O documento é uma sentença trabalhista que condena parcialmente a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos a pagar indenização por danos morais no valor de R$80.000,00 a Francisco Silva da Costa, que sofreu abalos psicológicos após um assalto à agência onde trabalhava. A empresa foi considerada responsável por não garantir segurança adequada aos empregados.
DECISÃO SOBRE DANO MORAL APÓS ASSALTO EM AGENCIA DOS CORREIOS
1. PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 14ª REGIÃO
1ª VARA DO TRABALHO DE PORTO VELHO
Rua Prudente de Moraes, 2313, Centro, PORTO VELHO - RO - CEP: 76801-039
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PROCESSO Nº 0010021-32.2014.5.14.0001
RECLAMANTE(S): FRANCISCO SILVA DA COSTA
RECLAMADO(S): EMPRESA BRASILEIRA DE
CORREIOS E TELEGRAFOS
SENTENÇA
Vistos, etc.
FRANCISCO SILVA DA COSTA ajuizou a
presente reclamação trabalhista contra EMPRESA
BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS
alegando que a agência onde trabalha em Candeias de
Jamari sofreu assalto a mão armada, em razão do que tem
sofrido abalos de ordem psicológica, pelo que devem ser
ressarcidos por danos morais; que em razão de contratação
de profissional para haver seus direitos requer honorários
contratuais. Junta documentos.
Regularmente notificada a reclamada
compareceu à audiência e contestou a ação alegando, em
2. preliminar, a ilegitimidade passiva e, no mérito, sustenta
que a questão posta pelo reclamante é de ordem pública,
pelo que não pode ser responsabilizada; que não cabe
condenação em verba honorária. Pede a improcedência da
ação. Junta documentos.
Na instrução processual foi dispensado o
depoimento pessoal das partes, que declararam não haver
testemunhas e, não havendo mais provas a produzir, foi
encerrada a fase probatória do processo.
Em razões finais as partes se reportaram ao
alegado e provado.
Foram infrutíferas as tentativas de conciliação.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO.
Ilegitimidade passiva “ad causam”.
A legitimidade das partes deve ser aferida em
abstrato. É o que se convencionou chamar de teoria da
asserção, segundo a qual, afirmando o autor possuir
direitos em face da reclamada, esta possui legitimidade
para ocupar o polo passivo da demanda. Todavia, o
reconhecimento ou não de sua responsabilidade é matéria
que concerne ao mérito da demandae como tal deve ser
analisado.
Indenização por dano moral.
O reclamante alega que a agência da
reclamada onde trabalha, na cidade de Candeias de Jamari,
sofreu assalto a mão armada, e desde então tem sofrido
3. abalos de ordem psicológica, pelo que deve ser ressarcido
por danos morais.
A reclamada, por seu turno, sustenta que não
lhe cabe responder pelos efeitos decorrentes do assalto, eis
que o evento foi praticado por terceiros, portanto, se houve
seqüelas, estas não podem ser atribuídas a seu
comportamento omissivo ou comissivo, mesmo porque a
questão relaciona-se com segurança pública, cuja missão é
do Estado.
Aduz, ainda, que é empresa pública criada
para explorar e prestar os serviços postais em todo o
território nacional e, embora tenha incluído no rol dos seus
serviços os denominados serviços financeiros postais
especiais, denominados de Banco Postal, tudo em sintonia
com as resoluções do Banco Central e Portaria do
Ministério das Comunicações, não sofreu nenhuma
transmudação em sua natureza jurídica, muito menos suas
agências foram transformadas em agências bancárias
típicas, de modo que tais atividades não se tratam de
atividade de risco.
Primeiramente deve ser registrado que o caput
do artigo 2º, da CLT, estabelece que:
Considera-se empregador a empresa,
individual ou coletiva, que, assumindo
os riscos da atividade econômica,
admite, assalaria e dirige a prestação
pessoal de serviço.
Partindo dessa premissa, temos que o
legislador, com o intuito de proteger o empregado,
personificou a empresa como objeto e não como sujeito de
direitos, devendo ser ressaltado que o termo empresa
representa a atividade produtiva decorrente da atuação do
4. conjunto de bens e recursos humanos destacados e
utilizados para obtenção de lucro. Quando a lei personifica
a empresa, esta assume a posição de empregador, passa a
ocupar um dos polos da relação empregatícia, de forma
que nenhuma alteração em sua estrutura jurídica ou
mudança de titularidade do seu detentor afeta o contrato
de trabalho, com fundamento no disposto nos artigos 10 e
448 da Consolidação das Leis do Trabalho.
O caso em tela tem como eixo o pedido de
indenização por danos morais decorrentes de sequelas
produzidas em razão da ocorrência de assalto a mão
armada ocorrido no local de trabalho do reclamante,
devendo ser ressaltado que a ocorrência do assalto a mão
armada é fato incontroverso nos autos.
A existência de sequelas decorrentes do evento
assalta a mão armada também está demonstrada, pois o
documento ID 409860 (CAT) demonstra que o reclamante
realmente sofreu trauma psicológico, com diagnóstico de
stress grave decorrente de assalto ocorrido na agência em
que trabalha.
Todavia, ainda que a proteção dos cidadãos
seja obrigação do Estado, é dever do empregador velar
pela integridade física de seus empregados e o fato da
reclamada alegar ter tomado algumas medidas preventivas
em relação à segurança e integridade física de seus
empregados não foi o bastante para evitar o ocorrido, pois
a verdade é que o local de trabalho do reclamante não
ficou imune à ocorrência do assalto registrado no boletim
de ocorrência de ID 409861.
É evidente, e inclusive confessado pela
reclamada, que o funcionamento do banco postal gera um
acréscimo na movimentação de numerário, o que
5. fatalmente torna a agência mais visada e até alvo fácil para
a prática de assaltos.
A partir do momento em que passou a realizar
atividades típicas de uma agência bancária, a reclamada
atraiu para si a obrigação de adequar-se às normas de
segurança destinadas aos estabelecimentos bancários,
obrigação cujo cumprimento restou evidenciado no
presente feito, daí emergindo da situação a fragilidade das
normas de segurança no ambiente de trabalho, expondo,
por isso, o empregado a risco constante, máxime se for
considerado que o liame empregatício perdura.
Com efeito, a Lei n. 7.102/83, que dispõe
sobre segurança para estabelecimentos financeiros,
estabelece normas para constituição e funcionamento das
empresas particulares que exploram serviços de vigilância
e de transporte de valores, e dá outras providências, em
seu artigo 2º assim dispõe:
Art. 2º - O sistema de segurança
referido no artigo anterior inclui
pessoas adequadamente preparadas, assim
chamadas vigilantes; alarme capaz de
permitir, com segurança, comunicação
entre o estabelecimento financeiro e
outro da mesma instituição, empresa de
vigilância ou órgão policial mais
próximo; e, pelo menos, mais um dos
seguintes dispositivos:
I - equipamentos elétricos, eletrônicos
e de filmagens que possibilitem a
identificação dos assaltantes;
6. II - artefatos que retardem a ação dos
criminosos, permitindo sua perseguição,
identificação ou captura; e
III - cabina blindada com permanência
ininterrupta de vigilante durante o
expediente para o público e enquanto
houver movimentação de numerário no
interior do estabelecimento.
Considerando que a reclamada, ao explorar
atividade que implica movimentação financeira, ainda que
de pequeno valor, não pode alegar que um assalto é um
fato imprevisível ou de força maior.
Assim a proliferação de postos do gênero
representa burla aos requisitos contidos na Lei 7.102/83,
que dispõe sobre a segurança para estabelecimentos
financeiros com a criação de uma divisão nada
convencional: de um lado, instituições financeiras
protegidas para aqueles que usam serviços de grande
monta; de outro, os postos com precária segurança para a
população mais carente.
Além do que, a empresa reclamada está
obrigada a garantir a segurança de seus empregados,
conforme preceitua a Constituição Federal em seu artigo
7º, inciso XXII, que diz:
São direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social: –
redução dos riscos inerentes ao
trabalho, por meio de normas de saúde,
higiene e segurança.
Nesse caminho, inegavelmente existe a
possibilidade de responsabilização do empregador pelo
7. dano sofrido, pois assumiu os riscos do ocorrido ao
permitir que seus empregados laborem com medida de
proteção inócua, pelo que agiu com culpa ao expor seu
empregado ao risco da atividade que realizava, já que
evidentemente a agência em que laborava o reclamante
não estava devidamente preparada e protegida para a
prestação de serviços bancários, ainda que básicos como
se refere a reclamada.
Não basta, porém, que se verifique a conduta
culposa do empregador, pois deve estar devidamente
caracterizado o sofrimento íntimo do ofendido que, no
caso concreto, é dispensanda a comprovação efetiva dos
danos, que devem ser presumidos por ser inegável o
sofrimento psicológico de quem é vítima de assalto a mão
armada, sendo que o prejuízo de natureza
extrapatrimonial, neste caso, o denominado dano moral
puro, independe de comprovação, por tratar-se de dano “in
re ipsa”.
Tal entendimento decorre do fato de que os
danos de natureza moral são de tal ordem que, em alguns
casos, impossibilitam ou dificultam a comprovação, como
ocorre nos casos em que os prejuízos foram
experimentados em esfera extremamente particular do
ofendido e, na hipótese dos autos, a situação fática
delineada é capaz de configurar dano injusto e
indenizável.
Em relação ao quantum indenizatório, deve ser
salientado que a indenização deve representar para a
vítima uma sensação capaz de amenizar de alguma forma
o sofrimento impingido, proporcionando uma satisfação
em justa medida, de modo que não ocasione
enriquecimento sem causa para a parte demandante, além
de que, deve-se, ainda, considerar que a indenização por
8. dano moral possui também um caráter punitivo, no sentido
de que a conduta lesiva do ofensor não fique impune,
como forma de reprimir atitudes semelhantes.
Assim, considerando o conjunto probatório
dos autos, o tempo de prestação de serviços para o
reclamado, os fatos apresentados colocando em risco a
própria vida do funcionário, gerando sentimentos de
medo, pavor e insegurança, acarretando inclusive a
necessidade de tratamento psicológico para tentar superar
o trauma, bem como o porte econômico da demandada e o
salário do reclamante, razoável o arbitramento de
indenização por dano moral no valor de R$80.000,00.
Reparação Danos Materiais.
O reclamante alega que sofreu dano material
em razão da necessidade de contratar e remunerar
advogada para defesa de seus interesses.
A defesa não admite o dano pretendido ao
afirmar que no processo do trabalho não cabe condenação
em verba honorária.
Ressalvando entendimento pessoal em sentido
contrário, deve ser salientado que a matéria em debate já
foi enfrentada pelo Tribunal Superior do Trabalho em
seguidos julgados e a decisão tem sido invariavelmente
para não reconhecer a pretensão deduzida, tendo como
referência o fato de que no processo do trabalho só é
possível condenação em verba honorária nos casos
previstos em lei, o que não é o caso versado nestes autos.
Assim sendo, a pretensão deduzida deve ser
indeferida.
CONCLUSÃO
9. Diante do exposto, e pelo mais que dos autos
conste, julgo PROCEDENTE, EM PARTE, a
reclamação trabalhista que FRANCISCO SILVA DA
COSTA ajuizou contra EMPRESA BRASILEIRA DE
CORREIOS E TELÉGRAFOS e, na forma da
fundamentação precedente, que integra o presente julgado,
condeno a reclamada, a cumprir as seguintes obrigações:
1. Pagar ao reclamante indenização por danos morais no
valor de R$80.000,00.
2. O DL 75/66 determina que a atualização monetária
deve ser contada a partir da época própria para o
pagamento, assim entendido o 5º dia útil do mês
subsequente ao trabalhado, aplicando-se o
entendimento do art. 459, § 1º da CLT (súmula 381,
TST).
3. Os juros de mora serão computados do ajuizamento
da ação, à base de 1% ao mês, de forma simples, na
forma estabelecida no artigo 883 da CLT e súmula
200 do TST.
Liquidação por simples cálculos.
Os demais pedidos são improcedentes.
Fica registrado que a parcela deferida a título
indenização por danos morais, é de natureza indenizatória.
Custas, pela reclamada, no importe de
R$1.600,00, calculadas sobre R$80.000,00, valor arbitrado
provisoriamente para a condenação.
Intimem-se as partes.
Porto Velho, 14 de maio de 2014
10. LAFITE MARIANO
Juiz do Trabalho
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