04/11/2015 16h29 - Atualizado em 04/11/2015 18h23 Decisão da Justiça obriga U...
Transporte adaptado para deficiente física
1. TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2014.0000191251
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº
9158847-35.2009.8.26.0000, da Comarca de Ribeirão Preto, em
que é apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE RIBEIRAO PRETO, é
apelado MINISTERIO PUBLICO.
ACORDAM, em 1ª Câmara Extraordinária de Direito
Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade
com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmo.
Desembargadores RICARDO DIP (Presidente sem voto), MAGALHÃES
COELHO E JOSÉ LUIZ GERMANO.
São Paulo, 25 de março de 2014.
VERA ANGRISANI
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
1ª Câmara Extraordinária de Direito Público
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Va - Apelação n.º 9158847-35.2009.8.26.0000 – Ribeirão Preto
Voto nº 19657
Apelação com Revisão nº 9158847-35.2009.8.26.0000
Comarca: RIBEIRÃO PRETO
Apelante: PREFEITURA MUNICIPAL DE RIBEIRÃO PRETO
Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Juiz de 1º Grau: Dr. Paulo César Gentile
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRANSPORTE. Ação de
rito ordinário. Fornecimento de transporte
adaptado para deficiente físico. Transporte da
residência para o local onde realiza tratamento
médico. Dever constitucional do Estado. Sentença
mantida. Recurso improvido.
I- Trata-se de apelação com revisão
interposta pela PREFEITURA MUNICIPAL DE RIBEIRÃO PRETO,
nos autos da ação civil pública proposta pelo MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, visando ao cumprimento
de obrigação de fazer consistente em disponibilizar transporte
especial a Maria de Lourdes Freitas.
A sentença de fls. 174/178 julgou
procedente a demanda para condenar as rés, solidariamente, a
disponibilizar a Maria de Lourdes Freitas, transporte adaptado por
ser usuária de cadeira de rodas, objetivando transportá-la de sua
residência para o local onde se submete a tratamento de
fisioterapia, e desse local para sua residência, com acompanhante,
com pena de multa diária de cinco mil reais, em caso de
descumprimento.
Recorre o Município pretendendo a inversão
do julgado, de forma a ser reconhecida a improcedência da
demanda (fls. 187/191).
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O recurso é tempestivo e foi regularmente
processado, com apresentação de contrarrazões pela apelada às fls.
195/207.
Os autos foram redistribuídos a esta Relatora
em 21 de fevereiro de 2014, na forma da Resolução 639/2014 do
Órgão Especial deste E. Tribunal de Justiça e Portaria n.º 02/2014
da Presidência da Seção de Direito Público do Tribunal de Justiça.
É o relatório.
II- O recurso não comporta provimento.
Bem examinados os autos, pretende o autor
na presente demanda em beneficio à Maria de Lourdes Freitas,
portadora de deficiência física, transporte adaptado por ser usuária
de cadeira de rodas, visando transportá-la de sua residência para os
locais onde se submete a tratamento de saúde e de tais lugares para
sua residência.
O Estado Democrático de Direito na
atualidade precisa exercer seu papel, não podendo ficar distante dos
acontecimentos sociais. Hodiernamente, não é tão somente mero
garantidor da ordem pública e das liberdades civis. O Estado Social
(Welfare State) deve ter por objetivo proporcionar aos
cidadãos melhores condições sociais, sob a tônica do
princípio da igualdade.
Como aponta Canotilho “havemos de convir
que a problemática jurídica dos direitos sociais se encontra hoje uma
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posição desconfortável”.1
É neste contexto que se encontra o Poder
Judiciário cuja face retrata a crise do próprio Estado Democrático de
Direito.
As políticas públicas delineadas pelo
Executivo e pelo Legislativo devem observar os princípios
fundamentais e os preceitos Constitucionais e cabe ao Judiciário, em
última instância, analisar a compatibilidade daquelas com estes.
A intervenção judicial em políticas públicas,
no entanto, deve observar certas limitações, dentre as quais
podemos destacar o mínimo existencial, a razoabilidade e a reserva
do possível.
O mínimo existencial pode ser definido como
as condições mínimas de existência humana digna, que exigem
prestações positivas por parte do Estado. Tais direitos comporiam o
núcleo central que objetiva garantir a dignidade humana, ou seja,
são o núcleo duro dos direitos garantidos pela Constituição. A não
observância do mínimo existencial autoriza da intervenção do
Judiciário.
A reserva do possível, por fim, relaciona-se
com a disponibilidade financeira da administração. Ela indica tanto a
existência de disponibilidade orçamentário-financeira, quanto à
necessidade de planejamento para a execução das políticas públicas.
1
CANOTILHO, J.J. Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra
Editora, 2004, p. 100.
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Ainda, observo que a reserva do possível
(Vorbehalt des Möglichen) não se aplica a direitos exigíveis,
tais como considerados o mínimo existencial este originado
diretamente da Constituição, ou um direito subjetivo de
qualquer natureza que tenha assento em lei, isto porque,
nestes casos, estaria reduzida a zero a discricionariedade
política do legislador orçamentário, sob pena de ofensa aos
princípios do Estado de Direito e da tutela judicial efetiva.
In casu, resta claro que a impossibilidade de
locomoção do terceiro até o local onde é realizado tratamento de
saúde viola os direitos fundamentais à dignidade da pessoa humana
e à saúde, garantidos pela Constituição Federal.
Assim, correta a condenação das rés a
disponibilizar transporte adaptado a beneficiária, para que esta seja
transportada de sua residência para os locais onde se submete a
fisioterapia, e desse local para sua residência, com acompanhante.
Cabe às rés suprir tal necessidade, garantido o atendimento ao
mandamento constitucional.
A alegação da falta de recursos não afasta a
obrigação da autoridade em atender ao pedido apresentado, na
medida em que a preservação da vida e a dignidade da pessoa
humana devem prevalecer sobre outros interesses.
Neste mesmo sentido já se posicionou este
Tribunal de Justiça:
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Transporte adaptado
para deficiente Criança portadora de grave
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deficiência física e mental, que necessita de
tratamento especial para a manutenção de sua
saúde. Obrigação do Poder Público de fornecer ao
deficiente físico meio de transporte adequado que
lhe possibilite o acesso e frequência aos serviços de
saúde. Arts. 196 e 227 da Constituição Federal, art
2º, Lei Federal 7.853/89 e Leis Complementares
Municipais n 6.010/91 e n 867/99. Recursos
improcedentes.” (Apelação Cível 0161781-
56.2008.8.26.0000, 7ª Câmara de Direito Público, Rel.
Des. Nogueira Diefenthaler, Comarca de Ribeirão
Preto, j. 21/12/2009).
“PRELIMINAR - ALEGADA ILEGITIMIDADE
ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO -
DESCABIMENTO - ART. 127 DA CF QUE
FUNÇÃO INSTITUCIONAL AO PARQUET NO
QUE TOCA À DEFESA DOS DIREITOS
INDIVIDUAIS INDISPONÍVEIS - REJEIÇÃO.
PRELIMINAR ALEGADA ILEGITIMIDADE
PASSIVA DO MUNICÍPIO DE FIGURAR NO
PÓLO PASSIVO DA AÇÃO - DESCABIMENTO -
OBSERVÂNCIA DO ART. 23 DA CF
COMPETÊNCIA COMUM DOS ENTES
FEDERADOS DE CUIDAR DA SAÚDE DA
POPULAÇÃO - REJEIÇÃO. APELAÇÃO - AÇÃO
CIVIL PÚBLICA - LIMINAR CONFIRMADA PELA
SENTENÇA - FORNECIMENTO DE
TRANSPORTE COLETIVO ADEQUADO PARA
PESSOA PORTADORA DE NECESSIDADES
ESPECIAIS CABIMENTO. Em atendimento a
preceito constitucional (artigos 5, 196 e 203, IV da
CF) é direito dos pacientes portadores de
necessidades especiais obterem o fornecimento de
transporte necessário à sua locomoção para a
realização de tratamento médico. Obrigação dos
órgãos públicos de garantir atendimento salutar à
saúde da população. Decisão mantida. Recurso
negado.” (Apelação Cível 9135765-72.2009.8.26.0000
1ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Danilo
Panizza, Comarca de Ribeirão Preto, j. 22/09/2009).
“APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
Deficiente físico. Transporte. Garantia de
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acessibilidade pelos artigos 23, inciso II, 227, §2º e
244, ambos da Constituição Federal, c/c artigo 2º,
“caput”, e parágrafo único, inciso V, “a”, Lei nº
7.853/89, e artigo 16 da Lei 10.098/00. Disciplina
normativa envolvendo os portadores de deficiência
física que visa assegurar-lhes melhoria da condição
individual, social e econômica, através de
mecanismos compensatórios destinados a
superação das limitações de ordem pessoal, em
consagração ao princípio da dignidade da pessoa
humana Lei Complementar nº 867/99 e Lei nº
9.171/01 que não se prestam a atender a totalidade
dos cidadãos deficientes. Poder Judiciário que
apenas torna efetivo o direito do portador de
deficiência física. Primado constitucional da
separação dos poderes incólume. Desídia do ente
local nos atendimentos das disciplinas legais que
implica custeio do transporte individual do cidadão
deficiente. Limitação orçamentária, e mesmo de
aplicação da teoria da reserva do possível, que
cedem lugar ao bem jurídico tutelado, cuja proteção
não pode ser postergada. Precedentes. Recurso não
provido.” (Apelação Cível
0232484-75.2009.8.26.0000, 12ª Câmara de Direito
Público, Rel. Des. Osvaldo de
Oliveira, Comarca de Ribeirão Preto, j. 07/03/2012).
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RIBEIRÃO PRETO.
Pretensão de fornecimento ao beneficiário
deficiente físico de transporte adaptado para levá-lo
de sua residência até o local onde estuda e de tal
local para sua residência. ADMISSIBILIDADE:
Compete aos órgãos e às entidades do Poder
Público assegurar à pessoa portadora de deficiência
o pleno exercício de seus direitos básicos, dentre
eles o direito à saúde e ao transporte, conforme o
disposto na Lei Municipal nº 6010/91 e no artigo 2º,
parágrafo único, II, “c” e “d” da Lei nº 7.853/89 que
dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de
deficiência, sua integração social e sobre a
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência. Sentença mantida.”
ILEGITIMIDADE AD CAUSAM Ilegitimidade do
Ministério Público Direito personalíssimo de
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terceiros - DESCABIMENTO: Legitimação ativa
extraordinária do Ministério Público que se afirma
porque a questão envolve interesse individual e
indisponível. Preliminar rejeitada.
ILEGITIMIDADE PASSIVA. Fazenda Pública
Municipal que atribui a responsabilidade pelo
transporte a pessoa com deficiência à empresa
criada para administrar o transporte público. NÃO
CABIMENTO: Deveres tanto do Município quanto
da Empresa mencionada na inicial, porque cabe à
Municipalidade implementar as medidas
necessárias à efetivação dos direitos sociais
previstos na Constituição Federal, como a proteção
dos portadores de deficiência física.
PRELIMINARES REJEITADAS E RECURSO
DESPROVIDO. (Apelação Cível 0375091-
14.2009.8.26.0000, 6ª Câmara de Direito Público, Rel.
Des. Israel Góes dos Anjos, Comarca de Ribeirão
Preto, j. 30/01/2012).
“Ação Civil Pública. Transporte adaptado para
pessoa idosa, hipossuficiente e portadora
deficiência física. Pretensão de fornecimento de
transporte adaptado ao deficiente físico e seu
acompanhante para a realização de seu tratamento
de saúde. Admissibilidade. Direito à saúde
assegurado pela Constituição Federal Legitimidade
ativa ad causam do Ministério Público para
propositura da ação Legitimidade passiva ad
causam da Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto e
TRANSERP Empresa de Transporte Urbano de
Ribeirão Preto. Lei Municipal nº. 6.010/1991 e
parágrafo único, II. Manutenção da r. sentença de
procedência. Recursos não providos.” (Apelação
Cível 3004326-40.2010.8.26.0506, 13ª Câmara de
Direito Público, Rel. Des. Peiretti de Godoy,
Comarca de Ribeirão Preto, j. 19/10/2011).
“Mandamus - Saúde Pública - Cardiopatia
hipertensiva - Deficiência física - Dificuldade de
locomoção - Obrigação de Fazer - Disponibilização
de transporte municipal gratuito como condição de
continuidade do tratamento de saúde -
Admissibilidade - Garantia constitucional do direito
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à saúde que abrange os serviços médicos,
fornecimento de remédios e meio de transporte,
independentemente da situação de deficiência
física.” (Apelação Cível 0159126- 48.2007.8.26.0000,
2ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Alves
Bevilacqua, Comarca de Ribeirão Preto, j.
20/09/2011).
“SAÚDE. Portador de deficiência física e mental.
Necessidade de transporte para tratamento de
fisioterapia que deve ser suprida pelo Poder
Público. Inteligência do artigo 196 da Constituição
Federal. Recurso não provido.” (Apelação Cível
9092909- 30.2008.8.26.0000, 12ª Câmara de Direito
Público, Rel. Des. Edson Ferreira, Comarca de
Ribeirão Preto).
Em suma, não há o que reformar na r.
decisão posta em combate.
Destarte, considera-se prequestionada toda
matéria infraconstitucional e constitucional, observando-se que é
pacífico no Superior Tribunal de Justiça que, tratando-se de
prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos
dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido
decidida. E mais, os embargos declaratórios, mesmo para fins de
prequestionamento, só são admissíveis se a decisão embargada
estiver eivada de algum dos vícios que ensejariam a oposição dessa
espécie recursal (EDROMS 18205 / SP, Ministro FELIX FISCHER, DJ
08.05.2006 p. 240).
Ante o exposto, nega-se provimento ao
recurso.
VERA ANGRISANI
Relatora
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