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Os desafios da organização do trabalho feminista da Ação Popular Socialista
Resumo: Este texto aborda a opressão específica às mulheres: a imposição do trabalho
reprodutivo não remunerado pelo capital, a desvalorização simbólica da mulher e das
suas atividades produtivas e sua exclusão dos espaços de poder. O que temdecorrências
econômicas, políticas e sociais que demandam formas especificas de enfrentamento.
Aborda esta problemática na teoria marxista – base para a produção teórica feminista
que orienta nossa ação. Ao tratar da resistência, pauta o feminismo enquanto uma
trincheira imprescindível para o processo de acúmulo prolongado de forças com vistas
ao desmonte da estrutura organizada pelo capital e para a construção de uma nova
forma de fazer política e de fazer ciência – fundamentais para a construção de um novo
homem e de uma nova mulher. Por fim, situa os desafios para que a Ação Popular
Socialista organize nacionalmente o trabalho feminista: 1) avançar na formulação de um
trabalho político-organizativo de cunho feminista;2) organizar uma política de formação
na teoria feminista marxista; 3) organizar uma corrente nacional feminista de caráter
popular; 4) resgatar a história de resistência e de luta das mulheres – no plural porque
somos diversas e atuamos em diferentes lutas.
Dominação e exploração social das mulheres
1. A ordem patriarcal de gênero é uma recém-nascida quando consideramos o
tempo aproximado de existência da humanidade (250000-300000 anos). Há
cerca de 6500-7000 anos, tendo início nas sociedades de caça e coleta, quando
homens desfrutando de tempo livre criaram sistemas simbólicos que criaram
assimetrias nas relações entre os sexos, inferiorizando socialmente as mulheres.
2. Mas, trata-se de práticas milenares, que antecedem o surgimento do
capitalismo, iniciado genericamente no século XVI e desenvolvido mais
plenamente com a revolução industrial no século XVIII. Mas, dizer que as
relações antagônicas entre os sexos antecedem as relações de dominação do
capitalsobre o trabalho não significadizerque a primeira relação socialsejamais
importante do que a última.
O marxismo e a questão da Mulher
3. O problema da subordinação das mulheres e a necessidade de sua libertação foi
reconhecido por todos os grandes pensadores socialistas do século XIX. Os
socialistas utópicos e os socialistas científicos buscaram mostrar caminhos para
a libertação da mulher. Ao fazer isso, deram visibilidade ao problema da
subordinação das mulheres. Os utópicos (Saint Simon; Fourier e Owen)
defenderam entre outras bandeiras, a educação igual para mulheres e homens,
a libertação dos trabalhos domésticos através da criação de cozinha central e
infantário para as crianças.
4. Os socialistas científicos, especialmente Marx e Engels abriram caminhos para a
teoria feminista sobretudo através da teoria da divisão social do trabalho. A
grande contribuição de Engels consisteemter apontado para o confinamento da
mulher no trabalho doméstico, não produtivo (divisãosexualdo trabalho). Antes
do capitalismo, “a divisão do trabalho [...] nada mais era do que a divisão do
trabalho no ato sexual”. Para Engels a primeira oposição de classe que se
manifesta na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre o
homem e a mulher no casamento conjugal, e a primeira opressão de classe com
a opressão do sexo feminino pelo masculino. Engels deriva a monogamia (causa
da subordinação das mulheres) da propriedade privada. A imposição da
fidelidade conjugal só para as mulheres expressa o objetivo da monogamia:
“procriar filhos de uma paternidade incontestável”, a quem será transmitida a
propriedade acumulada.
5. O casamento monogâmico é tema ricamente discutido pela Alessandra Kollontai
para quem a libertação da mulher passava pelo amor livremente associado.
Gramsci trata rapidamente do tema em Americanismo e Fordismo, mostrando
que este modelo de casamento é importante na construção do “novo homem”
demandado pelo novo método de trabalho, o fordismo. Ter uma esposa emcasa
impede que os homens (produtores) gastem suas energias com aventuras
sexuais noturnas, o que é bom para o fordismo, método que requer homens
disciplinados e concentrados no processo de trabalho.
6. Lenin deu grande contribuição ao trazer à cena o debate sobre a participação
política das mulheres, defendendo a igualdade efetiva, não apenas a igualdade
formal. Por igualdade efetiva entende a participação das mulheres na vida
pública, sua participação política. Por isso,considera importante acriação do Dia
Internacional das Mulheres. Entende que a mudança será lenta por se tratar de
mudança cultural.
7. Importante ressaltar que para estes autores, a solução para o problema da
mulher sedá peladestruição total do regime capitalistae através da implantação
da sociedade socialista. A verdadeira libertação da mulher é encarada como
processo geral de humanização de todo o gênero humano. Ou seja, os homens
não podem ser livres relacionando-se com mulheres em condição de objeto.
8. A contribuição marxista é inegável, seja do ponto de vista teórico seja do ponto
de vista político. Do ponto de vista teórico, a principal contribuição marxista
consistena análisehistórica e materialista, pautando a divisãodo trabalho e suas
mudanças na história, as transformações da família e das relações entre os
homens e as mulheres neste contexto. Do ponto de vista da luta, preciosa
contribuição com a organização dos trabalhadores e trabalhadoras através do
partido político.
9. Mas, também é inegável os limites teóricos do marxismo para a explicação da
subordinação específica das mulheres. Faltam instrumentos no arcabouço
teórico – desenvolvido para a análise da produção. A condição de subordinação
da mulher ao homem se dá em todos os espaços da vida social e, por isso, uma
análise voltada para a esfera da produção, que não leve em conta a reprodução,
não dá conta.
10. Coube ao movimento feminista, a criação dos instrumentos analíticos
necessários para a interpretação da subordinação social das mulheres. O que
acontecerá a partir da década de 70 pelas feministas inglesas, com a teoria de
gênero, sistematizada por Scott, e com a teoria das relações sociais de sexo
desenvolvida por autoras francesas,como DanieleKergoat eAne-Marie Devreux.
Esta teoria chegou ao Brasil após o exílio de ativistas feministas brasileira, como
Souza-Lobo. A ela nos filiamos.
Relações Sociais de Sexo e a divisão sexual do trabalho
11. A divisão sexual do trabalho é aqui concebida em termos de relação social, o que
significa dizer que se trata de uma relação antagônica entre homens e mulheres
no contexto de uma sociedade organizada pelo capital.
12. A relação social de sexo é constituída pela divisão e hierarquização dos homens
e das mulheres, de sua atividade de trabalho, de seu poder e dos valores ligados
a ambos.
13. Há um confronto permanente e uma disputa entre os sexos. Há um confronto
entre dois grupos sociais de sexo, o grupo social dos homens e o grupo social das
mulheres. Este confronto tem o trabalho e suas divisões como o principal objeto
de disputa.
14. Nesta relação tem lugar a superioridade dos homens sobre as mulheres.
Superioridade que tem uma base material e uma basesimbólica/ideativa. A base
material, expressa-se através da divisão sexual do trabalho e da divisão sexual
do poder; e, em sua dimensão simbólica, expressa-se como divisão sexual do
saber.
15. A divisão sexualdo trabalho éuma divisão social,istoé, é uma organização social
do compartilhamento do trabalho e do emprego entre dois grupos de sexo. A
divisãodo trabalho entre homens e mulheres integra a divisãosocialdo trabalho,
analisadapor Marx. É uma das suas modalidades,assimcomo o trabalho manual
e o trabalho intelectual ou a divisão internacional do trabalho. Com estas,
articula-se e interpenetra-se.
16. A divisão sexual do trabalho é a forma de divisão do trabalho social decorrente
das relações sociais entre os sexos. E esta divisão é um fato prioritário para a
sobrevivência da relação social entre os sexos. E é fundamental para a criação
do trabalho assalariado, que conta com a disponibilidade das mulheres para o
trabalho reprodutivo não pago. Os homens foram designados prioritariamente à
esfera produtiva e as mulheres à esfera reprodutiva e, simultaneamente, a
apropriação pelos homens das funções consideradas mais importantes (funções
políticas, religiosas, militares, etc). Essa forma de divisão do trabalho entre os
sexos é modulada histórica e socialmente. Ou seja,não é natural. É resultado das
relações entre os sexos na história.
17. A divisão sexual do trabalho nestes moldes interessa ao capital. Para manter as
desigualdades de salário e um comportamento dócil entre as operarias, é
necessário utilizar formas de controle e de disciplina que articulem a
subordinação operaria ao capital com a subordinação sexista da mulher. A
produção se estrutura sob a base de uma divisão sexual e social que atinge
salários, promoções, qualificação, escala de funções e as formas de controle da
mão de obra.
18. O capital não cria subordinação das mulheres, porém a integra e reforça. Na
verdade, as raízes da divisão sexual do trabalho devem ser procuradas na
sociedade e na família. Por isso, é importante levar em conta a análise das
condições de trabalho na fábrica com aquelas que prevalecem no mundo
exterior à empresa, na casa.
19. As empresas, as escolas, os centros de formação profissional, entre outros
participam da construção das relações de gênero ao fazer uso da divisão do
trabalho em bases sexuais. Estamos no trabalho profissional, mas em “guetos”:
predominamos sobretudo no trabalho doméstico remunerado e no setor de
serviços,espaços de baixíssimaremuneração e proteção do trabalho. Os homens
estão concentrados sobretudo na indústria, espaço onde predomina o trabalho
formal no Brasil; e neste setor, as mulheres se destacam no pior espaço: a
indústria de base técnica tradicional. Para as mulheres que conseguiram “furar
bloqueios”, geralmente mulheres não negras portadoras de um diploma, que
ascenderam a cargos de comando, seguem ainda nos espaços intermediários
como as médias gerências. Apesar da maior escolaridade das mulheres, o alto
escalão das empresas segue masculino, inclusive naquelas que passarampor um
processo de “feminização” com a reestruturação produtiva, como o setor
bancário.
20. Quando olhamos para os domicílios, percebemos que o desenvolvimento das
tecnologias para uso doméstico vem tornando as tarefas menos penosas; mas, a
divisão sexual do trabalho doméstico e a sua atribuição às mulheres continua
intacta; há insignificante mudança na participação dos homens nas atividades
domesticas e familiares inclusive entre os que defendem a democracia e a
divisão igualitária do trabalho. Ao analisar a experiência soviética, Saffioti
percebeu que cresceu a presença das mulheres na estrutura econômica, mas no
compartilhamento do trabalho doméstico nada mudou! Segundo ela, “os
homens soviéticos prestam muito menos auxílio às suas mulheres nos serviços
domésticos do que o fazem os maridos ingleses e norte-americanos”.
21. A divisão sexual do poder ou o compartilhamento do poder entre os sexos, mais
precisamente, aexclusãodas mulheres das esferas do poder e da decisãoé outra
grande questão. O poder político formal é masculino. As mulheres estão nas
lutas,nos movimentos sociais,crescesuapresença nas filiações partidárias e aos
sindicatos, mas estamos subrepresentadas nos espaços de poder. Apesar das
cotas de gênero, somos 10% na câmara de deputados, quando representamos
maioria da população brasileira. Poucas mulheres estão nos cargos mais
importantes nas direções sindicais e partidárias. Estando subrepresentadas
nestes espaços, marginais serão pautas como gênero e diversidade no plano de
educação, a creche como direito constitucional das crianças e como direito das
mulheres e homens que trabalham, o combate à violência e, sobretudo, as
políticas por maior participação política. E na reforma eleitoral que vem
acontecendo no Brasil o não lugar das mulheres neste espaço foi reafirmado...
22. Por fim, e não menos importante, queremos falar sobre a divisão sexualdo saber
que diz respeito ao trabalho de categorização ou a atividade simbólica das
relações sociais de sexo. Os indivíduos estão divididos em categorias de sexo:
homens e mulheres. Há ainda uma oposição entre o que é o masculino e o que
é o feminino, com atributos, normas e valores diferenciados por sexo. Esta
atividade de categorização consiste em “dar e fixar como verdade” definições
sociais:estabelecero que é um homem e o que é uma mulher, estabelecer o que
é trabalho de homem, o que é trabalho de mulher, o que é e o que não é
trabalho. Ela produz os valores ligados ao trabalho dos homens e ao trabalho das
mulheres, tendo o masculino como norma de referência. Para enfrentar esta
questão, foi importante construir os núcleos de pesquisa feminista e questionar
o modelo de ciência androcêntrico (que tem o masculino como norma de
referência). As categorias de analise como gênero nascem desta luta.
A especificidade da questão das mulheres
1. As mulheres não são segregadas como os outros grupos dominados; elas estão
inscritas no conjunto dos sistemas sociais de idade, de classe, de raça. “Essa
situação tem uma série de consequências entre as quais o fato de as mulheres
não poderem, como os outros oprimidos, reservar-se um espaço próprio,
coletivo ou individual” (Kergoat).
2. Falar em especificidadeépolêmica na esquerda e no movimento feminista. Mas,
considero importante iniciar este debate entre nós. O que torna a opressão às
mulheres específica? Mesmo considerando a heterogeneidade existente entre
as mulheres, a divisão sexual do trabalho (do poder e do saber) é comum a todas
as mulheres.
3. Falar em divisão sexual do trabalho é falar em antagonismo entre os sexos e,
portanto, entre pessoas que se amam e tem projetos comuns, como a educação
dos filhos. Homens e mulheres coexistem continuamente, vivem juntos e
‘produzem viver’ juntos. Nesta relação, tem solidariedade e tem disputa. E
muitas vezes tem violência doméstica entre pessoas que dividem o mesmo
espaço doméstico. Reconhecendo esta especificidade foi criada a Lei Maria da
Penha com medidas como o afastamento do agressor em caso de ameaça de
morte. Isto porque as mulheres em situação de violência dormem com o seu
agressor.
O movimento feminista e os caminhos da resistência
4. O movimento feminista é um movimento social e político, que pauta a defesa
dos direitos sociais negados às mulheres, como direito à educação, ao trabalho
remunerado e ao salário igual por trabalho igual, direito ao corpo e à decisão
sobre sua vida reprodutiva, direito a uma vida sem violência sexual e doméstica
familiar. Mas, não só isso; defende os direitos políticos das mulheres: direito ao
voto, direito a disputar eleições, paridade nas eleições e instancias de direção.
5. É um movimento bastante heterogêneo, e complexo. Abriga diferentes
concepções acerca do feminismo, as correntes se diferenciam do ponto de vista
da estratégia e da tática. Há partidárias e não partidárias. Burguesas e
marxistas...
6. No caso especifico das feministas marxistas, podemos dizer, genericamente,
que, pelos motivos expostos acima, a luta feminista se estrutura a partir de três
grandes eixos: 1) Luta pela inserção das mulheres no trabalho profissional e
reconhecimento do trabalho doméstico como trabalho; 2) Luta pela participação
política das mulheres; 3) Luta pela educação das mulheres e pela sua
participação na produção do conhecimento e da cultura.
As feministas nos partidos políticos e na luta pelo socialismo
7. O partido político é para as feministas marxistas um espaço importante de luta.
Pelo reconhecimento de que lutas fragmentadas não terão força para derrotar o
capital e por reconhecer a necessidade de um programa que aponte para o
socialismo como saída ao capitalismo. Etc.
8. Mas, as relações de poder no interior dos partidos de esquerda existem. As
hierarquias existem. Tem sido um desafio enfrentar as hierarquias entre lutas
principais e lutas secundárias. Enfrentar as falsas dicotomias entre dominação
simbólica versus exploração material.
9. Segundo Hirata e Kergoat “o movimento operário sempre funcionou segundo a
hipótese de que a unidade política da classe trabalhadora poderia ser alcançada
apesar dos conflitos e dos antagonismos de sexo. Resolver primeiro as
desigualdades de classe pondo fim à exploração na luta pelo socialismo e depois
resolver num segundo tempo os problemas de opressão ligados ao sexo foi essa
a tradicional resposta no movimento operário internacional às reivindicações
formuladas pelo movimento feminista” (1994, p. 95).
10. As feministas marxistas partidárias querem a unidade construída através da luta
comum contra a exploração que o capital opera sobre o trabalho – e esta
exploração é diferenciada segundo o lugar de homens e mulheres na produção.
Este lugar muda de acordo com a cor do trabalho, de acordo com a idade do
trabalho, de acordo com a orientação sexual do trabalho.
11. A opressão vivenciada pelas mulheres – pela suacondição de classe,racial,etária
e de acordo com sua orientação sexual – não pode ser vista apenas como uma
questão cultural. É cultural sim. Mas, é também uma questão econômica e
política!
A APS e sua contribuição à luta feminista
12. Temos nas nossas formulações posicionamentos importantes sobre as questões
relacionadas às opressões. São ainda genéricas, mas importantes. Destacarei
aqui o que considero definições mais importantes, tentando apontar algumas
ausências (pontos para aprofundamento), e o que acho que precisa ser
repensado neste debate, como por exemplo a localização destas opressões
como “Questões culturais” (se entendi bem...).
13. De forma resumida, acho importante nas nossas resoluções o reconhecimento
de que: 1) A transição socialista não se limita ao plano da economia e da política;
2) É preciso praticar, desde já, o combate às desigualdades e discriminações de
gênero, etnia, raça, religião e orientação sexual. E pela defesa dos direitos
humanos. 3) Combate este que exige aprofundamento na transição socialista
com a aplicação de políticas de ação afirmativa; 4) Portanto, estas temáticas são
fundamentais desde hoje para que o socialismo,de fato, abra caminho para uma
fase da história que elimine estas manifestações.
14. Nas Resoluções do V ENAPS (Encontro Nacional da APS - 2012), no ponto de
Estratégia, afirmamos que: “Nenhuma revolução socialista terá êxito se não
assentar-se nas tradições de luta e nas características culturais do seu povo. A
discussão sobre o sujeito histórico da revolução não se restringe às dimensões
políticas e econômicas strictu senso, até porque ambas fazem parte de uma
totalidade complexa, envolta na cultura dos diversos segmentos sociais que
forjaram o povo brasileiro. As desigualdades raciais e de gênero fizeram, e ainda
fazem, parte dos mecanismos de dominação, gerando também 512 anos de
resistência.”
15. Nas resoluções de 1999 e 2004, já tínhamos afirmado que “é preciso que os
socialistas tenham claro e pratiquem, desde já, o combate às desigualdades e
discriminações gênero, etnia, raça, religião e orientação sexual, bem como se
pautem pela defesa dos direitos humanos. Combate este que exige
aprofundamento na transição socialista com a aplicação de políticas de ação
afirmativa em todos os níveis. No Brasil, a opressão de gênero e etnia,
especialmente dos indígenas e afro-descendentes, tem sido reproduzida,
adaptada e ideologicamente disseminada no meio do povo, em cada etapa do
desenvolvimento do país, desde a invasão dos portugueses. Cabe, portanto,
conferir centralidade, hoje, a estas temáticas para que o socialismo,de fato, abra
caminho para uma fase da história que elimine estas manifestações”.
16. No ponto de nossos objetivos estratégicos (quinto) reafirmamos: “Colocar as
demandas da juventude, das idosas/os, dos negros/as, dos povos indígenas, do
movimento LGBT e das mulheres como questões centrais da agenda nacional.”
17. Além disso, nas resoluções do V ENAPS sobre “Construção Partidária e Nova
Cultura Política”, destacamos a necessidade de enfrentar estas questões
também dentro das organizações de esquerda e populares. Ali afirmamos que:
“No caso de organizações e movimentos que tem objetivos políticos mais ou
menos bem definidos em perspectiva contra-hegemônica, cabe aqui discutir
aquele conjunto de questões já citadas no item da cultura. Ou seja, a
identificação e necessidade de combater (com vistas à ‘Nova Cultura Política’)
aquele conjunto de práticas e expressões da sociedade burguesa, como o
individualismo, o egoísmo, o consumismo, o autoritarismo, o mandonismo, o
racismo, o machismo, a homofobia, a discriminação dos idosos, a separação
entre o trabalho manual e intelectual, o personalismo, o liberalismo, o
pragmatismo, o levar vantagem pessoal em tudo, o uso privado do que é
coletivo, o uso da força, da fraude e da corrupção para vencer eleições e
congressos etc”.
18. Carece de aprofundamento o debate sobre estas questões no PDP: Qual lugar
das políticas de enfrentamento ao machismo, ao racismo e à homofobia num
Programa Democrático e Popular? Como a luta feminista pode contribuir para o
processo de acúmulo prolongado de forças?
19. Falta formação política que trate as opressões com a centralidade que estas
questões devem ter. Não estou criticando nenhum dirigente de forma individual.
Penso que é tarefa da corrente avançar neste ponto. Formar homens e mulheres
para a construção da luta feminista nos três caminhos organizativos necessários
para agirmos de modo coerente e acumular estrategicamente: APS, PSOL e as
organizações da luta popular.
20. Do ponto de vistadas questões organizativas, temos mais desafios neste setorial,
pois nunca tivemos uma corrente feminista - diferente da experiência de outros
setoriais, como negros e negras e juventude.
21. Mas, temos condições objetivas para avançar. Os sujeitos para fazer esta luta a
APS já têm: mulheres ocupando espaços importantes: 1) temos militantes nas
universidades atuando com pesquisa na área dos estudos de gênero e temas
relacionados à escravidão; 2) temos grandes lideranças da corrente em espaços
sindicais, em diferentes categorias, em diferentes estados, sobretudo na
educação, na saúde e nos bancários –base com perfil bastante feminino; 3) na
juventude; 4) no movimento popular (no MSTB por exemplo a base é
predominantemente composta por mulheres); 5) na Intersindical, a pasta de
opressões é ocupada por uma militante da APS; 6) Na CSP Conlutas temos
militantes construindo o Setorial de Mulheres; 7) temos mulheres dirigindo o
PSOL; 8) e na nossa Corrente, temos paridade na direção. Será que todo este
trabalho é visível para nós, ou somos invisíveis dentro da nossa corrente?
Conjuntura política: avançodo conservadorismo, desorganização domovimento e
retrocessos no PSOL
22. A conjuntura política é crise econômica, com desemprego estrutural prolongado
e com tendência ao acirramento da luta entre os sexos pelos postos de trabalho
formais, tendência apontada por alguns estudos. O momento é de ameaça aos
direitos conquistados, como direitos trabalhistas e sindicais.
23. A terceirização teve as mulheres e jovens como “cobaias”, mas hoje se
generaliza; e se o “PL das terceirizações” for aprovado aumentará o número de
acidentes de trabalho, adoecimentos ocupacionais, aumentará o desemprego, e
pais e mães da classetrabalhadora ficarão mais tempo na empresa e bem menos
tempo em casa com a família. E, o que é pior: aumentará o medo de perder o
emprego, dificultando a organização dos trabalhadores e trabalhadoras e a sua
luta. Tudo isso com impacto bem maior sobre as mulheres.
24. A aliança do PT com partidos conservadores como PMDB e PSC fortaleceu o
conservadorismo que hoje atua de forma mais organizada e com agitação
política tanto no Congresso Nacional quanto na sociedade civil, com pautas
homo fóbicas, estimulando o ódio e a intolerância religiosa, e viabilizando
retrocessos no pouco que avançamos com o governo do PT como a inclusão de
gênero e diversidade nos planos de educação.
25. A conjuntura é resistência e de reorganização dos lutadores e lutadoras. Mas, no
que diz respeito ao movimento feminista, o momento ainda é de fragmentação
e defensiva. Se a referência no PT já não pesa tanto para algumas, o fato da
presidenta ser uma mulher isso ainda conta, ainda que esta presidenta esteja
adotando um conjunto de medidas como as MPs 664 e 665 que atingem
especialmente as mulheres mais vulneráveis como jovens e idosas.
26. Por fim, não poderia deixar de registrar o retrocesso no PSOL. O setorial de
mulheres era o espaço nacional mais coletivo do partido. Toda a corrente que
construía o setorial tinha representação nele, independente do seu tamanho na
base. Por este setorial tocamos campanhas nacionais de combate à violência
contra as mulheres, e produzimos e apresentamos às candidaturas do partido
uma plataforma feminista. Até a US dar o golpe. De olho nos 5% do fundo
partidário e no controle burocrático do setorial, elegeu uma delegação fraudada
no Amapá; e através do DNPSOL, por um voto de diferença, impôs ao setorial a
delegação fraudada; implodindo a unidade do setorial.
27. As nossas divergências não podem “liquidar” as militantes da Corrente
28. Nossas divergências teóricas e políticas vêm extrapolando nossos fóruns e listas
de e-mails, expondo a corrente e suas militantes. O que precisa ser discutido e
superado internamente, sem exposição pública.
29. Na Bahia, por duas vezes, divergências políticas foram pautadas nas redes
sociais, com exposição das mulheres da corrente e da APS. Numa sociedade
organizada de forma hierárquica e com valores machistas, racistas e
homofóbicos, nossos camaradas precisam estar a serviço do combate a estes
valores. Do contrário, estarão contribuindo para fortalecer estigmas contra as
mulheres e contra as feministas e a violência, seja ela física ou simbólica. Ciente
de que estamos sujeitos à reprodução destas praticas – porque formados nelas
– devemos estar atentos, vigilantes e dispostos à autocritica; além disso, a APS
precisa investir na formação política feminista e pensar medidas para tratar
casos envolvendo violência de gênero e outras formas de violência entre
militantes.
30. A disputa no Rio de Janeiro não pode levar a um desacumulo e à “liquidação”
das nossas dirigentes feministas. Nosso desafio é fortalecer as mulheres em sua
luta, estimular a sua participação. Mas, as disputas internas vêm dando espaço
a outras práticas. A exemplo da tentativa de destituição e de engessamento do
trabalho político de uma militante nossa, presidenta do PSOL de Nova Iguaçu,
por parte de outras companheiras da direção nacional da corrente, que para isso
contou com a aliança com setores fundamentalistas como o grupo de Janira
Rocha; e a exemplo do ocorrido no Congresso da CSP quando as mesmas
camaradas invisibilizaram a presença e a contribuição de uma companheira da
APS, dirigente sindical que atua e formula sobre a política feminista para o
espaço sindical.
Os desafios da organização do trabalho feminista da Ação Popular Socialista
 investir na formulação de um trabalho político-organizativo de cunho feminista;
 organizar uma política de formação na teoria feminista marxista para homens e
mulheres; para isso, retomar a construção do centro nacional de formação
politica da corrente;
 resgatar a história de resistência e de luta das mulheres nas regiões;
 organizar nosso setorial, dialogando com outros setoriais da corrente: LGBT,
negros e negras, juventude, sindical; e dialogando como nossa ação
institucional, via mandatos;
 construir nossa corrente e campo de trabalho de massas.
Maria Filipa, Vive!
Zilmar Alverita, Capital da Resistência, Salvador. 08 de julho de 2015.

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  • 1. Os desafios da organização do trabalho feminista da Ação Popular Socialista Resumo: Este texto aborda a opressão específica às mulheres: a imposição do trabalho reprodutivo não remunerado pelo capital, a desvalorização simbólica da mulher e das suas atividades produtivas e sua exclusão dos espaços de poder. O que temdecorrências econômicas, políticas e sociais que demandam formas especificas de enfrentamento. Aborda esta problemática na teoria marxista – base para a produção teórica feminista que orienta nossa ação. Ao tratar da resistência, pauta o feminismo enquanto uma trincheira imprescindível para o processo de acúmulo prolongado de forças com vistas ao desmonte da estrutura organizada pelo capital e para a construção de uma nova forma de fazer política e de fazer ciência – fundamentais para a construção de um novo homem e de uma nova mulher. Por fim, situa os desafios para que a Ação Popular Socialista organize nacionalmente o trabalho feminista: 1) avançar na formulação de um trabalho político-organizativo de cunho feminista;2) organizar uma política de formação na teoria feminista marxista; 3) organizar uma corrente nacional feminista de caráter popular; 4) resgatar a história de resistência e de luta das mulheres – no plural porque somos diversas e atuamos em diferentes lutas. Dominação e exploração social das mulheres 1. A ordem patriarcal de gênero é uma recém-nascida quando consideramos o tempo aproximado de existência da humanidade (250000-300000 anos). Há cerca de 6500-7000 anos, tendo início nas sociedades de caça e coleta, quando homens desfrutando de tempo livre criaram sistemas simbólicos que criaram assimetrias nas relações entre os sexos, inferiorizando socialmente as mulheres. 2. Mas, trata-se de práticas milenares, que antecedem o surgimento do capitalismo, iniciado genericamente no século XVI e desenvolvido mais plenamente com a revolução industrial no século XVIII. Mas, dizer que as relações antagônicas entre os sexos antecedem as relações de dominação do capitalsobre o trabalho não significadizerque a primeira relação socialsejamais importante do que a última. O marxismo e a questão da Mulher
  • 2. 3. O problema da subordinação das mulheres e a necessidade de sua libertação foi reconhecido por todos os grandes pensadores socialistas do século XIX. Os socialistas utópicos e os socialistas científicos buscaram mostrar caminhos para a libertação da mulher. Ao fazer isso, deram visibilidade ao problema da subordinação das mulheres. Os utópicos (Saint Simon; Fourier e Owen) defenderam entre outras bandeiras, a educação igual para mulheres e homens, a libertação dos trabalhos domésticos através da criação de cozinha central e infantário para as crianças. 4. Os socialistas científicos, especialmente Marx e Engels abriram caminhos para a teoria feminista sobretudo através da teoria da divisão social do trabalho. A grande contribuição de Engels consisteemter apontado para o confinamento da mulher no trabalho doméstico, não produtivo (divisãosexualdo trabalho). Antes do capitalismo, “a divisão do trabalho [...] nada mais era do que a divisão do trabalho no ato sexual”. Para Engels a primeira oposição de classe que se manifesta na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre o homem e a mulher no casamento conjugal, e a primeira opressão de classe com a opressão do sexo feminino pelo masculino. Engels deriva a monogamia (causa da subordinação das mulheres) da propriedade privada. A imposição da fidelidade conjugal só para as mulheres expressa o objetivo da monogamia: “procriar filhos de uma paternidade incontestável”, a quem será transmitida a propriedade acumulada. 5. O casamento monogâmico é tema ricamente discutido pela Alessandra Kollontai para quem a libertação da mulher passava pelo amor livremente associado. Gramsci trata rapidamente do tema em Americanismo e Fordismo, mostrando que este modelo de casamento é importante na construção do “novo homem” demandado pelo novo método de trabalho, o fordismo. Ter uma esposa emcasa impede que os homens (produtores) gastem suas energias com aventuras sexuais noturnas, o que é bom para o fordismo, método que requer homens disciplinados e concentrados no processo de trabalho. 6. Lenin deu grande contribuição ao trazer à cena o debate sobre a participação política das mulheres, defendendo a igualdade efetiva, não apenas a igualdade formal. Por igualdade efetiva entende a participação das mulheres na vida pública, sua participação política. Por isso,considera importante acriação do Dia Internacional das Mulheres. Entende que a mudança será lenta por se tratar de mudança cultural. 7. Importante ressaltar que para estes autores, a solução para o problema da mulher sedá peladestruição total do regime capitalistae através da implantação da sociedade socialista. A verdadeira libertação da mulher é encarada como
  • 3. processo geral de humanização de todo o gênero humano. Ou seja, os homens não podem ser livres relacionando-se com mulheres em condição de objeto. 8. A contribuição marxista é inegável, seja do ponto de vista teórico seja do ponto de vista político. Do ponto de vista teórico, a principal contribuição marxista consistena análisehistórica e materialista, pautando a divisãodo trabalho e suas mudanças na história, as transformações da família e das relações entre os homens e as mulheres neste contexto. Do ponto de vista da luta, preciosa contribuição com a organização dos trabalhadores e trabalhadoras através do partido político. 9. Mas, também é inegável os limites teóricos do marxismo para a explicação da subordinação específica das mulheres. Faltam instrumentos no arcabouço teórico – desenvolvido para a análise da produção. A condição de subordinação da mulher ao homem se dá em todos os espaços da vida social e, por isso, uma análise voltada para a esfera da produção, que não leve em conta a reprodução, não dá conta. 10. Coube ao movimento feminista, a criação dos instrumentos analíticos necessários para a interpretação da subordinação social das mulheres. O que acontecerá a partir da década de 70 pelas feministas inglesas, com a teoria de gênero, sistematizada por Scott, e com a teoria das relações sociais de sexo desenvolvida por autoras francesas,como DanieleKergoat eAne-Marie Devreux. Esta teoria chegou ao Brasil após o exílio de ativistas feministas brasileira, como Souza-Lobo. A ela nos filiamos. Relações Sociais de Sexo e a divisão sexual do trabalho 11. A divisão sexual do trabalho é aqui concebida em termos de relação social, o que significa dizer que se trata de uma relação antagônica entre homens e mulheres no contexto de uma sociedade organizada pelo capital. 12. A relação social de sexo é constituída pela divisão e hierarquização dos homens e das mulheres, de sua atividade de trabalho, de seu poder e dos valores ligados a ambos. 13. Há um confronto permanente e uma disputa entre os sexos. Há um confronto entre dois grupos sociais de sexo, o grupo social dos homens e o grupo social das mulheres. Este confronto tem o trabalho e suas divisões como o principal objeto de disputa. 14. Nesta relação tem lugar a superioridade dos homens sobre as mulheres. Superioridade que tem uma base material e uma basesimbólica/ideativa. A base material, expressa-se através da divisão sexual do trabalho e da divisão sexual do poder; e, em sua dimensão simbólica, expressa-se como divisão sexual do saber.
  • 4. 15. A divisão sexualdo trabalho éuma divisão social,istoé, é uma organização social do compartilhamento do trabalho e do emprego entre dois grupos de sexo. A divisãodo trabalho entre homens e mulheres integra a divisãosocialdo trabalho, analisadapor Marx. É uma das suas modalidades,assimcomo o trabalho manual e o trabalho intelectual ou a divisão internacional do trabalho. Com estas, articula-se e interpenetra-se. 16. A divisão sexual do trabalho é a forma de divisão do trabalho social decorrente das relações sociais entre os sexos. E esta divisão é um fato prioritário para a sobrevivência da relação social entre os sexos. E é fundamental para a criação do trabalho assalariado, que conta com a disponibilidade das mulheres para o trabalho reprodutivo não pago. Os homens foram designados prioritariamente à esfera produtiva e as mulheres à esfera reprodutiva e, simultaneamente, a apropriação pelos homens das funções consideradas mais importantes (funções políticas, religiosas, militares, etc). Essa forma de divisão do trabalho entre os sexos é modulada histórica e socialmente. Ou seja,não é natural. É resultado das relações entre os sexos na história. 17. A divisão sexual do trabalho nestes moldes interessa ao capital. Para manter as desigualdades de salário e um comportamento dócil entre as operarias, é necessário utilizar formas de controle e de disciplina que articulem a subordinação operaria ao capital com a subordinação sexista da mulher. A produção se estrutura sob a base de uma divisão sexual e social que atinge salários, promoções, qualificação, escala de funções e as formas de controle da mão de obra. 18. O capital não cria subordinação das mulheres, porém a integra e reforça. Na verdade, as raízes da divisão sexual do trabalho devem ser procuradas na sociedade e na família. Por isso, é importante levar em conta a análise das condições de trabalho na fábrica com aquelas que prevalecem no mundo exterior à empresa, na casa. 19. As empresas, as escolas, os centros de formação profissional, entre outros participam da construção das relações de gênero ao fazer uso da divisão do trabalho em bases sexuais. Estamos no trabalho profissional, mas em “guetos”: predominamos sobretudo no trabalho doméstico remunerado e no setor de serviços,espaços de baixíssimaremuneração e proteção do trabalho. Os homens estão concentrados sobretudo na indústria, espaço onde predomina o trabalho formal no Brasil; e neste setor, as mulheres se destacam no pior espaço: a indústria de base técnica tradicional. Para as mulheres que conseguiram “furar bloqueios”, geralmente mulheres não negras portadoras de um diploma, que ascenderam a cargos de comando, seguem ainda nos espaços intermediários como as médias gerências. Apesar da maior escolaridade das mulheres, o alto escalão das empresas segue masculino, inclusive naquelas que passarampor um
  • 5. processo de “feminização” com a reestruturação produtiva, como o setor bancário. 20. Quando olhamos para os domicílios, percebemos que o desenvolvimento das tecnologias para uso doméstico vem tornando as tarefas menos penosas; mas, a divisão sexual do trabalho doméstico e a sua atribuição às mulheres continua intacta; há insignificante mudança na participação dos homens nas atividades domesticas e familiares inclusive entre os que defendem a democracia e a divisão igualitária do trabalho. Ao analisar a experiência soviética, Saffioti percebeu que cresceu a presença das mulheres na estrutura econômica, mas no compartilhamento do trabalho doméstico nada mudou! Segundo ela, “os homens soviéticos prestam muito menos auxílio às suas mulheres nos serviços domésticos do que o fazem os maridos ingleses e norte-americanos”. 21. A divisão sexual do poder ou o compartilhamento do poder entre os sexos, mais precisamente, aexclusãodas mulheres das esferas do poder e da decisãoé outra grande questão. O poder político formal é masculino. As mulheres estão nas lutas,nos movimentos sociais,crescesuapresença nas filiações partidárias e aos sindicatos, mas estamos subrepresentadas nos espaços de poder. Apesar das cotas de gênero, somos 10% na câmara de deputados, quando representamos maioria da população brasileira. Poucas mulheres estão nos cargos mais importantes nas direções sindicais e partidárias. Estando subrepresentadas nestes espaços, marginais serão pautas como gênero e diversidade no plano de educação, a creche como direito constitucional das crianças e como direito das mulheres e homens que trabalham, o combate à violência e, sobretudo, as políticas por maior participação política. E na reforma eleitoral que vem acontecendo no Brasil o não lugar das mulheres neste espaço foi reafirmado... 22. Por fim, e não menos importante, queremos falar sobre a divisão sexualdo saber que diz respeito ao trabalho de categorização ou a atividade simbólica das relações sociais de sexo. Os indivíduos estão divididos em categorias de sexo: homens e mulheres. Há ainda uma oposição entre o que é o masculino e o que é o feminino, com atributos, normas e valores diferenciados por sexo. Esta atividade de categorização consiste em “dar e fixar como verdade” definições sociais:estabelecero que é um homem e o que é uma mulher, estabelecer o que é trabalho de homem, o que é trabalho de mulher, o que é e o que não é trabalho. Ela produz os valores ligados ao trabalho dos homens e ao trabalho das mulheres, tendo o masculino como norma de referência. Para enfrentar esta questão, foi importante construir os núcleos de pesquisa feminista e questionar o modelo de ciência androcêntrico (que tem o masculino como norma de referência). As categorias de analise como gênero nascem desta luta. A especificidade da questão das mulheres
  • 6. 1. As mulheres não são segregadas como os outros grupos dominados; elas estão inscritas no conjunto dos sistemas sociais de idade, de classe, de raça. “Essa situação tem uma série de consequências entre as quais o fato de as mulheres não poderem, como os outros oprimidos, reservar-se um espaço próprio, coletivo ou individual” (Kergoat). 2. Falar em especificidadeépolêmica na esquerda e no movimento feminista. Mas, considero importante iniciar este debate entre nós. O que torna a opressão às mulheres específica? Mesmo considerando a heterogeneidade existente entre as mulheres, a divisão sexual do trabalho (do poder e do saber) é comum a todas as mulheres. 3. Falar em divisão sexual do trabalho é falar em antagonismo entre os sexos e, portanto, entre pessoas que se amam e tem projetos comuns, como a educação dos filhos. Homens e mulheres coexistem continuamente, vivem juntos e ‘produzem viver’ juntos. Nesta relação, tem solidariedade e tem disputa. E muitas vezes tem violência doméstica entre pessoas que dividem o mesmo espaço doméstico. Reconhecendo esta especificidade foi criada a Lei Maria da Penha com medidas como o afastamento do agressor em caso de ameaça de morte. Isto porque as mulheres em situação de violência dormem com o seu agressor. O movimento feminista e os caminhos da resistência 4. O movimento feminista é um movimento social e político, que pauta a defesa dos direitos sociais negados às mulheres, como direito à educação, ao trabalho remunerado e ao salário igual por trabalho igual, direito ao corpo e à decisão sobre sua vida reprodutiva, direito a uma vida sem violência sexual e doméstica familiar. Mas, não só isso; defende os direitos políticos das mulheres: direito ao voto, direito a disputar eleições, paridade nas eleições e instancias de direção. 5. É um movimento bastante heterogêneo, e complexo. Abriga diferentes concepções acerca do feminismo, as correntes se diferenciam do ponto de vista da estratégia e da tática. Há partidárias e não partidárias. Burguesas e marxistas... 6. No caso especifico das feministas marxistas, podemos dizer, genericamente, que, pelos motivos expostos acima, a luta feminista se estrutura a partir de três grandes eixos: 1) Luta pela inserção das mulheres no trabalho profissional e reconhecimento do trabalho doméstico como trabalho; 2) Luta pela participação política das mulheres; 3) Luta pela educação das mulheres e pela sua participação na produção do conhecimento e da cultura. As feministas nos partidos políticos e na luta pelo socialismo 7. O partido político é para as feministas marxistas um espaço importante de luta. Pelo reconhecimento de que lutas fragmentadas não terão força para derrotar o
  • 7. capital e por reconhecer a necessidade de um programa que aponte para o socialismo como saída ao capitalismo. Etc. 8. Mas, as relações de poder no interior dos partidos de esquerda existem. As hierarquias existem. Tem sido um desafio enfrentar as hierarquias entre lutas principais e lutas secundárias. Enfrentar as falsas dicotomias entre dominação simbólica versus exploração material. 9. Segundo Hirata e Kergoat “o movimento operário sempre funcionou segundo a hipótese de que a unidade política da classe trabalhadora poderia ser alcançada apesar dos conflitos e dos antagonismos de sexo. Resolver primeiro as desigualdades de classe pondo fim à exploração na luta pelo socialismo e depois resolver num segundo tempo os problemas de opressão ligados ao sexo foi essa a tradicional resposta no movimento operário internacional às reivindicações formuladas pelo movimento feminista” (1994, p. 95). 10. As feministas marxistas partidárias querem a unidade construída através da luta comum contra a exploração que o capital opera sobre o trabalho – e esta exploração é diferenciada segundo o lugar de homens e mulheres na produção. Este lugar muda de acordo com a cor do trabalho, de acordo com a idade do trabalho, de acordo com a orientação sexual do trabalho. 11. A opressão vivenciada pelas mulheres – pela suacondição de classe,racial,etária e de acordo com sua orientação sexual – não pode ser vista apenas como uma questão cultural. É cultural sim. Mas, é também uma questão econômica e política! A APS e sua contribuição à luta feminista 12. Temos nas nossas formulações posicionamentos importantes sobre as questões relacionadas às opressões. São ainda genéricas, mas importantes. Destacarei aqui o que considero definições mais importantes, tentando apontar algumas ausências (pontos para aprofundamento), e o que acho que precisa ser repensado neste debate, como por exemplo a localização destas opressões como “Questões culturais” (se entendi bem...). 13. De forma resumida, acho importante nas nossas resoluções o reconhecimento de que: 1) A transição socialista não se limita ao plano da economia e da política; 2) É preciso praticar, desde já, o combate às desigualdades e discriminações de gênero, etnia, raça, religião e orientação sexual. E pela defesa dos direitos humanos. 3) Combate este que exige aprofundamento na transição socialista com a aplicação de políticas de ação afirmativa; 4) Portanto, estas temáticas são fundamentais desde hoje para que o socialismo,de fato, abra caminho para uma fase da história que elimine estas manifestações. 14. Nas Resoluções do V ENAPS (Encontro Nacional da APS - 2012), no ponto de Estratégia, afirmamos que: “Nenhuma revolução socialista terá êxito se não assentar-se nas tradições de luta e nas características culturais do seu povo. A
  • 8. discussão sobre o sujeito histórico da revolução não se restringe às dimensões políticas e econômicas strictu senso, até porque ambas fazem parte de uma totalidade complexa, envolta na cultura dos diversos segmentos sociais que forjaram o povo brasileiro. As desigualdades raciais e de gênero fizeram, e ainda fazem, parte dos mecanismos de dominação, gerando também 512 anos de resistência.” 15. Nas resoluções de 1999 e 2004, já tínhamos afirmado que “é preciso que os socialistas tenham claro e pratiquem, desde já, o combate às desigualdades e discriminações gênero, etnia, raça, religião e orientação sexual, bem como se pautem pela defesa dos direitos humanos. Combate este que exige aprofundamento na transição socialista com a aplicação de políticas de ação afirmativa em todos os níveis. No Brasil, a opressão de gênero e etnia, especialmente dos indígenas e afro-descendentes, tem sido reproduzida, adaptada e ideologicamente disseminada no meio do povo, em cada etapa do desenvolvimento do país, desde a invasão dos portugueses. Cabe, portanto, conferir centralidade, hoje, a estas temáticas para que o socialismo,de fato, abra caminho para uma fase da história que elimine estas manifestações”. 16. No ponto de nossos objetivos estratégicos (quinto) reafirmamos: “Colocar as demandas da juventude, das idosas/os, dos negros/as, dos povos indígenas, do movimento LGBT e das mulheres como questões centrais da agenda nacional.” 17. Além disso, nas resoluções do V ENAPS sobre “Construção Partidária e Nova Cultura Política”, destacamos a necessidade de enfrentar estas questões também dentro das organizações de esquerda e populares. Ali afirmamos que: “No caso de organizações e movimentos que tem objetivos políticos mais ou menos bem definidos em perspectiva contra-hegemônica, cabe aqui discutir aquele conjunto de questões já citadas no item da cultura. Ou seja, a identificação e necessidade de combater (com vistas à ‘Nova Cultura Política’) aquele conjunto de práticas e expressões da sociedade burguesa, como o individualismo, o egoísmo, o consumismo, o autoritarismo, o mandonismo, o racismo, o machismo, a homofobia, a discriminação dos idosos, a separação entre o trabalho manual e intelectual, o personalismo, o liberalismo, o pragmatismo, o levar vantagem pessoal em tudo, o uso privado do que é coletivo, o uso da força, da fraude e da corrupção para vencer eleições e congressos etc”. 18. Carece de aprofundamento o debate sobre estas questões no PDP: Qual lugar das políticas de enfrentamento ao machismo, ao racismo e à homofobia num Programa Democrático e Popular? Como a luta feminista pode contribuir para o processo de acúmulo prolongado de forças? 19. Falta formação política que trate as opressões com a centralidade que estas questões devem ter. Não estou criticando nenhum dirigente de forma individual. Penso que é tarefa da corrente avançar neste ponto. Formar homens e mulheres
  • 9. para a construção da luta feminista nos três caminhos organizativos necessários para agirmos de modo coerente e acumular estrategicamente: APS, PSOL e as organizações da luta popular. 20. Do ponto de vistadas questões organizativas, temos mais desafios neste setorial, pois nunca tivemos uma corrente feminista - diferente da experiência de outros setoriais, como negros e negras e juventude. 21. Mas, temos condições objetivas para avançar. Os sujeitos para fazer esta luta a APS já têm: mulheres ocupando espaços importantes: 1) temos militantes nas universidades atuando com pesquisa na área dos estudos de gênero e temas relacionados à escravidão; 2) temos grandes lideranças da corrente em espaços sindicais, em diferentes categorias, em diferentes estados, sobretudo na educação, na saúde e nos bancários –base com perfil bastante feminino; 3) na juventude; 4) no movimento popular (no MSTB por exemplo a base é predominantemente composta por mulheres); 5) na Intersindical, a pasta de opressões é ocupada por uma militante da APS; 6) Na CSP Conlutas temos militantes construindo o Setorial de Mulheres; 7) temos mulheres dirigindo o PSOL; 8) e na nossa Corrente, temos paridade na direção. Será que todo este trabalho é visível para nós, ou somos invisíveis dentro da nossa corrente? Conjuntura política: avançodo conservadorismo, desorganização domovimento e retrocessos no PSOL 22. A conjuntura política é crise econômica, com desemprego estrutural prolongado e com tendência ao acirramento da luta entre os sexos pelos postos de trabalho formais, tendência apontada por alguns estudos. O momento é de ameaça aos direitos conquistados, como direitos trabalhistas e sindicais. 23. A terceirização teve as mulheres e jovens como “cobaias”, mas hoje se generaliza; e se o “PL das terceirizações” for aprovado aumentará o número de acidentes de trabalho, adoecimentos ocupacionais, aumentará o desemprego, e pais e mães da classetrabalhadora ficarão mais tempo na empresa e bem menos tempo em casa com a família. E, o que é pior: aumentará o medo de perder o emprego, dificultando a organização dos trabalhadores e trabalhadoras e a sua luta. Tudo isso com impacto bem maior sobre as mulheres. 24. A aliança do PT com partidos conservadores como PMDB e PSC fortaleceu o conservadorismo que hoje atua de forma mais organizada e com agitação política tanto no Congresso Nacional quanto na sociedade civil, com pautas homo fóbicas, estimulando o ódio e a intolerância religiosa, e viabilizando retrocessos no pouco que avançamos com o governo do PT como a inclusão de gênero e diversidade nos planos de educação. 25. A conjuntura é resistência e de reorganização dos lutadores e lutadoras. Mas, no que diz respeito ao movimento feminista, o momento ainda é de fragmentação e defensiva. Se a referência no PT já não pesa tanto para algumas, o fato da
  • 10. presidenta ser uma mulher isso ainda conta, ainda que esta presidenta esteja adotando um conjunto de medidas como as MPs 664 e 665 que atingem especialmente as mulheres mais vulneráveis como jovens e idosas. 26. Por fim, não poderia deixar de registrar o retrocesso no PSOL. O setorial de mulheres era o espaço nacional mais coletivo do partido. Toda a corrente que construía o setorial tinha representação nele, independente do seu tamanho na base. Por este setorial tocamos campanhas nacionais de combate à violência contra as mulheres, e produzimos e apresentamos às candidaturas do partido uma plataforma feminista. Até a US dar o golpe. De olho nos 5% do fundo partidário e no controle burocrático do setorial, elegeu uma delegação fraudada no Amapá; e através do DNPSOL, por um voto de diferença, impôs ao setorial a delegação fraudada; implodindo a unidade do setorial. 27. As nossas divergências não podem “liquidar” as militantes da Corrente 28. Nossas divergências teóricas e políticas vêm extrapolando nossos fóruns e listas de e-mails, expondo a corrente e suas militantes. O que precisa ser discutido e superado internamente, sem exposição pública. 29. Na Bahia, por duas vezes, divergências políticas foram pautadas nas redes sociais, com exposição das mulheres da corrente e da APS. Numa sociedade organizada de forma hierárquica e com valores machistas, racistas e homofóbicos, nossos camaradas precisam estar a serviço do combate a estes valores. Do contrário, estarão contribuindo para fortalecer estigmas contra as mulheres e contra as feministas e a violência, seja ela física ou simbólica. Ciente de que estamos sujeitos à reprodução destas praticas – porque formados nelas – devemos estar atentos, vigilantes e dispostos à autocritica; além disso, a APS precisa investir na formação política feminista e pensar medidas para tratar casos envolvendo violência de gênero e outras formas de violência entre militantes. 30. A disputa no Rio de Janeiro não pode levar a um desacumulo e à “liquidação” das nossas dirigentes feministas. Nosso desafio é fortalecer as mulheres em sua luta, estimular a sua participação. Mas, as disputas internas vêm dando espaço a outras práticas. A exemplo da tentativa de destituição e de engessamento do trabalho político de uma militante nossa, presidenta do PSOL de Nova Iguaçu, por parte de outras companheiras da direção nacional da corrente, que para isso contou com a aliança com setores fundamentalistas como o grupo de Janira Rocha; e a exemplo do ocorrido no Congresso da CSP quando as mesmas camaradas invisibilizaram a presença e a contribuição de uma companheira da APS, dirigente sindical que atua e formula sobre a política feminista para o espaço sindical. Os desafios da organização do trabalho feminista da Ação Popular Socialista  investir na formulação de um trabalho político-organizativo de cunho feminista;
  • 11.  organizar uma política de formação na teoria feminista marxista para homens e mulheres; para isso, retomar a construção do centro nacional de formação politica da corrente;  resgatar a história de resistência e de luta das mulheres nas regiões;  organizar nosso setorial, dialogando com outros setoriais da corrente: LGBT, negros e negras, juventude, sindical; e dialogando como nossa ação institucional, via mandatos;  construir nossa corrente e campo de trabalho de massas. Maria Filipa, Vive! Zilmar Alverita, Capital da Resistência, Salvador. 08 de julho de 2015.