2. MEMÓRIA
• A memória é definida como a faculdade de reter as idéias, as
impressões e os conhecimentos adquiridos. Remete também à
lembrança, à reminiscência.
• A memória é divida em três partes: aquisição, retenção e evocação.
1- Aquisição: as recordações não são réplicas de acontecimentos
percebidos, por serem limitados pela natureza do fato (tempo de
observação, luminosidade, atenção aos detalhes, existência de
violência, caráter estressante);
2- Retenção: a informação é menos completa e exata, relacionando-
se com o transcurso do tempo entre a observação do episódio e a
recordação posterior, bem como com as informações obtidas após o
fato. Nesses termos, dois fatores são de suma importância à
deterioração da lembrança:
3. a) intervalo de retenção a diminuição da precisão da
lembrança se deve ao esquecimento normal, o qual é mais rápido
após a aquisição, tornando-se mais lento em seguida;
b) informação após o ocorrido a informação pode ser
distorcida em função de comentários de outras pessoas que
vivenciaram a mesma situação ou pessoas que não vivenciaram a
situação, mas expressam sua opinião sobre o fato.
4. • O processo de fixação definitiva da memória é chamado de
consolidação. Esta, por sua vez, requer tempo e submete-se a
numerosos agentes externos;
• Por isso, destaca-se a possibilidade de modificação da memória no
intervalo entre a aquisição e a consolidação, devido à influência de
fatores externos ao processo;
• O que nos leva a crer que no intervalo de tempo entre o
acontecimento e o relato, seja ele extrajudicial ou judicial, pode
também ocorrer alteração da lembrança da testemunha ou da
própria vítima.
• O tempo e as informações pós-evento abrem uma brecha à
formação de falsas memórias, na medida em que acabam por
confundir a testemunha, a qual não distingue mais o evento original
daquilo que foi incorporado depois.
5. 3- Evocação: essa fase é produzida a recuperação da informação
armazenada na memória, o que pode ocorrer tanto com sucesso, ou
com fracasso, devido a uma aquisição defeituosa ou ao próprio
processo de lembrança em si.
• Muitos dos fracassos que ocorrem na memória se devem à
incapacidade de a pessoa recordar a informação, por uma
aquisição defeituosa ou pela tarefa de lembrança em si mesmo.
Entretanto, por não recordar algum aspecto do ocorrido não significa
que este não esteja armazenado na memória, mas sim que, no
momento, este não esteja acessível.
6. • No que concerne ao conteúdo, há dois grandes grupos de
memórias, isto é, o da memória de procedimentos (ou
procedural) e o da memória declarativa.
1- Memória procedural: é aquela que tem capacidade ou
habitualidade motora ou sensorial. Assim, conecta-se ao
aprendizado de atividades como digitar um texto, andar de
bicicleta, nadar... e pode ser subdividida em implícita e explícita:
• Implícita: é aquela adquirida de maneira mais ou menos
automática, sem que o sujeito perceba claramente a
aprendizagem, tal como ocorre com a língua materna;
• Explícita: é a que se constitui em memória adquirida com plena
intervenção da consciência.
7. 2- Memória declarativa: que se refere à memória de fatos, eventos,
de pessoas, de faces, de conceitos e de idéias. Aqui também há uma
subdivisão em episódicas e semânticas:
a) Episódicas ou autobiográficas: relativas a eventos dos quais
assistimos ou participamos;
b) Semânticas: relacionadas aos conhecimentos gerais.
8. HISTÓRICO DAS FALSAS MEMÓRIAS
• Conceito de FM foi sendo construído no final do séc. XIX e início do
séc. XX na Europa, quando surgiu em Paris o caso de um homem de
34 anos, chamado Louis, com lembranças de acontecimentos que
não haviam ocorrido.
• Theodule Ribot (1881) utilizou pela primeira vez o termo “falsas
lembranças”.
• Os primeiros estudos específicos sobre as FM foram conduzidos por
Alfred Binet (1900), na França, e versavam sobre a
sugestionabilidade da memória, ou seja, a incorporação e a
recordação de informações falsas, que o indivíduo lembra como
verdadeiras.
9. FALSAS MEMÓRIAS
• As FM podem ocorrer devido a:
- Distorção endógena ou
- Falsa informação oferecida pelo ambiente externo.
• Assim, as FM passaram a ser classificadas conforme a origem do
processo de falsificação da memória, sendo denominadas FM
espontâneas (ou autossugeridas) e FM sugeridas.
10. • Loftus, iniciou seus estudos sobre as FM em 1970. Esses
apresentaram resultados impressionantes e até mesmo
assustadores, pois concluíram que a lembrança pode ser altamente
manipulada a partir de informações errôneas sobre acontecimentos
nunca vividos e, também, pode haver modificação dos fatos
vivenciados.
• Loftus realizou centenas de experiências, com mais de vinte mil
pessoas, a fim de constatar como a exposição à informações não
verdadeiras distorce a memória.
• Averiguou, através de trabalho de campo, ser a desinformação
capaz de modificar as lembranças de maneira previsível e, até
mesmo, espetacular, nas situações mais cotidianas: “a informação
errônea pode se imiscuir em nossas lembranças quando
falamos com outras pessoas, quando somos interrogados de
maneira evocativa, ou quando uma reportagem nos mostra um
evento que nós próprios vivemos”.
11. • Sobre a implantação da falsa recordação, Loftus relata que a
lembrança dos acontecimentos fictícios da infância possuem maior
aceitação quando a fonte da informação foi esquecida e quando o
participante se familiariza com os detalhes.
• Nesse sentido, destaca: “o fato de imaginar um acontecimento
o torna mais familiar, e a familiaridade é então falsamente
associada às lembranças da infância. Uma confusão como
essa – esquecer a fonte de uma informação – pode ser típica
de experiências infantis”. Ainda conforme Loftus, “as falsas
lembranças são elaboradas pela combinação de lembranças
verdadeiras e de sugestões vindas de outras pessoas”.
12. • Segundo Loftus, “Saul Kassin, Universidade Williams, estudou as
reações de indivíduos falsamente acusados de terem danificado
um computador apertando uma tecla errada. Os participantes,
inocentes no início, negavam a afirmação, mas depois de terem
sido confrontados com um cúmplice do experimentador que
afirmava tê-los visto fazer isso, vários deles assinaram
confissões e terminaram por descrever, de maneira detalhada, o
ato que não haviam cometido”.
• A assunção de culpa, inclusive a confissão por escrito, fornece bem
a dimensão do problema, isto é, de quanto as pessoas podem ser
induzidas a relatar acontecimentos não experimentados.
13. • Para o processo, a possibilidade de uma testemunha ou vítima
fornecer um relato não verdadeiro, a partir da falsificação da
recordação, compromete, integralmente, a confiabilidade do
testemunho, gerando um imenso prejuízo ao imputado.
• Não se pode afastar a tendência daquele que toma os depoimentos
em explorar unicamente a hipótese acusatória, induzindo os
questionamentos, fruto do modelo inquisitorial, bem como do
despreparo dos profissionais para lidar com essa situação.
• Mais preocupante é que, na maioria das vezes, diante da ausência
de outros elementos probatórios, o julgador emite um juízo com
base unicamente na palavra do(a) ofendido(a). Não se trata de por
em descrédito essa prova, mas em demonstrar que, dependendo
do contexto, ela não é suficiente para afastar a presunção de
inocência.
14. • A ausência de resquícios materiais, os quais poderiam desmentir a
falsificação da lembrança, gera a problemática de desvendar o que
de fato ocorreu, diante da “contaminação” do contexto no qual a
prova foi produzida.
• Esse poderá ocorrer pelo induzimento realizado por parentes, por
amigos, por policiais ou julgadores, ao formularem os seus
questionamentos, bem como pela mídia, devido à notoriedade do
caso.
• Igualmente, há uma estreita relação entre a memória e a emoção,
considerando que os maiores reguladores da aquisição, da
formação e da evocação das memórias são justamente as emoções
e os estados de ânimo, somados, é claro, aos níveis da
consciência.
15. • Com efeito, “nas experiências que deixam memórias, aos olhos que
vêem somam-se o cérebro que compara e o coração que bate
acelerado. No momento de evocar, muitas vezes, é o coração
quem pede ao cérebro que lembre, e, muitas vezes, a lembrança
acelera o coração”.
• “Além disso, quando estamos alerta e com bom ânimo, facilmente
apreendemos ou evocamos algo; o mesmo não se pode dizer
quando se está estressado, cansado ou deprimido, pois nesses
estados de ânimo é mais difícil a apreensão de qualquer coisa”.
• As questões relacionadas à habilidade de crianças e adultos em
relatar fidedignamente os fatos vividos, tanto como vítimas de
abuso físico ou sexual, quanto como testemunhas oculares de
contravenções em geral, têm influenciado e incentivado os estudos
científicos na área das falsas memórias.
16. • As falsas memórias referem-se ao fato de lembrarmos de eventos
que na realidade não ocorreram. Informações são armazenadas na
memória e posteriormente recordadas como se tivessem sido
verdadeiramente vivenciadas;
• Algumas falsas memórias são geradas espontaneamente, como
resultado do processo normal de compreensão, ou seja, fruto de
processos de distorções endógenas. Estas são as chamadas falsas
memórias espontâneas ou autosugeridas.
• Ex.: você pode lembrar vividamente que ouviu sua colega dizer que
a prova de biologia seria no dia dois de maio. Na verdade, as
exatas palavras da colega teriam sido “Vamos ter uma prova de
biologia logo após um feriado”. É claro que o dia dois de maio é
logo após um feriado, porém existe uma grande diferença entre
lembrar-se exatamente do que você ouviu da colega e relatar uma
inferência consistente com o que você ouviu.
17. • Esta distinção é fundamental, especialmente em situações onde se
espera que a pessoa relate suas experiências de forma fidedigna e
não suas inferências ou entendimento sobre o que ocorreu, como
no caso de um testemunho num tribunal.
• Outro tipo de falsas memórias pode resultar de sugestão externa,
acidental ou deliberada, de uma informação falsa, a qual não fez
parte da experiência vivida pela pessoa, mas que de alguma forma
é compatível com a mesma como no procedimento de sugestão de
falsa informação.
• Assim, se a pessoa viu um carro que não parou numa placa de “dê
a preferência” e, posteriormente, lhe é sugerido que a placa de
trânsito era de “pare”, poderá lembrar do sinal de pare como tendo
sido realmente visto por ela.
18. • A pessoa passa a recordar de fatos como se tivessem sido
realmente vividos, quando, na verdade, estes fatos foram-lhe
sugeridos. As chamadas falsas memórias implantadas ou sugeridas
podem resultar deste tipo de sugestão externa.
• Já a memória literal seria a codificação das informações de forma
precisa, de modo que os detalhes são registrados e armazenados
de forma episódica, sendo, contudo, mais suscetível ao
esquecimento e à interferência, se comparada à memória de
essência.
• Cabe ressaltar que tanto as falsas memórias espontâneas quanto
as sugeridas são fenômenos são lembranças de base mnemônica,
lembranças, e não de base social, como uma mentira ou simulação
por pressão social.
19. TEORIAS PRESSUPOSTOS
TEÓRICOS
LIMITAÇÕES
Construtivista
• Há um único sistema de
memória;
• Memória é construída com
base no significado;
• FM são frutos do processo
de interpretação da
informação.
• Somente uma memória é
construída sobre a experiência;
• Informações literais são perdidas
no processo de interpretação da
informação.
Monitoramento
da Fonte
• FM são atribuições
errôneas da fonte da
informação lembrada por erro
de julgamento e não fruto de
uma distorção da memória.
• É uma teoria de julgamento e
tomada de decisão sobre a fonte
da memória recuperada;
• FM somente para informações
sobre a fonte.
Teoria do
Traço Difuso
• Modelo dos Múltiplos
Traços;
• Mais de um sistema de
memória;
• Memórias literal e de
essência armazenadas em
traços independentes e em
paralelo.
• Teoria mais complexa;
• Não tenta explicar os erros de
julgamento da fonte da fonte de
experiências diferentes.
20. ENTREVISTA COGNITIVA
• Etapas:
1. Construção do Rapport;
2. Recriação do contexto original;
3. Narrativa livre;
4. Questionamento;
5. Fechamento.
21. ETAPA OBJETIVOS
I. Construção do Rapport -Personalizar a entrevista;
-Construir um ambiente acolhedor;
-Discutir assuntos neutros;
-Explicar os objetivos da entrevista;
-Transferir o controle para o entrevistado.
II. Recriação do contexto original -Restabelecer mentalmente o contexto no qual a
situação ou crime ocorreu;
-Recriar o contexto ambiental, perceptual e afetivo.
III. Narrativa Livre -Obter relato livre da testemunha, sem interrupções.
IV. Questionamento -Realizar o questionamento compatível com o nível
de compreensão da testemunha;
-Priorizar o uso de perguntas abertas;
-Obter esclarecimentos e detalhamento do relato;
-Possibilitar múltiplas recuperações.
V. Fechamento -Realizar o fechamento da entrevista;
-Fornecer o resumo das informações obtidas;
-Discutir tópicos neutros;
-Estender a vida útil da entrevista.
22. - Principais aspectos na abordagem da
testemunha
• O entrevistador não estava lá – é a testemunha que detém todas as
informações;
• Liberdade da testemunha descrever o evento da sua maneira e no
seu ritmo;
• Instrução para descrever todos os detalhes;
• Instrução para não editar o relato;
• Direito e dever de dizer “não sei”;
• Direito e dever de dizer “não entendi”;
• Responsabilidade de corrigir o entrevistador.
23. - Exemplo de aplicação da técnica:
... Neste momento eu gostaria de te ajudar a lembrar tudo o que
conseguir sobre (referir o evento em questão). Você pode fechar os
olhos, se preferir. Tente voltar mentalmente ao exato momento em
que aconteceu essa situação (pausa). Você não precisa me dizer
nada ainda, apenas procure observar o local ao seu redor (pausa).
O que você consegue ver? (pausa) Que coisas consegue escutar?
(pausa) Que coisas passam pela sua cabeça? (pausa) Como você
está se sentindo? (pausa) Como está o clima nesse momento?
(pausa) Tem algum cheiro que você consiga sentir? (pausa)
Quando você achar que estiver pronto, pode contar tudo que
conseguir se lembrar sobre o que aconteceu, do jeito que achar
melhor.
24. - Tipos de perguntas:
Tipo de pergunta: Definição: Exemplo:
Abertas Permitem que a pessoa que está
respondendo dê mais informações.
“O que você viu quando entrou na
loja?”
Fechadas Propiciam que o entrevistado
responda apenas sim/não ou
escolha entre uma alternativa.
“Era manhã, tarde ou noite quando
o crime aconteceu?”
Perguntas múltiplas Várias questões colocadas
simultaneamente.
“Você viu o rosto do assaltante? Ele
foi agressivo? O que ele falou?”
Tendenciosas/Sugestivas Expressam implícita ou
explicitamente, a opinião do
entrevistador, conduzindo a
testemunha a uma determinada
resposta.
“Tendo em vista que o Borracha é
um bandido foragido e no momento
do fato estava nas imediações,
você não acha que ele possuía
algum envolvimento com o crime?”
Confirmatórias/inquisitivas Procuram confirmar aquilo que foi
dito ou uma hipótese levantada
pelo entrevistador.
“Então você está me dizendo que
viu aquele seu vizinho no local do
crime?” (quando a testemunha
falou que apenas que a pessoa do
local do crime lembrava o vizinho).
25. - Dez falhas mais comuns dos entrevistadores
forenses:
1. Não explicar o propósito da entrevista;
2. Não explicar as regras básicas da sistemática da entrevista;
3. Não estabelecer rapport;
4. Não solicitar relato livre;
5. Basear-se em perguntas fechadas e não fazer perguntas abertas;
6. Fazer perguntas sugestivas/confirmatórias;
7. Não acompanhar o que a testemunha recém disse;
8. Não permitir pausas;
9. Interromper a testemunha quando ela está falando;