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1
Journal of the Adventist Theological Society, 20/1-2 (2009):177-191.
Tradução: Yure Gramacho
Revisão da Tradução: Darcy Propodolski Pinto
Revisão de Língua Portuguesa: Everton Cardoso
Justificação pela Fé:
Uma Compreensão Adventista
Peter M. van Bemmelen
Seminário Teológico Adventista do Sétimo Dia
Universidade Andrews
Introdução
Os adventistas do sétimo dia acreditam que foram chamados a
proclamar o evangelho eterno a cada nação, tribo, língua e povo, no contexto
da tríplice mensagem angélica em Ap 14:6-12. Essas mensagens são o apelo
final de Deus à raça humana antes da Segunda Vinda de Jesus Cristo (ver Ap
14:14-20). A expressão “Evangelho Eterno,” que ocorre somente nesta
passagem no Novo Testamento, tem implicações importantes. Em primeiro
lugar, implica que o evangelho estava no plano de Deus desde a eternidade.
Este eterno propósito divino é enraizado no eterno amor de Deus como
registrado em Jr 31:3 e Jo 3:12. Em segundo lugar, significa a existência de
apenas um evangelho pelo qual os seres humanos caídos podem ser salvos, e
este é o evangelho de Jesus Cristo, como Paulo frequentemente se refere
(Rm 15:9; 1Co 9:12; etc). Em outras palavras, desde os dias de Adão e Eva
até o fim do mundo tem havido e sempre haverá apenas um evangelho, um
meio de salvação. Nas palavras do apóstolo: “pois pela graça sois salvos, por
meio da fé – e isso não vem de vós, é dom de Deus – não por obras, para que
ninguém se glorie” (Ef 2:8-9). Pedro, falando da salvação através de Jesus
Cristo perante os guias religiosos de Israel foi muito enfático: “Não há
salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome
dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (Atos 4:12).1
Os adventistas
sempre identificaram a si mesmos como os herdeiros das grandes verdades
restauradas e proclamadas pelos reformadores protestantes. Como registrado
no relatório final de outro diálogo bilateral: “Os adventistas têm um grande
apreço pela Reforma. Eles se veem como herdeiros de Lutero e de outros
reformadores, especialmente em sua fidelidade aos grandes princípios da
1
Salvo indicação contrária, os textos bíblicos deste artigo foram retirados da Nova Versão
Internacional.
2
Sola Scriptura, Sola Gratia, Sola Fide, Solo Christo”.2
Isso coloca os
adventistas em harmonia com a compreensão evangélica tradicional da
justificação pela fé e também com a tradição patrística, uma vez que, de
acordo com Thomas Oden, “os principais apelos dos reformadores por Sola
Scriptura, Sola Gratia e Sola Fide são encontrados abundantemente na
interpretação patrística das Escrituras”.3
Neste artigo pretendemos apresentar
a compreensão adventista da unidade do ensino da Escritura sobre a
justificação pela fé em Cristo somente, através da graça somente. Em
seguida, um suposto conflito entre alguns ensinos adventistas específicos, tal
como sua ênfase sobre a observância do Sábado e a compreensão protestante
tradicional da justificação pela fé serão considerados.
O Ensino Fundamental da Justificação pela Fé no Antigo Testamento
A unidade da Escritura não significa uniformidade. Esperar por
declarações teológicas muito explícitas no Antigo Testamento (AT) como
são encontrados nos escritos paulinos demonstra uma falta de apreciação
pela diversidade das revelações de Deus para, e no trato com seus
mensageiros inspirados. Todavia, o próprio Paulo recorre ao AT para
mostrar a unidade entre seu ensino sobre justificação pela fé ou justiça pela
fé com os de Moisés e dos Profetas. “Mas agora se manifestou uma justiça
que vem de Deus, independente da lei, da qual testemunham a Lei e os
Profetas” (Rm 3:21). É, portanto, essencial estudar cuidadosamente o que o
AT ensina sobre justiça e justificação. Obviamente, neste artigo podemos
lidar apenas com alguns dos aspectos mais pertinentes sobre o assunto.
O AT proclama a justiça de Deus em todo trato com Israel. No
cântico majestoso, que Moisés por ordem divina ensinou os israelitas a
cantarem, ele anunciou o nome do Senhor nestas palavras: “Ele é a Rocha, as
suas obras são perfeitas, e todos os seus caminhos são justos. É Deus fiel,
que não comete erros, justo e reto Ele é” (Dt 32:4). A justiça de Yahweh é
manifestada, de acordo com o pacto de bênçãos e maldições do capítulo 28
de Deuteronômio, em atos de juízo (ver por exemplo 2 Cr 12:1-6; Dn 9:3-14;
Ne 9:8) e em atos de salvação. Estes últimos são, por vezes, referidos como
os tsidqot Yahweh, podendo ser traduzido como as justiças ou os atos justos
do Senhor (ver Jz 5:10; 1Sm 12:6-7; Mq 6:5). É importante entender que no
AT a justiça de Deus é geralmente equivalente à salvação de Deus, como
pode ser observado no paralelismo hebraico (ver Is 51:6, 8).
2
Lutherans & Adventists in Conversation: Report and Papers Presented 1994-1998 (Silver
Spring, Maryland: General Conference of Seventh-day Adventists; Geneva, Switzerland: The Lutheran
World Federation, 2000), 8.
3
Thomas C. Oden, The Justification Reader (Grand Rapids, Michigan; Cambridge, United
Kingdom: William B. Eerdmans Publishing Co., 2002), 162.
3
Quando aborda a justiça humana, o AT nos apresenta um aparente
paradoxo. Existem insistentes e enfáticas declarações de que ninguém é
justo, todos pecaram. Davi pleiteia com Deus, “mas não leves o teu servo a
julgamento, pois ninguém é justo diante de ti” (Sl 143:2). Salomão
reconhece, em sua oração de dedicação do templo, que “não há ninguém que
não peque” (1 Cr 6:36). Ele repete esse pensamento em Eclesiastes 7:20:
“não há um homem justo sobre a Terra que faça o que é certo e nunca
peque”. Moisés por três vezes disse aos israelitas para não acharem que o
Senhor lhes tinha dado a terra de Canaã devido à sua justiça, ao contrário
disso afirmou: “vocês são um povo de dura cerviz” (Dt 9:4-6). O paradoxo é
que esses mesmos escritores e todo o AT fazem uma distinção entre duas
classes de seres humanos: “os justos” e “os ímpios”. Isto suscita a questão
crucial: “Como algum ser humano pode ser chamado de justo em face da
afirmação de que ninguém é justo e que todos pecaram?” A urgência dessa
questão é intensificada quando encontramos pessoas que são designadas
como justas ou irrepreensíveis, “amigo de Deus”, ou mesmo “altamente
estimado” (tais como Noé, Jó, Abraão e Daniel- ver Gn 7:1; Jó 1:1; Is 41:8;
Dn 9:23), como tendo cometido pecados ou confessado algum deles. É
evidente que a justiça dessas pessoas não é idêntica com a ausência de
pecado. Como então podem ser chamados de justos ou irrepreensíveis?
Edmund Clowney destaca quão crucial é essa questão: “Como pode um
homem ser justo para com Deus? Toda a história do AT gira em torno das
respostas divinas a esta pergunta” 4
.
A resposta clara e direta é que Yahweh, o Deus da Aliança, justifica
todo aquele que nEle acredita, confia em Suas promessas, reconhece seus
pecados, se lançam sobre a misericórdia de Deus e arrependem-se de suas
injustiças. De Abraão nós lemos, “Abraão creu no Senhor, e isso lhe foi
creditado como justiça” (Gn 15:6). Jó, de quem o Senhor testificou que era
“irrepreensível e honesto, um homem que teme a Deus e se aparta do mal”,
foi arguido pelo mesmo Senhor, “Você vai por em dúvida a minha Justiça?
Vai condenar-me para justificar-se?” (Jó 40:8). Perante o Deus santo e justo
Jó reconheceu sua pecaminosidade e respondeu “Meus ouvidos já tinham
ouvido a teu respeito, mas agora meus olhos te viram. Por isso menosprezo a
mim mesmo e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42:6). Davi, o ungido do
Senhor, quando convencido do seu pecado contra Deus por meio do
adultério e assassinato, o confessou e encontrou perdão (2 Sm 12:13). De
acordo com os Salmos 32 e 51 ele foi justificado perante Deus e pôde cantar,
4
Edmund P. Clowney, “The Biblical Doctrine of Justification by Faith,” em Right With God:
Justification in the Bible and the World, ed. D.A. Carson, Publicado com a autorização do World
Evangelical Fellowship (Paternoster Press; Baker Book House, 1992), 24; cf. pág. 23, “De fato, esta é a
grande questão para todo o Antigo Testamento”.
4
“Alegrem-se no Senhor e exultem, vocês que são justos! Cantem de alegria,
todos vocês que são retos de coração” (Sl 32:11). Isso é justificação pela fé
unicamente pela graça. A justiça dos justos no AT é um dom do justo
Senhor. É por isso que ao longo dos Salmos se exalta a justiça de Deus.
Paulo declarou a verdade quando afirmou que a Lei e os Profetas testificam
de “uma justiça que provém de Deus, independente da Lei” (Rm 3:21).
Esses temas do AT são desenvolvidos de forma mais profunda por
Edmund Clowney no seu capítulo “The Biblical Doctrine of Justification by
Faith” (A Doutrina Bíblica da Justificação Pela Fé), no livro Right with God:
Justification in the Bible and the World (Correto com Deus: Justificação na
Bíblia e o Mundo) publicado em 1992 em nome da World Evangelical
Fellowship (Sociedade Evangélica Mundial). Os adventistas do sétimo dia
deveriam, acredito eu, concordar com muito, se não com a totalidade da
minuciosa apresentação bíblica de Clowney.5
Seguindo McGrath, Clowney
mostra que o verbo hebraico hasdiq “sempre significa „declarar justo‟ e
portanto para inocentar ou vindicar”. Com um apelo a Dt 25:1, onde aos
juízes de Israel é ordenado “justificar o justo e condenar o ímpio” ele
declara: “é claro que „condenar‟ deve significar „declarar ímpio‟, não „fazer
ímpio‟” (ênfase dele), e que “„justificar‟ deve significar „declarar justo‟ e
não „fazer justo‟”. “Esse significado é constante no AT”.6
O Senhor
admoesta os juízes a darem vereditos justos porque Deus é o Supremo Juiz,
que testifica de si mesmo: “Eu não inocento [ou justifico] o culpado” (Ex
23:7). Enquanto aqui Deus está falando no contexto de um tribunal de justiça
terrestre, torna-se evidente quando avançamos através das Escrituras que
esta declaração tem um profundo significado soteriológico. É necessário
enfatizar que “justificar” é um termo legal, declarando que alguém não é
culpado. Assim, o significado básico de justificação como um veredito
judicial é mantido até mesmo quando abordado sob um aspecto mais amplo
na revelação progressiva de Deus e na reflexão teológica dessa revelação.
Justificação pela Fé em Cristo Somente
Os adventistas do sétimo dia acreditam firmemente e sinceramente
que a salvação é puramente um dom de Deus em Jesus Cristo. Pecadores
como somos, nós não podemos acrescentar nada à perfeita justiça de Cristo,
a qual Ele efetuou em sua encarnação por Sua perfeita obediência à Lei de
Deus e por Sua morte na cruz pelos nossos pecados. Nas palavras de uma
das crenças fundamentais dos adventistas do sétimo dia:
5
Clowney, “The Biblical Doctrine of Justification by Faith” em Right With God, 17-50
6
Ibid., 23; Alister E. McGrath, Iustitia Dei: A History of the Christian Doctrine of
Justification, Vol. 1, The Beginnings to the Reformation (Cambridge: Cambridge University Press, 1986),
12.
5
Na vida de Cristo de perfeita obediência à vontade de Deus, Seu
sofrimento, morte e ressurreição, Deus provê o único meio de expiação para
o pecado humano, para que aqueles que pela fé aceitam esta expiação
possam ter vida eterna, e toda a criação possa entender melhor o infinito e
santo amor do Criador. Esta perfeita expiação vindica a justiça da Lei de
Deus e a graciosidade de Seu caráter; por ela condena nosso pecado e nos
provê perdão. Crenças Fundamentais, 9.7
“Salvação por meio de Cristo somente” é central para o
entendimento adventista e experiência da salvação. Embora durante nossa
história de mais de 160 anos isso nem sempre tenha recebido a devida
ênfase, essa crença central pode ser traçada ao longo desse período com
acentuação crescente e articulação em livros, tratados, e periódicos
publicados aos milhões pelas casas publicadoras adventistas em todo o
mundo. O mesmo é verdade para o evangelismo adventista em milhares de
formas diferentes desde pequenos grupos de estudo em casas particulares até
evangelismo de alta tecnologia por meios de satélite e internet. Aqui, nós
podemos apenas ressaltar algumas evidências significativas desta ênfase
cristocêntrica na compreensão adventista de justificação pela fé.
Nos escritos de Ellen White, a autora mais lida do adventismo,
Cristo é consistentemente apresentado como a única esperança e o único
caminho de salvação para os seres humanos pecadores. Ela escreveu em
1891: “De todos os que professam serem cristãos, os adventistas do sétimo
dia deveriam ser os primeiros em exaltar a Cristo perante o mundo”.8
Ela
mesma fez exatamente aquilo que seus escritos prestaram testemunho.
Concernente à justificação pela fé era muito explícita. Note sua forte ênfase:
Não há outro ponto que precise ser mais zelosamente apresentado, mais
frequentemente repetido, ou mais firmemente estabelecido na mente de
todos que a impossibilidade do homem caído de merecer alguma coisa
pelas suas próprias boas obras. A salvação é através da fé em Jesus Cristo
somente9
.
7
“Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists, 9. „Life, Death, and Resurrection of
Christ,‟” em Seventh-day Adventist Yearbook, 2006 ([Silver Springs, Maryland:] The General Conference
Corporation of Seventh-day Adventists, 2006), 5.
8
Ellen G. White, Gospel Workers (Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Assn.,
1915), 156; Idem, Manuscript Releases, Volume 9 (Silver Springs, Maryland: E.G. White State, 1990),
294.
9
Ellen G. White, Faith and Works (Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Assn.,
1979), 19.
6
O sangue de Cristo foi derramado para expiar o pecado e para purificar o
pecador; e nós devemos tomar posse dos méritos do sangue de Cristo,
crendo que temos vida em Seu nome. Não deixais as falácias de Satanás
vos enganar; vocês são justificados unicamente pela fé (…)10
.
Não é surpresa, pois, que Ellen White tinha uma elevada estima pela
epístola de Paulo aos Romanos. “Com grande clareza e poder o apóstolo
apresentou a doutrina da justificação pela fé em Cristo”. Ela comenta sobre o
fato de que Paulo vagamente podia prever o grande alcance que suas
palavras teriam. “Ao longo de todas as eras a grande verdade da justificação
pela fé tem se mantido como um poderoso farol para guiar pecadores
arrependidos ao caminho da vida”. Ela menciona a experiência de Martinho
Lutero e então conclui que “na epístola à igreja de Roma todo cristão tem
motivo para agradecer a Deus”.11
A importância da epístola aos Romanos e
outras epístolas paulinas para a compreensão adventista do evangelho é
manifestada em publicações eruditas bem como em materiais bíblicos em
geral e leituras devocionais12
.
Conforme exposto anteriormente, os adventistas crêem que existe
apenas um caminho para salvação desde Gênesis até Apocalipse, sendo este
a fé em Cristo e em Sua justiça. Essa crença central pode ser (e tem sido)
expressa em diferentes palavras, da mesma maneira como as Escrituras não
são monótonas, mas apresentam a verdade do evangelho eterno em variadas
formas. Enquanto os eruditos adventistas podem divergir de opinião no que
diz respeito a certos aspectos do evangelho (assim como diferenças podem
ser encontradas entre eruditos de outras denominações) há uma significativa
unidade concernente à doutrina da justificação unicamente através da graça
pela fé somente. Nas palavras do teólogo adventista Hans LaRondelle:
Básico para o adventismo é o princípio evangélico que a salvação humana
não é através da lei ou pelas obras humanas, mas unicamente por meio da
graça salvadora de Deus (…). A crença adventista aceita a Cristo como o
substituto e o exemplo do homem, nesta irreversível ordem. A fé em Cristo
como nosso substituto diante de Deus provê nossa justificação como o ato
de Deus em declarar (ênfase do autor) justo o crente arrependido. A
justificação é vista como o oposto da condenação (ver Rm 5:16; 8:1, 33,
10
Ellen G. White, “Faith Does Not Make Void the Law,” Signs of the Times, 24 de Março,
1890.
11
Ellen G. White Acts of the Apostles (Mountain View, California: Pacific Press Publishing
Assn., 1911), 373, 374.
12
Ver por exemplo a meditação diária para adultos de George R. Knight, Walking with Paul
Through the Book of Romans (Hagerstown, Maryland: Review and Herald Publishing Assn., 2002)
7
34). A base para a justificação do crente não é sua observância à lei, mas a
obediência sem pecado de Cristo (Rm 5:18, 19).13
Indubitavelmente, a justificação é primariamente uma declaração
judicial feita por Deus de que o pecador crente em Cristo é justo. Isso é o
oposto de condenação. Mas a fé pela qual nós somos justificados não é
meramente um assentimento mental de certa doutrina. Ela é uma fé viva que
se apega a Cristo e ao Seu sacrifício expiatório. Lutero distingue entre “fé
adquirida” e “fé verdadeira”. Ele escreveu: “Fé adquirida tem como
aplicação final a paixão de Cristo como mera especulação. Fé verdadeira tem
como aplicação final a paixão de Cristo como vida e salvação. (…) A fé
verdadeira com braços estendidos abraça alegremente a dádiva do Filho de
Deus e diz, „Ele é meu amado, e eu sou dEle.‟”14
Ellen White em uma linha
similar escreveu que “há milhares que creem no evangelho e em Jesus Cristo
como redentor do mundo, mas eles não são salvos por esta fé. Esse é apenas
um assentimento racional de que aquilo é um fato”. Ela chama isto de uma fé
geral e a contrasta com uma fé que se apodera de Cristo como o único
Salvador que perdoa pecados, uma fé que conduz ao arrependimento, “uma
fé que executa sua obra no recebedor, uma fé no sacrifício expiatório, uma fé
que opera por amor e purifica a alma”.15
Ela complementa a descrição dessa
fé com as seguintes palavras: “No momento em que a verdadeira fé nos
méritos do custoso sacrifício expiatório é exercitada, reivindicando a Cristo
como um Salvador pessoal, nesse exato momento o pecador é justificado
perante Deus, porque ele é perdoado”16
.
Algumas Áreas Supostamente Problemáticas do Ensino Adventista em
Relação à Justificação pela Fé
Os adventistas do sétimo dia não escaparam das acusações de que
não aceitam realmente o ensino bíblico da justificação unicamente pela graça
por meio da fé somente. Anthony Hoekema em seu livro The Four Major
Cults (As Quatro Maiores Seitas), expressa sua convicção de que os
adventistas, “embora reivindiquem ensinar salvação unicamente pela graça”,
são na realidade culpados por uma espécie de legalismo misturado.17
Ele
13
Hans K. LaRondelle, “The Seventh-day Adventist View of the Relationship of Justification-
Sanctification-the Final Judgment,” em Lutherans & Adventists in Conversation, 123.
14
Citado em Robin A. Leaver, Luther on Justification (St. Louis, Missouri: Concordia
Publishing House, 1975), 30.
15
Ellen G. White, “Justified by Faith,” em Manuscript Releases, Volume 8 (Silver Spring,
Maryland: E.G. White State, 1990), 356.
16
Ibid., 357.
17
Anthony A. Hoekema, The Four Major Cults (Exeter, Reino Unido: Paternoster Press,
1969), 126.
8
baseia essa afirmação na doutrina adventista do juízo investigativo e seu
ensino com respeito à necessidade de guardar o sétimo dia como o Sábado, o
próprio Dia do Senhor (especialmente no contexto escatológico de Ap
13:11-17).18
Por essa e outras razões classifica o Adventismo do Sétimo Dia
como seita. Críticas similares têm sido levantadas por outros, não menos que
por alguns ex-adventistas. Nem todos concordam com a declaração de
Hoekema. Vale salientar que o erudito evangélico Walter Martin em sua
obra The Kingdom of the Cults (O Império das Seitas) mostra algumas
inconsistências sérias na argumentação de Hoekema. Embora o próprio
Martin não concorde com certas crenças adventistas, aceita como genuína a
enfática afirmação dos adventistas de “que a salvação vem apenas pela graça
de Deus por meio da fé no sacrifício de Jesus Cristo na cruz”19
.
É verdade que os adventistas acreditam que a Lei dos Dez
Mandamentos, incluindo o Sábado do sétimo dia, ainda vigora sobre a raça
humana.20
Mas isso de forma alguma significa que os pecadores podem ser
justificados pela obediência aos mandamentos de Deus. Como citado
anteriormente, os adventistas rejeitam enfaticamente a ideia de que os
pecadores são justificados através de sua obediência à Lei de Deus. Nesse
aspecto a crença adventista concorda com a posição dos reformadores
protestantes conforme indicado, por exemplo, na Segunda Confissão
Helvética de 1566, que diz no capítulo 12, intitulado “Da Lei de Deus”:
Nós ensinamos que essa lei [a Lei de Deus] não foi dada aos homens para
que pudessem ser justificados pela sua observância, mas que antes dela
aprendemos que podemos conhecer nossas fraquezas, pecado e condenação,
e, não confiando em nossas forças, podermos ser convertidos a Cristo pela
fé. O apóstolo abertamente declara: “A lei produz ira,” pois “é mediante a
lei que nos tornamos plenamente conscientes do pecado” (Rm 4:15; 3:20),
e, “Se a lei tivesse sido dada e pudesse justificar ou fazer viver, então a
justiça seria alcançada pela lei. Mas a Escritura (que é, a Lei) encerrou tudo
debaixo do pecado, a fim de que a promessa, que é pela fé em Jesus Cristo,
fosse dada aos que creem (…). Assim, a lei foi o nosso tutor até Cristo, para
que fôssemos justificados pela fé” (Gl 3:22, 24 ff.).21
O mesmo artigo, entretanto, começa afirmando “que a vontade de
Deus é nos explicar na Sua Lei o que Ele deseja ou não que façamos e o que
18
Ibid., 126-128.
19
Walter Martin, The Kingdon of the Cults (Minneapolis, Minnesota: Bethany House
Publishers, 1985), 435.
20
“Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists, 19. „Law of God,‟” em Seventh-day
Adventist Yearbook, 2006, 7.
21
Arthur C. Cochrane, ed., Reformed Confessions of the 16th
Century (Philadelphia:
Westminster Press, 1966), 248.
9
é bom e justo, ou o que é mal e injusto. Portanto, confessamos que a lei é
santa e boa.22
Os adventistas aceitam essa afirmação como compatível com o
ensino da Escritura, creem que a nova aliança prometida pelo Senhor
(conforme indicada através de Jeremias e repetida em Hebreus 8:10, “Porei
minhas leis em suas mentes e as escreverei em seus corações. Serei o Deus
deles, e eles serão Meu povo”) se cumpriu na vida de todo aquele que
aceitou a Jesus Cristo como seu Salvador e Sumo Sacerdote. Enquanto Paulo
enfaticamente assegura “que o homem é justificado pela fé independente da
obediência à lei”, válido tanto para judeus quanto para gentios, no mesmo
contexto afirma que através da fé não anulamos a lei, “pelo contrário,
confirmamos a lei” (Rm 3:28, 31). Em outro lugar ele (Paulo) declara a
mesma verdade com outras palavras: “a circuncisão não significa nada, e a
incircuncisão também nada é. O que importa é obedecer aos mandamentos
de Deus” (1Co 7:19). Essa obediência deriva da fé e amor a Cristo,
implantados pelo Espírito Santo, “pois em Cristo Jesus nem circuncisão ou
incircuncisão têm efeito algum, mas sim a fé que atua pelo amor” (Gl 5:6).
Jesus, em suas últimas palavras aos discípulos antes da crucificação, falou
várias vezes sobre essa obediência que nasce do amor: “Se vocês me amam,
obedecerão aos meus mandamentos” (Jo 14:15); “Como o Pai me amou,
assim eu os amei; permaneçam no meu amor. Se vocês obedecerem aos
meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu tenho
obedecido aos mandamentos de meu Pai e em seu amor permaneço” (Jo
15:9, 10); “Vocês serão meus amigos, se fizerem o que eu lhes ordeno” (Jo
15:14). Os adventistas crêem que essa é a obediência por amor a qual Paulo
se refere quando escreve que “o amor é o cumprimento da lei” (Rm 13:10).
Enquanto os adventistas acreditam que os cristãos são chamados
para “a obediência que vem pela fé” (Rm 1:5) e que nós “somos criação de
Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus
preparou de antemão para nós as praticássemos” (Ef 2:10), rejeitam
energicamente qualquer sugestão de que tal obediência e boas obras tem
algum sentido meritório. O Concílio de Trento ensinou em seu Decreto
sobre Justificação que a justificação aumenta “por meio da observância dos
mandamentos de Deus e da Igreja, fé cooperando com boas obras” também
ensina o mérito de boas obras como frutos da justificação23
. Seu cânon sobre
justificação pronunciou a seguinte condenação a qualquer um que disser
“que a justiça recebida não se conserva nem tampouco se aumenta diante de
Deus pelas boas obras, mas que as obras somente são frutos e sinais da
justificação que se alcançou, e que não é causa do aumento da mesma – seja
22
Ibid., 247.
23
H. J. Schroeder, trans., Canons and Decrees of the Council of Trent (Rockford, Illinois: Tan
Books and Publishers, 1978), 36 e 40-42.
10
excomungado”. Outro anátema condena qualquer um que disser “que as boas
obras do homem justificado de tal modo são dons de Deus, que não são
também méritos do homem justificado”24
. Em outras palavras, a justificação
é aumentada pela obediência e boas obras, não sendo estas apenas dons da
graça de Deus, mas também os méritos do cristão justificado. Essa crença foi
reconfirmada no Catecismo da Igreja Católica, publicado com a benção
papal de João Paulo II25
. O Catecismo também reafirma a posição do
Concílio de Trento de que “a Justificação não é apenas a remissão de
pecados, mas também a santificação e renovação do homem interior”26
. Esta
visão sobre justificação era e ainda é enfaticamente rejeitada por protestantes
tradicionais, incluindo os adventistas do sétimo dia27
.
Que o tema é bastante relevante no século XXI como foi no século
XVI fica evidente pelo fato de que Francis Beckwith, quem por um breve
período foi presidente da Sociedade Teológica Evangélica, em maio de 2007
renunciou sua posição e sua filiação na Sociedade, volvendo logo depois (em
abril do seguinte ano) à Igreja Católica Romana (igreja na qual cresceu). De
acordo com o Christianity Today, Beckwith mudou suas concepções sobre
justificação porque “achou a visão protestante, a qual assume que a
santificação segue a justificação, inadequada”28
. Beckwith convenceu-se que
o ponto de vista Católico Romano sobre justificação “tem mais poder de
argumentação para explicar para ambos os textos bíblicos sobre justificação
[e] o entendimento histórico da igreja sobre a salvação anterior à Reforma,
todos os caminhos levam de volta para a igreja primitiva dos primeiros
séculos”29
. Tal fato destaca a suprema importância e centralidade da doutrina
da justificação para todo aquele que aceita o princípio da Sola Scriptura. De
acordo com o editorial do Christianity Today, os reformadores
“corretamente ensinaram que apenas o mérito de Jesus tem validade diante
de Deus e que somente através da fé esse mérito poderia ser nosso”30
. Os
adventistas concordam totalmente com esta posição.
24
Ibid., 45 (Canon 24) e 46 (Canon 32).
25
“Uma vez que a iniciativa pertence a Deus na ordem da graça, ninguém pode merecer a
graça inicial do perdão e justificação, no inicio da conversão. Movido pelo Espírito Santo e pela caridade,
podemos então merecer para nós mesmos e para outros as graças necessárias para nossa santificação, para
o aumento da graça e da caridade, e para a obtenção da vida eterna” (a ênfase está no texto). Catechism of
the Catholic Church (Mahwah, New Jersey: Paulist Press, 1994), 487, parágrafo 2010.
26
Catechism of the Catholic Church, 482, parágrafo 1989.
27
Uma incisiva crítica protestante do Decreto sobre Justificação do Concílio de Trento pode
ser encontrada em Martin Chemnitz, Examination of the Council of Trent, Part 1, trans. Fred Kramer (St.
Louis, Missouri: Concordia Publishing House, 1971), 455-663.
28
Editorial, “Virtue That Counts: Why Justification by Faith Alone Is Still Our Defining
Doctrine,” Christianity Today, Julho de 2007, 20.
29
Collin Hansen, “Leaving for Rome,” Christianity Today, Julho de 2007, 14.
30
Editorial, “Virtue That Counts,” Christianity Today, Julho de 2007, 20.
11
Desta discussão anterior deve ficar claro que os adventistas do
sétimo dia acreditam que a guarda dos dez mandamentos, incluindo a
observância do Sábado do sétimo dia da semana, é visto como parte da
obediência da fé. É o fruto da justificação, nunca a raiz. Cristo refere-se a si
mesmo como o Senhor do Sábado (Mc 2:28), obviamente não para abolir o
Sábado, mas para que todos os que foram justificados pela fé pudessem
seguir seu Senhor na observância do Sábado como um memorial da criação
bem como um selo de sua redenção da escravidão do pecado através de
Cristo (ver e.g. Ex 20:8-11; 31:12-17; Dt 5:12-15; Ez 20:12, 20). Não há
sequer um traço de legalismo em tal observância do Sábado.
Se nossa justificação é somente por meio da graça pela fé somente, a
obediência pela fé tem algo que ver com nossa salvação? Ou para formular a
questão de outra maneira: nossos pensamentos, palavras e atos têm algum
papel em determinar nosso destino eterno? Essas são questões cruciais que
estão estreitamente relacionadas com o tema do julgamento final. As
Escrituras têm muito a dizer sobre esse juízo, não menos que os ensinos de
nosso Senhor como registrado nos Evangelhos. Disse Jesus: “Mas eu lhes
digo que, no dia do juízo, os homens haverão de dar conta de toda palavra
inútil que tiverem falado. Pois por suas palavras você será absolvido (RSV
“justificados”), e por suas palavras será condenado” (Mt 12:36-37). Aqui
nosso Senhor fala sobre justificação e condenação (as declarações judiciais
de inocência e culpa) no contexto do dia do juízo. Obviamente, há um
aspecto escatológico para justificação. Os adventistas creem com base nas
Escrituras que o dia do juízo é um conceito muito abrangente e muita
literatura adventista tem sido publicada sobre o assunto31
. É suficiente dizer
que sustentam o juízo como possuindo duas fases distintas, uma
investigativa e outra executiva. É a sua crença em um juízo investigativo que
tem levado à acusação de que não crêem realmente nos princípios da
Reforma de Sola Fide e Sola Gratia. Para concluir, analisemos brevemente a
questão.
Em Romanos 8:1, Paulo nos diz que “agora já não há condenação
para os que estão em Cristo Jesus”. Anteriormente havia afirmado que
“tendo sido, pois justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor
Jesus Cristo” (Rm 5:1). Tudo isso é uma realidade presente. Em outro lugar
está escrito que “o sólido fundamento de Deus permanece firme, selado com
essa inscrição: „O Senhor conhece quem lhe pertence‟” (2 Tm 2:19).
31
Ver por exemplo Roy Gane, Who’s Afraid of the Judgment? (Nampa: Idaho: Pacific Press
Publishing Association, 2006); Gerhard F. Hasel, “Divine Judgment” em Handbook of Seventh-day
Adventist Theology, Commentary Reference Series, Vol. 12, ed. Raoul Dederen (Hagerstown, Maryland:
Review and Herald Publishing Association, 2000), 815-856; Frank B. Holbrook, The Atoning Priesthood
of Jesus Christ (Berrien Springs, Michigan: Adventist Theological Society Publications, 1996).
12
Algumas vezes argumenta-se que tais textos mostram que para aqueles que
estão em Cristo não há necessidade de serem julgados, que o conceito de um
juízo investigativo não é bíblico e retira a certeza de salvação dos crentes.
Entretanto, esse tipo de raciocínio ignora totalmente o claro ensino da
Escritura de que todos serão julgados. O apóstolo Paulo é muito enfático
sobre esse ponto. “Pois todos compareceremos diante do tribunal de Deus
(…). Assim, cada um de nós prestará contas de si mesmo a Deus” (Rm
14:10, 12); “Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de
Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio
do corpo, quer sejam boas quer sejam más” (2Co 5:10). Outras passagens da
Escritura podem ser incluídas. Salomão escreveu no fim de sua vida cheia de
altos e baixos: “agora que já se ouviu tudo, aqui está a conclusão: Tema a
Deus e guarde os seus mandamentos, pois isso é o essencial para o homem.
Pois Deus trará a julgamento tudo o que foi feito, inclusive tudo o que está
escondido, seja bom, seja mal” (Ec 12:13, 14). O apóstolo Pedro nos informa
que o juízo começará pela família de Deus. Todos os que em algum
momento professaram fé em Deus e em Cristo serão julgados antes
“daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus” (1 Pe 4:17). Essas
declarações porventura retiram a certeza de nossa justificação?
A clara resposta para essa pergunta é: “Não, se permanecemos em
Cristo!” Jesus na parábola da videira e os ramos destaca a importância
crucial de permanecer nEle. “Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se
alguém permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; pois sem mim
vocês não podem fazer coisa alguma” (Jo 15:5). E acrescenta que se alguém
não permanece nEle será semelhante a um ramo seco que é lançado ao fogo
para ser queimado (v. 6). O juízo final revelará quem permaneceu ou não em
Cristo. Isso será manifestado se nossa fé em Cristo produziu frutos em
obediência de fé ou se é uma fé estéril (cf. Tg 2:17, 26). Isso revelará na
presença de todo o universo quem manteve a fé em Cristo e quem perdeu de
vista o Caminho, a Verdade e a Vida. A certeza de Paulo na vida eterna
estava enraizada no fato de que “ele tinha guardado a fé” (2 Tm 4:7), sua fé
em Cristo como seu Salvador e Senhor, o justo Juiz de quem receberia a
coroa da justiça. LaRondelle destaca a relação entre a justificação presente
dos crentes e sua justificação no juízo final:
Paulo baseia nossa certeza de salvação futura na realidade de nossa
salvação presente, a certeza de nossa justificação futura na realidade de
nossa justificação presente: „Logo, muito mais agora, sendo justificados
pelo seu sangue, seremos por Ele salvos da ira!”(Rm 5:9, ênfase
acrescentada; ver também v.17). Em outras palavras, quando Jesus nos
13
justifica, nós temos plena certeza de que Ele nos justificará no juízo final se
tão somente permanecermos nEle32
.
De um modo diferente, P. T. O‟Brien, colaborador do livro Right
with God (Correto com Deus), também destaca a relação entre justificação
pela fé e julgamento pelas obras. O autor torna claro que o “alicerce da
justificação não está nas obras, nem na fé, mas „na revelação da graça de
Deus em Cristo abraçada pela fé‟. As obras são indispensáveis, pois
demonstram a presença da verdadeira fé e elas são a evidência de que a
pessoa está unida com Cristo em Sua morte e ressurreição”33
. Os adventistas
concordam e acreditam que o juízo, seja investigativo ou executivo, é uma
boa notícia para todos que (assim como Paulo) tem guardado a fé pela graça
de Deus, a saber, a fé em Cristo.
Peter M. van Bemmelen é professor emérito de teologia sistemática no
Seminário Teológico Adventista na Universidade Andrews. Recebeu seu Th.D. da
Universidade Andrews em 1987 e sua dissertação, Issues in Biblical Inspiration:
Sanday and Warfield, foi publicada em 1988 pela Andrews University Press. Van
Bemmelen trabalhou como pastor, presidente de missão e professor em cinco países
diferentes. Ele ensinou mais de trinta anos no Caribbean Union College em
Trinidad, Newbold College na Inglaterra, e desde 1993 na Universidade Andrews.
Tem contribuído com artigos para vários periódicos e simpósios, dentre os quais
Handbook of Seventy-day Adventist Theology (2000), Understanding Scripture: Na
Adventist Approch (2006), Christ, Salvation, and the Eschaton: Essays in Honor and
Hans K. LaRondelle (2009), e Interpreting Scripture: Bible Questions and Answers
(2010).
32
Hans K. LaRondelle, Assurance of Salvation (Nampa: Idaho: Pacific Press Publishing
Association, 1999), 99. Herman Ridderbos discute sucintamente o assunto (Judgment According to
Works) em seu excelente livro Paul: An Outline of His Theology, trans. John Richard De Witt (Grand
Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1975), 178-181.
33
P. T. O‟Brien, “Justification in Paul and Some Crucial Issues of the Last Two Decades,” em
Right With God: Justification in the Bible and the World, ed. D.A. Carson, Publicado com a autorização
da World Evangelical Fellowship (Paternoster Press; Baker Book House, 1992), 94. A citação dentro da
citação foi tirada de Ridderbos, Paul: An Outline of His Theology, 180.

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  • 1. 1 Journal of the Adventist Theological Society, 20/1-2 (2009):177-191. Tradução: Yure Gramacho Revisão da Tradução: Darcy Propodolski Pinto Revisão de Língua Portuguesa: Everton Cardoso Justificação pela Fé: Uma Compreensão Adventista Peter M. van Bemmelen Seminário Teológico Adventista do Sétimo Dia Universidade Andrews Introdução Os adventistas do sétimo dia acreditam que foram chamados a proclamar o evangelho eterno a cada nação, tribo, língua e povo, no contexto da tríplice mensagem angélica em Ap 14:6-12. Essas mensagens são o apelo final de Deus à raça humana antes da Segunda Vinda de Jesus Cristo (ver Ap 14:14-20). A expressão “Evangelho Eterno,” que ocorre somente nesta passagem no Novo Testamento, tem implicações importantes. Em primeiro lugar, implica que o evangelho estava no plano de Deus desde a eternidade. Este eterno propósito divino é enraizado no eterno amor de Deus como registrado em Jr 31:3 e Jo 3:12. Em segundo lugar, significa a existência de apenas um evangelho pelo qual os seres humanos caídos podem ser salvos, e este é o evangelho de Jesus Cristo, como Paulo frequentemente se refere (Rm 15:9; 1Co 9:12; etc). Em outras palavras, desde os dias de Adão e Eva até o fim do mundo tem havido e sempre haverá apenas um evangelho, um meio de salvação. Nas palavras do apóstolo: “pois pela graça sois salvos, por meio da fé – e isso não vem de vós, é dom de Deus – não por obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2:8-9). Pedro, falando da salvação através de Jesus Cristo perante os guias religiosos de Israel foi muito enfático: “Não há salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (Atos 4:12).1 Os adventistas sempre identificaram a si mesmos como os herdeiros das grandes verdades restauradas e proclamadas pelos reformadores protestantes. Como registrado no relatório final de outro diálogo bilateral: “Os adventistas têm um grande apreço pela Reforma. Eles se veem como herdeiros de Lutero e de outros reformadores, especialmente em sua fidelidade aos grandes princípios da 1 Salvo indicação contrária, os textos bíblicos deste artigo foram retirados da Nova Versão Internacional.
  • 2. 2 Sola Scriptura, Sola Gratia, Sola Fide, Solo Christo”.2 Isso coloca os adventistas em harmonia com a compreensão evangélica tradicional da justificação pela fé e também com a tradição patrística, uma vez que, de acordo com Thomas Oden, “os principais apelos dos reformadores por Sola Scriptura, Sola Gratia e Sola Fide são encontrados abundantemente na interpretação patrística das Escrituras”.3 Neste artigo pretendemos apresentar a compreensão adventista da unidade do ensino da Escritura sobre a justificação pela fé em Cristo somente, através da graça somente. Em seguida, um suposto conflito entre alguns ensinos adventistas específicos, tal como sua ênfase sobre a observância do Sábado e a compreensão protestante tradicional da justificação pela fé serão considerados. O Ensino Fundamental da Justificação pela Fé no Antigo Testamento A unidade da Escritura não significa uniformidade. Esperar por declarações teológicas muito explícitas no Antigo Testamento (AT) como são encontrados nos escritos paulinos demonstra uma falta de apreciação pela diversidade das revelações de Deus para, e no trato com seus mensageiros inspirados. Todavia, o próprio Paulo recorre ao AT para mostrar a unidade entre seu ensino sobre justificação pela fé ou justiça pela fé com os de Moisés e dos Profetas. “Mas agora se manifestou uma justiça que vem de Deus, independente da lei, da qual testemunham a Lei e os Profetas” (Rm 3:21). É, portanto, essencial estudar cuidadosamente o que o AT ensina sobre justiça e justificação. Obviamente, neste artigo podemos lidar apenas com alguns dos aspectos mais pertinentes sobre o assunto. O AT proclama a justiça de Deus em todo trato com Israel. No cântico majestoso, que Moisés por ordem divina ensinou os israelitas a cantarem, ele anunciou o nome do Senhor nestas palavras: “Ele é a Rocha, as suas obras são perfeitas, e todos os seus caminhos são justos. É Deus fiel, que não comete erros, justo e reto Ele é” (Dt 32:4). A justiça de Yahweh é manifestada, de acordo com o pacto de bênçãos e maldições do capítulo 28 de Deuteronômio, em atos de juízo (ver por exemplo 2 Cr 12:1-6; Dn 9:3-14; Ne 9:8) e em atos de salvação. Estes últimos são, por vezes, referidos como os tsidqot Yahweh, podendo ser traduzido como as justiças ou os atos justos do Senhor (ver Jz 5:10; 1Sm 12:6-7; Mq 6:5). É importante entender que no AT a justiça de Deus é geralmente equivalente à salvação de Deus, como pode ser observado no paralelismo hebraico (ver Is 51:6, 8). 2 Lutherans & Adventists in Conversation: Report and Papers Presented 1994-1998 (Silver Spring, Maryland: General Conference of Seventh-day Adventists; Geneva, Switzerland: The Lutheran World Federation, 2000), 8. 3 Thomas C. Oden, The Justification Reader (Grand Rapids, Michigan; Cambridge, United Kingdom: William B. Eerdmans Publishing Co., 2002), 162.
  • 3. 3 Quando aborda a justiça humana, o AT nos apresenta um aparente paradoxo. Existem insistentes e enfáticas declarações de que ninguém é justo, todos pecaram. Davi pleiteia com Deus, “mas não leves o teu servo a julgamento, pois ninguém é justo diante de ti” (Sl 143:2). Salomão reconhece, em sua oração de dedicação do templo, que “não há ninguém que não peque” (1 Cr 6:36). Ele repete esse pensamento em Eclesiastes 7:20: “não há um homem justo sobre a Terra que faça o que é certo e nunca peque”. Moisés por três vezes disse aos israelitas para não acharem que o Senhor lhes tinha dado a terra de Canaã devido à sua justiça, ao contrário disso afirmou: “vocês são um povo de dura cerviz” (Dt 9:4-6). O paradoxo é que esses mesmos escritores e todo o AT fazem uma distinção entre duas classes de seres humanos: “os justos” e “os ímpios”. Isto suscita a questão crucial: “Como algum ser humano pode ser chamado de justo em face da afirmação de que ninguém é justo e que todos pecaram?” A urgência dessa questão é intensificada quando encontramos pessoas que são designadas como justas ou irrepreensíveis, “amigo de Deus”, ou mesmo “altamente estimado” (tais como Noé, Jó, Abraão e Daniel- ver Gn 7:1; Jó 1:1; Is 41:8; Dn 9:23), como tendo cometido pecados ou confessado algum deles. É evidente que a justiça dessas pessoas não é idêntica com a ausência de pecado. Como então podem ser chamados de justos ou irrepreensíveis? Edmund Clowney destaca quão crucial é essa questão: “Como pode um homem ser justo para com Deus? Toda a história do AT gira em torno das respostas divinas a esta pergunta” 4 . A resposta clara e direta é que Yahweh, o Deus da Aliança, justifica todo aquele que nEle acredita, confia em Suas promessas, reconhece seus pecados, se lançam sobre a misericórdia de Deus e arrependem-se de suas injustiças. De Abraão nós lemos, “Abraão creu no Senhor, e isso lhe foi creditado como justiça” (Gn 15:6). Jó, de quem o Senhor testificou que era “irrepreensível e honesto, um homem que teme a Deus e se aparta do mal”, foi arguido pelo mesmo Senhor, “Você vai por em dúvida a minha Justiça? Vai condenar-me para justificar-se?” (Jó 40:8). Perante o Deus santo e justo Jó reconheceu sua pecaminosidade e respondeu “Meus ouvidos já tinham ouvido a teu respeito, mas agora meus olhos te viram. Por isso menosprezo a mim mesmo e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42:6). Davi, o ungido do Senhor, quando convencido do seu pecado contra Deus por meio do adultério e assassinato, o confessou e encontrou perdão (2 Sm 12:13). De acordo com os Salmos 32 e 51 ele foi justificado perante Deus e pôde cantar, 4 Edmund P. Clowney, “The Biblical Doctrine of Justification by Faith,” em Right With God: Justification in the Bible and the World, ed. D.A. Carson, Publicado com a autorização do World Evangelical Fellowship (Paternoster Press; Baker Book House, 1992), 24; cf. pág. 23, “De fato, esta é a grande questão para todo o Antigo Testamento”.
  • 4. 4 “Alegrem-se no Senhor e exultem, vocês que são justos! Cantem de alegria, todos vocês que são retos de coração” (Sl 32:11). Isso é justificação pela fé unicamente pela graça. A justiça dos justos no AT é um dom do justo Senhor. É por isso que ao longo dos Salmos se exalta a justiça de Deus. Paulo declarou a verdade quando afirmou que a Lei e os Profetas testificam de “uma justiça que provém de Deus, independente da Lei” (Rm 3:21). Esses temas do AT são desenvolvidos de forma mais profunda por Edmund Clowney no seu capítulo “The Biblical Doctrine of Justification by Faith” (A Doutrina Bíblica da Justificação Pela Fé), no livro Right with God: Justification in the Bible and the World (Correto com Deus: Justificação na Bíblia e o Mundo) publicado em 1992 em nome da World Evangelical Fellowship (Sociedade Evangélica Mundial). Os adventistas do sétimo dia deveriam, acredito eu, concordar com muito, se não com a totalidade da minuciosa apresentação bíblica de Clowney.5 Seguindo McGrath, Clowney mostra que o verbo hebraico hasdiq “sempre significa „declarar justo‟ e portanto para inocentar ou vindicar”. Com um apelo a Dt 25:1, onde aos juízes de Israel é ordenado “justificar o justo e condenar o ímpio” ele declara: “é claro que „condenar‟ deve significar „declarar ímpio‟, não „fazer ímpio‟” (ênfase dele), e que “„justificar‟ deve significar „declarar justo‟ e não „fazer justo‟”. “Esse significado é constante no AT”.6 O Senhor admoesta os juízes a darem vereditos justos porque Deus é o Supremo Juiz, que testifica de si mesmo: “Eu não inocento [ou justifico] o culpado” (Ex 23:7). Enquanto aqui Deus está falando no contexto de um tribunal de justiça terrestre, torna-se evidente quando avançamos através das Escrituras que esta declaração tem um profundo significado soteriológico. É necessário enfatizar que “justificar” é um termo legal, declarando que alguém não é culpado. Assim, o significado básico de justificação como um veredito judicial é mantido até mesmo quando abordado sob um aspecto mais amplo na revelação progressiva de Deus e na reflexão teológica dessa revelação. Justificação pela Fé em Cristo Somente Os adventistas do sétimo dia acreditam firmemente e sinceramente que a salvação é puramente um dom de Deus em Jesus Cristo. Pecadores como somos, nós não podemos acrescentar nada à perfeita justiça de Cristo, a qual Ele efetuou em sua encarnação por Sua perfeita obediência à Lei de Deus e por Sua morte na cruz pelos nossos pecados. Nas palavras de uma das crenças fundamentais dos adventistas do sétimo dia: 5 Clowney, “The Biblical Doctrine of Justification by Faith” em Right With God, 17-50 6 Ibid., 23; Alister E. McGrath, Iustitia Dei: A History of the Christian Doctrine of Justification, Vol. 1, The Beginnings to the Reformation (Cambridge: Cambridge University Press, 1986), 12.
  • 5. 5 Na vida de Cristo de perfeita obediência à vontade de Deus, Seu sofrimento, morte e ressurreição, Deus provê o único meio de expiação para o pecado humano, para que aqueles que pela fé aceitam esta expiação possam ter vida eterna, e toda a criação possa entender melhor o infinito e santo amor do Criador. Esta perfeita expiação vindica a justiça da Lei de Deus e a graciosidade de Seu caráter; por ela condena nosso pecado e nos provê perdão. Crenças Fundamentais, 9.7 “Salvação por meio de Cristo somente” é central para o entendimento adventista e experiência da salvação. Embora durante nossa história de mais de 160 anos isso nem sempre tenha recebido a devida ênfase, essa crença central pode ser traçada ao longo desse período com acentuação crescente e articulação em livros, tratados, e periódicos publicados aos milhões pelas casas publicadoras adventistas em todo o mundo. O mesmo é verdade para o evangelismo adventista em milhares de formas diferentes desde pequenos grupos de estudo em casas particulares até evangelismo de alta tecnologia por meios de satélite e internet. Aqui, nós podemos apenas ressaltar algumas evidências significativas desta ênfase cristocêntrica na compreensão adventista de justificação pela fé. Nos escritos de Ellen White, a autora mais lida do adventismo, Cristo é consistentemente apresentado como a única esperança e o único caminho de salvação para os seres humanos pecadores. Ela escreveu em 1891: “De todos os que professam serem cristãos, os adventistas do sétimo dia deveriam ser os primeiros em exaltar a Cristo perante o mundo”.8 Ela mesma fez exatamente aquilo que seus escritos prestaram testemunho. Concernente à justificação pela fé era muito explícita. Note sua forte ênfase: Não há outro ponto que precise ser mais zelosamente apresentado, mais frequentemente repetido, ou mais firmemente estabelecido na mente de todos que a impossibilidade do homem caído de merecer alguma coisa pelas suas próprias boas obras. A salvação é através da fé em Jesus Cristo somente9 . 7 “Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists, 9. „Life, Death, and Resurrection of Christ,‟” em Seventh-day Adventist Yearbook, 2006 ([Silver Springs, Maryland:] The General Conference Corporation of Seventh-day Adventists, 2006), 5. 8 Ellen G. White, Gospel Workers (Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Assn., 1915), 156; Idem, Manuscript Releases, Volume 9 (Silver Springs, Maryland: E.G. White State, 1990), 294. 9 Ellen G. White, Faith and Works (Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Assn., 1979), 19.
  • 6. 6 O sangue de Cristo foi derramado para expiar o pecado e para purificar o pecador; e nós devemos tomar posse dos méritos do sangue de Cristo, crendo que temos vida em Seu nome. Não deixais as falácias de Satanás vos enganar; vocês são justificados unicamente pela fé (…)10 . Não é surpresa, pois, que Ellen White tinha uma elevada estima pela epístola de Paulo aos Romanos. “Com grande clareza e poder o apóstolo apresentou a doutrina da justificação pela fé em Cristo”. Ela comenta sobre o fato de que Paulo vagamente podia prever o grande alcance que suas palavras teriam. “Ao longo de todas as eras a grande verdade da justificação pela fé tem se mantido como um poderoso farol para guiar pecadores arrependidos ao caminho da vida”. Ela menciona a experiência de Martinho Lutero e então conclui que “na epístola à igreja de Roma todo cristão tem motivo para agradecer a Deus”.11 A importância da epístola aos Romanos e outras epístolas paulinas para a compreensão adventista do evangelho é manifestada em publicações eruditas bem como em materiais bíblicos em geral e leituras devocionais12 . Conforme exposto anteriormente, os adventistas crêem que existe apenas um caminho para salvação desde Gênesis até Apocalipse, sendo este a fé em Cristo e em Sua justiça. Essa crença central pode ser (e tem sido) expressa em diferentes palavras, da mesma maneira como as Escrituras não são monótonas, mas apresentam a verdade do evangelho eterno em variadas formas. Enquanto os eruditos adventistas podem divergir de opinião no que diz respeito a certos aspectos do evangelho (assim como diferenças podem ser encontradas entre eruditos de outras denominações) há uma significativa unidade concernente à doutrina da justificação unicamente através da graça pela fé somente. Nas palavras do teólogo adventista Hans LaRondelle: Básico para o adventismo é o princípio evangélico que a salvação humana não é através da lei ou pelas obras humanas, mas unicamente por meio da graça salvadora de Deus (…). A crença adventista aceita a Cristo como o substituto e o exemplo do homem, nesta irreversível ordem. A fé em Cristo como nosso substituto diante de Deus provê nossa justificação como o ato de Deus em declarar (ênfase do autor) justo o crente arrependido. A justificação é vista como o oposto da condenação (ver Rm 5:16; 8:1, 33, 10 Ellen G. White, “Faith Does Not Make Void the Law,” Signs of the Times, 24 de Março, 1890. 11 Ellen G. White Acts of the Apostles (Mountain View, California: Pacific Press Publishing Assn., 1911), 373, 374. 12 Ver por exemplo a meditação diária para adultos de George R. Knight, Walking with Paul Through the Book of Romans (Hagerstown, Maryland: Review and Herald Publishing Assn., 2002)
  • 7. 7 34). A base para a justificação do crente não é sua observância à lei, mas a obediência sem pecado de Cristo (Rm 5:18, 19).13 Indubitavelmente, a justificação é primariamente uma declaração judicial feita por Deus de que o pecador crente em Cristo é justo. Isso é o oposto de condenação. Mas a fé pela qual nós somos justificados não é meramente um assentimento mental de certa doutrina. Ela é uma fé viva que se apega a Cristo e ao Seu sacrifício expiatório. Lutero distingue entre “fé adquirida” e “fé verdadeira”. Ele escreveu: “Fé adquirida tem como aplicação final a paixão de Cristo como mera especulação. Fé verdadeira tem como aplicação final a paixão de Cristo como vida e salvação. (…) A fé verdadeira com braços estendidos abraça alegremente a dádiva do Filho de Deus e diz, „Ele é meu amado, e eu sou dEle.‟”14 Ellen White em uma linha similar escreveu que “há milhares que creem no evangelho e em Jesus Cristo como redentor do mundo, mas eles não são salvos por esta fé. Esse é apenas um assentimento racional de que aquilo é um fato”. Ela chama isto de uma fé geral e a contrasta com uma fé que se apodera de Cristo como o único Salvador que perdoa pecados, uma fé que conduz ao arrependimento, “uma fé que executa sua obra no recebedor, uma fé no sacrifício expiatório, uma fé que opera por amor e purifica a alma”.15 Ela complementa a descrição dessa fé com as seguintes palavras: “No momento em que a verdadeira fé nos méritos do custoso sacrifício expiatório é exercitada, reivindicando a Cristo como um Salvador pessoal, nesse exato momento o pecador é justificado perante Deus, porque ele é perdoado”16 . Algumas Áreas Supostamente Problemáticas do Ensino Adventista em Relação à Justificação pela Fé Os adventistas do sétimo dia não escaparam das acusações de que não aceitam realmente o ensino bíblico da justificação unicamente pela graça por meio da fé somente. Anthony Hoekema em seu livro The Four Major Cults (As Quatro Maiores Seitas), expressa sua convicção de que os adventistas, “embora reivindiquem ensinar salvação unicamente pela graça”, são na realidade culpados por uma espécie de legalismo misturado.17 Ele 13 Hans K. LaRondelle, “The Seventh-day Adventist View of the Relationship of Justification- Sanctification-the Final Judgment,” em Lutherans & Adventists in Conversation, 123. 14 Citado em Robin A. Leaver, Luther on Justification (St. Louis, Missouri: Concordia Publishing House, 1975), 30. 15 Ellen G. White, “Justified by Faith,” em Manuscript Releases, Volume 8 (Silver Spring, Maryland: E.G. White State, 1990), 356. 16 Ibid., 357. 17 Anthony A. Hoekema, The Four Major Cults (Exeter, Reino Unido: Paternoster Press, 1969), 126.
  • 8. 8 baseia essa afirmação na doutrina adventista do juízo investigativo e seu ensino com respeito à necessidade de guardar o sétimo dia como o Sábado, o próprio Dia do Senhor (especialmente no contexto escatológico de Ap 13:11-17).18 Por essa e outras razões classifica o Adventismo do Sétimo Dia como seita. Críticas similares têm sido levantadas por outros, não menos que por alguns ex-adventistas. Nem todos concordam com a declaração de Hoekema. Vale salientar que o erudito evangélico Walter Martin em sua obra The Kingdom of the Cults (O Império das Seitas) mostra algumas inconsistências sérias na argumentação de Hoekema. Embora o próprio Martin não concorde com certas crenças adventistas, aceita como genuína a enfática afirmação dos adventistas de “que a salvação vem apenas pela graça de Deus por meio da fé no sacrifício de Jesus Cristo na cruz”19 . É verdade que os adventistas acreditam que a Lei dos Dez Mandamentos, incluindo o Sábado do sétimo dia, ainda vigora sobre a raça humana.20 Mas isso de forma alguma significa que os pecadores podem ser justificados pela obediência aos mandamentos de Deus. Como citado anteriormente, os adventistas rejeitam enfaticamente a ideia de que os pecadores são justificados através de sua obediência à Lei de Deus. Nesse aspecto a crença adventista concorda com a posição dos reformadores protestantes conforme indicado, por exemplo, na Segunda Confissão Helvética de 1566, que diz no capítulo 12, intitulado “Da Lei de Deus”: Nós ensinamos que essa lei [a Lei de Deus] não foi dada aos homens para que pudessem ser justificados pela sua observância, mas que antes dela aprendemos que podemos conhecer nossas fraquezas, pecado e condenação, e, não confiando em nossas forças, podermos ser convertidos a Cristo pela fé. O apóstolo abertamente declara: “A lei produz ira,” pois “é mediante a lei que nos tornamos plenamente conscientes do pecado” (Rm 4:15; 3:20), e, “Se a lei tivesse sido dada e pudesse justificar ou fazer viver, então a justiça seria alcançada pela lei. Mas a Escritura (que é, a Lei) encerrou tudo debaixo do pecado, a fim de que a promessa, que é pela fé em Jesus Cristo, fosse dada aos que creem (…). Assim, a lei foi o nosso tutor até Cristo, para que fôssemos justificados pela fé” (Gl 3:22, 24 ff.).21 O mesmo artigo, entretanto, começa afirmando “que a vontade de Deus é nos explicar na Sua Lei o que Ele deseja ou não que façamos e o que 18 Ibid., 126-128. 19 Walter Martin, The Kingdon of the Cults (Minneapolis, Minnesota: Bethany House Publishers, 1985), 435. 20 “Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists, 19. „Law of God,‟” em Seventh-day Adventist Yearbook, 2006, 7. 21 Arthur C. Cochrane, ed., Reformed Confessions of the 16th Century (Philadelphia: Westminster Press, 1966), 248.
  • 9. 9 é bom e justo, ou o que é mal e injusto. Portanto, confessamos que a lei é santa e boa.22 Os adventistas aceitam essa afirmação como compatível com o ensino da Escritura, creem que a nova aliança prometida pelo Senhor (conforme indicada através de Jeremias e repetida em Hebreus 8:10, “Porei minhas leis em suas mentes e as escreverei em seus corações. Serei o Deus deles, e eles serão Meu povo”) se cumpriu na vida de todo aquele que aceitou a Jesus Cristo como seu Salvador e Sumo Sacerdote. Enquanto Paulo enfaticamente assegura “que o homem é justificado pela fé independente da obediência à lei”, válido tanto para judeus quanto para gentios, no mesmo contexto afirma que através da fé não anulamos a lei, “pelo contrário, confirmamos a lei” (Rm 3:28, 31). Em outro lugar ele (Paulo) declara a mesma verdade com outras palavras: “a circuncisão não significa nada, e a incircuncisão também nada é. O que importa é obedecer aos mandamentos de Deus” (1Co 7:19). Essa obediência deriva da fé e amor a Cristo, implantados pelo Espírito Santo, “pois em Cristo Jesus nem circuncisão ou incircuncisão têm efeito algum, mas sim a fé que atua pelo amor” (Gl 5:6). Jesus, em suas últimas palavras aos discípulos antes da crucificação, falou várias vezes sobre essa obediência que nasce do amor: “Se vocês me amam, obedecerão aos meus mandamentos” (Jo 14:15); “Como o Pai me amou, assim eu os amei; permaneçam no meu amor. Se vocês obedecerem aos meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu tenho obedecido aos mandamentos de meu Pai e em seu amor permaneço” (Jo 15:9, 10); “Vocês serão meus amigos, se fizerem o que eu lhes ordeno” (Jo 15:14). Os adventistas crêem que essa é a obediência por amor a qual Paulo se refere quando escreve que “o amor é o cumprimento da lei” (Rm 13:10). Enquanto os adventistas acreditam que os cristãos são chamados para “a obediência que vem pela fé” (Rm 1:5) e que nós “somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus preparou de antemão para nós as praticássemos” (Ef 2:10), rejeitam energicamente qualquer sugestão de que tal obediência e boas obras tem algum sentido meritório. O Concílio de Trento ensinou em seu Decreto sobre Justificação que a justificação aumenta “por meio da observância dos mandamentos de Deus e da Igreja, fé cooperando com boas obras” também ensina o mérito de boas obras como frutos da justificação23 . Seu cânon sobre justificação pronunciou a seguinte condenação a qualquer um que disser “que a justiça recebida não se conserva nem tampouco se aumenta diante de Deus pelas boas obras, mas que as obras somente são frutos e sinais da justificação que se alcançou, e que não é causa do aumento da mesma – seja 22 Ibid., 247. 23 H. J. Schroeder, trans., Canons and Decrees of the Council of Trent (Rockford, Illinois: Tan Books and Publishers, 1978), 36 e 40-42.
  • 10. 10 excomungado”. Outro anátema condena qualquer um que disser “que as boas obras do homem justificado de tal modo são dons de Deus, que não são também méritos do homem justificado”24 . Em outras palavras, a justificação é aumentada pela obediência e boas obras, não sendo estas apenas dons da graça de Deus, mas também os méritos do cristão justificado. Essa crença foi reconfirmada no Catecismo da Igreja Católica, publicado com a benção papal de João Paulo II25 . O Catecismo também reafirma a posição do Concílio de Trento de que “a Justificação não é apenas a remissão de pecados, mas também a santificação e renovação do homem interior”26 . Esta visão sobre justificação era e ainda é enfaticamente rejeitada por protestantes tradicionais, incluindo os adventistas do sétimo dia27 . Que o tema é bastante relevante no século XXI como foi no século XVI fica evidente pelo fato de que Francis Beckwith, quem por um breve período foi presidente da Sociedade Teológica Evangélica, em maio de 2007 renunciou sua posição e sua filiação na Sociedade, volvendo logo depois (em abril do seguinte ano) à Igreja Católica Romana (igreja na qual cresceu). De acordo com o Christianity Today, Beckwith mudou suas concepções sobre justificação porque “achou a visão protestante, a qual assume que a santificação segue a justificação, inadequada”28 . Beckwith convenceu-se que o ponto de vista Católico Romano sobre justificação “tem mais poder de argumentação para explicar para ambos os textos bíblicos sobre justificação [e] o entendimento histórico da igreja sobre a salvação anterior à Reforma, todos os caminhos levam de volta para a igreja primitiva dos primeiros séculos”29 . Tal fato destaca a suprema importância e centralidade da doutrina da justificação para todo aquele que aceita o princípio da Sola Scriptura. De acordo com o editorial do Christianity Today, os reformadores “corretamente ensinaram que apenas o mérito de Jesus tem validade diante de Deus e que somente através da fé esse mérito poderia ser nosso”30 . Os adventistas concordam totalmente com esta posição. 24 Ibid., 45 (Canon 24) e 46 (Canon 32). 25 “Uma vez que a iniciativa pertence a Deus na ordem da graça, ninguém pode merecer a graça inicial do perdão e justificação, no inicio da conversão. Movido pelo Espírito Santo e pela caridade, podemos então merecer para nós mesmos e para outros as graças necessárias para nossa santificação, para o aumento da graça e da caridade, e para a obtenção da vida eterna” (a ênfase está no texto). Catechism of the Catholic Church (Mahwah, New Jersey: Paulist Press, 1994), 487, parágrafo 2010. 26 Catechism of the Catholic Church, 482, parágrafo 1989. 27 Uma incisiva crítica protestante do Decreto sobre Justificação do Concílio de Trento pode ser encontrada em Martin Chemnitz, Examination of the Council of Trent, Part 1, trans. Fred Kramer (St. Louis, Missouri: Concordia Publishing House, 1971), 455-663. 28 Editorial, “Virtue That Counts: Why Justification by Faith Alone Is Still Our Defining Doctrine,” Christianity Today, Julho de 2007, 20. 29 Collin Hansen, “Leaving for Rome,” Christianity Today, Julho de 2007, 14. 30 Editorial, “Virtue That Counts,” Christianity Today, Julho de 2007, 20.
  • 11. 11 Desta discussão anterior deve ficar claro que os adventistas do sétimo dia acreditam que a guarda dos dez mandamentos, incluindo a observância do Sábado do sétimo dia da semana, é visto como parte da obediência da fé. É o fruto da justificação, nunca a raiz. Cristo refere-se a si mesmo como o Senhor do Sábado (Mc 2:28), obviamente não para abolir o Sábado, mas para que todos os que foram justificados pela fé pudessem seguir seu Senhor na observância do Sábado como um memorial da criação bem como um selo de sua redenção da escravidão do pecado através de Cristo (ver e.g. Ex 20:8-11; 31:12-17; Dt 5:12-15; Ez 20:12, 20). Não há sequer um traço de legalismo em tal observância do Sábado. Se nossa justificação é somente por meio da graça pela fé somente, a obediência pela fé tem algo que ver com nossa salvação? Ou para formular a questão de outra maneira: nossos pensamentos, palavras e atos têm algum papel em determinar nosso destino eterno? Essas são questões cruciais que estão estreitamente relacionadas com o tema do julgamento final. As Escrituras têm muito a dizer sobre esse juízo, não menos que os ensinos de nosso Senhor como registrado nos Evangelhos. Disse Jesus: “Mas eu lhes digo que, no dia do juízo, os homens haverão de dar conta de toda palavra inútil que tiverem falado. Pois por suas palavras você será absolvido (RSV “justificados”), e por suas palavras será condenado” (Mt 12:36-37). Aqui nosso Senhor fala sobre justificação e condenação (as declarações judiciais de inocência e culpa) no contexto do dia do juízo. Obviamente, há um aspecto escatológico para justificação. Os adventistas creem com base nas Escrituras que o dia do juízo é um conceito muito abrangente e muita literatura adventista tem sido publicada sobre o assunto31 . É suficiente dizer que sustentam o juízo como possuindo duas fases distintas, uma investigativa e outra executiva. É a sua crença em um juízo investigativo que tem levado à acusação de que não crêem realmente nos princípios da Reforma de Sola Fide e Sola Gratia. Para concluir, analisemos brevemente a questão. Em Romanos 8:1, Paulo nos diz que “agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus”. Anteriormente havia afirmado que “tendo sido, pois justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo” (Rm 5:1). Tudo isso é uma realidade presente. Em outro lugar está escrito que “o sólido fundamento de Deus permanece firme, selado com essa inscrição: „O Senhor conhece quem lhe pertence‟” (2 Tm 2:19). 31 Ver por exemplo Roy Gane, Who’s Afraid of the Judgment? (Nampa: Idaho: Pacific Press Publishing Association, 2006); Gerhard F. Hasel, “Divine Judgment” em Handbook of Seventh-day Adventist Theology, Commentary Reference Series, Vol. 12, ed. Raoul Dederen (Hagerstown, Maryland: Review and Herald Publishing Association, 2000), 815-856; Frank B. Holbrook, The Atoning Priesthood of Jesus Christ (Berrien Springs, Michigan: Adventist Theological Society Publications, 1996).
  • 12. 12 Algumas vezes argumenta-se que tais textos mostram que para aqueles que estão em Cristo não há necessidade de serem julgados, que o conceito de um juízo investigativo não é bíblico e retira a certeza de salvação dos crentes. Entretanto, esse tipo de raciocínio ignora totalmente o claro ensino da Escritura de que todos serão julgados. O apóstolo Paulo é muito enfático sobre esse ponto. “Pois todos compareceremos diante do tribunal de Deus (…). Assim, cada um de nós prestará contas de si mesmo a Deus” (Rm 14:10, 12); “Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio do corpo, quer sejam boas quer sejam más” (2Co 5:10). Outras passagens da Escritura podem ser incluídas. Salomão escreveu no fim de sua vida cheia de altos e baixos: “agora que já se ouviu tudo, aqui está a conclusão: Tema a Deus e guarde os seus mandamentos, pois isso é o essencial para o homem. Pois Deus trará a julgamento tudo o que foi feito, inclusive tudo o que está escondido, seja bom, seja mal” (Ec 12:13, 14). O apóstolo Pedro nos informa que o juízo começará pela família de Deus. Todos os que em algum momento professaram fé em Deus e em Cristo serão julgados antes “daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus” (1 Pe 4:17). Essas declarações porventura retiram a certeza de nossa justificação? A clara resposta para essa pergunta é: “Não, se permanecemos em Cristo!” Jesus na parábola da videira e os ramos destaca a importância crucial de permanecer nEle. “Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se alguém permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; pois sem mim vocês não podem fazer coisa alguma” (Jo 15:5). E acrescenta que se alguém não permanece nEle será semelhante a um ramo seco que é lançado ao fogo para ser queimado (v. 6). O juízo final revelará quem permaneceu ou não em Cristo. Isso será manifestado se nossa fé em Cristo produziu frutos em obediência de fé ou se é uma fé estéril (cf. Tg 2:17, 26). Isso revelará na presença de todo o universo quem manteve a fé em Cristo e quem perdeu de vista o Caminho, a Verdade e a Vida. A certeza de Paulo na vida eterna estava enraizada no fato de que “ele tinha guardado a fé” (2 Tm 4:7), sua fé em Cristo como seu Salvador e Senhor, o justo Juiz de quem receberia a coroa da justiça. LaRondelle destaca a relação entre a justificação presente dos crentes e sua justificação no juízo final: Paulo baseia nossa certeza de salvação futura na realidade de nossa salvação presente, a certeza de nossa justificação futura na realidade de nossa justificação presente: „Logo, muito mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, seremos por Ele salvos da ira!”(Rm 5:9, ênfase acrescentada; ver também v.17). Em outras palavras, quando Jesus nos
  • 13. 13 justifica, nós temos plena certeza de que Ele nos justificará no juízo final se tão somente permanecermos nEle32 . De um modo diferente, P. T. O‟Brien, colaborador do livro Right with God (Correto com Deus), também destaca a relação entre justificação pela fé e julgamento pelas obras. O autor torna claro que o “alicerce da justificação não está nas obras, nem na fé, mas „na revelação da graça de Deus em Cristo abraçada pela fé‟. As obras são indispensáveis, pois demonstram a presença da verdadeira fé e elas são a evidência de que a pessoa está unida com Cristo em Sua morte e ressurreição”33 . Os adventistas concordam e acreditam que o juízo, seja investigativo ou executivo, é uma boa notícia para todos que (assim como Paulo) tem guardado a fé pela graça de Deus, a saber, a fé em Cristo. Peter M. van Bemmelen é professor emérito de teologia sistemática no Seminário Teológico Adventista na Universidade Andrews. Recebeu seu Th.D. da Universidade Andrews em 1987 e sua dissertação, Issues in Biblical Inspiration: Sanday and Warfield, foi publicada em 1988 pela Andrews University Press. Van Bemmelen trabalhou como pastor, presidente de missão e professor em cinco países diferentes. Ele ensinou mais de trinta anos no Caribbean Union College em Trinidad, Newbold College na Inglaterra, e desde 1993 na Universidade Andrews. Tem contribuído com artigos para vários periódicos e simpósios, dentre os quais Handbook of Seventy-day Adventist Theology (2000), Understanding Scripture: Na Adventist Approch (2006), Christ, Salvation, and the Eschaton: Essays in Honor and Hans K. LaRondelle (2009), e Interpreting Scripture: Bible Questions and Answers (2010). 32 Hans K. LaRondelle, Assurance of Salvation (Nampa: Idaho: Pacific Press Publishing Association, 1999), 99. Herman Ridderbos discute sucintamente o assunto (Judgment According to Works) em seu excelente livro Paul: An Outline of His Theology, trans. John Richard De Witt (Grand Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1975), 178-181. 33 P. T. O‟Brien, “Justification in Paul and Some Crucial Issues of the Last Two Decades,” em Right With God: Justification in the Bible and the World, ed. D.A. Carson, Publicado com a autorização da World Evangelical Fellowship (Paternoster Press; Baker Book House, 1992), 94. A citação dentro da citação foi tirada de Ridderbos, Paul: An Outline of His Theology, 180.