1. CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DA ARTE DE CSCW
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA POR
ANTÓNIO JOSÉ GUILHERME CORREIA
Sob orientação dos Professores Doutores Benjamim Fonseca e Hugo Paredes
UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO
ESCOLA DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIAS
2011
3. iii
Dissertação apresentada por António José Guilherme
Correia à Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro para o
cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de
Mestre em Tecnologias da Informação e Comunicação, sob a
orientação dos Professores Doutores Benjamim Fonseca e Hugo
Paredes.
5. v
RESUMO
Nas últimas décadas, o trabalho cooperativo adquiriu uma importância assinalável na
comunidade científica como um domínio de investigação composto por múltiplos interesses. A
avaliação do estado da arte do campo multidisciplinar de Trabalho Cooperativo Suportado por
Computador, uma área científica polimórfica focada no fenómeno social do trabalho em grupo
e no suporte tecnológico às suas dinâmicas processuais, suscitou uma meta-análise transversal
a diversas publicações científicas encontradas em conferências e revistas especializadas. Numa
perspectiva holística, esta dissertação fundamenta-se na conceptualização do campo científico
supra-referido, onde é procurado um ponto de referência comum na literatura para explicar os
elementos que caracterizam a sua envolvente terminológica, no enquadramento histórico com
alguns dos factos que marcaram a sua evolução, bem como nos seus domínios de aplicação.
A análise bibliométrica ao campo de Trabalho Cooperativo Suportado por Computador
respeitou um processo de selecção prévia de conferências e revistas com tópicos dedicados ao
seu domínio de investigação, e catalogação dos atributos de identificação presentes neste tipo
de artigos. Complementarmente, foram recolhidos dados sobre o número de citações em cada
artigo, segundo os resultados obtidos no Google Scholar, ACM Digital Library e Web of Science,
num total de 1480 artigos. Os resultados obtidos com a análise bibliométrica apresentam uma
perspectiva que pode clarificar possíveis tendências futuras, em termos de produção científica,
bem como uma caracterização aproximada sobre o impacto de determinadas publicações. Este
estudo demonstra assim uma forte volatilidade na composição da comunidade de investigação
científica, num intervalo de tempo com profundos avanços tecnológicos. A selecção de um
período de análise entre 2003 e 2010, deveu-se particularmente ao facto de representar uma
grande parte da produção científica na última década, complementando os estudos anteriores.
De forma a caracterizar a perspectiva actual desta área de investigação, é utilizado um
método de revisão sistemática da literatura para rever o conjunto de taxonomias apresentadas
para classificação de características de trabalho cooperativo e atributos funcionais de sistemas
centrados no suporte à cooperação. Neste sentido, foi adoptado um esquema de classificação
proposto para categorizar as tipologias e os atributos funcionais de ferramentas colaborativas,
funcionando como a base de classificação seleccionada para publicações desta natureza. Neste
processo, foram classificados um total de 541 artigos publicados entre 2003 e 2010, registando
as suas características taxonómicos. A metodologia de análise deste conjunto de publicações
respeitou um processo sistemático de leitura do resumo de cada artigo, leitura na íntegra para
o caso específico de artigos que apresentam elevados níveis de complexidade para a obtenção
deste tipo de informação, bem como busca por palavras-chave relacionadas com as categorias.
De uma forma genérica, o campo de Trabalho Cooperativo Suportado por Computador
tem apresentado alguns esforços para combinar a investigação sobre os fenómenos sociais do
trabalho e a investigação de cariz mais tecnológico. A análise efectuada neste trabalho aponta
para a prevalência das ferramentas centradas em dinâmicas de grupo, bem como a tendência
de crescimento das aplicações de tagging social e videoconferência.
Palavras-chave
Trabalho Cooperativo Suportado por Computador, CSCW, Groupware, Bibliometria, Interacção
Humano-Computador, Taxonomias, Revisão Sistemática, Análise Transversal.
7. vii
ABSTRACT
In the last decades, cooperative work has gained a remarkable importance in the
scientific community as a research domain that encompasses multiple interests. The
evaluation of the state of the art of the multidisciplinary field of Computer Supported
Cooperative Work, a polymorphic scientific area focused on the social phenomenon of group
work and on the technological support to its procedural dynamics, prompted a cross-sectional
meta-analysis to several scientific publications found in specialized conferences and journals.
In an holistic view, this dissertation is based on the conceptualization of the above-mentioned
scientific field, where a common reference point in the literature is sought to explain the
elements that characterize its surrounding terminology, in the historical background with
some of the facts that marked its progress, as well as in their application domains.
The bibliometric analysis to the field of Computer Supported Cooperative Work,
respected a prior selection process of conferences and journals with topics dedicated to their
research domain, and cataloging the identification attributes present in this type of articles. In
addition, data about the number of citations in each article was collected, according to the
results obtained using Google Scholar, ACM Digital Library and Web of Science, in a total of
1480 articles. The results obtained with bibliometric analysis present a perspective that can
clarify possible future trends in terms of scientific production, as well as an approximate
characterization to the impact of certain publications. This study thus shows a strong volatility
in the composition of the scientific research community, in a review period characterized by
deep technological advances. The selection of the 2003-2010 period was due particularly to
the fact that it represents a significant part of the last decade scientific production,
complementing previous studies.
In order to characterize the current state of this research field, a systematic review
method is used to review the taxonomies presented for the classification of cooperative work
characteristics and the functional attributes of systems centered in the cooperation support. In
this sense, a classification scheme was adopted that aims to categorize the typologies and
functional properties of cooperative work tools, working as the classification basis chosen for
this type of publications. In this process, a total of 541 articles published between 2003 and
2010 were classified, recording their taxonomic elements. The analysis methodology used for
this set of publications to obtain this kind of information followed a process of reading the
summary of each article, searching for keywords related to each category, as well as fully
reading those articles that have high levels of complexity.
Generally, the scientific field of Computer Supported Cooperative Work has been
carrying out some efforts to combine research concerning social aspects of work with research
dealing with technological aspects. The analysis carried out in this thesis point to a prevalence
of group dynamics tools, as well as a growing trend for applications of social tagging and
videoconference.
Keywords
Computer Supported Cooperative Work, CSCW, Groupware, Bibliometrics, Human-Computer
Interaction, Taxonomies, Systematic Review, Cross-seccional Analysis.
9. ix
AGRADECIMENTOS
Esta dissertação é resultado da confluência entre o esforço e empenho do autor, bem
como do apoio e incentivo incondicional de muitas entidades aglutinadoras de um crescimento
assinalável.
Assumindo um risco sempre presente em conjunturas psicossociais desta natureza, de
ser injusto por omissão, gostaria de agradecer particularmente:
- Aos Professores Doutores Hugo Paredes e Benjamim Fonseca, orientadores da minha
investigação, auxiliando-me incondicionalmente com o seu conhecimento científico, incentivo,
infinita amizade e espírito de união que, em uníssono, muito contribuíram para ultrapassar as
dificuldades de percurso que uma investigação neste domínio multidisciplinar acarreta.
- À Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, pela forte entreajuda que é patente
no seio desta instituição, pelas excelentes condições de trabalho que proporciona, e por todas
as oportunidades de investigação concedidas. Um agradecimento especial para os Professores
Doutores João Varajão, Leonel Morgado, Joaquim Escola e Paulo Martins por terem feito parte
da minha evolução enquanto investigador, constituindo-se como verdadeiros mentores.
- Aos meus colegas do laboratório, em particular o André Pinheiro, o Diogo Azevedo, o
Ricardo Nunes, o Gonçalo Matos, o Jorge Santos, a Daniela Pedrosa, o Pedro Neves e a Ana
Margarida Maia, pelo ambiente de trabalho maravilhoso que constroem diariamente.
- Aos meus colegas de curso, em especial à Nilza Rocha, ao Luís Rodrigues e ao Gilberto
Vilela, por sempre acreditarem em mim desde a minha entrada na universidade.
- À minha família, em particular à avó ‘Rosa’, fonte de sabedoria ancestral que serviu
de sustentáculo à minha manutenção e evolução enquanto ser.
- Um agradecimento não menos especial à minha ‘musa’ e aos meus amigos e colegas,
por terem sido o alicerce de todo o meu desenvolvimento, criando-me um ambiente propício
às tarefas de investigação, reflexão e redacção do trabalho que agora se materializa.
11. xi
ÍNDICE
Resumo.......................................................................................................................................... v
Abstract........................................................................................................................................vii
Agradecimentos ............................................................................................................................ix
Lista de figuras ............................................................................................................................xiii
Lista de tabelas.............................................................................................................................xv
Glossário, acrónimos e abreviaturas..........................................................................................xvii
Capítulo 1: Introdução................................................................................................................... 1
1.1 Enquadramento......................................................................................................... 2
1.2 Motivação e contribuições........................................................................................ 4
1.3 Objectivos.................................................................................................................. 4
1.4 Estrutura.................................................................................................................... 5
Capítulo 2: Trabalho Cooperativo Suportado por Computador.................................................... 7
2.1 Envolvente conceptual.............................................................................................. 8
2.2 Enquadramento histórico........................................................................................ 11
2.3 Etnografia e psicossociologia do trabalho e das organizações ............................... 16
2.4 Groupware............................................................................................................... 18
2.4.1 Requisitos............................................................................................................ 19
2.4.2 Factores de sucesso e fracasso ........................................................................... 21
2.4.3 Áreas de aplicação............................................................................................... 22
2.4.3.1 Colaboração móvel.............................................................................................. 23
2.4.3.2 Comércio colaborativo ........................................................................................ 26
2.4.3.3 Telemedicina ....................................................................................................... 29
2.4.3.4 Aprendizagem Colaborativa Suportada por Computador .................................. 31
2.4.3.5 Ambientes virtuais e videojogos colaborativos................................................... 35
Capítulo 3: Classificação de CSCW .............................................................................................. 39
3.1 Classificação de sistemas groupware...................................................................... 40
3.1.1 Matriz tempo-espaço.......................................................................................... 40
12. xii
3.1.2 Domínios de aplicação ........................................................................................ 42
3.1.3 Modelo 3C........................................................................................................... 47
3.1.4 Taxonomias híbridas ........................................................................................... 54
3.2 Modelos de classificação de trabalho cooperativo................................................. 61
Capítulo 4: Metodologia.............................................................................................................. 69
4.1 Cienciometria: Origem e aplicabilidade .................................................................. 70
4.2 Métricas de avaliação quantitativa......................................................................... 72
4.3 Método de investigação.......................................................................................... 74
4.3.1 Métodos de recolha e catalogação de bibliografia de referência....................... 75
4.3.2 Avaliação taxonómica de publicações científicas sobre groupware................... 80
Capítulo 5: Resultados................................................................................................................. 85
5.1 Estudos de análise bibliométrica na literatura de CSCW ........................................ 86
5.2 Bibliométricas transversais de investigação em CSCW........................................... 93
5.3 Classificação de publicações científicas de groupware......................................... 104
Capítulo 6: Conclusões e trabalho futuro ................................................................................. 111
Referências bibliográficas ......................................................................................................... 119
Apêndices.................................................................................................................................. 157
Apêndice 1: Compilação das propriedades taxonómicas de CSCW.......................................... 157
Apêndice 2: Lista de publicações com maior número de citações ........................................... 167
13. xiii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Cronologia de sistemas de suporte à colaboração ...................................................... 15
Figura 2. Estrutura de um sistema de actividade humana (Adaptado de Engeström, 1987) ..... 32
Figura 3. Relação entre teorias individuais e sociais de aprendizagem (Adaptado de Stahl, 2011)
..................................................................................................................................................... 34
Figura 4. Natureza geográfica em sistemas de CSCW (Rodden & Blair, 1991) ........................... 41
Figura 5. Classificação de acordo com as funções de suporte (Adaptado de Borghoff &
Schlichter, 2000).......................................................................................................................... 48
Figura 6. Modelo de colaboração em trevo (Adaptado de Elmarzouqi et al., 2007).................. 50
Figura 7. Modelo para avaliar a percepção da actividade (Adaptado de Neale et al., 2004)..... 51
Figura 8. Diagrama cíclico do Modelo 3C (Adaptado de Fuks et al., 2005)................................. 52
Figura 9. Roda de ferramentas colaborativas (Adaptado de Weiseth et al., 2006).................... 57
Figura 10. Redes de comunicação (Adaptado de Shaw, 1971)................................................... 62
Figura 11. Circunflexo das tarefas de grupo (Adaptado de McGrath, 1984) .............................. 63
Figura 12. Quadro de pessoas/artefactos (Adaptado de Dix, 1994)........................................... 64
Figura 13. Modelo dinâmico de interacção em grupo (Adaptado de Andriessen, 2002)........... 65
Figura 14. Modelo teórico de formação da percepção da situação (Adaptado de Bolstad et al.,
2005) ........................................................................................................................................... 66
Figura 15. Diagrama lógico da metodologia de investigação ..................................................... 84
Figura 16. Variação da percentagem média de investigadores de CSCW em redes de co-autoria
(Horn et al., 2004) ....................................................................................................................... 87
Figura 17. Distribuição dos locais de publicação de trabalhos citados em CSCW (2000-2002)
(Adaptado de Horn et al., 2004).................................................................................................. 88
Figura 18. Evolução dos tipos de investigação (Adaptado de Wainer & Barsottini, 2007)......... 89
Figura 19. Rede de referências no campo de CSCL em 2003 (Adaptado de Kienle & Wessner,
2006) ........................................................................................................................................... 90
Figura 20. Estatísticas da conferência CHI (Adaptado de Henry et al., 2007)............................. 91
Figura 21. Tópicos de investigação da conferência CRIWG (Adaptado de Antunes & Pino, 2010)
..................................................................................................................................................... 93
Figura 22. Variações na média de citações do Google Scholar................................................... 96
14. xiv
Figura 23. Análise global aos dados comparáveis nos três índices de citação ........................... 98
Figura 24. Locais de publicação de autores de referência em CSCW (2000-2010)................... 100
Figura 25. Resultados embrionários da análise aos tópicos globais de CSCW (1945-2010)..... 101
Figura 26. Análise bianual dos atributos funcionais de groupware.......................................... 105
Figura 27. Características funcionais de groupware por conferência....................................... 108
Figura 28. Análise bianual das tipologias de groupware........................................................... 109
Figura 29. Tipologias de groupware por conferência ............................................................... 110
15. xv
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Comparação de CVE orientados à aprendizagem (Adaptado de Rajaei & Aldhalaan,
2011) ........................................................................................................................................... 38
Tabela 2. Matriz tempo-espaço para a classificação de groupware (Adaptado de Johansen,
1988) ........................................................................................................................................... 40
Tabela 3. Categorização do espaço de interacção segundo os domínios de aplicação (Adaptado
de Ellis, 2000) .............................................................................................................................. 43
Tabela 4. Ferramentas colaborativas e respectivas funcionalidades (Adaptado de Bafoutsou &
Mentzas, 2002)............................................................................................................................ 45
Tabela 5. Esquema de classificação para tecnologias de suporte à colaboração (Mittleman et
al., 2008)...................................................................................................................................... 47
Tabela 6. Características de colaboração para partilha de conteúdo em redes sociais (Oliveira &
Gerosa, 2011).............................................................................................................................. 53
Tabela 7. Taxonomia de colaboração (Adaptado de Bolstad & Endsley, 2003).......................... 56
Tabela 8. Classificação não-exclusiva (Adaptada de Penichet et al., 2007)................................ 58
Tabela 9. Classificação das referências taxonómicas de groupware (Adaptado de Bafoutsou &
Mentzas, 2002)............................................................................................................................ 60
Tabela 10. Modelo hierárquico de colaboração (Adaptado de Okada, 2007)............................ 67
Tabela 11. Conferências e revistas seleccionadas....................................................................... 75
Tabela 12. Campos de dados do modelo de catalogação de artigos.......................................... 79
Tabela 13. Esquema de comparação para sistemas de groupware (Adaptado de Mittleman et
al., 2008)...................................................................................................................................... 80
Tabela 14. Método de classificação de publicações científicas .................................................. 83
Tabela 15. Comparação da presença de CSCW segundo a organização do trabalho (Adaptado
de Grudin, 1994) ......................................................................................................................... 86
Tabela 16. Organização dos indicadores ‘bibliométricos’ obtidos com o processo de
catalogação ................................................................................................................................. 94
Tabela 17. Tópicos usados para a classificação de artigos entre 1945-2010 (Adaptado de
Greenberg, 1991) ...................................................................................................................... 102
17. xvii
GLOSSÁRIO, ACRÓNIMOS E ABREVIATURAS
ABC – Activity-Based Computing
ACCM – Augmented Continuum of Collaboration Model
AI – Artificial Intelligence
AR – Augmented Reality
ATM – Asynchronous Transfer Mode
B2B – Business-to-Business
BPM – Business Process Management
BPML – Business Process Modeling Language
CAD – Computer-Aided Design
CAM – Computer-Aided Manufacturing
C-Commerce – Collaborative Commerce
CMC – Computer-Mediated Communication
CRM – Customer Relationship Management
CSCL – Computer-Supported Collaborative Learning
CSCW – Computer Supported Cooperative Work
CVEs – Collaborative Virtual Environments
CVGE – Collaborative Virtual Geographic Environment
DIS – Distributed Interactive Simulation
E-Business – Electronic Business
ebXML – Electronic Business XML
E-Commerce – Electronic Commerce
EIP – Enterprise Information Portals
E-mail – Electronic Mail
EMR – Electronic Medical Record
ENIAC – Electronic Numerical Integrator and Calculator
ERP – Enterprise Resource Planning
GDSS – Group Decision Support Systems
18. xviii
HCI – Human-Computer Interaction
HLA – High Level Arquitecture
JCR – Journal Citation Reports
LDA – Linear Discriminant Analysis
MMOGs – Massively Multiplayer Online Games
MUDs – Multi-User Dungeons
OA – Office Automation
P2P – Peer-to-Peer
PDAs – Personal Digital Assistants
PLC – Product Lyfecycle Collaboration
PLM – Product Lifecycle Management
PoP – Publish or Perish
RPC – Remote Procedure Call
SCI – Science Citation Index
SI – Sistemas de Informação
SIDES – Shared Interfaces to Develop Effective Social Skills
SMS – Short Message Service
SNA – Social Network Analysis
TIC – Tecnologias da Informação e Comunicação
TOUCH – Telehealth Outreach for Unified Community Health)
WFM – Workflow Management
WIF – Web Impact Factor – WIF
Workflow – Fluxo de trabalho
WoS – Web of Science
WWW – World Wide Web
WYSIWIS – What You See Is What I See
XML – Extensible Markup Language
19. 1
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO
“Coming together is a beginning. Keeping together is progress. Working
together is success.”
Henry Ford
Neste capítulo de génese introdutória, faz-se um enquadramento lógico do problema e
das motivações que conduziram à definição concreta do estudo proposto. São ainda definidos
os objectivos parciais que se pretendem alcançar com o trabalho de investigação e apresenta-
se a estrutura da dissertação, referindo sumariamente os assuntos que são abordados em cada
um dos capítulos seguintes.
20. 2
1.1 ENQUADRAMENTO
Com o advento do novo milénio, sucedeu-se uma efervescente mutação paradigmática
na aplicação de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), fomentando a criação de uma
sociedade centrada na informação, com base num conjunto de relações interpessoais (Paredes
& Martins, 2011), e regenerando a capacidade de trabalhar remotamente através da redução
das barreiras temporais, espaciais e de interacção social. Neste contexto, a tecnologia adquiriu
um papel estratégico como suporte aos processos de ‘trabalho cooperativo’, suscitando uma
simbiose eficaz entre humanos e máquinas com funções distintas mas fortemente interligadas
(Gruber, 2008). Os avanços tecnológicos que se concretizaram no domínio da colaboração com
suporte informático, designadamente o correio electrónico (e-mail) como ferramenta de apoio
à coordenação de tarefas, o uso de mundos virtuais para a realização de reuniões, formações
específicas e simulação de actividades com elevados níveis de exigência, sistemas de workflow
dinâmicos, mensagens instantâneas (instant messaging), videoconferência, audioconferência e
espaços multi-utilizador para a edição e partilha de documentos em tempo real, introduziram
inúmeras possibilidades ao campo do ‘teletrabalho’. No entanto, estes progressos acarretam
também imensos desafios no que diz respeito às múltiplas necessidades dos utilizadores para
aumentar a transparência, ‘co-presença’, privacidade e produtividade laboral em contextos de
natureza operacional, numa manifesta tentativa de cooperar activamente de forma ‘ubíqua’. O
conceito de Computação Ubíqua é subentendido na forma de “submersão” dos computadores
‘embutidos’ no mundo real, com o intuito de auxiliar o ser humano na utilização de tecnologia
de uma forma ‘inconsciente’. Com a colocação dos dispositivos computacionais num plano
secundário, “a virtualidade embebida no espaço físico permitiu reverter as forças centrípetas
afectantes que os computadores pessoais convencionais inseriram dentro da vida e do espaço
de trabalho” (Weiser, 1991). Na senda evolutiva deste paradigma, Dey e Abowd (2000) fizeram
um enquadramento conceptual ao ‘contexto’ e definiram-no como “qualquer informação que
possa ser usada para caracterizar uma entidade” e melhorar, desta forma, a interacção entre o
utilizador e uma aplicação, reportando-se tipicamente “à localização, à identidade e ao estado
de pessoas, grupos e objectos físicos e computacionais”. Por sua vez, Dourish (2004) afirmou
que “o contexto não é a informação per si, mas as propriedades que a constituem”, suscitando
a criação de sistemas ‘cientes do contexto’ (context-aware) que permitam “extrair, interpretar
e usar a informação de contexto” e adaptar a sua funcionalidade a situações específicas (Rohn,
2003), trazendo um conjunto de desafios e oportunidades para o desenvolvimento de sistemas
colaborativos mais robustos (Kulkarni & Tripathi, 2010).
O paradigma actual dos sistemas de apoio à cooperação amplia a metáfora do espaço
de trabalho auxiliado por dispositivos informáticos e abre novos caminhos à forma como as TIC
podem apoiar as várias dinâmicas processuais de um grupo em constante interacção, tornando
crucial a manutenção de uma ‘percepção do contexto de trabalho’ para que a cooperação seja
bem sucedida (Bardram & Hansen, 2010). A componente de ‘percepção do espaço de trabalho’
concentra-se no conhecimento da interacção de outras pessoas com um ambiente operacional
partilhado, num esforço conjunto, tornando-se uma funcionalidade útil para uma grande parte
das actividades de colaboração. Esta característica permite coordenar acções, gerir junções de
forma estratégica, manter a comunicação objectiva e ininterrupta sobre uma tarefa, antecipar
as acções dos outros elementos do grupo e encontrar oportunidades para alcançar um elevado
grau de entreajuda tendo como base um ‘entendimento mútuo’ (Gutwin & Greenberg, 2002).
21. 3
O Trabalho Cooperativo Suportado por Computador (Computer Supported Cooperative
Work – CSCW, na terminologia anglo-saxónica) emergiu como um campo científico de carácter
multidisciplinar, centrado nas possibilidades e nos efeitos do suporte tecnológico a grupos de
trabalho envolvidos em tarefas e/ou objectivos comuns (Bowers & Benford, 1991). Conforme
argumentou Ackerman (2000), uma grande parte dos avanços alcançados em CSCW durante a
década de 1990 centrou-se em pressupostos como a actividade humana ser altamente flexível,
contextualizada e variável, suscitando a necessidade de criação de ‘entidades’ computacionais
ajustáveis a esta envolvente, nomeadamente ao nível da transferência de informação, funções
e políticas. Com os estudos realizados, tornou-se evidente a existência de uma lacuna inerente
entre os ‘requisitos sociais’ e os ‘mecanismos técnicos’ implementados, um fenómeno que tem
originado preocupações da parte dos investigadores de CSCW ao tentarem colmatar a ‘rigidez’
dos sistemas colaborativos em termos de fundamentação lógica e apoio à actividade social. Os
‘mecanismos sociais’ apresentam uma forma de complementar as aplicações ao possibilitarem
controlar, regular e estimular comportamentos (Sproull & Kiesler, 1991). Neste sentido, tem-se
mantido activa uma procura por novas formas de gerir problemas e compromissos resultantes
de conflitos observados em ambientes de trabalho em grupo e da coordenação das actividades
dos participantes (Malone & Crowston, 1994; Schmidt & Simone, 1996). As visões precedentes
que defendiam uma natureza intelectual, mecanicista e metódica das actividades laborais têm
sido questionadas, na medida em que as interacções passaram a ocorrer com maior frequência
e em níveis de complexidade mais elevados, o que acarreta sérios desafios para a resolução de
problemas relacionados com o suporte ao ‘trabalho de articulação’ (Schmidt, 2010).
A implementação de sistemas colaborativos em ambientes organizacionais requer uma
adaptação estruturada, contínua e flexível, sedimentada na ‘co-evolução’ e propulsionada pela
tendência dos utilizadores para moldar o sistema às suas necessidades específicas (Orlikowski,
1992). Esta situação pode originar vários conflitos e mobilizar sinergias para uma análise sobre
os impactos e as variações verificáveis no processo de negociação de um grupo de trabalho nas
suas configurações naturais. A psicologia social aplicada ao campo de CSCW (Finholt & Teasley,
1998; Kraut, 2003; Beenen et al., 2004) fundamenta-se na análise do comportamento humano
em grupo com o objectivo de atingir uma compreensão sistemática das transformações ‘sócio-
comportamentais’ que caracterizam o segmento da Interacção Humano-Computador (Human-
Computer Interaction – HCI). Segundo Sinha et al. (2010), a HCI pode ser entendida como “uma
disciplina afecta ao desenvolvimento, avaliação e implementação de sistemas computacionais
interactivos para utilização humana e ao estudo dos principais fenómenos que os rodeiam” e a
sua origem remonta a 1946, com a introdução do primeiro computador electrónico de grande
escala, denominado por Electronic Numerical Integrator and Calculator (ENIAC).
A ‘co-construção de conhecimento’ (Clases & Wehner, 2002), compreendida como um
modo específico de cooperação expansiva no ciberespaço, estabelece-se na redefinição mútua
de funções, objectivos de trabalho e padrões de interacção. Neste contexto, as ‘comunidades
virtuais’ (Rheingold, 1993) surgem como um espaço onde as pessoas podem interagir entre si,
construir relações fechadas e executar actividades (Paredes & Martins, 2011), com o objectivo
de alcançar o ‘capital social’ e aumentar a eficácia laboral. Em virtude do seu compromisso em
construir aplicações que suportem a estrutura interpessoal, o CSCW situou a tecnologia numa
envolvente composta por actividades funcionais, através de uma análise rigorosa das práticas
reais de trabalho (Schmidt, 2010), criando novas directrizes para um alinhamento estratégico.
22. 4
1.2 MOTIVAÇÃO E CONTRIBUIÇÕES
Segundo Schmidt (2009), o CSCW nunca conseguiu estabelecer-se como um campo de
investigação bem delimitado, encontrando-se num estado avançado de ‘fragmentação’. Neste
sentido, torna-se essencial visualizar a evolução da área ao longo da sua existência, recorrendo
a métodos de avaliação ‘bibliométrica’ para determinar os factores de impacto da comunidade
de investigação científica em CSCW e os seus principais tópicos de interesse. A motivação para
a realização deste trabalho de investigação baseia-se na premissa de que existe uma manifesta
necessidade de analisar a produção científica deste campo devido à escassez de conhecimento
sobre estudos recentes que contemplem uma amostra com o nível de granularidade desejado.
O estudo do impacto científico das publicações de CSCW é complementado com a classificação
de sistemas colaborativos abordados no conjunto específico de artigos científicos catalogados,
possibilitando a avaliação das transformações mais relevantes. Com o intuito de compreender
os dados considerados, esta dissertação expõe as variações em formatos simétricos, utilizando
uma metodologia uniforme no tratamento e subsequente apresentação dos dados. Contudo,
os processos de pesquisa e de análise dos artigos catalogados levantaram uma necessidade de
construir um modelo para a classificação de publicações dirigidas aos fundamentos teóricos do
CSCW, acrescentando a dimensão tecnológica. As características deste modelo de classificação
que se pretende criar futuramente são apresentadas de forma genérica no terceiro capítulo da
dissertação, sendo extraídas da literatura de CSCW e respeitando uma estrutura ‘ortogonal’. O
contributo principal deste estudo foca-se na decomposição de uma década caracterizada pelas
introduções de diferentes ferramentas colaborativas, promovendo uma comparação funcional
aos seus atributos técnicos, articulada numa visão global e prospectiva, exposta no formato de
hipótese sobre o crescimento, organização e impacto do campo de CSCW.
1.3 OBJECTIVOS
A caracterização do estado da arte de um campo científico de natureza interdisciplinar
acarreta imensos desafios de investigação. De forma a contextualizar o crescimento verificado
na área de CSCW, pretende-se desenvolver um estudo que avalie a sua perspectiva histórica,
defina o estado actual e analise possíveis tendências futuras. O trabalho a realizar em contexto
de dissertação transita por um processo de catalogação e ‘revisão sistemática’ de literatura de
referência, levantamento de taxonomias centradas na classificação de tecnologias de suporte à
colaboração e consequente justificação da necessidade de uma taxonomia compreensiva, bem
como o cruzamento de dados estatísticos e reflexão sob perspectivas distintas. Os ‘metadados’
obtidos no âmbito deste estudo funcionarão como uma das componentes integrantes da base
de dados criada para organizar o conjunto de publicações catalogadas e classificadas, podendo
ser facilmente actualizados e analisados. Neste sentido, pretende-se enfatizar o status quo em
CSCW, colocando alguns dos seus factos mais marcantes num referencial compreensivo.
A concretização do objectivo primordial desta dissertação passa pelo estabelecimento
de objectivos parcelares que se concretizarão em várias fases do seu desenvolvimento global,
delimitando uma sequência de ‘desideratos’ cruciais para atingir resultados reais. Apresenta-se
assim, em seguida, a lista sintetizada de objectivos a concretizar no âmbito desta dissertação:
Elaborar um estudo sobre o estado da arte de CSCW, onde se apresentem os
factos históricos que marcaram a evolução do campo, a sua perspectiva actual
e as formas de convergência que apresenta para o futuro.
23. 5
Fazer a análise transversal ao conteúdo de alguns dos artigos que representam
o maior número de citações no campo em estudo.
Processo de recolha, catalogação e análise de artigos publicados em revistas e
conferências internacionais de reconhecido mérito científico na área.
Aplicação de métodos de avaliação ‘bibliométrica’ ao universo catalogado.
Criar uma árvore de dependências para definir as áreas específicas e as áreas
transversais que constituem o campo de CSCW.
Identificação de taxonomias para a classificação de artigos relativos a CSCW, e
justificação da necessidade de um modelo formal composto por ‘propriedades’
abordadas separadamente na literatura.
Classificação de artigos relativos a tecnologias de suporte a grupos envolvidos
em tarefas colaborativas segundo uma taxonomia pré-definida.
Consolidar a análise estatística dos dados obtidos no processo de classificação,
de forma a contextualizar a evolução dos sistemas colaborativos ao longo dos
últimos anos.
Análise dos resultados obtidos e definição de linhas de trabalho futuro.
1.4 ESTRUTURA
A estrutura da dissertação encontra-se dividida em seis capítulos independentes mas
fortemente interligados, respeitando um encadeamento lógico e sequencial. A par da presente
secção introdutória, a dissertação encontra-se organizada da seguinte forma:
Capítulo 2
Trabalho Cooperativo Suportado por Computador
Estudo dos fundamentos do CSCW, auxiliado pelo enquadramento conceptual
relativo às temáticas que o caracterizam transversalmente. Abordagem sucinta
aos domínios da etnografia, psicologia e sociologia em contexto de trabalho de
grupo com suporte informático, clarificando as suas características primaciais.
Descrição detalhada das ferramentas de suporte à colaboração, delimitando a
sua envolvente conceptual, os requisitos de maior relevância para a utilização
destes sistemas e os factores de adopção e rejeição mencionados na literatura,
bem como algumas das suas áreas de aplicação.
Capítulo 3
Classificação de CSCW
Descrição de taxonomias abordadas na literatura com o objectivo de classificar
os sistemas colaborativos e as suas dinâmicas de trabalho em grupo. É exposta
uma fracção significativa da produção científica neste domínio, com correlação
entre os atributos que caracterizam as principais correntes taxonómicas. Neste
contexto, são apresentadas as ‘propriedades’ de forma agregada com o intuito
de traçar uma linha de investigação baseada na criação de um modelo híbrido.
Capítulo 4
Metodologia
Apresentação dos métodos de análise ‘cienciométrica’ existentes na literatura,
definindo esta envolvente e inserindo-a no contexto em estudo. Descrição dos
processos de recolha, catalogação e análise de dados ‘bibliométricos’ relativos
24. 6
a artigos de CSCW. Exposição dos métodos utilizados na avaliação dos sistemas
colaborativos e fundamentação da amostra considerada no estudo.
Capítulo 5
Resultados
Validação dos resultados conseguidos com a análise ‘bibliométrica’ numa visão
hipotética sobre as transformações e tendências que o campo apresenta para
o futuro. Análise profunda às possibilidades de convergência em CSCW, no que
se refere às funcionalidades mais evidentes dos sistemas colaborativos, sendo
complementada por um estudo aos tipos de sistemas mais estudados entre os
anos 2003 e 2010 em conferências e revistas específicas. Determinação de um
conjunto de publicações científicas onde um grupo pré-definido de autores de
CSCW publicou na última década. Lista de artigos sobre CSCW com um número
significativo de citações nos índices de indexação contemplados. Os conjuntos
de ‘metadados’ são agrupados e apresentados de forma sucinta para facilitar a
leitura e tornar os resultados mais perceptíveis.
Capítulo 6
Conclusões e trabalho futuro
Sinopse dos conteúdos com maior relevância no trabalho de caracterização do
estado da arte de CSCW, suscitando uma avaliação crítica aos dados obtidos e
apresentados com tratamento estatístico, fundamentando evidências relativas
ao processo de extracção de informação. Averiguação do cumprimento eficaz
dos objectivos propostos inicialmente, indicando linhas de investigação futura
com base nos desafios encontrados com o desenvolvimento desta dissertação.
25. 7
CAPÍTULO 2: TRABALHO COOPERATIVO SUPORTADO POR COMPUTADOR
“Society does not consist of individuals, but expresses the sum of the interrelations
within which these individuals stand.”
Karl Marx
Esta secção apresenta um enquadramento conceptual do campo de CSCW e descreve-
o como uma área científica multidisciplinar alavancada por uma comunidade de investigadores
de HCI com interesses específicos no estudo do impacto social da tecnologia, enquadrando-se
em domínios como a antropologia, a informática e a psicologia. Neste sentido, são referidas as
definições introduzidas na literatura de CSCW para explicar os conceitos genéricos, é feita uma
abordagem à etnografia e à corrente psicossociológica do trabalho cooperativo como métricas
de análise usadas para determinar os factores que influenciam a utilização efectiva de sistemas
colaborativos e explica-se, pormenorizadamente, o domínio tecnológico circunscrito ao CSCW.
Os factores de sucesso e fracasso, os paradigmas, os requisitos formais e as áreas de aplicação,
em que é possível identificar segmentos de utilização destes sistemas, são também abordados
neste capítulo com o objectivo de apresentar as principais linhas de trabalho desta área.
26. 8
2.1 ENVOLVENTE CONCEPTUAL
A investigação em CSCW assume um papel ‘instrumental’ na redução da complexidade
de coordenação relativa às actividades cooperativas intercedidas por ferramentas informáticas
(Schmidt & Simone, 1996), suscitando o interesse pela criação de unidades estruturais flexíveis
e de fácil integração que orientem a execução de tarefas através de mecanismos de interacção
social adaptados à imprevisibilidade do mundo real (Holt, 1985, p. 281). Na distinção analítica
‘recursiva’ enfatizada por Schmidt e Simone (1996), “o trabalho cooperativo é constituído pela
interdependência de múltiplos actores a interagir através da alteração do estado de um campo
comum de trabalho”, onde o seu carácter distribuído depende de factores como a ‘repartição’
de actividades no tempo e espaço, o número de participantes em disposições de cooperação, a
complexidade estrutural constituída pela área de trabalho (interacções e heterogeneidade), o
nível de especialização dos participantes e a variedade de ‘heurísticas’ envolvidas, exigindo um
‘trabalho de articulação’ efectivo para unir os esforços cooperativos nas actividades realizadas
de forma distribuída através de ‘artefactos’ específicos. Neste domínio, podem ser englobados
os ‘mecanismos de coordenação’ como construções resultantes da relação entre um protocolo
coordenativo (um conjunto integrado de procedimentos e convenções que fomentam a junção
de actividades interdependentes) e um artefacto (onde o protocolo é materializado), podendo
ser concebido como um dispositivo de software especializado que interage com uma aplicação
para apoiar o ‘trabalho de articulação’ representado por estruturas de dados e funcionalidades
concretas, numa base ‘semântica’ acessível a todas as entidades cooperantes. Historicamente,
o termo ‘trabalho cooperativo’ remonta à primeira metade do século XIX, subentendido como
a designação geral e neutra de trabalho com a envolvência de múltiplos actores (Ure, 1835). A
definição formal de Marx (1867) pressupõe a presença de “múltiplos indivíduos a trabalhar em
conjunto, de forma planeada, no mesmo processo de produção ou em processos de produção
diferentes mas interligados”.
Segundo Bannon e Schmidt (1989), o CSCW não pode ser entendido apenas em termos
de técnicas a serem aplicadas, mas sim como uma área de investigação centrada na concepção
de sistemas de suporte a grupos, tendo uma base conceptual em diversos campos das ciências
sociais e da computação. Nesta óptica, deve ser definido como um esforço de compreensão da
natureza holística e das características que constroem o trabalho cooperativo, com o objectivo
de criar tecnologias computacionais adequadas e aperfeiçoadas num esforço sistemático. Greif
(1988) define a envolvente de CSCW como “um campo de investigação identificável, centrado
no papel do computador no trabalho em grupo”. O termo ‘grupo’ é aqui enfatizado no sentido
de caracterizar qualquer tipo de interacção social, podendo ser entendido como um conjunto
de pessoas, relativamente fechado e fixo, que partilham objectivos comuns e estão envolvidas
num processo de comunicação ininterrupto. A interacção entre os membros pode alternar em
termos de frequência, desde o simples acto de informar ao caso da cooperação, onde coexiste
uma actividade partilhada para a qual é necessário interagir com grande frequência. O caso da
coordenação não envolve comunicação com o propósito de operar uma actividade simultânea,
mas sim o contacto com o objectivo de ‘coordenar’ actividades e informação (Ellis et al., 1991).
O trabalho em equipa designa um tipo específico de relação cooperativa expressa pela partilha
de responsabilidades entre os membros, por ser premeditada e por respeitar um planeamento
efectivo (Johansen, 1988). O conceito de ‘trabalho cooperativo’ define a envolvente composta
por múltiplas pessoas a trabalhar em conjunto, através de processos relacionados em termos
27. 9
de conteúdo, para produzir um determinado ‘produto’ ou ‘serviço’ (Bannon & Schmidt, 1989).
O núcleo do ‘trabalho cooperativo’ encontra-se na noção de ‘dependência mútua’ no processo
laboral, envolvendo actores a cooperar com o objectivo de terminar determinadas tarefas com
eficácia, e uma forte dependência sobre o tempo e a qualidade do trabalho realizado (Schmidt
& Bannon, 1992). A configuração de um ambiente de trabalho cooperativo considera o ‘campo
de trabalho’ como uma parte do universo que é controlada ou transformada pelo trabalho dos
actores, incluindo as suas interfaces (Schmidt, 1994), envolvendo igualmente a ‘organização do
trabalho cooperativo’ como uma combinação de actores interdependentes constituída por um
sistema de actividades de dependência mútua (Schmidt, 2002). Neste sentido, os participantes
num cenário desta natureza dependem da ‘informação contextual’ sobre o estado efectivo das
acções dos restantes elementos, possibilitando um acompanhamento mais rigoroso. McGrath
(1984) descreveu ‘grupos’ como instrumentos que influenciam ou modificam os seus membros
constituintes e fomentam a produção de trabalho, formando agregações sociais que envolvem
um nível comum de conhecimento e interacção. O trabalho cooperativo é ‘articulado’ de modo
a que os actores envolvidos sejam estimulados a partilhar, distribuir, coordenar ou interligar as
suas actividades individuais distribuídas (Schmidt & Bannon, 1992).
A ‘percepção’ (conceptualizada como ‘awareness’, na terminologia anglo-saxónica) foi
definida por Dourish e Bellotti (1992) como a compreensão da actividade dos outros membros
de um grupo num espaço partilhado, fornecendo um ‘contexto’ para a sua própria acção. Com
a ‘percepção mútua’ da presença e das actividades dos colaboradores num contexto específico
de trabalho em grupo, torna-se possível ‘articular’ as actividades cooperativas de acordo com a
sua situação actual, num fenómeno contínuo onde a prática pode ocorrer de forma implícita,
em ambientes de pequena dimensão, e onde se verifica a criação recursiva de conhecimento,
interesses e intenções por parte dos membros do grupo (Schmidt, 1994). Em CSCW, o conceito
de ‘foco’ foi introduzido como um domínio explícito da actividade de determinados indivíduos,
enquanto a nomenclatura ‘nimbo’ foi utilizada para descrever o comportamento, a disposição
ou a actividade que podem derivar da acção de um indivíduo, numa relação sem reciprocidade
em que o cruzamento dos dois conceitos resulta na ‘percepção’ (Rodden, 1996). A literatura de
CSCW apresenta diversas combinações com o termo ‘percepção’ para caracterizar os domínios
específicos em que se encontram os ‘sistemas colaborativos’, designadamente: ‘percepção de
colaboração’ (Lauwers & Lantz, 1990), ‘percepção passiva’ (Dourish & Bellotti, 1992, p. 107),
‘percepção genérica’, ‘conhecimento mútuo’ e ‘percepção periférica’ (Bly et al., 1993; Grudin,
2001), ‘percepção recíproca’ e ‘percepção mútua’ (Shmidt, 1994), ‘conhecimento da presença’
(Milewski & Smith, 2000), ‘percepção contextual’ (Izadi et al., 2002), ‘percepção da situação’ e
‘percepção do espaço de trabalho’ (Gutwin & Greenberg, 2002). Segundo Schmidt (2002), este
conjunto de abordagens conceptuais indica que o termo ‘percepção’ é ambíguo e necessita de
uma qualificação mais rigorosa para que não seja usado de forma contraditória. Na envolvente
aplicacional, a informação que possibilita a ‘percepção’ deve ser coerente em toda a rede, algo
que é reflectido pela exigência de sistemas síncronos ‘multi-utilizador’ onde a percepção visual
do espaço de trabalho é partilhada entre todos os participantes (What You See Is What I See –
WYSIWIS). Neste contexto, as ‘sobrecargas’ cognitivas devem ser evitadas, e os mecanismos de
notificação devem ser ‘accionados’ sem perturbar a atenção nas tarefas (Papadopoulos, 2006).
O conceito de ‘fluxo de trabalho’, conhecido por ‘workflow’, é definido por Xiao (2005)
como o conjunto de processos criados por uma organização para coordenar as actividades de
28. 10
múltiplos indivíduos e, desta forma, assegurar a conclusão do trabalho com êxito e aumentar a
eficiência dos colaboradores. Os ‘procedimentos’ funcionais padronizados podem influenciar o
carácter das actividades coordenadas, fomentando a incorporação de ‘tecnologia colaborativa’
dentro do fluxo de trabalho de uma organização. Segundo Ellis (1999), alguns tipos de trabalho
em contexto de escritório podem ser vistos como conjuntos interligados de tarefas recorrentes
estruturadas (processos ou procedimentos do ‘fluxo de trabalho’), onde as etapas elementares
de trabalho (actividades) devem ser realizadas por várias pessoas (actores) numa determinada
sequência. Os sistemas de ‘workflow’ têm a capacidade de definir, gerir e executar ‘processos’
através de software, cuja ordem de execução é dirigida por uma representação computacional
da lógica referente ao ‘fluxo de trabalho’.
Em termos genéricos, o CSCW aborda processos cooperativos unindo indivíduos, assim
como grupos homogéneos, para que possam trabalhar conjuntamente visando alcançar metas
comuns, independentemente da sua localização física e actuando numa configuração temporal
simultânea e/ou assíncrona. Segundo Bowers e Benford (1991), “na sua forma mais genérica, o
CSCW examina as possibilidades e os efeitos do suporte tecnológico a pessoas envolvidas em
processos de comunicação e trabalho colaborativo”. Neste sentido, salientam-se os dois pares
de caracteres que formam o acrónimo, ‘CW’ como fenómeno social que caracteriza o trabalho
em grupo e ‘CS’ na perspectiva dos sistemas colaborativos que fornecem o respectivo suporte,
conhecidos internacionalmente por groupware (Schmidt & Bannon, 1992; Ackerman, 2000). O
termo aparece inicialmente como a ‘combinação’ entre os processos de grupo intencionais e o
software para os suportar (Johnson-Lenz & Johnson-Lenz, 1981). Numa envolvente conceptual
mais estrita, pode subentender-se por groupware “o conjunto de sistemas computacionais que
suportam indivíduos envolvidos numa tarefa (ou objectivo) comum e fornecem uma interface
para um ambiente partilhado”, incluindo software, hardware e serviços de suporte a processos
de trabalho cooperativo (Ellis et al., 1991). De acordo com a interpretação feita ao trabalho de
Poltrock e Grudin (1999), as ferramentas de suporte à ‘coordenação’ podem ser caracterizadas
como groupware que permite aos seus utilizadores capturar e coordenar os processos internos
de uma organização, aumentar a qualidade e reduzir custos de coordenação (Sproull & Kiesler,
1991). Na definição de Ehrlich (1999), o conceito de groupware refere-se ao “desenvolvimento
de tecnologias que suportam o modo como as pessoas comunicam e colaboram para cumprir
metas de trabalho no contexto de processos pessoais, organizacionais e de gestão”. Neste tipo
de sistema, o trabalho pode ser tácito e amorfo, e as tarefas executadas podem apresentar um
carácter explícito, observável e concreto. Contudo, as organizações possuem uma necessidade
contínua de aumentar a produtividade devido à competitividade global, suscitando a execução
de tarefas mais complexas e ‘polimorfas’. Desta forma, são necessários sistemas ‘flexíveis’ para
enfrentar problemas como o aumento da sobrecarga administrativa, a pressão para aumentar
os índices de eficácia e eficiência, bem como a intenção dos colaboradores em diminuir a carga
de trabalho desnecessária que pode provocar diversas perturbações orgânicas e psíquicas.
O ‘suporte’ aos processos de trabalho cooperativo não se baseia apenas na ‘disposição
metódica’ de tecnologias e instrumentos de trabalho, consolida-se pela formação de sistemas
‘sociotécnicos’ eficazes (Trist & Bamforth, 1951). Enquanto os sistemas groupware abordam os
problemas técnicos para aperfeiçoar a interface homem-computador, fornecendo tecnologias
de suporte a múltiplos utilizadores, o CSCW deve articular o trabalho cooperativo, partilhar um
espaço de informação activo, e adaptar a tecnologia ao ‘contexto’ da organização (Bannon &
29. 11
Schmidt, 1989), focando o estudo dos efeitos ‘psicossociais’ observáveis com a implementação
de sistemas colaborativos, a criação de modelos de classificação que contemplem as dinâmicas
de trabalho em grupo e o suporte informático, e as ‘heurísticas’ que devem ser ponderadas na
fase de desenvolvimento de um sistema ‘multi-utilizador’. Wilson (1991) expressou a diferença
entre os dois conceitos, definindo o CSCW como um termo genérico que combina a percepção
do modo como as pessoas trabalham em grupo através de tecnologia de groupware suportada
por redes de dispositivos computacionais.
Extrapolando as dimensões supramencionadas para uma definição mais compreensiva,
caracteriza-se a génese do acrónimo CSCW como uma ‘fórmula’ terminológica para identificar
um conjunto de sistemas e processos de trabalho de natureza cooperativa, envolvendo grupos
de indivíduos situados no tempo e espaço, com objectivos comuns e um ‘contexto’ partilhado,
permitindo a percepção de todas as acções ocorridas num âmbito específico de trabalho. Num
espectro evolutivo, devemos ser capazes de ‘repensar’ o estado actual do campo em epígrafe,
na medida em que o acrónimo perdeu alguma relevância ao deixar de reflectir a actividade de
um grupo, devido a factores como o computador ter perdido o estatuto de exclusividade como
dispositivo digital de interesse global, a tecnologia não estar confinada unicamente a um papel
de suporte, o foco principal já não incidir em pequenos grupos para os quais a cooperação era
a regra, levando o mundo digital a englobar ataques de hackers, spam, preocupações com a
privacidade, conflitos e competição, bem como os sistemas capazes de apoiar as tarefas dos
grupos em contexto laboral terem ampliado significativamente o seu espaço de disseminação
e utilização para além do ambiente corporativo (Grudin, 2010; Correia et al., 2011).
2.2 ENQUADRAMENTO HISTÓRICO
Embora o termo ‘CSCW’ remonte originalmente a 1984, num seminário organizado por
Irene Greif e Paul Cashman (Grudin, 1994), a sua ideia central remete-nos à década de 1940
quando Vannevar Bush propôs o MEMEX, um sistema de memória e comunicação baseado em
hipertexto que usaria código binário, foto células e fotografia instantânea para que as pessoas
pudessem criar e seguir referências cruzadas de ‘microfilmes’ (Bush, 1945). Impulsionado pela
visão vanguardista do seu antecessor, Douglas Engelbart desenvolveu o AUGMENT/NLS SYSTEM,
o “primeiro” sistema colaborativo operacional baseado em hipertexto, introduzindo conceitos
que suportariam a origem de tecnologias como a ‘teleconferência’ e o groupware, tendo como
objectivo o ‘aumento do intelecto humano’ (Engelbart, 1963). Neste sentido, o surgimento do
sistema SABRE, em 1964, veio solucionar os problemas apresentados pelas companhias aéreas
americanas a nível do preenchimento de lugares em voos de avião e da impressão de cheques
de pagamento (Copeland et al., 1995), introduzindo uma “era” denominada por Automação de
Escritório (Office Automation – OA, na terminologia anglo-saxónica). Em 1969, é implementada
a ARPA NETWORK, que viria a transformar-se na grande catalisadora da Internet. Dois anos mais
tarde, é criado o sistema de e-mail pelas mãos de Ray Tomlinson, marcando uma revolução de
importância capital ao nível das comunicações (Berners-Lee, 1996). Schmidt (2009) considera a
introdução da Comunicação Mediada por Computador (Computer-Mediated Communication –
CMC) como um ‘movimento intelectual’ que se fundiu com a OA na constituição do CSCW. Este
conceito possui ‘raízes’ de orientação tecnológica com enfoque em aspectos de interacção que
se constituem como parte integrante na operacionalização do trabalho e estão profundamente
‘entrosados’ na configuração do ambiente físico, nos procedimentos laborais e nas convenções
organizacionais estabelecidas. A investigação realizada em CMC incidiu sobre os efeitos sociais
30. 12
da tecnologia de suporte à comunicação, passando pela criação de padrões com o objectivo de
reunir um conjunto de normas estabilizadas na década de 1980 para a comunicação por e-mail
e noutras ferramentas de groupware (ex.: X.25, X.400 e STML).
Com a introdução do campo de CSCW, surgiram inúmeros estudos centrados no modo
como o software colaborativo poderia articular os processos de trabalho, tornando obsoleta a
OA. Na prossecução desta mudança, construíram-se várias aplicações de groupware, nas quais
se salienta o COORDINATOR, para a troca de mensagens semi-estruturadas (Winograd & Flores,
1986), o LOTUS NOTES, como um sistema ‘cliente-servidor’ de suporte ao trabalho colaborativo
com vários módulos integrados, cuja base remonta ao sistema PLATO NOTES (Orlikowski, 1992),
o CALLISTO, como um sistema de ‘gestão de projectos’ orientado à construção de protótipos de
engenharia (Sathi et al., 1986), o CAVECAT, um ‘espaço multimédia’ com a integração de vídeo
e áudio para reuniões remotas (Mantei et al., 1991), o CHAOS, um sistema baseado no suporte
à conversação e melhoria da coordenação no âmbito das tarefas de escritório (De Cindio et al.,
1986), o COGNOTER, como uma ferramenta ‘multi-utilizador’ centrada na organização de ideias
(Foster & Stefik, 1986), o gIBIS, um sistema de hipertexto desenvolvido para suportar o debate
de políticas de forma exploratória (Conklin, 1988), o GROUPSKETCH, um ‘bloco de notas’ multi-
utilizador para pequenos grupos dispersos geograficamente (Greenberg & Bohnet, 1991), bem
como os sistemas MMCONF (Thomas et al., 1985), SIBYL (Lee, 1990), PROJECTNICK (Begeman et
al., 1986), e TEAMWORKSTATION (Ishii, 1990).
Ao ‘projectar’ a arquitectura da World Wide Web (WWW), Tim Berners-Lee visionou o
potencial cooperativo associado ao que o mesmo descreveu como “o universo de informação
acessível através de uma rede global” (Berner-Lee, 1996), marcando o fim de uma era marcada
por incompatibilidades entre os sistemas computacionais e fomentando uma explosão ao nível
da ‘acessibilidade’, caracterizada por enormes impactos sociais e económicos. A consolidação
deste fenómeno, na década de 1990, globalizou as comunicações e constituiu uma verdadeira
“auto-estrada” de conhecimento acessível à população, crescendo a partir de uma ferramenta
utilizada por uma pequena comunidade de especialistas, para uma ‘rede global’ composta por
milhões de utilizadores. Neste sentido, torna-se premente enfatizar o estudo das redes sociais
como espaços virtuais que trouxeram algumas possibilidades de suporte a inter-relações entre
um conjunto de pessoas que comunicam entre si, partilham as suas convicções e trabalham de
forma colaborativa. Numa perspectiva correlacionada, Rheingold (1993) define ‘comunidades
virtuais’ como sendo autênticas “agregações sociais que emergem a partir da Internet quando
um número suficiente de pessoas desenvolve discussões públicas por tempo indeterminado”,
possuindo sentimentos suficientes para estabelecer redes de relações pessoais no ciberespaço
e sendo caracterizadas por múltiplos grupos de pessoas com sistemas de valor, normas, regras,
bem como um sentido de identificação e associação comum. As ‘comunidades de prática’ são
caracterizadas pela envolvência ‘recíproca’ numa actividade através de uma estrutura informal
estabelecida por três componentes: objectivo, funcionamento e produção (Wenger, 1998). Na
sua generalidade, aplicam-se fortemente ao ambiente empresarial, num contexto de gestão de
conhecimento e aprendizagem.
A interacção social manteve-se originalmente no desenvolvimento dos computadores
baseados em terminais, e através da USENET e de diversos tipos de software na Internet. Entre
1995 a 1997, foram lançados o ICQ (“I Seek You”) e o AOL Instant Messenger, e a utilização de
31. 13
mensagens de texto via telefone (Short Message Service – SMS) teve uma ascensão acentuada,
dando origem a portais Web com este segmento de interacção incorporado. Durante o mesmo
período, surgiram redes sociais precursoras como a CLASSMATES.COM e SIXDEGREES.COM e, em
2001, foi lançada oficialmente a RYZE.COM, numa aproximação para a melhoria das redes de
negócios interpessoais. Segundo Boyd e Ellison (2007), as redes sociais são ‘serviços’ baseados
na Web, que posssibilitam às pessoas criar um perfil ‘público’ ou ‘semi-público’ dentro de um
sistema limitado, articular a lista de outros utilizadores com quem podem partilhar conexões, e
visualizar ou percorrer as suas listas de conexões.
A utilização das redes sociais por profissionais aumentou de uma forma exponencial, e
as questões de investigação confrontam-se com o modo e a facilidade de utilização, a variação
da produtividade, a adequação às ‘necessidades empresariais’ e as tendências de evolução. No
final de 2008, o MYSPACE e o FACEBOOK tinham ambos cerca de 60 milhões de utilizadores nos
Estados Unidos e representavam entre 6% e 8% do tempo gasto online. A utilização pessoal do
LINKEDIN quadruplicou para mais de 25 milhões de membros num ano e o e-mail continua a ter
uma missão estratégica no meio organizacional (Skeels & Grudin, 2009). Na ascendente espiral
de mudança social, prosperaram muitos sítios novos com uma componente de rede social (por
exemplo, TWITTER, FLICKR e YOUTUBE). No intervalo temporal entre os anos 2002 e 2004, foram
libertadas ou promovidas activamente redes como CYWORLD, FRIENDSTER e LIVE SPACES. A nível
‘funcional’, as acções de classificação, anotação, marcação de objectos, entre outras formas de
enriquecimento da informação, podem resultar na associação de ideias inovadoras, e definição
de ‘ontologias’ para a maximização mútua da ‘inteligência colectiva’ e valor acrescentado para
participantes em partilha dinâmica de informação. Os resultados alcançados com a cooperação
podem reflectir-se na criação de ‘conhecimento colectivo’, num processo comum para garantir
a auto-regulação da qualidade (Hoegg et al., 2006).
A análise quantitativa das ‘interacções sociais’ remonta ao princípio da década de 1920
(Freeman, 1996), sendo caracterizada pela interacção cruzada entre investigadores de diversas
disciplinas como sociologia, antropologia aplicada, psicologia social e estatística, com métricas
específicas. A Análise de Redes Sociais (Social Network Analysis – SNA) incide sobre as relações
entre as ‘entidades sociais’, a comunicação entre os membros de um grupo, ou as transacções
económicas entre organizações e países, suscitando o interesse no estudo de redes complexas
com uma estrutura dinâmica em termos de evolução no tempo (Boccaletti et al., 2006). Neste
contexto, podem abordar-se estudos ao nível da análise de ferramentas de ‘microblog’ como o
TWITTER em termos de relações interpessoais, frequência das contribuições e tipo de conteúdo
publicado (Zhao & Rosson, 2009), utilização de ‘blogs’ como uma actividade social (Nardi et al.,
2004), aplicação da psicologia social para compreender as motivações para a contribuição nas
comunidades online (Beenen et al., 2004), utilização de funcionalidades e vocabulários focados
na marcação ou ‘tagging’ social (Sen et al., 2006), uso do FACEBOOK por um grande número de
utilizadores num espaço de tempo reduzido (Lampe et al., 2006) ou a participação colaborativa
na WIKIPÉDIA (Bryant et al., 2005), num substrato colectivo onde o ‘crowdsourcing’ apresenta a
sua génese na prática de obter informações de um grupo de pessoas de grande dimensão que
contribui de forma conectada, e as ‘folksonomias’ são subentendidas como taxonomias criadas
pelos utilizadores para categorizar e recuperar conteúdo na Web como páginas, fotografias, e
ligações usando rótulos de marcação (Albors et al., 2008).
32. 14
A tendência de investigação em CSCW transitou das ‘infra-estruturas de rede’ originais
para os Ambientes Virtuais Colaborativos (Collaborative Virtual Environments – CVEs), desde a
simples ‘interface de texto’ às complexas ‘interfaces tridimensionais’, promovendo a evolução.
Nos últimos anos, foi possível verificar a utilização de mundos virtuais como o SECOND LIFE e o
WORLD OF WARCRAFT para fins de negócio, entretenimento, e simulação de tarefas complexas,
suscitando um interesse crescente por parte dos investigadores sobre o impacto que este tipo
de tecnologia pode ter sobre os padrões de comportamento no domínio do trabalho em grupo
através de CVEs (Kock, 2008). Numa perspectiva genérica, os mundos virtuais podem aplicar-se
a várias áreas, nomeadamente a ‘telemedicina’, a educação, o treino militar, o desporto, entre
outros segmentos de actuação onde a simulação pode ter uma importância estratégica.
As ‘superfícies tangíveis’, abrangidas num domínio anglo-saxónico que se designa por
surface computing/tabletop display (Scott et al., 2003), apresentam ‘tecnologias’ de interacção
interpessoal, permitem um acesso a objectos digitais físicos partilhados, bem como transições
entre actividades e pessoas, fomentando a ‘colaboração síncrona’ na resolução de problemas.
Na sua generalidade, têm sido estudadas diversas formas de melhorar a ‘acessibilidade’ destas
superfícies para invisuais (Kane et al., 2011), a execução de tarefas de forma colaborativa com
o intuito de aumentar a produtividade em domínios como a ‘pesquisa’ na WWW (Morris et al.,
2010), a análise visual colaborativa de documentos com grande complexidade (Isenberg et al.,
2010), o apoio a grupos de programadores de pequena dimensão em ‘reuniões co-localizadas’,
através de sistemas de interacção híbridos (por exemplo, o CODE SPACE) (Bragdon et al., 2011),
bem como o suporte a colaboradores num escritório, no processo de gestão das relações entre
o conteúdo digital e em papel (Everitt et al., 2008). No domínio educacional, encontram-se as
interfaces para promoção da participação equitativa dos alunos no trabalho em grupo (Morris
et al., 2006a), e ferramentas como o SIDES (Shared Interfaces to Develop Effective Social Skills),
“uma ferramenta concebida para ajudar os adolescentes com Síndrome de Asperger a praticar
as suas capacidades de trabalho em grupo usando um jogo de computador multi-utilizador que
funciona sobre a tecnologia tangível” (Piper et al., 2005). No controlo de acesso e coordenação
de múltiplas superfícies, foram abordadas várias políticas de coordenação (Morris et al., 2004),
e técnicas para partilha de documentos (Ringel et al., 2004). Ainda no domínio tecnológico das
superfícies tangíveis, foram abordadas questões como a anotação colectiva através do sistema
TEAMTAG (Morris et al., 2006b), as técnicas de ensino de utilizadores sobre gestos disponíveis
e as respectivas formas de execução através do sistema SHADOWGUIDES (Freeman et al., 2009),
bem como o estudo prático sobre o impacto que a dimensão de um grupo e de uma ‘superfície
tangível’ pode ter na interacção (Ryall et al., 2004).
A Figura 1 apresenta um referencial com a evolução dos aspectos técnicos relativos ao
campo de CSCW. A identificação dos elementos que caracterizam a linha temporal foi feita de
acordo com uma ‘bibliografia anotada’ composta por uma análise às ‘teorias’ e aos sistemas de
groupware introduzidos até à década de 1990 a nível científico (Greenberg, 1991). Este estudo
foi complementado por uma análise genérica a sistemas colaborativos que surgiram a partir do
desenvolvimento da WWW até à última década. Com a análise gráfica desta envolvente, torna-
se possível visualizar algumas das principais introduções tecnológicas que foram estudadas ao
nível científico com alguma incidência, uma vez que retrata os fundamentos da área de CSCW,
e foca um número diversificado de sistemas concebidos para suportar a partilha de informação
e a contribuição de diversos utilizadores de múltiplas formas.
34. 16
2.3 ETNOGRAFIA E PSICOSSOCIOLOGIA DO TRABALHO E DAS ORGANIZAÇÕES
A origem do termo ‘etnografia’ remonta à antropologia ocidental do século XIX, tendo-
se tornado posteriormente uma referência na integração da investigação empírica e teórica na
interpretação comparativa de uma cultura ou organização social. O ‘trabalho de campo’ requer
uma forte vivência com um grupo de pessoas durante extensos períodos de tempo, de forma a
documentar e interpretar o modo de vida dessa comunidade, as suas crenças e valores. Numa
abordagem paralela, os ‘estudos de caso’ despontaram a partir da investigação protagonizada
por sociólogos entre as décadas de 1920 e 1950 com base no estudo da vida social humana. Na
aproximação efectuada por Macdonald (2001), o termo ‘etnografia’ é utilizado para quantificar
o desenvolvimento e a reconfiguração do trabalho etnográfico na antropologia anglo-saxónica,
tendo os seus domínios de análise sido “ampliados” à psicologia humana e às componentes de
âmbito geográfico (Hammersley & Atkinson, 2007).
A etnografia tornou-se uma das principais abordagens usadas na comunidade de CSCW
para especificar a importância da concepção de sistemas computacionais na prática laboral. No
domínio organizacional, é fundamental ter em consideração diversas etapas para certificar que
os materiais etnográficos cobrem um espectro suficiente de tarefas situadas, bem como alguns
subconjuntos específicos, envolvendo uma adopção generalizada por parte dos seus membros.
A etnografia aplicada ao CSCW apresenta diversas vertentes de formulação, reportando-se ao
estudo de locais de trabalho com recurso à observação, programas analíticos ou teóricos onde
podem ser utilizados os dados etnográficos para fomentar a partilha de informação e as causas
perceptíveis para o facto de uma grande parcela dos etnógrafos nesta área terem uma agenda
tácita que se opõe à mudança tecnologicamente orientada (Harper, 2000). A discussão gerada
em torno desta envolvente aborda questões como a natureza das reportagens etnográficas, as
visões sociológicas de ‘organização’ (Jirotka et al., 1992), interacção em termos de conversação
(Luff et al., 1990) e negociação (Schmidt & Bannon, 1992), sendo necessária uma forma híbrida
de etnografia mais específica para o campo de CSCW. A etnografia marca uma transição entre
as abordagens quantitativas e as ciências sociais, e acarreta um compromisso que envolve um
longo período de tempo e um grau de imersão elevado no ambiente em estudo, com o intuito
de alcançar uma compreensão qualitativa do seu ‘modo de operação’ (Shapiro, 1994).
No extenso domínio da etnometodologia, Heath e Luff (1992) descreveram as práticas
e os procedimentos de trabalho colaborativo através dos quais se processa a comunicação e a
coordenação numa sala de controlo do metro de Londres, propulsionados por Suchman (1987)
que havia utilizado esta aproximação como base dos seus ‘planos’ e das suas ‘acções situadas’
e Garfinkel (1967) como uma das referências introdutórias neste campo. Conforme argumenta
Shapiro (1994), a complexa padronização da actividade social decorre das práticas dos próprios
membros, contrariamente à promulgação de determinado esquema interiorizado, suscitando a
prossecução activa da organização social das actividades por parte de todos os membros. Com
o estudo ao sistema de controlo do tráfego aéreo no Reino Unido (Hughes et al., 1992; Bentley
et al., 1992), foram abordados ‘métodos etnográficos’ para identificar a ‘organização social’ do
trabalho cooperativo e a utilização de ‘instrumentos’ para a sua realização. Neste contexto, foi
introduzido um conjunto de ‘metáforas’ para a representação electrónica das práticas manuais
e exploraram-se formas de interligar a etnografia na concepção de sistemas colaborativos.
35. 17
Na área de CSCW, a etnografia recaíu fortemente nas implicações de desenvolvimento,
onde os fundamentos da ‘psicologia cognitiva’ foram aplicados na modelação de requisitos. No
âmbito da sociologia, salienta-se a ‘teoria marxista do processo de trabalho’ sobre a percepção
da utilização dos sistemas computacionais e a evolução da ‘divisão do trabalho’. Num espectro
de possibilidades de avaliação para os sistemas colaborativos, argumentou-se que as formas e
as tecnologias referentes ao trabalho cooperativo, representam um suporte sistemático para a
exploração de diferentes aspectos etnográficos (por exemplo, a divisão global do trabalho). As
tecnologias podem ter uma natureza inerentemente democrática e ‘libertadora’, e os diversos
modos de trabalho estão a tornar-se cada vez menos opressivos e apelam à preponderância de
‘relações humanas’ colaborativas (Shapiro, 1994), exigindo um ‘alinhamento estratégico’ entre
as práticas que podem ser observadas num determinado ambiente de trabalho, e a concepção
metódica de ferramentas adequadas às funções que lhe estão intrinsecamente associadas.
No domínio metodológico, Hughes et al. (1997) abordaram uma ‘vertente’ etnográfica
que permite aos etnógrafos capturar os requisitos do sistema através de um estudo ‘sistémico’
do local de trabalho e de todas as actividades das pessoas envolvidas, englobando a percepção
laboral, os planos e procedimentos, a ‘coordenação distribuída’ na dimensão de ‘interesse pelo
trabalho de campo’, a representação dos utilizadores e do trabalho ao nível das ‘preocupações
do sistema’, e o suporte às acções, às tarefas e à ‘coordenação multi-utilizador’. O conceito de
‘meta-modelação’ (Farias et al., 2000), entendido pela “análise, construção e desenvolvimento
de estruturas, regras, constrangimentos, modelos e teorias aplicáveis para modelar uma classe
pré-definida de problemas”, pode ser aplicado na representação dos atributos de configuração
de ‘ambientes de trabalho’. Estas características podem ser capturadas com recurso a estudos
etnográficos focados na concepção de sistemas, baseando-se em pontos fortes e ‘intersecções’
comuns entre as teorias de ‘coordenação’, ‘actividade’, ‘acção/interacção’, ‘gestão de tarefas’,
e no ‘modelo de suporte às actividades objectivas’. Dourish (2006) identificou a importância do
trabalho etnográfico na perspectiva de apoio à compreensão e reflexão da prática tecnológica,
ao invés de influenciar unicamente intervenções específicas. Como consequência, este tipo de
abordagem não significa a simples documentação de práticas, mas a percepção da organização
das ‘actividades’ e dos ‘recursos’ usados na sua realização, num ambiente de trabalho sujeito a
transformações. Na perspectiva do ensino, a etnografia apresenta sérios desafios ao combinar
um conjunto de capacidades teóricas, analíticas, organizacionais e de observação em contexto
de aprendizagem colaborativa com recurso a ferramentas informáticas (Brown et al., 2007).
Na óptica de Bell et al. (2005), a etnografia em HCI pode ser caracterizada pelo foco de
atenção dos etnógrafos incidir na ‘cultura de consumo’ e nas ‘práticas culturais’, apresentando
bases literárias relativas ao contexto social de utilização da tecnologia e estimulando sugestões
inovadoras para a resolução de problemas. Neste sentido, as novas aproximações etnográficas
baseiam-se em estudos antropológicos, literários e culturais para fornecer múltiplas formas de
compreender as relações humanas e repensar as tecnologias como um conjunto de ‘artefactos
culturais’. No domínio da ‘reflexão crítica’, são identificados os pressupostos inconscientes em
HCI que podem resultar em impactos negativos, envolvendo utilizadores e programadores na
prática de concepção tecnológica socialmente responsável (Sengers et al., 2005). Na ‘estrutura
interpretativa crítica’, a investigação etnográfica focaliza-se na organização de encontros entre
culturas e funciona como base para a ‘análise interpretativa’, recorrendo à exploração cultural,
etnografia e desenvolvimento participativo, que partilham o reconhecimento do papel central
36. 18
desempenhado pelos intérpretes e se opõem às concepções comuns usadas em HCI (Crabtree
et al., 2009). A ‘etnografia colaborativa’, por seu lado, concentra-se na procura pelos requisitos
de trabalho em grupos inseridos em ambientes complexos, permitindo realizar a análise social
extensiva das actividades laborais (Silva et al., 2009), combinando as características das outras
abordagens etnográficas, e reformulando as funções básicas dos sistemas colaborativos.
A ‘etnografia virtual’, também definida pelos termos ‘netnografia’, ‘etnografia digital’ e
‘ciberetnografia’, pode ser entendida como um ‘método’ que se prende, em grande parte, com
o facto da informação retirada para análise se encontrar inteiramente em fontes provenientes
da Internet (Hine, 2000; Mann & Stewart, 2000; Markham, 2005). Este ‘método’ foi concebido
como resposta à necessidade de analisar as ‘comunidades virtuais’ baseadas em comunicações
electrónicas, complementando a ‘etnografia convencional’ com características específicas para
estudar a utilização de tecnologias sedimentadas no ciberespaço (Hine, 2000). Contudo, esta
‘abordagem etnográfica’ contém ainda algumas limitações ao nível do rigor metodológico que
é estabelecido para analisar as ‘práticas sociais’ em rede, englobando um conjunto muito vasto
de variáveis que deve ser devidamente especificado.
2.4 GROUPWARE
Segundo Ellis e Wainer (1999), enquanto o CSCW se centra no estudo de novas formas
de trabalho em grupo e nas potencialidades de implementação de tecnologia para melhorar as
dinâmicas de interacção e colaboração, o groupware cinge-se à tecnologia para assistir grupos,
compreendendo sistemas assentes em computação e comunicação e suportando um ambiente
partilhado e os seus respectivos participantes. A aceleração do ritmo de mudança na economia
impõe uma necessidade de adaptação de processos por parte de grupos e organizações devido
a factores como a introdução de novas tecnologias, procura de novos clientes ou concorrência.
Grudin (1994) abordou a investigação realizada em torno de Sistemas de Suporte à Tomada de
Decisão em Grupo (Group Decision Support Systems – GDSS), estabelecendo as suas raízes pela
década de 1970 no campo dos Sistemas de Informação (SI). Estas ferramentas oferecem vários
recursos que possibilitam a resolução de conflitos através da negociação de propostas entre os
participantes, numa envolvência mútua de dinâmicas de grupo, brainstorming, infra-estruturas
de comunicação e avaliação de ideias e onde o advento da WWW deu origem a sistemas inter-
organizacionais de suporte à decisão com funções de discussão e votação (Shim et al., 2002).
Chang et al. (2001) propuseram um esquema composto por alterações paradigmáticas
no domínio de investigação em sistemas cooperativos, sustentando a transição das aplicações
‘monoutilizador’ assíncronas para uma dimensão síncrona ‘multi-utilizador’, e perspectivando
o desenvolvimento de ferramentas baseadas nos conceitos de ‘ubiquidade’ e de ‘comunidade’
como uma tendência emergente. Ao nível do ‘controlo’, verificou-se uma evolução desde a era
em que não existiam mecanismos de ‘percepção’ para situar o trabalho executado, transitando
para a inserção de aplicações ‘customizáveis’ pelos utilizadores. O ‘fluxo de trabalho’ tornou-se
distribuído e multidimensional, evoluindo a partir das abordagens centralizadas e lineares que
foram implementadas anteriormente. As ‘sessões’ passaram a ser mais dinâmicas/flexíveis, em
oposição à natureza rígida e pré-definida. Contudo, os domínios supra-referidos, juntamente
com o ‘controlo de acesso’, apresentam perspectivas tendenciais para um suporte centrado na
‘procura’. No que diz respeito ao ‘ambiente’, é expectável a transição de um contexto múltiplo
para a dimensão ‘ubíqua’. O conceito de ‘comunidade’ passou de um estado isolado para uma
37. 19
envolvente cooperativa e evolucionária, a ‘coordenação’ tem uma granularidade fina e baseia-
se em serviços com uma composição de ‘computação dinâmica’, e as ‘condutas sociais’ focam-
se na federação de comunidades com diferentes culturas e valores. A inserção de padrões para
a definição de ‘políticas’ de utilização e ‘normas de regulação’ torna-se fundamental neste tipo
de aplicações. A ‘realidade virtual’ é amplamente estudada ao nível da imersão de utilizadores,
em tempo real, num espaço composto por diversos objectos interactivos. No que diz respeito à
‘forma de armazenamento’, esta tende a basear-se em conceitos de ‘auto-presença’, migração
e remoção de arquivos de forma automática. A ‘formalização’ da arquitectura tende a basear-
se no contexto em que o trabalho é executado, com a implementação de uma ‘linguagem livre’
ao invés de centrada no conhecimento, e uma ‘interface’ que pode passar de middleware para
componentware. Os sistemas centrados na partilha do espaço de trabalho tiveram algum êxito
no suporte a diferentes formas de cooperação (Divitini et al., 2004). Os campos de CSCW e HCI
analisaram os benefícios atingidos com a implementação de vídeo nos ambientes de trabalho,
representando uma grande evolução no sentido de presença (Dourish & Bly, 1992).
Segundo Xue et al. (2008), os sistemas de groupware ‘distribuídos’ envolvem um grupo
de utilizadores em localizações distintas que cooperam entre si através da manipulação directa
dos objectos partilhados. Hindmarsh et al. (2005) salientaram a preocupação crescente dentro
do CSCW, com a concepção de novos sistemas para suportar a colaboração num conjunto mais
diversificado de domínios, implicando não apenas o movimento para “fora da sala de controlo”
(Hughes et al., 1994), mas mais longe dos locais de trabalho tradicionais e em ‘arenas’ como os
domínios públicos e as configurações internas e adicionais consideradas importantes para que
envolvem ‘mobilidade’ (Grinter et al., 2002; Crabtree et al., 2003). Nesta visão, a ‘reorientação’
da agenda de CSCW levanta desafios ao nível de estudo e desenvolvimento, que sustentam a
procura de novos resultados na esfera do trabalho social e técnico de CSCW. Grudin e Poltrock
(1997) defenderam que, devido a uma grande parte das aplicações incorporar funcionalidades
que suportam comunicação, coordenação, e partilha, o termo ‘groupware’ já não denota tanta
importância como uma simples nomenclatura, mas é fundamental sob a óptica de envolvência
dos desafios de natureza técnica e social que caracterizam o ‘processo de trabalho’. Orlikowski
(1992) investigou a introdução de software colaborativo numa organização para compreender
as transformações visíveis nas práticas de trabalho e a interacção social através de tecnologia.
Os resultados sugeriram que a implementação e subsequente utilização de tecnologia de apoio
a grupos de trabalho são influenciadas pela cultura e estrutura organizacional, e pelos modelos
mentais das pessoas, comportando a adaptação por parte de todos os membros às constantes
transformações ‘sociotécnicas’.
2.4.1 REQUISITOS
As ferramentas de suporte ao trabalho cooperativo requerem um número mínimo de
utilizadores, uma massa crítica, envolvendo um estudo prévio dos seus benefícios de utilização
e dos custos que acarretam (Grudin, 1994; Dix, 1997), bem como um conjunto de requisitos de
colaboração constituído por: i) tamanho do grupo (número total de utilizadores que o sistema
suporta), ii) controlo de versões, iii) mapeamento, iv) partilha de ficheiros, e v) repositório com
a informação necessária ao desenvolvimento das tarefas. Marca (1991) identificou um número
diversificado de requisitos para software colaborativo com base em entrevistas, salientando-se
o fornecimento de mecanismos de coordenação e co-autoria, a autenticação dos participantes
distribuídos geograficamente, a gestão das actividades e a integração entre aplicações.
38. 20
Beck e Bellotti (1993) identificaram que, até ao início da década de 1990, grande parte
dos sistemas colaborativos era ‘implementada’ sem ter em consideração as diversas formas de
colaborar entre os membros de um grupo, uma questão que merece alguma reflexão da parte
dos investigadores para apurar a continuidade desta afirmação em termos científicos. Segundo
Grudin (1994), é difícil definir os requisitos de um sistema groupware, na medida em que este
processo exige uma extensa consideração de ‘aspectos funcionais’ e características dos grupos
que não apresentam um carácter intuitivo, permitindo aos programadores adaptarem diversas
funcionalidades ao contexto específico em que se desenrola o ‘fluxo laboral’, e onde a relação
custo/benefício depende de factores como as preferências, as funções, a experiência anterior,
e as tarefas dos utilizadores. Na perspectiva de utilização do sistema, alguns estudos focaram a
sobrecarga imposta sobre os membros do grupo pela introdução de groupware (Rogers, 1994),
e as elevadas despesas que surgem de forma imprevista (Bowers, 1994), como alguns factores
a considerar na implementação de um sistema. Prinz et al. (1998) defenderam a capacidade de
compreender melhor os processos de trabalho, a nível dos requisitos de desenvolvimento e da
utilização do sistema, com o objectivo de identificar experiências e estabelecer directrizes para
a prática futura com o devido suporte computacional.
Com a aprendizagem da ‘dinâmica de funcionamento’ de um sistema groupware, deve
ser feita uma reflexão sobre as necessidades dos membros para desenvolver os procedimentos
adequados, com o objectivo de coordenar o trabalho efectuado e utilizar as funcionalidades do
sistema (Malone & Crowston, 1990). Neste sentido, é importante considerar as normas sociais,
os comportamentos e as atitudes que se movem gradualmente em direcção à ‘congruência’ no
grupo (Newcomb, 1968), onde a tecnologia e os processos do grupo não devem ser encarados
separadamente (Prinz et al., 1998). A natureza ‘pervasiva’ dos dispositivos computacionais na
sociedade tornou a ‘informação digital’ uma condição fundamental durante a colaboração. Por
sua vez, Gutwin e Greenberg (2000) identificaram ‘mecanismos de colaboração’ para o uso por
parte de pessoas com o objectivo de organizar as suas actividades e interacções colaborativas,
aumentando a ‘percepção do espaço de trabalho’ (Gutwin et al., 1996) através da transmissão
e compilação de informações sobre o tipo de acções executadas, os responsáveis, e o instante
temporal em que ocorrem as actividades.
As convenções para estabelecer padrões e regular acordos de cooperação recorrentes,
podem ser introduzidas para melhorar a interacção de um grupo (Mark, 2002). Para Schmidt e
Bannon (1992), a cooperação é caracterizada por ‘interdependências mútuas’ e as convenções
podem regular a comunicação (Lenke et al., 1995), o ‘afastamento interpessoal’ (Hall, 1966), a
utilização de ‘artefactos’ e o controlo dos processos socais com efeitos negativos (Mark, 2002).
A ‘engenharia de requisitos’ é uma parte fundamental do processo de concepção de software,
envolvendo programadores e consumidores ‘em rede’ para que possam construir socialmente
os seus requisitos e atingir elevados níveis de eficiência através da colaboração, num processo
de ‘negociação’ permanente (Herlea & Greenberg, 1998). O ‘design participativo’ é entendido
como um método complementar para a etnografia no qual os utilizadores e outros públicos se
envolvem no desenvolvimento a partir de um estágio muito inicial, acompanhando o processo
de concepção integralmente. Esta abordagem suscita igualmente um conjunto diversificado de
possibilidades para aumentar gradualmente a eficácia na fase de criação dos sistemas de apoio
à colaboração. Complementarmente, caracteriza uma forma de trabalho centrada no aumento
da qualidade através da adequação contínua do sistema à envolvente do consumidor.
39. 21
De forma genérica, podem identificar-se alguns requisitos que devem ser considerados
no desenvolvimento de groupware a partir de estudos pré-existentes, nomeadamente:
O sistema não deve ser restritivo. Na cooperação, as funções dos participantes
são frequentemente informais e dinâmicas (Strauss, 1993), onde a envolvência
dos utilizadores na ‘coordenação’ de esforços (controlo de acesso das funções
de comunicação e colaboração) não deve ser limitativa. No entanto, quando os
papéis explícitos são atribuídos, um sistema de groupware deve ser capaz de
aprovar ‘políticas de coordenação’ para reforçar o acesso controlado a opções
mais delicadas (Beck & Bellotti, 1993).
Suporte a múltiplas tarefas, métodos de trabalho, escalabilidade de um grupo,
métodos de interacção, ajustamento ao ‘contexto’ do grupo, e manutenção de
características comportamentais. Em complemento, os sistemas colaborativos
estão “constrangidos” à tecnologia disponível, às dificuldades na concepção de
‘interfaces sociais’, bem como aos requisitos de cada ambiente de trabalho, o
que exige um elevado grau de ‘interoperabilidade’ para eliminar as ‘restrições’
de utilização e fomenta a criação de novas ‘interfaces sociais’ que estabeleçam
padrões únicos de interacção (Mandviwalla & Olfman, 1994).
Suporte à ‘interacção interpessoal’ no núcleo da colaboração, transição entre a
actividade laboral em grupo e de forma individual, ‘acesso’, possível utilização
de ‘objectos’ físicos e digitais partilhados, disposição flexível dos utilizadores, e
‘interacção simultânea’ no espaço de trabalho partilhado (Scott et al., 2003).
Comunicação ‘ponto a ponto’ (peer-to-peer, na nomenclatura anglo-saxónica)
entre objectos (como artefactos, actividades e funções), situados num ou mais
espaços de trabalho (Babar, 2010).
Fornecimento de mecanismos não funcionais e extra-funcionais de ‘percepção’
das tarefas executadas por parte dos utilizadores (Teruel et al., 2011).
2.4.2 FACTORES DE SUCESSO E FRACASSO
Numa envolvente de elementos sociais, políticos, económicos e motivacionais, Grudin
(1994) identificou alguns dos principais ‘desafios’ encarados por programadores de groupware,
designadamente: i) a disparidade acentuada entre trabalho e benefícios, na medida em que as
aplicações colaborativas exigem um trabalho adicional de indivíduos que não compreendem as
vantagens directas de utilização, ii) a existência de uma ‘massa crítica’, porque o groupware só
tem sucesso se uma grande parte dos membros do grupo o usar de forma activa, iii) a ‘ruptura’
com os processos sociais, devido ao facto deste tipo de sistemas poder representar ameaças às
estruturas políticas existentes ou infringir ‘convenções sociais’, iv) o tratamento de excepções,
na medida em que os sistemas colaborativos podem não acomodar a grande imprevisibilidade
que caracteriza as actividades de trabalho em grupo, v) a acessibilidade discreta mas eficaz, no
que respeita ao uso das características que suportam os processos de grupo, vi) as dificuldades
de avaliação dos obstáculos intransponíveis à aprendizagem do funcionamento de groupware,
vii) o processo de adopção, envolvendo uma introdução cuidadosa da tecnologia no espaço de
trabalho, e viii) a falha de intuição nas aplicações ‘multi-utilizador’, podendo resultar num fluxo
de trabalho inadequado, numa gestão feita de forma incorrecta, e num processo de concepção
susceptível a erros que podem marcar o fracasso de um projecto.
40. 22
Por sua vez, Grudin e Palen (1995) apontaram para uma melhoria da ‘infra-estrutura’
(rede, software, suporte e comportamento), facilidade de acesso da ‘interface gráfica’, pressão
generalizada e expansão da funcionalidade da aplicação como as principais razões encontradas
para explicar uma adopção bem sucedida de aplicações de suporte ao trabalho em equipa. Na
sua generalidade, o sucesso dos sistemas colaborativos requer um balanço entre o esforço e os
benefícios para todos os utilizadores, sem disparidade, que deve ser comunicado e conglobar a
necessidade de construção de interfaces fáceis de utilizar e com capacidades de integração.
Menold (2009) defende que a aplicação bem sucedida das TIC para suportar o trabalho
cooperativo numa organização depende não só das características da tecnologia, mas também
das características de uma organização, como a estrutura ou cultura organizacional, estratégia,
gestão, as proprieadades do utilizador e a sua motivação, bem como os ‘factores cognitivos’. A
característica fundamental para o sucesso destas aplicações passa pela partilha de informação
entre os membros de um grupo, trazendo maior coesão aos procedimentos existentes (Koch &
Gross, 2006). Segundo Noël e Robert (2004), a maioria das pessoas usa processadores de texto
de carácter pessoal para escrever documentos de forma colaborativa, comunicando-se através
de e-mail, reuniões cara-a-cara e telefone. Em geral, alguns sistemas de suporte à colaboração
não foram bem sucedidos e, na visão destes autores, as razões prendem-se com o facto de que
a sua adopção é dispendiosa para utilizadores mais experientes por envolver um novo ciclo de
aprendizagem (Whitehead & Goland, 1999), a sua instalação e utilização pode suscitar diversos
problemas (Grasso et al., 1997), e o software deve ser instalado de forma correcta em todos os
locais de trabalho, exigindo um nível funcional aceitável para todos os utilizadores, levando-os
a reconhecer a sua importância na execução de tarefas (Noël e Robert, 2004). Para se alcançar
o êxito com a implementação de groupware num determinado ambiente de trabalho, torna-se
fundamental a utilização obrigatória por parte de todos os utilizadores (Grudin & Palen, 1995).
A interoperabilidade entre diferentes plataformas torna-se igualmente uma condição essencial
a nível operacional, fomentando a criação de ferramentas com vários módulos integrados, que
sejam personalizáveis mediante as necessidades dos utilizadores.
2.4.3 ÁREAS DE APLICAÇÃO
As ferramentas de groupware podem aplicar-se a diversos domínios científicos, onde a
mobilidade, as transacções comerciais na WWW, o suporte colaborativo a equipas médicas, as
dinâmicas processuais e as tecnologias que apoiam o paradigma de aprendizagem actual, bem
como a aplicação de mundos virtuais e a construção de videojogos de carácter cooperativo, se
assumem como ‘rotas de investigação’ na área de CSCW. Com os desenvolvimentos verificados
nestes segmentos, o software colaborativo e as conjunturas sociais que suporta, podem trazer
maior eficiência laboral, com a sua utilização a ser uma condição sine qua non para que muitas
organizações consigam expandir os seus negócios, motivar uma participação de toda a ‘infra-
estrutura social’ que sustenta a produção e transmissão de conhecimento, e reduzir o risco de
erro em situações complexas. A análise das subáreas de CSCW apresentadas nesta dissertação
pode ser feita respeitando a seguinte sequência de leitura: i) enquadramento histórico, com as
origens e as possíveis motivações de investigação em cada segmento, ii) domínios de actuação,
onde são apresentadas as características específicas para cada domínio, as limitações técnicas,
e os efeitos associados às implementações tecnológicas, e iii) perspectiva actual das subáreas e
possíveis tendências de convergência futura, onde se apresentam alguns estudos que têm sido
efectuados pela comunidade científica nos últimos anos.