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TIRADENTES  Olham-node longeos homens humildes.E nos ares erguea mão sem retornoque um dia os liberte. (Cecília Meirelles. Romanceiro da Inconfidência)                              PORTINARI Análise do painel Tiradentes Tiradentes,1948-1949.Têmpera/tela3,09x17,67m.Coleção: Memorial da América Latina
Trata-se da representação dos episódios e dos protagonistas principais da Inconfidência Mineira, especialmente da figura do suplício e da exaltação de Tiradentes. A encomenda da obra deu liberdade ao artista de escolher o tema que julgasse adequado ao lugar. No Colégio de Cataguases, construído sobre um projeto de Oscar Niemeyer, foi reservada uma dependência para a inserção da pintura, o saguão de entrada. Posteriormente, a obra fez parte da coleção do Palácio dos Bandeirantes, e atualmente se encontra no Memorial da América Latina, ambos em São Paulo. Como estudioso dos fatos brasileiros, Portinari, por se tratar de terra mineira, decide-se por Tiradentes. Debruça-se sobre os incidentes da Inconfidência Mineira, sobre os documentos, sobre esta história política poderosamente insuflada pelo ideal, pela ambição, pelo misticismo, pela paisagem e pelo ambiente mineiros do século XVIII, para a execução soberanamente didática em que História e Arte se conjugam. Faz Arte e História num nível comparável às pesquisas de Joaquim Pedro de Andrade no filme Os Inconfidentes e a Cecília Meirelles (talvez a melhor amostra) no Romanceiro da Inconfidência. Cecília, através de viagem, observação, leitura, consulta, conseguiu um levantamento da época histórica com uma fidelidade quase científica, "não fosse a grande asa de beleza alucinando tudo". O pintor está distante da descrição fiel “quase científica" do episódio - normalmente, como sempre age em relação aos fatos históricos, faz uma descrição livre e simbólica, sem deixar de transmitir uma mensagem verdadeira. Trata-se de uma das obras de maiores dimensões do artista. Leva quase um ano dedicando-se ao mural, que fica pronto em 1949, sendo que alguns acabamentos são feitos no próprio local de inserção da obra. Este painel completo é um tríptico, dividido em cinco cenas: Que vens tu fazer, Alferes, com tuas loucas doutrinas?Todos querem liberdade,Mas quem por ela trabalha? (Cecília Meirelles. Romanceiro da Inconfidência)
Primeira cena: começa com um grupo de mulheres acorrentadas, representando a nação brasileira sob o domínio da Metrópole. O primeiro grupo feminino aparece num corte súbito, cinematográfico. É nítida a intenção do artista de dividir este grupo em dois, um em frente do outro, em forma de leque, deixando que no seu centro se agrupem os inconfidentes. Estas mulheres têm a gravidade das personagens do coro do teatro grego; as faces apoiadas nas mãos e os cabelos para a frente choram a opressão (figuras semelhantes, ao mesmo tempo trágicas e maternais, surgem também em outros trabalhos de Portinari, principalmente no painel A Guerra). Em frente do segundo grupo de mulheres, crianças negras, igualmente acorrentadas, representam os escravos. Um detalhe constante e curioso nas obras de Portinari está diante das crianças: um baú de folha de flandres.  Os inconfidentes estão no primeiro plano. Em destaque a figura de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, uniformizado de alferes da 6a companhia do regimento de dragões de Vila Rica e, segundo rezava o regulamento militar, sem barba - um detalhe diferente da retratação usual do herói. O seu porte é de líder, em posição de alerta, "punhos de ferro" segurando, alegoricamente, a corrente do jugo, tem os traços amadurecidos da idade, que o marcavam na época da Inconfidência. Traduz a opinião que pairava sobre ele: de morrer na ação, contanto que ela se fizesse, ou de um verdadeiro herói... "Um espírito inquieto, um homem leal, esse alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha Tiradentes, herói sem medo de todo um povo". ...já vem a Jurisprudência
Segunda cena: é envolvida por planos geométricos que formam o fundo e o chão. Tal organização coloca a situação desta cena acontecendo num nível de maior distanciamento. A fisionomia dos inconfidentes novamente não é colocada de modo nítido. Percebem-se vultos que ocultam os rostos com as mãos – o plano branco que reúne estas cabeças coloca estas personagens num nível de lembranças – a lembrança interferindo na nitidez das coisas como numa espécie de "branco na memória". Como de costume, o artista procura homogeneizar a composição com o tema. Esta cena refere-se à passagem terrível da leitura da sentença. Na madrugada do dia 19 de abril de 1791, depois de quase três anos de prisão nas masmorras do Rio de Janeiro, os inconfidentes estão na sala do Oratório da Cadeia e ouvem o pronunciamento dos juízes, especialmente vindos do Reino para julgá-los. Como escrivão da Alçada, o desembargador Francisco Luís Álvares da Rocha, cercado de meirinhos, lê a sentença que condena à morte onze réus (tal pena será posteriormente comutada em degredo, com exceção da imposta a Tiradentes).
Terceira Cena: a execução de Tiradentes. É o episódio central, desenvolvido em dois lances: o do enforcamento e o do esquartejamento. E simultaneamente, em dois tempos, o passado acompanhando o testemunho histórico – retratando a cena do enforcamento – e o "presente", numa alusão histórica, mas ao mesmo tempo alegórica, trazendo bem próximos os pedaços do herói. A composição total do painel mantém um certo equilíbrio na narrativa deste episódio trágico, em parte contido pelo efeito pictural agradável da obra. Mas, sem dúvida, esta cena provoca grande impacto. À distância, Portinari compõe o enforcamento. Mais uma vez joga com a arbitrariedade no relato histórico e substitui o real factual e mesmo ótico pelo que julga essencial: a indicação do comportamento geral dos que presenciaram a cena do patíbulo. Entretanto, mantém parte das narrativas históricas alusivas ao que aconteceu no Campo de São Domingos, no dia 21 de abril de 1792: a formatura de uma parte do triângulo regular constituído por três regimentos, dando as costas para o centro, no qual estava a elevadíssima forca, com sua escada de mais de vinte degraus. Na cena distante, insistindo no "branco da memória", insinua o corpo do Tiradentes pendente sobre o patíbulo.
Quarta Cena: os quartos em postes altos. Num corte vertical repentino, lembrando o corte cinematográfico, Portinari coloca o espectador em Caminho Novo de Minas, no alto da Serra da Mantiqueira, com uma cena macabra: os quartos de Tiradentes elevados em quatro postes altos. Desta forma, colocados nos sítios da Varginha, Cebolas e outras povoações, por imposição da sentença da Alçada que condena o "abominável réu" a uma "morte para sempre", "até que o tempo os consuma".Apesar de a história documentar a atrocidade infligida a Tiradentes, a representação do episódio dos seus quartos suspensos, tão desarticulados como objetos num sonho, parece incrível! E estes dois elementos as negras aves e a flor surgem dentro do conjunto da obra, desenvolvida em oposições (o sacrifício do herói e a emancipação do povo, o próprio tratamento agradável da composição com certos aspectos trágicos da mensagem), possivelmente como dois símbolos: o da morte e o da vida, ligados à morte do herói, cujos pássaros agourentos destróem seu corpo, mas não seus ideais.
A quinta cena é uma síntese: uma diagonal abre, em destaque, uma última visão da cabeça de Tiradentes - o "posto alto", levantado por determinação da sentença, em "Vila Rica, aonde, em lugar mais público", deveria permanecer para ser consumida com o tempo. Este último lance recebe o sentimento de pessoas simples, desenvolvidas em grupo desde a altura das montanhas até o "posto alto", completando-se com a presença maternal de mulheres que choram e trazem suas crianças para se unirem às lamentações e às homenagens. Uma outra diagonal estabelece um elo entre a cabeça da mulher de alpargatas, no primeiro plano, e a cabeça do mártir no alto nicho ambas na mesma inclinação. Esta descrição pictórica está próxima também do texto de Cecília Meirelles:  em campos longos e vagostristes mulheres que ocultamseus filhos desamparados...  (Cecília Meirelles. Romanceiro da Inconfidência) A cena final é encerrada seguindo uma coerência dada pela própria narrativa do mural – que começa alegoricamente com mulheres acorrentadas, indicando o jugo e a escravidão da nação; com o sacrifício do herói, vem a esperança da libertação, indicada por um grupo de mulheres poderosas levantando as correntes arrebentadas. São testemunhas e conseqüências destes episódios. A tragédia, a miséria e a tristeza, constantemente presentes na obra de Portinari, vêm, neste mural, recapituladas, quer lembrando quadros já resolvidos, como as mulheres que lamentam a morte, ou a família de retirantes, quer analisando um fato ligado aos anseios do povo, como a luta pela emancipação.
Análise da obra - Elza Ajzenberg é diretora do Museu de Arte Contemporânea MAC/USP e Professora Titular da Escola de Comunicações e Artes – ECA/USP.  Elaboração do slide – Prof. Ana Lúcia

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Apresentação Tiradentes

  • 1. TIRADENTES Olham-node longeos homens humildes.E nos ares erguea mão sem retornoque um dia os liberte. (Cecília Meirelles. Romanceiro da Inconfidência) PORTINARI Análise do painel Tiradentes Tiradentes,1948-1949.Têmpera/tela3,09x17,67m.Coleção: Memorial da América Latina
  • 2. Trata-se da representação dos episódios e dos protagonistas principais da Inconfidência Mineira, especialmente da figura do suplício e da exaltação de Tiradentes. A encomenda da obra deu liberdade ao artista de escolher o tema que julgasse adequado ao lugar. No Colégio de Cataguases, construído sobre um projeto de Oscar Niemeyer, foi reservada uma dependência para a inserção da pintura, o saguão de entrada. Posteriormente, a obra fez parte da coleção do Palácio dos Bandeirantes, e atualmente se encontra no Memorial da América Latina, ambos em São Paulo. Como estudioso dos fatos brasileiros, Portinari, por se tratar de terra mineira, decide-se por Tiradentes. Debruça-se sobre os incidentes da Inconfidência Mineira, sobre os documentos, sobre esta história política poderosamente insuflada pelo ideal, pela ambição, pelo misticismo, pela paisagem e pelo ambiente mineiros do século XVIII, para a execução soberanamente didática em que História e Arte se conjugam. Faz Arte e História num nível comparável às pesquisas de Joaquim Pedro de Andrade no filme Os Inconfidentes e a Cecília Meirelles (talvez a melhor amostra) no Romanceiro da Inconfidência. Cecília, através de viagem, observação, leitura, consulta, conseguiu um levantamento da época histórica com uma fidelidade quase científica, "não fosse a grande asa de beleza alucinando tudo". O pintor está distante da descrição fiel “quase científica" do episódio - normalmente, como sempre age em relação aos fatos históricos, faz uma descrição livre e simbólica, sem deixar de transmitir uma mensagem verdadeira. Trata-se de uma das obras de maiores dimensões do artista. Leva quase um ano dedicando-se ao mural, que fica pronto em 1949, sendo que alguns acabamentos são feitos no próprio local de inserção da obra. Este painel completo é um tríptico, dividido em cinco cenas: Que vens tu fazer, Alferes, com tuas loucas doutrinas?Todos querem liberdade,Mas quem por ela trabalha? (Cecília Meirelles. Romanceiro da Inconfidência)
  • 3. Primeira cena: começa com um grupo de mulheres acorrentadas, representando a nação brasileira sob o domínio da Metrópole. O primeiro grupo feminino aparece num corte súbito, cinematográfico. É nítida a intenção do artista de dividir este grupo em dois, um em frente do outro, em forma de leque, deixando que no seu centro se agrupem os inconfidentes. Estas mulheres têm a gravidade das personagens do coro do teatro grego; as faces apoiadas nas mãos e os cabelos para a frente choram a opressão (figuras semelhantes, ao mesmo tempo trágicas e maternais, surgem também em outros trabalhos de Portinari, principalmente no painel A Guerra). Em frente do segundo grupo de mulheres, crianças negras, igualmente acorrentadas, representam os escravos. Um detalhe constante e curioso nas obras de Portinari está diante das crianças: um baú de folha de flandres. Os inconfidentes estão no primeiro plano. Em destaque a figura de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, uniformizado de alferes da 6a companhia do regimento de dragões de Vila Rica e, segundo rezava o regulamento militar, sem barba - um detalhe diferente da retratação usual do herói. O seu porte é de líder, em posição de alerta, "punhos de ferro" segurando, alegoricamente, a corrente do jugo, tem os traços amadurecidos da idade, que o marcavam na época da Inconfidência. Traduz a opinião que pairava sobre ele: de morrer na ação, contanto que ela se fizesse, ou de um verdadeiro herói... "Um espírito inquieto, um homem leal, esse alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha Tiradentes, herói sem medo de todo um povo". ...já vem a Jurisprudência
  • 4. Segunda cena: é envolvida por planos geométricos que formam o fundo e o chão. Tal organização coloca a situação desta cena acontecendo num nível de maior distanciamento. A fisionomia dos inconfidentes novamente não é colocada de modo nítido. Percebem-se vultos que ocultam os rostos com as mãos – o plano branco que reúne estas cabeças coloca estas personagens num nível de lembranças – a lembrança interferindo na nitidez das coisas como numa espécie de "branco na memória". Como de costume, o artista procura homogeneizar a composição com o tema. Esta cena refere-se à passagem terrível da leitura da sentença. Na madrugada do dia 19 de abril de 1791, depois de quase três anos de prisão nas masmorras do Rio de Janeiro, os inconfidentes estão na sala do Oratório da Cadeia e ouvem o pronunciamento dos juízes, especialmente vindos do Reino para julgá-los. Como escrivão da Alçada, o desembargador Francisco Luís Álvares da Rocha, cercado de meirinhos, lê a sentença que condena à morte onze réus (tal pena será posteriormente comutada em degredo, com exceção da imposta a Tiradentes).
  • 5. Terceira Cena: a execução de Tiradentes. É o episódio central, desenvolvido em dois lances: o do enforcamento e o do esquartejamento. E simultaneamente, em dois tempos, o passado acompanhando o testemunho histórico – retratando a cena do enforcamento – e o "presente", numa alusão histórica, mas ao mesmo tempo alegórica, trazendo bem próximos os pedaços do herói. A composição total do painel mantém um certo equilíbrio na narrativa deste episódio trágico, em parte contido pelo efeito pictural agradável da obra. Mas, sem dúvida, esta cena provoca grande impacto. À distância, Portinari compõe o enforcamento. Mais uma vez joga com a arbitrariedade no relato histórico e substitui o real factual e mesmo ótico pelo que julga essencial: a indicação do comportamento geral dos que presenciaram a cena do patíbulo. Entretanto, mantém parte das narrativas históricas alusivas ao que aconteceu no Campo de São Domingos, no dia 21 de abril de 1792: a formatura de uma parte do triângulo regular constituído por três regimentos, dando as costas para o centro, no qual estava a elevadíssima forca, com sua escada de mais de vinte degraus. Na cena distante, insistindo no "branco da memória", insinua o corpo do Tiradentes pendente sobre o patíbulo.
  • 6. Quarta Cena: os quartos em postes altos. Num corte vertical repentino, lembrando o corte cinematográfico, Portinari coloca o espectador em Caminho Novo de Minas, no alto da Serra da Mantiqueira, com uma cena macabra: os quartos de Tiradentes elevados em quatro postes altos. Desta forma, colocados nos sítios da Varginha, Cebolas e outras povoações, por imposição da sentença da Alçada que condena o "abominável réu" a uma "morte para sempre", "até que o tempo os consuma".Apesar de a história documentar a atrocidade infligida a Tiradentes, a representação do episódio dos seus quartos suspensos, tão desarticulados como objetos num sonho, parece incrível! E estes dois elementos as negras aves e a flor surgem dentro do conjunto da obra, desenvolvida em oposições (o sacrifício do herói e a emancipação do povo, o próprio tratamento agradável da composição com certos aspectos trágicos da mensagem), possivelmente como dois símbolos: o da morte e o da vida, ligados à morte do herói, cujos pássaros agourentos destróem seu corpo, mas não seus ideais.
  • 7. A quinta cena é uma síntese: uma diagonal abre, em destaque, uma última visão da cabeça de Tiradentes - o "posto alto", levantado por determinação da sentença, em "Vila Rica, aonde, em lugar mais público", deveria permanecer para ser consumida com o tempo. Este último lance recebe o sentimento de pessoas simples, desenvolvidas em grupo desde a altura das montanhas até o "posto alto", completando-se com a presença maternal de mulheres que choram e trazem suas crianças para se unirem às lamentações e às homenagens. Uma outra diagonal estabelece um elo entre a cabeça da mulher de alpargatas, no primeiro plano, e a cabeça do mártir no alto nicho ambas na mesma inclinação. Esta descrição pictórica está próxima também do texto de Cecília Meirelles: em campos longos e vagostristes mulheres que ocultamseus filhos desamparados... (Cecília Meirelles. Romanceiro da Inconfidência) A cena final é encerrada seguindo uma coerência dada pela própria narrativa do mural – que começa alegoricamente com mulheres acorrentadas, indicando o jugo e a escravidão da nação; com o sacrifício do herói, vem a esperança da libertação, indicada por um grupo de mulheres poderosas levantando as correntes arrebentadas. São testemunhas e conseqüências destes episódios. A tragédia, a miséria e a tristeza, constantemente presentes na obra de Portinari, vêm, neste mural, recapituladas, quer lembrando quadros já resolvidos, como as mulheres que lamentam a morte, ou a família de retirantes, quer analisando um fato ligado aos anseios do povo, como a luta pela emancipação.
  • 8. Análise da obra - Elza Ajzenberg é diretora do Museu de Arte Contemporânea MAC/USP e Professora Titular da Escola de Comunicações e Artes – ECA/USP. Elaboração do slide – Prof. Ana Lúcia