Ação do PSB contra Dilma por propaganda antecipada em pronunciamento da Copa
1. EXMO. SR. MINISTRO PRESIDENTE DO COLENDO TRIBUNAL
SUPERIOR ELEITORAL.
O PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO - PSB, por seu
Diretório Nacional, representado na forma estatutária, qualificado no
instrumento de mandato em anexo, por seu advogado, vem à presença
de V.Exa. para promover representação eleitoral contra DILMA VANA
ROUSSEFF, brasileira, separada, Presidente da República, com endereço
no Palácio do Planalto, para o que invoca os fatos e as razões de direito
que são expostos a seguir:
Objeto da Demanda
Trata-se de representação eleitoral por realização de
propaganda eleitoral antecipada pela Presidente da República Dilma
Vana Rousseff no pronunciamento de rádio e televisão em rede nacional
levado ao ar na noite de 10 de junho de 2014 (cf. mídia e a íntegra da
degravação em anexo).
Conforme será demonstrado a seguir, a representada
valeu-se da convocação de rede nacional de televisão para não apenas
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promover a si mesma, mas também para realizar nítida promoção
eleitoral de suas realizações administrativas, por meio do ataque
político aos seus adversários.
Valendo-se, ainda, da quebra da impessoalidade, que
deveria pautar a propaganda institucional, realizada nos termos do § 1º
do art. 37 da Constituição Federal, o pronunciamento realizado pela
representada consubstanciou propaganda política da presidente da
república em flagrante infringência à legislação eleitoral.
Os Fatos
A pretexto de saudar o início da "Copa do Mundo" de
Futebol, a representada, Presidente da República, convocou rede
nacional de rádio e televisão para um pronunciamento à nação.
O pronunciamento, entretanto, foi muito além das
balizas constitucionais do § 1º do art. 37 da Constituição Federal, que
impõem “caráter educativo, informativo ou de orientação social”.
Isso porque o discurso teve o objetivo de desferir
duríssimos ataques políticos a adversários, e de realizar promoção
pessoal da Presidente da Repúbica, o que é absolutamente impróprio e
ilícito em um pronunciamento à Nação. Leia-se o seguinte trecho do
discurso:
No jogo, que começa agora, os pessimistas já entram
perdendo. Foram derrotados pela capacidade de
trabalho e a determinação do povo brasileiro, que não
desiste nunca.”
A seguir, a Presidente da República menciona que o
Governo Federal estaria entregando diversas obras e serviços que vêm
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sendo objeto de crítica por parte da sociedade e da oposição por conta
dos atrasos e imperfeições notórias.
No que interessa à presente demanda, contudo, vê-se
que a Presidente utilizou do espaço de prestação de contas
constitucional para um ataque aos próprios críticos do Governo Federal,
como se fosse lícito tomar este espaço para esta reação política.
Com o devido acatamento, qual o sentido de um
pronunciamento à Nação, dirigido, portanto a todos do povo, para se
falar em pessimistas derrotados?
Evidentemente que não se está diante de uma mera
prestação de contas de realizações administrativas para a Copa, mas
sim de verdadeiro libelo de defesa do Governo e, sobretudo, de ataque
àqueles que ousaram desferir críticas aos desperdícios e descontroles
com as obras mal feitas ou inacabadas a propósito desse campeonato
mundial.
Basta a oitiva do pronunciamento oficial para
verificar a virulência do discurso, que teve endereço certeiro: atacar as
vozes da oposição que se somaram às vozes da sociedade nas críticas ao
Governo Federal:
“Os pessimistas diziam que não teríamos Copa porque
não teríamos estádios. Os estádios estão aí, prontos.
Diziam que não teríamos Copa porque não teríamos os
aeroportos. Praticamente, dobramos a capacidade dos
nossos aeroportos. Eles estão prontos para atender quem
vier nos visitar; prontos para dar conforto a milhões de
brasileiros.
Chegaram a dizer que iria haver racionamento de
energia. Quero garantir a vocês: não haverá falta de
luz na Copa, nem depois dela. O nosso sistema elétrico é
robusto, é seguro, porque trabalhamos muito para isso.
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Chegaram também ao ridículo de prever uma epidemia
de dengue na Copa em pleno inverno no Brasil!”
A estratégia de comunicação é sórdida quando se vê o
uso dos recursos públicos na sua execução: Dilma tenta estabelecer
uma divisão entre os que seriam "a favor" da copa daqueles que seriam
"contra" a copa e contra o governo.
Numa propaganda político partidária seria um
sofisma ingênuo e mal engendrado. Num pronunciamento presidencial
à nação a conduta não passa de um grave desvio de recursos públicos
para a realização de uma propaganda política absolutamente imprópria
em ano que a presidente disputa a sua reeleição.
De uma lado apresenta-se o governo Dilma, em
“defesa” da Copa e dos volumosos gastos com infraestrutura e de outro
as oposições, taxadas de “pessimistas” e pregadoras de previsões
“ridículas”...
Este é o quadro, em que todos aqueles que se opõe ao
Governo Dilma são retratados como inimigos que teriam sido
"derrotados".
São notórias as críticas políticas que têm sofrido o
governo federal que elegeu prioridades duvidosas nas obras que realizou
a propósito da chamada Copa do Mundo. Também são notórias as
críticas da sociedade à morosidade e incompetência na realização
dessas obras que sequer terminaram.
Por outro lado, é inegável a legitimidade dessas
críticas, que se voltaram contra a priorização de certos gastos em
prejuízo das mais variadas carências sociais e administrativas urgentes
e que demandavam recursos do Governo Federal.
Mas essa discussão sobre prioridades não poderia
jamais permear um pronunciamento público da Presidente da
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República em rede nacional, notadamente em ano eleitoral em que a
mesma disputa a reeleição.
A Presidente da República convocou cadeia nacional
de rádio e TV para responder a essas críticas de natureza política e
que são compartilhadas por milhares, senão alguns milhões de
brasileiros.
Os críticos do governo foram rotulados como
“pessimistas” pela Presidente e por ela foram colocados em seu “devido
lugar”. Aqueles que se opõem à Presidente Dilma foram por ela
apontados como se fossem uma verdadeira facção apartada.
Em suma, a presidente, do alto de sua função de
Estadista, apequenou o cargo para ser a presidente dos seus próprios
amigos e partidários, como se todos os brasileiros que a criticam fossem
parte de uma facção de pessimistas que merece ser derrotada.
É assustador que num discurso presidencial, dirigido
a todos os brasileiros, a própria Chefe do Estado tenha concitado seus
ouvintes a se mobilizar contra supostos adversários: o próprio povo
brasileiro que tem o direito de exigir do Governo competência, seriedade
e respeito ao erário público.
Note-se, que o discurso chegou ao cúmulo de atacar
pessoas que teriam chegado ao “ridículo de prever uma epidemia de
dengue na Copa em pleno inverno no Brasil!”
A um republicano desavisado, o discurso pareceria
próprio a um cenário de uma guerra com inimigos externos ou de uma
secessão interna conflagrada, tal a repetição e referência aos
pessimistas, adversários do povo brasileiro.
Com esta postura, é evidente que a representada não
tratou de temas administrativos, como seria próprio de uma impessoal
manifestação que observa as balizas constitucionais de um
pronunciamento oficial de um Chefe de Poder. O discurso aqui
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impugnado consubstanciou um claro manifesto político cujo objetivo
foi, assumidamente, o de buscar a continuidade de uma
administração que, como se sabe, será julgada proximamente nas
urnas eleitorais no pleito de 2014.
E não foram poucos os trechos desse discurso em
que a população foi convocada a dar continuidade ao atual governo; a
aderir as orientações políticas da representada:
“Vale lembrar, ainda, que os orçamentos da saúde e da
educação estão entre os que mais cresceram no meu
governo...”
Com todas as vênias, não é adequado a um
pronunciamento presidencial buscar valorizar a sua continuidade pela
promoção de um governo que é tratado num pronome possessivo.
O governo que presta contas num pronunciamento
nacional - deveria saber a presidente Dilma - é um governo dos
brasileiros e não de uma ocasional mandatária que deseja ser reeleita.
Esta mensagem seria totalmente lícita na propaganda
eleitoral, com a paridade de armas entre todos os concorrentes
garantida pela lei eleitoral.
Já a promoção política de uma gestão com o uso de
verbas públicas e de um espaço privilegiado, como no pronunciamento
presidencial convocado em rede nacional, convenha-se, é inaceitável:
“Nos últimos anos, nosso país promoveu um dos mais
exitosos processos de distribuição de renda, de
aumento do nível de emprego e de inclusão social.
Reduzimos a desigualdade em níveis impressionantes,
levando, em uma década, 42 milhões de pessoas à classe
média e retirando 36 milhões de brasileiros da miséria”.
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A adjetivação não é própria da informação objetiva ou
da prestação de contas: "um dos mais exitosos processos de distribuição
de renda". De resto, o que é que este autoelogio tem que ver com a
abertura dos jogos do campeonato mundial de futebol?
Como aceitar que esta promoção de um governo seja
inserida em um discurso, cujo mote é o ataque a adversários, aos
denominados “pessimistas” supostamente derrotados?
Quem tem adversários, data venia, é a política Dilma
Vana Rousseff e não o Governo Federal. Aquela será julgada nas urnas
e avaliada pela soberania popular do sufrágio. Este (o Governo) é de
todos e para todos, sendo certo que os pronunciamentos dos
mandatários que lá passam devem ocorrer de forma impessoal e sem
partidarismos.
A política Dilma Rousseff tem todo o direito de se
manifestar nos espaços partidários, eleitorais e cidadãos para suas
falas pessoais. Tem direito até mesmo às bravatas que lhe agradem,
como a de dizer que os pessimistas “foram derrotados". Já a Presidente
da República, neste espaço reservado para a sua autoridade (custeado
pelos cofres públicos), não pode valer-se de um pronunciamento oficial
para defender seus interesses políticos pessoais, concitando uns contra
outros (com diferenças reais ou artificialmente criadas), como num
embate eleitoral impróprio e desigual.
Trata-se de explícito discurso de campanha eleitoral,
em que a atual mandatária não se limita a divulgar atos já praticados
em seu governo, mas incita o povo brasileiro a se insurgir contra os
“pessimistas” que ousaram criticar as despesas do governo com a Copa.
Em suma, a mais aberta propaganda eleitoral
antecipada, com o uso da máquina administrativa em seu favor:
Faz lembrar os pesadelos de Aldous Huxley e George
Orwell que imaginavam que o Estado Absoluto poderia criar inimigos
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públicos supostamente ameaçadores para garantir a sua continuidade
no poder por meio de uma unidade artificialmente criada por guerras
psicológicas.
De resto, a crítica política a estes supostos
“adversários” constitui propaganda eleitoral negativa generalizada e
destinada a tantos quantos venham “ousar” disputar o cargo com
aquela que saberia reconhecer a “capacidade de trabalho e a
determinação do povo brasileiro, que não desiste nunca”.
Convém lembrar, contudo, que o pronunciamento
presidencial, nos termos do § 1º do art. 37 da Constituição Federal, não
é feito para atender interesse político de quem quer que seja.
Não menos grave é o uso desse pronunciamento
oficial para o exercício da defesa pessoal e política da representada.
Acuada pelas críticas, em especial quanto ao seu
desempenho, a representada usa o pronunciamento oficial da
Presidência da República para rebater críticas que lhe foram dirigidas
no campo político e partidário.
Mais uma vez, vê-se a politização do discurso
empregado pelo pronunciamento oficial, que não teve limites em valer-
se de um espaço republicano para uma defesa pessoal de interesses
políticos.
Reincidência da conduta
Conforme se verifica acima, está amplamente
demonstrada a realização da propaganda eleitoral antecipada
promovida pela representada Dilma Vana Rousseff, pré-candidata à
reeleição ao cargo de Presidente da República.
E para que não se alegue excesso de sensibilidade do
representante, convém mencionar há pouco mais de um mês, a
Presidente valeu-se da mesmo estratégia de comunicação para atacar
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seus adversários políticos e promover o seu governo em meio às
festividades do dia 1º de maio.
Do Direito e do Pedido
De norma interpretativa, contida no art. 36-B da Lei
9.504/97, muito bem delineia a conduta aqui denunciada ao dizer que:
Será considerada propaganda eleitoral antecipada a
convocação, por parte do Presidente da República,
dos Presidentes da Câmara dos Deputados, do
Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal, de
redes de radiodifusão para divulgação de atos que
denotem propaganda política ou ataques a partidos
políticos e seus filiados ou instituições. (grifos
nossos)
A natureza política e a agressividade da propaganda
que não apenas fez defesas políticas como mobilizou a população contra
supostos “adversários” se enquadra perfeitamente nessa hipótese
interpretativa do que vem a ser propaganda eleitoral a bem do
enquadramento da hipótese no proibitivo legal do art. 36, caput e no
seu § 3º, que dizem:
Art. 36. A propaganda eleitoral somente é permitida
após o dia 5 de julho do ano da eleição.
§ 3º A violação do disposto neste artigo sujeitará o
responsável pela divulgação da propaganda e,
quando comprovado o seu prévio conhecimento, o
beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco
mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), ou
ao equivalente ao custo da propaganda, se este for
maior.
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Nota-se, aliás, que nem mesmo seria necessária a
didática norma contida no art. 36-B. Para o cenário eleitoral, basta a
quebra da impessoalidade, o autoelogio e o uso da máquina pública
com o poderosíssimo voluntarismo de se convocar rede nacional para
tentar influenciar a opinião pública em favor de uma facção política
contra outra.
Em suma, a dialética eleitoral se instalou num
monólogo presidencial. Uma contradição em termos que a lei e a
constituição federal qualificam como improbidade.
Diante do exposto, é a presente para requerer a
notificação da representada para, querendo, apresentar sua defesa no
prazo legal.
Requer, ao final, após a manifestação do Ministério
Público Eleitoral, seja julgada procedente a Representação para impor à
representada, a penalidade de multa de que trata o § 3° do artigo 36 da
Lei nº 9.504, em valor máximo, tendo em vista o uso de recursos de
origem pública na prática do ilícito aqui denunciado.
Termos em que
pede deferimento.
Brasília, 11 de junho de 2014.
RICARDO PENTEADO GABRIELA ROLLEMBERG
OAB/SP 92.770 OAB-DF 25.157