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CENTRO UNIVERSITÁRIO “BARÃO DE MAUÁ”
Departamentos de Geografia, História e Pedagogia
DIALOGUS
revista das graduações em licenciatura em
Geografia, História e Pedagogia
ISSN 1808-4656
Ribeirão Preto v.6 n.2 2010 p.1-199
DIALOGUS é uma publicação semestral dos
cursos de Geografia, História e Pedagogia
mantidos pelo Centro Universitário Barão de
Mauá, Ribeirão Preto, SP. Solicita-se permuta.
As opiniões emitidas são de responsabilidade
dos autores. É permitida a reprodução total ou
parcial dos artigos desde que citada a fonte.
EXPEDIENTE
Reitora
Profª. Me. Maria Célia Pressinatto
Pró-Reitoras de Ensino
Profª. Drª. Dulce Maria Pamplona Guimarães e
Profª. Drª. Joyce Maria Worschech Gabrielli
Diretores
Sr. José Favaro Júnior
Sr. Guilherme Pincerno Favaro
Sra. Neusa Pincerno Teixeira
Srª. Elizabeth M. Cristina Pincerno Favaro e Silva
Sr. Carlos César Palma Spinelli
Sr. Marco Aurélio Palma Spinelli
Diretoria Executiva
Sr. José Antonio P.Capito
Departamento Didático Pedagógico
Profa. Esp. Dulce Aparecida Trindade do Val
Prof. Ms. Geraldo Alencar Ribeiro
Profa. Esp. Sara Maria Campos Soriani
Coordenadora das Graduações em Geografia e História
Profa. Ms. Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa
Coordenador da Graduação em Pedagogia
Prof. Ms. Cicero Barbosa do Nascimento
Comissão Editorial
Prof. Ms. Cícero Barbosa do Nascimento
Prof. Dr. Humberto Perinelli Neto
Profa. Ms. Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa
Prof. Dr. Paulo Eduardo V. P. Lopes
Conselho Editorial
Andréa Coelho Lastória, profª Drª
Antônio Aparecido de Souza, prof. Ms.
Antônio Carlos Lopes Petean, prof. Ms.
Beatriz Ribeiro Soares, profª Drª
Charlei Aparecido da Silva, prof. Dr.
Dulce Maria Pamplona Guimarães, profª. Drª.
Edvaldo Cesar Moretti, prof. Dr.
Fábio Augusto Pacano, prof. Ms.
Fábio Fernandes Villela, prof. Dr.
Francisco Sergio Bernardes Ladeira, prof. Dr.
Ivan Aparecido Manoel, prof. Dr.
José William Vesentini, prof. Dr.
Aparecida Turolo Garcia, profª Drª
José Luís Vieira de Almeida, prof. Dr.
Lélio Luiz de Oliveira, prof. Dr.
Marcos Antonio Gomes Silvestre, prof. Ms.
Maria Lúcia Lamounier, profª Drª
Nainora Maria Barbosa de Freitas, profª Drª
Pedro Paulo Funari, prof. Dr.
Renato Leite Marcondes, prof. Dr.
Robson Mendonça Pereira, prof. Dr.
Ronildo Alves dos Santos, prof. Dr.
Sedeval Nardoque, prof. Dr.
Silvio Reinod Costa, prof. Dr.
Taciana Mirna Sambrano, profª Drª
Vera Lúcia Salazar Pessoa, profª Drª
FICHA CATALOGRÁFICA
DIALOGUS (Departamentos de Geografia, História e Pedagogia – Centro Universitário “Barão de Mauá”) Ribeirão Preto, SP –
Brasil, v.6, n.2, jul/dez 2010. Semestral
16,0 X 21,0. 199p.
2010, 6-2
ISSN 1808-4656
1. Educação. 2. História. 3.Geografia.
I. Centro Universitário Barão de Mauá.
II. Departamentos de História, Geografia e Pedagogia.
CAPA: “ , autoria: Ana Carla Vannucchi
PREFÁCIO
Reitoria do Centro Universitário Barão de Mauá
Apresentação do segundo número do sexto volume
A apresentação deste número da DIALOGUS teve como
principio a consulta ao dicionário, na ânsia de melhor saber sobre o
sentido de dois termos que compõem a expressão produção
acadêmica:
 Produção: ato, processo ou efeito de produzir; criação,
elaboração, fabricação, fabricação, geração, realização.
 Acadêmica: substantivo masculino; filósofo da escola de Platão
(relativo a diálogos);
A surpresa diante do dicionário foi gratificante. A grosso modo,
tal consulta referenda a necessidade de pensarmos a produção
acadêmica como sendo o exercício constante e incompleto (ação) da
busca de conhecimento, por meio do contato freqüente com o novo, o
diferente e o desconhecido.
É nos fiando neste tipo de entendimento da expressão
produção acadêmica, que movemos diversos esforços para que
houvesse o lançamento de mais um volume da DIALOGUS.
Com este volume, buscamos ressaltar também que a ciência é
poliglota, já que se faz entender por várias línguas: podemos acessá-la
na forma de conferências, entrevistas, artigos e ensaios (todos aqui
presente sob a forma de textos escritos), entre outros suportes.
Ao ter este volume em mãos, que o leitor promova seus
próprios diálogos e, quiçá, a partir deles sua produção acadêmica, no
sentido mais latu possível.
Comissão Editorial
SUMÁRIO/SUMMARY
CONFERÊNCIA/CONFERENCE
ORIGENS DO TRADICIONALISMO CATÓLICO: UM ENSAIO DE
INTERPRETAÇÃO
Origins of traditional catholic: a test of Iinterpretation
Ivan Aparecido MANOEL
DOSSIÊ/SPECIAL
“PATRIMONIO CULTURAL/CULTURAL PATRIMONY”
PAISAGENS CULTURAIS: DO CAFÉ À CANA
Cultural landscapes: from coffee to sugarcane
Nainôra Maria Barbosa de FREITAS et al
INSTITUCIONALIZAÇÃO DA MEMÓRIA: MONUMENTOS EM
LUGARES PÚBLICOS DE RIBEIRÃO PRETO, SP
Institutionalization of memory: monuments in public places of Ribeirão
Preto, SP
Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA
Michelle Cartolano de Castro SILVA
ESTRATÉGIAS DE PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA DO LUGAR:
AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A INDUSTRIALIZAÇÃO, OS
INTELECTUAIS E A ORGANIZAÇÃO DA CULTURA E OS
DESAFIOS DA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
AGROINDUSTRIAL EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, SP
Strategies to preserve the memory of place: public policies for
industrialization, the intellectuals and the organization of culture and
heritage preservation challenges of agro-industrial in São José do Rio
Preto, SP, Brazil
Fábio Fernandes VILLELA
ARTIGOS/ARTICLES
GEOGRAFIA/GEOGRAPHY
ESPAÇO E FESTEJOS RELIGIOSOS: ASPECTOS DA
ESPACIALIDADE DE COMUNIDADES RIBEIRINHAS DA
AMAZÔNIA
Space and Parties Religious: aspects of the spaces communities that live
next to rive of the Amazonia
Adriano Lopes SARAIVA
Josué da Costa SILVA
A GEOGRAFIA ESCOLAR E A FORMAÇÃO DOS
PROFESSORES NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL
To school geography in the formation teachers in first years of basic
schooling
Clézio SANTOS
EDUCAÇÃO/EDUCATION
PRÁXIS EDUCATIVA E LIBERTAÇÃO DO SER HUMANO: AS
CEBs COMO MOVIMENTO SOCIAL
Educative práxis and the human being liberation: the CEBs as social
movement
Claudemiro Godoy do NASCIMENTO
GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA: IMPRESSÕES DOS
PARTICIPANTES DO PROGRAMA PROGESTÃO
Democratic management in schools: Impressions conveyed by
participants of the program Pro management (Progestão)
Iraíde Marques de Freitas BARREIRO
Gabriella Garcia MOURA
ENSAIO/ANALYSIS
O LEITE DERRAMADO CUJA LEMBRANÇA NOS ESPELHA...
MEMÓRIAS E SOCIABILIDADES NUM DISCURSO LITERÁRIO
DO/SOBRE O BRASIL
The leite derramado in remembrance of which mirrors ... memories and
sociability in a literary discourse of / about Brazil
Humberto PERINELLI NETO
Índice de autores/Authors index
Índice de Assuntos
Subject Index
Normas para publicação na revista DIALOGUS
CONFERÊNCIA/CONFERENCE
ORIGENS DO TRADICIONALISMO CATÓLICO: UM ENSAIO DE
INTERPRETAÇÃO
Ivan Aparecido MANOEL**
RESUMO: Tendo como objeto a Igreja Católica Apostólica Romana, o
presente artigo interpreta a reação católica, no século XIX, ao
pensamento moderno, a partir de teóricos como Donoso-Cortés.
Interpreta o conservadorismo católico tendo por base os seus
fundamentos tradicionalistas, cujos alicerces podem enraízam-se nas
tradições religiosas judaicas.
PALAVRAS-CHAVE: Igreja Católica; conservadorismo; pensamento
moderno.
No debate acadêmico, e mesmo nas matérias jornalísticas, há
constantemente o emprego de alguns adjetivos a qualificarem a Igreja
Católica Romana, sendo os mais comumente empregados,
tradicionalista, conservadora e reacionária, esquecendo-se que os
mesmos adjetivos poderiam, com toda razão, serem empregados a todas
outras igrejas e suas respectivas religiões, exatamente porque a
tradição, solo de que germinam a conservação e a reação, é o
fundamento de qualquer crença religiosa.
Centrando a atenção na Igreja Católica Romana, objeto deste
texto, constata-se que sua religião, o cristianismo, explicita seus
fundamentos tradicionais, que o próprio Jesus se encarregava de

Texto apresentado sob a forma de conferências no II Encontro Nacional do GT
“História das religiões e das religiosidades/ANPUH”, realizado em 2008 na
FCHS/UNESP/Franca..
** Livre Docente em Filosofia da História. Docente do Departamento de História
da FCHS/UNESP/Franca.
conservar, conforme se lê no Novo Testamento. Em Mateus (5, 17-18) se
lê: “[...] não julgueis que vim abolir a lei ou os profetas. Não vim para
abolir, mas sim para levá-los à perfeição. Pois em verdade vos digo:
passará o céu e a terra, antes que desapareça um jota, um traço da lei”
(BÍBLIA sagrada, 1982, p.1288).
Confirmando a tradição, em Lucas (5, 37-39) encontra-se a ideia
de que os elementos da cultura antiga são melhores do que a nova, uma
vez que foram conservados e maturados:
Também ninguém põe vinho novo em odres velhos; do contrário o
vinho novo arrebentará os odres e entornar-se-á e perder-se-ão os
odres. Mas, o vinho novo deve-se pôr em odres novos, e assim ambos
se conservam. Demais, ninguém que bebeu do vinho velho quer já do
novo, porque diz: „o vinho velho é melhor (BÍBLIA sagrada, 1982,
p.1353).
Estão postos, nessas duas passagens, os fundamentos
tradicionalistas do cristianismo, que permaneceram ao longo dos
séculos: ele se alicerçaria nas tradições religiosas judaicas, a Lei, e não
se proporia mudá-las, mas conservá-las. As mudanças que haveriam de
ocorrer não deveriam ser alterações, mas aperfeiçoamentos. Por isso o
“vinho velho” seria melhor: porque teria descansado em odres que foram
novos, e envelhecendo juntos se conservaram e se aperfeiçoaram.
Convém ressaltar, entretanto, que as tradições que se
encontram nas raízes do cristianismo não apenas judaicas. Aquela
região onde floresceu a religião cristã era já muito rica em tradições
religiosas, e a sua penetração na cultura judaica se explica tanto pelo
fato de o povo judeu habitar uma zona de trânsito intenso de diversos
povos, quanto pelo fato de terem sido dominados por povo
mesopotâmicos, aliás, sua própria região de origem, e também por
egípcios e romanos.
Embora a tradição cristã, seja na vertente católica, seja nas
vertentes ditas protestantes, sustente a idéia de que a crença em um
Deus único teve origem com a Revelação Divina ao povo judeu, na
verdade encontra-se a idéia monoteísta, a crença na imortalidade da
alma e sua origem transcendental já entre os egípcios e o seu culto a
Aton, e também no zoroastrismo, na antiga Pérsia. Conforme muitos
estudiosos do problema, dentre os quais podemos citar Freud, a própria
crença monoteísta entre os judeus foi assimilada por Moisés quando
viveu em Madiã, ou Midiã, e transformada em crença de seu povo.
Fundamentando-se em dezenas de historiadores, Freud diz que
eles, historiadores:
[...] concordam com a história bíblica em um ponto decisivo. Todos
eles acham que as tribos judaicas [...] adquiriram uma nova religião
num determinado ponto do tempo. Contudo, segundo eles isso não se
realizou no Egito ou ao sopé de uma montanha na Península de Sinai,
mas numa certa localidade conhecida como Meribá-Cades, um oásis...
ao sul da Palestina, entre a saída oriental da Península de Sinai e a
fronteira ocidental da Arábia. Aí, eles assumiram a adoração de um
deus Iavé ou Javé, provavelmente da tribo árabe vizinhas dos
midianitas (1975, p.49).
Há, certamente, fundamentos nas suposições de Freud e dos
demais historiadores porque Moisés, o introdutor do monoteísmo entre
os judeus, era genro de Jetro, sacerdote de Madiã, onde seguramente
Javé era adorado. Além do mais, durante a migração para Canaã, Jetro
visitou Moisés para lhe aconselhar sobre como se comunicar com o seu
povo e com Javé, conforme se lê no (ÊXODO 2, 16-22 e 18, 1-27, In:
BÍBLIA sagrada, 1982, p.102 e 118 – 119).
A tradição egípcia e persa da imortalidade da alma e sua origem
transcendental, que se tornará fundamental na tradição judaico-cristã,
pressupunham a transitoriedade do corpo. Os sumérios, na
Mesopotâmia, tinham clara consciência, não só da transitoriedade
individual, mas da própria transitoriedade de todas as coisas na longa
duração. Essa consciência advinha do fato de terem sofrido os impactos
da grande inundação que a tudo destruiu na região, cerca de 2000 AC,
inundação que se incorporou à tradição judaico-cristã como o Dilúvio
Universal. Por isso, na Epopéia de Gilgamesh, a transitoriedade era
encarada como da natureza das coisas:
Não há permanência. Construímos uma casa para se manter sempre,
selamos um contrato para vigorar por todo o tempo? Irmãos dividem
uma herança para guardá-la eternamente, o tempo da cheia dos rios
perdura? [...] Desde os velhos tempos não há permanência
(WHITROW, 1993, p.44).
A transitoriedade da vida era conhecida, obviamente, mas a
aceitação do fato era e é um problema para o Homem. Teria algum
sentido viver, conhecer, reproduzir, produzir e, depois, simplesmente
desaparecer deixando, quando muito, a lembrança na memória da
posteridade?
Embora os povos referidos tivessem a esperança na
possibilidade de uma vida espiritual eterna, e nesse particular os
egípcios são um ótimo exemplo, foi com Zaratustra (ou Zoroastro) que
essa esperança ganhou status de doutrina organizada, e mais, introduziu
a concepção escatológica da vida humana, que está no alicerce da
doutrina judaico-cristã e será, mais tarde, fundamentos da filosofia da
história catolicismo. Sua religião estabelecia que os homens que
tivessem uma vida de adesão à verdade, no final receberiam a
recompensa eterna, e os que tivessem aderido à mentira, receberiam o
castigo eterno:
Zaratustra declarava que, por ocasião da morte, Deus fazia um
julgamento do homem, o que decidia o destino que lhe caberia quando
o mundo finalmente atingisse o mesmo estado de perfeição em que o
deixara as mãos do Criador. Finalmente, a glória imortal seria
recompensa daqueles que aderissem à Verdade, ao passo que os
adeptos da Mentira seriam condenados a uma longa era de trevas,
comida podre e gritos de pesar. Essa doutrina de coisas finais, a
primeira escatologia sistematizada na história da religião, influenciou
profundamente o judaísmo, o cristianismo e o islã (WHITROW, 1993,
p.48).
Além das tradições propriamente religiosas que se imbricaram
na construção da doutrina cristã, outras, sejam de raízes astronômicas,
tais como o sistema de medição do tempo e datação de origem
babilônica, fundamentais para o estabelecimento do calendário das
festas cristãs, particularmente a definição da data da Páscoa, sejam de
raízes rituais, tais como a ereção de imagens e procissões para o culto
dos santos, ou a instituição do Ano Jubilar da Igreja, a cada 50 anos,
tradições essas de origem romana, também vieram se juntar para a
construção do cristianismo como a primeira grande e universal (católica)
religião monoteísta.
Certo é que poderíamos acrescentar outros dados mais a
demonstrarem o entrelaçamento de diversas outras tradições a
construírem o cristianismo. Entretanto, o já elencado é suficiente para
explicitar que o cristianismo não é uma religião “pura”, isto é, uma
religião que se tenha construído com elementos gerados em si mesmos,
sem a presença e até contra elementos culturais de outras religiões.
Ao contrário, a religião de Jesus, o Cristo, que se
institucionalizou e predominou na Europa e, depois, se espalhou pelo
mundo todo por meio da Igreja Católica Romana, é produto do
entrecruzamento de diversos elementos culturais que ela preservou e
dogmatizou, de tal modo que um católico, quando acompanha uma
procissão, provavelmente não sabe que está a repetir um ritual romano
como tantos outros, por exemplo, o incensar o altar durante cerimônias
especiais.
Aqui volto ao ponto inicial do texto: toda religião – e o
cristianismo católico romano é o objeto imediato – é necessariamente
tradicionalista, porque se constitui de elementos da tradição, e
conservadora, porque deve preservá-los. Uma religião que não
preservasse suas tradições deixaria de existir.
Se assim é, como tudo indica que seja, cabe perguntar por que
os adjetivos são usados pejorativamente em relação às religiões em
geral, e a católica romana, em particular.
A resposta a essa questão não é simples e exigiria a redação de
um compêndio. Proponho, à vista dessa complexidade, um ensaio de
resposta focado em dois pontos, o dogmatismo e a inserção política da
Igreja Católica Romana.
Rigorosamente falando, toda doutrina religiosa se alicerça em
dogmas, em postulados considerados a expressão da Verdade,
indiscutíveis, portanto, por exemplo, o dogma da Transubstanciação do
pão e do vinho em corpo e sangue de Cristo na Eucaristia, conforme a
tradição católica. Os dogmas são balizas orientadoras do fiel na
passagem pela ponte que religa o profano ao sagrado, a criatura ao
criador, o Homem a Deus e isso exigiu a elaboração de um conceito e
uma filosofia da história.
O problema se apresenta quando, em função de sua inserção
política, a igreja transfere suas balizas dogmáticas do âmbito
estritamente religioso para o conjunto da sociedade civil e da vida
cotidiana.
Há que se estabelecer, portanto, para a continuidade do
raciocínio, um conceito de Igreja e demarcar alguns pontos de sua
história para que se possa entender sua inserção, mais do que isso, seu
predomínio no mundo ocidental por tantos séculos.
Este texto entende a palavra Igreja em duas vertentes. Na
vertente eminentemente eclesial, Igreja é uma Eklesia, uma reunião de
fiéis, a “assembléia dos cristãos”, o “povo de Deus”, ou, nas palavras de
Pe. D‟Ângelo, no sentido eclesial, estrito senso, é a “Igreja Pneumática,
espiritual, invisível que chamamos de „Ecclesia Caritatis‟ e que o
Vaticano II descreve como Comunidade de Fé, Esperança e Caridade”
(D‟ÂNGELO, 1991, p.53).
Na outra vertente, num sentido mais eclesiástico, a Igreja é uma
instituição hierarquizada, ou, ainda seguindo o Pe. D‟Ângelo,
[...] é a Igreja Institucional, social, visível, a chamada „Ecclesia Iuris‟,
que a Lumen Gentium descreve como „Societas organis hierarchitis‟
„Ecclesia terrestris‟. É a Igreja que se manifesta externamente na
profissão da mesma fé, na comunicação dos mesmos sacramentos, na
participação do mesmo sacrifício e na observância das mesmas leis.
Para que seja visível a todos, tem como Cabeça Suprema o Romano
Pontífice que a guia a fim de obter o que ela pretende (1991, p.53).
É essa Igreja Católica Romana que este texto está a discutir, a
instituição que, iniciando-se da reunião de fiéis, institucionalizou-se e
conquistou um lugar central na sociedade européia e em países como o
Brasil, por exemplo, lugar de onde ditou normas de conduta pessoal,
social e política.
A história da Igreja Católica pode ser entendida como a história
de uma instituição que passou da condição de religião perseguida à
condição de religião oficial, ou como diz Marramao
[...] durante os acontecimentos do século IV, a confissão cristã – ou,
mais precisamente, a Igreja católica, isto é, aquela que havia adotado
o credo niceno – havia, no intervalo de poucas décadas, passado da
condição de organização apenas tolerada pelo Império, ainda
contrastada ou combatida por setores do establishment social e
político, à condição de instituição oficialmente admitida (por
Constantino), para enfim (com a proclamação de 380, por Teodósio I)
passar à condição de única religião do Estado, e conseqüentemente,
de plena co-responsável pelo exercício do poder (1995, p.19).
Esse entrelaçamento entre Igreja e Estado, que já principiou a
trazer condições vantajosas para a instituição religiosa e assentou as
bases da teoria da indissociabilidade entre os dois poderes (que na
realidade se converteu na tese da supremacia do poder religioso), se
reforçou sobremaneira no ano 800, com a coroação de Carlos Magno
como Imperador do Santo Império Romano-Germânico. A coroação de
Carlos Magno pelo Papa Leão III, trouxe para a Igreja toda a região
central da Itália, que foi incorporada ao seu patrimônio como Estados
Pontifícios. A partir de então, até 1849, a Igreja Católica, além e acima
de ser uma instituição religiosa preeminente no mundo ocidental,
também foi um Estado Nacional, com território próprio, sobre o qual o
Papa exercia o poder de Chefe de Estado, ao lado de um Cardeal, que
exercia o poder de Chefe de Governo.
Na qualidade de soberano temporal, além de chefe espiritual, o
Papa podia estabelecer como de fato estabeleceu acordos e alianças
com outros soberanos, que propiciaram algumas resultantes favoráveis à
Igreja, das quais três são fundamentais para o entendimento da
problemática posta:
1. Desde Carlos Magno, presença marcante do clero na
administração do Império, condição que permitiu à Igreja, dentre
outras coisas, exercer controle e monopólio sobre a produção e
distribuição do conhecimento;
2. Abertura de possibilidades para a Igreja construir um
invejável patrimônio fundiário em quase toda a Europa,
transformando-a em uma das maiores suseranas da Idade
Média;
3. Atribuição ao Papa da função de árbitro universal, acima dos
próprios reis e imperadores.
Essas são algumas das razões que deram à Igreja na Idade
Média uma posição singular. Além de instituição que oferecia serviços
religiosos, além de Estado Nacional, além de exercer suserania sobre
imensas regiões européias, além de atuar decisivamente na própria
administração imperial, avocava a si o privilégio de monopolizar o saber.
Em outros e mais simples termos, a Igreja se constituiu no
centro de equilíbrio da Europa medieval, e moldou o mundo feudal à sua
imagem e semelhança. Não por acaso, como se verá adiante,
Montalembert e Donoso-Cortés, dois pensadores católicos do século
XIX, em sua troca de correspondência, consideravam a Idade Média
como a “Idade de Ouro” da humanidade. Aliás, iam mais longe em seu
raciocínio. Ambos eram explícitos ao afirmarem que só existira
verdadeiramente civilização durante o medievo, porque era uma
civilização católica.
O significado dessa passagem é bastante elucidativo. Não se
tratava apenas de afirmar o valor salvífico que seria inerente à ética e
doutrina católicas e sua eficácia na regulamentação das relações
interpessoais e sociais. Tratava-se, na verdade, de subordinar todo o
processo histórico, dos fins do Império Romano em diante, a um
processo civilizatório católico, como se toda a intrincada rede de relações
estabelecidas nas e entre as estruturas feudais tivesse fundamento
apenas no ideário e na prática da Igreja.
Era essa exatamente a leitura feita pelos autores conservadores
católicos do século XIX. Donoso-Cortés, por exemplo, considerava acima
de qualquer discussão a existência de um processo civilizatório católico.
Conforme seu texto, somente a Igreja pode construir uma verdadeira
civilização, primeiro porque foi ela quem levou os homens a superarem a
barbárie do politeísmo pagão:
“Esa Iglesia, puesta en el mundo sin fundamentos humanos,
después de haberle sacado del abismo de la corrupción, le sacó de la
noche de la barbarie” (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.364).
Segundo, porque o catolicismo é uma teologia, a única
verdadeira teologia que jamais houve, razão de ser da própria civilização:
Esa nueva teología se llama el catolicismo. El catolicismo es un
sistema de civilización completo; tan completo, que en su inmensidad
lo abarca todo: la ciencia de Dios, la ciencia del ángel, la ciencia del
universo, la ciencia del hombre” (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.357).
Essa interpretação não freqüentava apenas o texto dos autores leigos,
antes estava incrustada nos fundamentos da autocrompreensão católica,
desde que Santo Agostinho estabelecera ser a função da Igreja
transformar a civitas secular em civitas divina, de tal sorte que
doutrinando em 1878, Leão XIII condensou-a nas seguintes palavras:
“Bem claro e evidente é que [...] à causa da civilização faltam
fundamentos sólidos se ela não se apóia nos princípios eternos da
verdade e nas leis imutáveis do direito e da justiça” (IGREJA CATÓLICA.
Papa Leão XIII, 1950, p.5).
Portanto, quem mais, senão a Igreja Católica poderia arrogar o
privilégio de ter construído a verdadeira civilização, perguntava Leão XIII.
Afinal, não fora ela quem
[...] pregando o Evangelho entre as nações, fez brilhar a luz da
verdade entre os povos selvagens? Não foi a Igreja quem, fazendo
desaparecer a calamidade da escravidão, revocou os homens à
dignidade da sua nobilíssima natureza? Não foi ela quem, em toda
parte civilizou nos seus costumes privados e públicos o gênero
humano, reergueu-o da sua miséria e formou-o para um gênero de
vida conforme a dignidade e as esperanças humanas? (IGREJA
CATÓLICA. Papa Leão XIII, 1950, p.5).
Dialogando com os filósofos não católicos, que acusavam a
Igreja de ser retrógrada e contrária à própria civilização, Leão XIII
respondia que se
[...] os bem numerosos que acabamos de relembrar e que deveram
seu nascimento ao ministério da Igreja e à sua salutar influência, são
verdadeiramente obra e glória da civilização humana, muitíssimo longe
está, pois, que a Igreja de Jesus Cristo abomine a civilização e a
repila, visto ser a si, pelo contrário, que ela crê caber inteiramente a
honra de haver sido nutriz, a mestra e a mãe (IGREJA CATÓLICA.
Papa Leão XIII, 1950, p.6).
Não seria diferente a posição de Rui Barbosa quando, em
1889, no jornal A Imprensa, escrevia que
Só a têmpera que o Evangelho deu à sociedade ocidental, com efeito,
a poderá livrar de um espantoso eclipse moral nesta luta com as
forças hediondas da anarquia, transformada em ideal de uma escola,
onde o desprezo da vida humana responde logicamente à negação de
Deus. (BARBOSA, MANOEL, Ivan, 1997)
Aqui se apresenta o centro do nosso problema. O catolicismo é
uma religião que se fundamenta nas tradições judaico-cristãs e as quer
conservar, do mesmo modo que pretende conservar um lugar central na
sociedade, tendo no Papa a sua voz oficial a dialogar com todos os
centros de poder, políticos, sociais, econômicos, científicos, tal como fora
na baixa Antigüidade e no medievo. Mas, desde um ponto de vista
estritamente político, para isso sempre se fez necessário, além de
conservar a tradição, conservar também a sociedade. Profundas
mudanças sociais, políticas e na esfera do conhecimento poderiam
significar alterações de tal ordem que comprometessem as tradições
religiosas.
Os debates a que me referi no início fazem exatamente isso,
circunscrevem a ação conservadora da Igreja Católica Romana apenas
ao âmbito estritamente político, reduzindo a ação católica apenas ao
simples exercício da conservação do poder, esquecendo-se que a
questão é mais profunda, radicando nas próprias funções que a
instituição se atribui.
Como toda religião, o cristianismo católico se propõe ser a ponte
de religação entre o profano e o sagrado. Por isso, repito, as balizas dos
dogmas devem permanecer imutáveis para que o fiel não se perca, saia
do reto caminho e desabe da ponte salvadora para o abismo da perdição
eterna. Entretanto, como manter firmes as balizas dogmáticas, conservar
as tradições em meio à fluidez e constante mutação do século, em meio
ao turbilhão da história?
Da baixa Antigüidade até meados do século XV a Igreja Católica
Romana conseguiu se manter como voz hegemônica em razão de seu
poder político na Europa, de tal sorte que as vozes discordantes eram
silenciadas pelo anátema, ou o pronunciador do discurso herético era
“relaxado ao braço secular”, isto é, executado. Por isso, durante esse
largo lapso de tempo o conjunto doutrinário e dogmático católico se
manteve quase inquestionado e íntegro.
As coisas começaram a se transformar e a se transtornarem
para a Igreja Católica Romana do Renascimento em diante, quando uma
retomada do humanismo deslocou o eixo teocêntrico e colocou o Homem
como objeto e objetivo do conhecimento e das ações humanas.
Filósofos, matemáticos e outros pensadores como Bacon e Descartes,
para ficar apenas nesses dois exemplos, embora sem descrerem – aliás,
Lucien Febvre já discutiu essa questão lembrando que os pensadores
renascentistas não dispunham sequer de vocabulário para expressarem
descrença – essas pensadores, repito, ao deslocarem o eixo para um
antropocentrismo, ainda que tímido de início, passaram a confiar também
na Razão.
Com o passar do tempo e com a consolidação dos métodos
científicos e suas descobertas aliadas às invenções tecnológicas, o eixo
se deslocou quase que completamente para o antropocentrismo e a
Razão foi entronizada como demonstração da vitória da inteligência
humana sobre a irracionalidade da crença religiosa, da imanência sobre
a transcendência.
O eixo não se deslocou completamente porque a Igreja Católica
Romana, apesar de abalada pela revolução renascentista, pelas
Reformas religiosas e, mais adiante, no final do século XVIII e início do
XIX, pela Revolução Francesa, pelo liberalismo e socialismo, mais tarde,
era ainda uma força a se ponderar na Europa e nas Américas, e usando
dessa força o instituto católico reagiu. Não vou me alongar sobre o
conjunto dessa reação, sendo mais proveitosa a leitura da farta
bibliografia já produzida sobre ela.1 Concentro-me na sua proposta de
repelir as mudanças profundas que ocorreram desde o século XVI até o
século XIX, rejeição se configurou plenamente em sua concepção e sua
filosofia da história.
Evitar, ou procurar retardar o processo de mudanças, ou a
mudança mesma, significa querer parar o movimento histórico – não
existem mudanças fora da história; melhor dizendo, a história humana é
o seu processo de mudanças.
A situação se apresentava paradoxal porque a mesma
instituição que se concebia como fautora da história humana, conforme
1 Há uma farta bibliografia já produzida sobre o assunto, podendo ser rastreada
a partir da leitura de Augustin Wernet, Ivan A. Manoel e Artur César Isaia.
se lê nas palavras pontifícias citadas páginas atrás, agora se posicionava
contra as mudanças e, corolário, contra o movimento da história.
A resposta ao paradoxo está na concepção da história, na
filosofia da história construída pela doutrina católica.
Já abordei o tema da filosofia católica da história em outra
publicação (MANOEL, 2004), mas com outro propósito. Naquele texto
procurei demonstrar que a concepção católica da história desenvolvida
pelo catolicismo entre 1860 e 1960, a que a historiografia denomina
Catolicismo Ultramontano, propiciou sua aproximação com os governos
ditatoriais de direita na primeira metade do século XX.
O propósito do presente texto é sugerir que o tradicionalismo
católico e, corolário, o seu conservadorismo, produziu a concepção de
história com as características com que se apresenta, um conceito
pendular e retilinear do processo histórico da humanidade.
É certo que Santo Agostinho, se contrapondo às concepções
cíclicas de história desenvolvidas na Antigüidade Clássica, elaborou o
conceito retilinear da história, estabelecendo a concepção de que a
história não se repete, mas segue um trajeto em linha reta, desde suas
origens no Pecado Original, até o seu fim no Juízo Final:
Os filósofos pagãos introduziram ciclos de tempo em que as mesmas
coisas seriam restauradas e repetidas pela ordem da natureza e
afirmaram que esses rodopios de idades passadas e futuras
prosseguirão incessantemente… A partir dessa zombaria, são
incapazes de por em liberdade a alma imortal, mesmo depois que ela
atingiu a sabedoria, e acreditam que ela está incessantemente
caminhando para um bem – aventurança falsa e incessantemente
retornando a uma miséria verdadeira […] É apenas através da sólida
doutrina de um curso retilinear que podemos escapar de não sei
quantos falsos ciclos descobertos por sábios falsos e enganosos
[grifo nosso] (AGOSTINHO apud WHITROW, 1993, p.79).
Porém, a concepção retilinear da história não se contrapõe a
ideia central da doutrina cristã que é a ideia do retorno. Os filósofos
gregos, tanto os estóicos, como o próprio Aristóteles, imaginavam que os
ciclos históricos se repetiriam eternamente com as mesmas
características, com as mesmas ideias, e até com os mesmos atores.
Por isso, Nemésio iria dizer que:
Sócrates e Platão e cada homem individual viverão novamente, com
os mesmo amigos e os mesmos concidadãos. Passarão pelas
mesmas experiências e as mesmas atividades. Cada cidade, cada
aldeia e campo serão restaurados, tal como eram. E essa restauração
do universo ocorre não uma só vez, mas reiteradamente – na verdade
por toda a eternidade, sem nunca findar. Aqueles entre os deuses que
não são sujeitos à destruição, tendo observado o curso de um período,
conhecem, a partir disso, tudo que vai acontecer em todos os períodos
subseqüentes. Pois jamais haverá qualquer coisa nova senão o que
houve antes, sendo tudo repetido até os mínimos detalhes
(WHITROW, 1993, p.58).
Na Metereológica, Aristóteles, citado por Whitrow, diz que “[...]
devemos dizer que as mesmas opiniões surgiram entre os homens em
ciclos, não uma ou duas vezes, não algumas vezes, mas com uma
freqüência infinita” (WHITROW, 1993, p.62).
A ideia de retorno no cristianismo é outra, é a concepção de que
a humanidade se afastou de Deus cometendo o pecado original e deve
retornar a Deus atravessando as águas turbulentas pela ponte da Igreja
Católica Romana obedecendo as suas balizas dogmáticas. Essa
concepção, que expressa o conjunto da concepção cristã, se explicita
plenamente na Parábola do Filho Pródigo, a humanidade que se afasta
de Deus, se arrepende e retorna ao Pai.
Nessa concepção não existem ciclos que se repetem
indefinidamente, mas existe o movimento de um pêndulo, um
afastamento e uma reaproximação.
Resumindo a doutrina católica sobre história em uma exígua
súmula didática encontramos o seguinte:
Deus criou o homem para que permanecesse em eterno contato
com sua autocomunicação. Entretanto, Adão e Eva, ao pretenderem
adquirir um saber e uma consciência não previstos no plano divino e
mesmo proibidos por ele, cometeram o Pecado Original, tendo como
resultado a expulsão do Paraíso, ou seja, provocaram a Queda. Inicia-se
aí a história humana.
A análise detida dessa doutrina revela:
1. Os seus termos apontam para a ausência da história. No
intervalo de tempo que teria existido entre a Criação e a
Queda, o homem teria vivido em uma situação de
imobilidade, na exata medida em que:
a) essa situação deveria ser eterna, perpetuar-se idêntica a
si mesma para todo sempre; isto é, uma situação sem tempo e
sem movimento;
b) estando livre da morte, o homem estava, na verdade,
acima da finitude própria da vida material; isto é, o ser humano
estava fora da história, ou melhor, a história não existia.
A esse período hipotético, a doutrina denomina “estado
supralapsário” isto é, um “estado” acima, fora, portanto, da história, que
se define como o estado
[…] de justicia original. Es decir, la situación salvífica paradisíaca
anterior al pecado original, del hombre „agraciado‟ sobrenaturalmente
por la auto comunicación de Dios; caracterizado por la inmunidad
respecto a la concupiscencia y substraído de la necesidad de morir
(RAHNER, & VORGRIMLER, 1966, p.225).
Nessa situação, o homem estava imune também às
enfermidades, sofrimentos e paixões. Portanto, a conclusão de que o
homem estava destinado à eternidade, estava isento de todas as
manifestações próprias de sua humanidade, leva também e logicamente
à conclusão de que esse homem era a-histórico.
1. Com o Pecado Original, o homem perdeu todas as
prerrogativas da a-historicidade: tornou-se mortal. A
mortalidade introduziu o ser humano na temporalidade e no
movimento, isto é, na história:
a) antes e acima de tudo porque se viu diante da
necessidade de trabalhar para garantir a reprodução da
vida. Esse talvez seja o significado mais profundo do
mito do Pecado Original, abordado de uma perspectiva
histórica. Expulso do Paraíso, o homem viu-se diante
da necessidade de trabalhar, e o trabalho é o elemento
fundamental da história humana.2 Mais ainda, quando
se recorda que o tema do pecado original foi elaborado
por um povo habitante de uma região semidesértica,
compreende-se porque ele considerava o trabalho um
castigo divino3·, em especial quando esse trabalho era
acompanhado da maldição de só produzir abrolhos ;
b) Além da necessidade de trabalhar, o homem se viu
presa também da concupiscência e dos sofrimentos
físicos e morais. Isso teria uma implicação profunda:
além do sofrimento, a inserção na historicidade deixou-
o vulnerável a apetites vorazes, sejam eles de bens e
sexualidade, sejam de conhecimento racional, e essa
vulnerabilidade iria trazer desdobramentos lastimáveis
em todo transcurso da história.
2 Não vamos entrar aqui na discussão surrealista do tipo “se o homem não
trabalhasse”, etc. etc. O fato histórico concreto é que o homem trabalha, e a
dialética entre o trabalho em si e suas formas concretas de realização constitui o
material por excelência do historiador, porque é dessas formas que derivam
todas as demais relações que os homens estabelecem entre si e a própria
natureza.
3 Esse mito é próprio de um povo habitante de uma região semidesértica, e foi
transformado pelo catolicismo em explicação universal. É muito difícil imaginar
um povo habitante de uma exuberante floresta tropical criando um mito
semelhante ao judaico-cristão. Com esse mito, os judeus tentaram explicar
porque eles e os demais povos da região encontravam tanta dificuldade em
produzir sua subsistência.
O ponto central dessa doutrina é a causa atribuída ao
movimento histórico.
Segundo ela, a história teve início com um ato humano negativo,
porque foi um ato de orgulho e desobediência. Por isso, história é um
processo negativo, considerado da perspectiva religiosa. Tanto assim,
que o Gênesis estabelece que toda evolução que levou do pastoreio
nômade a sedentarização e urbanização se deu pela linhagem
amaldiçoada de Caim (Gênesis, 4, 17-24. In: Bíblia Sagrada, 1982). A
esse respeito, afirmam os comentaristas da Bíblia de Jerusalém (1982)
que Caim, nessa passagem
[...] é o construtor da primeira cidade, o pai dos pastores, dos músicos,
dos ferreiros e das meretrizes, que provêem às comodidades e aos
prazeres da vida urbana. Esses progressos são atribuídos pelo autor
javista à linhagem de Caim, o amaldiçoado; a mesma condenação da
vida urbana será encontrada na narrativa javista da Torre de Babel
(BÍBLIA DE JERUSALÉM, p.37, Nota Z.).
Entretanto, toda maldição que provocou a história e nela
sobrevive, não radica no ato em si da desobediência, porque Adão
poderia ter desobedecido a qualquer outra restrição, mas radica no
móvel do seu ato – a busca do conhecimento.
Esse tema central e fundador de toda doutrina católica freqüenta
as páginas dos filósofos e teóricos católicos e, embora a estrutura central
seja a mesma, há pequenas diferenças na exposição do assunto. Por
isso, foram selecionados dois autores do século XIX para servirem de
suporte à nossa análise: René Chateaubriand e Juan Donoso-Cortés,
este já citado páginas atrás.
Chateaubriand publicou o seu livro, O gênio do cristianismo, em
1802, inaugurando o romantismo, segundo o estudo de Alceu de
Amoroso Lima 4. Escritor romântico, pela forma e conteúdo, ele produziu
4 “Pois, realmente, se as raízes do romantismo remontam ao século XVIII, é de
1802 e do livro cuja reedição hoje se faz que data, por assim dizer, oficialmente,
um texto hiperbólico e retórico, com o objetivo de fazer uma sólida
apologia do cristianismo católico, em contraposição àquilo que
considerava excessos do racionalismo científico e do discurso e da
prática revolucionária dos finais do século XVIII e início do XIX.
No Prefácio da edição francesa, de 1828, Chateaubriand
apresentava as razões de seu livro dizendo:
Ressurgia a França do caos revolucionário, quando o Gênio do
Cristianismo apareceu; todos os elementos da sociedade estavam
confusos: a mão que intentara ordená-los não conseguira ainda seu
intento – despotismo e glória não tinham podido criar ordem./Foi, pois,
entre as ruínas dos nossos templos que eu publiquei o Gênio do
Cristianismo, chamando a esses templos as pompas do culto e os
ministros dos altares. O Gênio do Cristianismo refletindo memórias do
nosso passado, nossos antigos costumes, da glória dos monumentos
de nossos reis, tinha o sabor da antiga monarquia: os franceses
afizeram-se a ver com saudades o seu passado, preparou-se a
estrada do futuro e reanimaram-se esperanças quase extintas
(CHATEAUBRIAND, [s.d], p.9 -11).
Compendiando a doutrina católica em linguagem retórica e
hiperbólica, o romantismo de Chateaubriand seguiu os passos do
tradicionalismo e leu literalmente as palavras bíblicas – para ele o
primeiro casal era uma realidade histórica e a sua culpa original, um ato
concreto de desobediência.
No cap. II, do livro 3, ele descreve a “Queda do Homem” do
seguinte modo:
Outra verdade estampada na Escritura, que nos maravilha: o homem
agonizante por ter se empeçonhado com o fruto da vida; o homem
perdido, por ter saboreado do fruto da ciência, por ter sabido conhecer
a aurora do romantismo.” LIMA, A. A. Prefácio à edição brasileira. In:
CHATEAUBRIAND, R. O gênio do cristianismo. São Paulo: Jackson Editores,
[s.d.]. p.15.
em demasia o bem e o mal, por ter cansado de ser semelhante ao
menino do evangelho. Suponha-se qualquer outra proibição de Deus,
relativa a qualquer outra tendência da alma: como compreender-se a
sabedoria e a profundeza dos decretos do Altíssimo? Seria isso um
capricho indigno da divindade, e nenhuma moralidade resultaria da
inobediência de Adão. Toda história do mundo, pelo contrário, dimana
da lei imposta ao nosso primeiro Pai. Ao seu alcance pôs Deus a
ciência que não podia refusar-lha, dando ao homem inteligência e
liberdade; prediz-lhe, porém, que se quiser saber demais, o
conhecimento das coisas será morto para ele e sua descendência
(CHATEAUBRIAND, [s.d.], p.72).
Essa passagem merece ser examinada em seus termos
fundamentais. O homem foi criado para permanecer inocente, isento de
malícia, com aquele conhecimento que aprazara a Deus revelar-lhe. Ao
querer saber demais, o homem entrou na história e todos os seus
atributos – trabalho, sofrimento, avidez. Por isso, a frase central é a que
diz: “Toda história do mundo, pelo contrário, dimana da lei imposta ao
nosso primeiro pai.”
Os verbos e adjetivos empregados por Chateaubriand são muito
fortes e elucidativos – o homem eterno agonizou pelo veneno da vida
temporal, perdeu-se pelo saber adquirido e entrou na história, ou melhor,
deu início à história, e toda a história do mundo traz essa marca, a marca
do pecado. Mas, não se trata de um pecado comum; trata-se de um
pecado primordial para a história do homem, aquele pelo qual o homem,
ao contrariar a Deus, quis a ele se igualar e, por meio do qual, rompeu a
aliança e se opôs ao projeto divino, saiu da eternidade e entrou na
história.
Por isso, o saber racional é estigmatizado, porque dele dimana
a história e dele pode se originar a perdição definitiva, porque por meio
dele a humanidade perdeu a inocência das crianças e, velha, caminha
para a morte. Assim, nos diz Chateaubriand, a
[...] inocência, santa ignorância, não é, per si, o mais inefável dos
mistérios? Exulta a infância, porque tudo ignora; amisera-se a velhice,
porque tudo sabe: felizmente para ela, principiam os mistérios da
morte, onde fenecem os da vida ([s.d.] p.124).
Meio século mais tarde, Juan Donoso-Cortés, ao abordar as
mesmas questões, seguiu o mesmo trajeto de Chateaubriand,
aprofundando algumas delas e adotando um posicionamento idêntico
quanto ao dogma, entretanto variando um pouco a interpretação.
Em seu texto de 1847, “Bosquejos Históricos”, Donoso-Cortés
estabeleceu que Adão foi criado para ter o saber, dominar o
conhecimento junto a Deus. Por isso, dele recebeu a ciência e o seu
instrumento universal – a linguagem.
Narrando, conforme o Gênesis, o momento em que Deus
entregou a Adão a tarefa de nomear todas as coisas, ele entende que aí
[…] se mostran dos cosas importantísimas: la primera, que el hombre
aprendió la lenguaje de Dios; y la segunda, que aprendió de Dios a
penetrar en la esencia de las cosas, lo cual quiere decir que recibió a
un tiempo mismo la revelación de las ciencias y del instrumento
universal de todas las ciencias (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.123).
Entretanto, ao homem deveria estar sempre vedado o
conhecimento absoluto de todos os mistérios. Penetrar em todos os
segredos seria
[...] penetrar en la naturaleza íntima del principio de las cosas; siendo
el principio de las cosas y Dios una cosa misma, seria penetrar en la
esencia de Dios; penetrar en la esencia de Dios es ser Dios hasta
cierto punto, y el hombre no puede ser Dios en cierta manera y hasta
cierto punto sino cuando haya sido deificado en su vida intra mundana
(DONOSO-CORTÉS, 1946, p.124).
Em outros termos, Deus compartilhou com o homem o saber,
mas até o limite que lhe parecia seguro, e resguardou da fraqueza
humana o conhecimento dos segredos maiores, para evitar que o
homem se destruísse. Portanto, segundo a interpretação donosiana, o
homem não caiu por pretender ser igual a Deus, mas porque pretendeu
adquirir o saber sem a aliança com o criador, ou seja,
[…] quiso aprender la ciencia del bien y del mal fuera de Dios y
desunió el entendimiento divino y humano; y así como la unión
primitiva había sido causa de la ciencia infusa de Adán, la desunión lo
fue de suya absoluta ignorancia./ Ni podría ser de otra manera, si se
atiende que Dios es la verdad absoluta ya que no hay verdad fuera de
Dios ... Si fuera posible que la verdad existiera fuera de Dios, Dios no
existiría (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.139).
Essa é a razão fundamental que explica porque, na Idade
Média, a Igreja Católica firmou a doutrina de ser a Teologia o centro e
fonte do saber, e a Filosofia, sua auxiliar.
O resultado da ambição adâmica se desdobrou em duas
vertentes – tanto o homem perdeu a imortalidade e constituiu uma
sociedade desordenada, quanto passou a produzir um saber que, por ser
falso, uma vez que adquirido fora de Deus, cada vez mais o direcionava
para o desastre final.
No “Ensayo sobre el catolicismo, el liberalismo y el comunismo”,
dando maior abrangência à sua teoria, Donoso-Cortés entende que o
pecado de Adão provocou uma desordem também física que “[...]
consistió en la enfermedad y la muerte... luego, la desorden física y
moral, la ignorancia y la flaqueza de la voluntad, por una parte, y la
enfermedad y la muerte, por otra, son una cosa misma” (1946, p.422).
Mas, essa desordem não teria se restringido apenas ao âmbito
da vida humana, mas se estendido por sobre toda a natureza. Por isso,
[…] la tierra se cuajó de espinas y de abrojos, y si secaran sus plantas,
y envejecieran sus árboles, y si agostaran sus hierbas […] y se restó
de bosques oscuros […] y si coronó de montes bravos, y hubo una
zona tórrida y otra frigidísima, y fue consumida por el fuego, y
abrasada por la escarcha, y se levantaran en todos sus horizontes
torbellinos impetuosos y sus ámbitos fueran encendidos con estrondos
de los huracanes (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.423 – 424).
A teoria católica, exposta e interpretada por Donoso-Cortés
(1946) e Chateaubriand (s.d.), comporta um elemento trágico – se a
punição divina ao pecado original foi impedir que Adão e sua
descendência adquirissem o saber verdadeiro por vias racionais, quanto
mais o homem produzir filosofia e ciência, tanto mais elas serão falsas e
tanto mais levarão à perdição eterna.
Donoso-Cortés é bastante explícito ao elaborar essa teoria. Nos
“Bosquejos Históricos”, ao relatar os resultados do pecado original de
Adão, entende que
[…] cuando el hombre se rebeló contra Dios, desvanecido por el
orgullo... Dios en su justicia le quitó la sabiduría, y en su misericordia
le conservó la inteligencia... Por eso, se ve que toda la ciencia de los
orgullosos es error y vanidad y que la ignorancia de los humildes es la
verdadera ciencia (1946, p.130).
Essa passagem, mais uma vez nos reafirma o tradicional
magistério católico. De fato, essa tese não é uma elaboração sua, mas
remonta aos tempos apostólicos e se encontra, com certeza, nas
Epístolas de São Paulo. Em Coríntios I (1, 19 – 20 e 3, 18 – 20. In:
BÍBLIA sagrada, 1982) lemos que
[…] está escrito: destruirei a sabedoria dos sábios e rejeitarei a
inteligência dos inteligentes. Onde está o sábio? Onde está o homem
culto? Onde está o argumentador deste século?/Ninguém se iluda: se
alguém dentre vós se julga sábio aos olhos deste mundo, torne-se
louco para ser sábio; pois a sabedoria deste mundo é loucura diante
de Deus... O Senhor conhece o raciocínio dos sábios, sabe que eles
são vãos (BÍBLIA sagrada, 1992, p.2149 e 2151).
No Ensayo..., Donoso-Cortés, seguindo mais uma vez essa
linha tradicional, entende que a inteligência dos
[…] incrédulos por ser altísima y la de los creyentes humilde; la
primera, empero, nos es grande sino a la manera del abismo; mientras
que la segunda es santa, a la manera de un tabernáculo; en la primera
habita el error, la muerte; en tabernáculo con la verdad, la vida. Por
esta razón, para aquellas sociedades que abandonan el culto austero
de la verdad por la idolatría del ingenio, no hay esperanza ninguna. En
pos de los sofismas vienen las revoluciones, y en pos de los sofistas,
los verdugos (1946, p.348 – 349).
Donoso-Cortés vai mais além – a desunião entre os homens e
Deus acabou por revelar a própria fraqueza do entendimento humano
porque o saber válido para o homem era aquele adquirido na comunhão
com o Criador. Ao se separar de Deus e não podendo atingir a essência
das coisas, o homem acabou por produzir uma desunião no seu próprio
entendimento. Por isso, criou divisões arbitrárias na tentativa de chegar,
sem resultados ao conhecimento de todas as coisas. Assim, o pensador
espanhol nos diz que a
[…] ciencia política, la ciencia social, no existen, sino en la calidad de
clasificaciones arbitrarias del entendimiento humano. El hombre
distingue en su flaqueza, lo que esta unido en Dios con una unidad
simplicísima (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.349).
O Marquês de Valdegamas estava, em sua tese, retomando as
teses católicas que somente a teologia pode dar ao homem o verdadeiro
conhecimento, devendo as outras disciplinas, inclusive a filosofia, ficarem
sob sua tutela, e é lógico que assim fosse, uma vez que todas as outras
atividades intelectuais não podem, por causa dos limites impostos pela
sua fragmentação, dar à humanidade o conhecimento daquilo que
realmente merece ser conhecido pelo homem: Deus.
Chateaubriand não foi menos agudo em sua condenação ao
conhecimento racional. Para ele não pode existir meio termo: toda vez
que o homem procura o conhecimento racional, provoca a destruição e a
morte. Discorrendo sobre os avanços da astronomia, e a consolidação
do heliocentrismo, ele revela o seu verdadeiro pavor diante da ciência:
Quem presenciou os dias da revolução francesa, quem assentou que
à vaidade do saber se deve quase todas nossas desgraças, quase
acreditou que o homem esteve à beira de uma nova morte, por ter
erguido, segunda vez a mão à árvore da ciência... os séculos
sabedores prendem com os séculos destruidores (CHATEAUBRIAND,
[s.d.], p.94).
Mais adiante, comentando novamente sobre os avanços da
matemática e da astronomia, conclui, de maneira contundente que “[...]
as ideias irreligiosas conduzem necessariamente às ciências, e as
ciências conduzem necessariamente às ideias irreligiosas”
(CHATEAUBRIAND, op.cit., p.31).
Talvez seja permitido dizer que a busca do conhecimento
racional representa, no contexto da doutrina do cristianismo, em geral e
do catolicismo ultramontano, em particular, uma constante renovação do
Pecado Original.
Em 1947, Gustave Thibon, em um estudo introdutório a uma
seleção de textos de Chateaubriand, condensava sua compreensão
sobre o movimento histórico na seguinte frase: “Les masses humaines
oscillent d‟un totalitarisme à l‟autre; dejà elles ne chissent plus entre
l‟esclavage et la liberté, mais entre las diverses formes dun même
esclavage [...]” (THIBON, GUSTAVE S.N.T. p.31. Apud, MANOEL,
2004, p. 83)
Em seu escrito, Gustave Thibon trazia ao primeiro plano o
conceito católico sobre a qualidade do movimento histórico: a oscilação
pendular.
Páginas atrás foi dito que o projeto único de Deus é a salvação
da humanidade, e a salvação tem o significado de reunir aquilo que o
pecado original desuniu, religar a aliança rompida. Nesse sentido, o
movimento da história deve, necessariamente, para se consumar como
história da salvação, levar o homem ao reencontro do Absoluto e nele
dissolvê-lo.
Roberto Romano, sumariando e interpretando esse passo da
tradição romântica do catolicismo conservador, tendo como suporte os
escritos de Shelling, Novalis, e outros autores da mesma tendência,
entende que
[...] o afastamento máximo entre a criatura e o Criador, o instante em
que o homem se imagina Deus, é apenas um elo no processo do
Absoluto. Após o lapso, nesse ponto culminante, inicia-se o retorno em
direção à Divindade. Por isso, a história é uma epopéia composta no
espírito de Deus; as suas partes principais são duas: a primeira
descreve a saída da Humanidade de seu centro até o máximo
distanciamento, a segunda, o retorno. A primeira é, por assim dizer, a
Ilíada, a segunda, a Odisséia da história (1981, p.74-75).
Era exatamente dessa fonte que se alimentava, por exemplo,
um escritor brasileiro, Hamilton Nogueira, em 1931, quando pensava que
[...] a humanidade, depois de tangenciar a borda de todos os abismos,
depois de realizar a sua mais perigosa experiência no plano
puramente natural sente, por assim dizer, aquela clarividência
momentânea que se segue aos erros cometidos, e volta-se
conscientemente para as causas de suas desgraças, tentando
reconquistar a unidade perdida. Nos povos, mesmos naqueles que
mais se notabilizaram por uma radical concepção naturalista do
mundo, nota-se um movimento de receio. Após uma apostasia Cristã
temporária, ela (civilização ocidental) parece voltar aos princípios a
que renunciara, para retomar o luminoso roteiro da verdade e da vida
(1931, p.154 – 155).
No entanto, os diversos autores que abordam essa questão,
embora concordem que seriam basicamente dois os períodos históricos
– o da “Ilíada” e o da “Odisséia” – na verdade aprofundam mais o
entendimento sobre o problema e estabelecem que, de fato, seriam
várias e contínuas as oscilações do “pêndulo da história” antes da
dissolução no Absoluto.
Para João Camilo de Oliveira Torres, o movimento da história
[...] provoca uma ruptura com o que é essencial e importante. Aliás,
devemos considerar que, em geral e na maioria das vezes, estaremos
fugindo sempre, por força do impulso que move a história, daquela
situação que é normal. Se compararmos o movimento da história ao
de um pêndulo, vemos que, da mesma forma que ele está solicitado a
volver ao ponto central, que é o da lei, da ordem, do equilíbrio, mas
está fugindo dele em busca das duas posições extremadas em torno
das quais oscila, igualmente a história vai e vem, passando pelo ponto
da linha vertical, mas deixando-a de lado (1968, p.103).
As teses de João Camilo de Oliveira Torres se filiavam àquela
interpretação estabelecida por Donoso-Cortés, em “Bosquejos
Históricos”, quando, em 1847, entendia que após a queda, o homem se
transformara em um “[...] compuesto lamentable de absurdas
contradicciones; lleno de pequeñez y de grandeza [...] oscilando con
perpetua oscilación entre el bien y el mal, entre su Dios que le solicita y
el demonio que lo tienta (1946, p.140).
A teoria da oscilação pendular também irá sustentar as teses de
Bérgson, que emprega, porém, a metáfora das cores para ilustrar sua
teoria – a história humana oscilaria entre o vermelho e o amarelo, cores
que simbolizariam os extremos, sem se estabilizar no laranja, que
simbolizaria a ordem social, a estabilidade e a lei (Apud TORRES, 1968,
p.103).
As considerações e interpretações anteriormente feitas
demonstraram as vinculações que a doutrina católica faz entre a procura
do saber racional e o movimento da história. Ao conceituar a qualidade
do movimento histórico, a doutrina católica explicitou por inteiro essas
vinculações. A metáfora do movimento pendular é a figura com a qual se
pretendeu ilustrar, tanto essas vinculações, quanto o próprio movimento,
porque ela é a que melhor pode representar, poder-se-ia dizer, até
graficamente, a luta entre o Bem e o Mal, tese que em última instância
sustenta essa construção teórica.
Se é possível atribuir uma finalidade para a criação do homem,
essa finalidade seria a união eterna com o Criador, a perpétua gravitação
em torno do Supremo Bem. A doutrina católica, ao se fundamentar sobre
esses conceitos, necessariamente circunscreveu a história do homem
nos limites da teodicéia. Portanto, Deus criou o homem para realizar
aquela união referida e isso implica que o homem só se realiza
cabalmente na dissolução no Absoluto. Assim, mesmo que o homem
tenha caído na historicidade, a sua história deve revelar a inesgotável
bondade divina, expressa no seu desígnio de redimi-lo.
Entretanto, o homem nada mais é do que uma criatura
imperfeita a quem foi dada a capacidade de escolha. Em outras palavras,
a imperfeição humana fundamental
[...] consiste en la facultad que tiene de seguir el mal y de abrazar el
error; es decir, que la imperfección de la libertad humana consiste
cabalmente en aquella facultad de escoger, en que consiste, según la
opinión vulgar, su perfección absoluta (DONOSO-CORTÉS, 1946,
p.399).
Imperfeito, vaidoso e orgulhoso, o homem escolheu não
continuar a aliança com o Criador e saiu em busca do saber racional e
caiu na historicidade.
A queda não significou a morte do homem - ao contrário, a
sobrevivência após a queda é o próprio eixo de sustentação da doutrina.
Essa é uma questão central e delicada – a vida temporal, material,
significa que o homem “morreu” para a vida eterna e o seu oposto é o
centro mesmo do projeto católico, ou seja, a ressurreição para a vida
eterna deve corresponder à morte para a vida terrena. Entretanto, para o
catolicismo do século XIX, recuperando o projeto do cenobitismo
medieval, a morte para a vida terrena não significava apenas o
falecimento, mas uma recusa ao “século”, um afastamento em relação ao
mundo como forma de preparação para a pós-morte. A frase seguinte,
de Madre Felicité, Superiora Geral das Irmãs de São José de Chamberry
é uma síntese dessa doutrina: “Esforce-se para atrair Deus a si por uma
contínua morte da natureza; é morrendo para a vida de Adão que
vivemos para a vida de Jesus.” (Carta de Madre Felicitè à Madre Voiron,
[s.d.] apud, MANOEL, 1996, p.98).
Essa teoria teve duas implicações fundamentais: 1) a
sobrevivência física fora do paraíso gerou o seu oposto, a morte física,
isto é, para viver na temporalidade, o homem perdeu a eternidade. 2) a
aquisição do saber racional provocou a perda do saber revelado, mas
não da capacidade de raciocinar, porque “Misericordioso y justo, a un
tempo mismo, Dios niega a las inteligencias culpables la verdad, pero no
les niega la vida; las condena al error mas no a la muerte” ( DONOSO-
CORTÉS, 1946, p.348 – 349).
Terrível castigo o do homem – privado do conhecimento da
Verdade, dotado de uma inteligência fraca e de uma vontade defeituosa,
o ser humano teria a desventura de converter-se naquele composto de
absurdas contradições de que nos fala Donoso-Cortés, oscilando entre
extremos sem jamais fixar-se junto a Deus. Mais ainda, na mesma linha
de Chateaubriand, para quem ciência e ateísmo seriam sinônimos, o
pensador espanhol, apocalíptico, adverte: “La razón sigue el error
dondequiera que vaya, aunque sea al abismo más profundo... El error le
dará la muerte. Mas [...] que importa si es madre y muere a manos del
hijo?” (1946, p.414)
Essa, para a doutrina do catolicismo ultramontano, a tragédia
humana – longe de Deus e com sua inteligência obscurecida, o homem
perde o saber revelado, mas conserva sua capacidade racional, e com
ela cria teorias erradas, um “anti-saber”, causa da sua ruína e perdição
eterna, causa do “pêndulo da história”. A tragédia e a oscilação pendular
estarão, portanto, nos alicerces das relações sociais e políticas –
rompida a unidade com Deus, os homens também rompem os laços
entre si e entre eles e a unidade do Poder: a revolução e a democracia
se tornam seu fim inexorável.
Em outros termos, a ruptura da unidade com Deus leva à
ruptura de todas as relações, inclusive no plano filosófico e político,
gerando a tensão que está nas raízes de todos os totalitarismos.
Radicado nesse terreno é que H. Hargraves irá dizer que
[...] esse conceito errado que os poderes, espiritual e temporal, devem
ser separados, é a pedra angular do edifício de corruptelas... Mais do
que anti-evangélico, mais do que anti-cristão, é o regime do
separatismo espiritual e dos poderes, epílogo fatal das confusões
conceituais básicas do individualismo, que conduziram a sociedade
humana à miséria atual em que ela definha, na mais franca estatolatria
generalizada, quer se chame esta república imperialista, ditadura
liberal, ditadura fascista, ou ditadura proletária, bolchevismo ou
anarquismo. (1932, p.348).
Diante das considerações acima, pode-se sintetizar a filosofia
católica da história no seguinte: a queda foi o primeiro ato histórico; a
fraqueza da vontade humana, o motor da história; a oscilação pendular,
a qualidade desse movimento e a perpétua desunião, a sua
conseqüência.
Assim posta a questão, fica-se diante de uma desconcertante
constatação: a tragédia humana é maior do que a própria teoria indica,
porque se o oscilar do pêndulo é perpétuo, e o é porque a imperfeição
humana o impele, então não há saída para a humanidade. Estranha
teoria essa, marcada pela escatologia e pela teleologia. Embora anuncie
o progresso do homem rumo à perfeição, encerra-o em um eterno
oscilar, uma eterna busca de extremos, um eterno recomeço de jornada
que em nada fica a dever a Sísifo.
Entretanto, se deslocarmos o eixo da visão, da teoria e suas
abstrações e o centrarmos na Igreja e seus procedimentos, se desfaz o
mistério.
Em Donoso-Cortés, Chateaubriand, Löwith, Marrou, Oliveira
Torres e em todo o pensamento cristão e particularmente no catolicismo
ultramontano, a história é a história da perdição, mas também, e
necessariamente, é a história soteriológica, a história da salvação. Por
isso, os atos humanos, sejam os particulares e os públicos, refletem,
necessariamente, a queda do homem, mas devem refletir acima de tudo
a ação da graça divina através da Igreja Católica, para a salvação da
humanidade que se perdeu.
Donoso-Cortés, para explicitar o significado dessa teoria no
processo histórico dividiu o movimento geral da história da humanidade
em dois períodos, o Antigo, antes de Cristo, e o Moderno, depois de
Cristo. Essa divisão foi também adotada por diversos outros autores
católicos dentre os quais podemos citar, no Brasil, Johnatas Serrano no
seu livro, “Epítome da História Universal” (1937).
O primeiro período da história compreenderia desde a Criação
até a vinda de Jesus, passando pela Queda, atravessando o Dilúvio e o
período profético. Esse período, ele o denominou, História Antiga. O
segundo compreenderia desde a vinda de Jesus e a instituição da Igreja,
até o século XIX. Por ser marcado pela presença de Jesus, do
Evangelho e da Igreja Católica Romana, esse período recebeu o nome
de História Moderna (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.155 ss).
Naquele período a que Donoso-Cortés denominou de História
Moderna, a teoria do pêndulo adquire seus contornos definitivos e,
segundo seus critérios, a sua plena justificativa.
Na História Antiga, os homens intuíam a existência de Deus.
Mas, dada a sua ignorância, exprimiam sua crença ou intuição de
maneira errada e desastrosa por meio do politeísmo. Entretanto, na
História Moderna, os homens têm já conhecimento da religião e da
Verdade revelada, contam com o eficiente magistério católico para
conduzi-los no caminho da salvação. Assim, não haveria mais razão
alguma para andarem extraviados, a não ser o seu orgulho e a vontade
defeituosa que os perde.
Estabelece-se aí o movimento do pêndulo – com o Pecado
Original, o homem afastou-se de Deus e passou a gravitar ao redor do
Mal através do paganismo e politeísmo. Com a vinda de Cristo, os
homens novamente foram atraídos pelo Bem, e orientados pela Igreja
passaram novamente a gravitar ao redor de Deus. Esse período teria
encontrado seu ponto culminante e de maior estabilidade durante a
Idade Média, mais exatamente, entre os séculos VIII e XIV.
Em 04 de junho de 1849, Montalembert, em carta dirigida a
Donoso-Cortés, reafirmando essa tese perguntava qual “[...] época
señalaremos como la en que haya existido civilización, o sea, la sociedad
católica por excelencia? Para mi es indudable que esta época fue la
Edad Media, en el período desde lo siglo VIII, hasta el XIV” (Carta de
Montalembert a Donoso-Cortés (04/06/1849). In: DONOSO-CORTÉS,
1946, T.II, p.211).
No mesmo dia 04 de junho de 1849, Donoso-Cortés respondeu
a Montalembert, confirmando e reafirmando a tese de que “El siglo de
oro de la civilización católica, es decir, el siglo en que la razón y la
voluntad del hombre se conformaron con el elemento católico, fue, sin
duda ninguna, el siglo XIV” (Carta de Montalembert a Donoso-Cortés
(04/06/1849) In: DONOSO-CORTÉS, 1946, T.II, p.212)
Essa era uma época áurea, quando a Igreja subordinava a
sociedade em todas as suas esferas “[...] a la libre y espontánea voluntad
de los Príncipes y de los pueblos, los cuales creyeron convenirles sujetar
sus diferencias al fallo de los Pontífices romanos, o de los Santos
Concilios.” (DONOSO-CORTÉS, J. Las reformas de Pio IX. (1946, p. 90).
Com sua decadência, veio a era da Revolução, aquela em que o
homem julgou a doutrina católica uma inútil superstição e se propôs, ele
mesmo, criar um novo saber, uma nova moral, uma nova política.
A verdade é que a doutrina do catolicismo ultramontano não
aceitava que o conjunto do pensamento moderno fosse um
desdobramento necessário do movimento geral do processo histórico.
Para a hierarquia da Igreja e o laicato intelectualizado, a ciência, a
filosofia e a política moderna eram apenas e tão somente uma atitude de
rebeldia do homem moderno, que não mais aceitava o espírito dos
dogmas católicos. Dividindo a humanidade em dois campos opostos – os
que estão a favor ou contra Deus – a Igreja atribuía aos primeiros a
responsabilidade de eliminar os erros do pensamento moderno,
produzidos pelos segundos. Mergulhando por completo nessa
concepção, Álvaro Vieira Pinto iria pontificar, em 1930:
As condições do mundo moderno, a divisão que dia a dia se torna
mais nítida entre os que ficam com Deus e os que põem contra ele,
exigem da consciência em flor do moço um esforço precoce no sentido
de uma definição que lhe permita uma posição no campo de egoísmos
inferiores ou de desprendimentos sublimes, em que se cindiram os
homens.” (1930, p.63)
O resultado dessas atitudes do moderno pensamento
racionalista teria se manifestado na incredulidade, nas revoluções
filosóficas e científicas, na Reforma Protestante, na Revolução Francesa,
no ciclo revolucionário de 1830 a 1848, na democracia e nas doutrinas
de esquerda. Por isso, no contexto da doutrina, o século XIX era
considerado o ponto de maior afastamento do pêndulo da história em
relação a Deus, o século de "ferro da civilização", segundo a
interpretação de Donoso-Cortés, já citado.
Conforme o catolicismo do século XIX, naquele “século de ferro
da civilização” foram condensadas todas as proposições e práticas da
filosofia e política atéias produzidas pelo mundo moderno e expressas
pelas doutrinas liberais, consideradas a síntese de quatro séculos de
racionalismo, lançando o homem nas mais torpes abominações, das
quais o ateísmo e o falso saber seriam as piores. Por isso, o papa Pio IX
condenou em bloco, tanto o século XIX, quanto o conjunto da
modernidade, lançando o anátema por sobre todos quantos dissessem
que “[...] o romano Pontífice pode e deve conciliar-se e transigir com o
progresso, com o Liberalismo e com a civilização moderna” (IGREJA
CATÓLICA, Papa Pio IX, 1947. 80ª Proposição).
O resultado, de resto já bastante discutido, é que se o homem
perdeu o saber revelado, por culpa de seu orgulho e vontade defeituosa,
a sociedade em seu conjunto perdeu a civilização e retornou à barbárie,
e a barbárie tinha já um sinônimo: a tirania. Se por civilização se deve
entender o predomínio católico em todas as esferas, incluindo-se aí o
próprio Estado, então a Europa do século XIX se encontraria de fato em
plena barbárie, uma vez que o mundo burguês moderno rompera com
todos os laços da feudalidade e sacramentara o individualismo e, como
conseqüência, as tiranias. Conforme os autores católicos examinados, a
Europa, afastada até o extremo limite da oscilação pendular, estava
reduzida ao caos, subjugada pela tirania da Revolução Francesa, do
jacobinismo, das revoluções de 1830 a 1848, do Império de Napoleão III,
a partir de 1851.
A figura com que Donoso-Cortés sintetiza a “crise do mundo
moderno” no século XIX é bastante reveladora: “[...] cuando el
termómetro religioso está subiendo, el termómetro de la represión está
bajo, y cuando el termómetro religioso está bajo, el termómetro político,
la represión está alto.” (DONOSO-CORTÉS, 1946 p.78).
MANOEL, Ivan A. Origins of traditional catholic: a test of Iinterpretation.
DIALOGUS. Ribeirão Preto, v.6, n.2, 2010, p.XXXXXX
ABSTRACT: Using as object the Catholic Apostolic Roman Church, this
present article interprets the catholic reaction in the XIX century, to
modern thought, from theoretical as Donoso-Cortés, analises the Catholic
conservatism based on yours traditionalists fundaments, whose bases
are rooted in Jewish religious traditions.
KEYWORDS: Catholic Church; Conservatism; modern thought.
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DOSSIÊ/SPECIAL
“PATRIMONIO CULTURAL/ CULTURAL PATRIMONY”
PAISAGENS CULTURAIS: DO CAFÉ À CANA
Nainôra Maria Barbosa de FREITAS*
Alcione de Albuquerque MÁS**
Wlaumir Doniseti de SOUZA***
Henrique Telles VICHNEWSKI****
Realizou-se a entrevista, ora denominada de Paisagens culturais: do
café à cana com o Professor Dr Leonardo Barci Castriota, no dia 19 de
outubro de 2010, no Hotel Canadá – Ribeirão Preto – SP. A entrevista
faz parte da XIV Semana de Geografia e História do Centro Universitário
Barão de Mauá que, pelo segundo ano consecutivo, discutiu a questão
do patrimônio.
1) Prof. Castriota, qual seria a melhor definição, para o senhor, de
paisagem cultural?
Leonardo Barci Castriota: Bom, tem uma definição de um técnico
da Unesco, que diz que as paisagens culturais são trabalho, são simples,
mas eu acho que ela é muito efetiva, que é o trabalho combinado o
homem da natureza, acho que essa é a definição melhor, assim.
2) Quando pensamos no Brasil, como no caso específico de São Paulo,
como o Sr. vê essa combinação?
* Professora do CEUBM. Doutora, Mestra e Graduada em História pela FDSS –
UNESP – Franca.
** Estudante do Curso de História do CEUBM.
*** Professor do CEUBM. Doutor em Sociologia pela FCL – UNESP – Araraquara
e Mestre em História pela FDSS – UNESP – Franca. Graduado em Filosofia e
Pedagogia. Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Metodologia da
Oralidade (NEPMO).
**** Professor do CEUBM. Mestre em História pela UNICAMP. Graduado em
Arquitetura e Urbanismo.
Leonardo Barci Castriota: Olha, esse termo, na verdade, ele
na minha perspectiva, ele veio trazer uma nova, um novo horizonte para
o campo do patrimônio. Porque durante muito tempo, o patrimônio
trabalhou com uma dicotomia natureza-cultura. Se pegarmos a
convenção mundial da Unesco de 1972, ela vai trabalhar de forma
separada esses dois campos e, inclusive, nessa época, havia uma
resistência muito grande dos países europeus de aceitar o patrimônio
natural. Até uma curiosidade foi o Brasil que, naquele momento, pelo
Renato Soero que era o presidente do IPHAN, que fez essa negociação
que deu a convenção mundial. Mas, o que foi acontecendo é que se
percebeu que, na verdade, você não consegue, pensando no trabalho do
homem sobre a Terra, você não consegue dissociar a natureza de
cultura, dessa forma. Então, o patrimônio cultural sempre vai ter uma
impregnação humana e vice-versa, o patrimônio cultural vai ser feito
sobre uma base natural. Então, foi percebendo essas dificuldades que a
Unesco foi desenvolvendo estudos, até que vinte anos depois, em 1992,
eles chegaram a esse conceito, a essa nova categoria, então isso abriu
uma perspectiva nova, não só sobre as paisagens culturais tradicionais,
mas, inclusive, sobre as próprias categorias já existentes. Então, nesse
sentido, as cidades, por exemplo, elas podem ser pensadas como
paisagens culturais. Embora, haja setores da própria Unesco que tenham
resistência a isso. A gente tem, você falou de São Paulo, a gente tem
recentemente a candidatura de Buenos Aires, se candidatou como
patrimônio mundial usando a perspectiva da paisagem cultural e foi mal
sucedida, a Unesco não aceitou. Porque dentro da Unesco, ainda tem
resistência a se considerar que cidade, embora, a gente saiba que essa
é a definição mais corrente. O Rio de Janeiro agora está tentando e o
Rio de Janeiro de uma forma mais estratégica que Buenos Aires, ela
restringiu sua candidatura, isso é uma coisa curiosa, ela restringiu
aquelas áreas que foram, que eram áreas naturais ou que foram feitas
pelo homem, então, no caso eles se concentraram no Jardim xxx, na
Floresta da Tijuca e no Aterro do Flamengo que são consideradas
paisagens culturais do Rio de Janeiro. Então, eu estava falando isso tudo
para dizer o seguinte, que a gente tem um conceito mais amplo de
paisagem cultural e temos o conceito que a Unesco tem trabalhado e
que ainda é um pouco restrito e que deixa de fora cidades, por exemplo,
e São Paulo teria muita dificuldade de se colocar como paisagem cultural
para a Unesco, embora, a gente saiba até pelo conceito da geografia que
uma cidade é uma paisagem cultural.
3) Para o Iphan há uma diferença entre esse trabalho e a Unesco, ou
não?
Leonardo Barci Castriota: Olha, o Iphan o que tem tentado
fazer, na verdade, no caso da candidatura do Rio é compatibilizar a sua
proposta com a proposta da Unesco porque, estrategicamente, eles
querem transformar o Rio em patrimônio mundial. Agora, o Iphan tem
uma concepção mais ampliada do que da Unesco. A gente vê os
trabalhos que eles tem feito, então eles caminham mais para em direção
de um conceito geográfico de paisagem cultural do que do conceito da
Unesco. Tanto que a proposta inicial do Iphan era muito mais ampla, ela
pegava a questão do samba, ela pegava o subúrbio, ela pegava o Rio de
Janeiro das praias, ela pegava toda essa diversidade que para o Iphan
compõe a paisagem cultural. Agora, para o efeito da candidatura ser bem
sucedida, eles estão limitando agora à Floresta da Tijuca e ao Aterro do
Flamengo.
4) Bem, nesse contexto, então, dos grandes teóricos de pensamento,
qual a proposta do senhor para uma definição de paisagem cultural?
Leonardo Barci Castriota: Olha, eu acho que o centro, o cerne
da definição de paisagem cultural é a idéia de trabalho combinado da
natureza e do homem. Acho que essa, apesar de ser uma definição
muito simples, ela consegue capturar essa riqueza dessa implicação
desses dois campos. Acho que a riqueza do conceito é esse e, por isso,
eu acho que não pode ser um conceito excludente, não pode se limitar
como muitas vezes faz a Unesco, apenas a paisagens de caráter
absolutamente rural, eu acho que se a gente pegar uma cidade, a gente
vai entender isso, vai ver isso nela isso também, a candidatura de
Buenos Aires, por exemplo, uma das restrições que eles colocaram foi
que o elemento natural estaria muito pouco presente, não é verdade a
candidatura foi feita com a coordenação do Ramon Gutierrez e eles
foram do natural, quer dizer da ocupação das barrancas do rio, da
pampa, até o traçado da cidade, até o patrimônio imaterial das
celebrações do tango, a literatura que marcou, a literatura de xxx que
marcou toda aquela paisagem de Buenos Aires, que é uma coisa única e
representativa para o mundo inteiro e, no entanto, a Unesco ainda tem
talvez uma perspectiva eurocêntrica, eles ainda tem essa dificuldade de
reconhecer no urbano, principalmente, no urbano heterogêneo, como é o
nosso latinoamericano, com caráter de paisagem. Vocês vejam que as
cidades que são protegidas como paisagem cultural são aquelas cidades
mais homogêneas e rurais, de origem rural que plantadas numa
paisagem normalmente ligada à agricultura.
5) Professor, Ribeirão Preto está pedindo a chancela de paisagem
cultural do Café pelo IPHAN, é um projeto grande que tem trabalhado
com a metodologia do IPHAN, e buscando primeiro identificar os marcos
edificados, identificar as festas, as celebrações por meio de todo um
trabalho em cinco localidades que foram escolhidas dentro da cidade de
Ribeirão Preto. São bairros que estão associados à formação urbana da
própria cidade. O que o senhor poderia colocar a respeito desta questão
de cidades estarem buscando no Brasil essa chancela de paisagem
cultural?
Leonardo Barci Castriota: Olha, acho isso muito inovador e
acho muito oportuno porque, na verdade, o que nós estamos fazendo,
principalmente, aqui na América Latina, a gente fez um encontro agora
sobre paisagem cultural enquanto Iberoamericano, em Belo Horizonte,
em agosto, e nós percebemos que teve muita contribuição européia e
latinoamericana, e que nós, latinoamericanos, estamos contribuindo em
nível mundial para expandir esse conceito, então essa iniciativa de pedir
chancela de paisagem cultural a localidades dentro das cidades ligadas
ai, eu acho muito interessante, a uma cadeia produtiva natural agrícola
que é o caso do Café, é muito interessante e muito importante, porque
eu acho que por essa ligação do ciclo de produção vocês vão conseguir
mapear toda essa questão do cultivo e do preparo, todas essas coisas
que estão ligadas nesse ciclo do Café e que vão se rebater no espaço ,
que vão se rebater nas práticas, que vão se rebater no patrimônio
imaterial, então eu acho que a potência do conceito de paisagem
cultural fica muito claro em trabalhos desta natureza.
6) Eu gostaria que o senhor falasse um pouco para nós, diante da nossa
realidade instrumental, quais seriam as etapas e procedimentos que o
senhor considera possíveis para identificação e caracterização sócio-
espacial de bairros históricos das cidades, principalmente, das cidades
do interior do Brasil e do nosso caso aqui do Estado de São Paulo.
Leonardo Barci Castriota: Olha, na verdade, a gente tem já no
Brasil algumas experiências de inventários, que tem trazido contribuições
importantes porque o inventario é um mecanismo tradicional, mas ele era
considerado simplesmente uma listagem de bens excepcionais como
uma operação propedêutica ao tombamento, hoje a gente sabe que não,
a gente sabe que o inventário em si, ele já tem uma função de proteção e
pode ser associado a outros instrumentos, como registros ou chancela
da paisagem. O que eu acho que a gente tem avançado é que nós
passamos daquele inventário que se limitava a nomear
excepcionalidades, principalmente, de caráter histórico e estético, para
um tipo de investigação, necessariamente, interdisciplinar, o inventário
necessariamente tem que ser interdisciplinar, onde a gente consegue
entender com esse mecanismo que é um instrumento de leitura
fortíssimo a gente consegue entender as relações sócio- espaciais, para,
por exemplo, o planejamento urbano o inventario pode ser um
instrumento de grande auxílio. Quando eu fui diretor de patrimônio da
cidade de Belo Horizonte a gente trabalhou numa equipe multidisciplinar
exatamente com o inventário como instrumento de conhecimento das
regiões e a nossa idéia era utilizá-lo no planejamento, por exemplo, nos
desenhos de bairro, um inventário ele vai captar coisas que o
planejamento tradicional não capta, por exemplo, toda uma dinâmica
cultural de uma região, nós trabalhamos num bairro de Belo Horizonte, o
bairro da Lagoinha, e que tinha numa das ruas principais um comercio
muito importante tradicional de moveis usados e antiguidades que era
ligado a uma tradição de artífices que tinha nesse bairro, quando nós
mapeamos isso, esses dados que nós tivemos ajudou o município, por
exemplo, a não transformar aquela rua num corredor de trânsito, porque
todos os outros dados que eles tinham indicavam que aquela rua tinha
que ser um corredor de trânsito, mas nós chegamos com dados culturais,
que sem um inventário nós, provavelmente, não teríamos, então eu acho
que o primeiro passo é um inventário muito bem feito, muito atrelado,
multidisciplinar. Outra coisa importante nessa metodologia é a questão
da participação da comunidade, acho que isso é fundamental, porque
apesar, quando a gente trabalha de forma multidisciplinar, a gente já está
ampliando a visão, eu acho que a visão do usuário é absolutamente
importante, ela é exatamente porque é com ela que você vai identificar
as chamadas referências culturais que são marcos muito importantes
para a paisagem cultural, então eu acho que você tem esse caminho,
quer dizer, fazer um inventariamento muito bem feito, muito detalhado.
7) Prof., a trajetória acadêmica do senhor permite que o senhor possa
colocar pra nós, alguma coisa a respeito de restauro, quais linhas o
senhor considera hoje que estão configuradas no Brasil, e como o
senhor colocaria essa intervencionista ativa da máxima interferência o
pseudo-restauro da originalidade, conservador, tradicional, e do falso
histórico, ou existem posturas conceituais, éticas, ou outras
recomendações internacionais que o senhor considera mais pertinentes?
Leonardo Barci Castriota: Olha, a questão do restauro é uma
questão que nós temos que discutir com urgência no Brasil, a professora
Beatriz Curi, da USP tem escrito alguns artigos muito interessantes,
inclusive, o último livro dela é um alerta nesse sentido, porque no Brasil
nós temos, infelizmente, nós temos ficado longe da discussão
internacional, por um lado nós temos uma postura do IPHAN, uma
postura predominante, que se por um lado ela conseguiu preservar muita
coisa, de outro ela também não fez com que a discussão avançasse
muito, porque eu acho que até de forma defensiva se refugiou numa
postura quase eminética, se você vê por exemplo a ação de conservação
dos sítios históricos tradicionais, você vai ver que você tem pouco
avanço nesse sentido, por outro lado, a gente tem uma outra postura,
que é pior ainda, porque a do IPHAN pelo menos ela é aceitável e a
gente poderia dizer defensiva, mas ela consegue preservar, mas a gente
tem hoje uma tendência a não considerar a realidade do próprio edifício
nas intervenções, o edifício é tomado muitas vezes apenas como uma
fachada, varrendo tudo dentro dele, a gente tem tido intervenções,
principalmente, de grandes arquitetos que até alguns anos atrás,
arquitetos modernistas que eles não costumavam intervir no patrimônio,
hoje nós temos intervenções desastrosas, por exemplo, me permite citar
Paulo Mendes da Rocha, nosso grande arquiteto, mas infelizmente um
grande destruidor do patrimônio. Em Belo horizonte, a gente teve uma
grande intervenção absolutamente equivocada do governo do Estado
sobre as Secretarias da Praça da Liberdade, ali nós temos um conjunto
de secretarias do século XIX que foram todas transformadas em centros
culturais, todas, cada uma de um Banco, e se tomou liberdades internas
nessas secretarias que eu nunca vi se fazer isso com uma obra
monumental, por exemplo, a Secretaria da educação que foi projeto de
intervenção do Paulo Mendes da Rocha, ele simplesmente destrói
grande parte do prédio original , para vocês terem uma idéia até o
volume externo é alterado com a posição de uma caixa vermelha que
sai sobre o telhado. Então toda aquela postura de humildade que o
restaurador deve ter, ela não está presente nessas intervenções, porque
na verdade com a condição do restaurador, é como diz uma professora
espanhola, me falta o nome, mas uma especialista em restauro, ela
chama de humilde condição, porque é exatamente um trabalho de
hermenêutica você tem que entender o que é o edifício o que ele está
falando, e de que maneira que dentro das possibilidades daquele edifício
eu consigo trazer o pronúncio do presente respeitando aquilo que ele
tem de essencialidade, então eu acho que essa deve ser a postura,
respeitando, inclusive, a própria possibilidade que o edifício te oferece ou
não, como há edifícios que não se serve a certas coisas, então não
adianta forçar. No caso desse Centro Cultural de Belo Horizonte, umas
das secretarias que eles quiseram transformar em sede da orquestra
sinfônica eu era presidente a OAB na época, quando eles nos
procuraram eu olhei e fiz uma rápida análise e dissemos que este edifício
não se presta a isso, ele não comporta isso, pois fizeram um concurso
público chegaram a uma solução e quando foram fazer análise técnica,
viram que de fato não comportava a não ser que destruísse o prédio
inteiro, então infelizmente eu acho que essa é uma questão é muito
importante que se coloque, é preciso que a gente discuta isso no Brasil
com urgência, porque nós temos que discutir o planejamento urbano com
patrimônio, paisagem cultural com patrimônio, mas nós temos discutido
pouco os restauros que se fazem aqui no Brasil.
8) Considerando que hoje no Brasil, quando se pensa em patrimônio, se
pensa muito em patrimônio edificado, como o senhor vê hoje esse
avanço de trabalhar o conceito de patrimônio mais abrangente como o
patrimônio cultural?
Leonardo Barci Castriota: Olha, eu acho também esse passo
muito importante, a gente tem que pensar que o Brasil, nesse sentido, a
gente, nós somos de certa forma pioneiros, se a gente pensar no Mário
de Andrade, que lá atrás nos anos 30 já tinha uma concepção de
patrimônio que foi proposta na criação do IPHAN que abrangia isso tudo,
ele usava a categoria de arte, mas sobre a categoria de arte ele
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Origens do tradicionalismo católico

  • 1. CENTRO UNIVERSITÁRIO “BARÃO DE MAUÁ” Departamentos de Geografia, História e Pedagogia DIALOGUS revista das graduações em licenciatura em Geografia, História e Pedagogia ISSN 1808-4656 Ribeirão Preto v.6 n.2 2010 p.1-199
  • 2. DIALOGUS é uma publicação semestral dos cursos de Geografia, História e Pedagogia mantidos pelo Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto, SP. Solicita-se permuta. As opiniões emitidas são de responsabilidade dos autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desde que citada a fonte. EXPEDIENTE Reitora Profª. Me. Maria Célia Pressinatto Pró-Reitoras de Ensino Profª. Drª. Dulce Maria Pamplona Guimarães e Profª. Drª. Joyce Maria Worschech Gabrielli Diretores Sr. José Favaro Júnior Sr. Guilherme Pincerno Favaro Sra. Neusa Pincerno Teixeira Srª. Elizabeth M. Cristina Pincerno Favaro e Silva Sr. Carlos César Palma Spinelli Sr. Marco Aurélio Palma Spinelli Diretoria Executiva Sr. José Antonio P.Capito Departamento Didático Pedagógico Profa. Esp. Dulce Aparecida Trindade do Val Prof. Ms. Geraldo Alencar Ribeiro Profa. Esp. Sara Maria Campos Soriani Coordenadora das Graduações em Geografia e História Profa. Ms. Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa Coordenador da Graduação em Pedagogia Prof. Ms. Cicero Barbosa do Nascimento Comissão Editorial Prof. Ms. Cícero Barbosa do Nascimento Prof. Dr. Humberto Perinelli Neto Profa. Ms. Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa Prof. Dr. Paulo Eduardo V. P. Lopes Conselho Editorial Andréa Coelho Lastória, profª Drª Antônio Aparecido de Souza, prof. Ms. Antônio Carlos Lopes Petean, prof. Ms. Beatriz Ribeiro Soares, profª Drª Charlei Aparecido da Silva, prof. Dr. Dulce Maria Pamplona Guimarães, profª. Drª. Edvaldo Cesar Moretti, prof. Dr. Fábio Augusto Pacano, prof. Ms. Fábio Fernandes Villela, prof. Dr. Francisco Sergio Bernardes Ladeira, prof. Dr. Ivan Aparecido Manoel, prof. Dr. José William Vesentini, prof. Dr. Aparecida Turolo Garcia, profª Drª José Luís Vieira de Almeida, prof. Dr. Lélio Luiz de Oliveira, prof. Dr. Marcos Antonio Gomes Silvestre, prof. Ms. Maria Lúcia Lamounier, profª Drª Nainora Maria Barbosa de Freitas, profª Drª Pedro Paulo Funari, prof. Dr. Renato Leite Marcondes, prof. Dr. Robson Mendonça Pereira, prof. Dr. Ronildo Alves dos Santos, prof. Dr. Sedeval Nardoque, prof. Dr. Silvio Reinod Costa, prof. Dr. Taciana Mirna Sambrano, profª Drª Vera Lúcia Salazar Pessoa, profª Drª FICHA CATALOGRÁFICA DIALOGUS (Departamentos de Geografia, História e Pedagogia – Centro Universitário “Barão de Mauá”) Ribeirão Preto, SP – Brasil, v.6, n.2, jul/dez 2010. Semestral 16,0 X 21,0. 199p. 2010, 6-2 ISSN 1808-4656 1. Educação. 2. História. 3.Geografia. I. Centro Universitário Barão de Mauá. II. Departamentos de História, Geografia e Pedagogia. CAPA: “ , autoria: Ana Carla Vannucchi
  • 3. PREFÁCIO Reitoria do Centro Universitário Barão de Mauá
  • 4. Apresentação do segundo número do sexto volume A apresentação deste número da DIALOGUS teve como principio a consulta ao dicionário, na ânsia de melhor saber sobre o sentido de dois termos que compõem a expressão produção acadêmica:  Produção: ato, processo ou efeito de produzir; criação, elaboração, fabricação, fabricação, geração, realização.  Acadêmica: substantivo masculino; filósofo da escola de Platão (relativo a diálogos); A surpresa diante do dicionário foi gratificante. A grosso modo, tal consulta referenda a necessidade de pensarmos a produção acadêmica como sendo o exercício constante e incompleto (ação) da busca de conhecimento, por meio do contato freqüente com o novo, o diferente e o desconhecido. É nos fiando neste tipo de entendimento da expressão produção acadêmica, que movemos diversos esforços para que houvesse o lançamento de mais um volume da DIALOGUS. Com este volume, buscamos ressaltar também que a ciência é poliglota, já que se faz entender por várias línguas: podemos acessá-la na forma de conferências, entrevistas, artigos e ensaios (todos aqui presente sob a forma de textos escritos), entre outros suportes. Ao ter este volume em mãos, que o leitor promova seus próprios diálogos e, quiçá, a partir deles sua produção acadêmica, no sentido mais latu possível. Comissão Editorial
  • 5. SUMÁRIO/SUMMARY CONFERÊNCIA/CONFERENCE ORIGENS DO TRADICIONALISMO CATÓLICO: UM ENSAIO DE INTERPRETAÇÃO Origins of traditional catholic: a test of Iinterpretation Ivan Aparecido MANOEL DOSSIÊ/SPECIAL “PATRIMONIO CULTURAL/CULTURAL PATRIMONY” PAISAGENS CULTURAIS: DO CAFÉ À CANA Cultural landscapes: from coffee to sugarcane Nainôra Maria Barbosa de FREITAS et al INSTITUCIONALIZAÇÃO DA MEMÓRIA: MONUMENTOS EM LUGARES PÚBLICOS DE RIBEIRÃO PRETO, SP Institutionalization of memory: monuments in public places of Ribeirão Preto, SP Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA Michelle Cartolano de Castro SILVA
  • 6. ESTRATÉGIAS DE PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA DO LUGAR: AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A INDUSTRIALIZAÇÃO, OS INTELECTUAIS E A ORGANIZAÇÃO DA CULTURA E OS DESAFIOS DA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO AGROINDUSTRIAL EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, SP Strategies to preserve the memory of place: public policies for industrialization, the intellectuals and the organization of culture and heritage preservation challenges of agro-industrial in São José do Rio Preto, SP, Brazil Fábio Fernandes VILLELA ARTIGOS/ARTICLES GEOGRAFIA/GEOGRAPHY ESPAÇO E FESTEJOS RELIGIOSOS: ASPECTOS DA ESPACIALIDADE DE COMUNIDADES RIBEIRINHAS DA AMAZÔNIA Space and Parties Religious: aspects of the spaces communities that live next to rive of the Amazonia Adriano Lopes SARAIVA Josué da Costa SILVA A GEOGRAFIA ESCOLAR E A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL To school geography in the formation teachers in first years of basic schooling Clézio SANTOS
  • 7. EDUCAÇÃO/EDUCATION PRÁXIS EDUCATIVA E LIBERTAÇÃO DO SER HUMANO: AS CEBs COMO MOVIMENTO SOCIAL Educative práxis and the human being liberation: the CEBs as social movement Claudemiro Godoy do NASCIMENTO GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA: IMPRESSÕES DOS PARTICIPANTES DO PROGRAMA PROGESTÃO Democratic management in schools: Impressions conveyed by participants of the program Pro management (Progestão) Iraíde Marques de Freitas BARREIRO Gabriella Garcia MOURA ENSAIO/ANALYSIS O LEITE DERRAMADO CUJA LEMBRANÇA NOS ESPELHA... MEMÓRIAS E SOCIABILIDADES NUM DISCURSO LITERÁRIO DO/SOBRE O BRASIL The leite derramado in remembrance of which mirrors ... memories and sociability in a literary discourse of / about Brazil Humberto PERINELLI NETO Índice de autores/Authors index Índice de Assuntos Subject Index Normas para publicação na revista DIALOGUS
  • 9. ORIGENS DO TRADICIONALISMO CATÓLICO: UM ENSAIO DE INTERPRETAÇÃO Ivan Aparecido MANOEL** RESUMO: Tendo como objeto a Igreja Católica Apostólica Romana, o presente artigo interpreta a reação católica, no século XIX, ao pensamento moderno, a partir de teóricos como Donoso-Cortés. Interpreta o conservadorismo católico tendo por base os seus fundamentos tradicionalistas, cujos alicerces podem enraízam-se nas tradições religiosas judaicas. PALAVRAS-CHAVE: Igreja Católica; conservadorismo; pensamento moderno. No debate acadêmico, e mesmo nas matérias jornalísticas, há constantemente o emprego de alguns adjetivos a qualificarem a Igreja Católica Romana, sendo os mais comumente empregados, tradicionalista, conservadora e reacionária, esquecendo-se que os mesmos adjetivos poderiam, com toda razão, serem empregados a todas outras igrejas e suas respectivas religiões, exatamente porque a tradição, solo de que germinam a conservação e a reação, é o fundamento de qualquer crença religiosa. Centrando a atenção na Igreja Católica Romana, objeto deste texto, constata-se que sua religião, o cristianismo, explicita seus fundamentos tradicionais, que o próprio Jesus se encarregava de  Texto apresentado sob a forma de conferências no II Encontro Nacional do GT “História das religiões e das religiosidades/ANPUH”, realizado em 2008 na FCHS/UNESP/Franca.. ** Livre Docente em Filosofia da História. Docente do Departamento de História da FCHS/UNESP/Franca.
  • 10. conservar, conforme se lê no Novo Testamento. Em Mateus (5, 17-18) se lê: “[...] não julgueis que vim abolir a lei ou os profetas. Não vim para abolir, mas sim para levá-los à perfeição. Pois em verdade vos digo: passará o céu e a terra, antes que desapareça um jota, um traço da lei” (BÍBLIA sagrada, 1982, p.1288). Confirmando a tradição, em Lucas (5, 37-39) encontra-se a ideia de que os elementos da cultura antiga são melhores do que a nova, uma vez que foram conservados e maturados: Também ninguém põe vinho novo em odres velhos; do contrário o vinho novo arrebentará os odres e entornar-se-á e perder-se-ão os odres. Mas, o vinho novo deve-se pôr em odres novos, e assim ambos se conservam. Demais, ninguém que bebeu do vinho velho quer já do novo, porque diz: „o vinho velho é melhor (BÍBLIA sagrada, 1982, p.1353). Estão postos, nessas duas passagens, os fundamentos tradicionalistas do cristianismo, que permaneceram ao longo dos séculos: ele se alicerçaria nas tradições religiosas judaicas, a Lei, e não se proporia mudá-las, mas conservá-las. As mudanças que haveriam de ocorrer não deveriam ser alterações, mas aperfeiçoamentos. Por isso o “vinho velho” seria melhor: porque teria descansado em odres que foram novos, e envelhecendo juntos se conservaram e se aperfeiçoaram. Convém ressaltar, entretanto, que as tradições que se encontram nas raízes do cristianismo não apenas judaicas. Aquela região onde floresceu a religião cristã era já muito rica em tradições religiosas, e a sua penetração na cultura judaica se explica tanto pelo fato de o povo judeu habitar uma zona de trânsito intenso de diversos povos, quanto pelo fato de terem sido dominados por povo mesopotâmicos, aliás, sua própria região de origem, e também por egípcios e romanos. Embora a tradição cristã, seja na vertente católica, seja nas vertentes ditas protestantes, sustente a idéia de que a crença em um Deus único teve origem com a Revelação Divina ao povo judeu, na
  • 11. verdade encontra-se a idéia monoteísta, a crença na imortalidade da alma e sua origem transcendental já entre os egípcios e o seu culto a Aton, e também no zoroastrismo, na antiga Pérsia. Conforme muitos estudiosos do problema, dentre os quais podemos citar Freud, a própria crença monoteísta entre os judeus foi assimilada por Moisés quando viveu em Madiã, ou Midiã, e transformada em crença de seu povo. Fundamentando-se em dezenas de historiadores, Freud diz que eles, historiadores: [...] concordam com a história bíblica em um ponto decisivo. Todos eles acham que as tribos judaicas [...] adquiriram uma nova religião num determinado ponto do tempo. Contudo, segundo eles isso não se realizou no Egito ou ao sopé de uma montanha na Península de Sinai, mas numa certa localidade conhecida como Meribá-Cades, um oásis... ao sul da Palestina, entre a saída oriental da Península de Sinai e a fronteira ocidental da Arábia. Aí, eles assumiram a adoração de um deus Iavé ou Javé, provavelmente da tribo árabe vizinhas dos midianitas (1975, p.49). Há, certamente, fundamentos nas suposições de Freud e dos demais historiadores porque Moisés, o introdutor do monoteísmo entre os judeus, era genro de Jetro, sacerdote de Madiã, onde seguramente Javé era adorado. Além do mais, durante a migração para Canaã, Jetro visitou Moisés para lhe aconselhar sobre como se comunicar com o seu povo e com Javé, conforme se lê no (ÊXODO 2, 16-22 e 18, 1-27, In: BÍBLIA sagrada, 1982, p.102 e 118 – 119). A tradição egípcia e persa da imortalidade da alma e sua origem transcendental, que se tornará fundamental na tradição judaico-cristã, pressupunham a transitoriedade do corpo. Os sumérios, na Mesopotâmia, tinham clara consciência, não só da transitoriedade individual, mas da própria transitoriedade de todas as coisas na longa duração. Essa consciência advinha do fato de terem sofrido os impactos da grande inundação que a tudo destruiu na região, cerca de 2000 AC, inundação que se incorporou à tradição judaico-cristã como o Dilúvio
  • 12. Universal. Por isso, na Epopéia de Gilgamesh, a transitoriedade era encarada como da natureza das coisas: Não há permanência. Construímos uma casa para se manter sempre, selamos um contrato para vigorar por todo o tempo? Irmãos dividem uma herança para guardá-la eternamente, o tempo da cheia dos rios perdura? [...] Desde os velhos tempos não há permanência (WHITROW, 1993, p.44). A transitoriedade da vida era conhecida, obviamente, mas a aceitação do fato era e é um problema para o Homem. Teria algum sentido viver, conhecer, reproduzir, produzir e, depois, simplesmente desaparecer deixando, quando muito, a lembrança na memória da posteridade? Embora os povos referidos tivessem a esperança na possibilidade de uma vida espiritual eterna, e nesse particular os egípcios são um ótimo exemplo, foi com Zaratustra (ou Zoroastro) que essa esperança ganhou status de doutrina organizada, e mais, introduziu a concepção escatológica da vida humana, que está no alicerce da doutrina judaico-cristã e será, mais tarde, fundamentos da filosofia da história catolicismo. Sua religião estabelecia que os homens que tivessem uma vida de adesão à verdade, no final receberiam a recompensa eterna, e os que tivessem aderido à mentira, receberiam o castigo eterno: Zaratustra declarava que, por ocasião da morte, Deus fazia um julgamento do homem, o que decidia o destino que lhe caberia quando o mundo finalmente atingisse o mesmo estado de perfeição em que o deixara as mãos do Criador. Finalmente, a glória imortal seria recompensa daqueles que aderissem à Verdade, ao passo que os adeptos da Mentira seriam condenados a uma longa era de trevas, comida podre e gritos de pesar. Essa doutrina de coisas finais, a primeira escatologia sistematizada na história da religião, influenciou profundamente o judaísmo, o cristianismo e o islã (WHITROW, 1993, p.48).
  • 13. Além das tradições propriamente religiosas que se imbricaram na construção da doutrina cristã, outras, sejam de raízes astronômicas, tais como o sistema de medição do tempo e datação de origem babilônica, fundamentais para o estabelecimento do calendário das festas cristãs, particularmente a definição da data da Páscoa, sejam de raízes rituais, tais como a ereção de imagens e procissões para o culto dos santos, ou a instituição do Ano Jubilar da Igreja, a cada 50 anos, tradições essas de origem romana, também vieram se juntar para a construção do cristianismo como a primeira grande e universal (católica) religião monoteísta. Certo é que poderíamos acrescentar outros dados mais a demonstrarem o entrelaçamento de diversas outras tradições a construírem o cristianismo. Entretanto, o já elencado é suficiente para explicitar que o cristianismo não é uma religião “pura”, isto é, uma religião que se tenha construído com elementos gerados em si mesmos, sem a presença e até contra elementos culturais de outras religiões. Ao contrário, a religião de Jesus, o Cristo, que se institucionalizou e predominou na Europa e, depois, se espalhou pelo mundo todo por meio da Igreja Católica Romana, é produto do entrecruzamento de diversos elementos culturais que ela preservou e dogmatizou, de tal modo que um católico, quando acompanha uma procissão, provavelmente não sabe que está a repetir um ritual romano como tantos outros, por exemplo, o incensar o altar durante cerimônias especiais. Aqui volto ao ponto inicial do texto: toda religião – e o cristianismo católico romano é o objeto imediato – é necessariamente tradicionalista, porque se constitui de elementos da tradição, e conservadora, porque deve preservá-los. Uma religião que não preservasse suas tradições deixaria de existir. Se assim é, como tudo indica que seja, cabe perguntar por que os adjetivos são usados pejorativamente em relação às religiões em geral, e a católica romana, em particular.
  • 14. A resposta a essa questão não é simples e exigiria a redação de um compêndio. Proponho, à vista dessa complexidade, um ensaio de resposta focado em dois pontos, o dogmatismo e a inserção política da Igreja Católica Romana. Rigorosamente falando, toda doutrina religiosa se alicerça em dogmas, em postulados considerados a expressão da Verdade, indiscutíveis, portanto, por exemplo, o dogma da Transubstanciação do pão e do vinho em corpo e sangue de Cristo na Eucaristia, conforme a tradição católica. Os dogmas são balizas orientadoras do fiel na passagem pela ponte que religa o profano ao sagrado, a criatura ao criador, o Homem a Deus e isso exigiu a elaboração de um conceito e uma filosofia da história. O problema se apresenta quando, em função de sua inserção política, a igreja transfere suas balizas dogmáticas do âmbito estritamente religioso para o conjunto da sociedade civil e da vida cotidiana. Há que se estabelecer, portanto, para a continuidade do raciocínio, um conceito de Igreja e demarcar alguns pontos de sua história para que se possa entender sua inserção, mais do que isso, seu predomínio no mundo ocidental por tantos séculos. Este texto entende a palavra Igreja em duas vertentes. Na vertente eminentemente eclesial, Igreja é uma Eklesia, uma reunião de fiéis, a “assembléia dos cristãos”, o “povo de Deus”, ou, nas palavras de Pe. D‟Ângelo, no sentido eclesial, estrito senso, é a “Igreja Pneumática, espiritual, invisível que chamamos de „Ecclesia Caritatis‟ e que o Vaticano II descreve como Comunidade de Fé, Esperança e Caridade” (D‟ÂNGELO, 1991, p.53). Na outra vertente, num sentido mais eclesiástico, a Igreja é uma instituição hierarquizada, ou, ainda seguindo o Pe. D‟Ângelo, [...] é a Igreja Institucional, social, visível, a chamada „Ecclesia Iuris‟, que a Lumen Gentium descreve como „Societas organis hierarchitis‟ „Ecclesia terrestris‟. É a Igreja que se manifesta externamente na profissão da mesma fé, na comunicação dos mesmos sacramentos, na
  • 15. participação do mesmo sacrifício e na observância das mesmas leis. Para que seja visível a todos, tem como Cabeça Suprema o Romano Pontífice que a guia a fim de obter o que ela pretende (1991, p.53). É essa Igreja Católica Romana que este texto está a discutir, a instituição que, iniciando-se da reunião de fiéis, institucionalizou-se e conquistou um lugar central na sociedade européia e em países como o Brasil, por exemplo, lugar de onde ditou normas de conduta pessoal, social e política. A história da Igreja Católica pode ser entendida como a história de uma instituição que passou da condição de religião perseguida à condição de religião oficial, ou como diz Marramao [...] durante os acontecimentos do século IV, a confissão cristã – ou, mais precisamente, a Igreja católica, isto é, aquela que havia adotado o credo niceno – havia, no intervalo de poucas décadas, passado da condição de organização apenas tolerada pelo Império, ainda contrastada ou combatida por setores do establishment social e político, à condição de instituição oficialmente admitida (por Constantino), para enfim (com a proclamação de 380, por Teodósio I) passar à condição de única religião do Estado, e conseqüentemente, de plena co-responsável pelo exercício do poder (1995, p.19). Esse entrelaçamento entre Igreja e Estado, que já principiou a trazer condições vantajosas para a instituição religiosa e assentou as bases da teoria da indissociabilidade entre os dois poderes (que na realidade se converteu na tese da supremacia do poder religioso), se reforçou sobremaneira no ano 800, com a coroação de Carlos Magno como Imperador do Santo Império Romano-Germânico. A coroação de Carlos Magno pelo Papa Leão III, trouxe para a Igreja toda a região central da Itália, que foi incorporada ao seu patrimônio como Estados Pontifícios. A partir de então, até 1849, a Igreja Católica, além e acima de ser uma instituição religiosa preeminente no mundo ocidental, também foi um Estado Nacional, com território próprio, sobre o qual o
  • 16. Papa exercia o poder de Chefe de Estado, ao lado de um Cardeal, que exercia o poder de Chefe de Governo. Na qualidade de soberano temporal, além de chefe espiritual, o Papa podia estabelecer como de fato estabeleceu acordos e alianças com outros soberanos, que propiciaram algumas resultantes favoráveis à Igreja, das quais três são fundamentais para o entendimento da problemática posta: 1. Desde Carlos Magno, presença marcante do clero na administração do Império, condição que permitiu à Igreja, dentre outras coisas, exercer controle e monopólio sobre a produção e distribuição do conhecimento; 2. Abertura de possibilidades para a Igreja construir um invejável patrimônio fundiário em quase toda a Europa, transformando-a em uma das maiores suseranas da Idade Média; 3. Atribuição ao Papa da função de árbitro universal, acima dos próprios reis e imperadores. Essas são algumas das razões que deram à Igreja na Idade Média uma posição singular. Além de instituição que oferecia serviços religiosos, além de Estado Nacional, além de exercer suserania sobre imensas regiões européias, além de atuar decisivamente na própria administração imperial, avocava a si o privilégio de monopolizar o saber. Em outros e mais simples termos, a Igreja se constituiu no centro de equilíbrio da Europa medieval, e moldou o mundo feudal à sua imagem e semelhança. Não por acaso, como se verá adiante, Montalembert e Donoso-Cortés, dois pensadores católicos do século XIX, em sua troca de correspondência, consideravam a Idade Média como a “Idade de Ouro” da humanidade. Aliás, iam mais longe em seu raciocínio. Ambos eram explícitos ao afirmarem que só existira verdadeiramente civilização durante o medievo, porque era uma civilização católica. O significado dessa passagem é bastante elucidativo. Não se tratava apenas de afirmar o valor salvífico que seria inerente à ética e
  • 17. doutrina católicas e sua eficácia na regulamentação das relações interpessoais e sociais. Tratava-se, na verdade, de subordinar todo o processo histórico, dos fins do Império Romano em diante, a um processo civilizatório católico, como se toda a intrincada rede de relações estabelecidas nas e entre as estruturas feudais tivesse fundamento apenas no ideário e na prática da Igreja. Era essa exatamente a leitura feita pelos autores conservadores católicos do século XIX. Donoso-Cortés, por exemplo, considerava acima de qualquer discussão a existência de um processo civilizatório católico. Conforme seu texto, somente a Igreja pode construir uma verdadeira civilização, primeiro porque foi ela quem levou os homens a superarem a barbárie do politeísmo pagão: “Esa Iglesia, puesta en el mundo sin fundamentos humanos, después de haberle sacado del abismo de la corrupción, le sacó de la noche de la barbarie” (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.364). Segundo, porque o catolicismo é uma teologia, a única verdadeira teologia que jamais houve, razão de ser da própria civilização: Esa nueva teología se llama el catolicismo. El catolicismo es un sistema de civilización completo; tan completo, que en su inmensidad lo abarca todo: la ciencia de Dios, la ciencia del ángel, la ciencia del universo, la ciencia del hombre” (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.357). Essa interpretação não freqüentava apenas o texto dos autores leigos, antes estava incrustada nos fundamentos da autocrompreensão católica, desde que Santo Agostinho estabelecera ser a função da Igreja transformar a civitas secular em civitas divina, de tal sorte que doutrinando em 1878, Leão XIII condensou-a nas seguintes palavras: “Bem claro e evidente é que [...] à causa da civilização faltam fundamentos sólidos se ela não se apóia nos princípios eternos da verdade e nas leis imutáveis do direito e da justiça” (IGREJA CATÓLICA. Papa Leão XIII, 1950, p.5).
  • 18. Portanto, quem mais, senão a Igreja Católica poderia arrogar o privilégio de ter construído a verdadeira civilização, perguntava Leão XIII. Afinal, não fora ela quem [...] pregando o Evangelho entre as nações, fez brilhar a luz da verdade entre os povos selvagens? Não foi a Igreja quem, fazendo desaparecer a calamidade da escravidão, revocou os homens à dignidade da sua nobilíssima natureza? Não foi ela quem, em toda parte civilizou nos seus costumes privados e públicos o gênero humano, reergueu-o da sua miséria e formou-o para um gênero de vida conforme a dignidade e as esperanças humanas? (IGREJA CATÓLICA. Papa Leão XIII, 1950, p.5). Dialogando com os filósofos não católicos, que acusavam a Igreja de ser retrógrada e contrária à própria civilização, Leão XIII respondia que se [...] os bem numerosos que acabamos de relembrar e que deveram seu nascimento ao ministério da Igreja e à sua salutar influência, são verdadeiramente obra e glória da civilização humana, muitíssimo longe está, pois, que a Igreja de Jesus Cristo abomine a civilização e a repila, visto ser a si, pelo contrário, que ela crê caber inteiramente a honra de haver sido nutriz, a mestra e a mãe (IGREJA CATÓLICA. Papa Leão XIII, 1950, p.6). Não seria diferente a posição de Rui Barbosa quando, em 1889, no jornal A Imprensa, escrevia que Só a têmpera que o Evangelho deu à sociedade ocidental, com efeito, a poderá livrar de um espantoso eclipse moral nesta luta com as forças hediondas da anarquia, transformada em ideal de uma escola, onde o desprezo da vida humana responde logicamente à negação de Deus. (BARBOSA, MANOEL, Ivan, 1997) Aqui se apresenta o centro do nosso problema. O catolicismo é uma religião que se fundamenta nas tradições judaico-cristãs e as quer
  • 19. conservar, do mesmo modo que pretende conservar um lugar central na sociedade, tendo no Papa a sua voz oficial a dialogar com todos os centros de poder, políticos, sociais, econômicos, científicos, tal como fora na baixa Antigüidade e no medievo. Mas, desde um ponto de vista estritamente político, para isso sempre se fez necessário, além de conservar a tradição, conservar também a sociedade. Profundas mudanças sociais, políticas e na esfera do conhecimento poderiam significar alterações de tal ordem que comprometessem as tradições religiosas. Os debates a que me referi no início fazem exatamente isso, circunscrevem a ação conservadora da Igreja Católica Romana apenas ao âmbito estritamente político, reduzindo a ação católica apenas ao simples exercício da conservação do poder, esquecendo-se que a questão é mais profunda, radicando nas próprias funções que a instituição se atribui. Como toda religião, o cristianismo católico se propõe ser a ponte de religação entre o profano e o sagrado. Por isso, repito, as balizas dos dogmas devem permanecer imutáveis para que o fiel não se perca, saia do reto caminho e desabe da ponte salvadora para o abismo da perdição eterna. Entretanto, como manter firmes as balizas dogmáticas, conservar as tradições em meio à fluidez e constante mutação do século, em meio ao turbilhão da história? Da baixa Antigüidade até meados do século XV a Igreja Católica Romana conseguiu se manter como voz hegemônica em razão de seu poder político na Europa, de tal sorte que as vozes discordantes eram silenciadas pelo anátema, ou o pronunciador do discurso herético era “relaxado ao braço secular”, isto é, executado. Por isso, durante esse largo lapso de tempo o conjunto doutrinário e dogmático católico se manteve quase inquestionado e íntegro. As coisas começaram a se transformar e a se transtornarem para a Igreja Católica Romana do Renascimento em diante, quando uma retomada do humanismo deslocou o eixo teocêntrico e colocou o Homem como objeto e objetivo do conhecimento e das ações humanas.
  • 20. Filósofos, matemáticos e outros pensadores como Bacon e Descartes, para ficar apenas nesses dois exemplos, embora sem descrerem – aliás, Lucien Febvre já discutiu essa questão lembrando que os pensadores renascentistas não dispunham sequer de vocabulário para expressarem descrença – essas pensadores, repito, ao deslocarem o eixo para um antropocentrismo, ainda que tímido de início, passaram a confiar também na Razão. Com o passar do tempo e com a consolidação dos métodos científicos e suas descobertas aliadas às invenções tecnológicas, o eixo se deslocou quase que completamente para o antropocentrismo e a Razão foi entronizada como demonstração da vitória da inteligência humana sobre a irracionalidade da crença religiosa, da imanência sobre a transcendência. O eixo não se deslocou completamente porque a Igreja Católica Romana, apesar de abalada pela revolução renascentista, pelas Reformas religiosas e, mais adiante, no final do século XVIII e início do XIX, pela Revolução Francesa, pelo liberalismo e socialismo, mais tarde, era ainda uma força a se ponderar na Europa e nas Américas, e usando dessa força o instituto católico reagiu. Não vou me alongar sobre o conjunto dessa reação, sendo mais proveitosa a leitura da farta bibliografia já produzida sobre ela.1 Concentro-me na sua proposta de repelir as mudanças profundas que ocorreram desde o século XVI até o século XIX, rejeição se configurou plenamente em sua concepção e sua filosofia da história. Evitar, ou procurar retardar o processo de mudanças, ou a mudança mesma, significa querer parar o movimento histórico – não existem mudanças fora da história; melhor dizendo, a história humana é o seu processo de mudanças. A situação se apresentava paradoxal porque a mesma instituição que se concebia como fautora da história humana, conforme 1 Há uma farta bibliografia já produzida sobre o assunto, podendo ser rastreada a partir da leitura de Augustin Wernet, Ivan A. Manoel e Artur César Isaia.
  • 21. se lê nas palavras pontifícias citadas páginas atrás, agora se posicionava contra as mudanças e, corolário, contra o movimento da história. A resposta ao paradoxo está na concepção da história, na filosofia da história construída pela doutrina católica. Já abordei o tema da filosofia católica da história em outra publicação (MANOEL, 2004), mas com outro propósito. Naquele texto procurei demonstrar que a concepção católica da história desenvolvida pelo catolicismo entre 1860 e 1960, a que a historiografia denomina Catolicismo Ultramontano, propiciou sua aproximação com os governos ditatoriais de direita na primeira metade do século XX. O propósito do presente texto é sugerir que o tradicionalismo católico e, corolário, o seu conservadorismo, produziu a concepção de história com as características com que se apresenta, um conceito pendular e retilinear do processo histórico da humanidade. É certo que Santo Agostinho, se contrapondo às concepções cíclicas de história desenvolvidas na Antigüidade Clássica, elaborou o conceito retilinear da história, estabelecendo a concepção de que a história não se repete, mas segue um trajeto em linha reta, desde suas origens no Pecado Original, até o seu fim no Juízo Final: Os filósofos pagãos introduziram ciclos de tempo em que as mesmas coisas seriam restauradas e repetidas pela ordem da natureza e afirmaram que esses rodopios de idades passadas e futuras prosseguirão incessantemente… A partir dessa zombaria, são incapazes de por em liberdade a alma imortal, mesmo depois que ela atingiu a sabedoria, e acreditam que ela está incessantemente caminhando para um bem – aventurança falsa e incessantemente retornando a uma miséria verdadeira […] É apenas através da sólida doutrina de um curso retilinear que podemos escapar de não sei quantos falsos ciclos descobertos por sábios falsos e enganosos [grifo nosso] (AGOSTINHO apud WHITROW, 1993, p.79). Porém, a concepção retilinear da história não se contrapõe a ideia central da doutrina cristã que é a ideia do retorno. Os filósofos gregos, tanto os estóicos, como o próprio Aristóteles, imaginavam que os
  • 22. ciclos históricos se repetiriam eternamente com as mesmas características, com as mesmas ideias, e até com os mesmos atores. Por isso, Nemésio iria dizer que: Sócrates e Platão e cada homem individual viverão novamente, com os mesmo amigos e os mesmos concidadãos. Passarão pelas mesmas experiências e as mesmas atividades. Cada cidade, cada aldeia e campo serão restaurados, tal como eram. E essa restauração do universo ocorre não uma só vez, mas reiteradamente – na verdade por toda a eternidade, sem nunca findar. Aqueles entre os deuses que não são sujeitos à destruição, tendo observado o curso de um período, conhecem, a partir disso, tudo que vai acontecer em todos os períodos subseqüentes. Pois jamais haverá qualquer coisa nova senão o que houve antes, sendo tudo repetido até os mínimos detalhes (WHITROW, 1993, p.58). Na Metereológica, Aristóteles, citado por Whitrow, diz que “[...] devemos dizer que as mesmas opiniões surgiram entre os homens em ciclos, não uma ou duas vezes, não algumas vezes, mas com uma freqüência infinita” (WHITROW, 1993, p.62). A ideia de retorno no cristianismo é outra, é a concepção de que a humanidade se afastou de Deus cometendo o pecado original e deve retornar a Deus atravessando as águas turbulentas pela ponte da Igreja Católica Romana obedecendo as suas balizas dogmáticas. Essa concepção, que expressa o conjunto da concepção cristã, se explicita plenamente na Parábola do Filho Pródigo, a humanidade que se afasta de Deus, se arrepende e retorna ao Pai. Nessa concepção não existem ciclos que se repetem indefinidamente, mas existe o movimento de um pêndulo, um afastamento e uma reaproximação. Resumindo a doutrina católica sobre história em uma exígua súmula didática encontramos o seguinte: Deus criou o homem para que permanecesse em eterno contato com sua autocomunicação. Entretanto, Adão e Eva, ao pretenderem adquirir um saber e uma consciência não previstos no plano divino e
  • 23. mesmo proibidos por ele, cometeram o Pecado Original, tendo como resultado a expulsão do Paraíso, ou seja, provocaram a Queda. Inicia-se aí a história humana. A análise detida dessa doutrina revela: 1. Os seus termos apontam para a ausência da história. No intervalo de tempo que teria existido entre a Criação e a Queda, o homem teria vivido em uma situação de imobilidade, na exata medida em que: a) essa situação deveria ser eterna, perpetuar-se idêntica a si mesma para todo sempre; isto é, uma situação sem tempo e sem movimento; b) estando livre da morte, o homem estava, na verdade, acima da finitude própria da vida material; isto é, o ser humano estava fora da história, ou melhor, a história não existia. A esse período hipotético, a doutrina denomina “estado supralapsário” isto é, um “estado” acima, fora, portanto, da história, que se define como o estado […] de justicia original. Es decir, la situación salvífica paradisíaca anterior al pecado original, del hombre „agraciado‟ sobrenaturalmente por la auto comunicación de Dios; caracterizado por la inmunidad respecto a la concupiscencia y substraído de la necesidad de morir (RAHNER, & VORGRIMLER, 1966, p.225). Nessa situação, o homem estava imune também às enfermidades, sofrimentos e paixões. Portanto, a conclusão de que o homem estava destinado à eternidade, estava isento de todas as manifestações próprias de sua humanidade, leva também e logicamente à conclusão de que esse homem era a-histórico. 1. Com o Pecado Original, o homem perdeu todas as prerrogativas da a-historicidade: tornou-se mortal. A mortalidade introduziu o ser humano na temporalidade e no movimento, isto é, na história:
  • 24. a) antes e acima de tudo porque se viu diante da necessidade de trabalhar para garantir a reprodução da vida. Esse talvez seja o significado mais profundo do mito do Pecado Original, abordado de uma perspectiva histórica. Expulso do Paraíso, o homem viu-se diante da necessidade de trabalhar, e o trabalho é o elemento fundamental da história humana.2 Mais ainda, quando se recorda que o tema do pecado original foi elaborado por um povo habitante de uma região semidesértica, compreende-se porque ele considerava o trabalho um castigo divino3·, em especial quando esse trabalho era acompanhado da maldição de só produzir abrolhos ; b) Além da necessidade de trabalhar, o homem se viu presa também da concupiscência e dos sofrimentos físicos e morais. Isso teria uma implicação profunda: além do sofrimento, a inserção na historicidade deixou- o vulnerável a apetites vorazes, sejam eles de bens e sexualidade, sejam de conhecimento racional, e essa vulnerabilidade iria trazer desdobramentos lastimáveis em todo transcurso da história. 2 Não vamos entrar aqui na discussão surrealista do tipo “se o homem não trabalhasse”, etc. etc. O fato histórico concreto é que o homem trabalha, e a dialética entre o trabalho em si e suas formas concretas de realização constitui o material por excelência do historiador, porque é dessas formas que derivam todas as demais relações que os homens estabelecem entre si e a própria natureza. 3 Esse mito é próprio de um povo habitante de uma região semidesértica, e foi transformado pelo catolicismo em explicação universal. É muito difícil imaginar um povo habitante de uma exuberante floresta tropical criando um mito semelhante ao judaico-cristão. Com esse mito, os judeus tentaram explicar porque eles e os demais povos da região encontravam tanta dificuldade em produzir sua subsistência.
  • 25. O ponto central dessa doutrina é a causa atribuída ao movimento histórico. Segundo ela, a história teve início com um ato humano negativo, porque foi um ato de orgulho e desobediência. Por isso, história é um processo negativo, considerado da perspectiva religiosa. Tanto assim, que o Gênesis estabelece que toda evolução que levou do pastoreio nômade a sedentarização e urbanização se deu pela linhagem amaldiçoada de Caim (Gênesis, 4, 17-24. In: Bíblia Sagrada, 1982). A esse respeito, afirmam os comentaristas da Bíblia de Jerusalém (1982) que Caim, nessa passagem [...] é o construtor da primeira cidade, o pai dos pastores, dos músicos, dos ferreiros e das meretrizes, que provêem às comodidades e aos prazeres da vida urbana. Esses progressos são atribuídos pelo autor javista à linhagem de Caim, o amaldiçoado; a mesma condenação da vida urbana será encontrada na narrativa javista da Torre de Babel (BÍBLIA DE JERUSALÉM, p.37, Nota Z.). Entretanto, toda maldição que provocou a história e nela sobrevive, não radica no ato em si da desobediência, porque Adão poderia ter desobedecido a qualquer outra restrição, mas radica no móvel do seu ato – a busca do conhecimento. Esse tema central e fundador de toda doutrina católica freqüenta as páginas dos filósofos e teóricos católicos e, embora a estrutura central seja a mesma, há pequenas diferenças na exposição do assunto. Por isso, foram selecionados dois autores do século XIX para servirem de suporte à nossa análise: René Chateaubriand e Juan Donoso-Cortés, este já citado páginas atrás. Chateaubriand publicou o seu livro, O gênio do cristianismo, em 1802, inaugurando o romantismo, segundo o estudo de Alceu de Amoroso Lima 4. Escritor romântico, pela forma e conteúdo, ele produziu 4 “Pois, realmente, se as raízes do romantismo remontam ao século XVIII, é de 1802 e do livro cuja reedição hoje se faz que data, por assim dizer, oficialmente,
  • 26. um texto hiperbólico e retórico, com o objetivo de fazer uma sólida apologia do cristianismo católico, em contraposição àquilo que considerava excessos do racionalismo científico e do discurso e da prática revolucionária dos finais do século XVIII e início do XIX. No Prefácio da edição francesa, de 1828, Chateaubriand apresentava as razões de seu livro dizendo: Ressurgia a França do caos revolucionário, quando o Gênio do Cristianismo apareceu; todos os elementos da sociedade estavam confusos: a mão que intentara ordená-los não conseguira ainda seu intento – despotismo e glória não tinham podido criar ordem./Foi, pois, entre as ruínas dos nossos templos que eu publiquei o Gênio do Cristianismo, chamando a esses templos as pompas do culto e os ministros dos altares. O Gênio do Cristianismo refletindo memórias do nosso passado, nossos antigos costumes, da glória dos monumentos de nossos reis, tinha o sabor da antiga monarquia: os franceses afizeram-se a ver com saudades o seu passado, preparou-se a estrada do futuro e reanimaram-se esperanças quase extintas (CHATEAUBRIAND, [s.d], p.9 -11). Compendiando a doutrina católica em linguagem retórica e hiperbólica, o romantismo de Chateaubriand seguiu os passos do tradicionalismo e leu literalmente as palavras bíblicas – para ele o primeiro casal era uma realidade histórica e a sua culpa original, um ato concreto de desobediência. No cap. II, do livro 3, ele descreve a “Queda do Homem” do seguinte modo: Outra verdade estampada na Escritura, que nos maravilha: o homem agonizante por ter se empeçonhado com o fruto da vida; o homem perdido, por ter saboreado do fruto da ciência, por ter sabido conhecer a aurora do romantismo.” LIMA, A. A. Prefácio à edição brasileira. In: CHATEAUBRIAND, R. O gênio do cristianismo. São Paulo: Jackson Editores, [s.d.]. p.15.
  • 27. em demasia o bem e o mal, por ter cansado de ser semelhante ao menino do evangelho. Suponha-se qualquer outra proibição de Deus, relativa a qualquer outra tendência da alma: como compreender-se a sabedoria e a profundeza dos decretos do Altíssimo? Seria isso um capricho indigno da divindade, e nenhuma moralidade resultaria da inobediência de Adão. Toda história do mundo, pelo contrário, dimana da lei imposta ao nosso primeiro Pai. Ao seu alcance pôs Deus a ciência que não podia refusar-lha, dando ao homem inteligência e liberdade; prediz-lhe, porém, que se quiser saber demais, o conhecimento das coisas será morto para ele e sua descendência (CHATEAUBRIAND, [s.d.], p.72). Essa passagem merece ser examinada em seus termos fundamentais. O homem foi criado para permanecer inocente, isento de malícia, com aquele conhecimento que aprazara a Deus revelar-lhe. Ao querer saber demais, o homem entrou na história e todos os seus atributos – trabalho, sofrimento, avidez. Por isso, a frase central é a que diz: “Toda história do mundo, pelo contrário, dimana da lei imposta ao nosso primeiro pai.” Os verbos e adjetivos empregados por Chateaubriand são muito fortes e elucidativos – o homem eterno agonizou pelo veneno da vida temporal, perdeu-se pelo saber adquirido e entrou na história, ou melhor, deu início à história, e toda a história do mundo traz essa marca, a marca do pecado. Mas, não se trata de um pecado comum; trata-se de um pecado primordial para a história do homem, aquele pelo qual o homem, ao contrariar a Deus, quis a ele se igualar e, por meio do qual, rompeu a aliança e se opôs ao projeto divino, saiu da eternidade e entrou na história. Por isso, o saber racional é estigmatizado, porque dele dimana a história e dele pode se originar a perdição definitiva, porque por meio dele a humanidade perdeu a inocência das crianças e, velha, caminha para a morte. Assim, nos diz Chateaubriand, a [...] inocência, santa ignorância, não é, per si, o mais inefável dos mistérios? Exulta a infância, porque tudo ignora; amisera-se a velhice,
  • 28. porque tudo sabe: felizmente para ela, principiam os mistérios da morte, onde fenecem os da vida ([s.d.] p.124). Meio século mais tarde, Juan Donoso-Cortés, ao abordar as mesmas questões, seguiu o mesmo trajeto de Chateaubriand, aprofundando algumas delas e adotando um posicionamento idêntico quanto ao dogma, entretanto variando um pouco a interpretação. Em seu texto de 1847, “Bosquejos Históricos”, Donoso-Cortés estabeleceu que Adão foi criado para ter o saber, dominar o conhecimento junto a Deus. Por isso, dele recebeu a ciência e o seu instrumento universal – a linguagem. Narrando, conforme o Gênesis, o momento em que Deus entregou a Adão a tarefa de nomear todas as coisas, ele entende que aí […] se mostran dos cosas importantísimas: la primera, que el hombre aprendió la lenguaje de Dios; y la segunda, que aprendió de Dios a penetrar en la esencia de las cosas, lo cual quiere decir que recibió a un tiempo mismo la revelación de las ciencias y del instrumento universal de todas las ciencias (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.123). Entretanto, ao homem deveria estar sempre vedado o conhecimento absoluto de todos os mistérios. Penetrar em todos os segredos seria [...] penetrar en la naturaleza íntima del principio de las cosas; siendo el principio de las cosas y Dios una cosa misma, seria penetrar en la esencia de Dios; penetrar en la esencia de Dios es ser Dios hasta cierto punto, y el hombre no puede ser Dios en cierta manera y hasta cierto punto sino cuando haya sido deificado en su vida intra mundana (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.124). Em outros termos, Deus compartilhou com o homem o saber, mas até o limite que lhe parecia seguro, e resguardou da fraqueza humana o conhecimento dos segredos maiores, para evitar que o homem se destruísse. Portanto, segundo a interpretação donosiana, o
  • 29. homem não caiu por pretender ser igual a Deus, mas porque pretendeu adquirir o saber sem a aliança com o criador, ou seja, […] quiso aprender la ciencia del bien y del mal fuera de Dios y desunió el entendimiento divino y humano; y así como la unión primitiva había sido causa de la ciencia infusa de Adán, la desunión lo fue de suya absoluta ignorancia./ Ni podría ser de otra manera, si se atiende que Dios es la verdad absoluta ya que no hay verdad fuera de Dios ... Si fuera posible que la verdad existiera fuera de Dios, Dios no existiría (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.139). Essa é a razão fundamental que explica porque, na Idade Média, a Igreja Católica firmou a doutrina de ser a Teologia o centro e fonte do saber, e a Filosofia, sua auxiliar. O resultado da ambição adâmica se desdobrou em duas vertentes – tanto o homem perdeu a imortalidade e constituiu uma sociedade desordenada, quanto passou a produzir um saber que, por ser falso, uma vez que adquirido fora de Deus, cada vez mais o direcionava para o desastre final. No “Ensayo sobre el catolicismo, el liberalismo y el comunismo”, dando maior abrangência à sua teoria, Donoso-Cortés entende que o pecado de Adão provocou uma desordem também física que “[...] consistió en la enfermedad y la muerte... luego, la desorden física y moral, la ignorancia y la flaqueza de la voluntad, por una parte, y la enfermedad y la muerte, por otra, son una cosa misma” (1946, p.422). Mas, essa desordem não teria se restringido apenas ao âmbito da vida humana, mas se estendido por sobre toda a natureza. Por isso, […] la tierra se cuajó de espinas y de abrojos, y si secaran sus plantas, y envejecieran sus árboles, y si agostaran sus hierbas […] y se restó de bosques oscuros […] y si coronó de montes bravos, y hubo una zona tórrida y otra frigidísima, y fue consumida por el fuego, y abrasada por la escarcha, y se levantaran en todos sus horizontes torbellinos impetuosos y sus ámbitos fueran encendidos con estrondos de los huracanes (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.423 – 424).
  • 30. A teoria católica, exposta e interpretada por Donoso-Cortés (1946) e Chateaubriand (s.d.), comporta um elemento trágico – se a punição divina ao pecado original foi impedir que Adão e sua descendência adquirissem o saber verdadeiro por vias racionais, quanto mais o homem produzir filosofia e ciência, tanto mais elas serão falsas e tanto mais levarão à perdição eterna. Donoso-Cortés é bastante explícito ao elaborar essa teoria. Nos “Bosquejos Históricos”, ao relatar os resultados do pecado original de Adão, entende que […] cuando el hombre se rebeló contra Dios, desvanecido por el orgullo... Dios en su justicia le quitó la sabiduría, y en su misericordia le conservó la inteligencia... Por eso, se ve que toda la ciencia de los orgullosos es error y vanidad y que la ignorancia de los humildes es la verdadera ciencia (1946, p.130). Essa passagem, mais uma vez nos reafirma o tradicional magistério católico. De fato, essa tese não é uma elaboração sua, mas remonta aos tempos apostólicos e se encontra, com certeza, nas Epístolas de São Paulo. Em Coríntios I (1, 19 – 20 e 3, 18 – 20. In: BÍBLIA sagrada, 1982) lemos que […] está escrito: destruirei a sabedoria dos sábios e rejeitarei a inteligência dos inteligentes. Onde está o sábio? Onde está o homem culto? Onde está o argumentador deste século?/Ninguém se iluda: se alguém dentre vós se julga sábio aos olhos deste mundo, torne-se louco para ser sábio; pois a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus... O Senhor conhece o raciocínio dos sábios, sabe que eles são vãos (BÍBLIA sagrada, 1992, p.2149 e 2151). No Ensayo..., Donoso-Cortés, seguindo mais uma vez essa linha tradicional, entende que a inteligência dos
  • 31. […] incrédulos por ser altísima y la de los creyentes humilde; la primera, empero, nos es grande sino a la manera del abismo; mientras que la segunda es santa, a la manera de un tabernáculo; en la primera habita el error, la muerte; en tabernáculo con la verdad, la vida. Por esta razón, para aquellas sociedades que abandonan el culto austero de la verdad por la idolatría del ingenio, no hay esperanza ninguna. En pos de los sofismas vienen las revoluciones, y en pos de los sofistas, los verdugos (1946, p.348 – 349). Donoso-Cortés vai mais além – a desunião entre os homens e Deus acabou por revelar a própria fraqueza do entendimento humano porque o saber válido para o homem era aquele adquirido na comunhão com o Criador. Ao se separar de Deus e não podendo atingir a essência das coisas, o homem acabou por produzir uma desunião no seu próprio entendimento. Por isso, criou divisões arbitrárias na tentativa de chegar, sem resultados ao conhecimento de todas as coisas. Assim, o pensador espanhol nos diz que a […] ciencia política, la ciencia social, no existen, sino en la calidad de clasificaciones arbitrarias del entendimiento humano. El hombre distingue en su flaqueza, lo que esta unido en Dios con una unidad simplicísima (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.349). O Marquês de Valdegamas estava, em sua tese, retomando as teses católicas que somente a teologia pode dar ao homem o verdadeiro conhecimento, devendo as outras disciplinas, inclusive a filosofia, ficarem sob sua tutela, e é lógico que assim fosse, uma vez que todas as outras atividades intelectuais não podem, por causa dos limites impostos pela sua fragmentação, dar à humanidade o conhecimento daquilo que realmente merece ser conhecido pelo homem: Deus. Chateaubriand não foi menos agudo em sua condenação ao conhecimento racional. Para ele não pode existir meio termo: toda vez que o homem procura o conhecimento racional, provoca a destruição e a morte. Discorrendo sobre os avanços da astronomia, e a consolidação do heliocentrismo, ele revela o seu verdadeiro pavor diante da ciência:
  • 32. Quem presenciou os dias da revolução francesa, quem assentou que à vaidade do saber se deve quase todas nossas desgraças, quase acreditou que o homem esteve à beira de uma nova morte, por ter erguido, segunda vez a mão à árvore da ciência... os séculos sabedores prendem com os séculos destruidores (CHATEAUBRIAND, [s.d.], p.94). Mais adiante, comentando novamente sobre os avanços da matemática e da astronomia, conclui, de maneira contundente que “[...] as ideias irreligiosas conduzem necessariamente às ciências, e as ciências conduzem necessariamente às ideias irreligiosas” (CHATEAUBRIAND, op.cit., p.31). Talvez seja permitido dizer que a busca do conhecimento racional representa, no contexto da doutrina do cristianismo, em geral e do catolicismo ultramontano, em particular, uma constante renovação do Pecado Original. Em 1947, Gustave Thibon, em um estudo introdutório a uma seleção de textos de Chateaubriand, condensava sua compreensão sobre o movimento histórico na seguinte frase: “Les masses humaines oscillent d‟un totalitarisme à l‟autre; dejà elles ne chissent plus entre l‟esclavage et la liberté, mais entre las diverses formes dun même esclavage [...]” (THIBON, GUSTAVE S.N.T. p.31. Apud, MANOEL, 2004, p. 83) Em seu escrito, Gustave Thibon trazia ao primeiro plano o conceito católico sobre a qualidade do movimento histórico: a oscilação pendular. Páginas atrás foi dito que o projeto único de Deus é a salvação da humanidade, e a salvação tem o significado de reunir aquilo que o pecado original desuniu, religar a aliança rompida. Nesse sentido, o movimento da história deve, necessariamente, para se consumar como história da salvação, levar o homem ao reencontro do Absoluto e nele dissolvê-lo.
  • 33. Roberto Romano, sumariando e interpretando esse passo da tradição romântica do catolicismo conservador, tendo como suporte os escritos de Shelling, Novalis, e outros autores da mesma tendência, entende que [...] o afastamento máximo entre a criatura e o Criador, o instante em que o homem se imagina Deus, é apenas um elo no processo do Absoluto. Após o lapso, nesse ponto culminante, inicia-se o retorno em direção à Divindade. Por isso, a história é uma epopéia composta no espírito de Deus; as suas partes principais são duas: a primeira descreve a saída da Humanidade de seu centro até o máximo distanciamento, a segunda, o retorno. A primeira é, por assim dizer, a Ilíada, a segunda, a Odisséia da história (1981, p.74-75). Era exatamente dessa fonte que se alimentava, por exemplo, um escritor brasileiro, Hamilton Nogueira, em 1931, quando pensava que [...] a humanidade, depois de tangenciar a borda de todos os abismos, depois de realizar a sua mais perigosa experiência no plano puramente natural sente, por assim dizer, aquela clarividência momentânea que se segue aos erros cometidos, e volta-se conscientemente para as causas de suas desgraças, tentando reconquistar a unidade perdida. Nos povos, mesmos naqueles que mais se notabilizaram por uma radical concepção naturalista do mundo, nota-se um movimento de receio. Após uma apostasia Cristã temporária, ela (civilização ocidental) parece voltar aos princípios a que renunciara, para retomar o luminoso roteiro da verdade e da vida (1931, p.154 – 155). No entanto, os diversos autores que abordam essa questão, embora concordem que seriam basicamente dois os períodos históricos – o da “Ilíada” e o da “Odisséia” – na verdade aprofundam mais o entendimento sobre o problema e estabelecem que, de fato, seriam várias e contínuas as oscilações do “pêndulo da história” antes da dissolução no Absoluto.
  • 34. Para João Camilo de Oliveira Torres, o movimento da história [...] provoca uma ruptura com o que é essencial e importante. Aliás, devemos considerar que, em geral e na maioria das vezes, estaremos fugindo sempre, por força do impulso que move a história, daquela situação que é normal. Se compararmos o movimento da história ao de um pêndulo, vemos que, da mesma forma que ele está solicitado a volver ao ponto central, que é o da lei, da ordem, do equilíbrio, mas está fugindo dele em busca das duas posições extremadas em torno das quais oscila, igualmente a história vai e vem, passando pelo ponto da linha vertical, mas deixando-a de lado (1968, p.103). As teses de João Camilo de Oliveira Torres se filiavam àquela interpretação estabelecida por Donoso-Cortés, em “Bosquejos Históricos”, quando, em 1847, entendia que após a queda, o homem se transformara em um “[...] compuesto lamentable de absurdas contradicciones; lleno de pequeñez y de grandeza [...] oscilando con perpetua oscilación entre el bien y el mal, entre su Dios que le solicita y el demonio que lo tienta (1946, p.140). A teoria da oscilação pendular também irá sustentar as teses de Bérgson, que emprega, porém, a metáfora das cores para ilustrar sua teoria – a história humana oscilaria entre o vermelho e o amarelo, cores que simbolizariam os extremos, sem se estabilizar no laranja, que simbolizaria a ordem social, a estabilidade e a lei (Apud TORRES, 1968, p.103). As considerações e interpretações anteriormente feitas demonstraram as vinculações que a doutrina católica faz entre a procura do saber racional e o movimento da história. Ao conceituar a qualidade do movimento histórico, a doutrina católica explicitou por inteiro essas vinculações. A metáfora do movimento pendular é a figura com a qual se pretendeu ilustrar, tanto essas vinculações, quanto o próprio movimento, porque ela é a que melhor pode representar, poder-se-ia dizer, até graficamente, a luta entre o Bem e o Mal, tese que em última instância sustenta essa construção teórica.
  • 35. Se é possível atribuir uma finalidade para a criação do homem, essa finalidade seria a união eterna com o Criador, a perpétua gravitação em torno do Supremo Bem. A doutrina católica, ao se fundamentar sobre esses conceitos, necessariamente circunscreveu a história do homem nos limites da teodicéia. Portanto, Deus criou o homem para realizar aquela união referida e isso implica que o homem só se realiza cabalmente na dissolução no Absoluto. Assim, mesmo que o homem tenha caído na historicidade, a sua história deve revelar a inesgotável bondade divina, expressa no seu desígnio de redimi-lo. Entretanto, o homem nada mais é do que uma criatura imperfeita a quem foi dada a capacidade de escolha. Em outras palavras, a imperfeição humana fundamental [...] consiste en la facultad que tiene de seguir el mal y de abrazar el error; es decir, que la imperfección de la libertad humana consiste cabalmente en aquella facultad de escoger, en que consiste, según la opinión vulgar, su perfección absoluta (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.399). Imperfeito, vaidoso e orgulhoso, o homem escolheu não continuar a aliança com o Criador e saiu em busca do saber racional e caiu na historicidade. A queda não significou a morte do homem - ao contrário, a sobrevivência após a queda é o próprio eixo de sustentação da doutrina. Essa é uma questão central e delicada – a vida temporal, material, significa que o homem “morreu” para a vida eterna e o seu oposto é o centro mesmo do projeto católico, ou seja, a ressurreição para a vida eterna deve corresponder à morte para a vida terrena. Entretanto, para o catolicismo do século XIX, recuperando o projeto do cenobitismo medieval, a morte para a vida terrena não significava apenas o falecimento, mas uma recusa ao “século”, um afastamento em relação ao mundo como forma de preparação para a pós-morte. A frase seguinte, de Madre Felicité, Superiora Geral das Irmãs de São José de Chamberry é uma síntese dessa doutrina: “Esforce-se para atrair Deus a si por uma
  • 36. contínua morte da natureza; é morrendo para a vida de Adão que vivemos para a vida de Jesus.” (Carta de Madre Felicitè à Madre Voiron, [s.d.] apud, MANOEL, 1996, p.98). Essa teoria teve duas implicações fundamentais: 1) a sobrevivência física fora do paraíso gerou o seu oposto, a morte física, isto é, para viver na temporalidade, o homem perdeu a eternidade. 2) a aquisição do saber racional provocou a perda do saber revelado, mas não da capacidade de raciocinar, porque “Misericordioso y justo, a un tempo mismo, Dios niega a las inteligencias culpables la verdad, pero no les niega la vida; las condena al error mas no a la muerte” ( DONOSO- CORTÉS, 1946, p.348 – 349). Terrível castigo o do homem – privado do conhecimento da Verdade, dotado de uma inteligência fraca e de uma vontade defeituosa, o ser humano teria a desventura de converter-se naquele composto de absurdas contradições de que nos fala Donoso-Cortés, oscilando entre extremos sem jamais fixar-se junto a Deus. Mais ainda, na mesma linha de Chateaubriand, para quem ciência e ateísmo seriam sinônimos, o pensador espanhol, apocalíptico, adverte: “La razón sigue el error dondequiera que vaya, aunque sea al abismo más profundo... El error le dará la muerte. Mas [...] que importa si es madre y muere a manos del hijo?” (1946, p.414) Essa, para a doutrina do catolicismo ultramontano, a tragédia humana – longe de Deus e com sua inteligência obscurecida, o homem perde o saber revelado, mas conserva sua capacidade racional, e com ela cria teorias erradas, um “anti-saber”, causa da sua ruína e perdição eterna, causa do “pêndulo da história”. A tragédia e a oscilação pendular estarão, portanto, nos alicerces das relações sociais e políticas – rompida a unidade com Deus, os homens também rompem os laços entre si e entre eles e a unidade do Poder: a revolução e a democracia se tornam seu fim inexorável. Em outros termos, a ruptura da unidade com Deus leva à ruptura de todas as relações, inclusive no plano filosófico e político,
  • 37. gerando a tensão que está nas raízes de todos os totalitarismos. Radicado nesse terreno é que H. Hargraves irá dizer que [...] esse conceito errado que os poderes, espiritual e temporal, devem ser separados, é a pedra angular do edifício de corruptelas... Mais do que anti-evangélico, mais do que anti-cristão, é o regime do separatismo espiritual e dos poderes, epílogo fatal das confusões conceituais básicas do individualismo, que conduziram a sociedade humana à miséria atual em que ela definha, na mais franca estatolatria generalizada, quer se chame esta república imperialista, ditadura liberal, ditadura fascista, ou ditadura proletária, bolchevismo ou anarquismo. (1932, p.348). Diante das considerações acima, pode-se sintetizar a filosofia católica da história no seguinte: a queda foi o primeiro ato histórico; a fraqueza da vontade humana, o motor da história; a oscilação pendular, a qualidade desse movimento e a perpétua desunião, a sua conseqüência. Assim posta a questão, fica-se diante de uma desconcertante constatação: a tragédia humana é maior do que a própria teoria indica, porque se o oscilar do pêndulo é perpétuo, e o é porque a imperfeição humana o impele, então não há saída para a humanidade. Estranha teoria essa, marcada pela escatologia e pela teleologia. Embora anuncie o progresso do homem rumo à perfeição, encerra-o em um eterno oscilar, uma eterna busca de extremos, um eterno recomeço de jornada que em nada fica a dever a Sísifo. Entretanto, se deslocarmos o eixo da visão, da teoria e suas abstrações e o centrarmos na Igreja e seus procedimentos, se desfaz o mistério. Em Donoso-Cortés, Chateaubriand, Löwith, Marrou, Oliveira Torres e em todo o pensamento cristão e particularmente no catolicismo ultramontano, a história é a história da perdição, mas também, e necessariamente, é a história soteriológica, a história da salvação. Por isso, os atos humanos, sejam os particulares e os públicos, refletem,
  • 38. necessariamente, a queda do homem, mas devem refletir acima de tudo a ação da graça divina através da Igreja Católica, para a salvação da humanidade que se perdeu. Donoso-Cortés, para explicitar o significado dessa teoria no processo histórico dividiu o movimento geral da história da humanidade em dois períodos, o Antigo, antes de Cristo, e o Moderno, depois de Cristo. Essa divisão foi também adotada por diversos outros autores católicos dentre os quais podemos citar, no Brasil, Johnatas Serrano no seu livro, “Epítome da História Universal” (1937). O primeiro período da história compreenderia desde a Criação até a vinda de Jesus, passando pela Queda, atravessando o Dilúvio e o período profético. Esse período, ele o denominou, História Antiga. O segundo compreenderia desde a vinda de Jesus e a instituição da Igreja, até o século XIX. Por ser marcado pela presença de Jesus, do Evangelho e da Igreja Católica Romana, esse período recebeu o nome de História Moderna (DONOSO-CORTÉS, 1946, p.155 ss). Naquele período a que Donoso-Cortés denominou de História Moderna, a teoria do pêndulo adquire seus contornos definitivos e, segundo seus critérios, a sua plena justificativa. Na História Antiga, os homens intuíam a existência de Deus. Mas, dada a sua ignorância, exprimiam sua crença ou intuição de maneira errada e desastrosa por meio do politeísmo. Entretanto, na História Moderna, os homens têm já conhecimento da religião e da Verdade revelada, contam com o eficiente magistério católico para conduzi-los no caminho da salvação. Assim, não haveria mais razão alguma para andarem extraviados, a não ser o seu orgulho e a vontade defeituosa que os perde. Estabelece-se aí o movimento do pêndulo – com o Pecado Original, o homem afastou-se de Deus e passou a gravitar ao redor do Mal através do paganismo e politeísmo. Com a vinda de Cristo, os homens novamente foram atraídos pelo Bem, e orientados pela Igreja passaram novamente a gravitar ao redor de Deus. Esse período teria
  • 39. encontrado seu ponto culminante e de maior estabilidade durante a Idade Média, mais exatamente, entre os séculos VIII e XIV. Em 04 de junho de 1849, Montalembert, em carta dirigida a Donoso-Cortés, reafirmando essa tese perguntava qual “[...] época señalaremos como la en que haya existido civilización, o sea, la sociedad católica por excelencia? Para mi es indudable que esta época fue la Edad Media, en el período desde lo siglo VIII, hasta el XIV” (Carta de Montalembert a Donoso-Cortés (04/06/1849). In: DONOSO-CORTÉS, 1946, T.II, p.211). No mesmo dia 04 de junho de 1849, Donoso-Cortés respondeu a Montalembert, confirmando e reafirmando a tese de que “El siglo de oro de la civilización católica, es decir, el siglo en que la razón y la voluntad del hombre se conformaron con el elemento católico, fue, sin duda ninguna, el siglo XIV” (Carta de Montalembert a Donoso-Cortés (04/06/1849) In: DONOSO-CORTÉS, 1946, T.II, p.212) Essa era uma época áurea, quando a Igreja subordinava a sociedade em todas as suas esferas “[...] a la libre y espontánea voluntad de los Príncipes y de los pueblos, los cuales creyeron convenirles sujetar sus diferencias al fallo de los Pontífices romanos, o de los Santos Concilios.” (DONOSO-CORTÉS, J. Las reformas de Pio IX. (1946, p. 90). Com sua decadência, veio a era da Revolução, aquela em que o homem julgou a doutrina católica uma inútil superstição e se propôs, ele mesmo, criar um novo saber, uma nova moral, uma nova política. A verdade é que a doutrina do catolicismo ultramontano não aceitava que o conjunto do pensamento moderno fosse um desdobramento necessário do movimento geral do processo histórico. Para a hierarquia da Igreja e o laicato intelectualizado, a ciência, a filosofia e a política moderna eram apenas e tão somente uma atitude de rebeldia do homem moderno, que não mais aceitava o espírito dos dogmas católicos. Dividindo a humanidade em dois campos opostos – os que estão a favor ou contra Deus – a Igreja atribuía aos primeiros a responsabilidade de eliminar os erros do pensamento moderno,
  • 40. produzidos pelos segundos. Mergulhando por completo nessa concepção, Álvaro Vieira Pinto iria pontificar, em 1930: As condições do mundo moderno, a divisão que dia a dia se torna mais nítida entre os que ficam com Deus e os que põem contra ele, exigem da consciência em flor do moço um esforço precoce no sentido de uma definição que lhe permita uma posição no campo de egoísmos inferiores ou de desprendimentos sublimes, em que se cindiram os homens.” (1930, p.63) O resultado dessas atitudes do moderno pensamento racionalista teria se manifestado na incredulidade, nas revoluções filosóficas e científicas, na Reforma Protestante, na Revolução Francesa, no ciclo revolucionário de 1830 a 1848, na democracia e nas doutrinas de esquerda. Por isso, no contexto da doutrina, o século XIX era considerado o ponto de maior afastamento do pêndulo da história em relação a Deus, o século de "ferro da civilização", segundo a interpretação de Donoso-Cortés, já citado. Conforme o catolicismo do século XIX, naquele “século de ferro da civilização” foram condensadas todas as proposições e práticas da filosofia e política atéias produzidas pelo mundo moderno e expressas pelas doutrinas liberais, consideradas a síntese de quatro séculos de racionalismo, lançando o homem nas mais torpes abominações, das quais o ateísmo e o falso saber seriam as piores. Por isso, o papa Pio IX condenou em bloco, tanto o século XIX, quanto o conjunto da modernidade, lançando o anátema por sobre todos quantos dissessem que “[...] o romano Pontífice pode e deve conciliar-se e transigir com o progresso, com o Liberalismo e com a civilização moderna” (IGREJA CATÓLICA, Papa Pio IX, 1947. 80ª Proposição). O resultado, de resto já bastante discutido, é que se o homem perdeu o saber revelado, por culpa de seu orgulho e vontade defeituosa, a sociedade em seu conjunto perdeu a civilização e retornou à barbárie, e a barbárie tinha já um sinônimo: a tirania. Se por civilização se deve entender o predomínio católico em todas as esferas, incluindo-se aí o
  • 41. próprio Estado, então a Europa do século XIX se encontraria de fato em plena barbárie, uma vez que o mundo burguês moderno rompera com todos os laços da feudalidade e sacramentara o individualismo e, como conseqüência, as tiranias. Conforme os autores católicos examinados, a Europa, afastada até o extremo limite da oscilação pendular, estava reduzida ao caos, subjugada pela tirania da Revolução Francesa, do jacobinismo, das revoluções de 1830 a 1848, do Império de Napoleão III, a partir de 1851. A figura com que Donoso-Cortés sintetiza a “crise do mundo moderno” no século XIX é bastante reveladora: “[...] cuando el termómetro religioso está subiendo, el termómetro de la represión está bajo, y cuando el termómetro religioso está bajo, el termómetro político, la represión está alto.” (DONOSO-CORTÉS, 1946 p.78). MANOEL, Ivan A. Origins of traditional catholic: a test of Iinterpretation. DIALOGUS. Ribeirão Preto, v.6, n.2, 2010, p.XXXXXX ABSTRACT: Using as object the Catholic Apostolic Roman Church, this present article interprets the catholic reaction in the XIX century, to modern thought, from theoretical as Donoso-Cortés, analises the Catholic conservatism based on yours traditionalists fundaments, whose bases are rooted in Jewish religious traditions. KEYWORDS: Catholic Church; Conservatism; modern thought. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: Livros, partes e capítulos de livros
  • 42. AGOSTINHO (Santo), Bispo de Hipona. A cidade de Deus (contra os pagãos). Petrópolis: Vozes, São Paulo: Federação Agostiniana Brasileira, 1990, 2 v. ANDRADE, Pe. Djalma R. O Paradoxo cristão: história e transcendência em Alceu de Amoroso Lima. São Paulo: Loyola, 1994. ARMSTRONG, Karen. Uma história de Deus. São Paulo: Cia das Letras, 1994. AUBERT, Roger. A Igreja na sociedade liberal e no mundo moderno. In, ROGIER, L.J. (diretor). Nova história da Igreja. Petrópolis: Vozes, 1975, v.5, t. I AZZI, Riolando. Ascensão ou decadência da Igreja? São Paulo: Edameris, 1962. BENDA, Julien. O pensamento vivo de Kant. São Paulo: Livraria Martins, 1952 BIGNOTTO, Newton. O círculo e a linha. In: NOVAIS, Adauto (org). Tempo e história. São Paulo: Cia das Letras/Secretaria Municipal da Cultura, 1992. CÂMARA, Jaime de Barros. Apontamentos de história eclesiástica. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1945. CHATEAUBRIAND, René. O gênio do cristianismo. São Paulo: W.M. Jackson Editores, s.d. COMTE, Auguste. Catecismo positivista. In: Comte, A. Seleção de textos. São Paulo: Abril Cultural, 1983. (Coleção Os Pensadores). CONDORCET, Nicolas A. O progresso do espírito humano. In: GARDINER, Patrick L. Teorias da História. Lisboa: Calouste- Gulbenkian, 1969. DEZINGER, Enrique. El magisterio de la Iglesia. Barcelona: Ed. Herder, 1963. D‟ÂNGELO, Pe. José Carlos. O ministério próprio e típico do leigo: sua função pública na Igreja e pela Igreja. 1991. Tese (Doutorado em Direito Canônico) - Pontificia Studiorum Universitas A S. Thoma Aq. In Urbe – Roma, 1991.
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  • 47. KOSER, Frei Dr. Constantino ofm. Avatares do evolucionismo da espécie humana. REB – Revista Eclesiástica Brasileira. Petrópolis: Vozes, v. XIX, fasc. 3, 09/1959, p. 638 KLOPPEMBURG, Frei Boaventura. Eoanthropus de Piltdown. REB – Revista Eclesiástica Brasileira. Petrópolis: Vozes, v. XIV, fasc., 2, 06/1954. LIMA VAZ, H.C. Cristianismo e mundo moderno (posição e evolução do problema). Paz & Terra. Rio de Janeiro, Paz & Terra, ano II, nº 6, 04/1968, passin. MANOEL, Ivan A Presença católica na educação brasileira (1859 – 1959. Didática. São Paulo, Unesp, nº 25, passin ___. D. Macedo Costa e a laicização do Estado: a Pastoral de 1890. História. São Paulo, Unesp, (número especial sobre a Proclamação da República), 1989. ___. No centenário da Rerum Novarum: a doutrina católica sobre o capitalismo. Revista da SBPH. Curitiba, SBPH, nº 7, 1992 passin ___. Donoso-Cortés e a anti-democracia católica no século XIX. História. São Paulo, Unesp, nº 11. ___. Igreja e laicismo educacional: as bases do conflito. Didática. São Paulo, Unesp, nº 12. ___. D. Antônio de Macedo Costa e Rui Barbosa: a Igreja Católica na ordem republicana brasileira. Pós-História (revista de Pós-Graduação em História). Assis, Unesp. V.5 passin 1997. ___. A Diocese de Assis e o seu primeiro Bispo, D. Antônio José dos Santos (1930-1956). Estudos de História (revista de Pós-Graduação em História). Franca, Unesp, 1999, passin MARTINS, Estevão de R. Atualidade e relevância da Teoria da História. Um debate contemporâneo. Revista da SBPH. São Paulo, SBPH, nº 01, 1983, passin. MEHELMANN, João osb. A criação de Adão e o transformismo. REB – Revista Eclesiástica Brasileira. Petrópolis, Vozes, v. 8, 1948. NOGUEIRA, Hamilton. Sinais animadores. A Ordem, Rio de Janeiro, Centro D. Vital, n. 19, 1931.
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  • 50. PAISAGENS CULTURAIS: DO CAFÉ À CANA Nainôra Maria Barbosa de FREITAS* Alcione de Albuquerque MÁS** Wlaumir Doniseti de SOUZA*** Henrique Telles VICHNEWSKI**** Realizou-se a entrevista, ora denominada de Paisagens culturais: do café à cana com o Professor Dr Leonardo Barci Castriota, no dia 19 de outubro de 2010, no Hotel Canadá – Ribeirão Preto – SP. A entrevista faz parte da XIV Semana de Geografia e História do Centro Universitário Barão de Mauá que, pelo segundo ano consecutivo, discutiu a questão do patrimônio. 1) Prof. Castriota, qual seria a melhor definição, para o senhor, de paisagem cultural? Leonardo Barci Castriota: Bom, tem uma definição de um técnico da Unesco, que diz que as paisagens culturais são trabalho, são simples, mas eu acho que ela é muito efetiva, que é o trabalho combinado o homem da natureza, acho que essa é a definição melhor, assim. 2) Quando pensamos no Brasil, como no caso específico de São Paulo, como o Sr. vê essa combinação? * Professora do CEUBM. Doutora, Mestra e Graduada em História pela FDSS – UNESP – Franca. ** Estudante do Curso de História do CEUBM. *** Professor do CEUBM. Doutor em Sociologia pela FCL – UNESP – Araraquara e Mestre em História pela FDSS – UNESP – Franca. Graduado em Filosofia e Pedagogia. Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Metodologia da Oralidade (NEPMO). **** Professor do CEUBM. Mestre em História pela UNICAMP. Graduado em Arquitetura e Urbanismo.
  • 51. Leonardo Barci Castriota: Olha, esse termo, na verdade, ele na minha perspectiva, ele veio trazer uma nova, um novo horizonte para o campo do patrimônio. Porque durante muito tempo, o patrimônio trabalhou com uma dicotomia natureza-cultura. Se pegarmos a convenção mundial da Unesco de 1972, ela vai trabalhar de forma separada esses dois campos e, inclusive, nessa época, havia uma resistência muito grande dos países europeus de aceitar o patrimônio natural. Até uma curiosidade foi o Brasil que, naquele momento, pelo Renato Soero que era o presidente do IPHAN, que fez essa negociação que deu a convenção mundial. Mas, o que foi acontecendo é que se percebeu que, na verdade, você não consegue, pensando no trabalho do homem sobre a Terra, você não consegue dissociar a natureza de cultura, dessa forma. Então, o patrimônio cultural sempre vai ter uma impregnação humana e vice-versa, o patrimônio cultural vai ser feito sobre uma base natural. Então, foi percebendo essas dificuldades que a Unesco foi desenvolvendo estudos, até que vinte anos depois, em 1992, eles chegaram a esse conceito, a essa nova categoria, então isso abriu uma perspectiva nova, não só sobre as paisagens culturais tradicionais, mas, inclusive, sobre as próprias categorias já existentes. Então, nesse sentido, as cidades, por exemplo, elas podem ser pensadas como paisagens culturais. Embora, haja setores da própria Unesco que tenham resistência a isso. A gente tem, você falou de São Paulo, a gente tem recentemente a candidatura de Buenos Aires, se candidatou como patrimônio mundial usando a perspectiva da paisagem cultural e foi mal sucedida, a Unesco não aceitou. Porque dentro da Unesco, ainda tem resistência a se considerar que cidade, embora, a gente saiba que essa é a definição mais corrente. O Rio de Janeiro agora está tentando e o Rio de Janeiro de uma forma mais estratégica que Buenos Aires, ela restringiu sua candidatura, isso é uma coisa curiosa, ela restringiu aquelas áreas que foram, que eram áreas naturais ou que foram feitas pelo homem, então, no caso eles se concentraram no Jardim xxx, na Floresta da Tijuca e no Aterro do Flamengo que são consideradas
  • 52. paisagens culturais do Rio de Janeiro. Então, eu estava falando isso tudo para dizer o seguinte, que a gente tem um conceito mais amplo de paisagem cultural e temos o conceito que a Unesco tem trabalhado e que ainda é um pouco restrito e que deixa de fora cidades, por exemplo, e São Paulo teria muita dificuldade de se colocar como paisagem cultural para a Unesco, embora, a gente saiba até pelo conceito da geografia que uma cidade é uma paisagem cultural. 3) Para o Iphan há uma diferença entre esse trabalho e a Unesco, ou não? Leonardo Barci Castriota: Olha, o Iphan o que tem tentado fazer, na verdade, no caso da candidatura do Rio é compatibilizar a sua proposta com a proposta da Unesco porque, estrategicamente, eles querem transformar o Rio em patrimônio mundial. Agora, o Iphan tem uma concepção mais ampliada do que da Unesco. A gente vê os trabalhos que eles tem feito, então eles caminham mais para em direção de um conceito geográfico de paisagem cultural do que do conceito da Unesco. Tanto que a proposta inicial do Iphan era muito mais ampla, ela pegava a questão do samba, ela pegava o subúrbio, ela pegava o Rio de Janeiro das praias, ela pegava toda essa diversidade que para o Iphan compõe a paisagem cultural. Agora, para o efeito da candidatura ser bem sucedida, eles estão limitando agora à Floresta da Tijuca e ao Aterro do Flamengo. 4) Bem, nesse contexto, então, dos grandes teóricos de pensamento, qual a proposta do senhor para uma definição de paisagem cultural? Leonardo Barci Castriota: Olha, eu acho que o centro, o cerne da definição de paisagem cultural é a idéia de trabalho combinado da natureza e do homem. Acho que essa, apesar de ser uma definição muito simples, ela consegue capturar essa riqueza dessa implicação desses dois campos. Acho que a riqueza do conceito é esse e, por isso,
  • 53. eu acho que não pode ser um conceito excludente, não pode se limitar como muitas vezes faz a Unesco, apenas a paisagens de caráter absolutamente rural, eu acho que se a gente pegar uma cidade, a gente vai entender isso, vai ver isso nela isso também, a candidatura de Buenos Aires, por exemplo, uma das restrições que eles colocaram foi que o elemento natural estaria muito pouco presente, não é verdade a candidatura foi feita com a coordenação do Ramon Gutierrez e eles foram do natural, quer dizer da ocupação das barrancas do rio, da pampa, até o traçado da cidade, até o patrimônio imaterial das celebrações do tango, a literatura que marcou, a literatura de xxx que marcou toda aquela paisagem de Buenos Aires, que é uma coisa única e representativa para o mundo inteiro e, no entanto, a Unesco ainda tem talvez uma perspectiva eurocêntrica, eles ainda tem essa dificuldade de reconhecer no urbano, principalmente, no urbano heterogêneo, como é o nosso latinoamericano, com caráter de paisagem. Vocês vejam que as cidades que são protegidas como paisagem cultural são aquelas cidades mais homogêneas e rurais, de origem rural que plantadas numa paisagem normalmente ligada à agricultura. 5) Professor, Ribeirão Preto está pedindo a chancela de paisagem cultural do Café pelo IPHAN, é um projeto grande que tem trabalhado com a metodologia do IPHAN, e buscando primeiro identificar os marcos edificados, identificar as festas, as celebrações por meio de todo um trabalho em cinco localidades que foram escolhidas dentro da cidade de Ribeirão Preto. São bairros que estão associados à formação urbana da própria cidade. O que o senhor poderia colocar a respeito desta questão de cidades estarem buscando no Brasil essa chancela de paisagem cultural? Leonardo Barci Castriota: Olha, acho isso muito inovador e acho muito oportuno porque, na verdade, o que nós estamos fazendo, principalmente, aqui na América Latina, a gente fez um encontro agora sobre paisagem cultural enquanto Iberoamericano, em Belo Horizonte,
  • 54. em agosto, e nós percebemos que teve muita contribuição européia e latinoamericana, e que nós, latinoamericanos, estamos contribuindo em nível mundial para expandir esse conceito, então essa iniciativa de pedir chancela de paisagem cultural a localidades dentro das cidades ligadas ai, eu acho muito interessante, a uma cadeia produtiva natural agrícola que é o caso do Café, é muito interessante e muito importante, porque eu acho que por essa ligação do ciclo de produção vocês vão conseguir mapear toda essa questão do cultivo e do preparo, todas essas coisas que estão ligadas nesse ciclo do Café e que vão se rebater no espaço , que vão se rebater nas práticas, que vão se rebater no patrimônio imaterial, então eu acho que a potência do conceito de paisagem cultural fica muito claro em trabalhos desta natureza. 6) Eu gostaria que o senhor falasse um pouco para nós, diante da nossa realidade instrumental, quais seriam as etapas e procedimentos que o senhor considera possíveis para identificação e caracterização sócio- espacial de bairros históricos das cidades, principalmente, das cidades do interior do Brasil e do nosso caso aqui do Estado de São Paulo. Leonardo Barci Castriota: Olha, na verdade, a gente tem já no Brasil algumas experiências de inventários, que tem trazido contribuições importantes porque o inventario é um mecanismo tradicional, mas ele era considerado simplesmente uma listagem de bens excepcionais como uma operação propedêutica ao tombamento, hoje a gente sabe que não, a gente sabe que o inventário em si, ele já tem uma função de proteção e pode ser associado a outros instrumentos, como registros ou chancela da paisagem. O que eu acho que a gente tem avançado é que nós passamos daquele inventário que se limitava a nomear excepcionalidades, principalmente, de caráter histórico e estético, para um tipo de investigação, necessariamente, interdisciplinar, o inventário necessariamente tem que ser interdisciplinar, onde a gente consegue entender com esse mecanismo que é um instrumento de leitura fortíssimo a gente consegue entender as relações sócio- espaciais, para,
  • 55. por exemplo, o planejamento urbano o inventario pode ser um instrumento de grande auxílio. Quando eu fui diretor de patrimônio da cidade de Belo Horizonte a gente trabalhou numa equipe multidisciplinar exatamente com o inventário como instrumento de conhecimento das regiões e a nossa idéia era utilizá-lo no planejamento, por exemplo, nos desenhos de bairro, um inventário ele vai captar coisas que o planejamento tradicional não capta, por exemplo, toda uma dinâmica cultural de uma região, nós trabalhamos num bairro de Belo Horizonte, o bairro da Lagoinha, e que tinha numa das ruas principais um comercio muito importante tradicional de moveis usados e antiguidades que era ligado a uma tradição de artífices que tinha nesse bairro, quando nós mapeamos isso, esses dados que nós tivemos ajudou o município, por exemplo, a não transformar aquela rua num corredor de trânsito, porque todos os outros dados que eles tinham indicavam que aquela rua tinha que ser um corredor de trânsito, mas nós chegamos com dados culturais, que sem um inventário nós, provavelmente, não teríamos, então eu acho que o primeiro passo é um inventário muito bem feito, muito atrelado, multidisciplinar. Outra coisa importante nessa metodologia é a questão da participação da comunidade, acho que isso é fundamental, porque apesar, quando a gente trabalha de forma multidisciplinar, a gente já está ampliando a visão, eu acho que a visão do usuário é absolutamente importante, ela é exatamente porque é com ela que você vai identificar as chamadas referências culturais que são marcos muito importantes para a paisagem cultural, então eu acho que você tem esse caminho, quer dizer, fazer um inventariamento muito bem feito, muito detalhado. 7) Prof., a trajetória acadêmica do senhor permite que o senhor possa colocar pra nós, alguma coisa a respeito de restauro, quais linhas o senhor considera hoje que estão configuradas no Brasil, e como o senhor colocaria essa intervencionista ativa da máxima interferência o pseudo-restauro da originalidade, conservador, tradicional, e do falso histórico, ou existem posturas conceituais, éticas, ou outras recomendações internacionais que o senhor considera mais pertinentes?
  • 56. Leonardo Barci Castriota: Olha, a questão do restauro é uma questão que nós temos que discutir com urgência no Brasil, a professora Beatriz Curi, da USP tem escrito alguns artigos muito interessantes, inclusive, o último livro dela é um alerta nesse sentido, porque no Brasil nós temos, infelizmente, nós temos ficado longe da discussão internacional, por um lado nós temos uma postura do IPHAN, uma postura predominante, que se por um lado ela conseguiu preservar muita coisa, de outro ela também não fez com que a discussão avançasse muito, porque eu acho que até de forma defensiva se refugiou numa postura quase eminética, se você vê por exemplo a ação de conservação dos sítios históricos tradicionais, você vai ver que você tem pouco avanço nesse sentido, por outro lado, a gente tem uma outra postura, que é pior ainda, porque a do IPHAN pelo menos ela é aceitável e a gente poderia dizer defensiva, mas ela consegue preservar, mas a gente tem hoje uma tendência a não considerar a realidade do próprio edifício nas intervenções, o edifício é tomado muitas vezes apenas como uma fachada, varrendo tudo dentro dele, a gente tem tido intervenções, principalmente, de grandes arquitetos que até alguns anos atrás, arquitetos modernistas que eles não costumavam intervir no patrimônio, hoje nós temos intervenções desastrosas, por exemplo, me permite citar Paulo Mendes da Rocha, nosso grande arquiteto, mas infelizmente um grande destruidor do patrimônio. Em Belo horizonte, a gente teve uma grande intervenção absolutamente equivocada do governo do Estado sobre as Secretarias da Praça da Liberdade, ali nós temos um conjunto de secretarias do século XIX que foram todas transformadas em centros culturais, todas, cada uma de um Banco, e se tomou liberdades internas nessas secretarias que eu nunca vi se fazer isso com uma obra monumental, por exemplo, a Secretaria da educação que foi projeto de intervenção do Paulo Mendes da Rocha, ele simplesmente destrói grande parte do prédio original , para vocês terem uma idéia até o volume externo é alterado com a posição de uma caixa vermelha que sai sobre o telhado. Então toda aquela postura de humildade que o
  • 57. restaurador deve ter, ela não está presente nessas intervenções, porque na verdade com a condição do restaurador, é como diz uma professora espanhola, me falta o nome, mas uma especialista em restauro, ela chama de humilde condição, porque é exatamente um trabalho de hermenêutica você tem que entender o que é o edifício o que ele está falando, e de que maneira que dentro das possibilidades daquele edifício eu consigo trazer o pronúncio do presente respeitando aquilo que ele tem de essencialidade, então eu acho que essa deve ser a postura, respeitando, inclusive, a própria possibilidade que o edifício te oferece ou não, como há edifícios que não se serve a certas coisas, então não adianta forçar. No caso desse Centro Cultural de Belo Horizonte, umas das secretarias que eles quiseram transformar em sede da orquestra sinfônica eu era presidente a OAB na época, quando eles nos procuraram eu olhei e fiz uma rápida análise e dissemos que este edifício não se presta a isso, ele não comporta isso, pois fizeram um concurso público chegaram a uma solução e quando foram fazer análise técnica, viram que de fato não comportava a não ser que destruísse o prédio inteiro, então infelizmente eu acho que essa é uma questão é muito importante que se coloque, é preciso que a gente discuta isso no Brasil com urgência, porque nós temos que discutir o planejamento urbano com patrimônio, paisagem cultural com patrimônio, mas nós temos discutido pouco os restauros que se fazem aqui no Brasil. 8) Considerando que hoje no Brasil, quando se pensa em patrimônio, se pensa muito em patrimônio edificado, como o senhor vê hoje esse avanço de trabalhar o conceito de patrimônio mais abrangente como o patrimônio cultural? Leonardo Barci Castriota: Olha, eu acho também esse passo muito importante, a gente tem que pensar que o Brasil, nesse sentido, a gente, nós somos de certa forma pioneiros, se a gente pensar no Mário de Andrade, que lá atrás nos anos 30 já tinha uma concepção de patrimônio que foi proposta na criação do IPHAN que abrangia isso tudo, ele usava a categoria de arte, mas sobre a categoria de arte ele