O documento resume os principais pontos sobre como Freud pensava a educação a partir de seus conceitos psicanalíticos. Freud acreditava que a educação era uma tarefa impossível devido às contradições em suas ideias sobre a repressão das pulsões sexuais infantis e a função da sublimação. No entanto, a psicanálise poderia contribuir para os educadores entenderem melhor a psique infantil e direcionar as pulsões de forma mais proveitosa.
2. Sigmund Freud (1856-1939) é o pai da psicanálise e postulador do conceito
de inconsciente.
Nasceu no dia 6 de maio de 1856 em Freiberg (hoje Pribor), pequena cidade
da Morávia, que na época, pertencia à Áustria e hoje está anexada à
Tchecoslováquia.
Seus pais eram judeus e a sua família bem numerosa. Era o mais velho dos
oito filhos do segundo casamento de seu pai.
Assim que se formou Freud (em Medicina) começou a trabalhar no
laboratório de Fisiologia de Ernest Brucke, uma pessoa que inspirava
respeito.
Ingressou, em seguida, no Hospital Geral de Viena, trabalhando em várias
especialidades, destacando as relações com Meynert, um grande
especialista em anatomia do cérebro. Ao afirmar que a Histeria não era um
mal exclusivamente feminino, encontrou em Meynert uma grande
resistência. Deixou-o para trás passando a dedicar-se ao estudo das
doenças nervosas, sendo seu próprio mestre
Em 1885, Freud foi a Paris para conhecer os trabalhos de Charcot, grande
nome da neuropatologia, o terceiro de seus mestres.
3. A superação das idéias de Charcot foi inevitável por causa do
advento da Psicanálise, com melhores caminhos para a tratamento
da histeria. E mais uma vez se repete o movimento freudiano de
superação de abandono dos mestres.
Nos anos em que trabalhou no laboratório de Brucke, Freud
conheceu Joseph Breuer, um clínico geral de renome, 14 anos
mais velho que ele e se tornaram grandes amigos. Em 1896,
escreveram uma obra conjunta: Estudos sobre a Histeria. No
entanto, discordavam num ponto: para Freud, a causa da histeria
era de natureza sexual e com isto Breuer não concordava, e aos
poucos os dois foram se distanciando.
Como queria gerar conhecimento, Freud sabia ser necessário ser
mestre de si mesmo, mas algo inconsciente o impedia e para
remover impedimentos dessa ordem é preciso um analista.
Encontrou-o na figura de Wilhelm Fliess, que desempenhou, sem o
saber, o papel de analista,
4. Freud pensa a Educação?
Através dos conceitos da Psicanálise podemos refletir sobre as várias áreas
do conhecimento humano. Assim é com a Educação.
Freud tem poucos textos que abordam diretamente a questão educacional,
entre eles podemos citar O interesse científico da psicanálise, de 1913 e
Algumas reflexões sobre a psicologia do escolar, de 1914;
Porém, a educação e, principalmente, a relação professor-aluno podem
ser “lidas” através da Psicanálise.
Nesse último texto citado acima, Freud é convidado a escrever para
comemorar o jubileu de seu antigo colégio, e ele o faz focando a figura de
seus professores e os sentimentos que os alunos dedicavam a eles. Escreve
Freud,
Nós os cortejávamos ou lhes virávamos as costas; imaginávamos
neles simpatias e antipatias que provavelmente não existiam;
estudávamos seu caráter e sobre estes formávamos ou
deformávamos o nosso. (...) Estávamos, desde o princípio,
igualmente inclinados a amá-los e a odiá-los, a criticá-los e a
respeitá-los. A psicanálise deu o nome de “ambivalência” a essa
facilidade para atitudes contraditórias. (1914/1974, p.286)
5. Educação: uma relação
possível?
Freud pensa a educação possibilidades e limites para as
relações entre a Psicanálise e a Educação.
Diante de seus achados sobre a sexualidade e sua
influência nas doenças nervosas, especialmente devido à
repressão, Freud pensa a relação entre sexualidade e
educação.
Se as idéias incompatíveis são quase sempre de
natureza sexual e intoleráveis ao Eu o que há que
insuportável na sexualidade? A resposta irá levá-lo à
moral e conseqüentemente à educação, pois é através
desta que a moral de difunde, por exemplo, através das
noções de pecado e de vergonha que se deve ter
necessariamente diante das atividades sexuais.
6. 1) Sexualidade infantil, pulsões parciais e
educação no decorrer da constituição sexual dos
indivíduos estão presentes práticas de natureza
perversa devido à presença das pulsões parciais,
que ligam o desejo a objetos variados e, muitas
vezes, perversos, pois desviados de seus objetos
precisos.
Dentre estas se destaca o exibicionismo, a
curiosidade exagerada dirigida aos órgãos sexuais
dos companheiros, a manipulação obsessiva dos
seus próprios órgãos sexuais Freud pensou que os
educadores e pais poderiam ser esclarecidos sobre
estas características da sexualidade infantil e,
especialmente, sobre o papel da sublimação
7. 2) sublimação e educação a sublimação
é um mecanismo de defesa do ego que
desvia parte da pulsão sexual, através da
repressão, para objetos não-sexuais,
dessexualizados, socialmente aceitos e
espiritualmente elevadas.
Por exemplo, a pulsão parcial anal de
manipular fezes pode ser sublimada em
parte para a atividade de esculpir argila
(objeto dessexualizado).
8. 3) a Educação Sexual das crianças -
Como Freud pensa a educação como forma
de canalizar as pulsões parciais para a
sublimação? Através de ações
educativas que se proponham a direcionar
as pulsões parciais e perversas para o
caminho da sublimação. No entanto, como
arrancar o “mal” da criança se no futuro
este mal se tornará a fonte do “bem”
(sexualidade adulta)?
9. A desilusão de Freud
com a Educação
Neste aspecto, Catherine Millot afirma que Freud
poderia ser aparentemente comparado a um
pedagogo clássico que vê na criança um mal
originário idéia identificada aos educadores
religiosos.
Deixa de ser identificado com o pedagogo clássico a
partir do momento em que não mais preconiza o
desenraizamento do “mal” que existe na
criança, mas propõe a sua canalização em
direção a valores superiores, aos bens culturais
e de socialmente produtivos sem perversão
não há sublimação e sem esta não há cultura.
10. Deste modo, Freud afirma que os educadores
precisam ser informados de que a tentativa de
supressão das pulsões parciais na infância é
inútil e pode gerar efeitos nocivos como a
neurose.
Os educadores poderiam reduzir assim a coerção e
dirigir de forma mais proveitosa a energia que move
as pulsões pulsão escópica (ligada ao olhar)
pode ser transformada em curiosidade
intelectual já que esta tem um papel importante
no desenvolvimento do desejo de saber. Mas
Freud nunca se preocupou em criar métodos para a
aplicação efetiva de suas idéias esperava que os
próprios educadores se ocupassem disto.
11. Freud demonstrava desconfiança sobre a Educação,
refletida em um questionamento: por que a Educação
sempre foi tão repressora? Para responder a esta
questão, Freud respondia que a hostilidade da civilização,
representada pela Educação repressora, é semelhante à
defesa que o eu infantil levanta contra a pulsão sexual;
assim, a civilização, representada pela Educação,
exagera e produz efeitos semelhantes aos que os
conflitos reprimidos produzem no eu, ou seja, a
neurose.
Desta forma, Freud declara que a sociedade, assim como
a própria Educação, são neuróticas, evidenciando o
que chama de “vocação natural para a neurose”
expressa pelo ser humano, não recorrendo a explicações
sociopolíticas como faria Reich e Marcuse a repressão é
uma das armas que a opressão política utiliza para
garantir a submissão das massas.
12. Apesar de sua desconfiança da educação sobre a
capacidade de estimular a sublimação das pulsões, Freud
declara que o educador é aquele que deve buscar para o
educando o equilíbrio entre o prazer individual (inerentes à
satisfação das pulsões sexuais) e as necessidades sociais
(garantidas pela repressão e sublimação das pulsões).
No decorrer de suas investigações, Freud chega à conclusão
de que a Educação é uma profissão impossível pois só pode
ser pedagogo aquele que for capaz de penetrar na psique
infantil o que para os adultos em geral é uma tarefa
impossível pois não somos capazes de compreender a nossa
própria infância, que está inacessível devido aos
mecanismos de defesa, especialmente a repressão.
13. Por que a Educação é impossível?
FREUD CHEGA À CONCLUSÃO DE QUE A EDUCAÇÃO É UMA TAREFA
IMPOSSÍVEL DEVIDO ÁS CONTRADIÇÕES ENCONTRADAS EM SUAS
PRÓPRIAS IDÉIAS SOBRE A TAREFA EDUCATIVA EM UMA PERSPECTIVA
PSICANALÍTICA. IMPOSSÍVEL, NESTE CONTEXTO, NÃO SIGNIFICA
IRREALIZÁVEL, MAS DIFÍCIL DE SER ALCANÇADO EM SUA INTEGRALIDADE.
O Inconsciente, objeto de estudo da Psicanálise vai contribuir mais ainda
para a proposição de que a Educação é uma tarefa impossível. Ao descobrir
a existência dessa instância, Freud retira do ser humano a idéia de que este
pode controlar totalmente seus atos e pensamentos, afirmando que não
somos senhores absolutos de nossos próprios comportamentos. O ser
humano é regido por forças que estão no seu interior mas que esse
desconhece. A vida psíquica não se resume aos fatores conscientes
(percepção, atenção, memória, intencionalidade, etc) mas está apoiada em
manifestações inconscientes. Segundo Kupfer (1992) ao apresentar essa
idéia Freud acrescenta mais uma ferida narcísica àquelas anteriormente
trazidas por Copérnico e Darwin, ao afirmarem, respectivamente, que a
Terra não é o centro do sistema solar e o homem não é o centro da criação.
14. Uma outra afirmação contundente de Freud é a existência da pulsão de morte
juntamente com a idéia do princípio do prazer, ou seja, a necessidade de satisfação das
pulsões sexuais que levariam o organismo à busca da sensação de prazer ou à evitação
da sensação de desprazer, haveria uma força contrária que levaria o ser humano a
buscar a satisfação de necessidades destrutivas, mas que fornecem um benefício
secundário. Por exemplo, ficar doente para ter atenção dos familiares.
A idéia deste “monstro” destrutivo dentro de cada um de nós seria mais um
impossibilitante, segundo Freud para que a Educação seja possível. Como educar,
buscando o desenvolvimento do individuo, motivar a crença na vida, no conhecimento,
se todo ser humano vive em conflito com a idéia da vida e da morte. Assim, a idéia do
inconsciente e da pulsão de morte não combinam com os ideais educacionais de vida,
bem-estar e felicidade próprios da Educação.
A ação do inconsciente implica na falta de controle do indivíduo sobre certos impulsos e
comportamentos, os quais também são incontroláveis pelo educador.
A educação exerce a sua ação através das palavras, concentrando seus esforços na
tentativa d estimular pelo discurso dirigido à consciência, os indivíduos a se conduzirem
por uma direção determinada. No entanto, a realidade do inconsciente ensina que a
palavra escapa ao falante ao falar um educador pode perder-se, revelar-se na direção
contrária à determinada. Assim, a palavra é ao mesmo tempo lugar de poder e de
submissão, de força e fraqueza, de controle e descontrole.
O impossível aqui reside na falta de controle e de direção que estão na base do sistema
pedagógico.
15. Como a Psicanálise
pode contribuir para o educador?
A partir da morte de Freud seus
discípulos buscaram respostas para
esta questão, fracassando na maioria
das vezs
16. Psicanálise e Educação na era pós-freudiana - Uma
História de Casamentos desfeitos:
A aplicação da Psicanálise à Educação
Foram pelo menos três as direções tomadas pelos teóricos
interessados no casamento da Psicanálise com a Educação:
A primeira tentativa de criar uma nova disciplina, a
Pedagogia Psicanalítica, empreendida principalmente por
Oskar Pfister e Hans Zulliger, na Suíça no início do Século
XX.
A segunda constitui no esforço a que se dedicaram alguns
analistas para transmitir a pais e professores a teoria
psicanalítica, imaginando que estes, de posse desse
conhecimento, pudessem evitar que as neuroses se
instalassem em seus filhos e alunos. Anna Freud, a filha do
Freud, foi a principal representante desse grupo.
A terceira direção, mais recente, não diz respeito ao
exatamente casamento da Psicanálise com a Educação.
Trata-se de uma tentativa mais difusa de transmitir a
Psicanálise a todos os representantes da cultura
interessados em ampliar a sua visão de mundo. Iniciou
principalmente na França dos anos 60.
17. Os casamentos da Psicanálise
com a Educação:
A Psicanálise até hoje nunca se casou
verdadeiramente com a Educação. Na
verdade Psicanálise tem comparecido aos
encontros marcados na condição de
mestre, de transmissor de verdades sobre
a criança que ela julga serem
desconhecidas pela Educação.
“O sonho Freudiano, que era de colocar a
Psicanálise a serviço de todos, acabou por
fazer de análise, paradoxalmente, pelo viés
institucional, um instrumento de dominação
e de seleção”.
18. teoria freudiana da
aprendizagem
O que habilita uma criança para o mundo do conhecimento? Em que
circunstancias o conhecimento se torna possível?
Sobre o tema aprendizagem especificamente não se encontra texto escrito
por Freud. Sua preocupações eram estritamente clínicas. No entanto,
gostava de pensar nos determinantes psíquicos que levam alguém a ser um
“desejante de saber” cientistas, crianças.
A abordagem deste tema na perspectiva psicanalítica significa responder à
pergunta: o que se busca quando se quer aprender algo? O processo de
aprendizagem depende da razão que motiva a busca de conhecimento.
Para Freud, há um momento decisivo na vida de todo ser humano que é o
momento da descoberta e interpretação dada ás
diferenças sexuais anatômicas, no decorrer da fase fálica e no Complexo de
Édipo. Esta descoberta implica o fato de que alguma coisa está faltando,
que algo se perdeu. Esta constatação da falta e da perda leva à angustia de
castração; basicamente é esta angústia e outras relacionadas ás diferenças
que a criança percebe no decorrer do Complexo de Édipo que a leva ao
desejo de saber.
As investigações da criança iniciam-se no campo da sexualidade e da
relação com os pais (papeis feminino e masculinos, mistérios da concepção
e do nascimento) e, após reprimidos, estes impulsos evoluem para outros
tipos de investigação, agora de caráter acadêmico.
19. O que se espera é que ao final do período edipiano a criança reprima parte das pulsões
e sublime outra parte em psulões de saber, associadas a pulsões de domínio e pulsões
de ver. Assim, o desejo de saber associa-se ao desejo de minar, de ver e de sublimar.
No caso da sublimação, as crianças deixam de lado as curiosidades sexuais e se
dedicam à necessidades próprias de sua constituição. Precisam renunciar ao saber
sobre a sexualidade e deslocar as pulsões para outros objetos não – sexuais.
Pulsão de domínio sadismo e agressividade ter que destruir para saber ex:
dissecação de animais para estudar anatomia e fisiologia. Esta pulsão de domínio
associa-se à idéia da curiosidade e é importante que o educador esteja consciente dessa
dimensão do funcionamento psíquico presente em todo ato de conhecimento.
A pulsão visual não é um elemento acessório na esfera das pulsões sexuais ligada à
idéia da fantasia da cena primária (fantasia de ver a cena de relação sexual entre os
pais) sublimada e associada à pulsão de domínio transforma-se em pulsão de saber
são seus derivados o prazer de pesquisar, o interesse pela observação da natureza, o
prazer de viajar (ver coisas novas).
De modo geral, para Freud, a mola propulsora do desenvolvimento intelecetual é o
desenvolvimento sexual. A inteligência funda-se em “restos da sexualidade” (Maud
Manonni).
Esta seria a grande diferença entre a teoria psicanalítica e qualquer outra
teoria cognitiva.
20. A transferência na relação prof – aluno
Sabemos que o ato de aprender sempre pressupõe uma relação com outra
pessoa: a que ensina. Essa pessoa que ensina, o professor, é colocado pelo
aluno numa determinada posição que pode ou não propiciar a
aprendizagem. Entre esses dois personagens do processo de ensino-
aprendizagem estabelece-se um campo de relações, que propicia as
condições para o aprender, denominado transferência. Transferir é o
mesmo que deslocar algo (sentido) de um lugar para o outro, sendo
que essas transferências atribuem um sentido especial à uma figura
determinada pelo desejo. Na relação professor-aluno a
transferência se produz quando o desejo de saber do aluno se liga a
um elemento particular que é a pessoa do professor.
Dessa forma, o conteúdo a ser ensinado deixa de ser o centro do processo
pedagógico e a figura do professor e sua significação para o aluno é que
passam a ser a chave para o aprendizado. Se um aluno, por alguma razão
consciente ou não, não se sente a vontade com determinado professor, não
consegue autorizá-lo a lhe ensinar algo, não gosta do seu jeito, sua postura,
sua voz, com certeza, haverá dificuldades em aprender conteúdos que
emanem desse professor, ainda que possam parecer interessantes ou
necessários. Neste caso, o aluno pode ter transferido algo negativo para a
figura desse professor que passou a ocupar um lugar de recusa na psique
desse aluno, um lugar que nunca foi da pessoa real do professor, mas que,
por alguma razão, esse passa a ocupar devido a transferência do aluno.
21. É importante lembrarmos que a transferência é um
processo inconsciente, não escolhemos racionalmente amar
ou odiar esse ou aquele professor ou transferir sentimentos
bons ou ruins dependendo da situação. A transferência é
algo que acontece sem que nos demos conta, onde o desejo
inconsciente busca ligar-se a “formas” (professor, analista)
para esvaziá-las de seu valor real e colocar ali o sentido que
nos interessa. Afirma Kupfer,
Instalada a transferência, tanto o analista como o professor
tornam-se depositários de algo que pertence ao analisando
ou ao aluno. Em decorrência dessa “posse”, tais figuras
ficam inevitavelmente carregadas de uma importância
especial. E é dessa importância que emana o poder que
inegavelmente têm sobre o indivíduo. (1992, p. 91)
22. A figura do professor passa a fazer parte do cenário inconsciente do aluno,
recebendo uma significação própria e, a partir de então, esse só será escutado
e entendido através desse lugar que é colocado. Na verdade o professor
servirá como uma “forma” esvaziada de seu valor real que receberá
significações através das transferências do aluno.
Este com certeza não é um lugar fácil de suportar, afinal, o professor também é um
sujeito desejante, que tem vida própria. Só o desejo do professor justifica que ele
esteja nesse lugar, mas estando ali, ele precisa renunciar a esse desejo para assumir o
lugar de transferência e, assim, possibilitar a aprendizagem.
O professor também transfere, por sua vez, conteúdos aos seus alunos. A esse conjunto
de reações inconscientes do professor/analista à pessoa do aluno/analisando, Freud deu
o nome de contratransferência. As influências dos alunos sobre os sentimentos
inconscientes do professor são freqüentes e resultam nos mais variados tipos de
comportamentos e reações por parte de quem ensina. Um professor, por mais que não
queira, pode desenvolver maior afinidade com determinado aluno, ouvir melhor suas
pocições, encará-lo com os olhos do sucesso, estimulá-lo a crescer com mais afinco, ao
passo que, com outro aluno, pode desenvolver uma relação de distanciamento, de
recusa, de não envolvimento. O que teria causado reações tão diferentes frente a
supostos objetos tão iguais, ou seja, alunos? O fato é que alunos são pessoas,
constituídas por tramas originais, que causam reações aos seus interlocutores, sendo o
professor, um deles.
23. Conhecer-se melhor é uma boa pedida para
que os professores possam entender a
dinâmica transferencial como um jogo
simbólico útil ao processo de ensino e
aprendizagem.
Quanto mais o professor buscar se
reconhecer no processo pedagógico, mais
facilmente ele poderá lidar com as
manifestações transferenciais e
contratransferenciais em sala de aula,
possibilitando o crescimento de seus
alunos, assim como o seu próprio
crescimento, por meio desse vínculo
específico e necessário ao aprendizado
significativo.
24. Referências de Freud à educação
Podemos afirmar que, basicamente, as contribuições de Freud à educação
dizem respeito primeiramente à transmissão de conhecimento através dos
Inconscientes. Devemos esclarecer que o Inconsciente é o conceito
fundamental da psicanálise, sendo considerado por ele a terceira ferida
narcísica da humanidade (Freud, 1917 a e b). Com esse conceito, podemos
nos conceber também como sujeitos do desconhecimento, no qual algo
sempre escapa à pretensão de controle consciente, como, por exemplo, de
tudo o que aprendemos.
Outra referência de Freud à educação diz respeito à importância da relação
professor-aluno, o que nos leva a pensar na questão da transferência sob o
aspecto de um fenômeno que não se passa apenas entre paciente e
terapeuta, mas que perpassa todas as relações humanas. Embora o que se
passa na escola seja diferente, na psicanálise a transferência constitui seu
próprio instrumento de trabalho.
Finalmente, uma terceira contribuição encontrada nos textos freudianos
aponta para o papel da educação como auxiliar da sublimação sexual (já
que seus argumentos afirmam que a curiosidade intelectual é derivada da
curiosidade sexual). Quanto a essa última referência, devemos ter em
mente que esse desvio pulsional necessário não deve ser excessivo e chegar
a inibir o sujeito do desejo.
25. Alguns de seus textos que mencionam a educação são:
- "Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise" (Freud, 1912),
no qual, ao ligar a atividade educativa à capacidade sublimatória e ao se
referir às indicações feitas pelos professores de livros a serem lidos, alerta
para o risco de os educadores quererem modificar os alunos à sua imagem,
tomando para si a função de modelo.
- "Algumas reflexões sobre a psicologia escolar" (Freud, 1914), no qual
afirma que a aquisição de conhecimento depende da relação do aluno com
seus professores e seus colegas, numa referência à relação transferencial
que faz com eles, enquanto representantes de seus pais e irmãos. Em suas
palavras: "... é difícil dizer se o que exerceu mais influência sobre nós e
teve importância maior foi nossa preocupação pelas ciências que nos eram
ensinadas, ou pela personalidade de nossos mestres" (p. 286). É importante
mencionar que o conceito de transferência designa o processo utilizado
pelos desejos inconscientes para, não só na relação analítica, repetir nossas
experiências infantis vividas, agora, como atualidade.
- "Prefácio à juventude desorientada de Aichhorn" (Freud, 1925). Nesse
texto, ao mencionar a importância do professor para o aluno - posto que
aquele pode orientá-lo, servindo como modelo -, Freud aponta para o valor
profilático de uma psicanálise para o próprio educador. Este não tem,
portanto, que se contentar somente com uma instrução teórica da teoria
psicanalítica.
26. - "Explicações, aplicações e orientações" em Novas Conferências
Introdutórias à psicanálise (Freud, 1933), no qual se refere à
tentativa da "educação psicanalítica" procurar um "ponto ótimo"
que possibilite "proibição de pulsão" sem "doença neurótica".
Freud afirma que cada criança tem seu ponto. Isso nos leva a
questionar o valor de uma educação de massa e pré-programada,
pois nos parece colocar aí a questão da singularidade. A partir
dessa menção, podemos dizer que o professor não tem controle
total dos efeitos de suas palavras sobre os alunos. Não saberá o
que o aluno fará com aquelas idéias e com o que as associará.
- "Análise terminável e interminável" (Freud, 1937), no qual
afirma que o psicanalisar, o educar e o governar são profissões
impossíveis, posto que sempre chegam a resultados
insatisfatórios.
Entretanto, a partir das indicações deixadas por Freud, que
desenvolvimento essas relações sofreram nos últimos anos?
27. Problemas de aprendizagem na abordagem
psicanalítica
Os problemas de aprendizagem podem ter múltiplas
determinações, desde inadequações didáticas até aquelas
dificuldades construtivas do conhecimento, determinados por
fatores multi-causais. Outras dificuldades de aprendizagem podem
ser pensadas desde uma perspectiva psicanalítica clássica, tais
como a articulação com os ideais, inibições secundárias a
sintomas, mal-estares nos intercâmbios escolares, etc. Sob a
denominação de dificuldades de aprendizagem podemos
englobar os aspectos mais neuróticos e secundários do
psiquismo e que permitem fazer intervenções, seja no plano
psicanalítico, seja no plano psicopedagógico. Porém, quando
falamos em transtornos da constituição do pensamento, da
produção simbólica, temos de nos deter em uma visão que seja
capaz de entender os processos de subjetivação e trabalhar com
uma teoria adequada da simbolização e da constituição psíquica.
Estamos num terreno de falhas de base para a aprendizagem, tais
como a não constituição da lógica aristotélica com as categorias da
classificação, da temporalidade, da negação. Estes são problemas
que remetem ao não constituído do ego e tem que ser resolvido
para que apareça, por um lado, a possibilidade de organização
desta lógica e, por outra parte, a organização de um ser que possa
perguntar-se por si mesmo e pelo universo, um lugar onde
instalar-se como sujeito.