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Florida Christian University - FCU
PhD – Doctor of Philosophy in Business Administration
Augusto Cury
Programa Freemind como Ferramenta Global para
Prevenção de Transtornos Psíquicos
Orlando, Florida - USA
2013
AGRADECIMENTOS
Tenho muito que agradecer a notáveis pessoas por incentivar, apoiar, praticar e
contribuir com essa tese. Sem elas, esse programa não teria asas para voar. Agradeço ao
doutor Anthony B.Portigliatti, as empresas Abril Educação, Abril-mídia, CPFL, ao
grupo YPÊ, Usina Colorado, pela sua preocupação em formar uma juventude
mentalmente saudável e intelectualmente pensante; aos distintos irmãos Martelli e Paulo
Martelli e sua equipe pela dedicação altruísta; ao ilustre amigo Dr. Laco; a Secretaria da
Justiça do Estado de São Paulo, ao ministério da Educação, da Saúde, a Polícia Federal,
OMS (Organização Mundial de Saúde) pela dedicação à prevenção e/ou ao combate ao
tráfico de drogas; aos meus amigos Marcos, Tomas e Regina da Editora Sextante por
seu desejo de contribuir com uma sociedade mais solidária e inteligente, e a psicóloga
Vanessa Veríssimo pela colaboração no programa FREEMIND. Agradeço ainda a Dra.
Juliana Leonardi por levar a capacitação de multiplicadores do Programa FREEMIND a
diversos educadores, cuidadores, advogados, jovens e lideranças da paz nas cidades de
Mogi Guaçu, Mogi Mirim, Campinas e Americana no ano de 2013, bem como a todos
os professores de todas as escolas que se dedicam à prevenção como melhor forma de
promover a saúde psíquica; a Camila Cury, Carolina Cury e ao Bruno Oliveira e a todo
o corpo de psicólogos, pedagogos e funcionários do meu instituto (Instituto Augusto
Cury) e da Escola da Inteligência, e aos mais de 100 mil alunos que aplicam seus
programas, que objetivam promover a saúde emocional, relações saudáveis e as funções
mais complexas da inteligência, como pensar antes de reagir, colocar-se no lugar dos
outros, filtrar estímulos estressantes, resiliência, raciocínio complexo, etc. E a todos os
pacientes que atendi ao longo de mais de vinte mil sessões de psicoterapia e consultas
psiquiátricas. Essa lista é completamente injusta, seja no elogio aos aqui listados, seja
na omissão de diletos colaboradores. Ela apenas representa uma amostra de seres
humanos que me incentivaram incansavelmente a elaborar e escrever o programa
FREEMIND. Todas elas acreditam que a vida é um espetáculo imperdível e que vale a
pena encená-la no teatro da existência mesmo quando o mundo desaba sobre nós.
Este trabalho é dedicado às mulheres da minha vida. Minha
esposa Suleima e minhas filhas Camila, Carolina e Claudia.
EPÍGRAFE
Quando somos abandonados pelo mundo, a solidão é superável;
quando somos abandonados por nós mesmos, a solidão é quase
incurável.
Augusto Cury
RESUMO
CURY, Augusto. Programa FREEMIND como ferramenta global para a
prevenção de transtornos psíquicos. 2013. 204f. Tese (Doutorado) – Florida Christian
University. Florida, 2013.
Esta pesquisa teve por objetivo analisar o programa FREEMIND como ferramenta
global para a prevenção de transtornos psíquicos. O programa FREEMIND é
constituído por 12 ferramentas multifocais da psicologia educacional e social,
psiquiatria social, sociologia, pedagogia e filosofia aplicada. O programa objetiva: 1-
Reeducação do Eu como autor da história e como gestor psíquico; 2- Reorganização e
amadurecimento das relações interpessoais; 3- Desenvolvimento de hábitos para a
excelência profissional, o trabalho em equipe, a cooperação social, a solidariedade, a
tolerância; 4- Desenvolvimento de habilidades emocionais para trabalhar perdas e
frustrações, proteger a emoção, gerenciar o estresse e prevenir transtornos psíquicos. As
12 ferramentas de intervenção preventiva do programa são: 1) Vivenciar os 12
princípios filosóficos; 2) Ser autor da sua história; 3) Gerenciar os pensamentos; 4)
Administrar e proteger a emoção; 5) Trabalhar os papéis da memória e reeditar o filme
do inconsciente; 6) A arte de ouvir e a arte de dialogar; 7) A arte do autodiálogo e a
mesa-redonda do Eu; 8) Contemplar o belo; 9) Libertar a criatividade e ser
empreendedor; 10) Disciplina e sonhos; 11) Ser empreendedor e, 12) Resiliência e
inteligência existencial. Cada uma das 12 ferramentas do programa FREEMIND foi
analisada a partir dos procedimentos de análise da Teoria da Inteligência Multifocal
(TIM), tais como a arte da formulação de perguntas, da dúvida e da crítica, a busca do
caos intelectual e os dois instrumentos empíricos ligados à análise dos processos de
construção dos pensamentos e das variáveis que atuam na construção das cadeias de
pensamentos.
Palavras-chave: Prevenção. Promoção da Saúde. Psicologia Multifocal
ABSTRACT
CURY, Augusto. FREEMIND Program as a global tool for the prevention of
psychiatric disorders. 2013. Sheet 205. Thesis (Doctorate) – Florida Christian
University.Florida, 2013.
The purpose of this research was to analyze the FREEMIND program as a global
tool for the prevention of psychiatric disorders. The FREEMIND program consists of
12 multifocal tools of the educational and social psychology, social psychiatry,
sociology, pedagogy and applied philosophy. This program aims to: 1- The reeducation
of the Self as the author of its own history as well as a psychological manager; 2-
Reorganization and maturation of interpersonal relationships; 3- Development of habits
for professional excellence, team work, social cooperation, solidarity, tolerance; 4-
Development of emotional skills in order to work on losses and frustrations, protect the
emotion, manage stress and prevent psychiatric disorders. The 12 tools of preventive
action in this program are: 1) Experiencing the 12 philosophical principles; 2) Being the
author of your own history; 3) Managing thoughts; 4) Administrating and protecting the
emotion; 5) Working on memory roles and re-editing the film of the unconsciousness;
6) The art of listening and the art of dialoguing; 7) The art of the self-dialogue and the
Self´s round table; 8) Contemplating the beauty; 9) Releasing the creativity and being
an entrepreneur; 10) Discipline and dreams; 11) Being an entrepreneur and, 12)
Resilience and existential intelligence. Each one of the 12 tools of the FREEMIND
program has been analyzed based on the Theory of Multifocal Intelligence (TMI)
analysis procedures, such as the art of formulating questions, of doubt and of criticism,
the search for the intellectual chaos and the two empirical instruments linked to the
analysis of the thought construction processes and of the variables that act in the chains
of thought construction.
Key-words: Prevention. Health Promotion.Multifocal Psychology
SUMÁRIO
1.0 INTRODUÇÃO....................................................................................................................10
2.0 OBJETIVOS.........................................................................................................................22
3.0 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO...........................................................23
3.1 TEORIA DA INTELIGÊNCIA MULTIFOCAL (TIM)......................................................................23
3.2 METODOLOGIA DA TIM .................................................................................................................29
4.0 DISCUSSÃO DAS FERRAMENTAS DO FREEMIND ..................................................34
4.1 PRIMEIRA FERRAMENTA DO FREEMIND: VIVENCIAR 12 PRINCÍPIOS FISLOSÓFICOS...34
4.2 SEGUNDA FERRAMENTA DO FREEMIND: SER AUTOR DA SUA HISTÓRIA........................41
4.3 TERCEIRA FERRAMENTA DO FREEMIND: GERENCIAR OS PENSAMENTOS......................63
4.4 QUARTA FERRAMENTA DO FREEMIND: ADMINISTRAR E PROTEGER A EMOÇÃO.........82
4.5 QUINTA FERRAMENTA DO FREEMIND: TRABALHAR OS PAPÉIS DA MEMÓRIA E
REEDITAR O FILME DO INCONSCIENTE...........................................................................................98
4.6 SEXTA FERRAMENTA DO FREEMIND: A ARTE DE OUVIR E A ARTE DE DIALOGAR ....113
4.7 SÉTIMA FERRAMENTA DO FREEMIND: A ARTE DO AUTODIÁLOGO E A MESA-
REDONDA DO EU.................................................................................................................................126
4.8 OITAVA FERRAMENTA DO FREEMIND: CONTEMPLAR O BELO ........................................140
4.9 NONA FERRAMENTA DO FREEMIND: LIBERTAR A CRIATIVIDADE E SER
EMPREENDEDOR .................................................................................................................................149
4.10 DÉCIMA FERRAMENTA DO FREEMIND: DISCIPLINA E SONHOS......................................158
4.11 DÉCIMA PRIMEIRA FERRAMENTA DO FREEMIND: SER EMPREENDEDOR....................170
4.12 DÉCIMA SEGUNDA FERRAMENTA DO FREEMIND: RESILIÊNCIA E INTELIGÊNCIA
EXISTENCIAL........................................................................................................................................181
5.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................196
6.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................200
7
1. INTRODUÇÃO
Teoria da Inteligência Multifocal, que é uma das poucas teorias mundiais que
estuda o processo de construção de pensamentos e o processo de formação de
pensadores.
Como o programa FREEMIND é uma tese de doutorado, e, ao mesmo tempo,
um programa de caráter universal, os participantes serão “bombardeados”
frequentemente com a arte da pergunta, que é o principio da sabedoria na filosofia, para
reciclarem seus paradigmas, falsas crenças, verdades absolutas e, desse modo, serem
provocados a abrirem o leque da inteligência, estimular o debate de ideias e expandir os
horizontes do conhecimento. Retirar o participante da passividade e estimulá-lo a ser
construtor do script da sua história é a meta fundamental.
Quando o Eu, que representa a capacidade consciente de escolha ou
autodeterminação, está relativamente maduro no final da adolescência, portanto,
relativamente capaz de filtrar estímulos estressantes e de escrever a sua própria história,
o ser humano já é refém de seu passado, de milhares de janelas no córtex cerebral que
contém milhões de experiências. E, como estudaremos, nenhuma dessas janelas, que são
áreas de leituras da memória num determinado momento existencial, pode ser deletada,
apenas reeditada, o que indica as gigantescas dificuldades de mudar a base da nossa
personalidade. Enfim, o Eu do adulto quando tem consciência crítica de que é um ser
único no “teatro” social, sua mente já possui inúmeros núcleos de habitação na sua
memória que dão sustentabilidade para as suas principais características, sejam elas
doentias ou saudáveis, como a timidez, a ousadia, a sensibilidade, a impulsividade, a
flutuabilidade emocional, humor depressivo, bom humor, determinação, insegurança,
conformismo, baixo limiar para suportar frustrações.
Sem uma educação profunda, o Eu na plenitude da sua liberdade para agir na sua
própria personalidade viverá paradoxalmente numa masmorra! Pense na timidez e na
fobia social (medo de se expressar em público). Algumas estatísticas demonstram que a
timidez atinge mais de 80% dos jovens. Reciclá-la não é ter uma atitude heroica de
mudança. A intencionalidade não muda a base da personalidade, pois gera uma janela
solitária, que não é encontrada num foco de tensão. Faz-se necessário uma plataforma
de experiências capaz de formar um novo núcleo de habitação do Eu e, assim, dar
sustentabilidade à ousadia e à espontaneidade diante de uma plateia. Mas para isso
8
também se faz necessário uma nova agenda educacional, onde o Eu durante semanas,
meses e anos, constrói essas plataformas no córtex cerebral. Por isso o programa
FREEMIND advoga de que o Eu pode e deve aprender desde a mais tenra infância
ferramentas para ser autor da própria história. Ou seja, à medida que ele é formado ele
também se torna um formador, à medida que é educado ele se torna também educador
da emoção e gerenciador dos pensamentos.
A educação clássica ensina milhões de informações para os alunos da pré-escola
a pós-graduação sobre o mundo em que estamos, do imenso espaço ao pequeno átomo,
mas pouco ensina sobre o planeta psíquico, sobre os fenômenos que nos torna seres
pensantes, Homo sapiens. É por isso que a educação clássica nessa sociedade
estressante, hipercompetitiva e saturada de informações, forma, com as devidas
exceções meninos com diplomas nas mãos, sem proteção emocional, sem habilidades
para lidar com perdas e frustrações, sem capacidade para ser líder de si mesmo.
Mas esse tipo de educação é de responsabilidade dos pais ou da escola? De
ambos. Não podemos lotear os alunos. Ambos têm responsabilidades pelo futuro
emocional, social e profissional dos seus educandos. Muitos pais terceirizam a
educação, atribuindo-a a escola uma responsabilidade que também é sua, o que é um
erro imperdoável. Mas a escola, com as devidas exceções, se esquiva de assumir sua
parte nesse processo. Encarrega-se de transmitir milhões de dados sobre o mundo em
que estamos, mas frequentemente se cala sobre o mundo que somos. Tenho dito em
dezenas de países que se a escola não se tornar uma escola que educa a emoção e não
trabalha as funções mais complexas da inteligência, ela será formadora de repetidores
de informações e não de pensadores.
Repetidores de informações obedecem a ordens, tem baixo nível de consciência
crítica e autonomia. Veja o caso da Alemanha pré-nazista. Os alemães ganharam um
terço dos prêmios Nobel na década de trinta do século XX. Ela tinha a melhor educação
clássica: a melhor matemática, física, química, engenharia. Mas não foi suficiente para
expurgar Hitler, um homem inculto, rude, tosco, mas, ao mesmo tempo teatral. Quando
ele surgiu no cenário com Goebbels, Himmler, Goring e outros e juntos começaram seu
marketing de massa, seduziram a juventude alemã. O Eu deles não era autor da sua
história, não era autônomo.
Numa situação especial capitaneada pela insegurança alimentar, fragmentação
política, 30% de desempregados e humilhação pelo tratado de Versalhes, um pool de
janelas traumáticas que dominava o inconsciente coletivo dos alemães comprometendo
9
sua consciência crítica emergiu. A educação clássica, embora notável, não produziu
pensadores coletivamente para rejeitar drasticamente o marketing de massa.
Hitler e Goebbels devoraram primeiramente o inconsciente coletivo dos alemães
para depois “devorar” judeus, marxistas, eslavos, ciganos, homossexuais, e outras
minorias. Quem imaginaria que a nobre Alemanha de Kant e de Hegel seria
protagonista dessa atrocidade? Com esse tipo de educação clássica atual que forma
repetidores de informações, onde os alunos são fissurados pelas redes sociais, onde
contatam muitos, mas raramente profundamente a alguém, estamos preparados para não
repetir outros holocaustos quando uma nova onda de conflitos mundiais, capitaneada
pelo aquecimento global, insegurança alimentar e escassez de recursos, abater o
inconsciente coletivo da humanidade? A resposta provável é: infelizmente não.
O programa FREEMIND, por estimular a formação de pessoas com opinião
própria e que pensa como espécie e não apenas como feudo, como grupo social,
cultural, filosófico, religioso, pretende funcionar como uma vacina, ainda que pequena,
contra novos holocaustos.
Ferramentas transculturais do FREEMIND
Como o FREEMIND tem como meta o desenvolvimento das habilidades
intelectoemocionais, ele pode ser útil para expandir a qualidade de vida de qualquer ser
humano de qualquer sociedade, pois suas ferramentas são universais.
Por exemplo, a arte de contemplar o belo, que é uma das ferramentas a ser
estudada, é tanto fundamental para quem vive nas florestas como para quem vive nas
metrópoles. Contemplar o belo é treinar a capacidade de observar para fazer dos
pequenos estímulos da rotina diária um espetáculo aos nossos olhos e, desse modo,
enriquecer o prazer de viver e estabilizar a emoção (CURY, 2009).
Há uma diferença enorme entre admirar o belo e contemplar o belo. Admirar é
uma experiência fugaz, efêmera e superficial. Contemplar é uma experiência
arrebatadora, prolongada e profunda. Até um psicopata admira o belo. Quem vive nas
matas tem mais chance de desenvolver espontaneamente a ferramenta de contemplar o
10
belo do que quem vive numa floresta de concreto. Nessa, não poucos, precisam de
grandes estímulos (aplausos, reconhecimentos, sucessos) para sentir migalhas de prazer,
o que compromete gravemente os níveis de satisfação, estabilidade e maturidade
psíquica. A arte de contemplar o belo é uma função complexa da inteligência que,
infelizmente, poucos desenvolvem. Ela precisa ser lapidada e treinada
educacionalmente.
Proteger a emoção é outra ferramenta universal. O ser humano coloca
fechaduras nas portas, janelas, carros, empresas, para proteger aquilo que tem valor,
mas por incrível que pareça não sabe minimamente colocar “fechaduras” em sua
emoção, que é ou deveria ser a sua mais importante propriedade. Qualquer
contrariedade, frustração, ofensa, dificuldade, a invade, e furta sua tranquilidade. Não é
isso uma incoerência absurda?
Não é sem razão que há muitos miseráveis morando em palácios. Nunca
aprenderam a filtrar estímulos estressantes. Para o programa FREEMIND “proteger a
emoção” é uma ferramenta fundamental para se adquirir saúde psíquica e social e
conquistar uma mente verdadeiramente livre (CURY, 2013). Mas em que escola ou
universidade se aprende essa complexa função da inteligência? Quais são as habilidades
que se deve desenvolver para proteger a emoção? Esses assuntos vitais para o futuro da
humanidade serão tratados aqui.
Ferramentas utilizadas pelo grande educador da história
A Teoria da Inteligência Multifocal estuda não apenas o funcionamento da
mente e a construção de pensamentos, mas também a formação de pensadores, sendo
uma das raras teorias que enfocam esse tema. Após terminar os pressupostos básicos da
teoria, comecei a estudar os instrumentos intelectuais e emocionais que os grandes
personagens da história usaram para influenciar a sociedade e brilhar na sua mente,
como Moisés, Buda, Maomé, Confúcio, Sócrates, Platão, Agostinho, Freud, Einstein, e
muitos outros. O programa FREEMIND contempla essas ferramentas. Também
comecei a estudar sob o ângulo da ciência (psicologia, psiquiatria, sociologia,
pedagogia) a personalidade do homem que “dividiu” a história, Jesus.
Usei as suas quatro biografias em varias versões, chamadas de evangelhos, para
analisar sua inteligência, para estudar como ele superava seus focos de tensão, protegia
11
seu psiquismo, filtrava estímulos estressantes, bem como quais os instrumentos mais
importantes que usou para educar a emoção dos seus alunos (discípulos), lapidar seu
intelecto e fazê-los superar as armadilhas da mente: o conformismo, o coitadismo, os
medos (fobias), o radicalismo, o exclusivismo, individualismo, a dependência
emocional, a alienação social. Claro que meu estudo é saturado de limitações e
imperfeições. Ele sonhava em formar pensadores solidários, seguros (resilientes), que
soubessem expor e não impor suas ideias, que pensassem antes de reagir e que, acima
de tudo, fossem autores da sua própria história.
Onde a fé entra a ciência se cala. O resultado dessa pesquisa psicológica e não
religiosa do notável educador Jesus me fez perceber minha pequenez como pensador e
educador. Suas reações fogem aos limites da nossa imaginação. Convenci-me, não pela
paleografia ou arqueologia, mas através das ciências humanas, de que nenhum autor
poderia construir um personagem com as suas características. Ele tinha todos os
motivos para ter ansiedade, depressão, fobias, devido à avalanche de estímulos
estressantes que vivenciou desde a sua infância, mas atingiu o ápice da saúde
emocional, resiliência, habilidade de trabalhar perdas e frustrações. Era capaz de
gerenciar sua psique e fazer “poesia” quando o mundo desabava sobre ele. Infelizmente
as religiões ao longo da história o estudaram quase que exclusivamente sob o ângulo da
espiritualidade e não das ciências humanas.
As ferramentas que utilizou eram impactantes. Ele era capaz de dar tudo o que
tinha aos que pouco tinha! Nunca desistia de um ser humano, mesmo que o traísse. Seu
Eu era de tal forma altruísta, solidário e tolerante que tinha a coragem de dar a uma
prostituta o status de rainha e a um discriminado leproso o status de um dileto amigo.
Nos tempos de hoje, ele estenderia as mãos para qualquer pessoa socialmente rejeitada e
a colocaria no centro da sua história. Certamente abraçaria os “doentes mentais” e
gastaria tempo usando metáforas e dinâmicas para encorajá-lo a reciclar sua fragilidade
e escrever os capítulos mais importantes de sua história nos momentos mais dramáticos
da sua vida.
Fui um dos maiores ateus que pisou nessa terra. A partir dessa análise deixei de
considerar a busca por Deus como fruto de um cérebro apequenado que resiste ao seu
caos na solidão de um túmulo e passei a entender que essa busca representa um ato
inteligente de uma mente a procura do mais importante endereço, um endereço que
poucos encontram, dentro de si mesmo. A ciência, que levou alguns ao ateísmo, fez-me
percorrer o caminho inverso. Deixei de ser ateu, mas não defendo uma religião. Tenho
12
amigos em todas as religiões, católicos, protestantes, judeus, islamitas, budistas,
inclusive não poucos ateus, e os respeito muito. O programa FREEMIND é um
programa sem fronteiras das ciências humanas, que objetiva, como disse, atingir as mais
diversas culturas, ideologias política e religiões. Uma das ferramentas do programa se
encontra nessa tese: ninguém é digno da liberdade e maturidade psíquica se não
respeitar os que pensam diferente!
Porque falar no programa FREEMIND das ferramentas psicológicas,
psicopedagógicas e sociológicas que o homem Jesus usou para equipar a inteligência de
seus alunos? Primeiro, porque são ferramentais universais; segundo, porque
representam um exemplo vivo da operacionalidade dessas ferramentas num grupo
conflitante de jovens, como era o grupo de discípulos de Jesus; terceiro, porque bilhões
de pessoas, portanto, uma parte significativa da humanidade, que abraçaram o
catolicismo, o protestantismo, o islamismo (o Alcorão exalta em prosa e versa Jesus), o
budismo (grande parte dos budistas o admiram), judeus (muitos o consideram o judeu
mais famoso da história) não estudaram os comportamentos do Mestre dos mestres sob
o ângulo da ciência e, portanto, não tiveram a oportunidade de incorporar as
nobilíssimas ferramentas que ele amplamente ensinou.
Milhões de pessoas admiram e exaltam Jesus a seu modo, mas tem uma emoção
desprotegida, não sabem trabalhar perdas e frustrações, sua mente é terra de ninguém,
não desenvolveram habilidades básicas para gerir seu psiquismo. Com muita humildade
e respeito o programa FREEMIND pretende dar um choque de lucidez também nessa
área tão delicada e importante. A religião, se bem usada liberta o altruísmo e a
tolerância, se mal usada, pode controlar e não libertar a mente humana. Os 12 alunos do
Mestre de Nazaré tinham vários conflitos importantes em sua personalidade: eram
autoritários, radicais, exclusivistas, punitivos, tinham a necessidade neurótica de poder,
de controlar os outros e de estar sempre certos, enfim, frequentemente lhe davam dores
de cabeça. Mas depois de todo seu treinamento educacional que durou pouco mais de
três anos, os transformou numa nobre casta de pensadores flexíveis, generosos, que
protegiam suas emoções, gerenciavam seu estresse, dirigiam o script de sua história, e
que acima de tudo consideravam a vida um espetáculo único e imperdível. Será muito
interessante após estudar cada capítulo analisar como o maior educador da história
aplicou as ferramentas do “FREEMIND”. Mentes livres e emoção saudável eram duas
de suas metas fundamentais.
13
Fundamentação do FREEMIND
Este programa é baseado em diversas teorias comportamentais, analíticas,
filosóficas, sociológicas, pedagógicas, mas em especial na Teoria da Inteligência
Multifocal (TIM.), desenvolvida pelo autor ao longo de mais de 30 anos. A TIM estuda,
como o próprio nome indica, múltiplos focos do funcionamento da mente, como o
processo de construção do Eu como gestor da psique, os papéis conscientes e
inconscientes da memória, o processo de gerenciamento da emoção, o processo de
formação de janelas traumáticas e o complexo processo de construção de pensamentos.
Além disso, estuda o processo de interpretação, a construção das relações sociais e o
processo de formação de pensadores (CURY, 1999).
A Teoria da Inteligência Multifocal está presente em dezenas de livros
publicados pelo autor em mais de sessenta países. Além disso, a TIM é objeto de
mestrado e doutorado internacionais, como na FCU (Florida Christian University),
USA- Flórida. Os grandes e brilhantes teóricos do passado, como Hegel, Kant, Freud,
Jung, Skinner, Piaget, Sartre, usaram o pensamento como tijolo pronto para construir
suas teorias sobre as relações sociopolíticas, a formação da personalidade, o
desenvolvimento do aprendizado, a formação dos conflitos, mas eles não tiveram a
oportunidade de estudar detalhadamente o próprio tijolo do intelecto. Ou seja, eles
pouco estudaram os tipos, natureza e processos construtivos do pensamento como pedra
fundamental do psiquismo. Como a TIM estuda esses fenômenos que estão na base da
psique, ela não anula ou compete com as teorias sociais, psicanalíticas, construtivistas,
comportamental-cognitivas, ao contrário, as fundamenta, as recicla e as expande.
Quem abrir mão de escrever a sua própria história, provavelmente seus erros,
conflitos, culpas, medos, rejeições, privações, traumas na infância, dependência
química, as escreverão. Metaforicamente dizendo, o programa FREEMIND pode
oferecer “a tinta e o papel”, mas só o participante pode escrever a sua história.
Uma pessoa madura jamais dá as “costas” para seu conflito, seja qual for, mas
aprende a transformar o caos em oportunidade criativa, bem como aprende a escrever os
melhores textos da sua vida, ainda que com lágrimas, nos dias mais dramáticos da sua
história. O programa FREEMIND demonstra que “se a sociedade te abandonar a solidão
é suportável, mas se você mesmo se abandonar ela é intolerável”. Uma pessoa feliz,
autônoma e saudável tem mais chances de, ao se relacionar com os outros, “arquivar”
janelas Lights ou saudáveis na memória deles e contribuir para fazê-los felizes e
14
saudáveis. Uma pessoa emocionalmente ansiosa e estressada tem chance de “plantar”
janelas Killers ou traumáticas e, assim, adoecer quem está próximo. As relações
interpessoais podem contribuir para promover cárceres psíquicos ou mentes livres
(FREEMIND).
Operacionalidade do programa
O programa FREEMIND, embora possa ser vivenciado individualmente,
preferencialmente ele deve ser aplicado em grupo nas universidades, escolas
secundárias, instituições sociais, empresas, igrejas, hospitais, clínicas para dependentes
químicos. Se aplicado em grupo, será proposta a seguir uma série de ferramentas para a
sua melhor operacionalidade. Essas ferramentas são flexíveis e devem ser adaptadas a
qualquer povo, cultura ou instituição.
1- Cada participante deve ter o material antes das reuniões para poder lê-lo e
estudá-lo. É fundamental estudá-lo também depois de cada reunião devido à
complexidade das suas ferramentas.
2- Recomendamos que cada ferramenta seja trabalhada semanalmente em uma
ou duas reuniões em dias alternados.
3- O programa foi elaborado para ser vivenciado em grupo, embora possa ser
trabalhado individualmente. O número de participantes de cada grupo não é
rígido: cinco, dez, quinze ou mais. Se o número for excessivamente grande
para impedir a participação de todos, seria bom dividi-lo em dois grupos.
4- O grupo deve se reunir em círculo ou semicírculo. Olhos nos olhos
incentivam o debate, a troca e a cumplicidade.
5- Todos devem se desarmar, tirar as máscaras e ser transparentes durante as
reuniões. Quem não é transparente não se recicla, e quem não se recicla
pode levar para o túmulo seus conflitos, traumas, bloqueios.
6- No inicio de cada reunião os participantes devem falar sua identidade
mínima: nome, origem e principais metas psíquicas e sociais que deseja
alcançar.
7- No final de cada reunião os participantes devem se cumprimentar, abraçar
um ao outro e agradecer a cada um por existir. Solidariedade, tolerância e
paz social são fundamentais no programa FREEMIND.
15
8- A duração de cada reunião é flexível, depende da capacidade de debater e
dos níveis de interação dos membros do grupo, mas em tese deveria durar
em torno de duas horas.
9- Seria conveniente que um líder da instituição ou membro do grupo fosse o
líder ou facilitador, estudando os textos previamente e se preparando para
dar uma pequena aula sobre cada ferramenta (15 a 30 minutos), antes de
iniciar o debate.
10- Outro modelo de reunião, mais recomendável, é o facilitador fazer pequenas
exposições de 5 a 10 minutos sobre os mais diversos temas que compõem
cada ferramenta. Após cada exposição inicia-se o debate sobre o tema.
Depois de esgotá-lo, outra exposição é feita provocando novos debates.
11- O verdadeiro líder ou facilitador nem sempre é o que tem mais
conhecimento do grupo, mas o que mais estimula o debate, não é o que
domina os participantes, mas o que mais incentiva a participação.
12- O facilitador deve levar todos os participantes a honrar e aplaudir quem fala
ou expõe suas ideias. Vivemos numa sociedade castradora, que aplaude
celebridades, mas não as ideias dos anônimos. Elogiar e aplaudir faz com
que participar se torne um convite ao prazer e à arte de pensar.
13- Os mais tímidos devem ser encorajados a se expressarem. O facilitador e os
demais membros devem comentar que a experiência deles é muito
importante para o grupo. Saiba que 80% das pessoas têm sintomas de
timidez e insegurança. Devemos ter medo não de falar, mas de nos omitir. O
preço da omissão é muito mais caro do que os erros da ação.
14- Os que têm mais facilidade de se expressar não devem controlar as reuniões.
Deve aprender a sintetizar a sua fala e descobrir o prazer de ouvir. Lembre-
se que aprender a ouvir é tão fundamental como falar.
15- Cada pergunta exposta durante o texto deve servir de alvo para o debate.
Esperamos que o debate já tenha ocorrido durante toda a exposição de cada
ferramenta, mas para facilitá-lo, ao final de cada capítulo, haverá uma série
de importantes perguntas no PAINEL DE DEBATE e, em seguida, um
PAINEL DE EXERCÍCIOS DIÁRIOS. É fundamental utilizá-los.
16- O facilitador, bem como os demais membros do grupo, devem abrandar as
disputas, intrigas, ofensas. Cada participante deve aprender que uma pessoa
madura expõe suas ideias e não as impõe.
16
17- Todos devem respeitar as ideias de um participante ainda que seja contrária
ao pensamento da maioria do grupo. Se o que ele pensa é débil ou infantil,
dê-lhe tempo para amadurecer. Saiba que ninguém muda ninguém, só a
própria pessoa pode reescrever sua história.
18- Faça a oração dos sábios quando alguém se exaltar (esbravejar-se) ou mesmo
quando se emocionar e chorar: o silêncio.
19- Sonhamos que cada um dos participantes se torne multiplicadores do
programa FREEMIND, futuros líderes ou facilitadores, aplicando-o nas
instituições, escolas, empresas, famílias.
20- É recomendável que esse programa que dura cerca de três meses possa ser
vivenciado pelos participantes pelo menos uma vez por ano nos próximos
anos. A cada programa absorve-se mais as pérolas das complexas
ferramentas e cristalizam-se mais as conquistas.
Participar do programa FREEMIND é prazeroso, embora possa levar em alguns
momentos o participante a mapear seus fantasmas: fobias, rigidez, pessimismo,
autopunição, necessidades neuróticas. Usando uma cozinha como metáfora das
reuniões, no inicio há certa desorganização, mas pouco a pouco os melhores pratos são
elaborados. Lembre-se que todos os participantes são cozinheiros do conhecimento.
Cada um deve elaborar seus “nutrientes”, ou seja, deve levar para o território da sua
mente as lições e ferramentas que encontrou, aprendeu, construiu. Cada participante tem
suas particularidades e limitações e elas devem ser respeitadas. Não é a quantidade de
informações que é o mais importante, mas a qualidade para suprir a sua inteligência.
Faremos com todos os participantes uma grande viagem, talvez a mais
importante de todas, uma viagem para dentro de nós mesmos, para algumas camadas
mais profundas de nossa mente. Almejamos que, através do FREEMIND, você ande em
terrenos nunca antes pisados e, em especial, se torne um caminhante nas trajetórias do
seu próprio ser.
17
2. OBJETIVOS
Apresentar e analisar, segundo os procedimentos da análise multifocal, as 12
ferramentas do programa FREEMIND como estratégia global prevenção dos transtornos
psíquicos e, consequentemente, subsidiar ações para a política internacional na área.
18
3. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
3.1 Teoria da Inteligência Multifocal
O referencial teórico utilizado para esta tese foi a Teoria da Inteligência
Multifocal (TIM) que pesquiso há mais de 25 anos. A TIM foi construída objetivando
funcionar como uma teoria universal para explicar os fenômenos psíquicos e
psicossociais. Ela já tem sido utilizada em teses de mestrado e doutorado, em cursos de
pós-graduação lato sensu nos EUA e Europa.
A TIM tem como objetivo estudar o processo de construção do pensamento, os
papéis conscientes e inconscientes da memória, os processos de interpretação e a
formação do eu como líder do teatro psíquico. Enquanto as demais teorias produziram
conhecimento usando como alicerce o pensamento pronto, a TIM estuda as variáveis e
os fenômenos universais conscientes e inconscientes, por isso recebe o nome
“Multifocal”, que estão na base da construção dos pensamentos e dos demais processos
psíquicos. Portanto, ela não anula e nem compete com as demais teorias, mas procura
19
contribuir para criticá-las, reciclá-las, fundamenta-las e abrir novas avenidas de pesquisa
para as demais teorias psicológicas, filosóficas, sociológicas e educacionais.
A TIM não é uma teoria fechada, mas aberta, muito ainda há que se produzir,
reciclar e desenvolver no seu bojo. Inúmeras áreas ainda precisam ser investigadas e
compreendidas no complexo e insondável mundo da psique humana. A própria teoria
revela que a verdade essencial é um fim inatingível, isto se deve tanto pelo fato de que o
pensamento consciente, aqui chamado de dialético, não incorpora a realidade intrínseca
do objeto que ele investiga, quanto porque o próprio processo de construção dos
pensamentos sofre um sistema de encadeamento distorcido capaz de fazer não apenas
com que dois observadores interpretem de maneira distinta, mas com que um mesmo
observador interprete micro ou macro distintamente um mesmo objeto em momentos
diferentes.
Através das ferramentas da TIM, utilizadas no programa FREEMIND, a
psicologia, a psiquiatria, as ciências da educação e sociologia terão subsídios para
entender alguns pilares da história intrapsíquica, arquivada na memória, da natureza dos
pensamentos, do caos e da reorganização da energia psíquica, da formação do eu, da
formação dos paradigmas culturais, da construção das relações sociais, da
psicopedagogia da aprendizagem e da psicopatologia da hiperatividade, do autismo, da
depressão, da síndrome do pânico, do TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), das
psicoses funcionais.
Embora muitas outras relevantes teorias já tenham sido desenvolvidas, a
presente teoria nasceu não apenas da observação direta do comportamento sob os
alicerces metodológicos já existentes na ciência, mas também sob a confecção de novas
metodologias. O desenvolvimento da TIM exigiu a produção de uma nova interpretação
e da produção de conhecimento, ela explica por que multiplicamos as escolas, mas não
multiplicamos a formação de pensadores, por que estamos produzindo uma massa de
expectadores passivos do conhecimento e não pessoas que expandam o mundo das
ideias, porque estamos ainda gerando uma população de repetidores de informações e
não universitários que rompam o cárcere da rotina e saibam utilizar a arte da dúvida e da
crítica.
A falta do conhecimento sobre os processos de construção dos pensamentos,
sobre o processo de interpretação e sobre os limites e o alcance de uma teoria pode
conduzir os pesquisadores que procuram defender teses acadêmicas a fechar as janelas
do pensamento. Seria importante que os usuários de uma teoria, não a utilizassem como
20
se ela incorporasse a verdade essencial, mas como um suporte limitado do processo de
observação e interpretação. Qualquer usuário de uma teoria que é incapaz de criticá-la
será um mero reprodutor das suas idéias, traindo-a interpretativamente sem o saber e
praticando uma ditadura intelectual no exercício da sua profissão ou na sua produção de
conhecimento científico. Esse processo é passível de ocorrer não apenas nas ciências da
cultura, mas também nas ciências físicas, biológicas e correlatas. As idéias, mesmo as
que são consideradas verdades científicas, não são fins em si mesmas, pois não são
coincidentes com a verdade essencial, que é inatingível. Produzir ciência não é uma
tarefa simples. A falta de conhecimento dos processos de construção dos pensamentos,
dos limites e do alcance de uma teoria, bem como dos sistemas de encadeamentos
distorcidos, passíveis de ocorrer no processo de interpretação, faz com que muitos
tenham o conceito errado de que, para produzir ciência ou se tornar um cientista, basta
defender uma tese acadêmica. Devemos repensar o processo de formação de pensadores
antes de pensar na produção da própria ciência. Devemos nos preocupar com a
qualidade da inteligência dos pensadores.
Nas ciências da cultura, na qual se inclui a Psicologia, a Filosofia, a Educação, a
Sociologia, entre outras, não há muitos recursos financeiros para incentivar a formação
de pensadores e a expansão das idéias psicossociais, como o têm as ciências naturais,
que incluem a Computação, a Biologia, a Química, cujas pesquisas resultam em
produtos industriais.
Se o capital é pequeno nas ciências da cultura, deveria haver, então, um processo
de compensação, através da expansão da qualidade dos pensadores pelo uso de
procedimentos que estimulam a plasticidade construtiva e a liberdade criativa do
conhecimento. Caso contrário, o contraste do desenvolvimento entre as ciências naturais
e as ciências da cultura continuará e aumentará.
A Física sabe como penetrar nas entranhas do átomo e distinguir as partículas
atômicas, tão ocultas aos olhos, e a Psicologia educacional não sabe como prevenir
eficientemente a discriminação racial dos negros, tão visível aos olhos, nem como
prevenir o uso de drogas que acomete milhões de jovens. Se esse contraste se perpetuar,
seremos cada vez mais gigantes na tecnologia e anões na prevenção das doenças
psíquicas, psicossomáticas, psicossociais, bem como na expansão do humanismo, da
cidadania e da democracia das idéias. Nessa situação, o homem do século XXI, que
navegará cada vez mais pelo espaço e pela Internet, terá infelizmente cada vez mais
dificuldade de navegar para dentro de si mesmo, de se interiorizar e de se repensar, de
21
superar seus estímulos estressantes e de falar de si mesmo. Talvez ele só consiga se
interiorizar e falar de si mesmo, como já tem acontecido, quando estiver diante de um
psiquiatra ou de um psicoterapeuta. (CURY, 1999)
Uma das mais importantes explorações do homem, se não a maior delas, é a
exploração de si mesmo, do seu próprio mundo intrapsíquico. Aprender a se
interiorizar; a criar raízes mais profundas dentro de si mesmo; a explorar a história
intrapsíquica arquivada na memória; a questionar os paradigmas socioculturais; a
trabalhar com maturidade as dores, perdas e frustrações psicossociais; aprender a
desenvolver consciência crítica, a conhecer os processos básicos que constroem os
pensamentos e que constituem a consciência existencial são direitos fundamentais do
homem.
Porém, freqüentemente, esses direitos são exercidos com superficialidade na
trajetória da vida humana. Um dos principais motivos do aborto desses direitos é que o
homem moderno tem vivido uma dramática crise de interiorização. O ser humano, como
complexo ser pensante, é um exímio explorador. Ele explora, ainda que sem a
consciência exploratória, até mesmo o meio ambiente intrauterino, através dos
malabarismos fetais e da deglutição do líquido amniótico. E, ao nascer, em toda a sua
trajetória existencial, explora o mundo que o envolve, o rico pool de estímulos
sensoriais e interpreta-os. Pelo fato de experimentar, desde sua mais tenra história
existencial, os estímulos sensoriais que esquadrinham a arquitetura do mundo
extrapsíquico, o homem tem a tendência natural de desenvolver uma trajetória
exploratória exteriorizante. Nessa trajetória, ele se torna cada vez mais íntimo do mundo
em que está, o extrapsíquico, mas, ao mesmo tempo, torna-se um estranho para si
mesmo. O homem moderno, em detrimento dos avanços da ciência e da tecnicidade,
vive a mais angustiante e paradoxal de todas as solidões psicossociais, expressa pelo
abandono de si mesmo na trajetória existencial. (CURY, 1999)
A pior solidão é aquela em que nós mesmos nos abandonamos, e não aquela em
que nos sentimos abandonados pelo mundo. É possível nos abandonarmos na trajetória
existencial? Veremos que sim. Quando o homem não se repensa, não se questiona, não
se recicla, não se reorganiza, ele abandona a si mesmo, pois não se interioriza, ainda que
tenha cultura e múltiplas atividades sociais. Os livros de autoajuda, embora não tenham
grande profundidade intelectual, são procurados com desespero nas sociedades atuais,
como tentativa de superar, ainda que ineficientemente, a grave crise de interiorização
que satura as pessoas.
22
O homem que não se interioriza é algoz de si mesmo, sofre de uma solidão
intransponível e incurável, ainda que viva em multidões. "O homem que não se
interioriza dança a valsa da vida engessado intelectualmente." Sua flexibilidade
intelectual fica profundamente reduzida para solucionar seus conflitos psicossociais,
superar suas contrariedades, frustrações e perdas. É mais fácil explorar os fenômenos do
mundo que nos envolve do que aprender a nos interiorizar e ser caminhantes na
trajetória de nosso próprio ser e explorar os fenômenos contidos em nosso mundo
intrapsíquico. É mais fácil e confortável explorar os estímulos extrapsíquicos, que
sensibilizam nosso sistema sensorial, do que explorar os sofisticados processos de
construção dos pensamentos, o nascedouro e desenvolvimento das idéias, a organização
da consciência existencial, as causas psicodinâmicas e histórico-existenciais de nossas
misérias, fragilidades, contradições emocionais, etc.
Mergulhado num processo socioeducacional que se ancora na transmissibilidade
e no construtivismo do conhecimento exteriorizante, o homem se torna um profissional
que aprende a usar, com determinados níveis de eficiência, o conhecimento como
ferramenta ou instrumento de trabalho. Porém, tem grandes dificuldades para usar o
conhecimento para desenvolver a inteligência: aprender a percorrer as avenidas da sua
própria mente, conhecer os limites e alcance básicos da construção de pensamentos,
regular seu processo de interpretação através da democracia das idéias e tornar-se um
pensador humanista, que trabalha com dignidade seus erros, dores, perdas e frustrações,
e aprende a se colocar no lugar do "outro" e a perceber suas dores e necessidades
psicossociais. (CURY, 1999)
Infelizmente, como veremos, a tendência intelectual natural do Homo sapiens,
desde a aurora da vida fetal até o seu último suspiro existencial, é seguir uma trajetória
de construção intelectual superficial. Uma trajetória socioeducacional em que ele pouco
se interioriza, pouco procura por si mesmo e pouco conhece a si mesmo.
Procurar a si mesmo é explorar e produzir conhecimento sobre os processos de
construção da inteligência, ou seja, sobre os processos de construção dos pensamentos,
sua natureza, cadeias psicodinâmicas, limites, alcance, lógica, práxis, bem como sobre a
formação da consciência existencial, da história intrapsíquica arquivada na memória, as
bases que sustentam o processo de interpretação e as variáveis que participam do
processo de transformação da energia emocional.
Quem sai do discurso intelectual superficial e procura "velejar" para dentro de si
mesmo, e vive a aventura ímpar de explorar sua própria mente, nunca mais será o
23
mesmo, ainda que fique perturbado num emaranhado de dúvidas sobre o seu próprio
ser. Aliás, ao contrário do que dizem os livros de autoajuda, a dúvida é o primeiro
degrau da sabedoria. Quem não duvida e critica a si mesmo nunca se posiciona como
aprendiz diante da vida e, consequentemente, nunca explora com profundidade seu
próprio mundo intrapsíquico. Quem aprendeu a vivenciar a arte da dúvida e da crítica na
sua trajetória existencial se posiciona como aprendiz diante da vida e, por isso, tem
condições intelectuais de repensar seus paradigmas socioculturais e expandir
continuamente suas ideias e maturidade psicossocial. Todos os pensadores, filósofos,
teóricos e cientistas que, de alguma forma, promoveram a ciência, as artes e as ideias
humanistas foram, ainda que minimamente, caminhantes nas trajetórias do seu próprio
ser e amantes da arte da dúvida e da crítica, enquanto produziam conhecimento sobre os
fenômenos que contemplavam. (CURY, 1999)
O homem que aprende a se interiorizar e a criticar suas "verdades", seus dogmas
e seus paradigmas socioculturais estimula a revolução da construção das idéias nos
bastidores clandestinos de sua mente. Assim, sai do superficialismo intelectual e, no
mínimo, aprende a concluir que os processos de construção da inteligência, dos quais se
destacam a produção das cadeias psicodinâmicas dos pensamentos e a formação da
consciência existencial do "eu", são intrinsecamente mais complexos que uma
explicação psicológica e filosófica meramente especulativa e superficial, que chamo de
explicacionismo, psicologismo, filosofismo.
O homem moderno tem vivenciado, com freqüência, uma importante síndrome
psicossocial doentia, a qual chamo de "síndrome da exteriorização O ser humano, nos
dias atuais, freqüentemente só tem coragem de falar de si mesmo quando vai a um
psicólogo ou a um psiquiatra. Tem uma necessidade vital de que o mundo gravite em
torno de si mesmo. Para ele, doar-se para o outro sem esperar a contrapartida do retorno
é um absurdo existencial, um jargão intelectual, um delírio humanístico. O mundo das
ideias dos portadores da síndrome da exteriorização existencial tem pouco espaço para
uma compreensão psicossocial e filosófica da existência humana. (CURY, 1999)
Aprender a interiorizar-se é uma arte complexa e difícil de ser conseguida no
terreno da existência. O homem moderno tem sido um ávido consumidor de ideias
positivistas misticistas, psicologistas, como se tal consumo cumprisse, por ele, o papel
inalienável e intransferível de caminhar nas trajetórias sinuosas do seu próprio ser e de
aprender a expandir sua consciência crítica e maturidade intelectoemocional.
24
A complexidade da mente, associada às deficiências do discurso literário para
esquadrinhar os fenômenos e processos envolvidos na construtividade de pensamentos,
na formação da consciência existencial e na transformação da energia psíquica, fizeram-
me rever, criticar e reescrever continuamente os textos deste livro. Por isso, passei mais
de dezessete anos de intensa dedicação a escrevê-los, bem como aos demais textos que
compõem o arcabouço teórico da minha produção de conhecimento e que ainda não
foram publicados, objetivando que esses textos não sejam efêmeros na ciência, mas que
criem raízes e sejam úteis em diversas áreas psicossociais. (CURY, 1999)
Esses dados são bem sintéticos. Meu objetivo é fornecer algumas informações
para evidenciar algumas causas psicossociais que me fizeram, desde minha época de
estudante de Medicina, me apaixonar pelo mundo das ideias e, ao mesmo tempo, criticar
diversas convenções existentes na Psicologia e na Psiquiatria e evidenciar a crise de
formação de pensadores. O objetivo da TIM é contribuir para a formação de pensadores
e promover o desenvolvimento de habilidades psíquicas capazes de fortalecer o Eu
como gestor da mente.
3.2 Metodologia
Cada uma das 12 ferramentas do programa FREEMIND foi analisada a partir
dos procedimentos de pesquisa multifocais da TIM, tais como a arte da formulação de
perguntas, da dúvida e da crítica, a busca do caos intelectual e os dois instrumentos
empíricos ligados à análise dos processos de construção dos pensamentos e das
variáveis que atuam na construção das cadeias de pensamentos.
Desenvolvi sete procedimentos metodológicos de análise multifocal. Estes
procedimentos não são utilizados, em sua maioria, na pesquisa acadêmica, mesmo nas
teses de doutorado. Os grandes teóricos da psicologia também não os utilizaram na
produção de suas teorias, o que gerou um grande prejuízo para esta ciência. Os
procedimentos utilizados na pesquisa acadêmica normalmente são bem conhecidos no
mundo todo, tais como: seletividade de dados, análise de dados, levantamento
bibliográfico, uso de uma teoria como suporte da interpretação.
Os setes procedimentos utilizados pela TIM são:
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1. A arte da formulação de perguntas;
2. A arte da dúvida;
3. A arte da crítica;
4. A busca do caos intelectual para se processar a descontaminação da
interpretação;
5. A busca do caos intelectual para expandir as possibilidades de construção do
conhecimento;
6. A análise das causalidades históricas e das circunstancialidades
biopsicossociais e,
7. A análise dos processos de construção das variáveis de interpretação na
mente.
Além desses setes procedimentos, também utilizei na minha trajetória de
pesquisa cinco "mesclagens de contrapontos intelectuais" (MCI), que me estimularam a
revisar criticamente e reorganizar continuamente a produção de conhecimento sobre os
processos de construção do pensamento. Essas mesclagens referem-se a uma mistura
entre pontos intelectuais opostos ou equidistantes, tais como: a liberdade em observar e
a disciplina na observação, a livre produção de pensamento e a revisão crítica dessa
produção. (CURY, 1999)
Algumas dessas mesclagens resultaram do processo de cointerferência dos sete
procedimentos metodológicos da TIM. As cinco "mesclagens de contrapontos
intelectuais" (MCI) que utilizei foram:
1. Mesclagem entre a liberdade contemplativa de observar os fenômenos com a
disciplina empírica no processo de observação e seleção dos mesmos.
2. Mesclagem entre a liberdade de interpretar os fenômenos com a reorganização
e reorientação contínua do processo de interpretação.
3. Mesclagem entre a utilização do caos intelectual para esvaziar, tanto quanto
possível, as distorções preconceituosas e os referenciais históricos contidos no processo
de formação da personalidade com a utilização desse caos para expandir as
possibilidades de compreensão dos fenômenos e de construção do conhecimento.
4. Mesclagem entre a liberdade da produção do conhecimento com a reciclagem
crítica e contínua da mesma.
5. Mesclagem entre a análise das variáveis da interpretação (fenômenos) com a
análise dos sistemas de cointerferências que elas organizam para gerar o funcionamento
da mente e a construção das cadeias de pensamentos.
26
Não é objetivo de esta tese dar ênfase aos sete procedimentos metodológicos da
TIM e as cinco "mesclagens de contrapontos intelectuais" que utilizei em minha
trajetória de pesquisa, embora toda a análise das ferramentas do FREEMIND resulte
deles. Vou dar ênfase apenas a arte da pergunta, da dúvida e da crítica como os
procedimentos metodológicos mais relevantes para a discussão do programa
FREEMIND.
Aprendi que a arte de perguntar é mais importante do que a arte de responder.
Aliás, a maneira como se pergunta pode produzir um autoritarismo das idéias, pois
estabelece as diretrizes das respostas. Antes da busca das respostas, antes da produção
de conhecimento, é necessário fazer não apenas algumas perguntas, mas múltiplas
perguntas sobre os fenômenos que estamos observando e interpretando.
Devemos ainda não apenas formular perguntas multifocais sobre os fenômenos e
suas micro e macrorrelações, mas perguntas sobre as próprias perguntas, suas
dimensões, seus limites e alcance. A função da arte da formulação das perguntas não é,
inicialmente, fornecer respostas, pois as respostas são ditadoras das perguntas, mas
expandir a dúvida. Quanto mais dúvida e confusão intelectual, mais profunda poderá ser
a resposta, mais rica será a produção de conhecimento; quanto menos dúvida, mais
pobre será a produção de conhecimento. (CURY, 1999)
Os três grandes inimigos de um pensador são: as dificuldades de expandir a arte
da pergunta e da crítica, a dificuldade de conviver com a dúvida e a ansiedade por
produzir respostas. A fertilidade das idéias de um pensador não está na sua capacidade
de produzir respostas, mas na sua intimidade com a arte da formulação das perguntas, a
arte da dúvida, a arte da crítica e do quanto procura e suporta a experiência do caos
intelectual. (CURY, 1999)
A palavra arte associada à palavra "dúvida" ou "crítica" não quer dizer uma
simples dúvida ou crítica esporádica, mas um processo contínuo de duvidar e criticar,
um sistema contínuo de aprimoramento da observação, interpretação e questionamento
do conhecimento.
A arte da formulação de perguntas me levou a fazer centenas e, em alguns casos,
milhares de perguntas sobre cada fenômeno intrapsíquico que observava. Mesmo diante
da mais simples idéia que eu produzia na minha mente, eu questionava intensamente
suas origens, construtividade, natureza, alcance etc. Eu observava atentamente não
apenas o comportamento das pessoas, mas era um contínuo viajante na trajetória do meu
próprio ser. Assim, durante o processo de observação dos fenômenos psíquicos, eu
27
expandia, através da arte da formulação de perguntas, a arte da dúvida. Esta estimulava
meu processo de interpretação e, conseqüentemente, minha produção de conhecimento.
Através da expansão da produção de conhecimento, aprimorava a arte da crítica.
Com isso, aprendi pouco a pouco a usar a arte da crítica, não apenas para criticar todo
conhecimento que previamente eu tinha sobre os fenômenos psíquicos que observava,
mas também para criticar toda interpretação e produção de conhecimento que extraía
deles. (CURY, 1999)
Vivi intensamente a arte da formulação de perguntas, a arte da dúvida e da
crítica, que chamo de "tríade da arte da Pesquisa Multifocal". Elas são fundamentais na
produção da pesquisa científica e até na convivência social. Elas foram para mim a
fonte motivadora do processo de produção de conhecimento sobre os complexos e
sofisticados processos de construção dos pensamentos.
O exercício contínuo da "tríade da arte da Pesquisa Multifocal" foi me levando,
ao longo dos anos, a desenvolver dois procedimentos sofisticados ligados à busca do
"caos intelectual" que objetivavam tanto processar a descontaminação da interpretação
quanto expandir as possibilidades de construção do conhecimento. A busca do caos
intelectual também me levou pouco a pouco a aprimorar dois instrumentos de
observação e análise (instrumentos empíricos), que é a análise das causas históricas
(variáveis ligadas à memória) e das circunstancialidades biopsicossociais (variáveis
intrapsíquicas, intraorgânicas e sociais presentes no ato da interpretação) e a análise dos
processos de construção das variáveis da interpretação na mente ou campo de energia
psíquica. (CURY, 1999)
Tenho consciência de que abordar sucintamente esse emaranhado de
procedimentos pode gerar mais confusão do que esclarecimento. Minha intenção é
evidenciar que um pensador precisa pesquisar com critério e rejeitar determinadas
atitudes especulativas e teoricistas. Penso que um teórico da Filosofia não precisa
evidenciar seus procedimentos, pois a grandeza das suas idéias está no conteúdo do seu
discurso teórico; mas um teórico da Psicologia precisa, embora muitos deles não o
tenham feito, pois ele estuda fenômenos intrapsíquicos específicos e sua produção de
conhecimento objetiva alcançar uma aplicabilidade psicossocial na educação, nas
relações sociais e no campo das doenças psicossociais e psíquicas.
Como procurei pesquisar o homem na perspectiva psicossocial e filosófica, bem
como com outras ciências, sinto a necessidade de fazer uma exposição sucinta desses
procedimentos de análise multifocal que desenvolvi na trajetória da minha pesquisa.
28
A busca do caos intelectual no processo de observação e interpretação dos
fenômenos psíquicos abre algumas janelas psicossociais e filosóficas para expandirmos
as possibilidades de compreensão sobre as origens, limites, alcance, práxis, natureza dos
pensamentos (incluindo o conhecimento científico) e da consciência existencial.
É mais fácil desenvolver o autoritarismo do que a democracia das ideias, do que
redirecionar o processo de observação, interpretação e produção de conhecimentos
através do exercício da "consciência crítica do eu". O respeito e o estímulo à capacidade
de pensar do "outro" deveriam saturar todos os níveis das relações humanas, inclusive a
pesquisa científica.
Os "antídotos" intelectuais contra o autoritarismo nas relações humanas são
multifocais: a) compreender que a democracia das ideias é uma inevitabilidade; b)
respeitar o ser humano na sua integralidade; c) considerá-lo capaz de pensar e escolher
seus próprios caminhos; d) estimular a revolução das idéias que ocorre na sua mente e
procurar contribuir para que ela seja redirecionada para desenvolver a revolução do
humanismo, da cidadania e da capacidade crítica de pensar. (CURY, 1999)
Por sua vez, as "vacinas" e "antídotos" intelectuais contra os autoritarismos das
idéias e as ditaduras dos discursos teóricos produzidos na pesquisa científica também
são multifocais: exercitar a arte da formulação de perguntas, da dúvida, da crítica; a
busca do caos intelectual, a reciclagem e reorganização contínua do processo de
interpretação; a postura constantemente aberta no processo de observação, interpretação
e produção de conhecimento, capaz de se abrir sempre às novas possibilidades dos
fenômenos que contemplamos etc.
Os procedimentos metodológicos derivados da busca do caos intelectual se
tornaram importantes "vacinas" contra o autoritarismo das ideias e a ditadura do
discurso teórico na minha trajetória de pesquisa e produção de conhecimento. Porém,
não há procedimentos totalmente seguros; por isso a minha produção de conhecimento
possui limites, além de ser, como disse, apenas uma ilha no mar inesgotável da ciência.
Assim, produzir conhecimento pode ser aparentemente simples, mas a
construtividade de pensamentos é altamente sofisticada. É preciso procedimentos
metodológicos de análise igualmente sofisticados para compreender a psicodinâmica
nos bastidores da mente. Os procedimentos de pesquisa multifocais apresentados neste
capítulo tem justamente esse objetivo ao analisar cada ferramenta do programa
FREEMIND.
29
4. DISCUSSÃO DAS FERRAMENTAS DO FREEMIND
O programa FREEMIND, como apresentado no início da tese, é constituído de
12 ferramentas multifocais da psicologia educacional e social, psiquiatria social,
sociologia, pedagogia e filosofia aplicada. Ele objetiva: 1- Reeducação do Eu como
autor da história e como gestor psíquico; 2- Reorganização e amadurecimento das
relações interpessoais; 3- Desenvolvimento de hábitos para a excelência profissional, o
trabalho em equipe, a cooperação social, a solidariedade, a tolerância; 4-
Desenvolvimento de habilidades emocionais para trabalhar perdas e frustrações,
proteger a emoção, gerenciar o estresse e prevenir transtornos psíquicos.
Cada uma de suas ferramentas de educação preventiva e promoção da saúde
serão apresentadas e discutidas à luz da TIM e dos procedimentos de análise multifocal
exposto no capítulo anterior.
As 12 ferramentas do programa FREEMIND são:
1. Vivenciar doze princípios filosóficos.
30
2. Ser autor da sua história.
3. Gerenciar os pensamentos.
4. Administrar e proteger a emoção.
5. Trabalhar os papéis da memória e reeditar o filme do inconsciente.
6. A arte de ouvir e a arte de dialogar.
7. A arte do autodiálogo e a mesa-redonda do Eu.
8. Contemplar o belo.
9. Libertar a criatividade e ser empreendedor.
10. Disciplina e sonhos.
11. Ser empreendedor.
12. Resiliência e inteligência existencial.
4.1 Primeira ferramenta do FREEMIND
VIVENCIAR DOZE PRINCÍPIOS FILOSÓFICOS
Cada uma das ferramentas contém algumas complexas funções da inteligência
que devem ser trabalhadas, como foi dito, ao longo de toda a história do participante. A
primeira ferramenta procura trabalhar os doze princípios filosóficos do programa
FREEMIND. Esses princípios elaborados pela Academia de Inteligência é a razão de
ser tanto dela e como do próprio programa. Esses 12 princípios vão alicerçar todas as
demais ferramentas que serão estudadas.
Debata em grupo cada um desses princípios filosóficos e aponte quais deles você
possui e quais precisa incorporar. Desejamos que cada um deles faça parte de cada
capítulo da sua história. Leia-os e releia-os, afixe-os em seu quarto e guarde-os sempre
em sua mente.
1 - Cada ser humano, apesar dos seus defeitos, conflitos, falhas e limitações, não é
mais um número na multidão, um número de identidade ou de cartão de crédito,
mas um ser humano único e complexo. Você sente um ser humano único e complexo?
Sente que sociedade o despreza? Que valor tem sua existência? Tente definir o que é a
vida, ainda que se perca nessa definição.
31
2- Cada ser humano possui ferramentas em sua mente que podem ser trabalhadas
e desenvolvidas para deixa-lo de ser espectador passivo e se tornar diretor do
script da sua história. Você dirige seu script ou é dirigido pelos seus conflitos e
ambiente externo? O quanto você gostaria de estar no controle da sua vida?
3 – Se a sociedade te abandona a solidão é suportável, mas se você mesmo se
abandona, ela é intolerável. Você tem se abandonado? Quem mais o diminui a
sociedade ou você mesmo? Ninguém pode decidir mudar a sua história, só você mesmo,
mas é impossível mudá-la se não levar em altíssima conta sua saúde mental e sua
liberdade.
4- Não se pode mudar o passado, mas você pode investir forte e intensamente em
seu presente e mudar seu futuro. O passado produz culpa e angústia? Você tem
tentado mudar seu passado ou o presente? As pessoas que você feriu, os erros que
cometeu, os acidentes que teve no caminho, só podem ser solucionados se você
reconstruir corajosamente sua história no presente. Economize as “promessas”, seja rico
em atitudes.
5- Você deve ter um romance com sua própria história e saber que a melhor
maneira de ter esse romance é investir na felicidade e no bem estar dos outros.
Você é egoísta, pensa em si mesmo em primeiro lugar? Seu mecanismo de recompensa
é imediato, ou seja, procura o prazer a qualquer custo sem pensar nas consequências do
seu comportamento? É preocupado com a felicidade das pessoas que ama? Essa
preocupação é teórica ou real?
6 – Os fortes são especialistas em agradecer, os frágeis, em reclamar. Os fortes são
hábeis em elogiar, os frágeis são peritos em apontar defeitos. Que tipo de
especialista você é, em agradecer ou reclamar? Você agradece o ar que respira, os
alimentos sobre a mesa, o coração que pulsa incansavelmente, as pessoas que se
preocupam com você? Você é uma pessoa agradável, aproveita as oportunidades para
elogiar cada pessoa que o rodeia? Ou é intolerante, chato, entediante, um perito em ver
defeitos nos outros, um especialista em reclamar de tudo e de todos? Sabia que reclamar
em excesso é um grave defeito da personalidade, uma bomba contra o prazer de viver,
pois aumenta os níveis de exigência para se ser feliz?
32
7- Os fortes apostam tudo o que têm naqueles que pouco têm, os frágeis excluem e
não dão novas chances aos outros. Você é generoso ou punitivo? Cobra demais dos
outros? As pessoas maduras não desistem de quem amam, por mais que o decepcionem.
Jamais abandonam os feridos no caminho. Seja sincero: de quem você já desistiu?
8 – Os fortes nunca desistem de si, dão sempre uma nova chance para si, os frágeis
são conformistas. Os fortes tropeçam, caem, falham, são vaiados, desacreditados,
excluídos, mas nunca desistem de reescrever sua história. Desistir não está no dicionário
de suas vidas. Os frágeis aceitam tudo passivamente, se acham incapazes, vítimas de seu
conflito, creem que são imutáveis. Quanto a este princípio filosófico, você é forte ou
frágil? Você elabora estratégias para mudar sua história emocional, social e
profissional?
9 – Os fortes usam seu sofrimento para se construir, os frágeis para se destruir. Os
fortes não são heróis, nem perfeitos. Eles choram, se perturbam e sentem que em alguns
momentos lhes faltam forças para continuar, mas têm uma característica fundamental:
usam seu sofrimento para se construir e não para se destruir. Usam abusos sexuais,
humilhações sociais, conflito dos pais, privações financeiras, abandonos, perdas de
pessoas queridas, derrotas, traições, enfim, todos os tipos de sofrimentos que por
ventura vivenciou não para se envergonhar, punir-se, fugir do mundo ou odiá-lo, mas
para escrever os capítulos mais importantes da sua história. Na infância, eles não tinham
ferramentas para se reconstruir, na vida adulta, não abre mão delas, as procuram como o
sedento no deserto. Você deseja procurá-las? Que tipo de dor você passou? Cite
algumas e recorde as atitudes que tomou e, se fosse hoje, pense nas atitudes que
tomaria.
10 - Os fortes são flexíveis, os frágeis são radicais. Os fortes compreendem, os
frágeis condenam. Você é flexível ou intolerante? Tem coragem de mudar de opinião
ou é teimoso, radical, imutável? Quem muda de opinião é frágil ou forte? Compreende
os que erram com você ou é rápido em condená-los?
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11- Os fortes expõem suas ideias, os frágeis as impõem. Você é um especialista em
expor suas ideias, em expressá-las com brandura e calma, dando o direito das pessoas as
aceitarem ou não? Ou se comporta como um deus, pressiona, eleva o tom de voz, faz
ameaças, para que seus amigos, filhos, colegas se submetam ao que pensa? Sabe ser
contrariado? Discuta esse pensamento filosófico: os fortes usam as ideias, os frágeis, a
agressividade.
12- Os fortes reconhecem suas falhas, os frágeis tem a necessidade neurótica de
estar sempre certo. Você tem coragem de reconhecer seus erros, estupidez, incoerência
ou se defende com unhas e dentes? Você tem coragem de falar das suas lágrimas para
que seus íntimos (inclusive as crianças) aprendam a chorar as deles? Discuta essa
pensamento filosófico: não há pessoas imutáveis, há pessoas sim que tem medo de
reconhecer suas “loucuras”, por isso levam para seu túmulo seus conflitos.
Dinâmica: reúna em grupo de dois e cada um conte honestamente para o seu
parceiro(a) os princípios filosóficos que mais precisa assimilar e aprender. Fale os
motivos. Depois de cinco ou dez minutos retorne o grupo.
Paradoxos doentios das sociedades modernas
Minha trajetória como psiquiatra, pesquisador e produtor de conhecimento sobre
o complexo funcionamento da mente humana me convenceu de que a nossa espécie, em
particular as sociedades modernas, está adoecendo coletivamente em seu psiquismo.
Enumerarei apenas alguns paradoxos ou pontos contrastantes e a necessidade de um
programa mais profundo para educar o Eu como gestor do intelecto e superar o cárcere
da emoção, que não apenas inclui fobias, humor depressivo, ansiedade, obsessão, mas
também a dependência de drogas/álcool:
1. O humor triste e a angústia estão aumentando. A indústria do lazer está se
expandindo. Nunca tivemos uma fonte de estímulos para excitar a emoção como na
atualidade. A indústria da moda, os parques temáticos, os jogos esportivos, a Internet, a
televisão, os estilos musicais e a literatura explodiram nas últimas décadas. Portanto,
esperávamos que nossa geração fosse a que vivesse o mais intenso oásis de prazer e
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tranquilidade. Mas nós nos enganamos, jamais fomos tão tristes e inseguros. Muitas
pessoas precisam de inumeráveis estímulos para sentir migalhas de prazer. Dantas
(2008) afirma que o discurso sobre o sofrimento psíquico passou a atuar na vida
cotidiana, de uma forma nunca vista, a partir dos anos 80 do séc. XX, tornando-se foco
de intensa preocupação social, política e de saúde mental.
O que está ocorrendo? Quem deseja ter uma mente livre deve fazer
questionamentos profundos. Um milhão de pessoas se suicidam por ano e dez milhões
tentam e felizmente não morrem. Um número muito maior do que as vítimas nas
guerras vigentes.
2. A solidão está se expandindo. As sociedades estão adensadas. No começo do
século XX, éramos pouco mais de um bilhão de pessoas. Hoje, só a China e a Índia têm,
cada uma, mais de um bilhão de habitantes. Por vivermos tão próximos fisicamente,
pensávamos que a solidão seria estancada. Mas nos enganamos novamente, a solidão
nos contaminou. As pessoas estão sós nos elevadores, no ambiente de trabalho, nas ruas,
nas praças esportivas. Estão sós no meio da multidão.
Moreira e Callou (2006) apontam que na contemporaneidade, apesar de seus
grandes avanços científicos e tecnológicos e, sua expansão nos meios de comunicação, é
possível notar uma crescente solidão no ser humano. Pois o estilo de vida individualista
e consumista compromete fortemente a comunicação entre as pessoas.
A solidão é, na atualidade, um dos mais graves problemas que desafiam a cultura
e o homem, sinaliza Ruggero (2004 apud MOREIRA; CALLOU, 2006).
3. O diálogo está morrendo. Muitos só sabem falar de si mesmos quando estão
diante de um psiquiatra ou psicólogo. Pais e filhos não cruzam suas histórias, raramente
trocam experiências de vida. A família moderna está se tornando um grupo de
estranhos, todos vivem ilhados em seu próprio mundo. 50% dos pais jamais
conversaram com seus filhos sobre suas lágrimas, medos, angústias, pesadelos. Nas
empresas e escolas as pessoas estão próximas fisicamente, mas infinitamente distantes
interiormente. Perdas, angústias, medos, conflitos não são verbalizados. 80% das
pessoas têm sintomas de timidez. Muitas pessoas tímidas são ótimas para os outros, mas
costumam ser carrascos de si mesmas.
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4. As discriminações chegaram a patamares insuportáveis. Infelizmente, nos
dividimos, discriminamos e excluímos de múltiplas formas. Não honramos o espetáculo
das ideias, nossa capacidade de pensar, o fascinante funcionamento da mente humana.
Não poucas vezes não é a discriminação imposta pelos outros que mais perturba, mas a
autodiscriminação. Você se autodiscrimina ou se diminui? E quanto a sociedade, sente
que as pessoas olham com preconceito? Esse preconceito o machuca muito ou pouco?
Já chorou ou se revoltou por causa disso?
5. A qualidade de vida está se deteriorando. Quanto pior a qualidade da
educação, mais importante será o papel da psiquiatria no terceiro milênio. Apesar dos
avanços da medicina, da psicologia e da psiquiatria, o normal tem sido ser ansioso e
estressado e o anormal tem sido ser tranquilo e relaxado. Segundo Nunomura (2004
apud PEREIRA; SILVA; SILVA, 2010) atualmente o estresse afeta inúmeras pessoas,
principalmente na fase adulta, devido a este ser o período onde se concentram as
maiores responsabilidades e pressões. O autor destaca também que o estresse tem sido
considerado a “doença do século”, agrupando diversos fatores internos e externos ao
sujeito, os quais se não forem controlados desde o início podem provocar muitas
complicações à saúde. De acordo com Instituto de pesquisa social da Universidade de
Michigan (USA) 50% das pessoas cedo ou tarde desenvolverão um transtorno psíquico
como depressão, fobias, síndrome do pânico, estresse pós-traumático, psicoses,
alcoolismo, farmacodependência. Um número assustador.
Que tipo de sintoma por ventura tem: é ansioso, agitado, tenso? Sofre por
antecipação? Acorda cansado, vive fatigado? Anda esquecido ou tem déficit de
memória? Tem sintomas psicossomáticos (dores de cabeça, muscular, taquicardia,
queda de cabelo, etc.)?
PAINEL DE DEBATE DA PRIMEIRA FERRAMENTA
Após cada ferramenta haverá um painel de debate. Esperamos que o debate já
tenha ocorrido durante toda a exposição de cada ferramenta, mas, apesar disso, o
programa FREEMIND trará sempre um painel de perguntas para trazer à lembrança
pontos importantes.
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1 - Você tem tido um romance com sua própria história? Qual o valor real que você dá
para você mesmo? Em que lugar está na sua escala de valores?
2 – O que é ser forte ou maduro para o programa FREEMIND?
3 – O que é ser frágil ou imaturo para o programa FREEMIND?
4 – você é um especialista em compreender ou em julgar? Quando você passa por um
sofrimento, seja ele qual for, você o enfrenta com maturidade e procura reciclá-lo e
usá-lo para crescer ou foge dele?
PAINEL DE EXERCÍCIOS DIÁRIOS
Faça um relatório dos seus exercícios durante a semana. O que praticou e qual
foi o resultado?
Após cada ferramenta haverá uma recomendação de exercícios diários. É
fundamental para o sucesso de cada participante que ele o pratique e faça um relatório
diário. Não basta se encantar com a ferramenta, é necessário disciplina para incorporá-
la. Antes de iniciar a exposição da próxima ferramenta, o facilitador deveria pedir para
os participantes comentarem pelo menos uma de suas práticas semanais.
1 – Escreva os princípios filosóficos que você mais precisa treinar, assimilar e trabalhar.
2 - Treine a cada momento compreender mais e julgar menos, agradecer mais e criticar
menos.
3 - Treine diariamente usar seus erros não para se punir, mas para amadurecer,
compreender as limitações da existência e ser mais tolerante com os outros.
4- Exercite encarar suas frustrações e decepções com maturidade. Jamais esqueça que
não há céus sem tempestades, nem caminhos sem acidentes. Comente as experiências
que teve na semana.
5 - Equipe seu Eu para nunca desistir de você e nem das pessoas que ama. Os fortes são
obstinados, determinados, ouvem o inaudível e veem o invisível, por isso sempre dão
uma nova chance para si e para os outros. Relate se durante a semana você vivenciou
essa ferramenta.
4.2 Segunda ferramenta do FREEMIND
O EU COMO AUTOR DA PRÓPRIA HISTÓRIA
37
Ser Autor da sua História é ser:
1. Capaz de reconhecer que cada ser humano é um ser único.
2. Gestor dos pensamentos.
3. Protetor das emoções.
4. Filtrador dos estímulos estressantes.
5. Capaz de pensar antes de reagir nos focos de tensão.
6. Capaz de construir metas claras e lutar por elas.
7. Capaz de fazer escolhas e saber que toda escolha implica em perdas e não
apenas em ganhos.
8. Capaz de tirar os disfarces sociais, ser transparente e reconhecer conflitos,
fragilidades, atitudes estúpidas.
9. Capaz de não desistir da vida, mesmo quando o mundo desaba sobre si.
10. Capaz de liderar a si mesmo, não ser controlado pelo ambiente, circunstâncias e
ideias perturbadoras.
Introdução
A educação clássica nos ensina a conhecer detalhes dos átomos que nunca
veremos e planetas que nunca pisaremos, mas não nos ensina a conhecer o planeta que
todos os dias respiramos, andamos, vivemos: o planeta psíquico. Ao longo da aplicação
do programa você será encorajado a se autoconhecer, a se mapear. O autoconhecimento
básico é fundamental para expandir o prazer de viver, superar a solidão, promover o
diálogo interpessoal, estimular a formação de pensadores, enriquecer a arte de pensar,
debelar o câncer da discriminação, prevenir a depressão, a síndrome do pânico, os
transtornos ansiosos, a dependência das drogas. Você se conhece? Já entrou em áreas
mais profundas de si mesmo? Tem medo de mapear suas fragilidades?
Por sermos uma espécie pensante, temos tendência em cuidar seriamente daquilo
que tem valor. Cuidamos do motor do carro para não fundir, da casa para não deteriorar,
do trabalho para não sermos superados, do dinheiro para não faltar. Alguns se
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preocupam com suas roupas; outros, com suas joias, e, ainda outros, com sua imagem
social.
Mas qual é o nosso maior tesouro? O que deveria ocupar o centro de nossas
atenções? O carro, a casa, o trabalho, o dinheiro, as roupas, as viagens ou a qualidade de
vida! Por incrível que pareça nossa qualidade de vida fica frequentemente em segundo
plano. Sem ela, não temos nada e não somos nada, não somos mentalmente saudáveis,
emocionalmente livres, socialmente maduros, profissionalmente realizados. Você cuida
da sua qualidade de vida?
Minayo (2000) associa qualidade de vida ao grau de satisfação encontrado na
vida familiar, amorosa, social, ambiental e à própria existência, sendo que em todas as
sondagens que são realizadas sobre essa temática se encontram valores não materiais,
como amor, liberdade, solidariedade, inserção social, realização pessoal e felicidade. A
autora acrescenta que o termo qualidade de vida abrange muitos significados, os quais
traduzem conhecimentos, experiências e valores de sujeitos e sociedades em suas
diferentes épocas e contextos culturais.
A aeronave mental tem um péssimo piloto
Você teria coragem de subir num avião e fazer uma longa viagem sabendo que o
piloto não tem experiência, tem poucas horas de vôo? Relaxaria se soubesse que ele
desconhece os instrumentos de navegação? Dormiria se ele não tivesse habilidades para
se desviar de rotas turbulentas, com alta concentração de nuvens e descargas elétricas?
Fiz essas simples perguntas numa conferência que dei sobre A Educação do
Século XXI para cerca trezentos coordenadores de faculdades, reitores e pró-reitores do
país, que representam um universo de mais de cem mil alunos universitários. É obvio
que todos responderam que se sentiriam completamente desconfortáveis. Muitos sequer
ousariam pisar nessa aeronave. Mas abaferramenta-os ao afirmar que embarcamos
diariamente na mais complexa das aeronaves e que é comandada por um piloto
frequentemente despreparado, mal equipado e mal educado e, portanto, sujeito a causa
inúmeros acidentes. A aeronave é a mente humana e o piloto é o Eu.
Se você entrar num avião de última geração ficará perplexo com a quantidade de
instrumentos para dar apoio à navegação. Mas de que adianta haver tais instrumentos se
o piloto não souber usá-los? De que adianta o Eu ter recursos para dirigir o psiquismo
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ou intelecto humano se durante o processo de formação da personalidade não aprende
os conhecimentos básicos desses instrumentos e as mínimas habilidades para operá-los?
Ninguém é tão importante como os professores(as) no teatro social, embora a
débil sociedade não lhes dê o status que merecem. Mas o sistema em que eles estão
inseridos é estressante e não forma coletivamente seres humanos que têm consciência de
que possuem um Eu, de que esse Eu é construído por mecanismos sofisticadíssimos, de
que esses mecanismos deveriam desenvolver funções vitais nobilíssimas, e de que sem
o desenvolvimento dessas funções ele poderá estar completamente despreparado para
pilotar o aparelho mental, em especial quando abarcado por um transtorno psíquico
mais grave, como a dependência de drogas, depressão e ansiedade crônica. E uma vez
despreparado, será conduzido pelas tempestades sociais e pelas crises psíquicas. Será
um barco a deriva, sem leme.
Um Eu mal formado terá grandes chances de ser imaturo, ainda que seja um
gigante na ciência; sem brilho, ainda que seja socialmente aplaudido; viver de migalhas
de prazer, ainda que tenha dinheiro para comprar o que bem desejar; engessado, ainda
que tenha grande potencial criativo.
O que seu Eu faz com as turbulências emocionais? Deixa-as passar, desvia-se
delas ou as enfrenta? Se fôssemos um piloto de avião, a melhor conduta talvez seria
desviar-se das formações densas de nuvens, mas, como pilotos mentais, essa seria a pior
atitude, embora seja a frequentemente tomada.
Em primeiro lugar, porque é impossível o Eu fugir de si mesmo. Em segundo,
porque, se o Eu exercitar a paciência para deixar as emoções angustiantes se dissiparem
espontaneamente para seguir em frente, ele cairá na armadilha da autoilusão. A
paciência, tão importante nas relações sociais, é péssima se significar omissão do Eu em
atuar no gerenciamento das dores e conflitos psíquicos. Elas apenas aparentemente se
dissiparão. Serão arquivadas no córtex cerebral (camada mais evoluída do cérebro) e
farão parte das matrizes de nossa personalidade. Atuar é a palavra chave. Em terceiro
lugar, porque poderão formar janelas traumáticas (Killer) duplo P (duplo poder: poder
de encarceramento do Eu e de expansão da janela doentia). Estudaremos esse assunto,
mas tais janelas aprisionam o Eu e o desestabiliza como gerente da mente humana.
O Eu deveria saber usar instrumentos para o enfrentamento e reciclagem das
tensões, angústias e mazelas emocionais. Mas as escolas do mundo todo não nos
ensinam a usar esses instrumentos ou ferramentas. Que tipo de ferramentas você usa
diante dos medos que furtam a tranquilidade? Os medos ou fobias vêm e aparentemente
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vão embora depois de minutos ou horas, mas nos enganamos, eles não vão embora,
ficam depositados nos bastidores da memória e pouco a pouco vão desertificando o
território da emoção.
A fobia é uma aversão irracional por insetos, elevadores (claustrofobia), falar em
público (fobia social), por sua vez, a dependência de drogas é uma atração irracional por
uma substancia. Tanto uma como a outra depende das janelas killer duplo P, produzidas
por um registro superdimensionado de experiências doentias. Depois que se instalou e
se expandiu essas janelas, cristaliza-se a dependência psicológica. A partir daí, o
verdadeiro monstro não mais é a droga química, mas o arquivamento delas nos
bastidores da mente. Esses arquivos é que controlam o Eu e “assombram” o usuário de
dentro para fora. Estudaremos que as janelas killer não podem ser deletadas, apenas
reeditadas. Por isso, superar a dependência não é uma tarefa simples ou mágica, é muito
mais do que se afastar das drogas. Depende de treinamento, educação e psicoterapia.
Bonadio (2011) afirma que a dependência química por ser uma condição crônica
apresenta demandas diversificadas dos pacientes ao longo do tempo, por isso é
imprescindível o estabelecimento de novas metas e também uma revisão nas estratégias
de reabilitação mais adequadas para atingi-las, partindo do pressuposto de uma
constante avaliação de necessidades.
E que tipo de atitude o Eu toma diante do humor depressivo que esmaga o
encanto pela existência? E dos estímulos estressantes que tira-nos do ponto de
equilíbrio? E dos pensamentos antecipatórios, da ansiedade e irritabilidade?
Infelizmente o Eu é treinado a ficar calado no único lugar que não se admite
ficar quieto. É adestrado para ser submisso no único lugar em que não se admite ser um
servo. É aprisionado no único ambiente em que só se é inteligente, saudável e feliz se
for livre. O seu Eu cala-se ou grita dentro de você. É líder ou servo dos seus
pensamentos perturbadores? Não seja rápido em responder. Pergunte se você não sofre
por problemas que ainda não aconteceram.
Os tipos de dependência
Esse programa objetiva, como foi comentado, o desenvolvimento das funções
complexas da inteligência, para promover a saúde emocional e prevenir transtornos
mentais, incluindo a dependência de drogas. A dependência das drogas é uma doença
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psíquica grave, que desertifica o prazer de viver e encarcera o ser humano na sua
própria mente, no único lugar que ele deveria ser livre. A quase totalidade dos usuários
de drogas não tem a mínima ideia do desastre nos solos do inconsciente que as drogas
causam. Apesar disso, é possível reciclar as janelas traumáticas que produzem
compulsão e dependência pelas drogas, superar o cárcere da emoção e encontrar a mais
plena liberdade. Uma tarefa difícil, mas plenamente possível, que, como sempre
enfatizaremos, exigirá educação, exercícios intelecto/emocionais diários e treinamentos.
Vejamos os dois tipos básicos de dependência que as drogas lícitas e ilícitas causam.
Dependência física: é a capacidade de uma droga de não apenas produzir efeito
psicológico, mas participar do metabolismo do organismo, a tal ponto que sua ausência
produz uma síndrome de abstinência, caracterizada por delírios, alucinações, dores pelo
corpo, diarreias, vômitos, cefaleia (dores de cabeça), alterações cardiovasculares. A
heroína e o álcool etílico são exemplo de duas drogas que produzem alta dependência
física. A dependência física da heroína pode se instalar em uma semana. É usada
frequentemente injetável. As bebidas alcoólicas podem demorar meses ou anos,
dependendo da frequência do uso, do tipo de organismo e do teor alcoólico das bebidas
ingeridas.
Dependência psicológica: é a capacidade de uma droga produzir efeito
psicológico intenso e rápido, gerando matrizes traumáticas no córtex cerebral, aqui
chamadas de janelas Killer duplo P: poder de fechar o circuito da memória e encarcerar
o Eu e poder de descolar a personalidade, levando-a a ser dependente, insegura, frágil.
Essas janelas traumáticas produzem uma necessidade compulsiva (“fissura”) pelo uso
de uma nova dose da droga. Quando o usuário deixa de usá-las por um determinado
período abrem-se algumas dessas janelas Killer duplo P nos solos do inconsciente, o
que gera uma atração intensa e irracional por elas, traduzida por uma rica
sintomatologia: ansiedade, insônia, humor depressivo, emoção aflitiva, irritabilidade,
angústia. Frequentemente o usuário não identifica esses sintomas como sendo da
dependência psicológica da droga que está usando, mas como problemas existenciais
que está atravessando. Esta falta de identificação agiganta o monstro da dependência ao
longo do tempo. Exemplo de drogas que provocam dependência psicológica é o crack e
a cocaína.
Nunca devemos nos esquecer que toda droga que produz dependência física
produz também dependência psicológica. Mas nem toda que produz dependência
psicológica produz dependência física. O crack e a cocaína por apresentarem graves
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sintomas psicológicos, mas não apresentarem dependência física significativa, ou seja,
por não gerarem sintomas orgânicos importantes com a abstinência (dores pelo corpo,
tremores, náuseas, aumento da temperatura), leva o usuário a ter a falsa ideia de que está
no controle do uso, o que, infelizmente, o conduz a afundar na lama da dependência,
levando-o frequentemente a reconhecer que está doente ou dependente numa fase mais
grave.
A heroína, ao contrário, por causar alta dependência física, em poucos dias leva
o usuário a sentir em seu corpo os terríveis efeitos da abstenção da droga, conduzindo-o
a ter mais humildade para reconhecer que está dependente, o que o faz procurar ajuda
mais rapidamente.
Drummond e Drummond-Filho (2004) sinalizam que apenas 10% dos usuários
de drogas desenvolvem dependência, ou seja, não são todas as pessoas que usam drogas
que são dependentes. Isso ocorre porque a relação de cada indivíduo com a droga é
muito distinta internamente, sendo que os dependentes químicos desenvolvem uma
relação de total dependência da droga, depositando nela toda sua motivação e controle
de sua vida. Já os nãodependentes conseguem ter a atitude de parar o consumo ao
perceber os estragos que a mesma provoca em sua vida, seja no trabalho, nas relações
familiares ou em sua vida social.
Que tipo de droga você usou? Qual foi a escalada ou as drogas que passou?
Quais foram os sintomas físicos e psíquicos mais importantes que sentiu quando
interrompeu o uso? Você dirige a sua vida? Falta-lhe honestidade para reconhecer sua
fragilidade e dependência? Dê uma nota de zero a dez que reflete seu nível de
honestidade consigo mesmo. Pegue uma folha de papel e faça um relatório sobre as
respostas a essas perguntas.
Saiba que a superação do uso de drogas, a educação da emoção e a
ressocialização do usuário exige grande empenho! Uma MENTE LIVRE (FREEMIND)
exige entrega absoluta para um novo projeto de vida. Nenhum psiquiatra, psicólogo,
educador, colaborador, pode fazer isso por você.
Uma mente saudável não exige que sejamos heróis
As mudanças na psique humana não aceita atos heroicos. Se você disser que de
hoje em diante será livre, tolerante, generoso, seguro, tranquilo, bem humorado,
provavelmente sua intenção heroica se dissipará como água no calor dos problemas que
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enfrentará. Até um psicopata tem, em alguns momentos, intenção de mudar sua história,
mas falha. A verdadeira liberdade é um treinamento que se conquista dia a dia,
formando, como veremos, plataformas de janelas light (formadas por experiências
saudáveis), que alicerçam o Eu como gestor de nossas mentes e como autor de nossas
histórias.
O FREEMIND é um projeto que clama que cada ser humano possua uma rica
história que contenha lágrimas, alegrias, falhas, coragem, timidez, ousadia, insegurança,
sonhos, sucessos, frustrações, solidão, dependência doentia. Você é um ser humano
complexo.
A última fronteira da ciência é desvendar como pensamos, qual a natureza e os
tipos de pensamentos, como o Eu desenvolve a consciência e pode ser o gestor de
nossas mentes. Nossa espécie tem o privilégio de ser uma espécie pensante entre
milhões de espécies na natureza, mas, infelizmente, ela nunca honrou adequadamente a
arte de pensar. As discriminações que sempre mancharam nossa história são um
testemunho evidente de que não honramos essa fascinante arte.
Infelizmente, pela falta de compreensão do espetáculo da vida e dos segredos
que nos tecem como seres que pensam, sempre nos dividimos. A paranóia de querer
estar um acima do outro e as guerras ideológicas, comerciais e físicas são reflexos de
uma espécie doente e dividida.
Não percebemos que, no teatro da nossa mente, somos todos iguais. Não somos
judeus, árabes, americanos, brasiferramentaros, chineses. Somos seres humanos,
pertencentes a uma única e fascinante espécie. Temos diferenças culturais, mas os
fenômenos que constroem as cadeias de pensamentos e transformam a energia
emocional são exatamente os mesmos em todo ser humano. Por isso, toda discriminação
é desinteligente e desumana.
Todos somos artistas no teatro da vida
Talvez você nunca tenha ouvido falar sobre isso, mas se apaixonar pela vida e
pela espécie humana são condições fundamentais para se ter alta qualidade de vida e
sabedoria.
Por favor, lembre-se sempre disto:
1- A vida que pulsa dentro de nós, independente de nossos erros, acertos, status e
cultura é uma joia única no teatro da existência;
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2- Cada ser humano é um mundo a ser explorado, uma história a ser compreendida,
um solo a ser cultivado. É uma atitude irracional valorizarmos alguns artistas de
Hollywood, políticos e intelectuais e não valorizarmos na mesma estatura nossa
indecifrável capacidade de pensar. Afinal de contas, todos somos grandes
artistas no anfiteatro da nossa mente.
Que espécie é essa em que alguns são supervalorizados e a maioria é relegada ao
rol dos anônimos? Isso é uma mutilação da inteligência. Muitos podem não ter fama e
status social, mas para a ciência todos somos igualmente complexos e dignos.
A rainha da Inglaterra nunca teve mais valor nem mais complexidade intelectual
do que um miserável das ruas de Londres. Einstein e Freud não tiveram mais segredos
psíquicos do que um faminto do terceiro mundo, um dependente de drogas ou um
criminoso. Essa é uma verdade científica.
Quando você lê sua memória em milésimos de segundos e escolhe, sem saber
como, as informações em meio a bilhões de opções em seu inconsciente para construir
uma única ideia, você está sendo um grande artista. Você crê nisso?
Supervalorizar uma minoria de intelectuais, artistas, políticos, empresários pode
ser tão traumático quanto discriminar. Respeitar e tomar algumas pessoas como modelo
é saudável, mas supervalorizá-las bloqueia nossa inteligência e capacidade de decidir.
Hitler foi supervalorizado. As consequências foram trágicas.
A primeira grande ferramenta da qualidade de vida do programa FREEMIND é:
ser autor da sua história. Para ser autor da sua história, é necessário primeiramente
enxergar a grandeza do psiquismo humano e nunca se diminuir, se inferiorizar ou ser
um coitadista que tem pena de si mesmo, que fica procurando culpados pelos nossos
conflitos. Ainda que haja culpados, o importante não é ir a caça às bruxas fora de nós,
mas encontrar os fantasmas em nossas mentes e reciclá-los, reeditá-los, eliminá-los. Um
Eu que é coitadista esmaga sua coragem para reescrever sua história.
Em segundo lugar, deve ter consciência de que na essência psíquica somos
iguais e nas diferenças nos respeitamos. Uma pessoa madura não exige que os outros
tenham a mesma crença, pensamento, cultura e modo de vida que temos.
Em terceiro lugar, deve aprender gerir seus pensamentos e emoções, ferramentas
que trataremos nos próximos capítulos. Ninguém pode ser um grande líder no teatro
social se primeiramente não o for no teatro psíquico.
Ter a capacidade de gerenciar as emoções, de acordo com Mayer e Salovey
(1999 apud MUNIZ; PRIMI, 2007), envolve adquirir tolerância às experiências
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emocionais mais intensas e também obter o conhecimento e emprego efetivo de
estratégias de alterações desses sentimentos. Sendo assim com o passar do tempo pode
tornar-se possível entender as reações emocionais, avaliando-as, controlando-as e
compreendendo-as.
O resgate da liderança do Eu
Muitos confundem o significado do Eu. Mesmo nas teorias psicológicas, há uma
carência de definição adequada. De acordo com a teoria da Inteligência Multifocal, o Eu
representa a nossa consciência crítica, nossa vontade consciente e capacidade de decidir.
O Eu é a nossa identidade. Não é um mero realizador de tarefas, eu posso, quero, faço.
O Eu é a nossa capacidade de analisar as situações, duvidar, criticar, fazer
escolhas, exercer o livre-arbítrio, corrigir rotas, estabelecer metas, administrar o
psiquismo.
Agrônomos discutem microelementos para nutrir as plantas, médicos debatem
sobre moléculas medicamentosas, economistas discorrem sobre medidas para controlar
o fluxo de capitais internacionais, mas não sabemos quase nada sobre como formar o Eu
como diretor psíquico. O sistema acadêmico nos prepara exercer uma profissão e para
conhecer e dirigir empresas, cidades ou estados, mas não a nós mesmos. Essa lacuna
gerou déficits gritantes na formação do Eu, que por sua vez, se tornou um dos
importantes fatores que fomentaram as falhas históricas do Homo sapiens.
Não é loucura um mortal produzir guerras e homicídios? O caos dramático da
morte perpetrado na solidão de um túmulo deveria produzir um aporte mínimo de
sabedoria para o Eu para controlar sua violência, mas não é suficiente. Um Eu infantil,
pouco dado a interiorização, postula-se como deus. Não é estupidez um ser humano que
morre um pouco a cada dia ter a necessidade neurótica de poder como se fosse eterno?
Não é estupidez um homem que não sabe como gerenciar seus pensamentos ter a
necessidade ansiosa de controlar os outros?
Não é uma barbaridade querer ser o mais rico, famoso ou o mais eficiente
profissional no leito de um hospital? Ninguém quer isso. Mas por que muitos que têm
espetacular sucesso social e financeiro, ao invés de relaxar e se deleitar, continuam num
ritmo alucinado, procurando metas inalcançáveis? Um Eu competente não quer dizer
um Eu bem formado. Um Eu mal formado pode ser eficientíssimo para o sistema social,
mas, simultaneamente, ter uma péssima relação consigo mesmo.
Augusto cury programa
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  • 1. Florida Christian University - FCU PhD – Doctor of Philosophy in Business Administration Augusto Cury Programa Freemind como Ferramenta Global para Prevenção de Transtornos Psíquicos Orlando, Florida - USA 2013
  • 2. AGRADECIMENTOS Tenho muito que agradecer a notáveis pessoas por incentivar, apoiar, praticar e contribuir com essa tese. Sem elas, esse programa não teria asas para voar. Agradeço ao doutor Anthony B.Portigliatti, as empresas Abril Educação, Abril-mídia, CPFL, ao grupo YPÊ, Usina Colorado, pela sua preocupação em formar uma juventude mentalmente saudável e intelectualmente pensante; aos distintos irmãos Martelli e Paulo Martelli e sua equipe pela dedicação altruísta; ao ilustre amigo Dr. Laco; a Secretaria da Justiça do Estado de São Paulo, ao ministério da Educação, da Saúde, a Polícia Federal, OMS (Organização Mundial de Saúde) pela dedicação à prevenção e/ou ao combate ao tráfico de drogas; aos meus amigos Marcos, Tomas e Regina da Editora Sextante por seu desejo de contribuir com uma sociedade mais solidária e inteligente, e a psicóloga Vanessa Veríssimo pela colaboração no programa FREEMIND. Agradeço ainda a Dra. Juliana Leonardi por levar a capacitação de multiplicadores do Programa FREEMIND a diversos educadores, cuidadores, advogados, jovens e lideranças da paz nas cidades de Mogi Guaçu, Mogi Mirim, Campinas e Americana no ano de 2013, bem como a todos os professores de todas as escolas que se dedicam à prevenção como melhor forma de promover a saúde psíquica; a Camila Cury, Carolina Cury e ao Bruno Oliveira e a todo o corpo de psicólogos, pedagogos e funcionários do meu instituto (Instituto Augusto Cury) e da Escola da Inteligência, e aos mais de 100 mil alunos que aplicam seus programas, que objetivam promover a saúde emocional, relações saudáveis e as funções mais complexas da inteligência, como pensar antes de reagir, colocar-se no lugar dos outros, filtrar estímulos estressantes, resiliência, raciocínio complexo, etc. E a todos os pacientes que atendi ao longo de mais de vinte mil sessões de psicoterapia e consultas psiquiátricas. Essa lista é completamente injusta, seja no elogio aos aqui listados, seja na omissão de diletos colaboradores. Ela apenas representa uma amostra de seres humanos que me incentivaram incansavelmente a elaborar e escrever o programa FREEMIND. Todas elas acreditam que a vida é um espetáculo imperdível e que vale a pena encená-la no teatro da existência mesmo quando o mundo desaba sobre nós. Este trabalho é dedicado às mulheres da minha vida. Minha esposa Suleima e minhas filhas Camila, Carolina e Claudia.
  • 3. EPÍGRAFE Quando somos abandonados pelo mundo, a solidão é superável; quando somos abandonados por nós mesmos, a solidão é quase incurável. Augusto Cury
  • 4. RESUMO CURY, Augusto. Programa FREEMIND como ferramenta global para a prevenção de transtornos psíquicos. 2013. 204f. Tese (Doutorado) – Florida Christian University. Florida, 2013. Esta pesquisa teve por objetivo analisar o programa FREEMIND como ferramenta global para a prevenção de transtornos psíquicos. O programa FREEMIND é constituído por 12 ferramentas multifocais da psicologia educacional e social, psiquiatria social, sociologia, pedagogia e filosofia aplicada. O programa objetiva: 1- Reeducação do Eu como autor da história e como gestor psíquico; 2- Reorganização e amadurecimento das relações interpessoais; 3- Desenvolvimento de hábitos para a excelência profissional, o trabalho em equipe, a cooperação social, a solidariedade, a tolerância; 4- Desenvolvimento de habilidades emocionais para trabalhar perdas e frustrações, proteger a emoção, gerenciar o estresse e prevenir transtornos psíquicos. As 12 ferramentas de intervenção preventiva do programa são: 1) Vivenciar os 12 princípios filosóficos; 2) Ser autor da sua história; 3) Gerenciar os pensamentos; 4) Administrar e proteger a emoção; 5) Trabalhar os papéis da memória e reeditar o filme do inconsciente; 6) A arte de ouvir e a arte de dialogar; 7) A arte do autodiálogo e a mesa-redonda do Eu; 8) Contemplar o belo; 9) Libertar a criatividade e ser empreendedor; 10) Disciplina e sonhos; 11) Ser empreendedor e, 12) Resiliência e inteligência existencial. Cada uma das 12 ferramentas do programa FREEMIND foi analisada a partir dos procedimentos de análise da Teoria da Inteligência Multifocal (TIM), tais como a arte da formulação de perguntas, da dúvida e da crítica, a busca do caos intelectual e os dois instrumentos empíricos ligados à análise dos processos de construção dos pensamentos e das variáveis que atuam na construção das cadeias de pensamentos. Palavras-chave: Prevenção. Promoção da Saúde. Psicologia Multifocal
  • 5. ABSTRACT CURY, Augusto. FREEMIND Program as a global tool for the prevention of psychiatric disorders. 2013. Sheet 205. Thesis (Doctorate) – Florida Christian University.Florida, 2013. The purpose of this research was to analyze the FREEMIND program as a global tool for the prevention of psychiatric disorders. The FREEMIND program consists of 12 multifocal tools of the educational and social psychology, social psychiatry, sociology, pedagogy and applied philosophy. This program aims to: 1- The reeducation of the Self as the author of its own history as well as a psychological manager; 2- Reorganization and maturation of interpersonal relationships; 3- Development of habits for professional excellence, team work, social cooperation, solidarity, tolerance; 4- Development of emotional skills in order to work on losses and frustrations, protect the emotion, manage stress and prevent psychiatric disorders. The 12 tools of preventive action in this program are: 1) Experiencing the 12 philosophical principles; 2) Being the author of your own history; 3) Managing thoughts; 4) Administrating and protecting the emotion; 5) Working on memory roles and re-editing the film of the unconsciousness; 6) The art of listening and the art of dialoguing; 7) The art of the self-dialogue and the Self´s round table; 8) Contemplating the beauty; 9) Releasing the creativity and being an entrepreneur; 10) Discipline and dreams; 11) Being an entrepreneur and, 12) Resilience and existential intelligence. Each one of the 12 tools of the FREEMIND program has been analyzed based on the Theory of Multifocal Intelligence (TMI) analysis procedures, such as the art of formulating questions, of doubt and of criticism, the search for the intellectual chaos and the two empirical instruments linked to the analysis of the thought construction processes and of the variables that act in the chains of thought construction. Key-words: Prevention. Health Promotion.Multifocal Psychology
  • 6. SUMÁRIO 1.0 INTRODUÇÃO....................................................................................................................10 2.0 OBJETIVOS.........................................................................................................................22 3.0 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO...........................................................23 3.1 TEORIA DA INTELIGÊNCIA MULTIFOCAL (TIM)......................................................................23 3.2 METODOLOGIA DA TIM .................................................................................................................29 4.0 DISCUSSÃO DAS FERRAMENTAS DO FREEMIND ..................................................34 4.1 PRIMEIRA FERRAMENTA DO FREEMIND: VIVENCIAR 12 PRINCÍPIOS FISLOSÓFICOS...34 4.2 SEGUNDA FERRAMENTA DO FREEMIND: SER AUTOR DA SUA HISTÓRIA........................41 4.3 TERCEIRA FERRAMENTA DO FREEMIND: GERENCIAR OS PENSAMENTOS......................63 4.4 QUARTA FERRAMENTA DO FREEMIND: ADMINISTRAR E PROTEGER A EMOÇÃO.........82 4.5 QUINTA FERRAMENTA DO FREEMIND: TRABALHAR OS PAPÉIS DA MEMÓRIA E REEDITAR O FILME DO INCONSCIENTE...........................................................................................98 4.6 SEXTA FERRAMENTA DO FREEMIND: A ARTE DE OUVIR E A ARTE DE DIALOGAR ....113 4.7 SÉTIMA FERRAMENTA DO FREEMIND: A ARTE DO AUTODIÁLOGO E A MESA- REDONDA DO EU.................................................................................................................................126 4.8 OITAVA FERRAMENTA DO FREEMIND: CONTEMPLAR O BELO ........................................140 4.9 NONA FERRAMENTA DO FREEMIND: LIBERTAR A CRIATIVIDADE E SER EMPREENDEDOR .................................................................................................................................149 4.10 DÉCIMA FERRAMENTA DO FREEMIND: DISCIPLINA E SONHOS......................................158 4.11 DÉCIMA PRIMEIRA FERRAMENTA DO FREEMIND: SER EMPREENDEDOR....................170 4.12 DÉCIMA SEGUNDA FERRAMENTA DO FREEMIND: RESILIÊNCIA E INTELIGÊNCIA EXISTENCIAL........................................................................................................................................181 5.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................196 6.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................200
  • 7. 7 1. INTRODUÇÃO Teoria da Inteligência Multifocal, que é uma das poucas teorias mundiais que estuda o processo de construção de pensamentos e o processo de formação de pensadores. Como o programa FREEMIND é uma tese de doutorado, e, ao mesmo tempo, um programa de caráter universal, os participantes serão “bombardeados” frequentemente com a arte da pergunta, que é o principio da sabedoria na filosofia, para reciclarem seus paradigmas, falsas crenças, verdades absolutas e, desse modo, serem provocados a abrirem o leque da inteligência, estimular o debate de ideias e expandir os horizontes do conhecimento. Retirar o participante da passividade e estimulá-lo a ser construtor do script da sua história é a meta fundamental. Quando o Eu, que representa a capacidade consciente de escolha ou autodeterminação, está relativamente maduro no final da adolescência, portanto, relativamente capaz de filtrar estímulos estressantes e de escrever a sua própria história, o ser humano já é refém de seu passado, de milhares de janelas no córtex cerebral que contém milhões de experiências. E, como estudaremos, nenhuma dessas janelas, que são áreas de leituras da memória num determinado momento existencial, pode ser deletada, apenas reeditada, o que indica as gigantescas dificuldades de mudar a base da nossa personalidade. Enfim, o Eu do adulto quando tem consciência crítica de que é um ser único no “teatro” social, sua mente já possui inúmeros núcleos de habitação na sua memória que dão sustentabilidade para as suas principais características, sejam elas doentias ou saudáveis, como a timidez, a ousadia, a sensibilidade, a impulsividade, a flutuabilidade emocional, humor depressivo, bom humor, determinação, insegurança, conformismo, baixo limiar para suportar frustrações. Sem uma educação profunda, o Eu na plenitude da sua liberdade para agir na sua própria personalidade viverá paradoxalmente numa masmorra! Pense na timidez e na fobia social (medo de se expressar em público). Algumas estatísticas demonstram que a timidez atinge mais de 80% dos jovens. Reciclá-la não é ter uma atitude heroica de mudança. A intencionalidade não muda a base da personalidade, pois gera uma janela solitária, que não é encontrada num foco de tensão. Faz-se necessário uma plataforma de experiências capaz de formar um novo núcleo de habitação do Eu e, assim, dar sustentabilidade à ousadia e à espontaneidade diante de uma plateia. Mas para isso
  • 8. 8 também se faz necessário uma nova agenda educacional, onde o Eu durante semanas, meses e anos, constrói essas plataformas no córtex cerebral. Por isso o programa FREEMIND advoga de que o Eu pode e deve aprender desde a mais tenra infância ferramentas para ser autor da própria história. Ou seja, à medida que ele é formado ele também se torna um formador, à medida que é educado ele se torna também educador da emoção e gerenciador dos pensamentos. A educação clássica ensina milhões de informações para os alunos da pré-escola a pós-graduação sobre o mundo em que estamos, do imenso espaço ao pequeno átomo, mas pouco ensina sobre o planeta psíquico, sobre os fenômenos que nos torna seres pensantes, Homo sapiens. É por isso que a educação clássica nessa sociedade estressante, hipercompetitiva e saturada de informações, forma, com as devidas exceções meninos com diplomas nas mãos, sem proteção emocional, sem habilidades para lidar com perdas e frustrações, sem capacidade para ser líder de si mesmo. Mas esse tipo de educação é de responsabilidade dos pais ou da escola? De ambos. Não podemos lotear os alunos. Ambos têm responsabilidades pelo futuro emocional, social e profissional dos seus educandos. Muitos pais terceirizam a educação, atribuindo-a a escola uma responsabilidade que também é sua, o que é um erro imperdoável. Mas a escola, com as devidas exceções, se esquiva de assumir sua parte nesse processo. Encarrega-se de transmitir milhões de dados sobre o mundo em que estamos, mas frequentemente se cala sobre o mundo que somos. Tenho dito em dezenas de países que se a escola não se tornar uma escola que educa a emoção e não trabalha as funções mais complexas da inteligência, ela será formadora de repetidores de informações e não de pensadores. Repetidores de informações obedecem a ordens, tem baixo nível de consciência crítica e autonomia. Veja o caso da Alemanha pré-nazista. Os alemães ganharam um terço dos prêmios Nobel na década de trinta do século XX. Ela tinha a melhor educação clássica: a melhor matemática, física, química, engenharia. Mas não foi suficiente para expurgar Hitler, um homem inculto, rude, tosco, mas, ao mesmo tempo teatral. Quando ele surgiu no cenário com Goebbels, Himmler, Goring e outros e juntos começaram seu marketing de massa, seduziram a juventude alemã. O Eu deles não era autor da sua história, não era autônomo. Numa situação especial capitaneada pela insegurança alimentar, fragmentação política, 30% de desempregados e humilhação pelo tratado de Versalhes, um pool de janelas traumáticas que dominava o inconsciente coletivo dos alemães comprometendo
  • 9. 9 sua consciência crítica emergiu. A educação clássica, embora notável, não produziu pensadores coletivamente para rejeitar drasticamente o marketing de massa. Hitler e Goebbels devoraram primeiramente o inconsciente coletivo dos alemães para depois “devorar” judeus, marxistas, eslavos, ciganos, homossexuais, e outras minorias. Quem imaginaria que a nobre Alemanha de Kant e de Hegel seria protagonista dessa atrocidade? Com esse tipo de educação clássica atual que forma repetidores de informações, onde os alunos são fissurados pelas redes sociais, onde contatam muitos, mas raramente profundamente a alguém, estamos preparados para não repetir outros holocaustos quando uma nova onda de conflitos mundiais, capitaneada pelo aquecimento global, insegurança alimentar e escassez de recursos, abater o inconsciente coletivo da humanidade? A resposta provável é: infelizmente não. O programa FREEMIND, por estimular a formação de pessoas com opinião própria e que pensa como espécie e não apenas como feudo, como grupo social, cultural, filosófico, religioso, pretende funcionar como uma vacina, ainda que pequena, contra novos holocaustos. Ferramentas transculturais do FREEMIND Como o FREEMIND tem como meta o desenvolvimento das habilidades intelectoemocionais, ele pode ser útil para expandir a qualidade de vida de qualquer ser humano de qualquer sociedade, pois suas ferramentas são universais. Por exemplo, a arte de contemplar o belo, que é uma das ferramentas a ser estudada, é tanto fundamental para quem vive nas florestas como para quem vive nas metrópoles. Contemplar o belo é treinar a capacidade de observar para fazer dos pequenos estímulos da rotina diária um espetáculo aos nossos olhos e, desse modo, enriquecer o prazer de viver e estabilizar a emoção (CURY, 2009). Há uma diferença enorme entre admirar o belo e contemplar o belo. Admirar é uma experiência fugaz, efêmera e superficial. Contemplar é uma experiência arrebatadora, prolongada e profunda. Até um psicopata admira o belo. Quem vive nas matas tem mais chance de desenvolver espontaneamente a ferramenta de contemplar o
  • 10. 10 belo do que quem vive numa floresta de concreto. Nessa, não poucos, precisam de grandes estímulos (aplausos, reconhecimentos, sucessos) para sentir migalhas de prazer, o que compromete gravemente os níveis de satisfação, estabilidade e maturidade psíquica. A arte de contemplar o belo é uma função complexa da inteligência que, infelizmente, poucos desenvolvem. Ela precisa ser lapidada e treinada educacionalmente. Proteger a emoção é outra ferramenta universal. O ser humano coloca fechaduras nas portas, janelas, carros, empresas, para proteger aquilo que tem valor, mas por incrível que pareça não sabe minimamente colocar “fechaduras” em sua emoção, que é ou deveria ser a sua mais importante propriedade. Qualquer contrariedade, frustração, ofensa, dificuldade, a invade, e furta sua tranquilidade. Não é isso uma incoerência absurda? Não é sem razão que há muitos miseráveis morando em palácios. Nunca aprenderam a filtrar estímulos estressantes. Para o programa FREEMIND “proteger a emoção” é uma ferramenta fundamental para se adquirir saúde psíquica e social e conquistar uma mente verdadeiramente livre (CURY, 2013). Mas em que escola ou universidade se aprende essa complexa função da inteligência? Quais são as habilidades que se deve desenvolver para proteger a emoção? Esses assuntos vitais para o futuro da humanidade serão tratados aqui. Ferramentas utilizadas pelo grande educador da história A Teoria da Inteligência Multifocal estuda não apenas o funcionamento da mente e a construção de pensamentos, mas também a formação de pensadores, sendo uma das raras teorias que enfocam esse tema. Após terminar os pressupostos básicos da teoria, comecei a estudar os instrumentos intelectuais e emocionais que os grandes personagens da história usaram para influenciar a sociedade e brilhar na sua mente, como Moisés, Buda, Maomé, Confúcio, Sócrates, Platão, Agostinho, Freud, Einstein, e muitos outros. O programa FREEMIND contempla essas ferramentas. Também comecei a estudar sob o ângulo da ciência (psicologia, psiquiatria, sociologia, pedagogia) a personalidade do homem que “dividiu” a história, Jesus. Usei as suas quatro biografias em varias versões, chamadas de evangelhos, para analisar sua inteligência, para estudar como ele superava seus focos de tensão, protegia
  • 11. 11 seu psiquismo, filtrava estímulos estressantes, bem como quais os instrumentos mais importantes que usou para educar a emoção dos seus alunos (discípulos), lapidar seu intelecto e fazê-los superar as armadilhas da mente: o conformismo, o coitadismo, os medos (fobias), o radicalismo, o exclusivismo, individualismo, a dependência emocional, a alienação social. Claro que meu estudo é saturado de limitações e imperfeições. Ele sonhava em formar pensadores solidários, seguros (resilientes), que soubessem expor e não impor suas ideias, que pensassem antes de reagir e que, acima de tudo, fossem autores da sua própria história. Onde a fé entra a ciência se cala. O resultado dessa pesquisa psicológica e não religiosa do notável educador Jesus me fez perceber minha pequenez como pensador e educador. Suas reações fogem aos limites da nossa imaginação. Convenci-me, não pela paleografia ou arqueologia, mas através das ciências humanas, de que nenhum autor poderia construir um personagem com as suas características. Ele tinha todos os motivos para ter ansiedade, depressão, fobias, devido à avalanche de estímulos estressantes que vivenciou desde a sua infância, mas atingiu o ápice da saúde emocional, resiliência, habilidade de trabalhar perdas e frustrações. Era capaz de gerenciar sua psique e fazer “poesia” quando o mundo desabava sobre ele. Infelizmente as religiões ao longo da história o estudaram quase que exclusivamente sob o ângulo da espiritualidade e não das ciências humanas. As ferramentas que utilizou eram impactantes. Ele era capaz de dar tudo o que tinha aos que pouco tinha! Nunca desistia de um ser humano, mesmo que o traísse. Seu Eu era de tal forma altruísta, solidário e tolerante que tinha a coragem de dar a uma prostituta o status de rainha e a um discriminado leproso o status de um dileto amigo. Nos tempos de hoje, ele estenderia as mãos para qualquer pessoa socialmente rejeitada e a colocaria no centro da sua história. Certamente abraçaria os “doentes mentais” e gastaria tempo usando metáforas e dinâmicas para encorajá-lo a reciclar sua fragilidade e escrever os capítulos mais importantes de sua história nos momentos mais dramáticos da sua vida. Fui um dos maiores ateus que pisou nessa terra. A partir dessa análise deixei de considerar a busca por Deus como fruto de um cérebro apequenado que resiste ao seu caos na solidão de um túmulo e passei a entender que essa busca representa um ato inteligente de uma mente a procura do mais importante endereço, um endereço que poucos encontram, dentro de si mesmo. A ciência, que levou alguns ao ateísmo, fez-me percorrer o caminho inverso. Deixei de ser ateu, mas não defendo uma religião. Tenho
  • 12. 12 amigos em todas as religiões, católicos, protestantes, judeus, islamitas, budistas, inclusive não poucos ateus, e os respeito muito. O programa FREEMIND é um programa sem fronteiras das ciências humanas, que objetiva, como disse, atingir as mais diversas culturas, ideologias política e religiões. Uma das ferramentas do programa se encontra nessa tese: ninguém é digno da liberdade e maturidade psíquica se não respeitar os que pensam diferente! Porque falar no programa FREEMIND das ferramentas psicológicas, psicopedagógicas e sociológicas que o homem Jesus usou para equipar a inteligência de seus alunos? Primeiro, porque são ferramentais universais; segundo, porque representam um exemplo vivo da operacionalidade dessas ferramentas num grupo conflitante de jovens, como era o grupo de discípulos de Jesus; terceiro, porque bilhões de pessoas, portanto, uma parte significativa da humanidade, que abraçaram o catolicismo, o protestantismo, o islamismo (o Alcorão exalta em prosa e versa Jesus), o budismo (grande parte dos budistas o admiram), judeus (muitos o consideram o judeu mais famoso da história) não estudaram os comportamentos do Mestre dos mestres sob o ângulo da ciência e, portanto, não tiveram a oportunidade de incorporar as nobilíssimas ferramentas que ele amplamente ensinou. Milhões de pessoas admiram e exaltam Jesus a seu modo, mas tem uma emoção desprotegida, não sabem trabalhar perdas e frustrações, sua mente é terra de ninguém, não desenvolveram habilidades básicas para gerir seu psiquismo. Com muita humildade e respeito o programa FREEMIND pretende dar um choque de lucidez também nessa área tão delicada e importante. A religião, se bem usada liberta o altruísmo e a tolerância, se mal usada, pode controlar e não libertar a mente humana. Os 12 alunos do Mestre de Nazaré tinham vários conflitos importantes em sua personalidade: eram autoritários, radicais, exclusivistas, punitivos, tinham a necessidade neurótica de poder, de controlar os outros e de estar sempre certos, enfim, frequentemente lhe davam dores de cabeça. Mas depois de todo seu treinamento educacional que durou pouco mais de três anos, os transformou numa nobre casta de pensadores flexíveis, generosos, que protegiam suas emoções, gerenciavam seu estresse, dirigiam o script de sua história, e que acima de tudo consideravam a vida um espetáculo único e imperdível. Será muito interessante após estudar cada capítulo analisar como o maior educador da história aplicou as ferramentas do “FREEMIND”. Mentes livres e emoção saudável eram duas de suas metas fundamentais.
  • 13. 13 Fundamentação do FREEMIND Este programa é baseado em diversas teorias comportamentais, analíticas, filosóficas, sociológicas, pedagógicas, mas em especial na Teoria da Inteligência Multifocal (TIM.), desenvolvida pelo autor ao longo de mais de 30 anos. A TIM estuda, como o próprio nome indica, múltiplos focos do funcionamento da mente, como o processo de construção do Eu como gestor da psique, os papéis conscientes e inconscientes da memória, o processo de gerenciamento da emoção, o processo de formação de janelas traumáticas e o complexo processo de construção de pensamentos. Além disso, estuda o processo de interpretação, a construção das relações sociais e o processo de formação de pensadores (CURY, 1999). A Teoria da Inteligência Multifocal está presente em dezenas de livros publicados pelo autor em mais de sessenta países. Além disso, a TIM é objeto de mestrado e doutorado internacionais, como na FCU (Florida Christian University), USA- Flórida. Os grandes e brilhantes teóricos do passado, como Hegel, Kant, Freud, Jung, Skinner, Piaget, Sartre, usaram o pensamento como tijolo pronto para construir suas teorias sobre as relações sociopolíticas, a formação da personalidade, o desenvolvimento do aprendizado, a formação dos conflitos, mas eles não tiveram a oportunidade de estudar detalhadamente o próprio tijolo do intelecto. Ou seja, eles pouco estudaram os tipos, natureza e processos construtivos do pensamento como pedra fundamental do psiquismo. Como a TIM estuda esses fenômenos que estão na base da psique, ela não anula ou compete com as teorias sociais, psicanalíticas, construtivistas, comportamental-cognitivas, ao contrário, as fundamenta, as recicla e as expande. Quem abrir mão de escrever a sua própria história, provavelmente seus erros, conflitos, culpas, medos, rejeições, privações, traumas na infância, dependência química, as escreverão. Metaforicamente dizendo, o programa FREEMIND pode oferecer “a tinta e o papel”, mas só o participante pode escrever a sua história. Uma pessoa madura jamais dá as “costas” para seu conflito, seja qual for, mas aprende a transformar o caos em oportunidade criativa, bem como aprende a escrever os melhores textos da sua vida, ainda que com lágrimas, nos dias mais dramáticos da sua história. O programa FREEMIND demonstra que “se a sociedade te abandonar a solidão é suportável, mas se você mesmo se abandonar ela é intolerável”. Uma pessoa feliz, autônoma e saudável tem mais chances de, ao se relacionar com os outros, “arquivar” janelas Lights ou saudáveis na memória deles e contribuir para fazê-los felizes e
  • 14. 14 saudáveis. Uma pessoa emocionalmente ansiosa e estressada tem chance de “plantar” janelas Killers ou traumáticas e, assim, adoecer quem está próximo. As relações interpessoais podem contribuir para promover cárceres psíquicos ou mentes livres (FREEMIND). Operacionalidade do programa O programa FREEMIND, embora possa ser vivenciado individualmente, preferencialmente ele deve ser aplicado em grupo nas universidades, escolas secundárias, instituições sociais, empresas, igrejas, hospitais, clínicas para dependentes químicos. Se aplicado em grupo, será proposta a seguir uma série de ferramentas para a sua melhor operacionalidade. Essas ferramentas são flexíveis e devem ser adaptadas a qualquer povo, cultura ou instituição. 1- Cada participante deve ter o material antes das reuniões para poder lê-lo e estudá-lo. É fundamental estudá-lo também depois de cada reunião devido à complexidade das suas ferramentas. 2- Recomendamos que cada ferramenta seja trabalhada semanalmente em uma ou duas reuniões em dias alternados. 3- O programa foi elaborado para ser vivenciado em grupo, embora possa ser trabalhado individualmente. O número de participantes de cada grupo não é rígido: cinco, dez, quinze ou mais. Se o número for excessivamente grande para impedir a participação de todos, seria bom dividi-lo em dois grupos. 4- O grupo deve se reunir em círculo ou semicírculo. Olhos nos olhos incentivam o debate, a troca e a cumplicidade. 5- Todos devem se desarmar, tirar as máscaras e ser transparentes durante as reuniões. Quem não é transparente não se recicla, e quem não se recicla pode levar para o túmulo seus conflitos, traumas, bloqueios. 6- No inicio de cada reunião os participantes devem falar sua identidade mínima: nome, origem e principais metas psíquicas e sociais que deseja alcançar. 7- No final de cada reunião os participantes devem se cumprimentar, abraçar um ao outro e agradecer a cada um por existir. Solidariedade, tolerância e paz social são fundamentais no programa FREEMIND.
  • 15. 15 8- A duração de cada reunião é flexível, depende da capacidade de debater e dos níveis de interação dos membros do grupo, mas em tese deveria durar em torno de duas horas. 9- Seria conveniente que um líder da instituição ou membro do grupo fosse o líder ou facilitador, estudando os textos previamente e se preparando para dar uma pequena aula sobre cada ferramenta (15 a 30 minutos), antes de iniciar o debate. 10- Outro modelo de reunião, mais recomendável, é o facilitador fazer pequenas exposições de 5 a 10 minutos sobre os mais diversos temas que compõem cada ferramenta. Após cada exposição inicia-se o debate sobre o tema. Depois de esgotá-lo, outra exposição é feita provocando novos debates. 11- O verdadeiro líder ou facilitador nem sempre é o que tem mais conhecimento do grupo, mas o que mais estimula o debate, não é o que domina os participantes, mas o que mais incentiva a participação. 12- O facilitador deve levar todos os participantes a honrar e aplaudir quem fala ou expõe suas ideias. Vivemos numa sociedade castradora, que aplaude celebridades, mas não as ideias dos anônimos. Elogiar e aplaudir faz com que participar se torne um convite ao prazer e à arte de pensar. 13- Os mais tímidos devem ser encorajados a se expressarem. O facilitador e os demais membros devem comentar que a experiência deles é muito importante para o grupo. Saiba que 80% das pessoas têm sintomas de timidez e insegurança. Devemos ter medo não de falar, mas de nos omitir. O preço da omissão é muito mais caro do que os erros da ação. 14- Os que têm mais facilidade de se expressar não devem controlar as reuniões. Deve aprender a sintetizar a sua fala e descobrir o prazer de ouvir. Lembre- se que aprender a ouvir é tão fundamental como falar. 15- Cada pergunta exposta durante o texto deve servir de alvo para o debate. Esperamos que o debate já tenha ocorrido durante toda a exposição de cada ferramenta, mas para facilitá-lo, ao final de cada capítulo, haverá uma série de importantes perguntas no PAINEL DE DEBATE e, em seguida, um PAINEL DE EXERCÍCIOS DIÁRIOS. É fundamental utilizá-los. 16- O facilitador, bem como os demais membros do grupo, devem abrandar as disputas, intrigas, ofensas. Cada participante deve aprender que uma pessoa madura expõe suas ideias e não as impõe.
  • 16. 16 17- Todos devem respeitar as ideias de um participante ainda que seja contrária ao pensamento da maioria do grupo. Se o que ele pensa é débil ou infantil, dê-lhe tempo para amadurecer. Saiba que ninguém muda ninguém, só a própria pessoa pode reescrever sua história. 18- Faça a oração dos sábios quando alguém se exaltar (esbravejar-se) ou mesmo quando se emocionar e chorar: o silêncio. 19- Sonhamos que cada um dos participantes se torne multiplicadores do programa FREEMIND, futuros líderes ou facilitadores, aplicando-o nas instituições, escolas, empresas, famílias. 20- É recomendável que esse programa que dura cerca de três meses possa ser vivenciado pelos participantes pelo menos uma vez por ano nos próximos anos. A cada programa absorve-se mais as pérolas das complexas ferramentas e cristalizam-se mais as conquistas. Participar do programa FREEMIND é prazeroso, embora possa levar em alguns momentos o participante a mapear seus fantasmas: fobias, rigidez, pessimismo, autopunição, necessidades neuróticas. Usando uma cozinha como metáfora das reuniões, no inicio há certa desorganização, mas pouco a pouco os melhores pratos são elaborados. Lembre-se que todos os participantes são cozinheiros do conhecimento. Cada um deve elaborar seus “nutrientes”, ou seja, deve levar para o território da sua mente as lições e ferramentas que encontrou, aprendeu, construiu. Cada participante tem suas particularidades e limitações e elas devem ser respeitadas. Não é a quantidade de informações que é o mais importante, mas a qualidade para suprir a sua inteligência. Faremos com todos os participantes uma grande viagem, talvez a mais importante de todas, uma viagem para dentro de nós mesmos, para algumas camadas mais profundas de nossa mente. Almejamos que, através do FREEMIND, você ande em terrenos nunca antes pisados e, em especial, se torne um caminhante nas trajetórias do seu próprio ser.
  • 17. 17 2. OBJETIVOS Apresentar e analisar, segundo os procedimentos da análise multifocal, as 12 ferramentas do programa FREEMIND como estratégia global prevenção dos transtornos psíquicos e, consequentemente, subsidiar ações para a política internacional na área.
  • 18. 18 3. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO 3.1 Teoria da Inteligência Multifocal O referencial teórico utilizado para esta tese foi a Teoria da Inteligência Multifocal (TIM) que pesquiso há mais de 25 anos. A TIM foi construída objetivando funcionar como uma teoria universal para explicar os fenômenos psíquicos e psicossociais. Ela já tem sido utilizada em teses de mestrado e doutorado, em cursos de pós-graduação lato sensu nos EUA e Europa. A TIM tem como objetivo estudar o processo de construção do pensamento, os papéis conscientes e inconscientes da memória, os processos de interpretação e a formação do eu como líder do teatro psíquico. Enquanto as demais teorias produziram conhecimento usando como alicerce o pensamento pronto, a TIM estuda as variáveis e os fenômenos universais conscientes e inconscientes, por isso recebe o nome “Multifocal”, que estão na base da construção dos pensamentos e dos demais processos psíquicos. Portanto, ela não anula e nem compete com as demais teorias, mas procura
  • 19. 19 contribuir para criticá-las, reciclá-las, fundamenta-las e abrir novas avenidas de pesquisa para as demais teorias psicológicas, filosóficas, sociológicas e educacionais. A TIM não é uma teoria fechada, mas aberta, muito ainda há que se produzir, reciclar e desenvolver no seu bojo. Inúmeras áreas ainda precisam ser investigadas e compreendidas no complexo e insondável mundo da psique humana. A própria teoria revela que a verdade essencial é um fim inatingível, isto se deve tanto pelo fato de que o pensamento consciente, aqui chamado de dialético, não incorpora a realidade intrínseca do objeto que ele investiga, quanto porque o próprio processo de construção dos pensamentos sofre um sistema de encadeamento distorcido capaz de fazer não apenas com que dois observadores interpretem de maneira distinta, mas com que um mesmo observador interprete micro ou macro distintamente um mesmo objeto em momentos diferentes. Através das ferramentas da TIM, utilizadas no programa FREEMIND, a psicologia, a psiquiatria, as ciências da educação e sociologia terão subsídios para entender alguns pilares da história intrapsíquica, arquivada na memória, da natureza dos pensamentos, do caos e da reorganização da energia psíquica, da formação do eu, da formação dos paradigmas culturais, da construção das relações sociais, da psicopedagogia da aprendizagem e da psicopatologia da hiperatividade, do autismo, da depressão, da síndrome do pânico, do TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), das psicoses funcionais. Embora muitas outras relevantes teorias já tenham sido desenvolvidas, a presente teoria nasceu não apenas da observação direta do comportamento sob os alicerces metodológicos já existentes na ciência, mas também sob a confecção de novas metodologias. O desenvolvimento da TIM exigiu a produção de uma nova interpretação e da produção de conhecimento, ela explica por que multiplicamos as escolas, mas não multiplicamos a formação de pensadores, por que estamos produzindo uma massa de expectadores passivos do conhecimento e não pessoas que expandam o mundo das ideias, porque estamos ainda gerando uma população de repetidores de informações e não universitários que rompam o cárcere da rotina e saibam utilizar a arte da dúvida e da crítica. A falta do conhecimento sobre os processos de construção dos pensamentos, sobre o processo de interpretação e sobre os limites e o alcance de uma teoria pode conduzir os pesquisadores que procuram defender teses acadêmicas a fechar as janelas do pensamento. Seria importante que os usuários de uma teoria, não a utilizassem como
  • 20. 20 se ela incorporasse a verdade essencial, mas como um suporte limitado do processo de observação e interpretação. Qualquer usuário de uma teoria que é incapaz de criticá-la será um mero reprodutor das suas idéias, traindo-a interpretativamente sem o saber e praticando uma ditadura intelectual no exercício da sua profissão ou na sua produção de conhecimento científico. Esse processo é passível de ocorrer não apenas nas ciências da cultura, mas também nas ciências físicas, biológicas e correlatas. As idéias, mesmo as que são consideradas verdades científicas, não são fins em si mesmas, pois não são coincidentes com a verdade essencial, que é inatingível. Produzir ciência não é uma tarefa simples. A falta de conhecimento dos processos de construção dos pensamentos, dos limites e do alcance de uma teoria, bem como dos sistemas de encadeamentos distorcidos, passíveis de ocorrer no processo de interpretação, faz com que muitos tenham o conceito errado de que, para produzir ciência ou se tornar um cientista, basta defender uma tese acadêmica. Devemos repensar o processo de formação de pensadores antes de pensar na produção da própria ciência. Devemos nos preocupar com a qualidade da inteligência dos pensadores. Nas ciências da cultura, na qual se inclui a Psicologia, a Filosofia, a Educação, a Sociologia, entre outras, não há muitos recursos financeiros para incentivar a formação de pensadores e a expansão das idéias psicossociais, como o têm as ciências naturais, que incluem a Computação, a Biologia, a Química, cujas pesquisas resultam em produtos industriais. Se o capital é pequeno nas ciências da cultura, deveria haver, então, um processo de compensação, através da expansão da qualidade dos pensadores pelo uso de procedimentos que estimulam a plasticidade construtiva e a liberdade criativa do conhecimento. Caso contrário, o contraste do desenvolvimento entre as ciências naturais e as ciências da cultura continuará e aumentará. A Física sabe como penetrar nas entranhas do átomo e distinguir as partículas atômicas, tão ocultas aos olhos, e a Psicologia educacional não sabe como prevenir eficientemente a discriminação racial dos negros, tão visível aos olhos, nem como prevenir o uso de drogas que acomete milhões de jovens. Se esse contraste se perpetuar, seremos cada vez mais gigantes na tecnologia e anões na prevenção das doenças psíquicas, psicossomáticas, psicossociais, bem como na expansão do humanismo, da cidadania e da democracia das idéias. Nessa situação, o homem do século XXI, que navegará cada vez mais pelo espaço e pela Internet, terá infelizmente cada vez mais dificuldade de navegar para dentro de si mesmo, de se interiorizar e de se repensar, de
  • 21. 21 superar seus estímulos estressantes e de falar de si mesmo. Talvez ele só consiga se interiorizar e falar de si mesmo, como já tem acontecido, quando estiver diante de um psiquiatra ou de um psicoterapeuta. (CURY, 1999) Uma das mais importantes explorações do homem, se não a maior delas, é a exploração de si mesmo, do seu próprio mundo intrapsíquico. Aprender a se interiorizar; a criar raízes mais profundas dentro de si mesmo; a explorar a história intrapsíquica arquivada na memória; a questionar os paradigmas socioculturais; a trabalhar com maturidade as dores, perdas e frustrações psicossociais; aprender a desenvolver consciência crítica, a conhecer os processos básicos que constroem os pensamentos e que constituem a consciência existencial são direitos fundamentais do homem. Porém, freqüentemente, esses direitos são exercidos com superficialidade na trajetória da vida humana. Um dos principais motivos do aborto desses direitos é que o homem moderno tem vivido uma dramática crise de interiorização. O ser humano, como complexo ser pensante, é um exímio explorador. Ele explora, ainda que sem a consciência exploratória, até mesmo o meio ambiente intrauterino, através dos malabarismos fetais e da deglutição do líquido amniótico. E, ao nascer, em toda a sua trajetória existencial, explora o mundo que o envolve, o rico pool de estímulos sensoriais e interpreta-os. Pelo fato de experimentar, desde sua mais tenra história existencial, os estímulos sensoriais que esquadrinham a arquitetura do mundo extrapsíquico, o homem tem a tendência natural de desenvolver uma trajetória exploratória exteriorizante. Nessa trajetória, ele se torna cada vez mais íntimo do mundo em que está, o extrapsíquico, mas, ao mesmo tempo, torna-se um estranho para si mesmo. O homem moderno, em detrimento dos avanços da ciência e da tecnicidade, vive a mais angustiante e paradoxal de todas as solidões psicossociais, expressa pelo abandono de si mesmo na trajetória existencial. (CURY, 1999) A pior solidão é aquela em que nós mesmos nos abandonamos, e não aquela em que nos sentimos abandonados pelo mundo. É possível nos abandonarmos na trajetória existencial? Veremos que sim. Quando o homem não se repensa, não se questiona, não se recicla, não se reorganiza, ele abandona a si mesmo, pois não se interioriza, ainda que tenha cultura e múltiplas atividades sociais. Os livros de autoajuda, embora não tenham grande profundidade intelectual, são procurados com desespero nas sociedades atuais, como tentativa de superar, ainda que ineficientemente, a grave crise de interiorização que satura as pessoas.
  • 22. 22 O homem que não se interioriza é algoz de si mesmo, sofre de uma solidão intransponível e incurável, ainda que viva em multidões. "O homem que não se interioriza dança a valsa da vida engessado intelectualmente." Sua flexibilidade intelectual fica profundamente reduzida para solucionar seus conflitos psicossociais, superar suas contrariedades, frustrações e perdas. É mais fácil explorar os fenômenos do mundo que nos envolve do que aprender a nos interiorizar e ser caminhantes na trajetória de nosso próprio ser e explorar os fenômenos contidos em nosso mundo intrapsíquico. É mais fácil e confortável explorar os estímulos extrapsíquicos, que sensibilizam nosso sistema sensorial, do que explorar os sofisticados processos de construção dos pensamentos, o nascedouro e desenvolvimento das idéias, a organização da consciência existencial, as causas psicodinâmicas e histórico-existenciais de nossas misérias, fragilidades, contradições emocionais, etc. Mergulhado num processo socioeducacional que se ancora na transmissibilidade e no construtivismo do conhecimento exteriorizante, o homem se torna um profissional que aprende a usar, com determinados níveis de eficiência, o conhecimento como ferramenta ou instrumento de trabalho. Porém, tem grandes dificuldades para usar o conhecimento para desenvolver a inteligência: aprender a percorrer as avenidas da sua própria mente, conhecer os limites e alcance básicos da construção de pensamentos, regular seu processo de interpretação através da democracia das idéias e tornar-se um pensador humanista, que trabalha com dignidade seus erros, dores, perdas e frustrações, e aprende a se colocar no lugar do "outro" e a perceber suas dores e necessidades psicossociais. (CURY, 1999) Infelizmente, como veremos, a tendência intelectual natural do Homo sapiens, desde a aurora da vida fetal até o seu último suspiro existencial, é seguir uma trajetória de construção intelectual superficial. Uma trajetória socioeducacional em que ele pouco se interioriza, pouco procura por si mesmo e pouco conhece a si mesmo. Procurar a si mesmo é explorar e produzir conhecimento sobre os processos de construção da inteligência, ou seja, sobre os processos de construção dos pensamentos, sua natureza, cadeias psicodinâmicas, limites, alcance, lógica, práxis, bem como sobre a formação da consciência existencial, da história intrapsíquica arquivada na memória, as bases que sustentam o processo de interpretação e as variáveis que participam do processo de transformação da energia emocional. Quem sai do discurso intelectual superficial e procura "velejar" para dentro de si mesmo, e vive a aventura ímpar de explorar sua própria mente, nunca mais será o
  • 23. 23 mesmo, ainda que fique perturbado num emaranhado de dúvidas sobre o seu próprio ser. Aliás, ao contrário do que dizem os livros de autoajuda, a dúvida é o primeiro degrau da sabedoria. Quem não duvida e critica a si mesmo nunca se posiciona como aprendiz diante da vida e, consequentemente, nunca explora com profundidade seu próprio mundo intrapsíquico. Quem aprendeu a vivenciar a arte da dúvida e da crítica na sua trajetória existencial se posiciona como aprendiz diante da vida e, por isso, tem condições intelectuais de repensar seus paradigmas socioculturais e expandir continuamente suas ideias e maturidade psicossocial. Todos os pensadores, filósofos, teóricos e cientistas que, de alguma forma, promoveram a ciência, as artes e as ideias humanistas foram, ainda que minimamente, caminhantes nas trajetórias do seu próprio ser e amantes da arte da dúvida e da crítica, enquanto produziam conhecimento sobre os fenômenos que contemplavam. (CURY, 1999) O homem que aprende a se interiorizar e a criticar suas "verdades", seus dogmas e seus paradigmas socioculturais estimula a revolução da construção das idéias nos bastidores clandestinos de sua mente. Assim, sai do superficialismo intelectual e, no mínimo, aprende a concluir que os processos de construção da inteligência, dos quais se destacam a produção das cadeias psicodinâmicas dos pensamentos e a formação da consciência existencial do "eu", são intrinsecamente mais complexos que uma explicação psicológica e filosófica meramente especulativa e superficial, que chamo de explicacionismo, psicologismo, filosofismo. O homem moderno tem vivenciado, com freqüência, uma importante síndrome psicossocial doentia, a qual chamo de "síndrome da exteriorização O ser humano, nos dias atuais, freqüentemente só tem coragem de falar de si mesmo quando vai a um psicólogo ou a um psiquiatra. Tem uma necessidade vital de que o mundo gravite em torno de si mesmo. Para ele, doar-se para o outro sem esperar a contrapartida do retorno é um absurdo existencial, um jargão intelectual, um delírio humanístico. O mundo das ideias dos portadores da síndrome da exteriorização existencial tem pouco espaço para uma compreensão psicossocial e filosófica da existência humana. (CURY, 1999) Aprender a interiorizar-se é uma arte complexa e difícil de ser conseguida no terreno da existência. O homem moderno tem sido um ávido consumidor de ideias positivistas misticistas, psicologistas, como se tal consumo cumprisse, por ele, o papel inalienável e intransferível de caminhar nas trajetórias sinuosas do seu próprio ser e de aprender a expandir sua consciência crítica e maturidade intelectoemocional.
  • 24. 24 A complexidade da mente, associada às deficiências do discurso literário para esquadrinhar os fenômenos e processos envolvidos na construtividade de pensamentos, na formação da consciência existencial e na transformação da energia psíquica, fizeram- me rever, criticar e reescrever continuamente os textos deste livro. Por isso, passei mais de dezessete anos de intensa dedicação a escrevê-los, bem como aos demais textos que compõem o arcabouço teórico da minha produção de conhecimento e que ainda não foram publicados, objetivando que esses textos não sejam efêmeros na ciência, mas que criem raízes e sejam úteis em diversas áreas psicossociais. (CURY, 1999) Esses dados são bem sintéticos. Meu objetivo é fornecer algumas informações para evidenciar algumas causas psicossociais que me fizeram, desde minha época de estudante de Medicina, me apaixonar pelo mundo das ideias e, ao mesmo tempo, criticar diversas convenções existentes na Psicologia e na Psiquiatria e evidenciar a crise de formação de pensadores. O objetivo da TIM é contribuir para a formação de pensadores e promover o desenvolvimento de habilidades psíquicas capazes de fortalecer o Eu como gestor da mente. 3.2 Metodologia Cada uma das 12 ferramentas do programa FREEMIND foi analisada a partir dos procedimentos de pesquisa multifocais da TIM, tais como a arte da formulação de perguntas, da dúvida e da crítica, a busca do caos intelectual e os dois instrumentos empíricos ligados à análise dos processos de construção dos pensamentos e das variáveis que atuam na construção das cadeias de pensamentos. Desenvolvi sete procedimentos metodológicos de análise multifocal. Estes procedimentos não são utilizados, em sua maioria, na pesquisa acadêmica, mesmo nas teses de doutorado. Os grandes teóricos da psicologia também não os utilizaram na produção de suas teorias, o que gerou um grande prejuízo para esta ciência. Os procedimentos utilizados na pesquisa acadêmica normalmente são bem conhecidos no mundo todo, tais como: seletividade de dados, análise de dados, levantamento bibliográfico, uso de uma teoria como suporte da interpretação. Os setes procedimentos utilizados pela TIM são:
  • 25. 25 1. A arte da formulação de perguntas; 2. A arte da dúvida; 3. A arte da crítica; 4. A busca do caos intelectual para se processar a descontaminação da interpretação; 5. A busca do caos intelectual para expandir as possibilidades de construção do conhecimento; 6. A análise das causalidades históricas e das circunstancialidades biopsicossociais e, 7. A análise dos processos de construção das variáveis de interpretação na mente. Além desses setes procedimentos, também utilizei na minha trajetória de pesquisa cinco "mesclagens de contrapontos intelectuais" (MCI), que me estimularam a revisar criticamente e reorganizar continuamente a produção de conhecimento sobre os processos de construção do pensamento. Essas mesclagens referem-se a uma mistura entre pontos intelectuais opostos ou equidistantes, tais como: a liberdade em observar e a disciplina na observação, a livre produção de pensamento e a revisão crítica dessa produção. (CURY, 1999) Algumas dessas mesclagens resultaram do processo de cointerferência dos sete procedimentos metodológicos da TIM. As cinco "mesclagens de contrapontos intelectuais" (MCI) que utilizei foram: 1. Mesclagem entre a liberdade contemplativa de observar os fenômenos com a disciplina empírica no processo de observação e seleção dos mesmos. 2. Mesclagem entre a liberdade de interpretar os fenômenos com a reorganização e reorientação contínua do processo de interpretação. 3. Mesclagem entre a utilização do caos intelectual para esvaziar, tanto quanto possível, as distorções preconceituosas e os referenciais históricos contidos no processo de formação da personalidade com a utilização desse caos para expandir as possibilidades de compreensão dos fenômenos e de construção do conhecimento. 4. Mesclagem entre a liberdade da produção do conhecimento com a reciclagem crítica e contínua da mesma. 5. Mesclagem entre a análise das variáveis da interpretação (fenômenos) com a análise dos sistemas de cointerferências que elas organizam para gerar o funcionamento da mente e a construção das cadeias de pensamentos.
  • 26. 26 Não é objetivo de esta tese dar ênfase aos sete procedimentos metodológicos da TIM e as cinco "mesclagens de contrapontos intelectuais" que utilizei em minha trajetória de pesquisa, embora toda a análise das ferramentas do FREEMIND resulte deles. Vou dar ênfase apenas a arte da pergunta, da dúvida e da crítica como os procedimentos metodológicos mais relevantes para a discussão do programa FREEMIND. Aprendi que a arte de perguntar é mais importante do que a arte de responder. Aliás, a maneira como se pergunta pode produzir um autoritarismo das idéias, pois estabelece as diretrizes das respostas. Antes da busca das respostas, antes da produção de conhecimento, é necessário fazer não apenas algumas perguntas, mas múltiplas perguntas sobre os fenômenos que estamos observando e interpretando. Devemos ainda não apenas formular perguntas multifocais sobre os fenômenos e suas micro e macrorrelações, mas perguntas sobre as próprias perguntas, suas dimensões, seus limites e alcance. A função da arte da formulação das perguntas não é, inicialmente, fornecer respostas, pois as respostas são ditadoras das perguntas, mas expandir a dúvida. Quanto mais dúvida e confusão intelectual, mais profunda poderá ser a resposta, mais rica será a produção de conhecimento; quanto menos dúvida, mais pobre será a produção de conhecimento. (CURY, 1999) Os três grandes inimigos de um pensador são: as dificuldades de expandir a arte da pergunta e da crítica, a dificuldade de conviver com a dúvida e a ansiedade por produzir respostas. A fertilidade das idéias de um pensador não está na sua capacidade de produzir respostas, mas na sua intimidade com a arte da formulação das perguntas, a arte da dúvida, a arte da crítica e do quanto procura e suporta a experiência do caos intelectual. (CURY, 1999) A palavra arte associada à palavra "dúvida" ou "crítica" não quer dizer uma simples dúvida ou crítica esporádica, mas um processo contínuo de duvidar e criticar, um sistema contínuo de aprimoramento da observação, interpretação e questionamento do conhecimento. A arte da formulação de perguntas me levou a fazer centenas e, em alguns casos, milhares de perguntas sobre cada fenômeno intrapsíquico que observava. Mesmo diante da mais simples idéia que eu produzia na minha mente, eu questionava intensamente suas origens, construtividade, natureza, alcance etc. Eu observava atentamente não apenas o comportamento das pessoas, mas era um contínuo viajante na trajetória do meu próprio ser. Assim, durante o processo de observação dos fenômenos psíquicos, eu
  • 27. 27 expandia, através da arte da formulação de perguntas, a arte da dúvida. Esta estimulava meu processo de interpretação e, conseqüentemente, minha produção de conhecimento. Através da expansão da produção de conhecimento, aprimorava a arte da crítica. Com isso, aprendi pouco a pouco a usar a arte da crítica, não apenas para criticar todo conhecimento que previamente eu tinha sobre os fenômenos psíquicos que observava, mas também para criticar toda interpretação e produção de conhecimento que extraía deles. (CURY, 1999) Vivi intensamente a arte da formulação de perguntas, a arte da dúvida e da crítica, que chamo de "tríade da arte da Pesquisa Multifocal". Elas são fundamentais na produção da pesquisa científica e até na convivência social. Elas foram para mim a fonte motivadora do processo de produção de conhecimento sobre os complexos e sofisticados processos de construção dos pensamentos. O exercício contínuo da "tríade da arte da Pesquisa Multifocal" foi me levando, ao longo dos anos, a desenvolver dois procedimentos sofisticados ligados à busca do "caos intelectual" que objetivavam tanto processar a descontaminação da interpretação quanto expandir as possibilidades de construção do conhecimento. A busca do caos intelectual também me levou pouco a pouco a aprimorar dois instrumentos de observação e análise (instrumentos empíricos), que é a análise das causas históricas (variáveis ligadas à memória) e das circunstancialidades biopsicossociais (variáveis intrapsíquicas, intraorgânicas e sociais presentes no ato da interpretação) e a análise dos processos de construção das variáveis da interpretação na mente ou campo de energia psíquica. (CURY, 1999) Tenho consciência de que abordar sucintamente esse emaranhado de procedimentos pode gerar mais confusão do que esclarecimento. Minha intenção é evidenciar que um pensador precisa pesquisar com critério e rejeitar determinadas atitudes especulativas e teoricistas. Penso que um teórico da Filosofia não precisa evidenciar seus procedimentos, pois a grandeza das suas idéias está no conteúdo do seu discurso teórico; mas um teórico da Psicologia precisa, embora muitos deles não o tenham feito, pois ele estuda fenômenos intrapsíquicos específicos e sua produção de conhecimento objetiva alcançar uma aplicabilidade psicossocial na educação, nas relações sociais e no campo das doenças psicossociais e psíquicas. Como procurei pesquisar o homem na perspectiva psicossocial e filosófica, bem como com outras ciências, sinto a necessidade de fazer uma exposição sucinta desses procedimentos de análise multifocal que desenvolvi na trajetória da minha pesquisa.
  • 28. 28 A busca do caos intelectual no processo de observação e interpretação dos fenômenos psíquicos abre algumas janelas psicossociais e filosóficas para expandirmos as possibilidades de compreensão sobre as origens, limites, alcance, práxis, natureza dos pensamentos (incluindo o conhecimento científico) e da consciência existencial. É mais fácil desenvolver o autoritarismo do que a democracia das ideias, do que redirecionar o processo de observação, interpretação e produção de conhecimentos através do exercício da "consciência crítica do eu". O respeito e o estímulo à capacidade de pensar do "outro" deveriam saturar todos os níveis das relações humanas, inclusive a pesquisa científica. Os "antídotos" intelectuais contra o autoritarismo nas relações humanas são multifocais: a) compreender que a democracia das ideias é uma inevitabilidade; b) respeitar o ser humano na sua integralidade; c) considerá-lo capaz de pensar e escolher seus próprios caminhos; d) estimular a revolução das idéias que ocorre na sua mente e procurar contribuir para que ela seja redirecionada para desenvolver a revolução do humanismo, da cidadania e da capacidade crítica de pensar. (CURY, 1999) Por sua vez, as "vacinas" e "antídotos" intelectuais contra os autoritarismos das idéias e as ditaduras dos discursos teóricos produzidos na pesquisa científica também são multifocais: exercitar a arte da formulação de perguntas, da dúvida, da crítica; a busca do caos intelectual, a reciclagem e reorganização contínua do processo de interpretação; a postura constantemente aberta no processo de observação, interpretação e produção de conhecimento, capaz de se abrir sempre às novas possibilidades dos fenômenos que contemplamos etc. Os procedimentos metodológicos derivados da busca do caos intelectual se tornaram importantes "vacinas" contra o autoritarismo das ideias e a ditadura do discurso teórico na minha trajetória de pesquisa e produção de conhecimento. Porém, não há procedimentos totalmente seguros; por isso a minha produção de conhecimento possui limites, além de ser, como disse, apenas uma ilha no mar inesgotável da ciência. Assim, produzir conhecimento pode ser aparentemente simples, mas a construtividade de pensamentos é altamente sofisticada. É preciso procedimentos metodológicos de análise igualmente sofisticados para compreender a psicodinâmica nos bastidores da mente. Os procedimentos de pesquisa multifocais apresentados neste capítulo tem justamente esse objetivo ao analisar cada ferramenta do programa FREEMIND.
  • 29. 29 4. DISCUSSÃO DAS FERRAMENTAS DO FREEMIND O programa FREEMIND, como apresentado no início da tese, é constituído de 12 ferramentas multifocais da psicologia educacional e social, psiquiatria social, sociologia, pedagogia e filosofia aplicada. Ele objetiva: 1- Reeducação do Eu como autor da história e como gestor psíquico; 2- Reorganização e amadurecimento das relações interpessoais; 3- Desenvolvimento de hábitos para a excelência profissional, o trabalho em equipe, a cooperação social, a solidariedade, a tolerância; 4- Desenvolvimento de habilidades emocionais para trabalhar perdas e frustrações, proteger a emoção, gerenciar o estresse e prevenir transtornos psíquicos. Cada uma de suas ferramentas de educação preventiva e promoção da saúde serão apresentadas e discutidas à luz da TIM e dos procedimentos de análise multifocal exposto no capítulo anterior. As 12 ferramentas do programa FREEMIND são: 1. Vivenciar doze princípios filosóficos.
  • 30. 30 2. Ser autor da sua história. 3. Gerenciar os pensamentos. 4. Administrar e proteger a emoção. 5. Trabalhar os papéis da memória e reeditar o filme do inconsciente. 6. A arte de ouvir e a arte de dialogar. 7. A arte do autodiálogo e a mesa-redonda do Eu. 8. Contemplar o belo. 9. Libertar a criatividade e ser empreendedor. 10. Disciplina e sonhos. 11. Ser empreendedor. 12. Resiliência e inteligência existencial. 4.1 Primeira ferramenta do FREEMIND VIVENCIAR DOZE PRINCÍPIOS FILOSÓFICOS Cada uma das ferramentas contém algumas complexas funções da inteligência que devem ser trabalhadas, como foi dito, ao longo de toda a história do participante. A primeira ferramenta procura trabalhar os doze princípios filosóficos do programa FREEMIND. Esses princípios elaborados pela Academia de Inteligência é a razão de ser tanto dela e como do próprio programa. Esses 12 princípios vão alicerçar todas as demais ferramentas que serão estudadas. Debata em grupo cada um desses princípios filosóficos e aponte quais deles você possui e quais precisa incorporar. Desejamos que cada um deles faça parte de cada capítulo da sua história. Leia-os e releia-os, afixe-os em seu quarto e guarde-os sempre em sua mente. 1 - Cada ser humano, apesar dos seus defeitos, conflitos, falhas e limitações, não é mais um número na multidão, um número de identidade ou de cartão de crédito, mas um ser humano único e complexo. Você sente um ser humano único e complexo? Sente que sociedade o despreza? Que valor tem sua existência? Tente definir o que é a vida, ainda que se perca nessa definição.
  • 31. 31 2- Cada ser humano possui ferramentas em sua mente que podem ser trabalhadas e desenvolvidas para deixa-lo de ser espectador passivo e se tornar diretor do script da sua história. Você dirige seu script ou é dirigido pelos seus conflitos e ambiente externo? O quanto você gostaria de estar no controle da sua vida? 3 – Se a sociedade te abandona a solidão é suportável, mas se você mesmo se abandona, ela é intolerável. Você tem se abandonado? Quem mais o diminui a sociedade ou você mesmo? Ninguém pode decidir mudar a sua história, só você mesmo, mas é impossível mudá-la se não levar em altíssima conta sua saúde mental e sua liberdade. 4- Não se pode mudar o passado, mas você pode investir forte e intensamente em seu presente e mudar seu futuro. O passado produz culpa e angústia? Você tem tentado mudar seu passado ou o presente? As pessoas que você feriu, os erros que cometeu, os acidentes que teve no caminho, só podem ser solucionados se você reconstruir corajosamente sua história no presente. Economize as “promessas”, seja rico em atitudes. 5- Você deve ter um romance com sua própria história e saber que a melhor maneira de ter esse romance é investir na felicidade e no bem estar dos outros. Você é egoísta, pensa em si mesmo em primeiro lugar? Seu mecanismo de recompensa é imediato, ou seja, procura o prazer a qualquer custo sem pensar nas consequências do seu comportamento? É preocupado com a felicidade das pessoas que ama? Essa preocupação é teórica ou real? 6 – Os fortes são especialistas em agradecer, os frágeis, em reclamar. Os fortes são hábeis em elogiar, os frágeis são peritos em apontar defeitos. Que tipo de especialista você é, em agradecer ou reclamar? Você agradece o ar que respira, os alimentos sobre a mesa, o coração que pulsa incansavelmente, as pessoas que se preocupam com você? Você é uma pessoa agradável, aproveita as oportunidades para elogiar cada pessoa que o rodeia? Ou é intolerante, chato, entediante, um perito em ver defeitos nos outros, um especialista em reclamar de tudo e de todos? Sabia que reclamar em excesso é um grave defeito da personalidade, uma bomba contra o prazer de viver, pois aumenta os níveis de exigência para se ser feliz?
  • 32. 32 7- Os fortes apostam tudo o que têm naqueles que pouco têm, os frágeis excluem e não dão novas chances aos outros. Você é generoso ou punitivo? Cobra demais dos outros? As pessoas maduras não desistem de quem amam, por mais que o decepcionem. Jamais abandonam os feridos no caminho. Seja sincero: de quem você já desistiu? 8 – Os fortes nunca desistem de si, dão sempre uma nova chance para si, os frágeis são conformistas. Os fortes tropeçam, caem, falham, são vaiados, desacreditados, excluídos, mas nunca desistem de reescrever sua história. Desistir não está no dicionário de suas vidas. Os frágeis aceitam tudo passivamente, se acham incapazes, vítimas de seu conflito, creem que são imutáveis. Quanto a este princípio filosófico, você é forte ou frágil? Você elabora estratégias para mudar sua história emocional, social e profissional? 9 – Os fortes usam seu sofrimento para se construir, os frágeis para se destruir. Os fortes não são heróis, nem perfeitos. Eles choram, se perturbam e sentem que em alguns momentos lhes faltam forças para continuar, mas têm uma característica fundamental: usam seu sofrimento para se construir e não para se destruir. Usam abusos sexuais, humilhações sociais, conflito dos pais, privações financeiras, abandonos, perdas de pessoas queridas, derrotas, traições, enfim, todos os tipos de sofrimentos que por ventura vivenciou não para se envergonhar, punir-se, fugir do mundo ou odiá-lo, mas para escrever os capítulos mais importantes da sua história. Na infância, eles não tinham ferramentas para se reconstruir, na vida adulta, não abre mão delas, as procuram como o sedento no deserto. Você deseja procurá-las? Que tipo de dor você passou? Cite algumas e recorde as atitudes que tomou e, se fosse hoje, pense nas atitudes que tomaria. 10 - Os fortes são flexíveis, os frágeis são radicais. Os fortes compreendem, os frágeis condenam. Você é flexível ou intolerante? Tem coragem de mudar de opinião ou é teimoso, radical, imutável? Quem muda de opinião é frágil ou forte? Compreende os que erram com você ou é rápido em condená-los?
  • 33. 33 11- Os fortes expõem suas ideias, os frágeis as impõem. Você é um especialista em expor suas ideias, em expressá-las com brandura e calma, dando o direito das pessoas as aceitarem ou não? Ou se comporta como um deus, pressiona, eleva o tom de voz, faz ameaças, para que seus amigos, filhos, colegas se submetam ao que pensa? Sabe ser contrariado? Discuta esse pensamento filosófico: os fortes usam as ideias, os frágeis, a agressividade. 12- Os fortes reconhecem suas falhas, os frágeis tem a necessidade neurótica de estar sempre certo. Você tem coragem de reconhecer seus erros, estupidez, incoerência ou se defende com unhas e dentes? Você tem coragem de falar das suas lágrimas para que seus íntimos (inclusive as crianças) aprendam a chorar as deles? Discuta essa pensamento filosófico: não há pessoas imutáveis, há pessoas sim que tem medo de reconhecer suas “loucuras”, por isso levam para seu túmulo seus conflitos. Dinâmica: reúna em grupo de dois e cada um conte honestamente para o seu parceiro(a) os princípios filosóficos que mais precisa assimilar e aprender. Fale os motivos. Depois de cinco ou dez minutos retorne o grupo. Paradoxos doentios das sociedades modernas Minha trajetória como psiquiatra, pesquisador e produtor de conhecimento sobre o complexo funcionamento da mente humana me convenceu de que a nossa espécie, em particular as sociedades modernas, está adoecendo coletivamente em seu psiquismo. Enumerarei apenas alguns paradoxos ou pontos contrastantes e a necessidade de um programa mais profundo para educar o Eu como gestor do intelecto e superar o cárcere da emoção, que não apenas inclui fobias, humor depressivo, ansiedade, obsessão, mas também a dependência de drogas/álcool: 1. O humor triste e a angústia estão aumentando. A indústria do lazer está se expandindo. Nunca tivemos uma fonte de estímulos para excitar a emoção como na atualidade. A indústria da moda, os parques temáticos, os jogos esportivos, a Internet, a televisão, os estilos musicais e a literatura explodiram nas últimas décadas. Portanto, esperávamos que nossa geração fosse a que vivesse o mais intenso oásis de prazer e
  • 34. 34 tranquilidade. Mas nós nos enganamos, jamais fomos tão tristes e inseguros. Muitas pessoas precisam de inumeráveis estímulos para sentir migalhas de prazer. Dantas (2008) afirma que o discurso sobre o sofrimento psíquico passou a atuar na vida cotidiana, de uma forma nunca vista, a partir dos anos 80 do séc. XX, tornando-se foco de intensa preocupação social, política e de saúde mental. O que está ocorrendo? Quem deseja ter uma mente livre deve fazer questionamentos profundos. Um milhão de pessoas se suicidam por ano e dez milhões tentam e felizmente não morrem. Um número muito maior do que as vítimas nas guerras vigentes. 2. A solidão está se expandindo. As sociedades estão adensadas. No começo do século XX, éramos pouco mais de um bilhão de pessoas. Hoje, só a China e a Índia têm, cada uma, mais de um bilhão de habitantes. Por vivermos tão próximos fisicamente, pensávamos que a solidão seria estancada. Mas nos enganamos novamente, a solidão nos contaminou. As pessoas estão sós nos elevadores, no ambiente de trabalho, nas ruas, nas praças esportivas. Estão sós no meio da multidão. Moreira e Callou (2006) apontam que na contemporaneidade, apesar de seus grandes avanços científicos e tecnológicos e, sua expansão nos meios de comunicação, é possível notar uma crescente solidão no ser humano. Pois o estilo de vida individualista e consumista compromete fortemente a comunicação entre as pessoas. A solidão é, na atualidade, um dos mais graves problemas que desafiam a cultura e o homem, sinaliza Ruggero (2004 apud MOREIRA; CALLOU, 2006). 3. O diálogo está morrendo. Muitos só sabem falar de si mesmos quando estão diante de um psiquiatra ou psicólogo. Pais e filhos não cruzam suas histórias, raramente trocam experiências de vida. A família moderna está se tornando um grupo de estranhos, todos vivem ilhados em seu próprio mundo. 50% dos pais jamais conversaram com seus filhos sobre suas lágrimas, medos, angústias, pesadelos. Nas empresas e escolas as pessoas estão próximas fisicamente, mas infinitamente distantes interiormente. Perdas, angústias, medos, conflitos não são verbalizados. 80% das pessoas têm sintomas de timidez. Muitas pessoas tímidas são ótimas para os outros, mas costumam ser carrascos de si mesmas.
  • 35. 35 4. As discriminações chegaram a patamares insuportáveis. Infelizmente, nos dividimos, discriminamos e excluímos de múltiplas formas. Não honramos o espetáculo das ideias, nossa capacidade de pensar, o fascinante funcionamento da mente humana. Não poucas vezes não é a discriminação imposta pelos outros que mais perturba, mas a autodiscriminação. Você se autodiscrimina ou se diminui? E quanto a sociedade, sente que as pessoas olham com preconceito? Esse preconceito o machuca muito ou pouco? Já chorou ou se revoltou por causa disso? 5. A qualidade de vida está se deteriorando. Quanto pior a qualidade da educação, mais importante será o papel da psiquiatria no terceiro milênio. Apesar dos avanços da medicina, da psicologia e da psiquiatria, o normal tem sido ser ansioso e estressado e o anormal tem sido ser tranquilo e relaxado. Segundo Nunomura (2004 apud PEREIRA; SILVA; SILVA, 2010) atualmente o estresse afeta inúmeras pessoas, principalmente na fase adulta, devido a este ser o período onde se concentram as maiores responsabilidades e pressões. O autor destaca também que o estresse tem sido considerado a “doença do século”, agrupando diversos fatores internos e externos ao sujeito, os quais se não forem controlados desde o início podem provocar muitas complicações à saúde. De acordo com Instituto de pesquisa social da Universidade de Michigan (USA) 50% das pessoas cedo ou tarde desenvolverão um transtorno psíquico como depressão, fobias, síndrome do pânico, estresse pós-traumático, psicoses, alcoolismo, farmacodependência. Um número assustador. Que tipo de sintoma por ventura tem: é ansioso, agitado, tenso? Sofre por antecipação? Acorda cansado, vive fatigado? Anda esquecido ou tem déficit de memória? Tem sintomas psicossomáticos (dores de cabeça, muscular, taquicardia, queda de cabelo, etc.)? PAINEL DE DEBATE DA PRIMEIRA FERRAMENTA Após cada ferramenta haverá um painel de debate. Esperamos que o debate já tenha ocorrido durante toda a exposição de cada ferramenta, mas, apesar disso, o programa FREEMIND trará sempre um painel de perguntas para trazer à lembrança pontos importantes.
  • 36. 36 1 - Você tem tido um romance com sua própria história? Qual o valor real que você dá para você mesmo? Em que lugar está na sua escala de valores? 2 – O que é ser forte ou maduro para o programa FREEMIND? 3 – O que é ser frágil ou imaturo para o programa FREEMIND? 4 – você é um especialista em compreender ou em julgar? Quando você passa por um sofrimento, seja ele qual for, você o enfrenta com maturidade e procura reciclá-lo e usá-lo para crescer ou foge dele? PAINEL DE EXERCÍCIOS DIÁRIOS Faça um relatório dos seus exercícios durante a semana. O que praticou e qual foi o resultado? Após cada ferramenta haverá uma recomendação de exercícios diários. É fundamental para o sucesso de cada participante que ele o pratique e faça um relatório diário. Não basta se encantar com a ferramenta, é necessário disciplina para incorporá- la. Antes de iniciar a exposição da próxima ferramenta, o facilitador deveria pedir para os participantes comentarem pelo menos uma de suas práticas semanais. 1 – Escreva os princípios filosóficos que você mais precisa treinar, assimilar e trabalhar. 2 - Treine a cada momento compreender mais e julgar menos, agradecer mais e criticar menos. 3 - Treine diariamente usar seus erros não para se punir, mas para amadurecer, compreender as limitações da existência e ser mais tolerante com os outros. 4- Exercite encarar suas frustrações e decepções com maturidade. Jamais esqueça que não há céus sem tempestades, nem caminhos sem acidentes. Comente as experiências que teve na semana. 5 - Equipe seu Eu para nunca desistir de você e nem das pessoas que ama. Os fortes são obstinados, determinados, ouvem o inaudível e veem o invisível, por isso sempre dão uma nova chance para si e para os outros. Relate se durante a semana você vivenciou essa ferramenta. 4.2 Segunda ferramenta do FREEMIND O EU COMO AUTOR DA PRÓPRIA HISTÓRIA
  • 37. 37 Ser Autor da sua História é ser: 1. Capaz de reconhecer que cada ser humano é um ser único. 2. Gestor dos pensamentos. 3. Protetor das emoções. 4. Filtrador dos estímulos estressantes. 5. Capaz de pensar antes de reagir nos focos de tensão. 6. Capaz de construir metas claras e lutar por elas. 7. Capaz de fazer escolhas e saber que toda escolha implica em perdas e não apenas em ganhos. 8. Capaz de tirar os disfarces sociais, ser transparente e reconhecer conflitos, fragilidades, atitudes estúpidas. 9. Capaz de não desistir da vida, mesmo quando o mundo desaba sobre si. 10. Capaz de liderar a si mesmo, não ser controlado pelo ambiente, circunstâncias e ideias perturbadoras. Introdução A educação clássica nos ensina a conhecer detalhes dos átomos que nunca veremos e planetas que nunca pisaremos, mas não nos ensina a conhecer o planeta que todos os dias respiramos, andamos, vivemos: o planeta psíquico. Ao longo da aplicação do programa você será encorajado a se autoconhecer, a se mapear. O autoconhecimento básico é fundamental para expandir o prazer de viver, superar a solidão, promover o diálogo interpessoal, estimular a formação de pensadores, enriquecer a arte de pensar, debelar o câncer da discriminação, prevenir a depressão, a síndrome do pânico, os transtornos ansiosos, a dependência das drogas. Você se conhece? Já entrou em áreas mais profundas de si mesmo? Tem medo de mapear suas fragilidades? Por sermos uma espécie pensante, temos tendência em cuidar seriamente daquilo que tem valor. Cuidamos do motor do carro para não fundir, da casa para não deteriorar, do trabalho para não sermos superados, do dinheiro para não faltar. Alguns se
  • 38. 38 preocupam com suas roupas; outros, com suas joias, e, ainda outros, com sua imagem social. Mas qual é o nosso maior tesouro? O que deveria ocupar o centro de nossas atenções? O carro, a casa, o trabalho, o dinheiro, as roupas, as viagens ou a qualidade de vida! Por incrível que pareça nossa qualidade de vida fica frequentemente em segundo plano. Sem ela, não temos nada e não somos nada, não somos mentalmente saudáveis, emocionalmente livres, socialmente maduros, profissionalmente realizados. Você cuida da sua qualidade de vida? Minayo (2000) associa qualidade de vida ao grau de satisfação encontrado na vida familiar, amorosa, social, ambiental e à própria existência, sendo que em todas as sondagens que são realizadas sobre essa temática se encontram valores não materiais, como amor, liberdade, solidariedade, inserção social, realização pessoal e felicidade. A autora acrescenta que o termo qualidade de vida abrange muitos significados, os quais traduzem conhecimentos, experiências e valores de sujeitos e sociedades em suas diferentes épocas e contextos culturais. A aeronave mental tem um péssimo piloto Você teria coragem de subir num avião e fazer uma longa viagem sabendo que o piloto não tem experiência, tem poucas horas de vôo? Relaxaria se soubesse que ele desconhece os instrumentos de navegação? Dormiria se ele não tivesse habilidades para se desviar de rotas turbulentas, com alta concentração de nuvens e descargas elétricas? Fiz essas simples perguntas numa conferência que dei sobre A Educação do Século XXI para cerca trezentos coordenadores de faculdades, reitores e pró-reitores do país, que representam um universo de mais de cem mil alunos universitários. É obvio que todos responderam que se sentiriam completamente desconfortáveis. Muitos sequer ousariam pisar nessa aeronave. Mas abaferramenta-os ao afirmar que embarcamos diariamente na mais complexa das aeronaves e que é comandada por um piloto frequentemente despreparado, mal equipado e mal educado e, portanto, sujeito a causa inúmeros acidentes. A aeronave é a mente humana e o piloto é o Eu. Se você entrar num avião de última geração ficará perplexo com a quantidade de instrumentos para dar apoio à navegação. Mas de que adianta haver tais instrumentos se o piloto não souber usá-los? De que adianta o Eu ter recursos para dirigir o psiquismo
  • 39. 39 ou intelecto humano se durante o processo de formação da personalidade não aprende os conhecimentos básicos desses instrumentos e as mínimas habilidades para operá-los? Ninguém é tão importante como os professores(as) no teatro social, embora a débil sociedade não lhes dê o status que merecem. Mas o sistema em que eles estão inseridos é estressante e não forma coletivamente seres humanos que têm consciência de que possuem um Eu, de que esse Eu é construído por mecanismos sofisticadíssimos, de que esses mecanismos deveriam desenvolver funções vitais nobilíssimas, e de que sem o desenvolvimento dessas funções ele poderá estar completamente despreparado para pilotar o aparelho mental, em especial quando abarcado por um transtorno psíquico mais grave, como a dependência de drogas, depressão e ansiedade crônica. E uma vez despreparado, será conduzido pelas tempestades sociais e pelas crises psíquicas. Será um barco a deriva, sem leme. Um Eu mal formado terá grandes chances de ser imaturo, ainda que seja um gigante na ciência; sem brilho, ainda que seja socialmente aplaudido; viver de migalhas de prazer, ainda que tenha dinheiro para comprar o que bem desejar; engessado, ainda que tenha grande potencial criativo. O que seu Eu faz com as turbulências emocionais? Deixa-as passar, desvia-se delas ou as enfrenta? Se fôssemos um piloto de avião, a melhor conduta talvez seria desviar-se das formações densas de nuvens, mas, como pilotos mentais, essa seria a pior atitude, embora seja a frequentemente tomada. Em primeiro lugar, porque é impossível o Eu fugir de si mesmo. Em segundo, porque, se o Eu exercitar a paciência para deixar as emoções angustiantes se dissiparem espontaneamente para seguir em frente, ele cairá na armadilha da autoilusão. A paciência, tão importante nas relações sociais, é péssima se significar omissão do Eu em atuar no gerenciamento das dores e conflitos psíquicos. Elas apenas aparentemente se dissiparão. Serão arquivadas no córtex cerebral (camada mais evoluída do cérebro) e farão parte das matrizes de nossa personalidade. Atuar é a palavra chave. Em terceiro lugar, porque poderão formar janelas traumáticas (Killer) duplo P (duplo poder: poder de encarceramento do Eu e de expansão da janela doentia). Estudaremos esse assunto, mas tais janelas aprisionam o Eu e o desestabiliza como gerente da mente humana. O Eu deveria saber usar instrumentos para o enfrentamento e reciclagem das tensões, angústias e mazelas emocionais. Mas as escolas do mundo todo não nos ensinam a usar esses instrumentos ou ferramentas. Que tipo de ferramentas você usa diante dos medos que furtam a tranquilidade? Os medos ou fobias vêm e aparentemente
  • 40. 40 vão embora depois de minutos ou horas, mas nos enganamos, eles não vão embora, ficam depositados nos bastidores da memória e pouco a pouco vão desertificando o território da emoção. A fobia é uma aversão irracional por insetos, elevadores (claustrofobia), falar em público (fobia social), por sua vez, a dependência de drogas é uma atração irracional por uma substancia. Tanto uma como a outra depende das janelas killer duplo P, produzidas por um registro superdimensionado de experiências doentias. Depois que se instalou e se expandiu essas janelas, cristaliza-se a dependência psicológica. A partir daí, o verdadeiro monstro não mais é a droga química, mas o arquivamento delas nos bastidores da mente. Esses arquivos é que controlam o Eu e “assombram” o usuário de dentro para fora. Estudaremos que as janelas killer não podem ser deletadas, apenas reeditadas. Por isso, superar a dependência não é uma tarefa simples ou mágica, é muito mais do que se afastar das drogas. Depende de treinamento, educação e psicoterapia. Bonadio (2011) afirma que a dependência química por ser uma condição crônica apresenta demandas diversificadas dos pacientes ao longo do tempo, por isso é imprescindível o estabelecimento de novas metas e também uma revisão nas estratégias de reabilitação mais adequadas para atingi-las, partindo do pressuposto de uma constante avaliação de necessidades. E que tipo de atitude o Eu toma diante do humor depressivo que esmaga o encanto pela existência? E dos estímulos estressantes que tira-nos do ponto de equilíbrio? E dos pensamentos antecipatórios, da ansiedade e irritabilidade? Infelizmente o Eu é treinado a ficar calado no único lugar que não se admite ficar quieto. É adestrado para ser submisso no único lugar em que não se admite ser um servo. É aprisionado no único ambiente em que só se é inteligente, saudável e feliz se for livre. O seu Eu cala-se ou grita dentro de você. É líder ou servo dos seus pensamentos perturbadores? Não seja rápido em responder. Pergunte se você não sofre por problemas que ainda não aconteceram. Os tipos de dependência Esse programa objetiva, como foi comentado, o desenvolvimento das funções complexas da inteligência, para promover a saúde emocional e prevenir transtornos mentais, incluindo a dependência de drogas. A dependência das drogas é uma doença
  • 41. 41 psíquica grave, que desertifica o prazer de viver e encarcera o ser humano na sua própria mente, no único lugar que ele deveria ser livre. A quase totalidade dos usuários de drogas não tem a mínima ideia do desastre nos solos do inconsciente que as drogas causam. Apesar disso, é possível reciclar as janelas traumáticas que produzem compulsão e dependência pelas drogas, superar o cárcere da emoção e encontrar a mais plena liberdade. Uma tarefa difícil, mas plenamente possível, que, como sempre enfatizaremos, exigirá educação, exercícios intelecto/emocionais diários e treinamentos. Vejamos os dois tipos básicos de dependência que as drogas lícitas e ilícitas causam. Dependência física: é a capacidade de uma droga de não apenas produzir efeito psicológico, mas participar do metabolismo do organismo, a tal ponto que sua ausência produz uma síndrome de abstinência, caracterizada por delírios, alucinações, dores pelo corpo, diarreias, vômitos, cefaleia (dores de cabeça), alterações cardiovasculares. A heroína e o álcool etílico são exemplo de duas drogas que produzem alta dependência física. A dependência física da heroína pode se instalar em uma semana. É usada frequentemente injetável. As bebidas alcoólicas podem demorar meses ou anos, dependendo da frequência do uso, do tipo de organismo e do teor alcoólico das bebidas ingeridas. Dependência psicológica: é a capacidade de uma droga produzir efeito psicológico intenso e rápido, gerando matrizes traumáticas no córtex cerebral, aqui chamadas de janelas Killer duplo P: poder de fechar o circuito da memória e encarcerar o Eu e poder de descolar a personalidade, levando-a a ser dependente, insegura, frágil. Essas janelas traumáticas produzem uma necessidade compulsiva (“fissura”) pelo uso de uma nova dose da droga. Quando o usuário deixa de usá-las por um determinado período abrem-se algumas dessas janelas Killer duplo P nos solos do inconsciente, o que gera uma atração intensa e irracional por elas, traduzida por uma rica sintomatologia: ansiedade, insônia, humor depressivo, emoção aflitiva, irritabilidade, angústia. Frequentemente o usuário não identifica esses sintomas como sendo da dependência psicológica da droga que está usando, mas como problemas existenciais que está atravessando. Esta falta de identificação agiganta o monstro da dependência ao longo do tempo. Exemplo de drogas que provocam dependência psicológica é o crack e a cocaína. Nunca devemos nos esquecer que toda droga que produz dependência física produz também dependência psicológica. Mas nem toda que produz dependência psicológica produz dependência física. O crack e a cocaína por apresentarem graves
  • 42. 42 sintomas psicológicos, mas não apresentarem dependência física significativa, ou seja, por não gerarem sintomas orgânicos importantes com a abstinência (dores pelo corpo, tremores, náuseas, aumento da temperatura), leva o usuário a ter a falsa ideia de que está no controle do uso, o que, infelizmente, o conduz a afundar na lama da dependência, levando-o frequentemente a reconhecer que está doente ou dependente numa fase mais grave. A heroína, ao contrário, por causar alta dependência física, em poucos dias leva o usuário a sentir em seu corpo os terríveis efeitos da abstenção da droga, conduzindo-o a ter mais humildade para reconhecer que está dependente, o que o faz procurar ajuda mais rapidamente. Drummond e Drummond-Filho (2004) sinalizam que apenas 10% dos usuários de drogas desenvolvem dependência, ou seja, não são todas as pessoas que usam drogas que são dependentes. Isso ocorre porque a relação de cada indivíduo com a droga é muito distinta internamente, sendo que os dependentes químicos desenvolvem uma relação de total dependência da droga, depositando nela toda sua motivação e controle de sua vida. Já os nãodependentes conseguem ter a atitude de parar o consumo ao perceber os estragos que a mesma provoca em sua vida, seja no trabalho, nas relações familiares ou em sua vida social. Que tipo de droga você usou? Qual foi a escalada ou as drogas que passou? Quais foram os sintomas físicos e psíquicos mais importantes que sentiu quando interrompeu o uso? Você dirige a sua vida? Falta-lhe honestidade para reconhecer sua fragilidade e dependência? Dê uma nota de zero a dez que reflete seu nível de honestidade consigo mesmo. Pegue uma folha de papel e faça um relatório sobre as respostas a essas perguntas. Saiba que a superação do uso de drogas, a educação da emoção e a ressocialização do usuário exige grande empenho! Uma MENTE LIVRE (FREEMIND) exige entrega absoluta para um novo projeto de vida. Nenhum psiquiatra, psicólogo, educador, colaborador, pode fazer isso por você. Uma mente saudável não exige que sejamos heróis As mudanças na psique humana não aceita atos heroicos. Se você disser que de hoje em diante será livre, tolerante, generoso, seguro, tranquilo, bem humorado, provavelmente sua intenção heroica se dissipará como água no calor dos problemas que
  • 43. 43 enfrentará. Até um psicopata tem, em alguns momentos, intenção de mudar sua história, mas falha. A verdadeira liberdade é um treinamento que se conquista dia a dia, formando, como veremos, plataformas de janelas light (formadas por experiências saudáveis), que alicerçam o Eu como gestor de nossas mentes e como autor de nossas histórias. O FREEMIND é um projeto que clama que cada ser humano possua uma rica história que contenha lágrimas, alegrias, falhas, coragem, timidez, ousadia, insegurança, sonhos, sucessos, frustrações, solidão, dependência doentia. Você é um ser humano complexo. A última fronteira da ciência é desvendar como pensamos, qual a natureza e os tipos de pensamentos, como o Eu desenvolve a consciência e pode ser o gestor de nossas mentes. Nossa espécie tem o privilégio de ser uma espécie pensante entre milhões de espécies na natureza, mas, infelizmente, ela nunca honrou adequadamente a arte de pensar. As discriminações que sempre mancharam nossa história são um testemunho evidente de que não honramos essa fascinante arte. Infelizmente, pela falta de compreensão do espetáculo da vida e dos segredos que nos tecem como seres que pensam, sempre nos dividimos. A paranóia de querer estar um acima do outro e as guerras ideológicas, comerciais e físicas são reflexos de uma espécie doente e dividida. Não percebemos que, no teatro da nossa mente, somos todos iguais. Não somos judeus, árabes, americanos, brasiferramentaros, chineses. Somos seres humanos, pertencentes a uma única e fascinante espécie. Temos diferenças culturais, mas os fenômenos que constroem as cadeias de pensamentos e transformam a energia emocional são exatamente os mesmos em todo ser humano. Por isso, toda discriminação é desinteligente e desumana. Todos somos artistas no teatro da vida Talvez você nunca tenha ouvido falar sobre isso, mas se apaixonar pela vida e pela espécie humana são condições fundamentais para se ter alta qualidade de vida e sabedoria. Por favor, lembre-se sempre disto: 1- A vida que pulsa dentro de nós, independente de nossos erros, acertos, status e cultura é uma joia única no teatro da existência;
  • 44. 44 2- Cada ser humano é um mundo a ser explorado, uma história a ser compreendida, um solo a ser cultivado. É uma atitude irracional valorizarmos alguns artistas de Hollywood, políticos e intelectuais e não valorizarmos na mesma estatura nossa indecifrável capacidade de pensar. Afinal de contas, todos somos grandes artistas no anfiteatro da nossa mente. Que espécie é essa em que alguns são supervalorizados e a maioria é relegada ao rol dos anônimos? Isso é uma mutilação da inteligência. Muitos podem não ter fama e status social, mas para a ciência todos somos igualmente complexos e dignos. A rainha da Inglaterra nunca teve mais valor nem mais complexidade intelectual do que um miserável das ruas de Londres. Einstein e Freud não tiveram mais segredos psíquicos do que um faminto do terceiro mundo, um dependente de drogas ou um criminoso. Essa é uma verdade científica. Quando você lê sua memória em milésimos de segundos e escolhe, sem saber como, as informações em meio a bilhões de opções em seu inconsciente para construir uma única ideia, você está sendo um grande artista. Você crê nisso? Supervalorizar uma minoria de intelectuais, artistas, políticos, empresários pode ser tão traumático quanto discriminar. Respeitar e tomar algumas pessoas como modelo é saudável, mas supervalorizá-las bloqueia nossa inteligência e capacidade de decidir. Hitler foi supervalorizado. As consequências foram trágicas. A primeira grande ferramenta da qualidade de vida do programa FREEMIND é: ser autor da sua história. Para ser autor da sua história, é necessário primeiramente enxergar a grandeza do psiquismo humano e nunca se diminuir, se inferiorizar ou ser um coitadista que tem pena de si mesmo, que fica procurando culpados pelos nossos conflitos. Ainda que haja culpados, o importante não é ir a caça às bruxas fora de nós, mas encontrar os fantasmas em nossas mentes e reciclá-los, reeditá-los, eliminá-los. Um Eu que é coitadista esmaga sua coragem para reescrever sua história. Em segundo lugar, deve ter consciência de que na essência psíquica somos iguais e nas diferenças nos respeitamos. Uma pessoa madura não exige que os outros tenham a mesma crença, pensamento, cultura e modo de vida que temos. Em terceiro lugar, deve aprender gerir seus pensamentos e emoções, ferramentas que trataremos nos próximos capítulos. Ninguém pode ser um grande líder no teatro social se primeiramente não o for no teatro psíquico. Ter a capacidade de gerenciar as emoções, de acordo com Mayer e Salovey (1999 apud MUNIZ; PRIMI, 2007), envolve adquirir tolerância às experiências
  • 45. 45 emocionais mais intensas e também obter o conhecimento e emprego efetivo de estratégias de alterações desses sentimentos. Sendo assim com o passar do tempo pode tornar-se possível entender as reações emocionais, avaliando-as, controlando-as e compreendendo-as. O resgate da liderança do Eu Muitos confundem o significado do Eu. Mesmo nas teorias psicológicas, há uma carência de definição adequada. De acordo com a teoria da Inteligência Multifocal, o Eu representa a nossa consciência crítica, nossa vontade consciente e capacidade de decidir. O Eu é a nossa identidade. Não é um mero realizador de tarefas, eu posso, quero, faço. O Eu é a nossa capacidade de analisar as situações, duvidar, criticar, fazer escolhas, exercer o livre-arbítrio, corrigir rotas, estabelecer metas, administrar o psiquismo. Agrônomos discutem microelementos para nutrir as plantas, médicos debatem sobre moléculas medicamentosas, economistas discorrem sobre medidas para controlar o fluxo de capitais internacionais, mas não sabemos quase nada sobre como formar o Eu como diretor psíquico. O sistema acadêmico nos prepara exercer uma profissão e para conhecer e dirigir empresas, cidades ou estados, mas não a nós mesmos. Essa lacuna gerou déficits gritantes na formação do Eu, que por sua vez, se tornou um dos importantes fatores que fomentaram as falhas históricas do Homo sapiens. Não é loucura um mortal produzir guerras e homicídios? O caos dramático da morte perpetrado na solidão de um túmulo deveria produzir um aporte mínimo de sabedoria para o Eu para controlar sua violência, mas não é suficiente. Um Eu infantil, pouco dado a interiorização, postula-se como deus. Não é estupidez um ser humano que morre um pouco a cada dia ter a necessidade neurótica de poder como se fosse eterno? Não é estupidez um homem que não sabe como gerenciar seus pensamentos ter a necessidade ansiosa de controlar os outros? Não é uma barbaridade querer ser o mais rico, famoso ou o mais eficiente profissional no leito de um hospital? Ninguém quer isso. Mas por que muitos que têm espetacular sucesso social e financeiro, ao invés de relaxar e se deleitar, continuam num ritmo alucinado, procurando metas inalcançáveis? Um Eu competente não quer dizer um Eu bem formado. Um Eu mal formado pode ser eficientíssimo para o sistema social, mas, simultaneamente, ter uma péssima relação consigo mesmo.