasil assinava tratados internacionais,        do Supremo, de afastar as alegações dos Estados e dos governantes, ao
comprometendo-se, no plano global, a punir tais violações, e não ti-       dizer que não implementam políticas públicas por uma questão de
nha, internamente, um instituto, para se fazer valer dessa situação.       falta de dinheiro. Fala-se muito em reserva do possível, reserva do
Então, a Emenda n.45 de 2004 criou o IDC e permitiu que, havendo           possível financeiro.
inoperância da Justiça local, o deslocamento da competência se efeti-               O que eu tenho sentido são algumas decisões do Supremo,
vasse para a Justiça Federal.                                              principalmente uma recente do Ministro Celso de Mello, no Recurso
           Esse instituto é ainda analisado no Supremo Tribunal Fede-      Extraordinário 482611. Discutia-se um projeto no Município de Flori-
ral, o que sustenta que o IDC seja inconstitucional, mas o que tem de      anópolis, chamado “Projeto Sentinela”, pelo qual o Município se com-
se verificar é o seguinte: para o STJ, a questão está superada. O IDC é    prometia a proteger, de forma integral, a infância e a juventude. O
constitucional, porque ele conheceu, superou a preliminar e julgou o       projeto não se implementava, o Município não executava o que havia
mérito. O IDC número 2, julgado no dia 27 de outubro de 2010, é            sido estabelecido, principalmente na proteção de crianças e de adoles-
então um tema muito recente e novo. O que é ainda analisado pelo           centes vítimas de abuso sexual.
Supremo são algumas ADI’s, em que se alega que o IDC é inconstitu-                  A alegação do Município era que eles não poderiam atuar em
cional com relação a duas questões: primeiro, com relação ao princípio     razão de inexistência de dinheiro. O Ministro Celso de Mello foi fir-
do Juiz natural. Dizem que o IDC seria inconstitucional, porque se         me, ao estabelecer que essa alegação não é razoável, que existe uma
desloca a competência do Juiz que julgaria aquela questão. Eu não          necessidade de atuação do Estado, que este deve preservar a ideia de
vejo problema algum no deslocamento, afinal, o Juiz Federal já é o         mínimo existencial. Mesmo inexistindo uma norma de caráter cogente,
juízo pré-constituído, então, não há problema.                             ele deve cumprir política pública, deve implementar direitos sociais,
           O que pode desembocar em um questionamento do Supre-            especialmente diante do assunto do artigo 5º, parágrafo primeiro, que
mo, que é muito delicado, é se haveria necessidade da definição do         diz que os direitos fundamentais têm aplicação imediata.
que é “grave violação aos direitos humanos”. Qualquer homicídio é                   Portanto, o Supremo vem dando contribuições muito impor-
violação a esses direitos, mas que é grave violação? Então, o que se       tantes, relacionadas às questões de políticas sociais e também relacio-
poderia discutir é se haveria alguma afronta ao princípio da estrita       nadas a questões ligadas a saúde, que envolvem o fornecimento de
legalidade penal.                                                          medicamentos. Há uma tendência a firmar uma responsabilidade soli-
           O STJ superou essa questão, mas o Supremo não a define. É       dária entre os entes federativos, para que se evite que o Município
um estudo com uma potência indiscutível, no sentido de proteção aos        jogue a responsabilidade para o Estado, este, para a União, e ninguém
direitos humanos. O que se faz não é mandar a questão, para o STJ          faça nada. Há uma proposta de Súmula Vinculante, para que se estabe-
julgar, eventualmente avocar o processo para o STJ. Não. É, perceben-      leça a responsabilidade solidária entre os entes federativos e até o
do a inoperância da Justiça Local, deslocá-la para a Justiça Federal.      bloqueio de verbas públicas para a implementação de políticas públi-
           O IDC número 1, que envolvia a Dorothy Stang, não foi           cas para o fornecimento de medicamentos sem a observância da regra
julgado procedente pelo Supremo, porque não havia inoperância. Aí se       geral da Precatória. Então, a reproposta de Súmula Vinculante número
encontra a relevância do caso Manoel Mattos, já que foi o primeiro a       4, de 2008, nesse sentido, demonstra que, realmente, o Supremo vem
ser julgado procedente e requerido o deslocamento para a Justiça Fe-       sendo muito firme com essas questões e surpreendendo, inclusive
deral do Estado da Paraíba. Então, realmente, o instituto ganha uma        determinando o pagamento de remédios caros, cirurgias até fora do
força muito grande com a decisão do STJ, e resta aguardar a apuração       país, dentro dessa perspectiva de direito à saúde.
dos fatos.
                                                                               Entrevista por: YULGAN TENNO e LEONARDO WRIGHT.
TRIBUNA—Qual o espaço de efetivação dos direitos sociais frente
                                                                               Acadêmicos da Faculdade de Direito em João Pessoa
aos novos paradigmas da interpretação constitucional?
                                                                               (UFPB).
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                                  DIREITO vs DIREITO
    APLICAÇÃO DO FICHA LIMPA: A FAVOR OU CONTRA?
          O Direito está longe de ser um mundo      lados. E, em um ramo do saber tão permeado           A mesma pergunta foi feita, de forma muito dire-
de unanimidades. Diferente das ciências exatas,     pelas divergências, a análise das construções ar-    ta, aos dois juristas: “O SUPREMO ACERTOU
nas quais a existência de uma resposta correta      gumentativas faz-se tão importante quanto o exa-     AO DECIDIR QUE A LEI DA FICHA LIM-
condena ao erro todas as demais, a Ciência do       me puro do fato em questão.                          PA NÃO SERIA APLICÁVEL ÀS ÚLTIMAS
Direito acolhe todos os entendimentos que ve-       É por isso que, nesta edição, a Tribuna da Justiça   ELEIÇÕES?” Eis as respostas, tão bem funda-
nham acompanhados de uma argumentação plau-         traz a opinião espontânea de dois grandes consti-    mentadas quanto divergentes, dos dois entrevista-
sível. Existe, a propósito, uma vasta discussão     tucionalistas - Dr. Solon Benevides e Dr. Vidal      dos
sobre se o Direito pode ou não ser definido como    Serrano Júnior – acerca da aplicabilidade da Lei
Ciência, com argumentos razoáveis em ambos os       da Ficha Limpa, aprovada em setembro de 2010.


            Vidal Serrano Júnior*                                                            Solon Benevides*

                   “EU ENTENDO QUE NÃO HÁ INCONSTITU-                                          “EU ACHO QUE A DECISÃO DO SUPREMO ESTÁ
  CIONALIDADE ALGUMA NA APLICAÇÃO DA CHAMADA                                       CORRETÍSSIMA. O art. 16 da Constituição Federal é muito claro,
  ―LEI DA FICHA LIMPA‖ EM 2010, portanto, creio que a posi-                        trata-se do principio da anterioridade da lei eleitoral. Se a lei altera o
  ção vencedora no Supremo Tribunal Federal, com apenas um voto                    processo eleitoral, ela só pode entrar em vigor um ano depois, e ela
  de diferença, tenha sido equivocada. A lei da ficha limpa, na verda-             alterou exatamente no ano da eleição, ferindo o principio da anterio-
                                                                                   ridade da lei eleitoral. O processo eleitoral citado na Constituição é
  de trata de inelegibilidade; são condições para as eleições e não para
                                                                                   abrangente, mas muitos querem restringir esse conceito, limitando-o
  o processo eleitoral. Portanto, não tem como se cogitar a aplicação              a alguns aspectos do processo eleitoral. Entendo que ele é abrangen-
  do Art. 16 da Constituição Federal,                                                                             te. Para o Supremo, o processo eleito-
  pois ele fala sim em anualidade, mas                                                                            ral compreende desde a alteração de
  para legislações que alterem o proces-                                                                          requisitos para o registro de candidatu-
  so eleitoral.                                                                                                   ra, até, por exemplo, a forma de se


                                                                           X
             Inelegibilidade é lei que                                                                            apurar os votos. Compreende, portanto,
  regula o conteúdo, a substância. São                                                                            qualquer etapa do processo eleitoral.
  condições para que a pessoa possa                                                                               Preciso deixar claro que sou a favor da
  viabilizar a candidatura, então não me                                                                          lei da ficha limpa. Todos desejam ex-
                                                                                                                  purgar da vida publica os maus políti-
  parece que esse dispositivo constituci-
                                                                                                                  cos, aqueles que cometeram ilícitos;
  onal que tenha se deslocado possa                                                                               contudo não se pode rasgar a Constitui-
  servir de pano de fundo para a não                                               ção. Na minha linha de raciocínio: a lei de ficha limpa é útil? Sim!
  aplicação da lei na última eleição.                                              Está correta a decisão do Supremo de aplicar o artigo 16? Sim, pela
             O processo eleitoral que aparece no artigo 16 fala de as-             abrangência do processo eleitoral.
  pectos procedimentais, relacionado às inscrições da candidatura, a                           Entendo que a Suprema Corte poderia dar interpretação
  impugnação da eventual candidatura, a formação dos pleitos, a apu-               conforme a Constituição Federal, com redução ou sem redução de
  ração, a formação das chapas, enfim, aspectos relacionados ao pro-               texto, em alguns dispositivos. Por exemplo: sobre a regionalização
  cesso e não à substancia das eleições e à condição de elegibilidade.             de uma decisão no sentido de que torna inelegível o cidadão já a
             Na questão da elegibilidade, temos várias condições colo-             partir de uma decisão colegiada em 2º grau, acho que fere o princi-
                                                                                   pio de presunção de inocência, o duplo grau de jurisdição. Se a
  cadas pelo texto Constitucional, como, por exemplo, a idade, e de-
                                                                                   Constituição diz que ninguém será considerado culpado até o trânsi-
  pois se criou mais algumas condições, que é a questão da ficha lim-              to final - e esse conceito não existe só em matéria penal - então você
  pa, a não condenação por colegiados, a não renuncia para se escapar              tem direito de percorrer as instancias superiores para rever essa
  de eventual processo de perda do mandato. Há, na verdade, um                     decisão. Se a matéria for constitucional, até o STF, se for matéria só
  elastecimento do rol de causas que impedem as eleições.                          eleitoral, até o TSE, e assim por diante.
             A posição minoritária dos cinco ministros que perderam a                           Retroação da pena é mais absurdo ainda. A não retroação
  votação é a posição mais adequada. Como nas próximas eleições já                 da lei é em campo de direito punitivo e se aplica em qualquer seara,
  vai ter passado mais de um ano e o artigo 16 não poderá mais ser                 desde que seja direito punitivo. Dizem que a questão de aplicação
  aplicado, existirão cogitações de outra natureza. O principal argu-              de penalidades pela lei eleitoral é condição de elegibilidade, mas
  mento daqueles que são contra a aplicação da lei da ficha limpa é a              não é. A lei complementar 64, em seu artigo 22, inciso XIV, diz que
                                                                                   “julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação
  questão da presunção de inocência. Eu acho inadequado tal argu-
                                                                                   dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e
  mento, pois temos uma disposição específica, que é o artigo 14, §                de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes
  9º, segundo o qual deve existir uma lei complementar que crie con-               sanção de inelegibilidade” e essa é a redação dada pela própria lei
  dição de inelegibilidade considerando a vida pregressa do candidato.             de ficha limpa. E o que é sanção? Sanção é punição, é pena! E se
  Diante de tal disposição que autoriza esse tipo de legislação, não há            disser que isso é só condição de elegibilidade, está errado.”
  que se cogitar o uso das formas de inconstitucionalidade.”
                                                                                            *Doutor em Ciências pela USP, professor de Direito
         *Doutor em Direito pela PUC-SP, professor de Direito                      Constitucional na UFPB, procurador do Estado da Paraíba e
  Constitucional na mesma casa e promotor de justiça em São                        advogado.
  Paulo.

                                                                       Entrevista por: LEONARDO WRIGHT. Acadêmicos
                                                                       da Faculdade de Direito em João Pessoa (UFPB).
ENTREVISTA
                                           12


                                                                               nomia, hoje, apesar de alguns percalços que sofreu, muitas mudanças es-
 Foto: portalmidia.net (acesso 09-06-11)




                                                                               truturais mesmo, hoje é mais uma economia centrada na atividade industri-
                                                                               al e no setor de serviços. Naquela época, nós tínhamos uma vida econômi-
                                                                               ca centrada sobretudo na agricultura e na pecuária. Na agricultura, nós
                                                                               tínhamos um tripé: era o algodão, o sisal e a cana-de-açúcar. O algodão e o
                                                                               sisal se inviabilizaram inteiramente por fatores diferentes um do outro,
                                                                               mas o resultado é que acabou a cultura do algodão e a cultura do sisal na
                                                                               Paraíba, os quais eram os dois esteios principais, porque elas se estendiam
                                                                               por quase todo o território.
                                                                                        Naquela época, a cultura de cana-de-açúcar ia desde o litoral até o
                                                                               brejo. No brejo, os engenhos e as poucas usinas que tinham fecharam com-
                                                                               pletamente. A cultura da cana-de-açúcar hoje ficou só na região litorânea.
                                                                               Em função disso, a economia da Paraíba direcionou-se para o setor indus-
                                                                               trial e para o setor de serviços. Então, a paisagem econômica hoje é intei-
                                                                               ramente diferente da minha juventude, da minha infância.

                                                                               Na Faculdade de Direito, como foi o contato com o professor Flóscolo
                                                                               da Nóbrega?
                                                                                       Ingressei na Faculdade, em 1954. Eu gostava muito dele, mas ele
                                                                               era ensimesmado. Nós tínhamos professores que se relacionam bem com
              JOSÉ TARGINO MARANHÃO:                                           os alunos, que criam um ambiente social bom. Não, ele não era homem de
             CONFISSÕES DE UMA HISTÓRIA                                        amizades. Ele era muito reservado, até meio tímido, de poucas palavras,
                                                                               mas uma pessoa muito boa. Como mestre, eu o achava excelente, e o livro
                                                                               dele, Introdução à Ciência do Direito, uma obra com uma pedagogia muito
         Eleito quatro vezes Deputado Estadual, três vezes Deputado Fe-        boa.
deral, três vezes Governador do Estado da Paraíba, além de Senador da
República, José Maranhão é um homem cuja atuação política perpassa             Qual foi a contribuição da Faculdade de Direito para sua vida?
meio século de vida paraibana. Suas posições políticas, no entanto, identi-            Acho que não há um curso mais universal, em termos de conheci-
ficam-no não só com o jovem José de 1955, o deputado estadual mais             mento, que o curso de Direito. É interessante que eu não pretendia fazer
jovem do Brasil, ou com o deputado estadual de 1969, cujo mandato foi          Direito, mas Engenharia Aeronáutica, pois sempre gostei de tudo que se
cassado pelo regime militar, mas com o político da vida inteira. Araru-
nense e graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba, nota-       ―(...)não há um curso mais universal, em ter-
bilizou-se pela vida de político e empresária, sendo um grande adminis-
trador moderno no gerenciamento da coisa pública. Dentre suas grandes         mos de conhecimento, que o curso de Direito‖
contribuições como político no Estado da Paraíba, destacam-se o Plano
das Águas, contemplando todas as regiões do Estado com barragens,              relacionava à aviação. No ano que eu ia fazer o vestibular em São Paulo,
açudes, adutoras além da interligação de bacias hidrográficas, atendendo       aconteceu uma crise política com minha família em Araruna. Fui surpreen-
às carências das regiões mais vulneráveis ao problema da seca; a expan-        dido com a ideia de ser candidato a Deputado Estadual.
são do Porto de Cabedelo; a criação do Hospital de Trauma; duplicação          Meu pai era um líder político e teve uma frustração com o Prefeito que
da BR-230 e a construção da PB-008.                                            elegeu, então, mobilizou todos, para uma reação contra a candidatura dele.
                                                                               Então, o objetivo do grupo era não deixar Celso ser o Deputado de Araru-
                                                                               na. Acho que era muito mais isso, que eleger um Deputado. Eu não sei se
                                                                               eles acreditavam muito que eu pudesse ser.
Sendo de Araruna, como foi sua vinda para a Capital?                                    Eu não sei se fluiu naturalmente. Foi uma grande surpresa. Daí eu
        É uma decorrência natural as pessoas virem, especialmente na
                                                                               ter mudado o curso para Direito, porque eu não podia fazer Engenharia
minha época, porque você não tinha nem Ensino Médio no interior, apenas
                                                                               Aeronáutica em São Paulo e ser Deputado na Paraíba. Como eu fui eleito,
em algumas cidades polos da Paraíba, como Patos, Souza, Cajazeiras. Na
                                                                               fui fazer Direito. Quando você é estudante e participa de política estudan-
região do Brejo, Bananeiras e Guarabira, havia um colégio de Ensino Mé-
                                                                               til, o caminho natural é o curso de Direito, mas não me julgava com voca-
dio só para mulheres e a Escola Técnica Agrícola, em Bananeiras. Areia
                                                                               ção para o curso.
tinha também uma Escola Técnica Agrícola que depois se tornou Faculda-
de de Engenharia Agronômica e acho que também de Veterinária. Então,
                                                                               Quais eram suas posições políticas à época?
como a gente não tinha condições de prosseguir estudando no interior, ia
                                                                                       Sempre fui fiel a meus ideais. Como todo jovem idealista, a minha
para a Capital. Eu fui aluno interno do colégio de Manuel Neri, Colégio
                                                                               posição era, naquela época, a defesa de um Estado brasileiro soberano e
Monsenhor Valfredo. Depois fui aluno do Pio X aqui, em João Pessoa, e,
                                                                               independente e o confronto com o imperialismo americano. Isso era tema
em Natal, no Santo Antônio, que também era Marista. Voltei para Recife e
                                                                               recorrente na cabeça da grande maioria dos jovens brasileiros. Fundei,
vim para João Pessoa. Recife era o caminho de todos os estudantes que
                                                                               aqui, na Paraíba, a Frente Parlamentar Nacionalista. Isso depois me valeu a
queriam chegar ao curso superior. Foi assim que eu cheguei a João Pessoa.
                                                                               cassação, quando eclodiu o golpe militar de 64, que era, na verdade, não
                                                                               um movimento nacional, mas um movimento antinacional. Era um movi-
Que elementos bons a Paraíba manteve e quais perdeu, desde aquela              mento de subordinação, de submissão aos interesses da política colonialis-
época?                                                                         ta americana. Então, aquelas ideias nacionalistas passaram a ser mal vistas
        Acho que todos nós temos um pouco de saudosismo. Na realidade,
                                                                               pelo regime. Alguns foram cassados imediatamente. Outros foram cassa-
a Paraíba cresceu. A Paraíba de hoje não é mais a Paraíba da minha infân-
                                                                               dos com o advento do AI-5, o Ato Institucional nº 5.
cia. O que tinha de bom na Paraíba era a maior proximidade entre as pes-
                                                                                       Então, quando foi editado o AI-5, eu já estava com dois ou três
soas. O Estado como um todo, João Pessoa especialmente, era um núcleo
                                                                               IPMs (Inquérito Policial Militar) por conta dos manifestos que nos tínha-
social pequeno e as pessoas podiam se dar o luxo de conhecer e de fre-
                                                                               mos feito na Paraíba. Aí eu não sobrevivi mais. Eu ainda fui candidato na
quentar os mesmos ambientes sociais, os mesmos clubes sociais. Hoje não
                                                                               eleição de 66. Em 64, eu já era Deputado, estava no meio do mandato e,
tem clubes sociais mais. Acabou. A vida estudantil era muito cordial, mui-
                                                                               em 66, houve a renovação, e eu fui novamente eleito. Em 69, fui cassado,
to próxima... É essa a diferença positiva.
                                                                               com o AI-5.
        No mais, eu acho que a cidade cresceu. O Estado cresceu. A eco-
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  • 1. Iniciativa doa estudantes UM INFORMATIVO INOVADOR da Paraíba. Maior –Junho (modificada). Ano 1. N 2. de Direito da Universidade Federal PARA NOVOS TEMPOS O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS Por: Igor Isídio e Yulgan Tenno “(...) Em meio à preparação das comemorações dos 60 anos da Faculdade de Direito, deve subsistir a vergonha de brin- dar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desa- ba sobre nossas cabeças”. P.8 , P.9. Infiltrações no teto da Faculdade de Direito JP (UFPB). Direito vs Direito P.11 Veja as opiniões opostas de dois grandes juristas a JOSÉ TARGINO respeito da decisão do STF em aplicar a lei do MARANHÃO “Ficha Limpa” nas elei- ções de 2010. Por: LEO- ―Eu cumpri meu dever, fiz o que era NARDO WRIGHT. possível e importante‖ O ex-Governador da Paraíba dá sua primeira Internacional entrevista após as eleições de 2010. Em meio a P.4. um espetáculo de confissões, Maranhão comenta o Golpe Militar de 64, sua posições políticas e A morte de Osama Bin Laden marca o início de ideológicas e fala da gratidão de fazer parte da uma nova era para a hu- construção histórico-política do Estado da Paraí- manidade. Estamos a ba. P8 , P.9. salvos do terrorismo in- ternacional? A análise dos fatos: TERRORIS- MO. Por JAN MARCELL. PEDRO LENZA A pedido da TRIBUNA, um dos maiores Saber Direito P.6 Criminal autores em Direito Constitucional do Bra- sil, Pedro Lenza, comenta o caso Manoel 10%, ilegal ou imoral? Saiba qual o grau de lega- Mattos à luz da constitucionalidade da lidade na cobrança dos EC.45 e sua repercussão para o meio jurí- 10% nos restaurantes e dico. Além de atentar para o novo espaço bares da capital e para de aplicação dos direitos sociais frente a onde vai o excedente. POR jurisprudência do STF. P1O. MATHEUS CHAVES. UM INFORMATIVO INOVADOR PARA NOVOS TEMPOS
  • 2. 2 IGOR ISÍDIO AMANDA GURGEL E OS INTERNAUTAS LEGIFERANTES “Como sempre colocam que os números são irrefutáveis, eu sociais, que deve ser o ambiente onde a sociedade civil e a esfera gostaria de apresentar um número composto por três algarismos ape- pública florescem.” Em termos de mobilização política, a grande rede nas, (...) que é o número do meu salário: um nove, um três e um zero. tem hoje um poder de contaminação tão proeminente que já existem Novecentos e trinta: meu salário-base. (...) Certamente esse salário não empresas especializadas em canalizar esse potencial. É o caso da Avaaz, é suficiente para pagar nem a indumentária que os senhores e as se- uma organização de mobilização online, atuante em 193 países, que nhoras utilizam para poder frequentar esta Casa.” ganhou espaço no Brasil após coordenar a bem-sucedida campanha pela Foram estas as primeiras palavras do depoimento da professo- aprovação da Lei da Ficha Limpa. Utilizando-se da velocidade de ra Amanda Gurgel, proferido em audiência pública da Assembléia Le- comunicação típica da web para catalizar suas ações, a organização gislativa do Rio Grande do Norte, sobre o cenário real da educação naquele estado. Diante do silenci- ―(...) um simples clique, reverberado no gigantesco universo oso constrangimento dos parlamentares, ela inter- da internet, passou a ser um ato político tão importante rogou: “Estão me colocando dentro de uma sala de quanto transformador‖ aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil, é isso?” O vídeo do discurso, postado no Youtube há apenas três sema- trabalha basicamente com a coleta de assinaturas e envio de petições nas, já foi assistido por quase dois milhões de internautas. Não só por aos congressistas. Em seu site, acessado mundialmente por mais de ser mais um dos muitos “virais” que alçam desconhecidos à fama com a nove milhões de pessoas, conclama a adesão dos internautas brasileiros instantaneidade de um clique, o depoimento da professora potiguar a campanhas como “Proteja o Brasil do Bolsonaro” ou “Pare Belo chama a atenção por evidenciar um fenômeno recente, potencializado Monte - Não à Mega Usina na Amazônia”. pelo avanço das ferramentas de comunicação: o ativismo político onli- As novas tecnologias na comunicação vêm contribuindo, ne. sobretudo, no fortalecimento da sociedade civil organizada perante o Tuitado e retuitado milhares de vezes - na mesma velocidade Legislativo. A vontade popular manifesta-se agora de forma mais orga- com que estes novos verbos foram absorvidos - o vídeo deflagrou a nizada, pois interesses semelhantes rapidamente se aglutinam e se mo- campanha que atualmente reúne assinaturas para uma petição pública bilizam a partir do ambiente virtual, exercendo sobre as ações dos parla- em favor do aumento de recursos destinados à educação. A mobilização mentares uma pressão, por uníssona, mais homogênea. Pode parecer em muito nos lembra a que levou à aprovação da “Lei da Ficha Limpa”, assustador àqueles que ainda não internalizaram os sentimentos de de- iniciada com um projeto de lei de iniciativa popular, fortalecido pela mocracia, mas, no frenético ritmo da atualidade, o postar de um simples reunião de mais de dois milhões de assinaturas. Tamanha força acelerou vídeo no Youtube ou de um texto em um blog passou a ter tanta relevân- sobremaneira a tramitação do projeto, em ambas as Casas do Congresso cia política quanto qualquer pronunciamento nas sessões solenes do Nacional, que em menos de um ano passou a vigorar como Lei Comple- Congresso Nacional. Um anônimo (mesmo uma professora primária) mentar nº 135/2010. E a grande maioria dos signatários tomou conheci- pode, instantaneamente, tornar-se político; os internautas, organizados, mento, aderiu e deu suporte à campanha através da internet. podem ser verdadeiros legisladores; um simples clique, reverberado no Ainda são escassos e incipientes os estudos da Ciência Políti- gigantesco universo da internet, passou a ser um ato político tão impor- ca brasileira sobre esse tipo de ativismo político, conhecido internacio- tante quanto transformador. nalmente como cyberativismo (ou E-activism), mas o fenômeno já é estudado há quase uma década por pesquisadores europeus e norte- IGOR ISÍDIO. Acadêmico da Faculdade de Direito americanos. Desde 2002, por exemplo, o havardiano Pippa Norris já em João Pessoa (UFPB). dizia que, “em suma, as tecnologias digitais facilitam a maior das redes CONSELHO CONSULTIVO Dr. Delosmar Mendonça Dr. Marcílio Franca Dr. Solon Benevides Leia TRIBUNA, promova JUSTIÇA @tribunajustica CONSELHO EDITORIAL HENRIQUE LENON IGOR ISÍDIO MIGUEL CÂMARA PEDRO ATAÍDE YULGAN TENNO
  • 3. CARTA 3 AO LEITOR A TRIBUNA E A JUSTIÇA ENTRE TRADIÇÃO E INOVAÇÃO Este informativo, como espaço de difusão de ideais e direitos, cada indivíduo é também um ponto de emergência de opini- de instrução acadêmica, acende o farol da justeza em uma cultura ões próprias e soberanas. Eis por que os autores dos textos que publi- mundial de novidade. Os povos se inserem, há algum tempo, em uma camos têm liberdade ideológica e desembaraço criativo. cadeia de progresso ordenado, que tem a inovação como regra. Entre tradição e inovação, este informativo firma-se Essa pulverização do novo só é possível por meio da sob o signo duplo da competência e da independência. Nestas páginas, difusão do indivíduo, que hoje com- falam põe, nas palavras de Rodriguez Ibarra, nomes uma “sociedade invisível” – além da institucionalizada – e, para nós, quebra ―Nosso trabalho busca a mudança, históricos da Paraí- as barreiras da invisibilidade social. Usando o Twitter, o Facebook e o mas não renegamos princípios...‖ ba, como Ronaldo Google, Um com Outro provam que a Cunha liderança não está apenas configurada no corpo social subordinado, Lima e José Maranhão, alternam-se juristas consagrados, como Dr. pelo contrato político, a representantes constituídos. Líderes emergem Genival Veloso e nossos conselheiros, e publicam-se escritos de estu- da população-em-si; pactos e acordos institucionais renovam-se; criam dantes universitários. Promovemos ainda debates com figuras inova- -se novas linguagens e tecnologias do poder. doras do cenário nacional, como Maria Berenice Dias e Marianna Se, nas sociedades feu- Chaves, dais, a individualização estava apenas nas regiões altaneiras da autoridade – ―Nosso norte é a grandeza, mas sem a membros do Insti- sendo sua medida –, atualmente, a indi- tuto Bra- vidualidade volta a acompanhar o po- der, desta maneira: cada indivíduo po- arrogância de outrora.‖ sileiro de Direito de de, a partir de si, inovar e transformar. Esse foi o exemplo das recen- Família. tes revoluções árabes, que obedeceram à potência virtual do Eu e de Nesse sentido, é alvissareiro sermos procurados por seus Followers. acadêmicos e por profissionais do direito, por leigos e por mestres, os Por outro lado, também a política ocidental se recons- quais querem colaborar, ou trabalhar conosco. Nosso trabalho busca a trói. O nacionalista Humala vence no Peru, reforçando uma aliança mudança, mas não renegamos princípios, tampouco nos subordinamos continental, e o PSD português – tendo um homônimo brasileiro em integralmente a eles. Nosso norte é a grandeza, sem a arrogância do gestação acelerada – toma dos socialistas o Governo luso. A nova século XX. direita francesa, com Marie Le Pen, advoga o fim da globalização, enquanto a esquerda acadêmica propõe a construção de uma contra- hegemonia dentro do sistema globalizado. HENRIQUE LENON FARIAS GUEDES Nesses novos tempos, reforçar bens tradicionais, como Presidente do Conselho Editorial o “justo”, parece contraditório, mas não embarcamos na estática esté- tica do valor imutável, e sim na dinâmica que busca um conceito. A tradição nos envolve e dela absorvemos o que é necessário, porquanto a estrutura de nossa perspectiva é cognitiva. Afinal, a proposta da Tribuna da Justiça não é a verti- calidade travestida de vanguardismo libertador, mas a horizontalidade dos que se submetem coordenadamente a pressupostos de investiga- ção da verdade. Se o sujeito social é um ponto de convergência de COMISSÃO JORNALÍSTICA DIRETOR-GERAL DIRETORIA DE REDAÇÃO DIRETORIA EXECUTIVA YULGAN TENNO IGOR ISÍDIO PEDRO ATAÍDE E RAFAEL MENEZES yulganfarias@hotmail.com Vice: MATHEUS CHAVES pedrinhoataide@hotmail.com Leia TRIBUNA, promova JUSTIÇA igor.isidio@gmail.com foirafa@gmail.com Tribuna da Justiça é uma publicação dos estudantes de Direito da UFPB. DIRETORIA DE REPORTAGEM DIRETORIA COMERCIAL DIRETORIA DO TESOURO tribunajustica@gmail.com NAYANNA SABIÁ VINICIUS PAIVA ILDECI TAVARES @TribunaJustica nayannasabia@hotmail.com vinicius@ejaconsultoria.com.br ildeci_filha@hotmail.com Fundadores: Henrique Lenon e Yulgan Redator: Guilherme Anacleto; Tenno Colunistas: Caroline Falcão, Danilo Moura, Heitor Toscanos, Jan Marcel, Matheus Chaves, Rafael Menezes; Projeto Gráfico: Repórteres: Ítalo Di Lucena; Uane Junilhia; Sérgio Sombra Consultores Comerciais: Thiago Lima, Ygor Fernandes, Yure Tenno; Tiragem Mensal: Mil exemplares Colaboraram nesta edição: Larissa Maranhão, Leonardo Wright, Nathan Wanderley, Ingride Ferreira, Luana Vas- conelos, Fotografia: Yulgan Tenno
  • 4. 4 INTERNACIONAL Por: Jan Marcell ANÁLISE DOS FATOS: MORTE DE OSAMA BIN LADEN E O TERRORISMO INTERNACIONAL NO PÓS-11 DE SETEMBRO Os atentados terroristas de 11 de setembro, a reeleição. Advogados do Brasil, Cezar Britto, releva que há a nos Estados Unidos, trouxeram um sentimento de predominância da concepção da “Teoria Bush”, cuja vulnerabilidade em nível internacional. A tolerância Um inimigo a menos: análise e críticas à ofensiva idéia é que: “para combater crime, tudo é possível, dos países diminuiu, consideravelmente, em especial, norte-americana inclusive violações a normas internacionais”. Ele a norte-americana, o que levou o presidente George ainda conclui que: "a não submissão à legislação dos W. Bush a declarar guerra a todos os grupos terroris- Na madrugada do dia 2 de maio de 2011, tribunais internacionais e o ato patriótico formam um tas. A primeira atitude do governo norte-americano Obama anunciou a morte do principal idealizador do sistema de auto-proteção dos EUA". foi planejar a derrubada do regime Talibã, no Afega- terrorismo internacional, responsável pelo atentado A decisão de não divulgação de imagens da nistão, e capturar Osama Bin Laden. de 11 de setembro de 2001 e líder da rede terroristamorte do terrorista, como exemplo do auto-sistema Em consequência do conhecimento adqui- Al-Qaeda. Através de uma articulada ofensiva da norte-americano, gerou ceticismo de grande parte do rido em outras experiências no oriente médio, a força armada norte-americana, tropa Seal, melhor mundo, principalmente do Oriente Médio. Com a política norte-americana objetivou melhorar sua tropa de operações dos EUA, os militares invadiram justificativa de não incitar grupos terroristas, o go- imagem no exterior e ter uma relação pública de o complexo que abrigava Bin Laden, na cidade de verno dos EUA aumentou a insatisfação quanto à combate aos terroristas. Conforme aponta Fraser Abbotabad, Paquistão. Em confronto direto, ao che- arbitrariedade das suas decisões, como de declarou Cameron, em sua obra sobre a Política Externa Ame- garem ao quarto do terrorista, os norte-americanos Ismail Haniyeh, líder do movimento palestino Ha- ricana no Pós-Guerra Fria, em 2003, os estaduniden- atiraram contra Bin Laden e sua esposa. mas: "Se esta notícia é verdade, pensamos que se ses, apoiados no patriotismo e na opinião pública, Segundo informações norte-americanas, o trata da continuidade da política de opressão ameri- fizeram com que o olhar do mundo para o país se terrorista morreu com um tiro na cabeça e outro no cana baseada no derramamento de sangue dos árabes tornasse uma forma de cooperação contra possíveis peito. E, ao se colocar a frente do marido, a esposae dos muçulmanos". Já o padre Frederico Lombardi, ameaças terroristas. do terrorista foi ferida com um tiro na perna. Após porta-voz do vaticano, criticou a polêmica comemo- Nesse contexto, é importante lembrar que exames de DNA, o corpo do terrorista foi sepultado eração dos norte-americanos à morte do terrorista. o terrorismo não é um fenômeno novo. Enquanto atirado ao mar, seguindo tradições islâmicas. No Para ele, não deviam se alegrar, pois há a expressão política, por exemplo, o termo “terror” entanto, como aponta Noam Chomsky, em artigo "responsabilidade de cada pessoa perante Deus e surgiu com a Revolução Francesa, em seu período de para a revista “Guernica”: “em sociedades que pro- homens". Espera ainda que: "não seja uma ocasião maior violência. No entanto, nos últimos tempos, fessam certo respeito pela lei, os suspeitos são deti- para mais ódio, mas para paz." pelos impactos provocados, esse termo vem ganhan- dos e passam por processo justo”. A morte do terro- A segurança internacional vive um momen- do maior destaque. Embora haja a percepção de que, rista, realizada de forma planejada pelos norte- to problemático, pois se questiona como será a reper- cada vez mais, o tema é estudado e debatido, ainda americanos, fere diversas normas de Direito Interna-cussão da morte do principal articulador do Terroris- não há um consenso acerca de sua definição oficial. cional. Por ter sido uma ofensiva em solo paquista- mo Internacional. Em pronunciamento oficial após a Segundo Raymond Aron, no livro “Paz e Guerra nês sem a autorização desse país, viola principalmen- morte de Bin Laden, Obama fala ao povo norte- entre as Nações”, em 1962: “Uma ação violenta é te o princípio da soberania dos Estados. americano como se a morte do terrorista fosse um chamada de terrorismo quando os seus efeitos psico- Como membro da ONU, outra infração ato derradeiro do terrorismo internacional. Contudo, lógicos são desproporcionais ao seu resultado pura- norte-americana foi o não respeito às normas de o ato do governo americano pode incitar outras célu- mente físico”. Ou seja, os efeitos psicológicos dos Direitos Humanos, cujo princípio básico é o direito à las da Al-qaeda a promover atentados contra seu atentados de 11 de setembro, entendidos como contra vida, como bem destaca Paulo Luiz de Toledo Piza, próprio território e aliados. A imprevisibilidade do todo o povo norte-americano ou até a civilização professor da GVLaw. Para ele, o direito ao julga- terrorismo, portanto, põe em xeque o futuro da segu- ocidental, foram bem maiores que os efeitos físicos mento também é violado pelos norte-americanos. rança internacional. (Ataque às duas torres gêmeas do World Trade Cen- Contudo, o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, ter, ao Pentágono e a morte de aproximadamente declarou que: "A morte de Osama Bin Laden, anun- 3000 pessoas). ciada pelo presidente Obama, na última noite, é um JAN MARCELL . Mestrando em Relações Interna- Com a eleição de Barack Obama, em momento divisor de águas em nossa luta global cionais (UEPB ) e acadêmico da Faculdade de 2009, oposição ao governo de Bush, há uma pressão comum contra o terrorismo". Na mesma linha, serviu Direito em João Pessoa (UFPB). por uma nova estratégia política contra o terrorismo. de alívio e reafirmação para diversos representantes Contudo, Obama manteve alguns nomes da gestão internacionais. do governo anterior, como o secretário de Defesa, Ao mesmo tempo, a ofensiva norte- Robert Gates. Conseqüentemente, Gates foi respon- americana contra o terrorista traz uma problemática sável por uma estratégia de continuidade e ruptura maior do que os princípios da lei, pois envolve patri- com a gestão de Bush, objetivando o controle do otismo, a moral e a ética não só do povo estaduni- Afeganistão e da região fronteiriça com o Paquistão. dense, mas também da civilização ocidental. Ou seja, Em 2011, em um momento de contestação ao gover- a morte de Bin Laden nos mostra ainda a fragilidade no Obama, essa estratégia consolidou a morte do de normas de Direito Internacional. Em matéria do terrorista Osama Bin Laden, no Paquistão, e repercu- site Consultor Jurídico, o presidente da Comissão tiu no fortalecimento da campanha de Barack Obama Nacional de Relações Internacionais da Ordem dos
  • 5. RAMON CAVALCANTI 5 O DIREITO À LITERATURA O utilitarismo é o princípio hegemônico na contemporaneidade. pessoas, mormente por causa da estrutura que a caracteriza, daquilo que Anto- Com o estabelecimento do primado da técnica, depois da Revolução Industrial, nio Candido denomina “força da palavra organizada”. A obra literária, como o valor dos objetos, das ideias e das pessoas passou a ser determinado, em objeto construído, transfigura a realidade e permite aos indivíduos que travam grande medida, pela utilidade e pela aplicabilidade imediata. Nesse contexto, a contato com ela experimentar algo que poderia ser chamado de experiência Literatura, como a Filosofia e as demais artes, foi, sistematicamente, desafiada concentradora de vida. Não menos importante, na efetivação da função a justificar sua existência e sua continuidade, com fundamento em algum uso humanizadora da Literatura, é a contribuição dela à capacidade de os objetivo, verificável pelos métodos tecnocientíficos. O literário, em sentido seres humanos representarem e comunicarem suas subjetividades, bem amplo, nunca deixou de ser buscado pelas pessoas, como uma necessidade, como a realidade, conforme eles a assimilam. A Literatura humaniza, por- apesar das contestações utilitaristas. A obra literária é um constructo que, por que, ao mesmo tempo, potencializa a vida e porque torna mais acessível a meio, principalmente, de sua estrutura e de seu significado, exerce poderosa complexidade do real. função humanizadora nos indivíduos. Em virtude do efeito humanizador exercido pela Literatura, Antonio Malgrado a Literatura consista, ao mesmo tempo, em uma forma de Candido considera que o acesso a ela deveria ser um direito humano. Na medi- expressão e em um meio de conhecimento, o aspecto que define o literário é da em que a busca do literário, da fabulação, é uma necessidade perceptível em sua condição de constructo, com uma estrutura e com um significado integra- todos os seres humanos, a fruição da Literatura deve ser garantida. Essa busca dos. A obra literária pode comportar qualquer conteúdo, desde que esse esteja comum a todos é explicável, pelo fato de que a ampliação da capacidade de ordenado e articulado de maneira particular, caracterizada pela exploração representação da realidade e de apreensão da complexidade da existência con- intensa dos meios expressivos de uma língua. Diferentemente do que muitos fere às pessoas meios essenciais à consecução da felicidade. Essa proposta pensam, o objeto da obra literária não é, necessariamente, a ficção, como é coaduna-se com a tendência de reconhecimento de que o que deve ser concebi- possível verificar em obras memorialistas, como Minha formação e Baú de do como necessidade humana primordial ultrapassa os aspectos meramente ossos, ou em ensaios, como Os sertões e Casa-grande & senzala, todos, de materiais que possibilitam a sobrevivência do organismo biológico do ser hu- modo inequívoco, detentores de um nível elevado de literariedade, em decor- mano. rência da maneira como são estruturados. As possibilidades que o contato com a Literatura oferece aos indiví- Concebido de forma ampla, o literário pode manifestar-se não ape- duos, as quais apresentam riscos e perigos, como a vida de que ela é imagem, nas por meio dos gêneros tradicionais, como conto, romance, poesia, mas tam- são inúmeras. Sem distinção de classe social ou de idade, a experiência do bém por filmes, por telenovelas, por músicas ou por outros modos. De acordo literário, em suas amplas possibilidades de manifestação, é uma necessidade com a opinião expressa por Antonio Candido, no ensaio “Direitos humanos e dos seres humanos, o que decorre do efeito humanizador que a obra literária, literatura”, embora não se deixem de reconhecer as especificidades de cada como objeto construído, provoca neles, por meio de sua forma de estruturação. linguagem, há literariedade nessas manifestações, inclusive, porque usam, em O referido efeito, por constituir um meio essencial à realização plena do ser sua elaboração, a palavra organizada. O teatro, de forma geral, filmes como humano, deve ser considerado um direito fundamental, garantido a todos indis- Laranja mecânica, em que há intensa estilização da linguagem verbal, assim tintamente. como músicas de compositores como Caetano Veloso, Chico Buarque e Arnal- do Antunes, corroboram a ideia de que o literário permeia, além da Literatura Ramon Limeira Cavalcanti de Arruda. Bacharel em Filosofia pela em sentido estrito, outras formas de expressão humana. UFPB. Oficial de Chancelaria. A Literatura, em todas as suas maneiras de existência, humaniza as IMAGEM DO MÊS @TRIBUNAJUSTICA ACESSO: 09 DE JUNHO DE 2011 Matar só não é desumano quando a vida sacri- ficada menos desumana for. Ele merecia ter sido julgados pelos seus cri- mes e não ser motivo de festa por sua morte... A morte de Osama Bin Laden é um exemplo típico de se fazer um mal necessário a fim de assegurar um bem maior. “Olho por olho, World Trade Center por Bin Laden. É ou não é uma guerra de símbolos?” A alegria regada de sangue, deixa de lado os D.Humanos, fato lamentável. além da arbitrariedade do ato, é revoltante a felicidade burra do povo mostrada na imagem.
  • 6. 6 SABER DIREITO Por: Matheus Chaves João pessoa, 11 de abril de 2011 A NÃO OBRIGATORIEDADE DA GORJETA E OS GARÇONS Idas a bares e restaurantes são momentos, em geral, marcados Quanto à cobrança obrigatória aos consumidores, entende-se pela descontração e tranquilidade. Entretanto, algumas práticas nestes que há ofensa clara ao princípio da legalidade, inscrito no inciso II, do locais despertam dúvidas e questionamentos, a exemplo da cobrança artigo 5º da Constituição Federal, que manifesta que "ninguém será de gorjeta, taxa de serviço, ou o popular "10%", bem como a sua obri- obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de gatoriedade. lei". Tal cobrança também é considerada abusiva, implicando em in- As gorjetas encontram previsão legal no caput do artigo 457 compatibilidade como Código de Defesa do Consumidor que veda da Consolidação das Leis do Trabalho, que destaca que práticas e cláusulas abusivas nas relações de consumo. "compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efei- No que diz respeito ao salário dos trabalhadores que recebem tos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, pagamento variável, sejam por comissões, porcentagens, prêmios ou como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber". O parágra- gorjetas, a Constituição Federal de 1988 trouxe como inovação para a fo terceiro do referido artigo também destaca que é considerada ordem jurídica nacional: o inciso VII do artigo 7º que estabelece a "gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao "garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao remuneração variável". Ou seja, os empregados, ainda que não tenham cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à salário fixo, possuem uma garantia mínima salarial. distribuição aos empregados". Corroborando a não obrigatoriedade do pagamento das gorje- Analisando os citados dispositivos legais, a doutrina do direito tas pelos consumidores, inúmeras decisões judiciais ratificam estes do trabalho entende que por opção de política legislativa a gorjeta é entendimentos. Nestas circunstâncias, reforçamos a não obrigatorieda- considerada como parte do salário, mais precisamente da remuneração. de do pagamento de gorjeta aos garçons pelos consumidores. Entretan- Entende-se também que esse artigo é importante na proteção do direito to, sendo possível, exercitemos nossa cortesia e façamos sim o paga- dos trabalhadores, entretanto, não vincula, nem obriga o consumidor a mento das taxas de serviço, pois é delas que se valem os funcionários pagar gorjeta, mas se este o fizer, diretamente a quem o atender ou de bares e restaurantes para complementar seu (geralmente ínfimo) indiretamente por meio de cobrança do estabelecimento, esta gratifica- salário. ção deve pertencer aos empregados e não aos empregadores. MATHEUS CHAVES. Acadêmico da Faculdade de Direito em João Pessoa (UFPB). REGIONAL Por: Heitor Henriques CHICO CÉSAR, A PROTEÇÃO DA CULTURA E OS DISCURSOS PLASTIFICADOS Tenho acompanhado toda essa discussão sobre o corte de investi- Antes que se monte um cavalo-de-batalha em torno desse corte, mento por parte da secretaria de cultura da Paraíba, capitaneada por atitude corrente de uma oposição tradicionalmente panfletária e plas- Chico César, ao São João de Campina Grande e os tais “forrós de tificada tal qual o forró em questão, é bom lembrar-se da difícil situa- plástico”. Mais do que observado, tenho me espantado com alguns ção financeira em que se encontra nosso orçamento. Não é só a preo- posicionamentos de parte da imprensa paraibana, principalmente no cupação com a preservação cultural que está em jogo, mas sim a vida meio eletrônico. Decerto que poucos são os segmentos comunicativos financeira de um Estado que não anda lá bem das pernas. que gozam de imparcialidade, contudo há de se resguardar um míni- Foi anunciado que o FENART, evento realizado anualmente no mo de bom senso para avaliar a questão. Espaço Cultural (que em 2010 homenageou Sivuca) foi cancelado Muita gente falou que o secretário/músico catoleense queria impor, para esse ano. Motivo: o governo passado não quitou a dívida com os tal qual um ditador, o gosto dos paraibanos, reforçando a ideia de que artistas que fizeram os shows do evento. Se nem mesmo um soldado essa intransigência acarretaria em uma diminuição do potencial lucra- de reserva cultural mais tradicional como é o FENART não vai ser tivo do evento. realizado devido a questões financeiras, quem dirá patrocinar as ban- É importante lembrar que o governo não pronunciou que vai deixar das de forró plastificado/estilizado que, além de publicar o total desa- Campina Grande e seu maior evento cultural, que gera gordas rendas pego às raízes, nos brinda com belíssimos versos como: através do turismo, à míngua. Somente foi dito que o parco dinheiro “Cachaça, cachaça, cachaça eu te amo de nosso pobre Estado não será utilizado para contratar bandas de Cachaça, cachaça, cachaça eu te adoro “forró” que se distanciam bastante do grave do zabumba e do agudo Cachaça, cachaça você é meu vício do triângulo e cobram valores exorbitantes por cada apresentação. Preciso te dizer que sem você eu não vivo.” A produção musical brasileira, em tempos negros de censura e Aceitar novas tendências não significa virar refém de um único opressão, resistiu poeticamente, propagando os mais belos ideais de estilo musical. Todos os ritmos que agradem podem ser aceitos. Mas liberdade. O tempo passou, a Constituição veio e a liberdade tão so- o Estado tem direito sim de forjar o aperfeiçoamento cultural do pró- nhada está aí. Mas e agora? O Estado deve ser absenteísta a ponto de prio povo, como forma de educá-lo. Como bem falou Ariano Suassu- não se importar com a identidade cultural do seu povo? Sinceramente, na, quando perguntado sobre a polêmica: “hoje em dia, o papel do não é possível entender a opinião de quem carrega a bandeira dessa Estado equivale ao papel da Igreja, no sentido de criar condições para liberdade musical desenfreada e desse “new forró”, que faz apologias os verdadeiros artistas.‖ descaradas à coisificação da mulher e ao alcoolismo. São apenas pas- Caso contrário, em breve esqueceremos nomes como Domingui- tiches dessas bandas estrangeiras, que estão bem distantes do nosso nhos, Santana, Flávio José, Geraldo Azevedo, Os Três do Forró, forró verdadeiro. Nordestinos do Ritmo, Aldemário Coelho, Alcymar Monteiro, A tese do respeito aos mais diversos estilos é válida e essencial Aleijadinho de Pombal, Pinto do Monteiro, entre outros. para a consolidação do ideal democrático da sociedade. Todavia, o Estado não pode fechar os olhos para a sua cultura e tem todo direito HEITOR HENRIQUES . Acadêmico da Faculdade de direcionar seus investimentos no sentido da valorização do seu povo, das suas raízes e tradições. de Direito em Guarabira (UEPB).
  • 7. YURE 7 ORDEM TENNO PRATICANDO A ―INCLUSÃO DO OUTRO‖: UMA OBSERVAÇÃO QUANTO A RETÓRICA DOS DEBATES POLÍTICOS A relação política e pública entre dois sujeitos políticos que cepção de pessoas não participantes (crianças, mulheres) gradativa- representam interesses, pontos de vista e ideologias antagônicas ou mente se perde toda a atenção para suas características humanas; no diferentes, que dividem o mesmo espaço público, de onde emanam as final, todos os membros dos grupos que presuntivamente são atribuí- decisões, torna-se deficiente quando ocorre o fechamento de um sujei- dos ao inimigo são considerados apenas como objetos inanimados, to em relação ao outro, fenômeno esse conhecido como “reificação” coisificados.” entre os sujeitos políticos que compõem o debate público. Em um mundo reificado ocorre isso, não sabemos quem o Isso ocorre quando o sujeito “A” não reconhece o sujeito “B”, outro é, vemos o que ele faz, vemos se oporem contra nós, vemos eles não tenta compreender nem entender as razões e contrarrazões das reagindo contra nossas ofensivas, mas não perguntamos, não nos en- propostas. O sujeito “B” torna-se para o sujeito “A”, opaco e incom- volvemos com sua humanidade e com a humanidade de nossas razões. preensivo. Axel Honnet concebe esta relação como um estado de au- A afecção existencial possibilitada pelo reconhecimento elementar de tismo: pois assim, como no mundo dos autistas, o outro não é visto que nos fala Honneth impossibilita a atitude ética que deveríamos ter. com a devida empatia humana, de seres que se reconhecem como Fechar-se ao outro nos coloca na complicada situação de pre- iguais e que por isso possuem a mesma dignidade. Para ele “a reifica- sunção sobre o outro, como não nos envolvemos pelas entrelinhas de ção pressupõe que nós nem percebamos mais nas outras pessoas as uma abertura existencial que seria compartilhada, não podemos fazer suas características que as tornam propriamente exemplares do gênero outra coisa senão absorver as ações de uma “coisa”, presumindo todas humano: tratar alguém como uma “coisa” significa justamente tomá-la as razões, essa é a perspectiva do observador e não do partícipe. De- (o) como “algo”, despido de quaisquer características ou habilidades mocracia se consolida com essa aprendizagem de participação, que só humanas.” se realiza na abertura existencial, na (re-)educação sentimental para o Esse modo de proceder cria a necessidade de segregação e a discurso heurístico e não para o erística. tentativa de criar fronteiras bem definidas, como se nada fosse idênti- A presunção pode nos levar ao maniqueísmo improprio e des- co entre as duas perspectivas. É ilustrativa a predisposição que temos proporcional, que poderia ser resolvido apenas perguntando ao “auter” de tentar colocar politicamente todo mundo no saco da esquerda ou da quem ele é e o que propõe. Ocorre toda uma estruturação de pré- direita. Em termos definitivos não temos critérios para a decisão, mas conceitos (no sentido hermenêutico) sem que esses pré-conceitos se- os efeitos psicológicos da rotulação é sentido por quem sofre e por jam construídos com a participação desses sujeitos. É a figura do índio quem age de acordo com a mesma. descrita pelo europeu sem se perguntar o que o índio pode contribuir A grande questão que defendo, é que o fechamento ao outro para sua conceituação. também implica no fechamento de dimensões do diálogo que são de Em termos de danos à práxis democrática, o perigo se realiza extrema importância para as ponderações e os convencimentos, que pelo déficit de racionalidade nas decisões, como foi dito. O déficit é aquilatam as duas versões da história com o mesmo tratamento refle- mehor compreendido com a perspectiva do problema da verdade. A xivo. Significa o fechamento a uma perspectiva participante no diálo- verdade lógica não coincide com a verdade psicológica. Para se con- go. vencer alguém, não podemos usar apenas a lógica. Porque o homem Assim como um dado viciado tende a determinados resulta- não é apenas feito de lógica, mas também de paixões. Então para con- dos, também o diálogo entre os sujeitos reificados tende a certas con- vencer o homem é necessário um envolvimento completo do ser. O clusões. O discurso sofre uma interferência que se torna independente envolvimento do homem com seu mundo “se realiza no reconhecer das capacidades do orador. E isso é venenoso para a democracia, pois (Anerkennen) e conhecer (Erkennen), de tal modo que por decisões que independem (ao menos em parte) dos discursos são em “reificação” devemos entender uma violação contra esta ordem de maior ou menor medida voluntarista. A democracia tem a vantagem precedência” (Honneth). A teoria do discurso retórico mantem sua de proporcionar decisões politicas por meio do embate dos melhores base não há apenas no logos, mas no Ethos e no Phatos. Assim, pode argumentos e dos argumentos moralmente adequados à comunidade. ser incluído na dimensão discursiva o reconhecer, por meio da pers- E um reconhecimento apenas institucional, ou seja, a inclusão no de- pectiva do Phatos e do Ethos, que são respectivamente uma atitude bate político ou o reconhecimento de voz no debate, não é uma garan- ética em relação a uma abertura participativa da mensagem e uma tia de reconhecimento psicológico da comunidade (linguística), que atitude ética sobre o sujeito que discursa, ambas posições complemen- pode continuar surda ao argumento, ignorando-o. Significa está no tares da abertura existencial da linguagem para uma perspectiva parti- poder de argumentar, mas não com o poder de argumentar. cipante sobre o texto. Seria necessária uma explanação maior sobre as É necessário que se esclareça que na política podem ser trava- relações não-epistêmicas com o Texto, que abrem variações interpre- das relações de força, ou simples negociações, sobre o qual é indife- tativas em nível epistêmico (locucional) e não-epistêmico rente a figura reificada, mas há assuntos que necessitam de um trata- (ilocucional). Essas variações ou desentendimentos têm potenciais mento diferenciado. Sobre isso, é ilustrativo o debate sobre as células perigosos na democracia. tronco, a pornografia, o terrorismo, o Estado de Bem-Estar etc. São Em termos de política democrática a perda do elemento racio- assuntos que pressupõem uma condição argumentativa não epistêmi- nal da democracia, a luta dos melhores argumentos, traz a perda de ca, que é a possibilidade de se orientar pelos motivos do outro. O que sua legitimidade, que acarretaria num voluntarismo das decisões da Honneth tenta deixar evidente é isso, que “nós só podemos assumir a maioria e de seus representantes. E essa forma de governo tem outro perspectiva do outro depois que previamente reconhecemos no outro nome, ela se chama Plutocracia, e isso independe do grupo que esteja uma intencionalidade que nos é familiar – isto, como tal, não é um ato governando. Portanto, as reflexões apontadas indicam um caminho racional, nem uma tomada qualquer de consciência de motivos, mas único de que em democracia não se pode esquecer o adversário, mas realização pré-cognitiva do ato de assumir uma determinada postura.” compreender sua posição diferente e fazer com que o outro também o O mundo reificado por excelência é o mundo Hobbesiano, compreenda, de modo a abrirem-se ambos, para as opiniões diferentes pois ele afirmava: homo homini lúpus, já que, segundo ele, um sujeito que a retórica politica poderá permitir. é opaco ao outro. As sujeições históricas que influenciaram a vida de Hobbes corroboram com essa perspectiva. A Inglaterra de sua época foi envolvida por uma práxis “reificantes”, como também foi à práxis YURE TENNO: Acadêmico da nacionalista do século XIX com as guerras de expansão napoleônicas. Faculdade de Direito em João Como assevera Honneth sobre o ideia de guerra: “a finalidade da des- Pessoa (UFPB). truição do adversário se autonomiza a tal ponto, que mesmo na per-
  • 8. 8 REPORTAGEM ESPECIAL I. ISÍDIO & Y. TENNO O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS A tradicional Faculdade de Direito da Paraíba responde hoje pelo nome de Centro de Ciências Jurídicas da UFPB e aninha dois cursos: um no campus I da Universida- de, em João Pessoa, outro no “campus virtual” de Santa Rita, DESCASO: Teto da que funciona provisoriamente no Centro de nossa capital. Estes Faculdade de Direito de dois cursos conseguem, de ma- João Pessoa com neira muito peculiar, fundir histó- ria e contemporaneidade, tradici- infiltrações sérias depois onalismo e inovação. Mas hoje há de menos de dois anos de uma marca por ambos comparti- lhada com tristeza: a má conser- inauguração . vação de suas instalações. Situado por quase 60 anos na Praça dos Três Po- deres, em João Pessoa, o curso de Direito foi transferido para o campus I da Universidade Federal da Paraíba, no qual passou ocupar um majestoso edifício, projetado em linhas arquitetônicas visivelmente modernas, de uma beleza sóbria, elegante- biblioteca, mas lá não haviam chegado devido à falta de um ambiente mente emolduradas pelos vestí- adequado para abrigá-los. Em síntese: a biblioteca do curso de João gios da Mata Atlântica. Mas a Pessoa ficou ainda menor, para que a de Santa Rita pudesse ao menos beleza das linhas modernas e o começar a existir. E não obstante os estudantes de lá já tivessem pas- frescor da construção – motivo sado quase dois anos prejudicados pela sua inexistência, a biblioteca de admiração aos transeuntes – tinha que existir – ao menos agora, aos olhos criteriosos conspiram para esconder os SORTE: dos avaliadores do MEC. graves problemas estruturais Tornar-se-ia maçante a escrita ou leitura de um longo texto por que passa o edifício. Cardeira que versasse sobre a fundamental importância das boas Muito mais do que os queimada bibliotecas nos cursos de Direito. Análogo a este seria o corredores estreitos ou o péssi- trabalho de um agrônomo que resolvesse tecer considera- mo isolamento termoacústico após a ções a respeito da importância da água nas plantações de das salas, outros problemas queda de abobrinha. Eis a ululante obviedade em tintas de compara- parecem mais graves aos olhos do corpo discente, usuário mais ventilador ção grosseira: a leitura está para o bom jurista assim como a água está para o vegetal. A nossa Faculdade de Direito, direto e cativo das instalações. como centro de construção jurídico-intelectual de qualida- Há não muito, o ventilador de de, deve ter sua biblioteca tal qual um santuário: um espaço amplo uma das salas caiu em cima de onde seja possível o acesso silencioso aos melhores títulos da doutrina uma carteira, pegando fogo. Na nacional e estrangeira. A cada visita às nossas bibliotecas, seja em ocasião, ninguém saiu ferido: o João Pessoa ou em Santa Rita, o estudante de Direito da UFPB pode, estudante que comumente ocupava a carteira, por sorte, havia faltado com tristeza, constatar a abissal diferença entre o dever ser e o ser. Ao à aula. Mas não são apenas os eventos imprevisíveis que põem risco à som de discussões exaltadas, vozes incessantes e um concerto de ruí- integridade física dos estudantes. As últimas chuvas revelaram vaza- dos que oscila de uma tranquila sonoridade vinda das estantes a um mentos em diversos pontos do teto, fragilizando as placas de gesso agudo som do balançar das mesas e cadeiras, os alunos são obrigados que, úmidas, rachadas e emboloradas, ameaçam desabar. Os alunos, a buscar por conhecimento em meio ao escasso e antiqüíssimo acervo felizmente, agora não correm mais tantos riscos: uma funcionária – bibliográfico que não corresponde com a demanda doutrinária moder- designada especialmente para este fim – posiciona-se no pátio e, vez na. E todas as reivindicações por melhorias na educação - sejam elas por outra, prestimosamente alerta um estudante: “Ei menino, saia daí pela educação básica ou superior, feitas a qualquer patamar da admi- que o teto vai cair!” Ainda assim, o transeunte continua a admirar as nistração – até aqui têm recebido uma mesma resposta: abobrinhas. invejadas linhas modernas do novíssimo prédio: “Esses juristas são mesmo privilegiados...” Nos últimos dias, alunos desse mesmo curso também foram surpreendidos pela repentina retirada de dezenas de volumes da bibli- oteca. Ficaram sabendo depois, por vias trans- versas, que os livros retirados tinham como destino a biblioteca do curso-irmão de Santa REPENTINO: Rita, no qual seria realizada, muito em breve, Ação de retirada dos uma visita de avaliadores do MEC (Ministério livros da biblioteca da Educação e Cultura). Um dos objetivos da visita seria conferir se as instalações do curso do CCJ de João (incluindo a biblioteca) obedecem a condições Pessoa, no início da mínimas de funcionamento. manhã. Foto: Luana Do já minguado acervo com o qual se contentava o estudante de Direito de João Pes- soa saíram, pois, vários livros. Eles foram “emprestados” à ainda mais precária biblioteca do curso santa-ritense. Alguns deles teriam sido, aliás, comprados havia quase dois anos, tendo como destino a referida
  • 9. REPORTAGEM 9 ESPECIAL I. ISÍDIO João Pessoa, 28 de abril de 2011 & Y. TENNO Ao nascer, o curso de Santa Rita herdou o antigo prédio da oferta de vagas, seja pela Faculdade de Direito, uma construção em que se respira história. Por lá melhor distribuição geográ- ―SE VIRA‖ passaram grandes nomes da jurisprudência, da cultura, da política fica delas, uma quantidade "Problemas das mais diversificadas (alguns raros, de todas estas), tais como Luiz Augusto Crispim, Tarcísio bem maior de alunos teria a naturezas deixam a uniformidade do Burity, Ronaldo Cunha Lima, José Maranhão, Dorgival Terceiro Neto, oportunidade de cursar Di- prédio comprometida, somado à inani- Carlos Coelho e uma vasta lista de notáveis. Em visita recente às instala- reito em uma respeitada e ção intelectual que a nossa biblioteca, ções do novo curso de Direito, pôde-se constatar que, ao menos na anti- bem avaliada instituição infelizmente, nos proporciona. Este federal. Até o momento, a último problema causa certa indignação implantação do curso pas- por parte dos discentes, que se vêem sou ao largo de um dos seus obrigados a disputar os pouquíssimos objetivos primordiais, pois livros lá existentes ou buscar outros em muito pouco vem bene- meios para suprir um serviço que deve- ficiando a cidade para a ria ser prestado, com eficiência, pela qual foi projetado. Dos biblioteca setorial do nosso CCJ, a qual alunos atualmente matricu- ainda “compartilha” sua defasagem com lados no curso, menos de o curso de Santa Rita. E o problema não cinco por cento são de Santa se resume apenas à falta de livros, por- Rita. Apesar de contraditó- que a própria acessibilidade física (ou rio, o número não represen- ausência dela) não nos oferece condi- ta um problema tão grave, ções. Mas como fica a situação daquele uma vez que não é comum que não tem condições financeiras para nem desejável destinarem- comprar livros? Como fica a situação se todas as vagas a estudan- daquele que não tem acesso aos livros tes de uma mesma naturali- de outras instituições? É, o famoso “se dade. O problema está em vira” cabe bem ao nosso decorrer aca- negar à cidade de Santa Rita dêmico." todos os benefícios sociais, NATHAN WANDERLEY: Acadêmico da educacionais e econômicos Faculdade de Direito em João Pessoa que a implantação de um campus universitário traria (UFPB). consigo. Não se trata apenas de poder ostentar o belo brasão da Universidade Federal da Paraíba, mas sim de ter a população contemplada, por exemplo, pelos projetos de extensão desenvolvidos pela Academia e pelo próprio florescimento intelectual que a acompanha. O prédio onde funcionará o curso, quando for finalmente INDIFERENÇA: Livros da antiga biblioteca de Santa Rita (foto transferido para a sua cidade-sede, teve sua construção iniciada recente- acima) embolorados no ambiente úmido do local, onde centenas de mente – quase dois anos após a admissão da turma pioneira. A falta de exemplares se encontram da mesma forma. Embora uma nova bi- instalações adequadas não foi empecilho à oferta de vagas aos vestibu- blioteca provisória tenha sido instalada na Faculdade, os livros landos, feita a toque de caixa para dar prosseguimento à política do REUNI e atingir as metas por ele traçadas. Dentre estas metas, reside a históricos continuam perecendo nessa condição. intenção de frear a atual explosão de cursos superiores, grande parte de baixíssima qualidade, por que passa nosso país. Até aqui, muito deve- ga biblioteca, não se pode mais respirar história. Aliás, lá não se pode mos ao rigor, felizmente mantido, dos concursos públicos e dos vestibu- respirar: as goteiras, em pingar constante por sobre centenas de livros lares, pois não fosse o notável engajamento e qualificação do corpo históricos, formam uma poça que toma todo o chão da sala. Alguns docente do novo curso de Direito, somados às potencialidades de seu exemplares já se apresentam completamente tomados pelo bolor; outros, alunado, o REUNI teria indubitavelmente falhado em seu propósito de depois de tanta resistência ao tempo e de tanto serviço prestado a tantos barrar tal explosão. E pior, auxiliaria o nefasto fenômeno ao criar um muitos valorosos juristas, jazem ali, condenados pela umidade, pelo ar curso de qualidade questionável sob a justificativa de ampliar, a todo miasmático, pela indiferença de uma má administração. ―(...) não fosse o notável engajamento e qualificação do corpo docente do curso O curso de Direito de Santa Rita, como já se perce- de Direito de Santa Rita, somados às potencialidades de seu alunado, o REUNI be, guarda algumas caracterís- teria indubitavelmente falhado em seu propósito‖ ticas bem diversas de seu “irmão mais velho” pessoense. Nascido há apenas dois anos, deveria custo, a oferta de vagas em universidades federais. funcionar em um campus na cidade vizinha, Santa Rita, cuja construção O primeiro curso de Direito da Paraíba, vetusta Faculdade ainda não saiu do papel. Não deixou, entretanto, de oferecer vagas aos donde frutificaram os mais ilustres juristas de nossa terra, está prestes a vestibulandos – nas linhas do Plano de Reestruturação e Expansão das atingir a emblemática marca de 60 anos. Em meio à preparação das Universidades Federais (REUNI) – e passou a funcionar, provisoriamen- devidas solenidades e eventos comemorativos, deve subsistir a vergonha te, no antigo prédio da Faculdade de Direito. Cerca de três meses antes, de brindar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desaba porém, este mesmo prédio havia sido desocupado, por falta de condições sobre nossas cabeças. Há também a esperança de que as vozes miúdas, estruturais, pelos estudantes do curso que passou a funcionar no campus vindas da indignação do corpo discente de hoje, possa reverberar em I da UFPB. vozes mais fortes, igualmente indignadas, do corpo discente de ontem. Um dos principais objetivos pretendidos com a criação de um curso jurídico em Santa Rita foi o de descentralizar as atividades educa- IGOR ISÍDIO E YULGAN TENNO: Acadêmicos da Faculdade de Direito em cionais da capital, bem como facilitar o acesso - sobretudo dos santa- João Pessoa (UFPB). ritenses – a um curso geralmente tido como “elitizado”. Seja pela maior Fotografia: YULGAN TENNO
  • 10. 10 OPINIÃO PEDRO LENZA FALA À TRIBUNA Um dos mais conceituados constitucionalistas do Brasil comenta a constitucionalidade do Incidente de Deslocamento de Compe- tência no caso Manoel Mattos e demonstra sua opinião sobre a atual perspectiva dos direitos sociais na doutrina constitucional. TRIBUNA—Recentemente, foi aplicado o Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) da Justiça comum para a Justiça Federal ao caso Manoel Mat- tos, reavivando a discussão sobre a constitucionalida- de do IDC. Qual sua opinião sobre o assunto? ―O STJ reconheceu Realmente o caso do IDC é bastante emblemá- a incapacidade das tico e relevante em termos de concretização desse novo instituto, na análise dos fatos que caracterizaram o ho- autoridades locais, micídio de Manoel Bezerra de Mattos Neto, advogado e Vereador pernambucano, que foi assassinado, o que leva na apuração do caso a crer, em razão de sua pública e conhecida atuação contra os grupos de extermínio. Manoel Mattos‖ O que o Superior Tribunal de Justiça entendeu foi que havia uma reconhecida incapacidade das autori- dades locais, para oferecer respostas efetivas para a apuração desse crime. Então, foi a primeira decisão de deslocamento de competência. Esse instituto busca fazer com que a Justiça brasileira, em especial, o Estado brasi- leiro, dê respostas efetivas aos tratados internacionais de direitos hu- Hoje, fala-se muito na concretização dos direitos sociais e manos, em que o Brasil se compromete a internamente punir a grave especialmente na questão de implementação de políticas públicas. Nós violação a esses direitos. poderíamos observar que existia uma tendência, cada vez mais forte Acontecia que o Brasil assinava tratados internacionais, do Supremo, de afastar as alegações dos Estados e dos governantes, ao comprometendo-se, no plano global, a punir tais violações, e não ti- dizer que não implementam políticas públicas por uma questão de nha, internamente, um instituto, para se fazer valer dessa situação. falta de dinheiro. Fala-se muito em reserva do possível, reserva do Então, a Emenda n.45 de 2004 criou o IDC e permitiu que, havendo possível financeiro. inoperância da Justiça local, o deslocamento da competência se efeti- O que eu tenho sentido são algumas decisões do Supremo, vasse para a Justiça Federal. principalmente uma recente do Ministro Celso de Mello, no Recurso Esse instituto é ainda analisado no Supremo Tribunal Fede- Extraordinário 482611. Discutia-se um projeto no Município de Flori- ral, o que sustenta que o IDC seja inconstitucional, mas o que tem de anópolis, chamado “Projeto Sentinela”, pelo qual o Município se com- se verificar é o seguinte: para o STJ, a questão está superada. O IDC é prometia a proteger, de forma integral, a infância e a juventude. O constitucional, porque ele conheceu, superou a preliminar e julgou o projeto não se implementava, o Município não executava o que havia mérito. O IDC número 2, julgado no dia 27 de outubro de 2010, é sido estabelecido, principalmente na proteção de crianças e de adoles- então um tema muito recente e novo. O que é ainda analisado pelo centes vítimas de abuso sexual. Supremo são algumas ADI’s, em que se alega que o IDC é inconstitu- A alegação do Município era que eles não poderiam atuar em cional com relação a duas questões: primeiro, com relação ao princípio razão de inexistência de dinheiro. O Ministro Celso de Mello foi fir- do Juiz natural. Dizem que o IDC seria inconstitucional, porque se me, ao estabelecer que essa alegação não é razoável, que existe uma desloca a competência do Juiz que julgaria aquela questão. Eu não necessidade de atuação do Estado, que este deve preservar a ideia de vejo problema algum no deslocamento, afinal, o Juiz Federal já é o mínimo existencial. Mesmo inexistindo uma norma de caráter cogente, juízo pré-constituído, então, não há problema. ele deve cumprir política pública, deve implementar direitos sociais, O que pode desembocar em um questionamento do Supre- especialmente diante do assunto do artigo 5º, parágrafo primeiro, que mo, que é muito delicado, é se haveria necessidade da definição do diz que os direitos fundamentais têm aplicação imediata. que é “grave violação aos direitos humanos”. Qualquer homicídio é Portanto, o Supremo vem dando contribuições muito impor- violação a esses direitos, mas que é grave violação? Então, o que se tantes, relacionadas às questões de políticas sociais e também relacio- poderia discutir é se haveria alguma afronta ao princípio da estrita nadas a questões ligadas a saúde, que envolvem o fornecimento de legalidade penal. medicamentos. Há uma tendência a firmar uma responsabilidade soli- O STJ superou essa questão, mas o Supremo não a define. É dária entre os entes federativos, para que se evite que o Município um estudo com uma potência indiscutível, no sentido de proteção aos jogue a responsabilidade para o Estado, este, para a União, e ninguém direitos humanos. O que se faz não é mandar a questão, para o STJ faça nada. Há uma proposta de Súmula Vinculante, para que se estabe- julgar, eventualmente avocar o processo para o STJ. Não. É, perceben- leça a responsabilidade solidária entre os entes federativos e até o do a inoperância da Justiça Local, deslocá-la para a Justiça Federal. bloqueio de verbas públicas para a implementação de políticas públi- O IDC número 1, que envolvia a Dorothy Stang, não foi cas para o fornecimento de medicamentos sem a observância da regra julgado procedente pelo Supremo, porque não havia inoperância. Aí se geral da Precatória. Então, a reproposta de Súmula Vinculante número encontra a relevância do caso Manoel Mattos, já que foi o primeiro a 4, de 2008, nesse sentido, demonstra que, realmente, o Supremo vem ser julgado procedente e requerido o deslocamento para a Justiça Fe- sendo muito firme com essas questões e surpreendendo, inclusive deral do Estado da Paraíba. Então, realmente, o instituto ganha uma determinando o pagamento de remédios caros, cirurgias até fora do força muito grande com a decisão do STJ, e resta aguardar a apuração país, dentro dessa perspectiva de direito à saúde. dos fatos. Entrevista por: YULGAN TENNO e LEONARDO WRIGHT. TRIBUNA—Qual o espaço de efetivação dos direitos sociais frente Acadêmicos da Faculdade de Direito em João Pessoa aos novos paradigmas da interpretação constitucional? (UFPB).
  • 11. 11 DIREITO vs DIREITO APLICAÇÃO DO FICHA LIMPA: A FAVOR OU CONTRA? O Direito está longe de ser um mundo lados. E, em um ramo do saber tão permeado A mesma pergunta foi feita, de forma muito dire- de unanimidades. Diferente das ciências exatas, pelas divergências, a análise das construções ar- ta, aos dois juristas: “O SUPREMO ACERTOU nas quais a existência de uma resposta correta gumentativas faz-se tão importante quanto o exa- AO DECIDIR QUE A LEI DA FICHA LIM- condena ao erro todas as demais, a Ciência do me puro do fato em questão. PA NÃO SERIA APLICÁVEL ÀS ÚLTIMAS Direito acolhe todos os entendimentos que ve- É por isso que, nesta edição, a Tribuna da Justiça ELEIÇÕES?” Eis as respostas, tão bem funda- nham acompanhados de uma argumentação plau- traz a opinião espontânea de dois grandes consti- mentadas quanto divergentes, dos dois entrevista- sível. Existe, a propósito, uma vasta discussão tucionalistas - Dr. Solon Benevides e Dr. Vidal dos sobre se o Direito pode ou não ser definido como Serrano Júnior – acerca da aplicabilidade da Lei Ciência, com argumentos razoáveis em ambos os da Ficha Limpa, aprovada em setembro de 2010. Vidal Serrano Júnior* Solon Benevides* “EU ENTENDO QUE NÃO HÁ INCONSTITU- “EU ACHO QUE A DECISÃO DO SUPREMO ESTÁ CIONALIDADE ALGUMA NA APLICAÇÃO DA CHAMADA CORRETÍSSIMA. O art. 16 da Constituição Federal é muito claro, ―LEI DA FICHA LIMPA‖ EM 2010, portanto, creio que a posi- trata-se do principio da anterioridade da lei eleitoral. Se a lei altera o ção vencedora no Supremo Tribunal Federal, com apenas um voto processo eleitoral, ela só pode entrar em vigor um ano depois, e ela de diferença, tenha sido equivocada. A lei da ficha limpa, na verda- alterou exatamente no ano da eleição, ferindo o principio da anterio- ridade da lei eleitoral. O processo eleitoral citado na Constituição é de trata de inelegibilidade; são condições para as eleições e não para abrangente, mas muitos querem restringir esse conceito, limitando-o o processo eleitoral. Portanto, não tem como se cogitar a aplicação a alguns aspectos do processo eleitoral. Entendo que ele é abrangen- do Art. 16 da Constituição Federal, te. Para o Supremo, o processo eleito- pois ele fala sim em anualidade, mas ral compreende desde a alteração de para legislações que alterem o proces- requisitos para o registro de candidatu- so eleitoral. ra, até, por exemplo, a forma de se X Inelegibilidade é lei que apurar os votos. Compreende, portanto, regula o conteúdo, a substância. São qualquer etapa do processo eleitoral. condições para que a pessoa possa Preciso deixar claro que sou a favor da viabilizar a candidatura, então não me lei da ficha limpa. Todos desejam ex- purgar da vida publica os maus políti- parece que esse dispositivo constituci- cos, aqueles que cometeram ilícitos; onal que tenha se deslocado possa contudo não se pode rasgar a Constitui- servir de pano de fundo para a não ção. Na minha linha de raciocínio: a lei de ficha limpa é útil? Sim! aplicação da lei na última eleição. Está correta a decisão do Supremo de aplicar o artigo 16? Sim, pela O processo eleitoral que aparece no artigo 16 fala de as- abrangência do processo eleitoral. pectos procedimentais, relacionado às inscrições da candidatura, a Entendo que a Suprema Corte poderia dar interpretação impugnação da eventual candidatura, a formação dos pleitos, a apu- conforme a Constituição Federal, com redução ou sem redução de ração, a formação das chapas, enfim, aspectos relacionados ao pro- texto, em alguns dispositivos. Por exemplo: sobre a regionalização cesso e não à substancia das eleições e à condição de elegibilidade. de uma decisão no sentido de que torna inelegível o cidadão já a Na questão da elegibilidade, temos várias condições colo- partir de uma decisão colegiada em 2º grau, acho que fere o princi- pio de presunção de inocência, o duplo grau de jurisdição. Se a cadas pelo texto Constitucional, como, por exemplo, a idade, e de- Constituição diz que ninguém será considerado culpado até o trânsi- pois se criou mais algumas condições, que é a questão da ficha lim- to final - e esse conceito não existe só em matéria penal - então você pa, a não condenação por colegiados, a não renuncia para se escapar tem direito de percorrer as instancias superiores para rever essa de eventual processo de perda do mandato. Há, na verdade, um decisão. Se a matéria for constitucional, até o STF, se for matéria só elastecimento do rol de causas que impedem as eleições. eleitoral, até o TSE, e assim por diante. A posição minoritária dos cinco ministros que perderam a Retroação da pena é mais absurdo ainda. A não retroação votação é a posição mais adequada. Como nas próximas eleições já da lei é em campo de direito punitivo e se aplica em qualquer seara, vai ter passado mais de um ano e o artigo 16 não poderá mais ser desde que seja direito punitivo. Dizem que a questão de aplicação aplicado, existirão cogitações de outra natureza. O principal argu- de penalidades pela lei eleitoral é condição de elegibilidade, mas mento daqueles que são contra a aplicação da lei da ficha limpa é a não é. A lei complementar 64, em seu artigo 22, inciso XIV, diz que “julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação questão da presunção de inocência. Eu acho inadequado tal argu- dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e mento, pois temos uma disposição específica, que é o artigo 14, § de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes 9º, segundo o qual deve existir uma lei complementar que crie con- sanção de inelegibilidade” e essa é a redação dada pela própria lei dição de inelegibilidade considerando a vida pregressa do candidato. de ficha limpa. E o que é sanção? Sanção é punição, é pena! E se Diante de tal disposição que autoriza esse tipo de legislação, não há disser que isso é só condição de elegibilidade, está errado.” que se cogitar o uso das formas de inconstitucionalidade.” *Doutor em Ciências pela USP, professor de Direito *Doutor em Direito pela PUC-SP, professor de Direito Constitucional na UFPB, procurador do Estado da Paraíba e Constitucional na mesma casa e promotor de justiça em São advogado. Paulo. Entrevista por: LEONARDO WRIGHT. Acadêmicos da Faculdade de Direito em João Pessoa (UFPB).
  • 12. ENTREVISTA 12 nomia, hoje, apesar de alguns percalços que sofreu, muitas mudanças es- Foto: portalmidia.net (acesso 09-06-11) truturais mesmo, hoje é mais uma economia centrada na atividade industri- al e no setor de serviços. Naquela época, nós tínhamos uma vida econômi- ca centrada sobretudo na agricultura e na pecuária. Na agricultura, nós tínhamos um tripé: era o algodão, o sisal e a cana-de-açúcar. O algodão e o sisal se inviabilizaram inteiramente por fatores diferentes um do outro, mas o resultado é que acabou a cultura do algodão e a cultura do sisal na Paraíba, os quais eram os dois esteios principais, porque elas se estendiam por quase todo o território. Naquela época, a cultura de cana-de-açúcar ia desde o litoral até o brejo. No brejo, os engenhos e as poucas usinas que tinham fecharam com- pletamente. A cultura da cana-de-açúcar hoje ficou só na região litorânea. Em função disso, a economia da Paraíba direcionou-se para o setor indus- trial e para o setor de serviços. Então, a paisagem econômica hoje é intei- ramente diferente da minha juventude, da minha infância. Na Faculdade de Direito, como foi o contato com o professor Flóscolo da Nóbrega? Ingressei na Faculdade, em 1954. Eu gostava muito dele, mas ele era ensimesmado. Nós tínhamos professores que se relacionam bem com JOSÉ TARGINO MARANHÃO: os alunos, que criam um ambiente social bom. Não, ele não era homem de CONFISSÕES DE UMA HISTÓRIA amizades. Ele era muito reservado, até meio tímido, de poucas palavras, mas uma pessoa muito boa. Como mestre, eu o achava excelente, e o livro dele, Introdução à Ciência do Direito, uma obra com uma pedagogia muito Eleito quatro vezes Deputado Estadual, três vezes Deputado Fe- boa. deral, três vezes Governador do Estado da Paraíba, além de Senador da República, José Maranhão é um homem cuja atuação política perpassa Qual foi a contribuição da Faculdade de Direito para sua vida? meio século de vida paraibana. Suas posições políticas, no entanto, identi- Acho que não há um curso mais universal, em termos de conheci- ficam-no não só com o jovem José de 1955, o deputado estadual mais mento, que o curso de Direito. É interessante que eu não pretendia fazer jovem do Brasil, ou com o deputado estadual de 1969, cujo mandato foi Direito, mas Engenharia Aeronáutica, pois sempre gostei de tudo que se cassado pelo regime militar, mas com o político da vida inteira. Araru- nense e graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba, nota- ―(...)não há um curso mais universal, em ter- bilizou-se pela vida de político e empresária, sendo um grande adminis- trador moderno no gerenciamento da coisa pública. Dentre suas grandes mos de conhecimento, que o curso de Direito‖ contribuições como político no Estado da Paraíba, destacam-se o Plano das Águas, contemplando todas as regiões do Estado com barragens, relacionava à aviação. No ano que eu ia fazer o vestibular em São Paulo, açudes, adutoras além da interligação de bacias hidrográficas, atendendo aconteceu uma crise política com minha família em Araruna. Fui surpreen- às carências das regiões mais vulneráveis ao problema da seca; a expan- dido com a ideia de ser candidato a Deputado Estadual. são do Porto de Cabedelo; a criação do Hospital de Trauma; duplicação Meu pai era um líder político e teve uma frustração com o Prefeito que da BR-230 e a construção da PB-008. elegeu, então, mobilizou todos, para uma reação contra a candidatura dele. Então, o objetivo do grupo era não deixar Celso ser o Deputado de Araru- na. Acho que era muito mais isso, que eleger um Deputado. Eu não sei se eles acreditavam muito que eu pudesse ser. Sendo de Araruna, como foi sua vinda para a Capital? Eu não sei se fluiu naturalmente. Foi uma grande surpresa. Daí eu É uma decorrência natural as pessoas virem, especialmente na ter mudado o curso para Direito, porque eu não podia fazer Engenharia minha época, porque você não tinha nem Ensino Médio no interior, apenas Aeronáutica em São Paulo e ser Deputado na Paraíba. Como eu fui eleito, em algumas cidades polos da Paraíba, como Patos, Souza, Cajazeiras. Na fui fazer Direito. Quando você é estudante e participa de política estudan- região do Brejo, Bananeiras e Guarabira, havia um colégio de Ensino Mé- til, o caminho natural é o curso de Direito, mas não me julgava com voca- dio só para mulheres e a Escola Técnica Agrícola, em Bananeiras. Areia ção para o curso. tinha também uma Escola Técnica Agrícola que depois se tornou Faculda- de de Engenharia Agronômica e acho que também de Veterinária. Então, Quais eram suas posições políticas à época? como a gente não tinha condições de prosseguir estudando no interior, ia Sempre fui fiel a meus ideais. Como todo jovem idealista, a minha para a Capital. Eu fui aluno interno do colégio de Manuel Neri, Colégio posição era, naquela época, a defesa de um Estado brasileiro soberano e Monsenhor Valfredo. Depois fui aluno do Pio X aqui, em João Pessoa, e, independente e o confronto com o imperialismo americano. Isso era tema em Natal, no Santo Antônio, que também era Marista. Voltei para Recife e recorrente na cabeça da grande maioria dos jovens brasileiros. Fundei, vim para João Pessoa. Recife era o caminho de todos os estudantes que aqui, na Paraíba, a Frente Parlamentar Nacionalista. Isso depois me valeu a queriam chegar ao curso superior. Foi assim que eu cheguei a João Pessoa. cassação, quando eclodiu o golpe militar de 64, que era, na verdade, não um movimento nacional, mas um movimento antinacional. Era um movi- Que elementos bons a Paraíba manteve e quais perdeu, desde aquela mento de subordinação, de submissão aos interesses da política colonialis- época? ta americana. Então, aquelas ideias nacionalistas passaram a ser mal vistas Acho que todos nós temos um pouco de saudosismo. Na realidade, pelo regime. Alguns foram cassados imediatamente. Outros foram cassa- a Paraíba cresceu. A Paraíba de hoje não é mais a Paraíba da minha infân- dos com o advento do AI-5, o Ato Institucional nº 5. cia. O que tinha de bom na Paraíba era a maior proximidade entre as pes- Então, quando foi editado o AI-5, eu já estava com dois ou três soas. O Estado como um todo, João Pessoa especialmente, era um núcleo IPMs (Inquérito Policial Militar) por conta dos manifestos que nos tínha- social pequeno e as pessoas podiam se dar o luxo de conhecer e de fre- mos feito na Paraíba. Aí eu não sobrevivi mais. Eu ainda fui candidato na quentar os mesmos ambientes sociais, os mesmos clubes sociais. Hoje não eleição de 66. Em 64, eu já era Deputado, estava no meio do mandato e, tem clubes sociais mais. Acabou. A vida estudantil era muito cordial, mui- em 66, houve a renovação, e eu fui novamente eleito. Em 69, fui cassado, to próxima... É essa a diferença positiva. com o AI-5. No mais, eu acho que a cidade cresceu. O Estado cresceu. A eco-