O poema "Não sei quantas almas tenho", de Fernando Pessoa, retrata o sujeito lírico questionando sua própria identidade. Ele sente que muda constantemente e não consegue se reconhecer, como se tivesse múltiplas "almas" dentro de si. Ao longo do poema, o sujeito explora essa sensação de despersonalização e estranhamento em relação a si mesmo.
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chave
Análise do poema Nao sei quantas almas tenho
1. ANÁLISE DO POEMA
Não sei quantas almas tenho
POESIA DE FERNANDO PESSOA
Ricardo Santos – 4071 Beatriz Quiaios - 824
2. LEITURA DO POEMA
Não sei quantas almas tenho
Não sei quantas almas tenho. Atento ao que eu sou e vejo, Por isso, alheio, vou lendo
Cada momento mudei. Torno-me eles e não eu. Como páginas, meu ser.
Continuamente me estranho. Cada meu sonho ou desejo O que segue prevendo,
Nunca me vi nem achei. É do que nasce e não meu. O que passou a esquecer.
De tanto ser, só tenho alma. Sou minha própria paisagem, Noto à margem do que li
Quem tem alma não tem calma. Assisto à minha passagem, O que julguei que senti.
Quem vê é só o que vê, Diverso, móbil e só, Releio e digo: "Fui eu"?
Quem sente não é quem é, Não sei sentir-me onde estou. Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa
3. ANÁLISE FORMAL
Não sei quantas almas tenho
6 Não sei quantas almas tenho. a
6 Cada momento mudei. b - 3 oitavas
6 Continuamente me estranho. a
6 Nunca me vi nem achei. b - Métrica regular (6 sílabas)
6 De tanto ser, só tenho alma. c
6 Quem tem alma não tem calma. c - Rima cruzada/emparelhado
6 Quem vê é só o que vê, d e versos soltos
6 Quem sente não é quem é, f
4. ANÁLISE DO CONTEÚDO
Não sei quantas almas tenho
Não sei quantas almas tenho.
Despersonalização de Pessoa (ex.1)
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho. (ex.2)
Nunca me vi nem achei.
- Sujeito Poético apresenta nesta
De tanto ser, só tenho alma. (ex.3)
estrofe uma reflexão que nos leva a
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê, (ex.4) verificar que não se reconhece. (ex.2)
Quem sente não é quem é, - Por ser múltiplo (heterónimos) o
sujeito poético não se reconhece
- Exteriorização torna-o estranho
(ex.3)
à própria vida (ex.4)
5. ANÁLISE DO CONTEÚDO
Não sei quantas almas tenho
Atento ao que eu sou e vejo,
Despersonalização de Pessoa (ex.1)
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo - “Esconde-se da realidade nos
É do que nasce e não meu.
heterónimos. (ex.1)
Sou minha própria paisagem,
(ex.2) - Corpo como se separasse da alma
Assisto à minha passagem,
(ex.2)
Diverso, móbil e só, (ex.3)
- Multiplica-se mas ao mesmo tempo é
Não sei sentir-me onde estou. (ex.4)
solitário (ex.3)
- Quanto mais se sente múltiplo, menos se reconhece, mais se sente perdido
6. ANÁLISE DO CONTEÚDO
Não sei quantas almas tenho
(ex.2) - Esta estrofe apresenta-se como
Por isso, alheio, vou lendo (ex.1)
Como páginas, meu ser. (ex.3) conclusão do poema (ex.1)
O que segue prevendo, - Sente-se ausente de si próprio
O que passou a esquecer. (ex.2)
Noto à margem do que li (ex.4) - Páginas interiores surgem como
O que julguei que senti. autoanálise (ex.3)
Releio e digo: "Fui eu"?
- Analogia do “eu” interior como
Deus sabe, porque o escreveu. (ex.5)
livro, no qual escreve na margem o
- Pessoa = Livro escrito por Deus (ex.5) que julga sentir (ex.4)
7. CONCLUSÃO
Não sei quantas almas tenho
O poema de Fernando Pessoa, Não Sei Quantas Almas Tenho, remete-nos
para uma autoanálise por parte do sujeito poético. O mesmo apresenta-se com
várias “almas”, como se o seu interior fosse um labirinto no qual tem dificuldade
em se encontrar a si próprio. Ou seja, tenta se expressar através de heterónimos
mas acaba solitário e triste pois na verdade não consegue ser ele mesmo.
8. ANÁLISE ESTILÍSTICA
Não sei quantas almas tenho
- "Quem vê é só o que vê, / Quem sente não é quem é,“- antítese - marca ainda mais
esta oposição viver/pensar. "Quem vê" é aquele que vive só a vida e não a pensa
(sente). “Quem sente não é quem é" - quer dizer que o pensamento impede a ação
na vida. Reforça o que dissemos anteriormente, que viver e pensar se tornam
inconciliáveis.
- “Por isso, alheio, vou lendo/ Como páginas o meu ser.”- metáfora - A vida foi
racionalizada, foi reduzida a linguagem escrita, transferida para os seus
personagens literários, que acabam por viver a sua vida por si, por deixá-lo a um
canto, reduzido quase a nada enquanto individualidade.
9. ANÁLISE ESTILÍSTICA
Não sei quantas almas tenho
• “Quem tem alma não tem calma/Quem vê é só o que vê,/Quem sente não é quem
é,” Quem tem alma não tem calma“ – Anáfora - Quer dizer que quem pensa não
tem paz - é inconciliável pensar e viver, ou se vive sem pensar ou se pensa sem
viver.
- De tanto ser, só tenho alma/Quem tem alma não tem calma – Assonância - Pessoa
quer dizer que não sente ter vida, mas só alma - ou seja, a sua vida foi (e é) toda
pensada, toda racionalizada. Como sempre passou para pensamento tudo o que
lhe acontecia, tudo o que sente é na alma, e parece que nada sente no corpo.
10. ANÁLISE LINGUÍSTICA
Não sei quantas almas tenho
• Uso de frases nominais : “Como páginas, meu ser”; “Diverso , móbil e só”
• Eufonia dos versos-Musicalidade: aliterações, rimas, ritmo, tom nasal.
• Interrogação “ fui eu?” inquietações do poeta
• Uso de pronomes: indefinidos “quantas e interrogativos “ quem” :expressando
quantidade indeterminada e dando sentido vago (impreciso) e ainda pessoais “
me, eu” e “eles” alternância entre Fernando pessoa ortonimo e heterónimos.
11. QUESTIONÁRIO
Não sei quantas almas tenho
- Justifica o uso do presente do indicativo no poema
- Este poema apresenta-se como uma reflexão feita por Fernando Pessoa.
- Como justificas a pergunta da terceira estrofe? Porque é que está
entre aspas? Porque é que está lá? (“Releio e digo: "Fui eu"?”)
- Pensamento em voz alta, como se fosse de outra pessoa pois o sujeito lírico não se
reconhece
- Explica o verso 5 (“De tanto ser, só tenho alma”)
- Pluralidade do “eu” não lhe permite conhecer-se a si próprio.