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                                         A bolinha da discórdia!
                  Uma discussão sobre acontecimento, verdade e realidade no telejornalismo

                                                                                                         Antônio Augusto Braighi1

Resumo: A partir de um dos episódios mais marcantes do período de campanha eleitoral para presidente no Brasil
em 2010 – reconhecido publicamente como caso ‘bolinha de papel’, este artigo analisa a relação entre verdade e
realidade no telejornalismo nacional, questionando como os noticiários expressam os acontecimentos e de que modo
podem influenciar na apreensão e proposição de sentidos dos sujeitos frente ao que os afeta e na confiabilidade das
informações de que têm acesso. Como caminho metodológico, apresenta-se uma estrutura que permite observar o
conceito de verdade aplicado no jornalismo, imbricado por uma realidade televisual, influenciado ainda pelas
perspectivas do acontecimento e pelos campos problemáticos que insurgem em razão de sua dinâmica. Concebe-se
que cada sujeito será afetado de uma forma em seu quadro de experiências e que a extração de um sentido, e a
anuência de uma verdade, dependerão não só da relação dos indivíduos com os media que trataram do caso, mas de
posições prévias frente aos candidatos envolvidos, aos partidos, entre e diante ao que socialmente caracteriza termos
como política, mídia, violência, e demais vetores, no Brasil e no mundo.

Palavras-chave: Telejornalismo; Verdade; Realidade; Acontecimento.

Abstract: Starting from one of the episodes more striking the period of electoral campaign for president in Brazil in
2010 – recognized openly as case ‘bolinha de papel’ (paper ball), this article analyzes the relationship between truth
and reality in the national TV journalism, questioning as the news expresses the events and how can influence in the
apprehension and proposition of senses of the subject front to the that affects them and in the reliability of the
information that have access. As methodological road, comes a structure that allows to really observe the concept
applied in the journalism, imbricated for a reality of television, still influenced by the perspectives of the event and
for the problematic fields that emerge in reason of its dynamics. It is conceived that each subject will be affected in a
way in its frame of experiences and that the extraction of a sense, and the adhesion to a truth, they will depend not
only of the individuals relationship with it measured them that they were about the case, but positions previous front
to involved candidates, to the parties, among and before to the that socially characterizes terms as politics, media,
violence, and other vectors, in Brazil and in the world.

Keywords: TV Journalism; Truth; Reality; Event.


1. INTRODUÇÃO
             O dia 20 de Outubro de 2010 marca um dos acontecimentos mais reverberados na
campanha eleitoral para presidente da república no Brasil daquele ano. Após um tumulto
envolvendo representantes do PSDB e militantes do PT, o presidenciável José Serra, que fazia
caminhada política na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, foi atingido na cabeça por
objeto(s), supostamente atirado(s) por manifestantes petistas. Era o início de um evento que



1
    Antônio A. Braighi é especialista em Imagens e Culturas Midiáticas (UFMG) e mestre em Estudos de Linguagens (CEFET-MG).
    E-mail: antonioaugustorp@yahoo.com.br

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repercutiria, intensamente, nos media, na própria campanha eleitoral, nos debates entre eleitores
nas ruas e na internet, e em muitas outras esferas.
          No mesmo dia, o Jornal Nacional, da Rede Globo, apresentou uma reportagem2 que
relatava o caso, frisando que o candidato havia interrompido uma atividade de campanha após ter
sido “agredido num tumulto iniciado por militantes do PT”. O vídeo mostra o momento em que
começa a confusão entre correligionários dos partidos rivais. Porém, reproduz fotos da agressão
ao candidato, tiradas após ter sido atingido, com as mãos postas à cabeça, em meio à confusão.
          A reportagem indica que Serra teria sido atingido por uma bobina de fita crepe. Mas, na
mesma noite, outro telejornal – o ‘SBT Brasil’, exibiu matéria 3 que trazia imagens do momento
em que o peessedebista é atingido por, segundo propõe o âncora da atração, um “objeto não
identificado”. Contudo, como indica o responsável pela reportagem, o jornalista Marco
Alvarenga, é possível ver um objeto branco, que parece uma “bola de papel”, atingindo a cabeça
do candidato. Indaga-se que esta matéria, de forma velada, ou não, dá a ver que, possivelmente,
Serra teria simulado as dores na cabeça, ao indicar que o mesmo teria recebido uma ligação e,
logo depois, volta a caminhar, aí sim, com a mão posta à cabeça.
          No dia seguinte, o mesmo Jornal Nacional apresenta outra matéria 4. Desta vez, trazia as
imagens veiculadas pelo SBT, ratificando que o candidato teria sido de fato atingido por um
objeto mais leve. Contudo, também apresentava o registro feito via celular, onde é, propõe-se,
possível ver o presidenciável sendo atingido também por outro objeto, circular, com entorno
transparente, presumidamente um rolo de fita adesiva.
          Acredita-se, em meio à confusão de informações apresentadas, e o conflito frente a uma
possível teatralidade, que as três reportagens, de modo complementar, fazem emergir amplos
campos problemáticos, postos à mesa para a discussão dos sujeitos (QUÉRÉ, 2005). Um destes
complexos é justamente o que se refere à função, o compromisso e o modus operandi dos meios
de comunicação de massa, um dos objetos desta análise, tenuemente limítrofe com outros, tais
como a luta pelo poder e as vinculações políticas, ideológicas e econômicas, entre outros.
          Em meio a estas colocações, questiona-se como, e com que intuito, os telejornais narram
os acontecimentos e por meio de quais estratégias tentam constituir a verdade. Para tanto, serão


2
  Disponível em http://g1.globo.com/videos/jornal-nacional/v/jose-serra-interrompe-atividade-de-campanha-apos-ser-agredido-no-rio-de-
janeiro/1360045/#/Edições/20101020/page/1, acessado em 05/01/2011 às 16h.
3
  Disponível em http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/?c=1172, acessado em 05/01/2011 às 15h.
4
  Disponível em: http://g1.globo.com/videos/jornal-nacional/v/perito-analisa-suposta-agressao-a-jose-serra-no-
rio/1360677/#/Edições/20101021/page/1, acessado em 05/01/2011 às 15h40.

                                                                                                                                        2
analisadas as reportagens acima expostas e realizada uma reflexão de como os campos
problemáticos relacionados à política e aos media, entre outros, assim como os quadros de
experiência particulares, podem influenciar na apreensão e proposição de sentidos dos sujeitos
frente ao que os afeta e na confiabilidade das informações de que têm acesso.
Com este propósito, autores de ordens distintas serão convocados para a discussão que ora se
pretende desempenhar, apresentando-os em momentos oportunos. Não obstante, para escolher um
caminho metodológico, sugere-se uma estrutura que permita observar o conceito de verdade
aplicado no telejornalismo, imbricado por uma realidade televisual, influenciado ainda pelas
perspectivas do acontecimento e pelos campos problemáticos que insurgem em razão de sua
dinâmica.


2. A VERDADE NOS MEIOS
       A verdade é tema de discussão e desencontros na filosofia, e em tantos outros campos, há
muito tempo. Entre Platão e Aristóteles já havia a diferença. E, após o segundo ter fundado os
teoremas fundamentais sobre a verdade, observações das mais diversas se apresentam, nos mais
variados cenários. Mas não é objetivo deste trabalho, levantar um plantel de autores e teorias
relacionadas à verdade, mesmo por que seria preciso bem mais que um artigo para tanto, haja
vista a amplitude e complexidade do tema. Ao modo de Cabral e Santana (2010), procura-se aqui
mais apresentar uma discussão adjacente a uma espécie de ‘verdade jornalística’. Todavia, alguns
nomes como Foucault (2009) e Nietzsche (2007), trazem concepções que podem abrir a
discussão, tal como este, que se arrisca a dizer o que é, pois, a verdade, enquanto:


                         um exército móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma
                         soma de relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e
                         adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas,
                         canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o
                         são, metáforas que se tornaram desgastadas e sem força sensível, moedas que perderam
                         seu troquel e agora são levadas em conta apenas como metal, e não mais como moedas.
                         (NIETZSCHE, 2007, p. 36-37).


       Mas onde então residiria a verdade? Segundo Nietzsche (2007), a verdade estaria na
superficialidade humana, em sua subjetividade. O autor indica que o pathos universal aspira não
diretamente à verdade, mas a uma crença, uma confiança em algo ao qual se dá o valor de
verdade. É nesse sentido que se estabelece a busca e a luta da sociedade por uma verdade, e não
amplamente ao ato pela verdade. E esta fé, esta procura, é necessária aos indivíduos, haja vista
                                                                                                               3
que, “do contrário [sem a/uma verdade], o homem viveria em eterno ofuscamento”
(NIETZSCHE, 2007, p.72). A crença em algo verdadeiro se faz presente e é fundamental, tendo
em vista que a busca pela verdade plena seria impossível, isso pois, “todo conhecimento surge
por meio da separação, delimitação e abreviação; não há conhecimento absoluto de uma
totalidade” (NIETZSCHE, 2007, p.66).
       Outro autor que se debruçou sobre as problemáticas da verdade foi Foucault (2009).
Dentre tantas outras abordagens sobre as implicações desta (CANDIOTTO, 2010), em sua
célebre aula inaugural no Collège de France, há mais de 40 anos, registrou que um sujeito ao
pensar na vontade de verdade que rege as aspirações humanas, e que historicamente atravessou a
formação dos povos, deixando na contemporaneidade sua marca, verá que a oposição verdadeiro
x falso se constitui como um complexo de supressão dos indivíduos. O autor dirá que a força da
verdade é análoga àquelas arbitrárias e é mantida por todo um aparato institucional que as impõe
e as reconduzem, ainda que no nível do discurso. (FOUCAULT, 2009).
       Em diversas passagens de suas obras, Foucault demonstra que a verdade está atrelada ao
discurso que a apresenta, diante às vicissitudes das regras do contexto em que é produzido e
recebido, assim como frente às mudanças sócio-culturais que se sucedem ao longo do tempo. O
jogo das verdades se dá também na legitimação de discursos autorizados, e na supressão de
outros, considerados falsos por seu desprestígio. Essas regras são aceitas, subjetivamente, pelo
público, que as incorpora e as pratica rotineiramente, adotando valor de verdade aos discursos
que são considerados válidos. (CANDIOTTO, 2010). Não obstante, as escolhas são individuais.
Cada sujeito será afetado de diferentes formas pela verdade; assim, irá agir e pautar seu modo de
vida de acordo com a perspectiva que adotar. (DREIFUS; RABINOW, 1995).
       Diante as ideias apresentadas, e frente aos objetivos que ora se propõem, alguns
questionamentos saltariam aos olhos; poder-se-ia falar dos meios de comunicação de massa
enquanto um dos responsáveis pela manutenção desta ordem da verdade, apresentada por
Foucault (2009)? Se sim, fazer contundentemente uma afirmação como esta, não seria limitar
demasiadamente a perspicácia humana?
       Não, pois não se trataria de dizer que os indivíduos estão submissos ao poder real
midiático, mas, sim, de levar em consideração que os media se constituem como um dos
principais mecanismos de experimentação dos sujeitos com o mundo, ainda que de forma
mediada, e que há muito a esfera midiática se tornou um dos locais preferenciais para a


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apresentação e discussão dos fenômenos sociais, ofertando chaves de leitura para a compreensão
da sociedade. (ECO, 1984; LUHMANN, 2005).
         Neste sentido, se estabelece a ideia de que, munidos da credibilidade da sua audiência, os
meios de comunicação de massa recebem a outorga da verdade. Contudo, esta se dá não na
crença em um oráculo midiático, que tudo sabe, mas na medida em que os media devem buscar a
verdade dos acontecimentos, por meio da narração dos fatos e do uso de estratégias que depõem a
favor do que se apresenta.
         Acerca do tipo de verdade que mais se aplicaria ao jornalismo, Tambosi (2007) analisou
as três principais teorias trabalhadas na epistemologia contemporânea e identificou que a de
correspondência é a mais adequada ao campo. Isso pois, esta perspectiva indica que a verdade de
uma assertiva consiste em sua relação com o mundo, na equação linguagem-realidade. Para o
autor, o jornalista deve fundamentalmente reportar fatos, o que implica a teoria da
correspondência como preponderante. Há, contudo, a ressalva de que os fatos, por vezes, se
apresentam a partir de versões inverídicas. Isto posto, podem-se confundir afirmações (tidas
verdadeiras) com fatos. “Recordemos que qualquer coisa que torne uma afirmação verdadeira é
um fato, e que o fato é sempre extralinguístico, isto é, esta fora da linguagem” (TAMBOSI, 2007,
p.46).
         Tambosi (2007), ainda faz considerações sobre a apreensão do fato, e o modo como os
sujeitos os relatarão, o que remonta à condição extralinguística daquele; ou seja, os fatos são
estáveis, as narrativas sobre eles, não. A ideia que vem à tona é sobre a articulação de atores
depoentes, que se arranjam nas reportagens, mas não se deve esquecer que o jornalista também é
um intérprete do acontecimento, fazendo, junto com seus entrevistados, a sua construção
discursiva acerca do fato. Afinal, a notícia não é o fato propriamente dito, mas o que se diz sobre
o fato: o relato. (LUSTOSA, 1996).
         Iluska Coutinho resume bem este quadro, quando indica que “[...] o que vemos impresso
nos jornais não é a voz dos fatos, mas de pessoas que participaram deles ou ainda que foram
espectadoras dos acontecimentos, também uma categoria carregada de julgamentos e
intencionalidades” (2004, p.9). A consideração da autora demonstra não só as fragilidades da
verdade midiática, mas já apresenta pistas acerca dos campos problemáticos.
         E quantas outras dificuldades o jornalismo não tem para apresentar a verdade; não
bastassem estas, ainda há o fator tempo, a objetividade, o grau de profundidade no tratamento dos


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temas, as limitações do sistema produtivo, entre outros. Ainda assim, e mesmo diante à
perspectiva de Nietzsche (2007), para quem a verdade é um ideal inalcançável, o jornalista nunca
deve assimilar esta prerrogativa, com o risco, inclusive, de perder o rigor da apuração, o que
comprometeria, este sim, a confiabilidade das informações, conforme preceituam Cabral e
Santana (2010). Para estas autoras, a busca pela verdade dos fatos se configura como uma das
principais perspectivas do profissional do jornalismo.
         Ainda assim, o que os meios de comunicação de massa apresentam, por maior que seja o
rigor na apuração e afastamento do jornalista frente ao que narra, é apenas um fragmento da
realidade social (CABRAL; SANTANA, 2010). A ‘verdade jornalística’, ainda que carregada do
utópico ideal de pleno conhecimento das razões, consequências e características dos fatos, não
alcança este propósito, apresentando apenas uma ideia de verdade. Além disso, por mais que a
discussão não se encerre aqui, se vê inebriada com as limitações do próprio conceito de verdade –
amplamente discutido na seara filosófica, os percalços relacionados ao fazer jornalístico, o modo
como a própria recepção encarará a construção dos fatos, sendo mais determinante ainda o tipo de
relação que estabelece com determinado veículo – ínterim este onde se poderia pensar nas
implicações do contrato midiático, e na própria dinâmica dos meios com a produção de uma espécie
de realidade midiática particular.


3. A REALIDADE DOS MEIOS
         O que significa falar da realidade? Entre tantas outras abordagens, buscamos referências
na psicanálise para estabelecer uma compreensão básica do termo. Jorge (2010), resume à sua
maneira o raciocínio de Lacan sobre a realidade, ao exprimir que ela é “simbólico-imaginária, é
uma construção eminentemente fantasística que, para cada sujeito, faz face ao real inominável”
(p.10). Neste contexto, o real apresenta-se enquanto unidade estável pura, que foge a qualquer
tipo de representação e estabelecimento de sentido, enquanto a realidade é uma construção
cognitivo-psíquica (e uma apreensão) de cada individuo – ainda que, em alguns pontos,
compartilhada socialmente, frente ao mundo, baseada na linguagem. (JORGE, 2010; JOST,
2009).
         A discussão, assim como a compreensão dos conceitos, é muito mais ampla do que se
pode tratar aqui. Neste sentido, questiona-se então: o que significaria falar de realidade para a
televisão? Jost (2004; 2009) se arriscou a responder. Após longo levantamento, e do


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estabelecimento de esquemas de compreensão de como se articula a (promessa de) realidade
neste suporte, dirá que “para saber como a televisão trata a realidade, não há outro caminho que a
análise dos programas, que nos dizem em que visão da realidade eles são fundados” (JOST, 2009,
p.30).
         Ora, uma vez que se tratam aqui de matérias exibidas em um (sub)gênero televisivo bem
definido, em que visão de realidade se fundem os telejornais? Segundo Duarte e Curvello (2009),
“o discurso do telejornal constrói-se tomando como referência o mundo real, exterior à mídia;
trata-se de uma meta-realidade, cujo regime de crença proposto é a veridicação” (p.69). Indaga-se
aqui que esta meta-realidade telejornalística produz, ou amplifica, sentidos outros, externos,
quando não extremos, frente aos acontecimentos que apresenta.
         Para Baudrillard (1991, p.105), por exemplo, “a informação devora os seus próprios
conteúdos. Devora a comunicação e o social”, isso, por dois motivos: um relacionado à
perspectiva de encenação da informação, imposta pelos meios de comunicação de massa ao tentar
comunicar algo – impondo sentidos outros à informação, e um seguinte que se pauta pela
desestruturação do real, implementando um processo de entropia do social.
         Para o autor, os media estabelecem, a sua maneira, um tipo de (re)apresentação do real –
e/ou da realidade social, instituída por meio de uma realidade própria aos veículos: virtual.
(BAUDRILLARD, 1991). Baudrillard, inclusive, irá resgatar ideias de MacLuhan, para quem o
meio é a própria mensagem, em alusão a esta dinamicidade dos media e à sua capacidade de
instaurar um processo de hiperinflação dos sentidos, a “hiper-realidade da comunicação e do
sentido. Mais real que o real, é assim que se anula o real” (1991, p.105).
         Assim, para Gumbrecht (1998, p.262), há tempos se estabeleceu “uma realidade
televisiva própria, que, desde o início, esteve tão ligada à realidade do espectador que,
paulatinamente, ela a transformou e, nesse meio tempo, começou a substituí-la”. Concluindo que
“faz todo o sentido dizer que a realidade televisiva, no final do século XX, torna-se uma realidade
cotidiana”. Estas considerações fazem todo sentido para as perspectivas de Eco (1984), ao
descrever detalhadamente a relação da ‘tevê’ e o público, interessando aqui, entre tantas outras
assertivas, a ideia de que estamos diante a uma “situação televisiva em que a relação entre
enunciado e fatos se torna cada vez menos relevante no que diz respeito à relação entre verdade
do ato de enunciação e experiência receptiva do espectador” (p.191). O que estaria em jogo na
realidade televisiva então seria a sustentação de autenticidade dos atos de enunciação, de


                                                                                                 7
expressão do acontecimento, de narrativa e encenação da verdade, que se estabelecem por
motivos particulares àquelas emissoras que os articulam.
       Neste contexto, mais do que uma realidade outra, o que se apresenta com a solidificação
dos media na sociedade contemporânea é um entrançamento rizomático das nuances midiáticas
com o real. Este imbricamento, cada dia mais voraz, escurece a mediação do real e implanta
outras condições de realidade, (não)lugares virtuais. E, diante a esta premissa, para Baudrillard,
seria “inútil sonhar com uma revolução pela forma, já que médium e real são a partir de agora
uma única nebulosa indecifrável na sua verdade” (1991, p.108).
       Ainda assim, os media continuam a atuar como instituições sociais viris, sendo
imprescindível então fazer questionamentos ao seu funcionamento e impacto na vida social.
Porém, Baudrillard conclui que a articulação e a dinâmica do sistema se dá, justamente, de
acordo com os anseios da sociedade; “é o que fazem as massas: remetem para o sistema a sua
própria lógica reduplicando-a, devolvem, como um espelho, o sentido sem o absorver. Esta
estratégia [...] leva a melhor hoje em dia”. (1991, p. 111).
       Outros pesquisadores, tal como Martín-Barbero (2003), irão verificar e destacar esta
relação dos meios com as aspirações dos sujeitos de outra forma – relativizada, no mínimo, de
modo um tanto menos pessimista. E não se pode perder de vista as concepções destes autores;
haja vista o que interessa nesta parte do trabalho, acaba sendo importante, para compreender o
maquinismo de funcionamento desta realidade midiática, assumir que, de fato, este entendimento
passa por levar em conta por que, e com que propósito, se motiva este mecanismo: em razão
daqueles a quem se dirige e, de forma retroalimentativa, pelos quais se fundamenta – o público.
       Neste imbróglio, Baudrillard (1991) irá marcar de forma contundente a relação dos media
com os acontecimentos, ratificando sempre que o envolvimento, principalmente da televisão,
com um determinado episódio, modifica a ideia inicial a ser apresentada, provocando um prejuízo
a essência do que de fato aconteceu, além de causar avarias para a sua percepção e experiência
dos sujeitos com o caso.

4. O ACONTECIMENTO E AS IMPLICAÇÕES DO CAMPO PROBLEMÁTICO
       Entende-se acontecimento aqui sob as perspectivas de autores tais como Quéré (2005),
para quem estes episódios, tenham eles a dimensão que tiverem, configuram a experiência social
dos sujeitos, marcando seu tempo, e organizando estruturas como passado e presente, e
influenciando, inclusive, nas decisões e acontecimentos futuros.
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O acontecimento é singular, de ordem paradoxal, acomete os sujeitos de modo
individualizado e inaugura – com efeito, uma nova forma de pensar e agir. Promove uma cisão
nas formas de ver o que está à volta e, sobretudo, frente ao que se relaciona diretamente ao
episódio, ainda que este não tenha, ou não se consiga articular a priori, uma explicação.
(QUÉRÉ, 2005; BRAIGHI, 2010).
       Nesse sentido, o acontecimento “é um fenômeno de ordem hermenêutica: por um lado, ele
pede para ser compreendido, e não apenas explicado, por causas; por outro, ele faz compreender
as coisas – tem, portanto, um poder de revelação.” (QUÉRÉ, 2005, p.60). O acontecimento
revela, ou traz à tona – propulsiona à arena de debates, justamente os elementos que se
relacionam com as causas e consequências do que aconteceu (sejam estes já existentes, ou
instituídos pelo episódio). Quéré (2005) tratará destas questões como campos problemáticos.
       Os campos problemáticos constituem a trama da vida dos sujeitos, e também de toda uma
sociedade, num dado momento. São questões pendentes para as quais não se assimilam respostas
imediatas, devido a sua complexidade. Por vezes, são amplos problemas, que se constituem por
elementos complicados como crises, disputas, incoerências e discrepâncias de interesses,
convivendo, quando não, convergindo, numa desarmoniosa relação interna. (QUÉRÉ, 2005).
       Quéré (2005) entende que, apesar destes problemas afetarem os indivíduos, muitas vezes
estes não são discutidos de forma ampla. Mas, os acontecimentos, com sua força, trazem uma
série de questões à visibilidade pública. Os episódios da vida, “ganham um lugar em campos
problemáticos e servem, pelo seu poder de esclarecimento e de discriminação, de pivôs dos
inquéritos que procuram e elaboram soluções.” (QUÉRÉ, 2005, p.72).
       E, em meio às “intrigas”, arranjadas no mundo, os sujeitos partem em busca de
explicações. Como foi dito, os acontecimentos afetam os sujeitos de modo individual,
influenciando a compreensão e o modo de agir, a partir do quadro de experiências de cada um.
Neste contexto, vale o registro de que “a individualidade do acontecimento não é determinada,
apenas, pelas características da sua ocorrência como fato, mas também pelas reações e pelas
respostas que suscita, via uma compreensão e uma apropriação, seja qual for o suporte.”
(QUÉRÉ, 2005, p.68)
       Neste ponto, vale lembrar que os media, são um dos campos privilegiados para a
experimentação – ainda que mediada, do mundo pelos sujeitos. Contudo, “a televisão contribui
decisivamente para a incomunicabilidade da experiência”, (GUIMARÃES; LEAL, 2008, p.7),


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pois ainda que apresente os acontecimentos, faz isso de modo fragmentado, reduz o episódio ao
visível, e lhe aplica a carga da realidade televisiva.
       Diante ao acontecimento, a operação dos veículos consiste em duas frentes: torná-lo
explicável, por meio de narrativas. Contudo, é na outra vertente, a explicativa, que se amplia o
lado paradoxal deste, uma vez que o sentido pode tomar proporções ainda maiores. Elementos
envolvidos na produção, apresentação e recepção influenciarão no modo como os indivíduos
fazem a leitura e serão afetados pela informação; “o que as notícias fazem é tentar dar conta,
linearmente, de toda a dinâmica do acontecimento a partir de seus fragmentos, que são
organizados segundo o saber jornalístico”. (LEAL, 2009, p.93).
       Mas, não obstante ao enquadramento midiático e a influência deste na apreensão – e até
na produção, os acontecimentos mantém sua força e complexidade, instituindo-se como
desafiadores da ação e do fazer jornalístico. (LEAL, 2009). O acontecimento está presente em
uma sofisticada (e embaraçada) teia, onde os fios dos campos problemáticos se cruzam e se
compelem, na busca por um ajustamento utópico.
       E estas disputas se dão no emaranhado cognitivo dos sujeitos e nas esferas públicas; o
episódio faz constituir um jogo entre sujeitos (sejam eles cidadãos comuns ou autoridades
políticas) e instituições, que interpelam seus discursos em uma arena contraditória. Isso pois, não
se trata aí da razão pura como norte, mas sim das impressões dadas a partir da maneira como a
questão afetará cada um em seus campos de experiência, imbuídos de sentidos particulares,
emanados pela expressão do acontecimento e sua apreensão. (BRAIGHI, 2010). Neste contexto,
“[...] trata-se, sobretudo, de qualidades que, em virtude do acontecimento, impregnam as
situações que o envolvem, afetam e modificam os seus elementos constitutivos assim como as
relações entre eles, penetram e coloram tudo o que está implicado na experiência”. (QUÉRÉ,
2005, p.68).


5. NA VERDADE, O QUE ACERTOU O SERRA FORAM...

                                                           Bolinhas de papel? Bexiga d´água? Não
                                                           importa. O que abriu-me o couro, caiu como
                                                           maçã de Newton. Despertou reflexão muito
                                                           mais ampla. Tem alcance maior que objetos
                                                           não identificados. (Mary G.)




                                                                                                  10
Mary G. é o pseudônimo com o qual a jornalista Mariana Gross assina textos em um
blog5. Em “Democracia”, postado em 24 de Outubro de 2010, a profissional relata sua
experiência ao ser atingida por uma pedra durante o tumulto apresentado nas matérias acima.
Para além de qualquer tipo de reflexão teórica acerca dos contornos do acontecimento, podem vir
à superfície, com este breve trecho, algumas percepções, tais como, e principalmente: o poder de
revelação do acontecimento e a forma como os sujeitos são afetados, direta e individualmente,
pelos acontecimentos.
             Na sequência de seu raciocínio, Mariana dá a ver alguns dos campos problemáticos
envolvidos neste episódio, que emergem e, particularmente, “despertam reflexão muito mais
ampla”: a discussão sobre a liberdade política, o ir e vir, a exposição de ideias e a imprensa livre,
cerceadas nesta situação pelas provocações e impedimentos impostos, além de pedras lançadas a
esmo, por aqueles que diziam representar os partidos políticos. Afetadas pelo acontecimento, as
pessoas saem da zona de conforto e se projetam em busca de respostas.
             O depoimento, mais da cidadã que experimentou a situação, do que da jornalista, serve
como uma chave de leitura para este caso. Os 27 comentários que esta postagem suscitou no
referido blog, também poderiam atuar como norteadores da discussão, haja vista que muitos se
manifestaram pontualmente a respeito do caso. Contudo, esta veiculação de Mariana Gross na
Internet, apesar de apresentar o seu relato, e demonstrar como um acontecimento está inserido em
um outro, dito mais amplo em razão de suas implicações, é também um mecanismo de mediação
dos internautas com o(s) episódio(s).
             Nesse sentido, é preciso pensar na afetação dos sujeitos pelos acontecimentos a partir das
edificações de sentido realizadas em cada meio. Os indivíduos, em maioria, experimentam os
fenômenos sociais a partir da confecção da realidade social promovida pelos media. Há, contudo,
um imbróglio, onde vetores de ordens distintas se entrecruzam. A realidade dos media, em razão
de sua própria dinamicidade, esfumaça a ‘verdade’. Mas o que se pode falar da verdade, se o que
se tem da verdade é só um fragmento, ou uma ideia compartilhada, sobretudo neste meio? Se a
verdade plena não existe, e na concepção de Nietzsche (2007) todo saber emana por meio do
afastamento e abreviação (de uma edição?), tão pouco haveria de existir, também, no
(tele)jornalismo.



5
    Suspirada: Um respiro literário. Disponível em: http://suspirada.blogspot.com. Acessado em 29/01/2011 às 21h.

                                                                                                                    11
Neste veículo, apesar da construção das narrativas fazer toda a diferença, as imagens são o
carro-chefe, conferindo a carga de verdade; “no telejornal, que utiliza a imagem como prova da
existência desse real, isso fica ainda mais evidente. O jornalista não só “fala o mundo”, mas também
o mostra” (DAVID-SILVA, 2005, p.23). E a questão que ora se apresenta tem a imagem como
ponto fundamental. Mas o que a imagem mostra? O que há de verdade nas imagens?
          Por outro lado, é preciso pensar que a combinação do texto icônico com o linguístico dá o
ajuste necessário para uma determinada expressão de sentidos, e que o seu alojamento em um
determinado campo do saber sócio-cultural irá selar a ideia por detrás da narrativa jornalística.
Um exemplo disso se dá quando o telejornal do SBT articula a proposta de que: José Serra havia
sido atingido por uma bola de papel; entra em um veículo; anda neste por alguns metros
(minutos); sai novamente; recebe uma ligação (não se sabe de quem) e, em seguida, coloca uma
das mãos na cabeça e começa a andar, como se estive sentido dores. Apesar do telejornal não
afirmar categoricamente, o que emana como compreensão seria: Serra foi orientado, ao telefone,
a simular uma dor, tendo em vista que estava sendo gravado e, como aquele era um período de
campanha, o candidato poderia ganhar a simpatia de alguns eleitores e ainda depreciar o
comportamento de seus rivais, afetando a imagem de sua adversária?
          Não se pode dizer que sim, nem que não. Mas sabe-se que a simples presença do
dispositivo cinematográfico no local (seja este de posse e operado pela mídia, ou os vários
celulares e câmeras digitais amadoras) influencia no comportamento dos sujeitos. Neste ponto, há
uma série de acusações sobre a possível teatralidade do candidato, inclusive do próprio, então
presidente, Lula, e da candidata Dilma6.
          Mas qual é a verdade aí? Quem, de fato, ligou para José Serra? E o que disse? E quando
ligou? Antes ou depois da bolinha de papel? Antes ou depois do rolo de fita adesiva? Haveria
rolo de fita adesiva? Se para Foucault (2009) a verdade está atrelada ao discurso que a apresenta,
o que se tem neste episódio é um embate admirável, onde, aparentemente, não há vencedor. No
dia seguinte o Jornal Nacional apresenta matéria, com duração três vezes maior do que veiculara
anteriormente, tentando desconstruir o processo cronológico veiculado pelo SBT (ou reconstituir,
a sua maneira, ‘corretamente’, a cronologia do episódio). O que se tem é uma disputa pela
verdade entre as emissoras? Antes, nem todas as informações podiam ser ‘provadas’, vez que não

6
  Lula afirmou que Serra teria mentido, comparando a atitude do peessedebista ao goleiro chileno Rojas que, em 1989, em uma partida contra a
seleção brasileira de futebol, simulou ter sido atingido por um foguete, ao passo que teria feito um corte no rosto, propositalmente, temendo que
sua equipe fosse eliminada das eliminatórias para a Copa do Mundo de 1990.



                                                                                                                                             12
se dão a ver pelas imagens, frente a sua possível inexistência – ausência do fato ou da imagem?
Onde está a verdade?
           Emerge o discurso: O que dizem Serra e aqueles que dele estavam próximo (a maioria,
representantes políticos), é que o candidato fora atingido por um rolo de fita adesiva. Mas um dos
campos problemáticos é justamente sobre a verdade nos discursos dos políticos no Brasil,
sobretudo no período de campanha. O que seria capaz de fazer um candidato a presidência que, já
no segundo turno, próximo ao dia da votação, está em segundo lugar nas pesquisas (outro campo
problemático: sua confiabilidade), com muitos pontos atrás de sua adversária? Questionamento
dos indivíduos, de uma sociedade marcada pela corrupção e impunidade política.
           O candidato foi atingido por uma bolinha de papel! As imagens mostram isso. Verdade!
Mas as imagens não podem provar que ele não foi atingido também por outro objeto. É preciso
ter provas: Depoimentos? Frágeis frente às imagens. Imagens? Só se tem das gravações de um
celular. Baixa resolução, pouca confiabilidade. Emerge novamente a necessidade do depoimento,
desta vez de um especialista, que atestará a confiabilidade das imagens. Mas quem é o perito? 7
           Foucault falará da legitimação de discursos autorizados, e do desprestigio a outros,
considerados falsos ou, nesse caso, com relações diretas com os envolvidos (CANDIOTTO,
2010). É o caso, por exemplo, das observações feitas por Lula sobre o médico que atendeu Serra
neste episódio. Com o prestigio de cerca de 80% de aprovação popular 8, o presidente incita a
possível simulação, ratificando que o Dr. Kligerman é ex-secretário de Saúde da administração
César Maia (DEM) e foi nomeado por Serra a cargo de confiança quando este foi ministro da
Saúde9.
           Muitos outros discursos foram proferidos e rebatidos, na tentativa de legitimá-los ou
questioná-los; jogo de contra-argumentação incessante, realizado tanto em um nível macro (das
trocas entre os envolvidos na mídia) quanto local (na discussão entre os sujeitos). Mas no caso do
médico, Lula toca nas vicissitudes de interesses e relações políticas, que é mais um dos campos
problemáticos, que configuram a complexidade de apreensão da questão, entre muitos outros. O

7
  Trata-se de Ricardo Molina, perito de vasto currículo profissional e acadêmico, tendo participado, na prestação de laudos e pareceres, de casos
de grande repercussão no Brasil. Em alguns episódios, atuou de forma particular, a pedido de emissoras de televisão. Contudo, já forneceu
relatórios discrepantes aos dos ‘peritos legitimados’, gerando contestação das instituições oficiais. Além disso, na internet , muitos se propuseram a
questionar a análise de Molina frente ao caso da “bolinha de papel”.
8
  Conforme matéria da Folha.com, disponível em http://www1.folha.uol.com.br/poder/820667-com-83-aprovacao-ao-governo-lula-bate-recorde-
historico-mostra-datafolha.shtml, acessado em 05/02/2011 às 12h.
9
  As declarações de Lula ofenderam Kligerman, que entrou com um pedido de retratação pública no Supremo Tribunal Federal (STF). A petição
foi, contudo, arquivada pelo ministro Celso de Mello, informando que não havia qualquer ambiguidade ou dubiedade nas afirmações do presidente
da República.



                                                                                                                                                  13
próprio presidente, apesar do cargo e de gozar do apoio popular ao seu governo, tem o seu
discurso jogado ao desprestigio, vez que também é um interessado – este na vitória de usa
partidária Dilma.
       Entre outros campos problemáticos envolvidos, também se pode falar da relação dos
meios de comunicação de massa. Este episódio, ao passo que demonstra, por um lado, limitações
dos telejornais, no que se refere principalmente aos erros e limitações na apuração, também faz
emergir a crítica da sociedade frente ao programa da Rede Globo, considerada parcial e
partidária, em inúmeras manifestações na internet, por exemplo, o que adensa ainda mais a
extração de ideia de verdade frente ao que, de fato, aconteceu.
       Em 21 de outubro de 2010 um senhor de 68 anos foi alvejado na rua por uma bolinha de
papel (e, conforme se afirma, também por um rolo de fita adesiva). Seria simples pensar assim.
Mas a função social assumida por esta pessoa, seus interesses, as perspectivas contextuais, sua
relação direta com os anseios de outros (de todo um país, por que não, de parte do mundo), e o
modo como este caso foi tratado nos meios de comunicação de massa (levando em consideração
que os media atuam a partir de uma (re)construção da realidade de modo particular), ampliam por
demais os sentidos que poderiam ser extraídos do caso, complexificando a compreensão do caso
por parte dos indivíduos.
       Independente disto, cada sujeito será afetado de diferentes formas em seus quadros de
experiência. A extração de um determinado sentido, e a anuência de uma verdade frente ao caso,
dependerá de uma posição prévia dos indivíduos com os candidatos envolvidos, os partidos e
seus partidários, os meios de comunicação que trataram do caso, entre outros, tais como a sua
relação, por exemplo, com a liberdade de expressão e manifestação política (seja ela como for).
Além disso, não só a disposição frente às partes, mas também diante ao que caracteriza termos
como política, mídia, violência, entre outros, no Brasil, estarão em xeque quando os indivíduos
forem processar o caso e suas implicações.
       A questão não se encerra aqui. Há muito mais a ser discutido, inclusive analisado, de
forma mais pontual. O propósito, de colocar o tema em discussão, foi atingido, e servirá, indaga-
se, enquanto referência para observações análogas, frente a acontecimentos que sempre se dão,
rotineiramente, na dinâmica da vida social e dos media, fazendo emergir amplos e complexos
campos problemáticos. No mais, se compreende que a verdade nunca poderá ser extraída por
completo, a realidade será sempre dependente e comungada socialmente em razão de um


                                                                                              14
determinado fim, e o mundo, nas palavras de Luhmann (2005), este “[...] jamais pode ser
observado, menos ainda conhecido, pois toda observação produz, por meio de um ‘cruzamento
inexpresso’, um ‘espaço não marcado’, que ela não observa.” (p.156, grifos no original).

REFERÊNCIAS

BAUDRILLARD, J. Simulacros e Simulações. Lisboa: Relógio D’água, 1991.

BRAIGHI, A.A. Índices de produtividade rural: A revelação do problema pela força de um
acontecimento público. Revista PJ:Br. VII, Ed. 13. Escola de Com. e Artes da USP, 2010.

CABRAL, A.M.; SANTANA, A. O processo de construção da verdade no jornalismo:
conceito, busca e método de apuração. SBPJor – Associação Brasileira de Pesquisadores em
Jornalismo. VIII Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo. São Luís: Univ. Fed. do
Maranhão, 2010.

CANDIOTTO, C. Foucault e a crítica da verdade. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

COUTINHO, I. O conceito de verdade e sua utilização no Jornalismo. Anais do Celacom
2004. Umesp: São Paulo, 2004.
Disponível    em:     http://encipecom.metodista.br/mediawiki/images/2/2d/GT1Texto014.pdf,
Acessado em 29/01/2011 às 19h30.

DAVID-SILVA, G. A informação televisiva: uma encenação da realidade. Tese de doutorado.
FALE/UFMG. Belo Horizonte, 2005.

DREYFUS, H.; RABINOW, P. Michel Foucault, uma trajetória filosófica (para além do
estruturalismo e da hermenêutica). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.

DUARTE, E.; CURVELLO, V. Telejornais: Quem dá o tom? In: GOMES, I.M. (org.). Televisão
e Realidade. Salvador: Edufba, 2009.

ECO, U. Viagem na irrealidade cotidiana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

FOUCAULT, M. A ordem do discurso. 18ª edição. São Paulo: Ed. Loyola, 2009.

GUIMARÃES, C.; LEAL, B.S. Experiência estética e experiência mediada. InTexto, Porto
Alegre, v. 2, p.1-14, 2008.

GUMBRECHT, H.U. Modernização dos sentidos. São Paulo: Ed. 34, 1998.

JORGE, M.A.C. Fundamentos da psicanálise de Freud a Lacan: A clinica da fantasia. v.2. Rio
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JOST, F. Seis lições sobre televisão. Porto Alegre: Sulina, 2004.

                                                                                           15
_______. Que significa falar de “realidade” para a televisão. In: GOMES, I.M. (org.). Televisão e
Realidade. Salvador: Edufba, 2009.

LEAL, B. Telejornalismos e autenticação do real: estratégias, espaços e acontecimentos. In:
GOMES, I.M. (org.). Televisão e Realidade. Salvador: Edufba, 2009.

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Comunicação. São Paulo, v.30, n. I, p. 35-48, jan./jun. 2007.




                                                                                              16

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A bolinha da discórdia!

  • 1. Confederación Iberoamericana de Asociaciones Científicas y Académicas de la Comunicación A bolinha da discórdia! Uma discussão sobre acontecimento, verdade e realidade no telejornalismo Antônio Augusto Braighi1 Resumo: A partir de um dos episódios mais marcantes do período de campanha eleitoral para presidente no Brasil em 2010 – reconhecido publicamente como caso ‘bolinha de papel’, este artigo analisa a relação entre verdade e realidade no telejornalismo nacional, questionando como os noticiários expressam os acontecimentos e de que modo podem influenciar na apreensão e proposição de sentidos dos sujeitos frente ao que os afeta e na confiabilidade das informações de que têm acesso. Como caminho metodológico, apresenta-se uma estrutura que permite observar o conceito de verdade aplicado no jornalismo, imbricado por uma realidade televisual, influenciado ainda pelas perspectivas do acontecimento e pelos campos problemáticos que insurgem em razão de sua dinâmica. Concebe-se que cada sujeito será afetado de uma forma em seu quadro de experiências e que a extração de um sentido, e a anuência de uma verdade, dependerão não só da relação dos indivíduos com os media que trataram do caso, mas de posições prévias frente aos candidatos envolvidos, aos partidos, entre e diante ao que socialmente caracteriza termos como política, mídia, violência, e demais vetores, no Brasil e no mundo. Palavras-chave: Telejornalismo; Verdade; Realidade; Acontecimento. Abstract: Starting from one of the episodes more striking the period of electoral campaign for president in Brazil in 2010 – recognized openly as case ‘bolinha de papel’ (paper ball), this article analyzes the relationship between truth and reality in the national TV journalism, questioning as the news expresses the events and how can influence in the apprehension and proposition of senses of the subject front to the that affects them and in the reliability of the information that have access. As methodological road, comes a structure that allows to really observe the concept applied in the journalism, imbricated for a reality of television, still influenced by the perspectives of the event and for the problematic fields that emerge in reason of its dynamics. It is conceived that each subject will be affected in a way in its frame of experiences and that the extraction of a sense, and the adhesion to a truth, they will depend not only of the individuals relationship with it measured them that they were about the case, but positions previous front to involved candidates, to the parties, among and before to the that socially characterizes terms as politics, media, violence, and other vectors, in Brazil and in the world. Keywords: TV Journalism; Truth; Reality; Event. 1. INTRODUÇÃO O dia 20 de Outubro de 2010 marca um dos acontecimentos mais reverberados na campanha eleitoral para presidente da república no Brasil daquele ano. Após um tumulto envolvendo representantes do PSDB e militantes do PT, o presidenciável José Serra, que fazia caminhada política na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, foi atingido na cabeça por objeto(s), supostamente atirado(s) por manifestantes petistas. Era o início de um evento que 1 Antônio A. Braighi é especialista em Imagens e Culturas Midiáticas (UFMG) e mestre em Estudos de Linguagens (CEFET-MG). E-mail: antonioaugustorp@yahoo.com.br 1
  • 2. repercutiria, intensamente, nos media, na própria campanha eleitoral, nos debates entre eleitores nas ruas e na internet, e em muitas outras esferas. No mesmo dia, o Jornal Nacional, da Rede Globo, apresentou uma reportagem2 que relatava o caso, frisando que o candidato havia interrompido uma atividade de campanha após ter sido “agredido num tumulto iniciado por militantes do PT”. O vídeo mostra o momento em que começa a confusão entre correligionários dos partidos rivais. Porém, reproduz fotos da agressão ao candidato, tiradas após ter sido atingido, com as mãos postas à cabeça, em meio à confusão. A reportagem indica que Serra teria sido atingido por uma bobina de fita crepe. Mas, na mesma noite, outro telejornal – o ‘SBT Brasil’, exibiu matéria 3 que trazia imagens do momento em que o peessedebista é atingido por, segundo propõe o âncora da atração, um “objeto não identificado”. Contudo, como indica o responsável pela reportagem, o jornalista Marco Alvarenga, é possível ver um objeto branco, que parece uma “bola de papel”, atingindo a cabeça do candidato. Indaga-se que esta matéria, de forma velada, ou não, dá a ver que, possivelmente, Serra teria simulado as dores na cabeça, ao indicar que o mesmo teria recebido uma ligação e, logo depois, volta a caminhar, aí sim, com a mão posta à cabeça. No dia seguinte, o mesmo Jornal Nacional apresenta outra matéria 4. Desta vez, trazia as imagens veiculadas pelo SBT, ratificando que o candidato teria sido de fato atingido por um objeto mais leve. Contudo, também apresentava o registro feito via celular, onde é, propõe-se, possível ver o presidenciável sendo atingido também por outro objeto, circular, com entorno transparente, presumidamente um rolo de fita adesiva. Acredita-se, em meio à confusão de informações apresentadas, e o conflito frente a uma possível teatralidade, que as três reportagens, de modo complementar, fazem emergir amplos campos problemáticos, postos à mesa para a discussão dos sujeitos (QUÉRÉ, 2005). Um destes complexos é justamente o que se refere à função, o compromisso e o modus operandi dos meios de comunicação de massa, um dos objetos desta análise, tenuemente limítrofe com outros, tais como a luta pelo poder e as vinculações políticas, ideológicas e econômicas, entre outros. Em meio a estas colocações, questiona-se como, e com que intuito, os telejornais narram os acontecimentos e por meio de quais estratégias tentam constituir a verdade. Para tanto, serão 2 Disponível em http://g1.globo.com/videos/jornal-nacional/v/jose-serra-interrompe-atividade-de-campanha-apos-ser-agredido-no-rio-de- janeiro/1360045/#/Edições/20101020/page/1, acessado em 05/01/2011 às 16h. 3 Disponível em http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/?c=1172, acessado em 05/01/2011 às 15h. 4 Disponível em: http://g1.globo.com/videos/jornal-nacional/v/perito-analisa-suposta-agressao-a-jose-serra-no- rio/1360677/#/Edições/20101021/page/1, acessado em 05/01/2011 às 15h40. 2
  • 3. analisadas as reportagens acima expostas e realizada uma reflexão de como os campos problemáticos relacionados à política e aos media, entre outros, assim como os quadros de experiência particulares, podem influenciar na apreensão e proposição de sentidos dos sujeitos frente ao que os afeta e na confiabilidade das informações de que têm acesso. Com este propósito, autores de ordens distintas serão convocados para a discussão que ora se pretende desempenhar, apresentando-os em momentos oportunos. Não obstante, para escolher um caminho metodológico, sugere-se uma estrutura que permita observar o conceito de verdade aplicado no telejornalismo, imbricado por uma realidade televisual, influenciado ainda pelas perspectivas do acontecimento e pelos campos problemáticos que insurgem em razão de sua dinâmica. 2. A VERDADE NOS MEIOS A verdade é tema de discussão e desencontros na filosofia, e em tantos outros campos, há muito tempo. Entre Platão e Aristóteles já havia a diferença. E, após o segundo ter fundado os teoremas fundamentais sobre a verdade, observações das mais diversas se apresentam, nos mais variados cenários. Mas não é objetivo deste trabalho, levantar um plantel de autores e teorias relacionadas à verdade, mesmo por que seria preciso bem mais que um artigo para tanto, haja vista a amplitude e complexidade do tema. Ao modo de Cabral e Santana (2010), procura-se aqui mais apresentar uma discussão adjacente a uma espécie de ‘verdade jornalística’. Todavia, alguns nomes como Foucault (2009) e Nietzsche (2007), trazem concepções que podem abrir a discussão, tal como este, que se arrisca a dizer o que é, pois, a verdade, enquanto: um exército móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma soma de relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o são, metáforas que se tornaram desgastadas e sem força sensível, moedas que perderam seu troquel e agora são levadas em conta apenas como metal, e não mais como moedas. (NIETZSCHE, 2007, p. 36-37). Mas onde então residiria a verdade? Segundo Nietzsche (2007), a verdade estaria na superficialidade humana, em sua subjetividade. O autor indica que o pathos universal aspira não diretamente à verdade, mas a uma crença, uma confiança em algo ao qual se dá o valor de verdade. É nesse sentido que se estabelece a busca e a luta da sociedade por uma verdade, e não amplamente ao ato pela verdade. E esta fé, esta procura, é necessária aos indivíduos, haja vista 3
  • 4. que, “do contrário [sem a/uma verdade], o homem viveria em eterno ofuscamento” (NIETZSCHE, 2007, p.72). A crença em algo verdadeiro se faz presente e é fundamental, tendo em vista que a busca pela verdade plena seria impossível, isso pois, “todo conhecimento surge por meio da separação, delimitação e abreviação; não há conhecimento absoluto de uma totalidade” (NIETZSCHE, 2007, p.66). Outro autor que se debruçou sobre as problemáticas da verdade foi Foucault (2009). Dentre tantas outras abordagens sobre as implicações desta (CANDIOTTO, 2010), em sua célebre aula inaugural no Collège de France, há mais de 40 anos, registrou que um sujeito ao pensar na vontade de verdade que rege as aspirações humanas, e que historicamente atravessou a formação dos povos, deixando na contemporaneidade sua marca, verá que a oposição verdadeiro x falso se constitui como um complexo de supressão dos indivíduos. O autor dirá que a força da verdade é análoga àquelas arbitrárias e é mantida por todo um aparato institucional que as impõe e as reconduzem, ainda que no nível do discurso. (FOUCAULT, 2009). Em diversas passagens de suas obras, Foucault demonstra que a verdade está atrelada ao discurso que a apresenta, diante às vicissitudes das regras do contexto em que é produzido e recebido, assim como frente às mudanças sócio-culturais que se sucedem ao longo do tempo. O jogo das verdades se dá também na legitimação de discursos autorizados, e na supressão de outros, considerados falsos por seu desprestígio. Essas regras são aceitas, subjetivamente, pelo público, que as incorpora e as pratica rotineiramente, adotando valor de verdade aos discursos que são considerados válidos. (CANDIOTTO, 2010). Não obstante, as escolhas são individuais. Cada sujeito será afetado de diferentes formas pela verdade; assim, irá agir e pautar seu modo de vida de acordo com a perspectiva que adotar. (DREIFUS; RABINOW, 1995). Diante as ideias apresentadas, e frente aos objetivos que ora se propõem, alguns questionamentos saltariam aos olhos; poder-se-ia falar dos meios de comunicação de massa enquanto um dos responsáveis pela manutenção desta ordem da verdade, apresentada por Foucault (2009)? Se sim, fazer contundentemente uma afirmação como esta, não seria limitar demasiadamente a perspicácia humana? Não, pois não se trataria de dizer que os indivíduos estão submissos ao poder real midiático, mas, sim, de levar em consideração que os media se constituem como um dos principais mecanismos de experimentação dos sujeitos com o mundo, ainda que de forma mediada, e que há muito a esfera midiática se tornou um dos locais preferenciais para a 4
  • 5. apresentação e discussão dos fenômenos sociais, ofertando chaves de leitura para a compreensão da sociedade. (ECO, 1984; LUHMANN, 2005). Neste sentido, se estabelece a ideia de que, munidos da credibilidade da sua audiência, os meios de comunicação de massa recebem a outorga da verdade. Contudo, esta se dá não na crença em um oráculo midiático, que tudo sabe, mas na medida em que os media devem buscar a verdade dos acontecimentos, por meio da narração dos fatos e do uso de estratégias que depõem a favor do que se apresenta. Acerca do tipo de verdade que mais se aplicaria ao jornalismo, Tambosi (2007) analisou as três principais teorias trabalhadas na epistemologia contemporânea e identificou que a de correspondência é a mais adequada ao campo. Isso pois, esta perspectiva indica que a verdade de uma assertiva consiste em sua relação com o mundo, na equação linguagem-realidade. Para o autor, o jornalista deve fundamentalmente reportar fatos, o que implica a teoria da correspondência como preponderante. Há, contudo, a ressalva de que os fatos, por vezes, se apresentam a partir de versões inverídicas. Isto posto, podem-se confundir afirmações (tidas verdadeiras) com fatos. “Recordemos que qualquer coisa que torne uma afirmação verdadeira é um fato, e que o fato é sempre extralinguístico, isto é, esta fora da linguagem” (TAMBOSI, 2007, p.46). Tambosi (2007), ainda faz considerações sobre a apreensão do fato, e o modo como os sujeitos os relatarão, o que remonta à condição extralinguística daquele; ou seja, os fatos são estáveis, as narrativas sobre eles, não. A ideia que vem à tona é sobre a articulação de atores depoentes, que se arranjam nas reportagens, mas não se deve esquecer que o jornalista também é um intérprete do acontecimento, fazendo, junto com seus entrevistados, a sua construção discursiva acerca do fato. Afinal, a notícia não é o fato propriamente dito, mas o que se diz sobre o fato: o relato. (LUSTOSA, 1996). Iluska Coutinho resume bem este quadro, quando indica que “[...] o que vemos impresso nos jornais não é a voz dos fatos, mas de pessoas que participaram deles ou ainda que foram espectadoras dos acontecimentos, também uma categoria carregada de julgamentos e intencionalidades” (2004, p.9). A consideração da autora demonstra não só as fragilidades da verdade midiática, mas já apresenta pistas acerca dos campos problemáticos. E quantas outras dificuldades o jornalismo não tem para apresentar a verdade; não bastassem estas, ainda há o fator tempo, a objetividade, o grau de profundidade no tratamento dos 5
  • 6. temas, as limitações do sistema produtivo, entre outros. Ainda assim, e mesmo diante à perspectiva de Nietzsche (2007), para quem a verdade é um ideal inalcançável, o jornalista nunca deve assimilar esta prerrogativa, com o risco, inclusive, de perder o rigor da apuração, o que comprometeria, este sim, a confiabilidade das informações, conforme preceituam Cabral e Santana (2010). Para estas autoras, a busca pela verdade dos fatos se configura como uma das principais perspectivas do profissional do jornalismo. Ainda assim, o que os meios de comunicação de massa apresentam, por maior que seja o rigor na apuração e afastamento do jornalista frente ao que narra, é apenas um fragmento da realidade social (CABRAL; SANTANA, 2010). A ‘verdade jornalística’, ainda que carregada do utópico ideal de pleno conhecimento das razões, consequências e características dos fatos, não alcança este propósito, apresentando apenas uma ideia de verdade. Além disso, por mais que a discussão não se encerre aqui, se vê inebriada com as limitações do próprio conceito de verdade – amplamente discutido na seara filosófica, os percalços relacionados ao fazer jornalístico, o modo como a própria recepção encarará a construção dos fatos, sendo mais determinante ainda o tipo de relação que estabelece com determinado veículo – ínterim este onde se poderia pensar nas implicações do contrato midiático, e na própria dinâmica dos meios com a produção de uma espécie de realidade midiática particular. 3. A REALIDADE DOS MEIOS O que significa falar da realidade? Entre tantas outras abordagens, buscamos referências na psicanálise para estabelecer uma compreensão básica do termo. Jorge (2010), resume à sua maneira o raciocínio de Lacan sobre a realidade, ao exprimir que ela é “simbólico-imaginária, é uma construção eminentemente fantasística que, para cada sujeito, faz face ao real inominável” (p.10). Neste contexto, o real apresenta-se enquanto unidade estável pura, que foge a qualquer tipo de representação e estabelecimento de sentido, enquanto a realidade é uma construção cognitivo-psíquica (e uma apreensão) de cada individuo – ainda que, em alguns pontos, compartilhada socialmente, frente ao mundo, baseada na linguagem. (JORGE, 2010; JOST, 2009). A discussão, assim como a compreensão dos conceitos, é muito mais ampla do que se pode tratar aqui. Neste sentido, questiona-se então: o que significaria falar de realidade para a televisão? Jost (2004; 2009) se arriscou a responder. Após longo levantamento, e do 6
  • 7. estabelecimento de esquemas de compreensão de como se articula a (promessa de) realidade neste suporte, dirá que “para saber como a televisão trata a realidade, não há outro caminho que a análise dos programas, que nos dizem em que visão da realidade eles são fundados” (JOST, 2009, p.30). Ora, uma vez que se tratam aqui de matérias exibidas em um (sub)gênero televisivo bem definido, em que visão de realidade se fundem os telejornais? Segundo Duarte e Curvello (2009), “o discurso do telejornal constrói-se tomando como referência o mundo real, exterior à mídia; trata-se de uma meta-realidade, cujo regime de crença proposto é a veridicação” (p.69). Indaga-se aqui que esta meta-realidade telejornalística produz, ou amplifica, sentidos outros, externos, quando não extremos, frente aos acontecimentos que apresenta. Para Baudrillard (1991, p.105), por exemplo, “a informação devora os seus próprios conteúdos. Devora a comunicação e o social”, isso, por dois motivos: um relacionado à perspectiva de encenação da informação, imposta pelos meios de comunicação de massa ao tentar comunicar algo – impondo sentidos outros à informação, e um seguinte que se pauta pela desestruturação do real, implementando um processo de entropia do social. Para o autor, os media estabelecem, a sua maneira, um tipo de (re)apresentação do real – e/ou da realidade social, instituída por meio de uma realidade própria aos veículos: virtual. (BAUDRILLARD, 1991). Baudrillard, inclusive, irá resgatar ideias de MacLuhan, para quem o meio é a própria mensagem, em alusão a esta dinamicidade dos media e à sua capacidade de instaurar um processo de hiperinflação dos sentidos, a “hiper-realidade da comunicação e do sentido. Mais real que o real, é assim que se anula o real” (1991, p.105). Assim, para Gumbrecht (1998, p.262), há tempos se estabeleceu “uma realidade televisiva própria, que, desde o início, esteve tão ligada à realidade do espectador que, paulatinamente, ela a transformou e, nesse meio tempo, começou a substituí-la”. Concluindo que “faz todo o sentido dizer que a realidade televisiva, no final do século XX, torna-se uma realidade cotidiana”. Estas considerações fazem todo sentido para as perspectivas de Eco (1984), ao descrever detalhadamente a relação da ‘tevê’ e o público, interessando aqui, entre tantas outras assertivas, a ideia de que estamos diante a uma “situação televisiva em que a relação entre enunciado e fatos se torna cada vez menos relevante no que diz respeito à relação entre verdade do ato de enunciação e experiência receptiva do espectador” (p.191). O que estaria em jogo na realidade televisiva então seria a sustentação de autenticidade dos atos de enunciação, de 7
  • 8. expressão do acontecimento, de narrativa e encenação da verdade, que se estabelecem por motivos particulares àquelas emissoras que os articulam. Neste contexto, mais do que uma realidade outra, o que se apresenta com a solidificação dos media na sociedade contemporânea é um entrançamento rizomático das nuances midiáticas com o real. Este imbricamento, cada dia mais voraz, escurece a mediação do real e implanta outras condições de realidade, (não)lugares virtuais. E, diante a esta premissa, para Baudrillard, seria “inútil sonhar com uma revolução pela forma, já que médium e real são a partir de agora uma única nebulosa indecifrável na sua verdade” (1991, p.108). Ainda assim, os media continuam a atuar como instituições sociais viris, sendo imprescindível então fazer questionamentos ao seu funcionamento e impacto na vida social. Porém, Baudrillard conclui que a articulação e a dinâmica do sistema se dá, justamente, de acordo com os anseios da sociedade; “é o que fazem as massas: remetem para o sistema a sua própria lógica reduplicando-a, devolvem, como um espelho, o sentido sem o absorver. Esta estratégia [...] leva a melhor hoje em dia”. (1991, p. 111). Outros pesquisadores, tal como Martín-Barbero (2003), irão verificar e destacar esta relação dos meios com as aspirações dos sujeitos de outra forma – relativizada, no mínimo, de modo um tanto menos pessimista. E não se pode perder de vista as concepções destes autores; haja vista o que interessa nesta parte do trabalho, acaba sendo importante, para compreender o maquinismo de funcionamento desta realidade midiática, assumir que, de fato, este entendimento passa por levar em conta por que, e com que propósito, se motiva este mecanismo: em razão daqueles a quem se dirige e, de forma retroalimentativa, pelos quais se fundamenta – o público. Neste imbróglio, Baudrillard (1991) irá marcar de forma contundente a relação dos media com os acontecimentos, ratificando sempre que o envolvimento, principalmente da televisão, com um determinado episódio, modifica a ideia inicial a ser apresentada, provocando um prejuízo a essência do que de fato aconteceu, além de causar avarias para a sua percepção e experiência dos sujeitos com o caso. 4. O ACONTECIMENTO E AS IMPLICAÇÕES DO CAMPO PROBLEMÁTICO Entende-se acontecimento aqui sob as perspectivas de autores tais como Quéré (2005), para quem estes episódios, tenham eles a dimensão que tiverem, configuram a experiência social dos sujeitos, marcando seu tempo, e organizando estruturas como passado e presente, e influenciando, inclusive, nas decisões e acontecimentos futuros. 8
  • 9. O acontecimento é singular, de ordem paradoxal, acomete os sujeitos de modo individualizado e inaugura – com efeito, uma nova forma de pensar e agir. Promove uma cisão nas formas de ver o que está à volta e, sobretudo, frente ao que se relaciona diretamente ao episódio, ainda que este não tenha, ou não se consiga articular a priori, uma explicação. (QUÉRÉ, 2005; BRAIGHI, 2010). Nesse sentido, o acontecimento “é um fenômeno de ordem hermenêutica: por um lado, ele pede para ser compreendido, e não apenas explicado, por causas; por outro, ele faz compreender as coisas – tem, portanto, um poder de revelação.” (QUÉRÉ, 2005, p.60). O acontecimento revela, ou traz à tona – propulsiona à arena de debates, justamente os elementos que se relacionam com as causas e consequências do que aconteceu (sejam estes já existentes, ou instituídos pelo episódio). Quéré (2005) tratará destas questões como campos problemáticos. Os campos problemáticos constituem a trama da vida dos sujeitos, e também de toda uma sociedade, num dado momento. São questões pendentes para as quais não se assimilam respostas imediatas, devido a sua complexidade. Por vezes, são amplos problemas, que se constituem por elementos complicados como crises, disputas, incoerências e discrepâncias de interesses, convivendo, quando não, convergindo, numa desarmoniosa relação interna. (QUÉRÉ, 2005). Quéré (2005) entende que, apesar destes problemas afetarem os indivíduos, muitas vezes estes não são discutidos de forma ampla. Mas, os acontecimentos, com sua força, trazem uma série de questões à visibilidade pública. Os episódios da vida, “ganham um lugar em campos problemáticos e servem, pelo seu poder de esclarecimento e de discriminação, de pivôs dos inquéritos que procuram e elaboram soluções.” (QUÉRÉ, 2005, p.72). E, em meio às “intrigas”, arranjadas no mundo, os sujeitos partem em busca de explicações. Como foi dito, os acontecimentos afetam os sujeitos de modo individual, influenciando a compreensão e o modo de agir, a partir do quadro de experiências de cada um. Neste contexto, vale o registro de que “a individualidade do acontecimento não é determinada, apenas, pelas características da sua ocorrência como fato, mas também pelas reações e pelas respostas que suscita, via uma compreensão e uma apropriação, seja qual for o suporte.” (QUÉRÉ, 2005, p.68) Neste ponto, vale lembrar que os media, são um dos campos privilegiados para a experimentação – ainda que mediada, do mundo pelos sujeitos. Contudo, “a televisão contribui decisivamente para a incomunicabilidade da experiência”, (GUIMARÃES; LEAL, 2008, p.7), 9
  • 10. pois ainda que apresente os acontecimentos, faz isso de modo fragmentado, reduz o episódio ao visível, e lhe aplica a carga da realidade televisiva. Diante ao acontecimento, a operação dos veículos consiste em duas frentes: torná-lo explicável, por meio de narrativas. Contudo, é na outra vertente, a explicativa, que se amplia o lado paradoxal deste, uma vez que o sentido pode tomar proporções ainda maiores. Elementos envolvidos na produção, apresentação e recepção influenciarão no modo como os indivíduos fazem a leitura e serão afetados pela informação; “o que as notícias fazem é tentar dar conta, linearmente, de toda a dinâmica do acontecimento a partir de seus fragmentos, que são organizados segundo o saber jornalístico”. (LEAL, 2009, p.93). Mas, não obstante ao enquadramento midiático e a influência deste na apreensão – e até na produção, os acontecimentos mantém sua força e complexidade, instituindo-se como desafiadores da ação e do fazer jornalístico. (LEAL, 2009). O acontecimento está presente em uma sofisticada (e embaraçada) teia, onde os fios dos campos problemáticos se cruzam e se compelem, na busca por um ajustamento utópico. E estas disputas se dão no emaranhado cognitivo dos sujeitos e nas esferas públicas; o episódio faz constituir um jogo entre sujeitos (sejam eles cidadãos comuns ou autoridades políticas) e instituições, que interpelam seus discursos em uma arena contraditória. Isso pois, não se trata aí da razão pura como norte, mas sim das impressões dadas a partir da maneira como a questão afetará cada um em seus campos de experiência, imbuídos de sentidos particulares, emanados pela expressão do acontecimento e sua apreensão. (BRAIGHI, 2010). Neste contexto, “[...] trata-se, sobretudo, de qualidades que, em virtude do acontecimento, impregnam as situações que o envolvem, afetam e modificam os seus elementos constitutivos assim como as relações entre eles, penetram e coloram tudo o que está implicado na experiência”. (QUÉRÉ, 2005, p.68). 5. NA VERDADE, O QUE ACERTOU O SERRA FORAM... Bolinhas de papel? Bexiga d´água? Não importa. O que abriu-me o couro, caiu como maçã de Newton. Despertou reflexão muito mais ampla. Tem alcance maior que objetos não identificados. (Mary G.) 10
  • 11. Mary G. é o pseudônimo com o qual a jornalista Mariana Gross assina textos em um blog5. Em “Democracia”, postado em 24 de Outubro de 2010, a profissional relata sua experiência ao ser atingida por uma pedra durante o tumulto apresentado nas matérias acima. Para além de qualquer tipo de reflexão teórica acerca dos contornos do acontecimento, podem vir à superfície, com este breve trecho, algumas percepções, tais como, e principalmente: o poder de revelação do acontecimento e a forma como os sujeitos são afetados, direta e individualmente, pelos acontecimentos. Na sequência de seu raciocínio, Mariana dá a ver alguns dos campos problemáticos envolvidos neste episódio, que emergem e, particularmente, “despertam reflexão muito mais ampla”: a discussão sobre a liberdade política, o ir e vir, a exposição de ideias e a imprensa livre, cerceadas nesta situação pelas provocações e impedimentos impostos, além de pedras lançadas a esmo, por aqueles que diziam representar os partidos políticos. Afetadas pelo acontecimento, as pessoas saem da zona de conforto e se projetam em busca de respostas. O depoimento, mais da cidadã que experimentou a situação, do que da jornalista, serve como uma chave de leitura para este caso. Os 27 comentários que esta postagem suscitou no referido blog, também poderiam atuar como norteadores da discussão, haja vista que muitos se manifestaram pontualmente a respeito do caso. Contudo, esta veiculação de Mariana Gross na Internet, apesar de apresentar o seu relato, e demonstrar como um acontecimento está inserido em um outro, dito mais amplo em razão de suas implicações, é também um mecanismo de mediação dos internautas com o(s) episódio(s). Nesse sentido, é preciso pensar na afetação dos sujeitos pelos acontecimentos a partir das edificações de sentido realizadas em cada meio. Os indivíduos, em maioria, experimentam os fenômenos sociais a partir da confecção da realidade social promovida pelos media. Há, contudo, um imbróglio, onde vetores de ordens distintas se entrecruzam. A realidade dos media, em razão de sua própria dinamicidade, esfumaça a ‘verdade’. Mas o que se pode falar da verdade, se o que se tem da verdade é só um fragmento, ou uma ideia compartilhada, sobretudo neste meio? Se a verdade plena não existe, e na concepção de Nietzsche (2007) todo saber emana por meio do afastamento e abreviação (de uma edição?), tão pouco haveria de existir, também, no (tele)jornalismo. 5 Suspirada: Um respiro literário. Disponível em: http://suspirada.blogspot.com. Acessado em 29/01/2011 às 21h. 11
  • 12. Neste veículo, apesar da construção das narrativas fazer toda a diferença, as imagens são o carro-chefe, conferindo a carga de verdade; “no telejornal, que utiliza a imagem como prova da existência desse real, isso fica ainda mais evidente. O jornalista não só “fala o mundo”, mas também o mostra” (DAVID-SILVA, 2005, p.23). E a questão que ora se apresenta tem a imagem como ponto fundamental. Mas o que a imagem mostra? O que há de verdade nas imagens? Por outro lado, é preciso pensar que a combinação do texto icônico com o linguístico dá o ajuste necessário para uma determinada expressão de sentidos, e que o seu alojamento em um determinado campo do saber sócio-cultural irá selar a ideia por detrás da narrativa jornalística. Um exemplo disso se dá quando o telejornal do SBT articula a proposta de que: José Serra havia sido atingido por uma bola de papel; entra em um veículo; anda neste por alguns metros (minutos); sai novamente; recebe uma ligação (não se sabe de quem) e, em seguida, coloca uma das mãos na cabeça e começa a andar, como se estive sentido dores. Apesar do telejornal não afirmar categoricamente, o que emana como compreensão seria: Serra foi orientado, ao telefone, a simular uma dor, tendo em vista que estava sendo gravado e, como aquele era um período de campanha, o candidato poderia ganhar a simpatia de alguns eleitores e ainda depreciar o comportamento de seus rivais, afetando a imagem de sua adversária? Não se pode dizer que sim, nem que não. Mas sabe-se que a simples presença do dispositivo cinematográfico no local (seja este de posse e operado pela mídia, ou os vários celulares e câmeras digitais amadoras) influencia no comportamento dos sujeitos. Neste ponto, há uma série de acusações sobre a possível teatralidade do candidato, inclusive do próprio, então presidente, Lula, e da candidata Dilma6. Mas qual é a verdade aí? Quem, de fato, ligou para José Serra? E o que disse? E quando ligou? Antes ou depois da bolinha de papel? Antes ou depois do rolo de fita adesiva? Haveria rolo de fita adesiva? Se para Foucault (2009) a verdade está atrelada ao discurso que a apresenta, o que se tem neste episódio é um embate admirável, onde, aparentemente, não há vencedor. No dia seguinte o Jornal Nacional apresenta matéria, com duração três vezes maior do que veiculara anteriormente, tentando desconstruir o processo cronológico veiculado pelo SBT (ou reconstituir, a sua maneira, ‘corretamente’, a cronologia do episódio). O que se tem é uma disputa pela verdade entre as emissoras? Antes, nem todas as informações podiam ser ‘provadas’, vez que não 6 Lula afirmou que Serra teria mentido, comparando a atitude do peessedebista ao goleiro chileno Rojas que, em 1989, em uma partida contra a seleção brasileira de futebol, simulou ter sido atingido por um foguete, ao passo que teria feito um corte no rosto, propositalmente, temendo que sua equipe fosse eliminada das eliminatórias para a Copa do Mundo de 1990. 12
  • 13. se dão a ver pelas imagens, frente a sua possível inexistência – ausência do fato ou da imagem? Onde está a verdade? Emerge o discurso: O que dizem Serra e aqueles que dele estavam próximo (a maioria, representantes políticos), é que o candidato fora atingido por um rolo de fita adesiva. Mas um dos campos problemáticos é justamente sobre a verdade nos discursos dos políticos no Brasil, sobretudo no período de campanha. O que seria capaz de fazer um candidato a presidência que, já no segundo turno, próximo ao dia da votação, está em segundo lugar nas pesquisas (outro campo problemático: sua confiabilidade), com muitos pontos atrás de sua adversária? Questionamento dos indivíduos, de uma sociedade marcada pela corrupção e impunidade política. O candidato foi atingido por uma bolinha de papel! As imagens mostram isso. Verdade! Mas as imagens não podem provar que ele não foi atingido também por outro objeto. É preciso ter provas: Depoimentos? Frágeis frente às imagens. Imagens? Só se tem das gravações de um celular. Baixa resolução, pouca confiabilidade. Emerge novamente a necessidade do depoimento, desta vez de um especialista, que atestará a confiabilidade das imagens. Mas quem é o perito? 7 Foucault falará da legitimação de discursos autorizados, e do desprestigio a outros, considerados falsos ou, nesse caso, com relações diretas com os envolvidos (CANDIOTTO, 2010). É o caso, por exemplo, das observações feitas por Lula sobre o médico que atendeu Serra neste episódio. Com o prestigio de cerca de 80% de aprovação popular 8, o presidente incita a possível simulação, ratificando que o Dr. Kligerman é ex-secretário de Saúde da administração César Maia (DEM) e foi nomeado por Serra a cargo de confiança quando este foi ministro da Saúde9. Muitos outros discursos foram proferidos e rebatidos, na tentativa de legitimá-los ou questioná-los; jogo de contra-argumentação incessante, realizado tanto em um nível macro (das trocas entre os envolvidos na mídia) quanto local (na discussão entre os sujeitos). Mas no caso do médico, Lula toca nas vicissitudes de interesses e relações políticas, que é mais um dos campos problemáticos, que configuram a complexidade de apreensão da questão, entre muitos outros. O 7 Trata-se de Ricardo Molina, perito de vasto currículo profissional e acadêmico, tendo participado, na prestação de laudos e pareceres, de casos de grande repercussão no Brasil. Em alguns episódios, atuou de forma particular, a pedido de emissoras de televisão. Contudo, já forneceu relatórios discrepantes aos dos ‘peritos legitimados’, gerando contestação das instituições oficiais. Além disso, na internet , muitos se propuseram a questionar a análise de Molina frente ao caso da “bolinha de papel”. 8 Conforme matéria da Folha.com, disponível em http://www1.folha.uol.com.br/poder/820667-com-83-aprovacao-ao-governo-lula-bate-recorde- historico-mostra-datafolha.shtml, acessado em 05/02/2011 às 12h. 9 As declarações de Lula ofenderam Kligerman, que entrou com um pedido de retratação pública no Supremo Tribunal Federal (STF). A petição foi, contudo, arquivada pelo ministro Celso de Mello, informando que não havia qualquer ambiguidade ou dubiedade nas afirmações do presidente da República. 13
  • 14. próprio presidente, apesar do cargo e de gozar do apoio popular ao seu governo, tem o seu discurso jogado ao desprestigio, vez que também é um interessado – este na vitória de usa partidária Dilma. Entre outros campos problemáticos envolvidos, também se pode falar da relação dos meios de comunicação de massa. Este episódio, ao passo que demonstra, por um lado, limitações dos telejornais, no que se refere principalmente aos erros e limitações na apuração, também faz emergir a crítica da sociedade frente ao programa da Rede Globo, considerada parcial e partidária, em inúmeras manifestações na internet, por exemplo, o que adensa ainda mais a extração de ideia de verdade frente ao que, de fato, aconteceu. Em 21 de outubro de 2010 um senhor de 68 anos foi alvejado na rua por uma bolinha de papel (e, conforme se afirma, também por um rolo de fita adesiva). Seria simples pensar assim. Mas a função social assumida por esta pessoa, seus interesses, as perspectivas contextuais, sua relação direta com os anseios de outros (de todo um país, por que não, de parte do mundo), e o modo como este caso foi tratado nos meios de comunicação de massa (levando em consideração que os media atuam a partir de uma (re)construção da realidade de modo particular), ampliam por demais os sentidos que poderiam ser extraídos do caso, complexificando a compreensão do caso por parte dos indivíduos. Independente disto, cada sujeito será afetado de diferentes formas em seus quadros de experiência. A extração de um determinado sentido, e a anuência de uma verdade frente ao caso, dependerá de uma posição prévia dos indivíduos com os candidatos envolvidos, os partidos e seus partidários, os meios de comunicação que trataram do caso, entre outros, tais como a sua relação, por exemplo, com a liberdade de expressão e manifestação política (seja ela como for). Além disso, não só a disposição frente às partes, mas também diante ao que caracteriza termos como política, mídia, violência, entre outros, no Brasil, estarão em xeque quando os indivíduos forem processar o caso e suas implicações. A questão não se encerra aqui. Há muito mais a ser discutido, inclusive analisado, de forma mais pontual. O propósito, de colocar o tema em discussão, foi atingido, e servirá, indaga- se, enquanto referência para observações análogas, frente a acontecimentos que sempre se dão, rotineiramente, na dinâmica da vida social e dos media, fazendo emergir amplos e complexos campos problemáticos. No mais, se compreende que a verdade nunca poderá ser extraída por completo, a realidade será sempre dependente e comungada socialmente em razão de um 14
  • 15. determinado fim, e o mundo, nas palavras de Luhmann (2005), este “[...] jamais pode ser observado, menos ainda conhecido, pois toda observação produz, por meio de um ‘cruzamento inexpresso’, um ‘espaço não marcado’, que ela não observa.” (p.156, grifos no original). REFERÊNCIAS BAUDRILLARD, J. Simulacros e Simulações. Lisboa: Relógio D’água, 1991. BRAIGHI, A.A. Índices de produtividade rural: A revelação do problema pela força de um acontecimento público. Revista PJ:Br. VII, Ed. 13. Escola de Com. e Artes da USP, 2010. CABRAL, A.M.; SANTANA, A. O processo de construção da verdade no jornalismo: conceito, busca e método de apuração. SBPJor – Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo. VIII Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo. São Luís: Univ. Fed. do Maranhão, 2010. CANDIOTTO, C. Foucault e a crítica da verdade. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. COUTINHO, I. O conceito de verdade e sua utilização no Jornalismo. Anais do Celacom 2004. Umesp: São Paulo, 2004. Disponível em: http://encipecom.metodista.br/mediawiki/images/2/2d/GT1Texto014.pdf, Acessado em 29/01/2011 às 19h30. DAVID-SILVA, G. A informação televisiva: uma encenação da realidade. Tese de doutorado. FALE/UFMG. Belo Horizonte, 2005. DREYFUS, H.; RABINOW, P. Michel Foucault, uma trajetória filosófica (para além do estruturalismo e da hermenêutica). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. DUARTE, E.; CURVELLO, V. Telejornais: Quem dá o tom? In: GOMES, I.M. (org.). Televisão e Realidade. Salvador: Edufba, 2009. ECO, U. Viagem na irrealidade cotidiana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. FOUCAULT, M. A ordem do discurso. 18ª edição. São Paulo: Ed. Loyola, 2009. GUIMARÃES, C.; LEAL, B.S. Experiência estética e experiência mediada. InTexto, Porto Alegre, v. 2, p.1-14, 2008. GUMBRECHT, H.U. Modernização dos sentidos. São Paulo: Ed. 34, 1998. JORGE, M.A.C. Fundamentos da psicanálise de Freud a Lacan: A clinica da fantasia. v.2. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. JOST, F. Seis lições sobre televisão. Porto Alegre: Sulina, 2004. 15
  • 16. _______. Que significa falar de “realidade” para a televisão. In: GOMES, I.M. (org.). Televisão e Realidade. Salvador: Edufba, 2009. LEAL, B. Telejornalismos e autenticação do real: estratégias, espaços e acontecimentos. In: GOMES, I.M. (org.). Televisão e Realidade. Salvador: Edufba, 2009. LUHMANN, Niklas. A realidade dos meios de comunicação. São Paulo. Paulus, 2005. LUSTOSA, E. O texto da notícia. Brasília: Ed. UnB, 1996. MARTIN-BARBERO, J. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. 2 ed. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2003. NIETZSCHE, F.W. Sobre verdade e mentira. São Paulo: Hedra, 2007. QUÉRÉ, L. Entre facto e sentido: a dualidade do acontecimento. Trajectos: revista da comunicação, cultura e educação, Lisboa, n. 6, p.59-74, 2005. TAMBOSI, O. Jornalismo e teorias da verdade. Intercom – Revista Brasileira de Ciências da Comunicação. São Paulo, v.30, n. I, p. 35-48, jan./jun. 2007. 16