1. O documento discute as informações tributárias em tratados internacionais e a possibilidade de troca dessas informações entre países, visando evitar a dupla tributação e sonegação fiscal.
2. É analisado o respaldo legal das informações fiscais no Brasil e o sigilo fiscal, bem como a necessidade de proteger a privacidade e intimidade dos contribuintes.
3. Tratados podem prever a troca de informações tributárias, mas devem respeitar as leis e limites de cada país, especialmente no que se refere ao sigilo fiscal
1. AS INFORMAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO TRATADO
Ricardo Henrique de jesus
SUMÁRIO
1, Introdução
2, Respaldo legal da informação fiscal
3, Sigilo fiscal e bancário das informações
4. Garantia individual, intimidade e privacidade
5, Informações no tratado
6, Conclusão
Estamos vivendo atualmente um período de acomodação da economia
mundial, tendente ao chamado movimento da globalização no qual algumas
nações por estratégias geopolíticas e geoeconômicas, procuram se ajustar ‘as
condições e formas de melhor 1acomodarem sua economia de mercado,
possibilitando-se assim maior lucratividade e ganho no intercâmbio e
comercialização de mercadorias e produtos internos de cada uma destas mesmas
nações como ente políticos soberanos e autônomos que são. Disto decorre, então,
a necessidade de serem formalizados acordos e convenções internacionais,
firmados através de claúsulas de tratados internacionais em matéria tributária, que
nada mais são do que instrumentos jurídicos hábeis a formalização de corpo
normativo internacional, tendendo ao ingresso no ordenamento jurídico interno de
cada uma das nações envolvidas, segundo possibilite o filtro constitucional das
mesmas.
O presente trabalho, objetiva, portanto, discutir a possibilidade do ingresso
no sistema jurídico interno de normas de tratados em matéria tributária que
considerem a possibilidade de cláusulas de trocas de informações fiscais,
evitando-se a sonegação, evasão e dupla tributação daqueles que obtém ganho e
renda no exterior...
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2. Considerou-se em primeiro momento o respaldo legal de informações
fiscais em nosso legislação para, em seguida, anlisar-se as informaçoes a nível de
tratado tributário.
Confrontou-se a possibilidade de informações tributárias, levando-se em conta o
sigilo fiscal e bancário, como forma de proteção ao direito individual, a intimidade e a
privacidade do contribuinte.
Respaldo Legal da Informação Fiscal
No exercício das suas prerrogativas de Lei a Administração Fazendária
possui em seu poder informações tributárias decorrentes da imposição legal do
Estado, imposta não só ao contribuinte quando livremente vem oferecer
informações, mas também aos terceiros que tem o dever legal para tanto, e a
própria fazenda que no decorrer de sua investigação ou diligência passa a ter
acesso aos elementos necessários às suas informações.
Dispõe o artigo 194 do CTN que a legislação tributária em função da
natureza do tributo, estabelecera a competência e o poder para a autoridade fiscal
exercer o poder de fiscalização, quer trate-se de pessoa física ou de pessoa
jurídica, imune, isenta, contribuinte ou não.
Em seqüência ao raciocínio e asseverando a garantia à imposição legal do
dever de informações, o CTN restringe a possibilidade de se limitar o direito da
administração fazendária examinar os livros, documentos e mercadorias
necessárias.
Como se vê, a administração fazendária exerce o direito de exercer a
fiscalização tributária, independente da vontade ou não do fiscalizado, posto que
trata-se de uma norma cogente, imperativa de ordem pública, não deixando
margem àquele que exerce atividade financeira.
3. Em outras linhas, aquele que tem o dever jurídico de fiscalizar não poderá
se eximir da função legal de fazê-lo, pois é dever legal do Estado observar a
realização da operação financeira, mediante a permissão legal da observância dos
elementos necessários à comprovação da atividade financeira desempenhada ou
concretizada, guardando, entretanto, o necessário e imprescindível sigilo das
informações recebidas.
SIGILO FISCAL E BANCÁRIO DAS INFORMAÇÕES
Com efeito, a Lei 8112/90 em seu artigo 116, e o artigo 198 do CTN,
assevera que é dever funcional daqueles que exercem atividade fazendária,
guardar informações colhidas ou fornecidas pelos sujeitos passivos.
Verifica-se claramente, a preocupação do legislador em preservar a
intimidade do sujeito passivo, guardando e protegendo as informações prestadas
e conseqüentemente preservando o direito individual e sua privacidade.
Antonio de Moura Borges assevera que não se vislumbra, afora no caso da
lei nº 6385, em seu artigo 28, em que se permite intercâmbio de informações, e no
que prescreve o artigo 199 do CTN, nenhum caso que faculte a possibilidade de
troca de informações pela fazenda pública com outros órgãos da administração.
No, entretanto, bom se ressaltar, que os casos de requisição pelo judiciário
serão excepcionados, e bem assim, os da comissão parlamentar de inquérito, os
de requisição do Ministério Público e os de convenções internacionais destinados
evitar a dupla tributação e evasão de rendas.
Com efeito, verifica-se que a Lei procura exercer ao máximo o respeito ao
sigilo das informações, sendo, portanto, este a regra enquanto que a troca de
informações é a exceção.
4. Logo, temos que quando a Fazenda desvirtua o alcance do que determina a
Lei, fornecendo dados sobre contribuintes e terceiros que não estavam previstos
em Lei, foge do conteúdo de legitimidade das suas prerrogativas de órgão
fiscalizador, eis que fere frontalmente o direito individual de intimidade daquele
que tem direito ao sigilo de suas informações pessoais.
A lei 8021, de 12 de abril de 1990, que disciplina obtenção de informações e
o valor do exame, por autoridade fiscal, de documentos, livros e registros das
Bolsas de valores de mercadorias, dispõe que as informações contidas no art. 2º
da mesma, só serão aceitas com base no cumprimento das obrigações tributárias.
De outra parte o Decreto –Lei nº 5844/43, que dispõe sobre a cobrança
bancaria e a fiscalização, diz categoricamente que todas as pessoas que tomarem
parte nos serviços do imposto de renda são obrigadas a manter sigilo sobre a
situação de riqueza do contribuinte, sendo expressamente proibido revelar ou
utilizar para qualquer fim, o conhecimento que os servidores adquirem quanto aos
segredos dos negócios ou da profissão dos contribuintes.
No tocante ao sigilo bancário, Antonio de Moura Borges, citando a Decisão
do Supremo Tribunal Federal, em que o Relator foi o Ministro Carlos Mario
Velloso, traz in verbis o que segue:
“O Sigilo Bancário protege interesses privados, é ele espécie de direito à
privacidade, inerente`a personalidade das pessoas e que a Constituição consagra
(C.F., art.5º, x), além de atender à uma finalidade de ordem pública, qual seja a de
proteção do sistema de crédito, registra Carlos Alberto Hagstrom, forte no
magistério de G. Ruta (Lê Secret Bancarie em droit Italien, Rapprt, p. 17; Carlos
Alberto Hagstrom. ‘O Sigilo Bancário e o Poder Público”, Ver. de Direito Mercantil,
79/34). Não é ele um direito absoluto, devendo ceder, é certo, diante do interesse
público, do interesse da justiça, do interesse social, conforme, aliás, tem decidido
5. esta corte (RMS 15.925-GB, Relator o Ministro Gonçalves de Oliveira; RE nº
71.640 – BA, Relator Ministro Djaci Falcão, RTJ 59/571; MS 1.047, Relator
Ministro Ribeiro da Costa, Ver. Forense 143/154; MS 2.172, Relator Ministro
Nelson Hungria, ‘DJ’ de 5.1.54; RE nº 94.608-SP, Relator Ministro Cordeiro
Guerra, RTJ 110/195). Esse caráter não absoluto do segredo bancário, que
constitui regra em direito comparado, no sentido de que deve ele ceder
diante do interesse público, é reconhecido pela maioria dos doutrinadores.
(Carlos Alberto Hagstrom, ob. cit., pág. 37; Sérvio Carlos Covello; “O Sigilo
Bancário como ‘Proteção ‘a Intimidade’, Ver. Dos Tribs., 648/27, 29; Ary
Brandão de Oliveira, Considerações Acerca do Segredo Bancário, Ver. De
Dir. Civil, 23/144,119 ). O Segredo há de ceder, entretanto, na forma e com
observância de procedimento estabelecido em lei”.
Garantia Individual, intimidade e privacidade.
As situações em que o legislador excepciona a possibilidade de
informações fiscais, restringindo-as ao máximo, e o respeito ao sigilo das
informações de pessoas físicas e jurídicas, nada mais são do que a garantia
individual dada ao contribuinte de ver guardado segredo sobre a sua intimidade e
privacidade .
É, portanto, o princípio constitucional da inviolabilidade das garantias
individuais, da intimidade e da privacidade, a prerrogativa dada ao titular do direito
de ver o Aparato Estatal, eximir-se momentaneamente da sua potestade ante a
individualidade daquele que é detentor do direito.
No dizer de Celso Ribeiro Bastos, a intimidade e a privacidade consiste no
direito que o indivíduo tem de obstar a intromissão de estranhos na sua vida
6. privada e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso à informações sobre a
privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgados informações
sobre esta área da manifestação existencial do ser humano.
Dentro deste diapasão merece transcrição a norma constitucional e a
legislação infraconstitucional in verbis.
“ Art. 5º...
Inciso X – são invioláveis a intimidade, a vida privada...;
Inciso XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações
telefônicas...;
Art. 145 do CTN...
& 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão
graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultando a
administração tributária, ...identificar, respeitados os direitos individuais...
INFORMAÇÕES NO TRATADO .
O Código Tributário, no seu art. 98, como Legislação Especial, recepciona o
Tratado como fonte de Direito Interno, tornando-o, inclusive, com força imperativa
de Lei de conteúdo revogador e modificador da Legislação Interna que, deve
respeitar as Normas de Tratados incorporadas e recepcionadas pelo ordenamento
jurídico pátrio em Matéria Tributária, mesmo que esta mesma Legislação Interna
sofra alterações.
O problema maior reside quando tratamos de tratados que trazem em
específico a possibilidade de trocas de informações tendentes a evitar a dupla
tributação e a prevenir a evasão tributária em matéria de imposto de renda.
7. Pois bem, a pretexto do suso citado, institui a Convenção da Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico da Organização das Nações
Unidas no seu art. 26: ““.
1. As autoridades competentes dos Estados contratantes, trocarão entre si
as informações necessárias para aplicar esta convenção ou as lei
internas dos Estados contratantes relativas aos impostos abrangidos por
esta convenção, na medida em que a tributação nelas previstas, não
seja contrária a esta convenção. A troca de informações não é
restringida pelo disposto no artigo 1º. As informações obtidas por um
Estado contratante serão consideradas secretas no mesmo modo que
as informações obtidas com base nas informações internas desse
Estado, e só poderão ser comunicadas às pessoas ou autoridades
(incluindo tribunais e autoridades administrativos) encarregadas do
lançamento ou cobrança dos impostos abrangidos por esta convenção,
ou dos procedimentos declarativos ou executivos relativos a esses
impostos ou de decisão de recursos referentes a estes impostos. Essas
pessoas ou autoridades utilizarão as informações assim obtidas apenas
para os fins referidos. Essas informações poderão ser reveladas no
decurso de audiências públicas de tribunais ou de sentença judicial.
2. O disposto no nº 1, nunca poderá ser interpretado no sentido de impor a
um Estado contratante a obrigação:
a) de tomar medidas administrativas contrárias à sua legislação e a
sua prática administrativa ou às do outro estado contratante;
b) de fornecer informações que não possam ser obtidas com base
na sua legislação ou no âmbito da sua prática administrativa
normal ou das do outro estado contratante;
c) de transmitir informações reveladoras de segredo ou processos
comerciais, industriais ou profissionais, ou informações cuja
comunicação seja contrária à ordem pública.”“.
8. Como se vê, o Tratado com cláusula de informações tributárias deve
respeitar as restrições e limites impostos pelo ordenamento jurídico interno de
cada um dos Estados celebrantes, nos limites dos impostos objetos da convenção,
e, bem assim, nos limites em razão da competência dos Estados e da matéria,
não podendo assim colidir ou ir de encontro com as regras de legislação interna
no âmbito da prática administrativa normal de cada Estado. Também devem ser
preservadas as informações que revelem segredo dos respectivos contribuintes
conforme a ordem jurídica do Estado convenente.
Logo, verifica-se que a troca de informações destinada a evitar a dupla
tributação e a prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre a renda não
poderá ultrapassar os limites do filtro constitucional ou da ordem jurídica interna de
cada um dos Estados.
“Assim a constitucionalidade da cláusula da troca de informações inserida
em Tratados Internacionais em que o Brasil é parte, deve ser aferida verificando-se
a sua compatibilidade com denominado” direito à privacidade “, previsto no
inciso x, do artigo 5º das Constituição ao declarar invioláveis intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas. Este dispositivo constitucional tem sido
objeto de controvérsias tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, de modo a
não se afigurar fácil a tarefa de determinar-lhe o sentido de precisar-lhe o alcance.
Grande esforço intelectual destinado a esclarecer o conteúdo de tal dispositivo
constitucional, foi realizado por Técio Sampaio Ferraz Júnior, chegando a
resultados irretorquíveis, segundo este autor (0p. cit., p.143).”
“Embora os comentadores não vejam diferença entre vida privada e
intimidade (cf. Ferreira Filho, 1990: 35, Cretella Júnior, 1990: 257), pode-se
vislumbrar um diferente grau de exclusividade entre ambas. A intimidade é o
âmbito do exclusivo que alguém reserva para si, sem nenhuma repercussão
social, nem mesmo ao alcance de sua vida privada que, por isolada que seja é
sempre um viver entre os outros, na família, no trabalho, no lazer em comum.).
9. Não há um conceito absoluto de intimidade, mas é possível exemplifica-lo: o diário
íntimo, o segredo sob juramento, as próprias convicções, as situações
indefazáveis de pudor pessoal, o segredo íntimo cuja mínima publicidade
constrange. Já a vida privada envolve a proteção de formas exclusivas de
convivência. Trata-se de situações em que a comunicação é inevitável em termos
de relação de alguém que, entre si, trocam mensagens), das quais, em princípio
são excluídos terceiros. Terceiro é, por definição, o que não participa, que não
troca mensagens, está interessado em outras coisas... A vida privada pode
envolver, pois, situações de opção pessoal, como a escolha do regime de bens de
casamento, mas que, em certos momentos, podem requerer a comunicação a
terceiros (na aquisição, por exemplo, de um bem imóvel). Por aí, ela difere da
intimidade que não experimenta esta forma de repercussão.
Já a honra e a imagem têm ostensivamente um sentido comunicacional que
inevitavelmente envolve terceiros. Ambos, especialmente a imagem, são
situações personalíssimas perante os outros. Direito à honra é assim, direito de
sustentar o modo pelo qual cada um supõe e deseja ser bem visto pela sociedade.
É uma combinação entre auto-respeito e respeito e respeito dos outros. A honra
se projeta na imagem que, embota de alguém, é sempre como alguém julga e
quer aparecer para os outros. O direito a imagem é o direito de não vê-la
mercantilizada, usada, sem o seu exclusivo consentimento, em proveito de outros
interesses que não os próprios.”
Ao arremate entendemos que a razão de ser das normas de tratados de
trocas de informações tributárias estão em sua compatibilidade com o respeito ao
direito individual. No entanto, não podemos nos esquecer de que o Direito
individual de privacidade, não deve e nem pode ser absoluto ante o interesse
público de trocas de informações e ante ao princípio constitucional da cooperação
entre os povos para o progresso da humanidade.
10. CONCLUSÃO
Entendemos conforme os parâmetros de Lei do Ordenamento Interno, que
a troca de informações tributárias é decorrente de imposição legal do Estado,
podendo a administração fazendária exercer o seu direito de fiscalização,
independente ou não da vontade do fiscalizado, respeitado, todavia, o sigilo das
informações por parte daqueles que que exercem a atividade fazendária.
O sigilo fiscal não é absoluto, sobretudo nos casos do art.28 da Lei nº 6385
e na Lei 5172/66, art. 199, e, bem assim nas Comissões Parlamentares de
Inquérito, nos casos de requisição do Ministério Público e da determinação da
Justiça.
O Sigilo Bancário protege interesses privados, sendo espécie de direito à
privacidade consagrado constitucionalmente no art.5º, X, não é absoluto, devendo
ele ceder, é certo, diante do interesse público, do interesse da justiça e do
interesse social.
A bem da verdade, o sigilo fiscal e bancário, estão resguardados pelo
principio constitucional da inviolabilidade das garantias individuais, da intimidade e
da privacidade, todavia tais princípios sofrem exceção quando o bem jurídico a ser
alcançado é o interesse da coletividade.
As normas de Tratado Internacional em Matéria Tributária, quando
recepcionadas pelo filtro constitucional, passam a integrar o ordemante jurídico
nacional, tendo o cunho de Lei Ordinária Federal.
Como fonte de direito do ordenamento jurídico pátrio, após recepcionadas,
podem trazer em si claúsulas de troca de informações, atinente ao controle da
11. sonegação, evasão e dupla tributação daqueles que obtém ganho e renda no
exterior.
A possibilidade da troca de informações em Tratado Tributário está
respaldada no respeito e na compatibilidade com o Direito Pátrio e com o que
dispõe o art. 26 da Convenção da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico da Organização das Nações Unidas, onde fica
estabelecido que os Estados Contratantes trocarão entre si as informações
necessárias para aplicar as Leis internas dos Estados contratantes na medida em
que a legislação neles previstas não seja contrária a esta Convenção.
Por fim, o argumento que fundamenta a troca de informaçãos é sempre o
do interesse da coletividade acima do interesse pessoal. Logo, não se pode falar
em inconstitucionalidade de informações.