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Sou católico, e não adoro imagens! i


Preparação: ............................................................................................................. 2
A linguagem utilizada por Deus para se comunicar com o homem .......................... 2
O “conceito” de Imagem ......................................................................................... 4
Imagem de Deus ..................................................................................................... 5
A concepção de “imagem” na Sagrada Escritura ..................................................... 6
A crítica que nos advém da “Babilônia Discursiva” .............................................. 13
“As imagens” no ambiente católico: Por quê? ....................................................... 15
O desafio da Igreja: Ensinar seus fiéis ................................................................... 17
Considerações finais ............................................................................................. 19




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Preparação:                                     orientados para que a prática errônea
                                                seja corrigida e os erros esclarecidos.
      Começamos transcrevendo estas                  Sabemos que a questão não é tão
palavras para alertar a multidão dos            simples e que a perplexidade do
“alunos”, no sentido etimológico                assunto necessitaria muito mais do
daqueles que “não possuem luz”, ou              que algumas “palavras escritas”, pois
ainda, os que correm em direção ás              muitos já o fizeram, por isso nós
trevas. Falo àqueles que insistem em            apenas        traremos       algumas
ficar longe da verdade e mais, que se           “lembranças” que insistem em serem
utilizam do discurso religioso para             esquecidas, ou até abandonadas.
deturpar e persuadir a Verdade em
nome de uma ilusão emotiva e um                       Por tais aspectos iremos nos
benefício plácido da comodidade que             fundamentar na Doutrina sacra da
não os permitem buscar os ramos                 Igreja, vigiada e guardada pelo
donde vertem os líquidos sapienciais            Colégio Episcopal, se utilizando de
do divino.                                      alguns documentos da Sagrada
                                                Tradição, e inconfundivelmente das
      Buscar    respostas     exige-nos         “Sagradas Escrituras”, pois esta
muito mais do que esforços, temos               distorcidamente interpretada é o
que ter a virtude de sermos sinceros e          arsenal da “babilônia discursiva” para
não temer o que poderemos encontrar             nos criticar.
pela frente. O que muito se escuta na
“babilônia dos discursos”1 são as                     Assim       desejamos       na
acusações infantis e infundadas, em             autenticidade desses escritos e na
todos os sentidos, a respeito do uso de         medida da limitação deste trabalho
imagens no ambiente católico.                   que o leitor possa se questionar e
                                                procurar sua verdade para além das
      O que queremos é de maneira               limitações aqui expostas; tanto que
singela esclarecer o nosso ponto de             acreditamos fielmente que quem
vista doutrinal a respeito da situação, e       busca com sinceridade a verdade
para além das críticas, fazer com que           encontrará o próprio Deus. Com as
os nossos fiéis, que muitas vezes são           palavras de Edith Stein: “Quem
infiéis no conhecimento de sua fé e             procura a verdade, mesmo sem tomar
doutrina, possam se sentir seguros e            consciência disto, procura Deus,
                                                porque ele é exatamente a Verdade”.

1
 Termo que utilizamos para descrever            A linguagem utilizada por Deus
as “doxas”, ou se preferirem, as meras
opiniões levantadas no âmbito externo
                                                para se comunicar com o homem
a Igreja, e que se esforçam em criticar              Deus em si não se utiliza de
a Doutrina, sem antes conhecê-la, e             linguagem, tendo em vista que a
consequencialmente sem entendê-la.

                                            2
própria linguagem é fruto do homem e         imagem e gestos que expressam de
em sua imanência está inserida. Deus         diversas maneiras a nossa relação com
em suas propriedades transcendentais,        o divino, e maneira pela qual
levando em conta a Onisciência               entendemos tal relação.
divina, daquele que tudo conhece, e
                                                   A linguagem que Deus se utiliza
tudo percebe, e que subjaz tudo sob
                                             é essencialmente analógica3 onde a
seu domínio, podemos nos perguntar:
                                             maneira de apreender alguma coisa de
Deus precisa de linguagem para
                                             Deus é realizada a “nossa” maneira,
comunicar a si? Obviamente que não!
                                             ou seja, Deus se “transporta” até o
Mas se Deus se comunica, ele se
                                             humano para que ele possa
comunica a algo, ou alguém, e este
                                             compreendê-lo. Por isso tem-se que
alguém, o homem é necessariamente
                                             admitir que Deus só seja conhecido e
um         ser     lingüístico      e
                                             expressado,     ora    pela   Sagrada
fundamentalmente necessitado de uma
                                             Escritura, ora pela Tradição, que se
“pedagogia” que seja acessível a ele.
                                             faz acessível pela linguagem universal
Deus para atingir nossa condição
                                             da relação comunicada.
humana se faz linguagem acessível
para ser entendido por este mesmo                  Com a certeza da lógica exposta
homem.                                       nesses       argumentos        acima,
                                             compreendemos que o homem não
      Assim a Igreja no CIC2 é clara
                                             tem intelecção direta do divino
em afirmar: “Sendo o homem um ser
                                             (intuição), muito pelo contrário, não
ao mesmo tempo corporal e espiritual,
                                             somos capazes de penetrar nos
exprime e percebe as realidades
                                             mistérios de Deus se não for pela
espirituais por meio de sinais e de
                                             graça revelada, ou seja, expressa de
símbolos materiais. Como ser social,
                                             maneira compreensiva ao nosso
o homem precisa de sinais e de
                                             entendimento.
símbolos para comunicar-se com os
outros, pela linguagem, por gestos,
por ações. Vale o mesmo para sua             3
                                                Entendemos o conceito de analogia
relação com Deus”. (CIC. 1998, par.          como:       “extensão    provável      do
1146).                                       conhecimento mediante a passagem de
                                             uma proposição que exprime certa
     Se o homem é um ser que                 situação para uma outra proposição
                                             que       exprime      uma      situação
fundamentalmente se utiliza de sinais,       genericamente              semelhante”.
entendemos, no que diz respeito ao           (Dicionário de Filosofia Abbagnano,
                                             2007. p. 59). Percebemos que a
conhecimento que se pode ter de              linguagem analógica é a acessibilidade
Deus, que este é transformado em             de compreensão que se dá na
                                             passagem de uma expressão (língua)
linguagem analógica, ou seja, em             incompreensível,     ou   neste     caso,
                                             inconfundivelmente superior, a uma
                                             linguagem que nos permite apreender
2
    Catecismo da Igreja Católica.            tal língua.

                                         3
O “conceito” de Imagem                       a aliança funciona como um Símbolo
                                             (Palavra do Grego “Symballéin” que
                                             significa reunir), ou seja, temos a
      Imagem é a tradução da palavra
                                             união da pessoa e de tudo o que ela
latina Imago que indica semelhança
                                             nos significa representada, mas ao
ou signo das coisas, que pode
                                             mesmo tempo ausente no símbolo
conservar-se independentemente das
                                             (anel), por isso o anel não é passivo de
coisas. Imagem e a representação
                                             amor, mas representa uma aliança
daquilo que está ausente, ou seja, é a
                                             estabelecida no amor e na fidelidade
presença ausente em nosso meio,
                                             com o outro.
daquilo que não temos acesso no
momento.                                           Este ato de usar um anel no dedo
                                             para representar um momento é tão
     Quando temos a imagem de algo
                                             verídico na igreja que o próprio rito do
em nossa mente sofremos o processo
                                             matrimônio sugera a seguinte fórmula
de trazer alguma coisa da realidade
                                             de benção do sacerdote sobre as
que nos causou a imagem, por isso
                                             alianças: “Ó Deus, abençoai estes
quando nos lembramos do rosto de
                                             vossos filhos e santificai-os no seu
uma pessoa que gostamos muito e que
                                             amor: que estas alianças, sinal de
há muito tempo não vemos, logo nos
                                             fidelidade recordem a N. e N. a sua
vêm uma série de recordações a
                                             promessa. Por Cristo, nosso Senhor.”
respeito da pessoa, ou ainda, um
                                             Ritual do Matrimônio, Paulus. par.
amontoado de sentimentos que nos
                                             229. p. 113).       E ainda, o ritual,
levam a ter saudades e a desejar
                                             colocando na boca dos noivos tal
reviver tais momentos com aquela
                                             oração que diz o seguinte: “recebe
pessoa.
                                             esta aliança em sinal do meu amor e
      Outro aspecto intrigante da            da minha fidelidade. Em nome do Pai,
imagem é o fato de que toda imagem           do Filho, e do Espírito Santo”. (Ritual
está carregada de sentidos, como, por        do Matrimônio, Paulus. par. 67. p.
exemplo, um anel de aliança, ele em si       34). Verifica-se então, o ato de
não é a pessoa que amamos, não tem           comprometimento e o arsenal de
seu cheiro, não é capaz de se declarar       significados que pode estar por detrás
para nós, não expressa essencialmente        de um símbolo, ou uma imagem.
à presença real da pessoa que
                                                   É por isso que quando um cristão
amamos, e se assim ocorre, então por
                                             utiliza o símbolo de uma cruz no peito
que um casal se utiliza de uma
                                             ele traz subjacente tudo o que ela
aliança?
                                             significou e significa para ele.
     A resposta é tão simples quanto
                                                  A imagem pode nos transportar
profunda. A aliança representa, ou re-
                                             para além de nós mesmos e nos faz
apresenta algo que nos leva a pessoa,

                                         4
mergulhar no passado com as                   semelhança” (Gn 2; 26)4 Entendemos
recordações que ela suscita, nos              este trecho bíblico a luz da
remete ao presente na medida em que           interpretação de Santo Tomás de
nós nos utilizamos dela, e nos projeta        Aquino que distingue a imagem da
ao futuro quando este por sua vez é           semelhança, assim, segundo o doutor
uma imagem que ainda não se                   angélico: “Qualquer semelhança,
realizou.                                     mesmo que seja a expressão de outra
                                              coisa, não basta para realizar e
                                              essência      da   imagem.    (Suma
Imagem de Deus
                                              Teológica. Questão XCIII. Art. II,
                                              p.829). Se assemelhar é parecer-se
     É com base no conceito de                com algo, o homem é semelhante a
imagem, e mais, em sua capacidade de          Deus na medida em que é através da
representar algo que se lhe indica, é         graça, capaz de refletir em si a
que percebemos toda a apologia para a         imagem fiel de Deus. Ser semelhante
defesa da dignidade humana e sua              é estar e permanecer atuante nas
ontológica representação da imagem            características que se lhe indicam
de Deus (Imago Dei). Ser imagem de            aquilo ao qual nós vamos tornando-
Deus é ser também capaz de re-                nos imagem, assim o homem é
apresentar a Deus, de refletir algo que       semelhante a Deus quando em sua
indique para o divino.                        natureza está resplandecendo algo do
                                              próprio Deus.
     Ser imagem de Deus nos coloca
numa situação encantadora, pois                    Assemelhar-se a Deus é fruto da
quando dizemos que somos imagem               comunhão com ele tanto que Santo
de algo logo estamos dizendo que              Tomás afirma que “pelo pecado o
desejamos ser algo que não está ao            homem torna-se dessemelhante a
nosso alcance, quando nos propomos            Deus,” (Idem. Art. IV, p. 832), por
a sermos a imagem de Deus nós                 isso nossa fidelidade demarca a linha
reconhecemos que desejamos seguir             de semelhança do humano para com o
seus passos e se assemelhar a ele, mas        divino. Quando o homem desobedece
que jamais seremos Deus mesmo, pois           a Deus no paraíso ele junto com a
a imagem por mais fiel que seja não é         Graça Original perde a semelhança
jamais o objeto que é representado.           (no sentido de natureza primeira e in-
                                              corrompida do estado original).
      A problemática bíblica a respeito
da situação do homem como imagem
de Deus está explicita desde o livro do
Gênesis quando Deus diz: “Façamos             4
                                               Sagrada Escritura; Tradução: A
o homem à nossa imagem, como nossa            BÍBLIA DE JERUSALÉM. Paulus, 7° Ed.
                                              Revisada, 1973, reimpressão 1995.


                                          5
O que então permanece na queda                No conceito imagem vemos
é justamente a imagem de Deus que se          “escondido”        a        verdadeira
manifesta em tudo o que existe e por          representação do termo e mais a sua
excelência se manifesta na imagem do          aplicabilidade na realidade do
homem na medida em que representa             cristianismo. Assim estamos muito
(re-apresenta: no sentido de atualizar        além       da   generalização       da
continuamente)       perfeita      ou         compreensão medíocre de imagem
imperfeitamente a imagem de Deus.             quando se compreende a imagem
                                              como algo pejorativo e até profano.
      O conceito de imagem abrange
uma intimidade entre o Criador e a                   Convém-nos ressaltar que se
criatura-homem, em defesa disso o             existe no humano algo capaz de elevá-
Doutor Angélico escreve na Suma               lo a uma dignificação é a capacidade
Teológica: “Por onde a imagem de              de tentar ser uma imagem do divino e
Deus pode ser considerada, no                 repetir ao longo da história o exemplo,
homem, a tríplice luz. Primeiro,              ou aquilo que denominamos como
enquanto o homem tem aptidão                  testemunho de santidade que na
natural para inteligir e amar a Deus;         verdade é a tentativa (embora de
e essa aptidão natural para inteligir         maneira imperfeita) à realização da
(conhecer) e amar a Deus; e essa              vontade do coração de Deus Pai:
aptidão consiste em a natureza mesma          “Sede santos como eu sou santo” (Lv
da mente, comum a todos os homens.            11; 44).
Depois enquanto o homem, atual ou
habitualmente, conhece e ama a Deus,
                                              A concepção de “imagem”             na
embora imperfeitamente; e essa é a
                                              Sagrada Escritura
imagem por conformidade da graça.
Terceiro, enquanto o homem conhece
e ama a Deus atualmente e                           Como         já       dissemos
perfeitamente o ama; e assim essa é a         anteriormente, há uma sacralidade no
imagem por semelhança da Glória”.             homem que foi criado a “imagem e
(Questão XCIII. Art. IV. p. 832).5            semelhança de Deus” (Gn 2; 26).
                                              Onde está impregnado na alma deste
5                                             mesmo homem propriedades que
    Chamamos a atenção para a
profundidade da colocação tomista
onde num primeiro momento o homem
mais do que tornar-se imagem de
Deus, tem em si a aptidão para refletir
a Deus, ou seja, no homem à imagem            moldado. Esta compreensão vem de
de Deus impressa indelevelmente no            encontro com o significado profundo do
homem, em todos os homens, que                nome      “cristão”     que      indica
permite com que a criatura ame o              essencialmente: “ser outro cristo”) em
Criador. Em um segundo momento o              Deus. No último estado, a semelhança
homem se “conforma” (no sentido de            para com o divino é resgatada e a
formar-se, entrar na forma, de ser            imagem restaurada.

                                          6
pertencem em suma ao Criador 6, tanto         pela atitude do ato de criação, sermos
que nos será possível perceber o zelo e       então e por excelência “ícones” de
o empenho de Deus em preservar sua            Deus. Aqui está à dignidade e a
imagem em si, dada que a imagem do            reverência de todo ser humano em
próprio Deus essencialmente não é             meio ao universo. Foi admirando à
submetida à corrupção, e no homem             divindade refletida no homem, que o
este processo ocorre pela ação da             salmista se elevou a um nível de
Graça.                                        espanto      para    com      tamanha
                                              benignidade, diz ainda o salmista:
      Expressamos de maneira sincera
                                              “fizeste pouco menos que um Deus,
e confessamos desde já que não temos
                                              coroando-o de glória e beleza”. Somos
a intenção de fazer uma exegese
                                              belos à medida que nos percebemos e
bíblica no conceito e na compreensão
                                              agimos como imagem viva de Deus.
de imagem, pois o tema é abrangente e
perpassa toda a Sagrada Escritura,                  Faz-se, portanto, necessário
porém, pretendemos nos ater no cerne          esclarecermos primeiramente um texto
da questão que envolve a imagem               bíblico que se tornou grande motivo
enquanto espécie sacramental da vida          de discussão e interpretação, quando
humana.                                       se atém em comentar tal concepção de
                                              imagem na Bíblia. Eis o texto: “Não
      Queremos começar este esboço
                                              farás imagem alguma para ti!” (Ex
com o salmista que louva a Deus da
                                              20; 4s).
seguinte forma: “Quando vejo o céu,
obra dos teus dedos, a lua e as                     Apressadamente nós devemos
estrelas que fixaste, que é um mortal,        perceber que a compreensão de
para dele te lembrares, e um filho de         imagem tem na Sagrada Escritura um
Adão, que venhas visitá-lo? E o fizeste       duplo      sentido.    Primeiramente
pouco menos que um deus, coroando-            percebemos a colocação do livro do
o de glória e beleza”.(Sl 8; 4-5).            Êxodo. “Eu sou o Senhor teu Deus,
                                              que te fez sair do Egito, da casa da
     O louvor do salmista vai de
                                              escravidão!” (Ex 20; 2). Israel foi um
encontro   com    uma     exigência
                                              povo escravizado por que se
desencadeada do Criador que nos faz
                                              distanciou do Deus Altíssimo, sua
                                              vida se tornou amarga pelo jugo da
6                                             escravidão, e pelo labor forçoso que
       As propriedades podem ser
observadas em um número grande,               lhe foi imposto, isso é inegável, o
mas destacamos a bondade, a verdade,
a beleza, e a unidade que estão               povo eleito foi e por muito tempo,
reunidas no homem em certo grau que           massacrado e condicionado a uma
permitem identificar nele os traços do
divino e nos faz compreender que é em
                                              vida desumana e sofrida em meio aos
Deus que todas essas propriedades se          egípcios.
encontram em grau infinitamente
manifestado.

                                          7
Porém o cerne da questão vai            humano é incapaz de atingir a
além, sabemos que o povo egípcio era          transcendência divina. Contudo o que
um povo politeísta e a Idolatria era          se pretende salvaguardar é na verdade
constante. Assim, não foi somente o           a imagem de Deus, não enquanto
número dos hebreus que cresceram no           Deus, pois, se ele tem uma imagem,
Egito, mas também houve uma                   ela o é inatingível; a questão é
interpenetração mútua nos costumes            justamente a imagem que os homens
de ambos os povos, na forma de viver,         (os escolhidos do altíssimo-hebreus)
e também na vida religiosa, onde              honram em si e que reflete Deus, é a
muitos dos filhos de Israel se                intimidade e a fidelidade que se tem
profanaram;      se      prostituíram,        em relação a Deus, esta participação
              7
prostrando-se a deuses que não o seu          axiológica que advém do próprio
Deus.                                         Deus, e deve ser acolhido no coração
                                              e nos costumes dos homens.
      Há uma ordem subjacente no
primeiro mandamento do Decálogo                     A proibição de “não fazer para si
que explicita toda a contextualização         imagem alguma”, a princípio não
acima apontada, segundo o autor do            pode ser entendida corretamente se
Êxodo, Deus deu uma ordem ao seu              não levarmos em consideração o
povo: “Não terás outros deuses além           caráter analógico da questão, ou seja,
de mim. Não farás para ti imagem              “não crie para ti uma imagem que o
esculpida, nem figura alguma do que           faça esquecer a imagem do Senhor
existe em cima nos céus, ou embaixo           Deus de Israel, o conceito em questão
na terra, ou nas águas debaixo da             é a idolatria.8
terra. Não te prostrarás diante dos
ídolos, nem lhes prestarás culto, pois
                                              8
eu sou o Senhor teu Deus, um Deus               Idolatria não consiste em manter uma
                                              imagem num ambiente, e muito menos
ciumento”. (Ex 20; 3-5).                      na materialidade de um signo que
                                              representa alguma coisa. A idolatria
     O que está estabelecido nas              consiste num sentido de colocar outra
“entre linhas” do texto acima não é           coisa que não Deus, no lugar de Deus.
                                              Reparemo-nos que o verbo “colocar” é
somente o comportamento humano                a      expressão      que     utilizamos
em si, e particularmente do povo              limitadamente e por uma dificuldade de
hebreu, pois um comportamento                 limites da própria linguagem, tanto que
                                              Deus não é literalmente, “colocado”
                                              como um objeto que pode ser movido
7
  Este, “se prostrar” não se reduz a um       de um lado para o outro. O sentido de
ato de reverência no que diz respeito         “colocar” que utilizamos é no sentido
ação de ajoelhar-se diante de; mas, é         existencial, que nos leva a pergunta:
muito mais do que isso, é a atitude           Qual é o lugar de Deus em nossa vida?
própria de se submeter livremente e           O que está em questão não é o
conscientemente a algo, ou a alguém,          movimento de Deus, mas o nosso
de tal maneira que a vida tornar-se-á         movimento para Deus, em Deus, e com
um serviço pleno que caminha em               Deus. Quem pode tornar-se idólatra
função de tal submissão.                      somos nós os humanos e não Deus,

                                          8
Se ainda insistíssemos em                somente o que é humano para se
interpretar esta passagem do Êxodo             saciar, ou seja, é deixar-se preencher
sem compreender as questões                    de coisas mundanas desviando-se do
históricas e religiosas da época, e para       Altíssimo. Eis a verdade impressa
além destas, a mensagem salvífica              neste texto do Êxodo. O povo foi
expressada aquele povo, vamos sem              idólatra na medida em que se desviou
dúvida nos esbarrarmos outra vez na            do caminho de Deus.
ausência da compreensão do trecho
                                                     As imagens sejam elas de barro
bíblico que diz: “Não farás para ti
                                               ou de ouro, de gesso ou de qualquer
imagem esculpida, nem figura alguma
                                               outro material, são indiferentes para
do que existe em cima nos céus, ou
                                               alcançar a Deus, pois este é
embaixo na terra, ou nas águas
                                               infinitamente superior. Como diz o
debaixo da terra” (Ex 20; 4). Afinal,
                                               salmista: “Aos ídolos das nações são
como poderiam os hebreus fazer
                                               prata e ouro, feitos por mãos
imagens nas águas debaixo da terra?
                                               humanas: têm boca e não falam, têm
Tal aspecto torna-se redutível no
                                               olhos e não vêem, têm ouvidos e não
contexto.
                                               ouvem, e boca deles não respira.
      Advertimos ao leitor que a               Sejam como eles os que fabricam e
concepção de imagem na Sagrada                 todos os que neles confiam”. (SL 135;
Escritura não pode indicar apenas o            15-18) Aqui não se discute a
ato de criar imagens de deuses com ás          fabricação de imagens como tal, mas
próprias mãos como ocorreu com                 sim a intencionalidade do ato para o
Aarão. 9 Este ato de criar deuses para         qual as imagens estão destinadas, eles
si não corresponde, ou ainda, carece           faziam imagens para adorá-las, e mais,
de sentido, quando especificado na             o ato de esculpir imagens era a
aparente “limitada compreensão”                maneira que Israel tinha de “dominar”
literária desses versículos, não é o ato       a divindade, de tentar se prevalecer
de criar imagens para si, mas voltar-se        diante do transcendente.
ao limitado se fechando ao
                                                     Outro aspecto que ainda merece
transcendente, e ainda, buscar
                                               ser destacado é a aparente contradição
como também as vítimas de tal                  da parte dos mandamentos de Deus a
idolatria são os humanos e não Deus.           respeito da criação (ato de esculpir)
9
   “Vendo que Moisés demorava a
descer do monte, o povo reuniu-se em           das imagens, se assim o for entendido
torno de Aarão e lhe disse: Vem, faze-         de maneira obscura. Comparemos
nos deuses que caminhem à nossa
frente” (Ex 32; 2), e ainda: [Aarão]           agora dois trechos da Sagrada
“Recebendo o ouro, preparou um molde           Escritura.
com o cinzel e fez um bezerro fundido.
Então disseram: Aí tens, Israel, os teus           O primeiro se encontra no livro
deuses que te fizeram sair do Egito! Ao
ver isto Aarão construiu um altar diante       do Deuteronômio, onde o Senhor
do bezerro”. (Ex 32; 4-5b).

                                           9
Deus de Israel através de Moisés              que se veja e que se perceba diante da
exorta outra vez o povo: “Tomai               imagem de uma Serpente, obra de
cuidado com grande zelo! No dia em            homens que agem de acordo com a
que o Senhor vos falou do meio do             vontade divina.
fogo do Horeb, não viste figura
                                                    Perguntamo-nos qual a diferença
alguma.     Guardai-vos     bem     de
                                              entre o primeiro texto e o segundo?
corromper-vos, fazendo figuras de
                                              Ambas as imagens são frutos do labor
ídolos de qualquer tipo, imagens de
                                              humano, ambas são imagens, ou
homem ou de mulher, imagens de
                                              figuras, e os homens se reverenciam
animais que vivem na terra ou de aves
                                              nas duas situações; reparemos que se
que voam no céu, de bichos que se
                                              no primeiro caso os homens se
movem pelo chão ou de qualquer
                                              aproximam da imagem para torná-la
espécie de peixes que vivem na água,
                                              parte de seus cultos, no sentido de
debaixo da terra”. (Dt 4; 15-18) Aqui
                                              latria (amor excessivo, e culto
a ordem divina é clara e imperativa,
                                              supremo), onde Deus o acusa de terem
“não farás imagem alguma para ti!”.
                                              se corrompido (Ex 32; 7-8).
      No outro texto, cujo desejamos
                                                    No segundo texto, nos parece um
fazer uma comparação está no livro do
                                              caso oposto, percebe-se que há uma
Gênesis, onde: “O povo dirigiu-se a
                                              atuação direta de Deus através do uso
Moisés e disse: Pecamos, falando
                                              que ele mesmo faz na imagem da
contra o Senhor e contra ti. Roga ao
                                              Serpente, assim sendo, a condição de
Senhor que afaste de nós as serpentes.
                                              sobrevivência para os homens em
Moisés intercedeu pelo povo, e o
                                              relação à picada que sofreram das
Senhor lhe respondeu: Faze uma
                                              serpentes é olhar para aquela imagem,
serpente venenosa e coloca-a sobre
                                              e diante dela perceber e reverenciar a
uma haste. Aquele que for mordido,
                                              ação de Deus ali, estendida sob um
mas olhar para ela ficará com vida.
                                              poste e significada, ou ainda
Moisés fez, pois, uma serpente de
                                              simbolizada numa imagem.
bronze e colocou-a sobre um poste.
Quando alguém era mordido por uma                   Se assim ocorreu, podemos nos
serpente de bronze, ficava curado”.           perguntar se é a imagem que deu a
(Nm 21; 7-9)                                  sacralidade ou a profanação para os
                                              homens? A força de atuação e
     Neste episódio, Deus se utiliza
                                              transmutação se encontra na imagem
da imagem da Serpente de bronze para
                                              esculpida? Pode então, uma imagem
curar e salvaguardar a vida dos que
                                              feita por mãos humanas ser tão
haviam sido picados. Reparemos que
                                              efetivamente      direcionadora       e
a ordem também é clara e imperativa,
                                              condicionadora, a tal ponto de confluir
os que querem ser curados devem:
“olhar para a imagem”. É necessário

                                         10
o destino humano diante do mundo,               coletivo, com foi com o povo de
dos homens, e de Deus?                          Israel.

      A chave para a interpretação não                Por isso afirmamos que não é o
está na imagem, e muito menos na                fato de estar na presença de uma
ordem divina, pois é fato que de todo           imagem, ou ainda, constituí-la, que
mal Deus pode tirar um bem maior.               nos tornará necessariamente pessoas
Por isso percebe-se facilmente, depois          idólatras. E o contrário também é
de ter apontado os fatos, que tudo              verdadeiro, ou seja, é possível que
decorre da intenção que nasce do                uma pessoa seja uma profunda
coração do homem em relação ao                  adoradora de “imagens” (idólatra) sem
mundo externo.                                  nunca ter tido contato com um
                                                protótipo de gesso.
      A importância e o grau de
intencionalidade que o homem coloca                  Quando Deus impõe ao homem:
em seus atos o fazem declinar-se em             “não farás imagem alguma!” ele nos
direção a Deus ou ao mundo. Pois o              diz para não criarmos coisas externas
próprio Deus disse a Moisés: “Vai,              para fugirmos do nosso interior, a
desce, pois corrompeu-se o teu povo             ordem implícita é: “seja a minha
que tiraste do Egito. Bem depressa              imagem, e também a minha
desviaram-se do caminho que os                  semelhança!”
prescrevi.” (Ex 32; 7-8) E ainda,
                                                     Subentende-se       ainda      a
quando Moisés pergunta a Aarão o
                                                necessidade de esclarecer dois termos
motivo pelo qual ele permitiu tal
                                                que perpassam a complexidade do
atitude do povo, Aarão respondeu:
                                                nosso assunto.
“Não se indigne o meu senhor. Tu
bem sabes que este povo é inclinado                   Com João Damasceno queremos
ao mal”. (Ex 32; 21).                           se aperceber numa distinção essencial
                                                para a compreensão diferenciada das
     A intenção que brota do coração
                                                diversas maneiras de culto: Segundo o
humano é fator essencial do ato de
                                                Papa Bento XVI: “João Damasceno
adoração, no sentido de depender da
                                                foi também um dos primeiros em
intenção íntima de cada um ser livre e
                                                distinguir entre o culto público e
escolher adorar o que bem desejar,
                                                privado dos cristãos, entre a
pois tudo nos pode ser tido como
                                                adoração (latreia) e a veneração
obrigação, mas a adesão a Deus, a
                                                (proskynesis): a primeira só pode
intimidade com Ele, e ainda, a decisão
                                                dirigir-se a Deus, sumamente
de adorá-lo ou adorar o mundo é uma
                                                espiritual; a segunda, ao contrário,
decisão subjetiva, livre, e pessoal, que
                                                pode utilizar uma imagem para
não obstante causará um efeito
                                                dirigir-se àquele que é representado
                                                nela”. (Catequese pronunciada pelo

                                           11
Papa Bento XVI aos peregrinos                  participamos de maneira antecipada
reunidos na Praça de São Pedro para            da comunhão celeste, mesmo ainda
a audiência geral, na qual apresentou          estando na terra. Por isso no livro do
a figura de São João Damasceno, no             Levítico encontramos a ordem de
dia 6 de maio de 2009). 10 Subjaz,             Deus: “Sede santos por que Eu sou
portanto, uma distinção clara do ponto         santo” (Lv 11; 44). E como não
de vista doutrinal no que diz respeito         admirar estes que são companheiros
ao culto dado a Deus no ato de se              nossos e testemunhas fiéis que ao
prostrar com a vida oferecendo tudo o          longo da história vieram firmando a
que somos e temos elevando assim, ao           primazia do seguimento a Deus?
Altíssimo as nossas oferendas                  Exemplos tão reais e tão pertos de
ofertadas em Espírito e Verdade.               nós. Sim! Admiramos e pedimos
                                               sempre a intercessão daqueles que
      No sentido contrário (e não
                                               estão mais perto do Cordeiro, e
contraditório) do ato de adoração
                                               através do poder da oração que não
agimos quando veneramos pela
                                               conhece barreiras, nos confiamos
comunhão dos Santos, todos os eleitos
                                               também às orações de tantos irmãos e
de Deus que formam o povo eleito,
                                               irmãs que já venceram o caminho que
assim como nos fala o livro do
                                               estamos percorrendo. Assim venerar a
Apocalipse: “Então, um dos Anciãos
                                               vida de um santo é ter a certeza de que
falou comigo, perguntando: Estes que
                                               como ele conseguiu vencer em Cristo,
estão vestidos com túnicas brancas,
                                               nós também somos capazes e se ainda
quem são e de onde vieram? Eu
                                               assim     duvidamos       de     nossas
respondi: Tu é que sabes meu senhor.
                                               capacidades, temos a vida deles para
Ele então me disse: Estes são os que
                                               nos ensinar e constantemente nos
vieram da grande tribulação.
                                               relembrar de que é possível “vencer
Lavaram e branquearam as suas
                                               no sangue do Cordeiro”!
vestes no sangue do Cordeiro. Por
isso estão diante do trono de Deus e                      Assim      permanece      e
lhe prestam culto dia e noite, no seu          reforçamos a distinção entre o culto á
santuário.” (Ap 7; 13-15)                      Deus e o culto aos santos
                                               representados nas imagens sacras.
      Veneramos (proskynesis) toda a
                                               Conforme nos relembra o Papa João
milícia celeste, desde os santos, os
                                               Paulo II: “O Concílio Niceno II,
mártires, e até as miríades de miríades
                                               portanto, reafirmou solenemente a
de anjos que servem e louvam a Deus
                                               distinção tradicional entre "a
incessantemente,      e    com     eles
                                               verdadeira adoração (latria)" que,
10
 Texto           acessado          em          "segundo a nossa fé, é devida somente
http://www.zenit.org/article-                  à natureza divina" e "a prosternação
21509?l=portuguese
> no dia 02/12/2010.
                                               de honra" (timetiké proskynesis), que


                                          12
é prestada aos icones, porque "aquele         medida com que medis             sereis
que se prostra diante do icone,               medidos”. (Mt 7; 1-2).
prostra-se diante da pessoa (a
                                                    Quando Jesus diz aos seus
hipóstase) daquele que na figuração é
                                              discípulos que se “a justiça deles não
representado".                 (Carta
                                              fossem mais verdadeira do que as dos
apostólica Duodecimum       Saeculum.
                                              fariseus, eles não entrariam no céu.”
Sobre a veneração das imagens por
                                              (Mt 5; 20), ele justamente nos indica a
ocasião do XII centenário do II
                                              interioridade com que o homem deve
concílio de Nicéia).11
                                              se ater em relação ás coisas internas e
       Torna-se, portanto expressivo e        externas. O grande pesar de Jesus para
fundamental a distinção que fizemos           com os Escribas e Fariseus era o
do culto de adoração a Deus e a               abismo que havia entre aquilo que
veneração que temos na comunhão               falavam e aquilo que viviam, ou seja,
dos santos. Aqui subjaz o cuidado que         o ato de hipocrisia, (pregar uma
as pessoas deveriam ter quando                doutrina sem a preocupação de vivê-
afirmam “ex-cátedra” que os católicos         la), medir os outros a partir de
adoram imagem. Será que ao menos              medidas que não são aplicáveis nem a
elas sabem fazer tão singela distinção        nós mesmos.
entre adoração e veneração? Pedimos
                                                    O que os “doutores da Lei” não
licença para um pensador chamado
                                              compreendiam é que as Letras fazem
Wittgeinstein, e nos permitimos
                                              parte da Lei escrita, mas o fundamento
adaptar sua famosa frase em nosso
                                              da Lei não se reduz ao cumprimento
contexto para dizer: “Daquilo que não
                                              cego e determinista de preceitos, e sim
se sabe é melhor que se cale!”
                                              na caridade e eficácia em nível de
                                              transformação interior refletida no
A crítica que nos advém            da         exterior de cada um que se põe sob os
“Babilônia Discursiva”                        moldes dessa mesma Lei. Em suma
                                              seguir a Lei é na verdade seguir
     - Os católicos adoram imagens...         aquele que nos deu os caminhos
                                              indicados na Lei, a Lei não é o fim,
“Não julgueis para não serdes
                                              mas o meio pelo qual se é indicado o
julgados. Pois com o julgamento com
                                              Fim, que é o próprio Deus.
que julgais sereis julgados, e com a
                                                   O aspecto de Lei, no sentido de
                                              normas redigidas nos ajudam a
11
  Texto acessado em:<
                                              percebermos um caráter fundamental
http://www.vatican.va/holy_father/joh         para esta parte de nosso trabalho, a
n_paul_ii/apost_letters/documents/hf_j        Lei, tem fundamento em nós na
p-ii_apl_19871204_duodecim-
saeculum_po.html> no dia                      medida em que nós tomamos
02/12/2010.

                                         13
conhecimento dela, pois, quem pode            acalentos da “Babilônia Discursiva” a
transgredir aquilo que não se conhece?        respeito de tal assunto para além da
Para ter peso de julgamento, toda             ignorância que se tem de tais
sentença pressupõe que o sentenciado          fundamentos,         suplicamos       na
tenha clareza, ou, ao menos a intuição        autoridade do Evangelho que deixem
de seu delito.                                o juízo para o Sumo Juiz, que nos
                                              julgue àquele que é digno, o resto
      A grande questão que colocamos
                                              torna-se fútil e desnecessário, por isso
é o peso das palavras do Evangelho
                                              recomendamos        a     vós    irmãos
que nos diz: “não julgueis para não
                                              separados, (não a todos, mas àqueles
serdes julgados,” e se assim nos
                                              que se comportam erroneamente ao
apercebemos como então seguirmos,
                                              nosso     respeito)    que não os
como se fossemos juízes da Lei
                                              condenamos, pois não somos o Juiz,
divina? E, nos atermos em atos
                                              apenas      os     recomendamos        à
críticos para com a maneira e o
                                              misericórdia       divina     e      vos
sentido dos cultos alheios?
                                              compreendemos na caridade, mas nem
      Como podemos então dizer “aos           a própria caridade tem o direito de
ventos” que os católicos são                  faltar ao respeito, este é destinado a
adoradores de imagens, e se                   todos, e todos são todos.
possivelmente o fossem? Afirmamos e
                                                    É fácil do ponto de vista
ao mesmo tempo nos perguntamos
                                              daqueles que não se preocupam em
junto com Thiago, em sua epístola:
                                              buscar a verdade das coisas e um
“Não faleis mal uns dos outros,
                                              profundo sentido para tudo o que está
irmãos. Aquele que fala mal de um
                                              lançado no universo, àqueles que,
irmão ou julga o seu irmão fala mal
                                              como dissemos no início, não se
da Lei e julga a Lei. Ora, se julgas a
                                              permite serem atingidos pelo próximo,
Lei, já não estás praticando a Lei,
                                              pois têm tanta certeza de suas certezas
mas te fazes juiz da Lei. Só há um
                                              que se aprisionam num dogmatismo
legislador e juiz, a saber, aquele que
                                              muitas vezes fideísta e egoísta.
pode salvar e destruir. Tu, porém,
quem és para julgares teu próximo?”                 A nós é caro à verdade em si, e
(Tg 4; 11-12).                                sabemos que ela emana do próprio
                                              Deus e por isso pode e deve ser
      Além do erro patético da
                                              submetida a tudo e a todos, pois seu
generalização da sentença acima (os
                                              caráter de estado não depende de
católicos adoram imagens), temos o
                                              “nossos bisturis, pelo contrário a
desconhecimento da doutrina em que
                                              Verdade é exposta não para ser
está embasada a sustentação do culto
                                              desacreditada e reprovada, pois se
de imagens dos católicos, devemos
                                              assim o fosse não seria a verdade, ela
então gritar em nome da justiça que os


                                         14
é exposta para iluminar e nos fazer           melhor, a profunda realidade de Deus
assentir a ela.”                              expressa na vida dos homens.

                                                      Outro aspecto em relação as
“As imagens” no ambiente católico:            imagens é o seu uso nos âmbitos
Por quê?                                      sacros que a partir de um conjunto de
                                              atos, reverências, interferências de
      Primeiramente deixamos claro            relações, ordem de culto e rito,
que as imagens cristãs quando                 intenção objetiva comum... Que em
inseridas naquilo que denominamos             suma formam o que chamamos de
como espaço litúrgico se diferem das          liturgia.
imagens expostas para a devoção                      Segundo o Concílio do
“particular”, onde a relação entre a          Vaticano II: “A liturgia, com efeito,
imagem e o devoto recebe uma                  mediante a qual, especialmente no
conotação de lembrança, de carinho,           divino sacrifício da eucaristia, se atua
de re-apresentação da ausência de uma         a obra de nossa redenção, contribui
presença, da presença de tudo aquilo          sumamente para que os fiéis
que Deus foi através da vida daquele          exprimam em suas vidas e manifestem
santo, ou santa e de tudo o que               aos outros o mistério de Cristo e a
significam para Deus, para a Igreja, e        genuína da verdade da Igreja, que tem
para cada um dos fiéis em sua                 a característica de ser ao mesmo
devoção particular.                           tempo humana e divina, visível, mas
        A imagem pode também                  dotada de realidades invisíveis,
ganhar a característica de representar        operosa na ação e devotada à
uma pessoa que significou para o              contemplação, presente no mundo e
devoto, em sua subjetividade, um              contudo peregrina; de tal modo que
exemplo para ser seguido e uma vida a         nela o humano é orientado e
ser admirada, onde se percebeu                subordinado ao divino, o visível ao
literalmente a força da expressão             invisível, a ação à contemplação, a
Imago Dei impregnada na vida de tal           realidade presente à futura cidade
santo. Mas para além desse, a imagem          para a qual estamos encaminhados”.
dos santos, ou de Maria (seja qual            (Sacrosanctum Concilium, 2007, p.
forem os aspectos sob ela admirados e         34, par. 02). A liturgia é a maneira
os títulos invocados) trazem uma              com a qual nós nos relacionamos com
identificação da realidade particular         o divino, onde ás realidades visíveis
da vida do fiel, ou até uma marca de          estão em comunicação com as
experiência de relação pessoal que ele        realidades celestes.
teve e identificou através de sua                   Entendendo,     portanto,  o
devoção para com aquilo que a                 fundamento da liturgia como aquela
imagem representa, assim, o santo, ou

                                         15
que realiza não em si mesma, mas em            fazer uma imagem daquilo que vi de
nós e conosco a ligação do humano              Deus. (...) Com o rosto descoberto,
com o divino, e do divino com o                contemplamos a glória do Senhor”.
humano, expressado no ato do culto.            (CIC. 1998, par. 1159). Se existe uma
Essa realidade é expressa na totalidade        Imagem Sacra esta é justamente a
do ato litúrgico, por excelência a nós         figura impressa na realidade humana
católicos na fôrma do sublime culto            pelo mistério da Encarnação, pois o
eucarístico dado como expressão                próprio Jesus é a Imagem viva do Pai.
última da liturgia.
                                                     Quando uma imagem ocupa um
      Todo este relevo até aqui                lugar no âmbito litúrgico ela deve nos
apresentado,    nos     ajuda     na           apontar para a imagem de Cristo na
contextualização da imagem no                  realidade humana, assim quando
âmbito sacro, e mais especificamente           temos, por exemplo, a imagem de São
obtendo um lugar próprio no culto              Paulo pintada num painel, no fundo de
litúrgico.                                     uma igreja, onde se aprecia uma
                                               grande espada em uma de suas mãos e
        Não pretendemos elencar e
                                               noutra um grande livro. Não temos a
aprofundar cada item do Culto
                                               intenção de remeter Paulo no lugar do
litúrgico sacrifical do catolicismo,
                                               Cristo, mas pelo contrário, vemos em
pois tudo o que se detém no âmbito da
                                               Paulo o grande e incansável
extensão da Santa Missa, tem um
                                               evangelizador dos gentios, expressado
“porque” próprio de ser e estar ali.
                                               por seu rosto cansado e em sua espada
Desde a Palavra proclamada, das
                                               vemos a realidade de luta daquele que
respostas e da participação da
                                               disse: “Combati o bom combate,
assembléia, da materialidade ofertada
                                               terminei a minha carreira, guardei a
(pão e vinho), do rito entendido e
                                               fé.” (2Tm 4; 7). E o livro em sua mão
participado por todos... Reparemo-
                                               nos recorda a fiel doutrina na qual ele
nos, portanto que a imagem está
                                               fez valer a sua vida, orientador das
estruturada neste todo litúrgico, e é
                                               almas, profundo conhecedor das
está imagem que denominamos como
                                               Escrituras, letrado e fervoroso no que
ícone, ou imagem sacra.
                                               diz respeito ao zelo pelas coisas de
      Tratemos mais especificamente            Deus... Assim, fica expresso em uma
da função das imagens dentro da                imagem todo um significado que
liturgia. Tendo em vista que                   remete a Cristo.
“Antigamente que Deus não tem
                                                    Por dizemos que tal imagem é
corpo nem aparência, não podia em
                                               cultuada no sentido de veneração e
absoluto ser representado por uma
                                               não de idolatria, pois ela nos indica a
imagem. Mas agora que se mostrou
                                               quem          devemos            adorar
na carne e viveu com os homens posso
                                               verdadeiramente, olhando para a

                                          16
imagem de Paulo lembramo-nos de               instrumentos que apontam para Deus,
sua conversão e de toda a sua vida que        que ilustram a realidade da relação
não é outra coisa se não o seguimento         entre Deus e os seres humanos. Neste
apaixonado á Cristo. Tente pensar o           sentido a Tradição da Igreja sempre
apóstolo Paulo sem se referir a Jesus         soube preservar e incentivar o aspecto
Cristo, perde-se profundamente o              estético de seus ambientes, e também
sentido, pois Paulo é Paulo na medida         nos é demonstrado na no decorrer da
em que está referido á Cristo e Cristo        história que foram incontáveis às
é Cristo em Paulo, com Paulo e por            vezes em que a Igreja serviu-se do
Paulo.                                        grande potencial humano chamado
                                              arte, para trazer à vida o espírito belo
      É neste segundo aspecto, o do
                                              da Revelação.
uso de imagem no ambiente litúrgico
e toda a função de apontar para a
realidade divina onde o visível               O desafio da Igreja: Ensinar seus
(imagens, textos, gestos, posturas, ou        fiéis
seja, sinais humanos) demonstra e
aponta para o invisível, nos é não                   Não é impossível expor uma
somente permitido, mas indicado.              doutrina que forme um sistema sem
Assim: “O culto cristão das imagens           lacunas, o difícil de uma doutrina não
não é contrário ao primeiro                   está na exposição da mesma, mas no
mandamento, que proíbe os ídolos. De          ensino correto de seus princípios e de
fato, a honra prestada a uma imagem           sua prática. Se a Igreja católica, no
se dirige ao modelo original, e quem          que diz respeito ao culto de imagens,
venera uma imagem venera a pessoa             traz parcelas de culpa pelos atos de
que nela está pintada. A honra                idolatria que muito se encontra em sua
prestada às santas imagens é uma              realidade, esta se deve não a sua
veneração respeitosa, e não uma               doutrina, mas a fraqueza que se tem
adoração, que só compete a Deus: O            na transmissão de seu ensinamento,
culto da religião não se dirige às            assim se tem uma doutrina coerente,
imagens em si como realidades, mas            mas do que adianta uma teoria de cuja
as considera em seu aspecto próprio           prática é quase inexistente? Eis à
de imagens que nos conduzem ao                grande chaga e à crítica que cabe a
Deus encarnado. Ora, o movimento              nós reconhecermos e na graça da
que se dirige à imagem enquanto tal           humildade, lutarmos para superar.
não determina nela, mas tende para a
realidade da qual é imagem.” (CIC.                  Como nos diz o apóstolo: “Mas
1998, par. 2132).                             como poderiam invocar aquele em
                                              quem não creram? E como poderiam
    Percebemos      que todas as              crer naquele que não ouviram? E
imagens devem       servir-nos como           como poderiam ouvir sem pregador?

                                         17
E como podem pregar se não forem                “mito”, pois muito se exige de um
enviados?” (Rm 10; 14-15a). É                   verdadeiro fiel, e, além disso, a
obrigação por excelência da Igreja de           praticidade dos interesses mundanos é
Cristo e a ela pertence o múnus de              egoísta, predominando totalmente a
ensinar e salvaguardar a Verdade, não           irrelevância, no que diz respeito à
para si, mas para a humanidade.                 posição de assumir a Imagem de Deus
                                                para si e ser essa imagem, por que há
      Torna-se então uma obrigação
                                                um grande slogam que se sobrepõem à
de toda a Igreja para com o aspecto
                                                maioria: “não precisamos mais de
formativo de seus fiéis e introduzi-los,
                                                Deus”.
pois se não ensinamos nossos fiéis
estamos cometendo o grave pecado da                      Assim, para além de atos
omissão.                                        ritualísticos nos deparamos com a
                                                tragédia a nível estrutural de nossa
       Hoje nossos fiéis sofrem de um
                                                sociedade, onde não se constroem
mal que denominamos “indiferença”,
                                                mais imagens materializadas para
ou seja, há uma secularização
                                                cultuar um ou outro deus, nós estamos
profunda e uma espécie de “perca do
                                                no século da idolatria, mas onde a
senso” das coisas sagradas. Trocamos
                                                própria matéria esculpida nas vaidades
a mística da vida e o sentido profundo
                                                dos corações é fundamentalmente
da vivência do cristianismo pela
                                                adorada, ou seja, hoje troca-se o
ordinariedade compulsiva de nossos
                                                Criador pela criatura.
dias e o nosso ativismo mortífero. Se
por um lado temos uma grande falha                     Se no Antigo testamento se
em nível de estrutura no que diz                constatava a idolatria a imagens feitas
respeito ao ensinamento para com os             por mãos humanas, hoje as próprias
fiéis, temos também um caminho                  mãos humanas são motivos de
contrário, que se soma a uma série de           idolatria, em nosso século há um
fatores, como por exemplo, o                    exacerbado culto do corpo e do status
desinteresse intrínseco da sociedade            do homem ideal, onde Deus para além
atual no que diz respeito à moral, à            de uma imagem transcendente tornou-
religião, ao meio ambiente, ao                  se um ideal próprio da criação humana
próximo, que parte do fiel para com a           e nada mais. Há uma inversão dos
sociedade...                                    valores, para não dizer uma perda,
                                                onde Deus tornou-se o próprio motivo
       Segue-se uma época onde a
                                                de um ato idólatra, ou ainda, quem crê
profundidade exigida no compromisso
                                                em Deus é tão ilusório quanto os
autêntico para com o relacionamento
                                                cultuados de imagens de gesso.
entre Deus e o individuo, e
conseqüentemente o compromisso                        Por isso o papel da Igreja
para com o próximo tornou-se um                 tornou-se mais do que em todos os


                                           18
tempos, uma necessidade de revolver           coração dos homens e de os levar a
os homens de suas “anestesias” em             conhecer, a partir de dentro, Aquele
relação à imagem do sagrado. Um               que     ousamos     representar   nas
desafio constante, como fazer com             imagens, Jesus Cristo, o Filho de
que os fiéis coloquem Deus no centro          Deus feito homem, o mesmo, ontem e
de suas vidas, tendo em vista todo o          hoje e por todos os séculos" (Hb
contexto atual e cultural, onde não há        13,8).” (Carta apostólica Duodecimum
espaço para esse mesmo Deus.                  Saeculum. Sobre a veneração das
                                              imagens por ocasião do XII centenário
       Temos então um ponto
                                              do II concílio de Nicéia).12
delicado que deve ser discutido, como
penetrar no coração dos homens                       Trata-se    de      explorar a
modernos? Sabe-se concretamente que           espiritualidade que a arte infunde e
com a evolução tecnológica e o                desperta no ser humano para colocá-lo
desenvolvimento global da cultura, os         ao encontro com Deus. Assim se
homens de hoje tem um caráter                 utilizado corretamente o culto as
mediático,    onde     se    difundem         imagens torna-se um instrumento útil
expansivamente tudo o que lhe é               na evangelização e não um motivo de
oferecido de maneira atrativa.                incentivo para a idolatria.

       Por isso a Igreja vê na arte
sacra uma maneira unia de perpassar o         Considerações finais
coração do homem moderno e fazê-lo
meditar os mistérios da fé. Assim                    Nós católicos adoramos a Deus
escreveu João Paulo II: “Amadíssimos          e nele colocamos a nossa confiança,
Irmãos: Ao recordar a atualidade da           pois é Ele quem subjaz em tudo o que
doutrina do VII Concílio Ecumênico,           é. Deus em sua infinita bondade se
parece-me que estamos perante um              comunica ao homem e se faz acessível
chamamento       à    nossa    tarefa         aos limites do homem. Assim, Ele, o
primordial de evangelização. A                inefável torna-se imanente sem perder
secularização crescente da sociedade          sua transcendência, e faz-se a própria
mostra que ela está se tornando, em           Imagem do Sagrado, personificado e
larga escala, alheia aos valores              encarnado em seu filho, Jesus Cristo.
espirituais, ao mistério da nossa
Salvação em Jesus Cristo e à                        Ele que de si mesmo nos disse:
realidade do mundo futuro. A nossa            “Se a mim mesmo glorifico minha
tradição     mais   autêntica,   que
                                              12
compartilhamos plenamente com os                Texto acessado em:<
                                              http://www.vatican.va/holy_father/joh
nossos irmãos ortodoxos, ensina-nos           n_paul_ii/apost_letters/documents/hf_j
que a linguagem da beleza, posta a            p-ii_apl_19871204_duodecim-
serviço da fé, é capaz de atingir o           saeculum_po.html> no dia
                                              02/12/2010.

                                         19
glória nada é; quem me glorifica é              em clamar ao modo da uma “babilônia
meu Pai”. (Jo 8; 53b). Sendo assim,             discursiva”, de que nós católicos
entendemos que o próprio Cristo é a             adoramos imagem, que a respeito
Imagem Perfeita do Pai, esta imagem             deles, ou da postura medíocre que a
que encarnada é motivo de nosso culto           maioria assume ao nos “criticar sem
de adoração, adoramos a imagem do               conhecer”, eis o lema da ignorância!
Pai, logo, adoramos o Filho.                    A estes Santo Agostinho já havia a
                                                milhares de anos atrás os advertido, e
        Se há a possibilidade de existir
                                                com Santo Agostinho elevamos a
uma Imagem de Deus, e acreditamos
                                                Deus nossas preces por estes, e por
piamente que há, essa é a própria face
                                                todos aqueles que não conhecem a sã
de Jesus Cristo, assim pelo mistério da
                                                doutrina da Esposa de Cristo, que
Encarnação e todo o seu efeito
                                                fielmente salvaguarda o Tesouro
cosmológico, nós entendemos que a
                                                Máximo, o próprio Deus em seu seio,
matéria corrompida inicialmente pelo
                                                até que Ele volte.
pecado foi dignificada e reinstituída
pelo ato da Encarnação, onde Deus em                   Assim pedimos a Deus pelos
sua “Kénosis” do grego que significa            desertores e por todos os que com o
“esvaziamento” de si mesmo (Fl 2; 6-            coração sincero, buscam a verdade
11), não se apegando a sua condição             para suas vidas, a eles entendemos que
divina, se fez homem, submetendo-se             ainda “Não conhecem o caminho, que
a um corpo e à sofrer uma imagem, ou            é a tua Palavra, por meio da qual
seja, tornar-se humano.                         criaste, não só o que eles medem, mas
                                                também a eles mesmos que medem,
       Sabemos que ás imagens são
                                                até os sentidos pelos quais vêem o que
símbolos pedagógicos, que revestidos
                                                calculam e a inteligência com a qual
de um sentido único nos levam a
                                                calculam, ilimitada! O próprio
contemplar ás realidades invisíveis da
                                                Unigênito se fez para nós sabedoria,
fé. Temos plena convicção que há
                                                justiça e santificação, foi considerado
uma severa distinção entre o signo e
                                                um de nós e pagou tributo a César.
aquilo que está sendo re-apresentado
                                                Não conhecem o caminho pelo qual,
com imagens, com palavras, e com
                                                deixando o orgulho, iriam a te o
gestos, e também com toda a realidade
                                                salvador, e, por ele, subiriam
material que nos faz prender a atenção
                                                novamente a ele, ignoram este
e nos impulsiona ao sagrado, tamanho
                                                caminho e se consideram tão elevados
acontecimento é expresso e facilmente
                                                e cintilantes quanto os astros; e
percebido em todos os atos litúrgicos
                                                tombaram por terra, com o coração
celebrados.
                                                coberto pelas trevas da ignorância.
       Ainda resta-nos a intenção de            Dizem muitas verdades sobre as
advertir a todos àqueles que insistem           criaturas, e não buscam devotamente


                                           20
a verdade, artífice da criação; assim,         fundamentando       o    mundo    em
não a encontram, ou, se a encontram,           princípios éticos cristãos a favor da
embora conhecendo a Deus, nem lhe              vida, e da vida no céu.
rendem graças.           Proclamam-se
                                                      Enfim cremos firmemente que
sábios, atribuindo a si dons que são
                                               quem busca a Verdade de coração
teus; e se empenham, cegos e
                                               sincero, cedo ou tarde, a encontrará.
perversos, em atribuir-te o que
                                               Nós buscamos, e temo a esperança de
propriamente pertence a eles:
                                               nela permanecer e escatologicamente,
transferem suas falsidades a ti, que és
                                               já dela participar.
a Verdade, e assim trocam a glória de
Deus incorruptível por imagens do
homem      corruptível,    de     aves,
quadrúpedes e répteis; trocam a
verdade de Deus pela mentira, e
adoram e servem a criatura em lugar
do      Criador”.       (AGOSTINHO,
Confissões. 2006, P. 120-121).

       Tem-se em nós a Verdade?
Está é a Igreja de Cristo? Isso é
possível e historicamente muito
provável, mas se a Verdade como
cremos é o próprio Deus, ele está para
além dos limites da instituição embora
queira nela permanecer, e por isso
acreditamos que se a perfeição está
muito longe de se realizar em nossa
humanidade, pois a Igreja mesmo
guiada fielmente e continuamente pelo
Espírito Santo, ela também é
constituída de homens pecadores
limitados. Assim temos a “Virgem
Prostituta” como diziam os santos
padres, o Céu em meio a terra, o
Divino penetrado no humano.

      Não somos perfeitos e nem
temos a pretensão de o ser, mas é
inegável e a história tem estado ao
nosso favor, de que estamos mais do
que nunca buscando a verdade e

                                          21
REFERENCIAS



ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. SP. Martins Fontes, 2007.

AGOSTINHO, Santo. Confissões. livro III. SP. Paulus: 1997.

AQUINO, Tomás. Suma teológica. Primeira parte. Questões 1- 49. 2° ed. RS.
Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, Universidade de Caxias do
Sul. Grafosul – Indústria Gráfica Editora Ltda. Co – Edição, 1980.


CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Edição revisada de acordo com o texto
oficial em latim. SP. Loyola: 1999.

RITUAL DO MATRIMÔNIO, SP. Paulus, 1993.

SAGRADA ESCRITURA. A Bíblia de Jerusalém. SP. Paulus, 1973.

VATICANO II, Sacrosanctum Concilium, SP. Paulus, 2007.




i
 José Fernando Vieira – Graduando em filosofia. 6° período. (Faculdade Arquidiocesana de Curitiba) FAF -
02/2011.


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Iconografia cristã

  • 1. Sou católico, e não adoro imagens! i Preparação: ............................................................................................................. 2 A linguagem utilizada por Deus para se comunicar com o homem .......................... 2 O “conceito” de Imagem ......................................................................................... 4 Imagem de Deus ..................................................................................................... 5 A concepção de “imagem” na Sagrada Escritura ..................................................... 6 A crítica que nos advém da “Babilônia Discursiva” .............................................. 13 “As imagens” no ambiente católico: Por quê? ....................................................... 15 O desafio da Igreja: Ensinar seus fiéis ................................................................... 17 Considerações finais ............................................................................................. 19 1
  • 2. Preparação: orientados para que a prática errônea seja corrigida e os erros esclarecidos. Começamos transcrevendo estas Sabemos que a questão não é tão palavras para alertar a multidão dos simples e que a perplexidade do “alunos”, no sentido etimológico assunto necessitaria muito mais do daqueles que “não possuem luz”, ou que algumas “palavras escritas”, pois ainda, os que correm em direção ás muitos já o fizeram, por isso nós trevas. Falo àqueles que insistem em apenas traremos algumas ficar longe da verdade e mais, que se “lembranças” que insistem em serem utilizam do discurso religioso para esquecidas, ou até abandonadas. deturpar e persuadir a Verdade em nome de uma ilusão emotiva e um Por tais aspectos iremos nos benefício plácido da comodidade que fundamentar na Doutrina sacra da não os permitem buscar os ramos Igreja, vigiada e guardada pelo donde vertem os líquidos sapienciais Colégio Episcopal, se utilizando de do divino. alguns documentos da Sagrada Tradição, e inconfundivelmente das Buscar respostas exige-nos “Sagradas Escrituras”, pois esta muito mais do que esforços, temos distorcidamente interpretada é o que ter a virtude de sermos sinceros e arsenal da “babilônia discursiva” para não temer o que poderemos encontrar nos criticar. pela frente. O que muito se escuta na “babilônia dos discursos”1 são as Assim desejamos na acusações infantis e infundadas, em autenticidade desses escritos e na todos os sentidos, a respeito do uso de medida da limitação deste trabalho imagens no ambiente católico. que o leitor possa se questionar e procurar sua verdade para além das O que queremos é de maneira limitações aqui expostas; tanto que singela esclarecer o nosso ponto de acreditamos fielmente que quem vista doutrinal a respeito da situação, e busca com sinceridade a verdade para além das críticas, fazer com que encontrará o próprio Deus. Com as os nossos fiéis, que muitas vezes são palavras de Edith Stein: “Quem infiéis no conhecimento de sua fé e procura a verdade, mesmo sem tomar doutrina, possam se sentir seguros e consciência disto, procura Deus, porque ele é exatamente a Verdade”. 1 Termo que utilizamos para descrever A linguagem utilizada por Deus as “doxas”, ou se preferirem, as meras opiniões levantadas no âmbito externo para se comunicar com o homem a Igreja, e que se esforçam em criticar Deus em si não se utiliza de a Doutrina, sem antes conhecê-la, e linguagem, tendo em vista que a consequencialmente sem entendê-la. 2
  • 3. própria linguagem é fruto do homem e imagem e gestos que expressam de em sua imanência está inserida. Deus diversas maneiras a nossa relação com em suas propriedades transcendentais, o divino, e maneira pela qual levando em conta a Onisciência entendemos tal relação. divina, daquele que tudo conhece, e A linguagem que Deus se utiliza tudo percebe, e que subjaz tudo sob é essencialmente analógica3 onde a seu domínio, podemos nos perguntar: maneira de apreender alguma coisa de Deus precisa de linguagem para Deus é realizada a “nossa” maneira, comunicar a si? Obviamente que não! ou seja, Deus se “transporta” até o Mas se Deus se comunica, ele se humano para que ele possa comunica a algo, ou alguém, e este compreendê-lo. Por isso tem-se que alguém, o homem é necessariamente admitir que Deus só seja conhecido e um ser lingüístico e expressado, ora pela Sagrada fundamentalmente necessitado de uma Escritura, ora pela Tradição, que se “pedagogia” que seja acessível a ele. faz acessível pela linguagem universal Deus para atingir nossa condição da relação comunicada. humana se faz linguagem acessível para ser entendido por este mesmo Com a certeza da lógica exposta homem. nesses argumentos acima, compreendemos que o homem não Assim a Igreja no CIC2 é clara tem intelecção direta do divino em afirmar: “Sendo o homem um ser (intuição), muito pelo contrário, não ao mesmo tempo corporal e espiritual, somos capazes de penetrar nos exprime e percebe as realidades mistérios de Deus se não for pela espirituais por meio de sinais e de graça revelada, ou seja, expressa de símbolos materiais. Como ser social, maneira compreensiva ao nosso o homem precisa de sinais e de entendimento. símbolos para comunicar-se com os outros, pela linguagem, por gestos, por ações. Vale o mesmo para sua 3 Entendemos o conceito de analogia relação com Deus”. (CIC. 1998, par. como: “extensão provável do 1146). conhecimento mediante a passagem de uma proposição que exprime certa Se o homem é um ser que situação para uma outra proposição que exprime uma situação fundamentalmente se utiliza de sinais, genericamente semelhante”. entendemos, no que diz respeito ao (Dicionário de Filosofia Abbagnano, 2007. p. 59). Percebemos que a conhecimento que se pode ter de linguagem analógica é a acessibilidade Deus, que este é transformado em de compreensão que se dá na passagem de uma expressão (língua) linguagem analógica, ou seja, em incompreensível, ou neste caso, inconfundivelmente superior, a uma linguagem que nos permite apreender 2 Catecismo da Igreja Católica. tal língua. 3
  • 4. O “conceito” de Imagem a aliança funciona como um Símbolo (Palavra do Grego “Symballéin” que significa reunir), ou seja, temos a Imagem é a tradução da palavra união da pessoa e de tudo o que ela latina Imago que indica semelhança nos significa representada, mas ao ou signo das coisas, que pode mesmo tempo ausente no símbolo conservar-se independentemente das (anel), por isso o anel não é passivo de coisas. Imagem e a representação amor, mas representa uma aliança daquilo que está ausente, ou seja, é a estabelecida no amor e na fidelidade presença ausente em nosso meio, com o outro. daquilo que não temos acesso no momento. Este ato de usar um anel no dedo para representar um momento é tão Quando temos a imagem de algo verídico na igreja que o próprio rito do em nossa mente sofremos o processo matrimônio sugera a seguinte fórmula de trazer alguma coisa da realidade de benção do sacerdote sobre as que nos causou a imagem, por isso alianças: “Ó Deus, abençoai estes quando nos lembramos do rosto de vossos filhos e santificai-os no seu uma pessoa que gostamos muito e que amor: que estas alianças, sinal de há muito tempo não vemos, logo nos fidelidade recordem a N. e N. a sua vêm uma série de recordações a promessa. Por Cristo, nosso Senhor.” respeito da pessoa, ou ainda, um Ritual do Matrimônio, Paulus. par. amontoado de sentimentos que nos 229. p. 113). E ainda, o ritual, levam a ter saudades e a desejar colocando na boca dos noivos tal reviver tais momentos com aquela oração que diz o seguinte: “recebe pessoa. esta aliança em sinal do meu amor e Outro aspecto intrigante da da minha fidelidade. Em nome do Pai, imagem é o fato de que toda imagem do Filho, e do Espírito Santo”. (Ritual está carregada de sentidos, como, por do Matrimônio, Paulus. par. 67. p. exemplo, um anel de aliança, ele em si 34). Verifica-se então, o ato de não é a pessoa que amamos, não tem comprometimento e o arsenal de seu cheiro, não é capaz de se declarar significados que pode estar por detrás para nós, não expressa essencialmente de um símbolo, ou uma imagem. à presença real da pessoa que É por isso que quando um cristão amamos, e se assim ocorre, então por utiliza o símbolo de uma cruz no peito que um casal se utiliza de uma ele traz subjacente tudo o que ela aliança? significou e significa para ele. A resposta é tão simples quanto A imagem pode nos transportar profunda. A aliança representa, ou re- para além de nós mesmos e nos faz apresenta algo que nos leva a pessoa, 4
  • 5. mergulhar no passado com as semelhança” (Gn 2; 26)4 Entendemos recordações que ela suscita, nos este trecho bíblico a luz da remete ao presente na medida em que interpretação de Santo Tomás de nós nos utilizamos dela, e nos projeta Aquino que distingue a imagem da ao futuro quando este por sua vez é semelhança, assim, segundo o doutor uma imagem que ainda não se angélico: “Qualquer semelhança, realizou. mesmo que seja a expressão de outra coisa, não basta para realizar e essência da imagem. (Suma Imagem de Deus Teológica. Questão XCIII. Art. II, p.829). Se assemelhar é parecer-se É com base no conceito de com algo, o homem é semelhante a imagem, e mais, em sua capacidade de Deus na medida em que é através da representar algo que se lhe indica, é graça, capaz de refletir em si a que percebemos toda a apologia para a imagem fiel de Deus. Ser semelhante defesa da dignidade humana e sua é estar e permanecer atuante nas ontológica representação da imagem características que se lhe indicam de Deus (Imago Dei). Ser imagem de aquilo ao qual nós vamos tornando- Deus é ser também capaz de re- nos imagem, assim o homem é apresentar a Deus, de refletir algo que semelhante a Deus quando em sua indique para o divino. natureza está resplandecendo algo do próprio Deus. Ser imagem de Deus nos coloca numa situação encantadora, pois Assemelhar-se a Deus é fruto da quando dizemos que somos imagem comunhão com ele tanto que Santo de algo logo estamos dizendo que Tomás afirma que “pelo pecado o desejamos ser algo que não está ao homem torna-se dessemelhante a nosso alcance, quando nos propomos Deus,” (Idem. Art. IV, p. 832), por a sermos a imagem de Deus nós isso nossa fidelidade demarca a linha reconhecemos que desejamos seguir de semelhança do humano para com o seus passos e se assemelhar a ele, mas divino. Quando o homem desobedece que jamais seremos Deus mesmo, pois a Deus no paraíso ele junto com a a imagem por mais fiel que seja não é Graça Original perde a semelhança jamais o objeto que é representado. (no sentido de natureza primeira e in- corrompida do estado original). A problemática bíblica a respeito da situação do homem como imagem de Deus está explicita desde o livro do Gênesis quando Deus diz: “Façamos 4 Sagrada Escritura; Tradução: A o homem à nossa imagem, como nossa BÍBLIA DE JERUSALÉM. Paulus, 7° Ed. Revisada, 1973, reimpressão 1995. 5
  • 6. O que então permanece na queda No conceito imagem vemos é justamente a imagem de Deus que se “escondido” a verdadeira manifesta em tudo o que existe e por representação do termo e mais a sua excelência se manifesta na imagem do aplicabilidade na realidade do homem na medida em que representa cristianismo. Assim estamos muito (re-apresenta: no sentido de atualizar além da generalização da continuamente) perfeita ou compreensão medíocre de imagem imperfeitamente a imagem de Deus. quando se compreende a imagem como algo pejorativo e até profano. O conceito de imagem abrange uma intimidade entre o Criador e a Convém-nos ressaltar que se criatura-homem, em defesa disso o existe no humano algo capaz de elevá- Doutor Angélico escreve na Suma lo a uma dignificação é a capacidade Teológica: “Por onde a imagem de de tentar ser uma imagem do divino e Deus pode ser considerada, no repetir ao longo da história o exemplo, homem, a tríplice luz. Primeiro, ou aquilo que denominamos como enquanto o homem tem aptidão testemunho de santidade que na natural para inteligir e amar a Deus; verdade é a tentativa (embora de e essa aptidão natural para inteligir maneira imperfeita) à realização da (conhecer) e amar a Deus; e essa vontade do coração de Deus Pai: aptidão consiste em a natureza mesma “Sede santos como eu sou santo” (Lv da mente, comum a todos os homens. 11; 44). Depois enquanto o homem, atual ou habitualmente, conhece e ama a Deus, A concepção de “imagem” na embora imperfeitamente; e essa é a Sagrada Escritura imagem por conformidade da graça. Terceiro, enquanto o homem conhece e ama a Deus atualmente e Como já dissemos perfeitamente o ama; e assim essa é a anteriormente, há uma sacralidade no imagem por semelhança da Glória”. homem que foi criado a “imagem e (Questão XCIII. Art. IV. p. 832).5 semelhança de Deus” (Gn 2; 26). Onde está impregnado na alma deste 5 mesmo homem propriedades que Chamamos a atenção para a profundidade da colocação tomista onde num primeiro momento o homem mais do que tornar-se imagem de Deus, tem em si a aptidão para refletir a Deus, ou seja, no homem à imagem moldado. Esta compreensão vem de de Deus impressa indelevelmente no encontro com o significado profundo do homem, em todos os homens, que nome “cristão” que indica permite com que a criatura ame o essencialmente: “ser outro cristo”) em Criador. Em um segundo momento o Deus. No último estado, a semelhança homem se “conforma” (no sentido de para com o divino é resgatada e a formar-se, entrar na forma, de ser imagem restaurada. 6
  • 7. pertencem em suma ao Criador 6, tanto pela atitude do ato de criação, sermos que nos será possível perceber o zelo e então e por excelência “ícones” de o empenho de Deus em preservar sua Deus. Aqui está à dignidade e a imagem em si, dada que a imagem do reverência de todo ser humano em próprio Deus essencialmente não é meio ao universo. Foi admirando à submetida à corrupção, e no homem divindade refletida no homem, que o este processo ocorre pela ação da salmista se elevou a um nível de Graça. espanto para com tamanha benignidade, diz ainda o salmista: Expressamos de maneira sincera “fizeste pouco menos que um Deus, e confessamos desde já que não temos coroando-o de glória e beleza”. Somos a intenção de fazer uma exegese belos à medida que nos percebemos e bíblica no conceito e na compreensão agimos como imagem viva de Deus. de imagem, pois o tema é abrangente e perpassa toda a Sagrada Escritura, Faz-se, portanto, necessário porém, pretendemos nos ater no cerne esclarecermos primeiramente um texto da questão que envolve a imagem bíblico que se tornou grande motivo enquanto espécie sacramental da vida de discussão e interpretação, quando humana. se atém em comentar tal concepção de imagem na Bíblia. Eis o texto: “Não Queremos começar este esboço farás imagem alguma para ti!” (Ex com o salmista que louva a Deus da 20; 4s). seguinte forma: “Quando vejo o céu, obra dos teus dedos, a lua e as Apressadamente nós devemos estrelas que fixaste, que é um mortal, perceber que a compreensão de para dele te lembrares, e um filho de imagem tem na Sagrada Escritura um Adão, que venhas visitá-lo? E o fizeste duplo sentido. Primeiramente pouco menos que um deus, coroando- percebemos a colocação do livro do o de glória e beleza”.(Sl 8; 4-5). Êxodo. “Eu sou o Senhor teu Deus, que te fez sair do Egito, da casa da O louvor do salmista vai de escravidão!” (Ex 20; 2). Israel foi um encontro com uma exigência povo escravizado por que se desencadeada do Criador que nos faz distanciou do Deus Altíssimo, sua vida se tornou amarga pelo jugo da 6 escravidão, e pelo labor forçoso que As propriedades podem ser observadas em um número grande, lhe foi imposto, isso é inegável, o mas destacamos a bondade, a verdade, a beleza, e a unidade que estão povo eleito foi e por muito tempo, reunidas no homem em certo grau que massacrado e condicionado a uma permitem identificar nele os traços do divino e nos faz compreender que é em vida desumana e sofrida em meio aos Deus que todas essas propriedades se egípcios. encontram em grau infinitamente manifestado. 7
  • 8. Porém o cerne da questão vai humano é incapaz de atingir a além, sabemos que o povo egípcio era transcendência divina. Contudo o que um povo politeísta e a Idolatria era se pretende salvaguardar é na verdade constante. Assim, não foi somente o a imagem de Deus, não enquanto número dos hebreus que cresceram no Deus, pois, se ele tem uma imagem, Egito, mas também houve uma ela o é inatingível; a questão é interpenetração mútua nos costumes justamente a imagem que os homens de ambos os povos, na forma de viver, (os escolhidos do altíssimo-hebreus) e também na vida religiosa, onde honram em si e que reflete Deus, é a muitos dos filhos de Israel se intimidade e a fidelidade que se tem profanaram; se prostituíram, em relação a Deus, esta participação 7 prostrando-se a deuses que não o seu axiológica que advém do próprio Deus. Deus, e deve ser acolhido no coração e nos costumes dos homens. Há uma ordem subjacente no primeiro mandamento do Decálogo A proibição de “não fazer para si que explicita toda a contextualização imagem alguma”, a princípio não acima apontada, segundo o autor do pode ser entendida corretamente se Êxodo, Deus deu uma ordem ao seu não levarmos em consideração o povo: “Não terás outros deuses além caráter analógico da questão, ou seja, de mim. Não farás para ti imagem “não crie para ti uma imagem que o esculpida, nem figura alguma do que faça esquecer a imagem do Senhor existe em cima nos céus, ou embaixo Deus de Israel, o conceito em questão na terra, ou nas águas debaixo da é a idolatria.8 terra. Não te prostrarás diante dos ídolos, nem lhes prestarás culto, pois 8 eu sou o Senhor teu Deus, um Deus Idolatria não consiste em manter uma imagem num ambiente, e muito menos ciumento”. (Ex 20; 3-5). na materialidade de um signo que representa alguma coisa. A idolatria O que está estabelecido nas consiste num sentido de colocar outra “entre linhas” do texto acima não é coisa que não Deus, no lugar de Deus. Reparemo-nos que o verbo “colocar” é somente o comportamento humano a expressão que utilizamos em si, e particularmente do povo limitadamente e por uma dificuldade de hebreu, pois um comportamento limites da própria linguagem, tanto que Deus não é literalmente, “colocado” como um objeto que pode ser movido 7 Este, “se prostrar” não se reduz a um de um lado para o outro. O sentido de ato de reverência no que diz respeito “colocar” que utilizamos é no sentido ação de ajoelhar-se diante de; mas, é existencial, que nos leva a pergunta: muito mais do que isso, é a atitude Qual é o lugar de Deus em nossa vida? própria de se submeter livremente e O que está em questão não é o conscientemente a algo, ou a alguém, movimento de Deus, mas o nosso de tal maneira que a vida tornar-se-á movimento para Deus, em Deus, e com um serviço pleno que caminha em Deus. Quem pode tornar-se idólatra função de tal submissão. somos nós os humanos e não Deus, 8
  • 9. Se ainda insistíssemos em somente o que é humano para se interpretar esta passagem do Êxodo saciar, ou seja, é deixar-se preencher sem compreender as questões de coisas mundanas desviando-se do históricas e religiosas da época, e para Altíssimo. Eis a verdade impressa além destas, a mensagem salvífica neste texto do Êxodo. O povo foi expressada aquele povo, vamos sem idólatra na medida em que se desviou dúvida nos esbarrarmos outra vez na do caminho de Deus. ausência da compreensão do trecho As imagens sejam elas de barro bíblico que diz: “Não farás para ti ou de ouro, de gesso ou de qualquer imagem esculpida, nem figura alguma outro material, são indiferentes para do que existe em cima nos céus, ou alcançar a Deus, pois este é embaixo na terra, ou nas águas infinitamente superior. Como diz o debaixo da terra” (Ex 20; 4). Afinal, salmista: “Aos ídolos das nações são como poderiam os hebreus fazer prata e ouro, feitos por mãos imagens nas águas debaixo da terra? humanas: têm boca e não falam, têm Tal aspecto torna-se redutível no olhos e não vêem, têm ouvidos e não contexto. ouvem, e boca deles não respira. Advertimos ao leitor que a Sejam como eles os que fabricam e concepção de imagem na Sagrada todos os que neles confiam”. (SL 135; Escritura não pode indicar apenas o 15-18) Aqui não se discute a ato de criar imagens de deuses com ás fabricação de imagens como tal, mas próprias mãos como ocorreu com sim a intencionalidade do ato para o Aarão. 9 Este ato de criar deuses para qual as imagens estão destinadas, eles si não corresponde, ou ainda, carece faziam imagens para adorá-las, e mais, de sentido, quando especificado na o ato de esculpir imagens era a aparente “limitada compreensão” maneira que Israel tinha de “dominar” literária desses versículos, não é o ato a divindade, de tentar se prevalecer de criar imagens para si, mas voltar-se diante do transcendente. ao limitado se fechando ao Outro aspecto que ainda merece transcendente, e ainda, buscar ser destacado é a aparente contradição como também as vítimas de tal da parte dos mandamentos de Deus a idolatria são os humanos e não Deus. respeito da criação (ato de esculpir) 9 “Vendo que Moisés demorava a descer do monte, o povo reuniu-se em das imagens, se assim o for entendido torno de Aarão e lhe disse: Vem, faze- de maneira obscura. Comparemos nos deuses que caminhem à nossa frente” (Ex 32; 2), e ainda: [Aarão] agora dois trechos da Sagrada “Recebendo o ouro, preparou um molde Escritura. com o cinzel e fez um bezerro fundido. Então disseram: Aí tens, Israel, os teus O primeiro se encontra no livro deuses que te fizeram sair do Egito! Ao ver isto Aarão construiu um altar diante do Deuteronômio, onde o Senhor do bezerro”. (Ex 32; 4-5b). 9
  • 10. Deus de Israel através de Moisés que se veja e que se perceba diante da exorta outra vez o povo: “Tomai imagem de uma Serpente, obra de cuidado com grande zelo! No dia em homens que agem de acordo com a que o Senhor vos falou do meio do vontade divina. fogo do Horeb, não viste figura Perguntamo-nos qual a diferença alguma. Guardai-vos bem de entre o primeiro texto e o segundo? corromper-vos, fazendo figuras de Ambas as imagens são frutos do labor ídolos de qualquer tipo, imagens de humano, ambas são imagens, ou homem ou de mulher, imagens de figuras, e os homens se reverenciam animais que vivem na terra ou de aves nas duas situações; reparemos que se que voam no céu, de bichos que se no primeiro caso os homens se movem pelo chão ou de qualquer aproximam da imagem para torná-la espécie de peixes que vivem na água, parte de seus cultos, no sentido de debaixo da terra”. (Dt 4; 15-18) Aqui latria (amor excessivo, e culto a ordem divina é clara e imperativa, supremo), onde Deus o acusa de terem “não farás imagem alguma para ti!”. se corrompido (Ex 32; 7-8). No outro texto, cujo desejamos No segundo texto, nos parece um fazer uma comparação está no livro do caso oposto, percebe-se que há uma Gênesis, onde: “O povo dirigiu-se a atuação direta de Deus através do uso Moisés e disse: Pecamos, falando que ele mesmo faz na imagem da contra o Senhor e contra ti. Roga ao Serpente, assim sendo, a condição de Senhor que afaste de nós as serpentes. sobrevivência para os homens em Moisés intercedeu pelo povo, e o relação à picada que sofreram das Senhor lhe respondeu: Faze uma serpentes é olhar para aquela imagem, serpente venenosa e coloca-a sobre e diante dela perceber e reverenciar a uma haste. Aquele que for mordido, ação de Deus ali, estendida sob um mas olhar para ela ficará com vida. poste e significada, ou ainda Moisés fez, pois, uma serpente de simbolizada numa imagem. bronze e colocou-a sobre um poste. Quando alguém era mordido por uma Se assim ocorreu, podemos nos serpente de bronze, ficava curado”. perguntar se é a imagem que deu a (Nm 21; 7-9) sacralidade ou a profanação para os homens? A força de atuação e Neste episódio, Deus se utiliza transmutação se encontra na imagem da imagem da Serpente de bronze para esculpida? Pode então, uma imagem curar e salvaguardar a vida dos que feita por mãos humanas ser tão haviam sido picados. Reparemos que efetivamente direcionadora e a ordem também é clara e imperativa, condicionadora, a tal ponto de confluir os que querem ser curados devem: “olhar para a imagem”. É necessário 10
  • 11. o destino humano diante do mundo, coletivo, com foi com o povo de dos homens, e de Deus? Israel. A chave para a interpretação não Por isso afirmamos que não é o está na imagem, e muito menos na fato de estar na presença de uma ordem divina, pois é fato que de todo imagem, ou ainda, constituí-la, que mal Deus pode tirar um bem maior. nos tornará necessariamente pessoas Por isso percebe-se facilmente, depois idólatras. E o contrário também é de ter apontado os fatos, que tudo verdadeiro, ou seja, é possível que decorre da intenção que nasce do uma pessoa seja uma profunda coração do homem em relação ao adoradora de “imagens” (idólatra) sem mundo externo. nunca ter tido contato com um protótipo de gesso. A importância e o grau de intencionalidade que o homem coloca Quando Deus impõe ao homem: em seus atos o fazem declinar-se em “não farás imagem alguma!” ele nos direção a Deus ou ao mundo. Pois o diz para não criarmos coisas externas próprio Deus disse a Moisés: “Vai, para fugirmos do nosso interior, a desce, pois corrompeu-se o teu povo ordem implícita é: “seja a minha que tiraste do Egito. Bem depressa imagem, e também a minha desviaram-se do caminho que os semelhança!” prescrevi.” (Ex 32; 7-8) E ainda, Subentende-se ainda a quando Moisés pergunta a Aarão o necessidade de esclarecer dois termos motivo pelo qual ele permitiu tal que perpassam a complexidade do atitude do povo, Aarão respondeu: nosso assunto. “Não se indigne o meu senhor. Tu bem sabes que este povo é inclinado Com João Damasceno queremos ao mal”. (Ex 32; 21). se aperceber numa distinção essencial para a compreensão diferenciada das A intenção que brota do coração diversas maneiras de culto: Segundo o humano é fator essencial do ato de Papa Bento XVI: “João Damasceno adoração, no sentido de depender da foi também um dos primeiros em intenção íntima de cada um ser livre e distinguir entre o culto público e escolher adorar o que bem desejar, privado dos cristãos, entre a pois tudo nos pode ser tido como adoração (latreia) e a veneração obrigação, mas a adesão a Deus, a (proskynesis): a primeira só pode intimidade com Ele, e ainda, a decisão dirigir-se a Deus, sumamente de adorá-lo ou adorar o mundo é uma espiritual; a segunda, ao contrário, decisão subjetiva, livre, e pessoal, que pode utilizar uma imagem para não obstante causará um efeito dirigir-se àquele que é representado nela”. (Catequese pronunciada pelo 11
  • 12. Papa Bento XVI aos peregrinos participamos de maneira antecipada reunidos na Praça de São Pedro para da comunhão celeste, mesmo ainda a audiência geral, na qual apresentou estando na terra. Por isso no livro do a figura de São João Damasceno, no Levítico encontramos a ordem de dia 6 de maio de 2009). 10 Subjaz, Deus: “Sede santos por que Eu sou portanto, uma distinção clara do ponto santo” (Lv 11; 44). E como não de vista doutrinal no que diz respeito admirar estes que são companheiros ao culto dado a Deus no ato de se nossos e testemunhas fiéis que ao prostrar com a vida oferecendo tudo o longo da história vieram firmando a que somos e temos elevando assim, ao primazia do seguimento a Deus? Altíssimo as nossas oferendas Exemplos tão reais e tão pertos de ofertadas em Espírito e Verdade. nós. Sim! Admiramos e pedimos sempre a intercessão daqueles que No sentido contrário (e não estão mais perto do Cordeiro, e contraditório) do ato de adoração através do poder da oração que não agimos quando veneramos pela conhece barreiras, nos confiamos comunhão dos Santos, todos os eleitos também às orações de tantos irmãos e de Deus que formam o povo eleito, irmãs que já venceram o caminho que assim como nos fala o livro do estamos percorrendo. Assim venerar a Apocalipse: “Então, um dos Anciãos vida de um santo é ter a certeza de que falou comigo, perguntando: Estes que como ele conseguiu vencer em Cristo, estão vestidos com túnicas brancas, nós também somos capazes e se ainda quem são e de onde vieram? Eu assim duvidamos de nossas respondi: Tu é que sabes meu senhor. capacidades, temos a vida deles para Ele então me disse: Estes são os que nos ensinar e constantemente nos vieram da grande tribulação. relembrar de que é possível “vencer Lavaram e branquearam as suas no sangue do Cordeiro”! vestes no sangue do Cordeiro. Por isso estão diante do trono de Deus e Assim permanece e lhe prestam culto dia e noite, no seu reforçamos a distinção entre o culto á santuário.” (Ap 7; 13-15) Deus e o culto aos santos representados nas imagens sacras. Veneramos (proskynesis) toda a Conforme nos relembra o Papa João milícia celeste, desde os santos, os Paulo II: “O Concílio Niceno II, mártires, e até as miríades de miríades portanto, reafirmou solenemente a de anjos que servem e louvam a Deus distinção tradicional entre "a incessantemente, e com eles verdadeira adoração (latria)" que, 10 Texto acessado em "segundo a nossa fé, é devida somente http://www.zenit.org/article- à natureza divina" e "a prosternação 21509?l=portuguese > no dia 02/12/2010. de honra" (timetiké proskynesis), que 12
  • 13. é prestada aos icones, porque "aquele medida com que medis sereis que se prostra diante do icone, medidos”. (Mt 7; 1-2). prostra-se diante da pessoa (a Quando Jesus diz aos seus hipóstase) daquele que na figuração é discípulos que se “a justiça deles não representado". (Carta fossem mais verdadeira do que as dos apostólica Duodecimum Saeculum. fariseus, eles não entrariam no céu.” Sobre a veneração das imagens por (Mt 5; 20), ele justamente nos indica a ocasião do XII centenário do II interioridade com que o homem deve concílio de Nicéia).11 se ater em relação ás coisas internas e Torna-se, portanto expressivo e externas. O grande pesar de Jesus para fundamental a distinção que fizemos com os Escribas e Fariseus era o do culto de adoração a Deus e a abismo que havia entre aquilo que veneração que temos na comunhão falavam e aquilo que viviam, ou seja, dos santos. Aqui subjaz o cuidado que o ato de hipocrisia, (pregar uma as pessoas deveriam ter quando doutrina sem a preocupação de vivê- afirmam “ex-cátedra” que os católicos la), medir os outros a partir de adoram imagem. Será que ao menos medidas que não são aplicáveis nem a elas sabem fazer tão singela distinção nós mesmos. entre adoração e veneração? Pedimos O que os “doutores da Lei” não licença para um pensador chamado compreendiam é que as Letras fazem Wittgeinstein, e nos permitimos parte da Lei escrita, mas o fundamento adaptar sua famosa frase em nosso da Lei não se reduz ao cumprimento contexto para dizer: “Daquilo que não cego e determinista de preceitos, e sim se sabe é melhor que se cale!” na caridade e eficácia em nível de transformação interior refletida no A crítica que nos advém da exterior de cada um que se põe sob os “Babilônia Discursiva” moldes dessa mesma Lei. Em suma seguir a Lei é na verdade seguir - Os católicos adoram imagens... aquele que nos deu os caminhos indicados na Lei, a Lei não é o fim, “Não julgueis para não serdes mas o meio pelo qual se é indicado o julgados. Pois com o julgamento com Fim, que é o próprio Deus. que julgais sereis julgados, e com a O aspecto de Lei, no sentido de normas redigidas nos ajudam a 11 Texto acessado em:< percebermos um caráter fundamental http://www.vatican.va/holy_father/joh para esta parte de nosso trabalho, a n_paul_ii/apost_letters/documents/hf_j Lei, tem fundamento em nós na p-ii_apl_19871204_duodecim- saeculum_po.html> no dia medida em que nós tomamos 02/12/2010. 13
  • 14. conhecimento dela, pois, quem pode acalentos da “Babilônia Discursiva” a transgredir aquilo que não se conhece? respeito de tal assunto para além da Para ter peso de julgamento, toda ignorância que se tem de tais sentença pressupõe que o sentenciado fundamentos, suplicamos na tenha clareza, ou, ao menos a intuição autoridade do Evangelho que deixem de seu delito. o juízo para o Sumo Juiz, que nos julgue àquele que é digno, o resto A grande questão que colocamos torna-se fútil e desnecessário, por isso é o peso das palavras do Evangelho recomendamos a vós irmãos que nos diz: “não julgueis para não separados, (não a todos, mas àqueles serdes julgados,” e se assim nos que se comportam erroneamente ao apercebemos como então seguirmos, nosso respeito) que não os como se fossemos juízes da Lei condenamos, pois não somos o Juiz, divina? E, nos atermos em atos apenas os recomendamos à críticos para com a maneira e o misericórdia divina e vos sentido dos cultos alheios? compreendemos na caridade, mas nem Como podemos então dizer “aos a própria caridade tem o direito de ventos” que os católicos são faltar ao respeito, este é destinado a adoradores de imagens, e se todos, e todos são todos. possivelmente o fossem? Afirmamos e É fácil do ponto de vista ao mesmo tempo nos perguntamos daqueles que não se preocupam em junto com Thiago, em sua epístola: buscar a verdade das coisas e um “Não faleis mal uns dos outros, profundo sentido para tudo o que está irmãos. Aquele que fala mal de um lançado no universo, àqueles que, irmão ou julga o seu irmão fala mal como dissemos no início, não se da Lei e julga a Lei. Ora, se julgas a permite serem atingidos pelo próximo, Lei, já não estás praticando a Lei, pois têm tanta certeza de suas certezas mas te fazes juiz da Lei. Só há um que se aprisionam num dogmatismo legislador e juiz, a saber, aquele que muitas vezes fideísta e egoísta. pode salvar e destruir. Tu, porém, quem és para julgares teu próximo?” A nós é caro à verdade em si, e (Tg 4; 11-12). sabemos que ela emana do próprio Deus e por isso pode e deve ser Além do erro patético da submetida a tudo e a todos, pois seu generalização da sentença acima (os caráter de estado não depende de católicos adoram imagens), temos o “nossos bisturis, pelo contrário a desconhecimento da doutrina em que Verdade é exposta não para ser está embasada a sustentação do culto desacreditada e reprovada, pois se de imagens dos católicos, devemos assim o fosse não seria a verdade, ela então gritar em nome da justiça que os 14
  • 15. é exposta para iluminar e nos fazer melhor, a profunda realidade de Deus assentir a ela.” expressa na vida dos homens. Outro aspecto em relação as “As imagens” no ambiente católico: imagens é o seu uso nos âmbitos Por quê? sacros que a partir de um conjunto de atos, reverências, interferências de Primeiramente deixamos claro relações, ordem de culto e rito, que as imagens cristãs quando intenção objetiva comum... Que em inseridas naquilo que denominamos suma formam o que chamamos de como espaço litúrgico se diferem das liturgia. imagens expostas para a devoção Segundo o Concílio do “particular”, onde a relação entre a Vaticano II: “A liturgia, com efeito, imagem e o devoto recebe uma mediante a qual, especialmente no conotação de lembrança, de carinho, divino sacrifício da eucaristia, se atua de re-apresentação da ausência de uma a obra de nossa redenção, contribui presença, da presença de tudo aquilo sumamente para que os fiéis que Deus foi através da vida daquele exprimam em suas vidas e manifestem santo, ou santa e de tudo o que aos outros o mistério de Cristo e a significam para Deus, para a Igreja, e genuína da verdade da Igreja, que tem para cada um dos fiéis em sua a característica de ser ao mesmo devoção particular. tempo humana e divina, visível, mas A imagem pode também dotada de realidades invisíveis, ganhar a característica de representar operosa na ação e devotada à uma pessoa que significou para o contemplação, presente no mundo e devoto, em sua subjetividade, um contudo peregrina; de tal modo que exemplo para ser seguido e uma vida a nela o humano é orientado e ser admirada, onde se percebeu subordinado ao divino, o visível ao literalmente a força da expressão invisível, a ação à contemplação, a Imago Dei impregnada na vida de tal realidade presente à futura cidade santo. Mas para além desse, a imagem para a qual estamos encaminhados”. dos santos, ou de Maria (seja qual (Sacrosanctum Concilium, 2007, p. forem os aspectos sob ela admirados e 34, par. 02). A liturgia é a maneira os títulos invocados) trazem uma com a qual nós nos relacionamos com identificação da realidade particular o divino, onde ás realidades visíveis da vida do fiel, ou até uma marca de estão em comunicação com as experiência de relação pessoal que ele realidades celestes. teve e identificou através de sua Entendendo, portanto, o devoção para com aquilo que a fundamento da liturgia como aquela imagem representa, assim, o santo, ou 15
  • 16. que realiza não em si mesma, mas em fazer uma imagem daquilo que vi de nós e conosco a ligação do humano Deus. (...) Com o rosto descoberto, com o divino, e do divino com o contemplamos a glória do Senhor”. humano, expressado no ato do culto. (CIC. 1998, par. 1159). Se existe uma Essa realidade é expressa na totalidade Imagem Sacra esta é justamente a do ato litúrgico, por excelência a nós figura impressa na realidade humana católicos na fôrma do sublime culto pelo mistério da Encarnação, pois o eucarístico dado como expressão próprio Jesus é a Imagem viva do Pai. última da liturgia. Quando uma imagem ocupa um Todo este relevo até aqui lugar no âmbito litúrgico ela deve nos apresentado, nos ajuda na apontar para a imagem de Cristo na contextualização da imagem no realidade humana, assim quando âmbito sacro, e mais especificamente temos, por exemplo, a imagem de São obtendo um lugar próprio no culto Paulo pintada num painel, no fundo de litúrgico. uma igreja, onde se aprecia uma grande espada em uma de suas mãos e Não pretendemos elencar e noutra um grande livro. Não temos a aprofundar cada item do Culto intenção de remeter Paulo no lugar do litúrgico sacrifical do catolicismo, Cristo, mas pelo contrário, vemos em pois tudo o que se detém no âmbito da Paulo o grande e incansável extensão da Santa Missa, tem um evangelizador dos gentios, expressado “porque” próprio de ser e estar ali. por seu rosto cansado e em sua espada Desde a Palavra proclamada, das vemos a realidade de luta daquele que respostas e da participação da disse: “Combati o bom combate, assembléia, da materialidade ofertada terminei a minha carreira, guardei a (pão e vinho), do rito entendido e fé.” (2Tm 4; 7). E o livro em sua mão participado por todos... Reparemo- nos recorda a fiel doutrina na qual ele nos, portanto que a imagem está fez valer a sua vida, orientador das estruturada neste todo litúrgico, e é almas, profundo conhecedor das está imagem que denominamos como Escrituras, letrado e fervoroso no que ícone, ou imagem sacra. diz respeito ao zelo pelas coisas de Tratemos mais especificamente Deus... Assim, fica expresso em uma da função das imagens dentro da imagem todo um significado que liturgia. Tendo em vista que remete a Cristo. “Antigamente que Deus não tem Por dizemos que tal imagem é corpo nem aparência, não podia em cultuada no sentido de veneração e absoluto ser representado por uma não de idolatria, pois ela nos indica a imagem. Mas agora que se mostrou quem devemos adorar na carne e viveu com os homens posso verdadeiramente, olhando para a 16
  • 17. imagem de Paulo lembramo-nos de instrumentos que apontam para Deus, sua conversão e de toda a sua vida que que ilustram a realidade da relação não é outra coisa se não o seguimento entre Deus e os seres humanos. Neste apaixonado á Cristo. Tente pensar o sentido a Tradição da Igreja sempre apóstolo Paulo sem se referir a Jesus soube preservar e incentivar o aspecto Cristo, perde-se profundamente o estético de seus ambientes, e também sentido, pois Paulo é Paulo na medida nos é demonstrado na no decorrer da em que está referido á Cristo e Cristo história que foram incontáveis às é Cristo em Paulo, com Paulo e por vezes em que a Igreja serviu-se do Paulo. grande potencial humano chamado arte, para trazer à vida o espírito belo É neste segundo aspecto, o do da Revelação. uso de imagem no ambiente litúrgico e toda a função de apontar para a realidade divina onde o visível O desafio da Igreja: Ensinar seus (imagens, textos, gestos, posturas, ou fiéis seja, sinais humanos) demonstra e aponta para o invisível, nos é não Não é impossível expor uma somente permitido, mas indicado. doutrina que forme um sistema sem Assim: “O culto cristão das imagens lacunas, o difícil de uma doutrina não não é contrário ao primeiro está na exposição da mesma, mas no mandamento, que proíbe os ídolos. De ensino correto de seus princípios e de fato, a honra prestada a uma imagem sua prática. Se a Igreja católica, no se dirige ao modelo original, e quem que diz respeito ao culto de imagens, venera uma imagem venera a pessoa traz parcelas de culpa pelos atos de que nela está pintada. A honra idolatria que muito se encontra em sua prestada às santas imagens é uma realidade, esta se deve não a sua veneração respeitosa, e não uma doutrina, mas a fraqueza que se tem adoração, que só compete a Deus: O na transmissão de seu ensinamento, culto da religião não se dirige às assim se tem uma doutrina coerente, imagens em si como realidades, mas mas do que adianta uma teoria de cuja as considera em seu aspecto próprio prática é quase inexistente? Eis à de imagens que nos conduzem ao grande chaga e à crítica que cabe a Deus encarnado. Ora, o movimento nós reconhecermos e na graça da que se dirige à imagem enquanto tal humildade, lutarmos para superar. não determina nela, mas tende para a realidade da qual é imagem.” (CIC. Como nos diz o apóstolo: “Mas 1998, par. 2132). como poderiam invocar aquele em quem não creram? E como poderiam Percebemos que todas as crer naquele que não ouviram? E imagens devem servir-nos como como poderiam ouvir sem pregador? 17
  • 18. E como podem pregar se não forem “mito”, pois muito se exige de um enviados?” (Rm 10; 14-15a). É verdadeiro fiel, e, além disso, a obrigação por excelência da Igreja de praticidade dos interesses mundanos é Cristo e a ela pertence o múnus de egoísta, predominando totalmente a ensinar e salvaguardar a Verdade, não irrelevância, no que diz respeito à para si, mas para a humanidade. posição de assumir a Imagem de Deus para si e ser essa imagem, por que há Torna-se então uma obrigação um grande slogam que se sobrepõem à de toda a Igreja para com o aspecto maioria: “não precisamos mais de formativo de seus fiéis e introduzi-los, Deus”. pois se não ensinamos nossos fiéis estamos cometendo o grave pecado da Assim, para além de atos omissão. ritualísticos nos deparamos com a tragédia a nível estrutural de nossa Hoje nossos fiéis sofrem de um sociedade, onde não se constroem mal que denominamos “indiferença”, mais imagens materializadas para ou seja, há uma secularização cultuar um ou outro deus, nós estamos profunda e uma espécie de “perca do no século da idolatria, mas onde a senso” das coisas sagradas. Trocamos própria matéria esculpida nas vaidades a mística da vida e o sentido profundo dos corações é fundamentalmente da vivência do cristianismo pela adorada, ou seja, hoje troca-se o ordinariedade compulsiva de nossos Criador pela criatura. dias e o nosso ativismo mortífero. Se por um lado temos uma grande falha Se no Antigo testamento se em nível de estrutura no que diz constatava a idolatria a imagens feitas respeito ao ensinamento para com os por mãos humanas, hoje as próprias fiéis, temos também um caminho mãos humanas são motivos de contrário, que se soma a uma série de idolatria, em nosso século há um fatores, como por exemplo, o exacerbado culto do corpo e do status desinteresse intrínseco da sociedade do homem ideal, onde Deus para além atual no que diz respeito à moral, à de uma imagem transcendente tornou- religião, ao meio ambiente, ao se um ideal próprio da criação humana próximo, que parte do fiel para com a e nada mais. Há uma inversão dos sociedade... valores, para não dizer uma perda, onde Deus tornou-se o próprio motivo Segue-se uma época onde a de um ato idólatra, ou ainda, quem crê profundidade exigida no compromisso em Deus é tão ilusório quanto os autêntico para com o relacionamento cultuados de imagens de gesso. entre Deus e o individuo, e conseqüentemente o compromisso Por isso o papel da Igreja para com o próximo tornou-se um tornou-se mais do que em todos os 18
  • 19. tempos, uma necessidade de revolver coração dos homens e de os levar a os homens de suas “anestesias” em conhecer, a partir de dentro, Aquele relação à imagem do sagrado. Um que ousamos representar nas desafio constante, como fazer com imagens, Jesus Cristo, o Filho de que os fiéis coloquem Deus no centro Deus feito homem, o mesmo, ontem e de suas vidas, tendo em vista todo o hoje e por todos os séculos" (Hb contexto atual e cultural, onde não há 13,8).” (Carta apostólica Duodecimum espaço para esse mesmo Deus. Saeculum. Sobre a veneração das imagens por ocasião do XII centenário Temos então um ponto do II concílio de Nicéia).12 delicado que deve ser discutido, como penetrar no coração dos homens Trata-se de explorar a modernos? Sabe-se concretamente que espiritualidade que a arte infunde e com a evolução tecnológica e o desperta no ser humano para colocá-lo desenvolvimento global da cultura, os ao encontro com Deus. Assim se homens de hoje tem um caráter utilizado corretamente o culto as mediático, onde se difundem imagens torna-se um instrumento útil expansivamente tudo o que lhe é na evangelização e não um motivo de oferecido de maneira atrativa. incentivo para a idolatria. Por isso a Igreja vê na arte sacra uma maneira unia de perpassar o Considerações finais coração do homem moderno e fazê-lo meditar os mistérios da fé. Assim Nós católicos adoramos a Deus escreveu João Paulo II: “Amadíssimos e nele colocamos a nossa confiança, Irmãos: Ao recordar a atualidade da pois é Ele quem subjaz em tudo o que doutrina do VII Concílio Ecumênico, é. Deus em sua infinita bondade se parece-me que estamos perante um comunica ao homem e se faz acessível chamamento à nossa tarefa aos limites do homem. Assim, Ele, o primordial de evangelização. A inefável torna-se imanente sem perder secularização crescente da sociedade sua transcendência, e faz-se a própria mostra que ela está se tornando, em Imagem do Sagrado, personificado e larga escala, alheia aos valores encarnado em seu filho, Jesus Cristo. espirituais, ao mistério da nossa Salvação em Jesus Cristo e à Ele que de si mesmo nos disse: realidade do mundo futuro. A nossa “Se a mim mesmo glorifico minha tradição mais autêntica, que 12 compartilhamos plenamente com os Texto acessado em:< http://www.vatican.va/holy_father/joh nossos irmãos ortodoxos, ensina-nos n_paul_ii/apost_letters/documents/hf_j que a linguagem da beleza, posta a p-ii_apl_19871204_duodecim- serviço da fé, é capaz de atingir o saeculum_po.html> no dia 02/12/2010. 19
  • 20. glória nada é; quem me glorifica é em clamar ao modo da uma “babilônia meu Pai”. (Jo 8; 53b). Sendo assim, discursiva”, de que nós católicos entendemos que o próprio Cristo é a adoramos imagem, que a respeito Imagem Perfeita do Pai, esta imagem deles, ou da postura medíocre que a que encarnada é motivo de nosso culto maioria assume ao nos “criticar sem de adoração, adoramos a imagem do conhecer”, eis o lema da ignorância! Pai, logo, adoramos o Filho. A estes Santo Agostinho já havia a milhares de anos atrás os advertido, e Se há a possibilidade de existir com Santo Agostinho elevamos a uma Imagem de Deus, e acreditamos Deus nossas preces por estes, e por piamente que há, essa é a própria face todos aqueles que não conhecem a sã de Jesus Cristo, assim pelo mistério da doutrina da Esposa de Cristo, que Encarnação e todo o seu efeito fielmente salvaguarda o Tesouro cosmológico, nós entendemos que a Máximo, o próprio Deus em seu seio, matéria corrompida inicialmente pelo até que Ele volte. pecado foi dignificada e reinstituída pelo ato da Encarnação, onde Deus em Assim pedimos a Deus pelos sua “Kénosis” do grego que significa desertores e por todos os que com o “esvaziamento” de si mesmo (Fl 2; 6- coração sincero, buscam a verdade 11), não se apegando a sua condição para suas vidas, a eles entendemos que divina, se fez homem, submetendo-se ainda “Não conhecem o caminho, que a um corpo e à sofrer uma imagem, ou é a tua Palavra, por meio da qual seja, tornar-se humano. criaste, não só o que eles medem, mas também a eles mesmos que medem, Sabemos que ás imagens são até os sentidos pelos quais vêem o que símbolos pedagógicos, que revestidos calculam e a inteligência com a qual de um sentido único nos levam a calculam, ilimitada! O próprio contemplar ás realidades invisíveis da Unigênito se fez para nós sabedoria, fé. Temos plena convicção que há justiça e santificação, foi considerado uma severa distinção entre o signo e um de nós e pagou tributo a César. aquilo que está sendo re-apresentado Não conhecem o caminho pelo qual, com imagens, com palavras, e com deixando o orgulho, iriam a te o gestos, e também com toda a realidade salvador, e, por ele, subiriam material que nos faz prender a atenção novamente a ele, ignoram este e nos impulsiona ao sagrado, tamanho caminho e se consideram tão elevados acontecimento é expresso e facilmente e cintilantes quanto os astros; e percebido em todos os atos litúrgicos tombaram por terra, com o coração celebrados. coberto pelas trevas da ignorância. Ainda resta-nos a intenção de Dizem muitas verdades sobre as advertir a todos àqueles que insistem criaturas, e não buscam devotamente 20
  • 21. a verdade, artífice da criação; assim, fundamentando o mundo em não a encontram, ou, se a encontram, princípios éticos cristãos a favor da embora conhecendo a Deus, nem lhe vida, e da vida no céu. rendem graças. Proclamam-se Enfim cremos firmemente que sábios, atribuindo a si dons que são quem busca a Verdade de coração teus; e se empenham, cegos e sincero, cedo ou tarde, a encontrará. perversos, em atribuir-te o que Nós buscamos, e temo a esperança de propriamente pertence a eles: nela permanecer e escatologicamente, transferem suas falsidades a ti, que és já dela participar. a Verdade, e assim trocam a glória de Deus incorruptível por imagens do homem corruptível, de aves, quadrúpedes e répteis; trocam a verdade de Deus pela mentira, e adoram e servem a criatura em lugar do Criador”. (AGOSTINHO, Confissões. 2006, P. 120-121). Tem-se em nós a Verdade? Está é a Igreja de Cristo? Isso é possível e historicamente muito provável, mas se a Verdade como cremos é o próprio Deus, ele está para além dos limites da instituição embora queira nela permanecer, e por isso acreditamos que se a perfeição está muito longe de se realizar em nossa humanidade, pois a Igreja mesmo guiada fielmente e continuamente pelo Espírito Santo, ela também é constituída de homens pecadores limitados. Assim temos a “Virgem Prostituta” como diziam os santos padres, o Céu em meio a terra, o Divino penetrado no humano. Não somos perfeitos e nem temos a pretensão de o ser, mas é inegável e a história tem estado ao nosso favor, de que estamos mais do que nunca buscando a verdade e 21
  • 22. REFERENCIAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. SP. Martins Fontes, 2007. AGOSTINHO, Santo. Confissões. livro III. SP. Paulus: 1997. AQUINO, Tomás. Suma teológica. Primeira parte. Questões 1- 49. 2° ed. RS. Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, Universidade de Caxias do Sul. Grafosul – Indústria Gráfica Editora Ltda. Co – Edição, 1980. CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Edição revisada de acordo com o texto oficial em latim. SP. Loyola: 1999. RITUAL DO MATRIMÔNIO, SP. Paulus, 1993. SAGRADA ESCRITURA. A Bíblia de Jerusalém. SP. Paulus, 1973. VATICANO II, Sacrosanctum Concilium, SP. Paulus, 2007. i José Fernando Vieira – Graduando em filosofia. 6° período. (Faculdade Arquidiocesana de Curitiba) FAF - 02/2011. 22
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