Ferramentas Do Processo De Desenvolvimento De Produto Como Mecanismos Potencializadores Da GestãO Do Conhecimento
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3º Congresso Brasileiro de Gestão de Desenvolvimento de Produto
Florianópolis, SC – 25-27 Setembro de 2001
FERRAMENTAS DO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE PRODUTO
COMO MECANISMOS POTENCIALIZADORES DA GESTÃO DO
CONHECIMENTO
Fernanda Menezes Ferrari José Carlos de Toledo
DEP-UFSCar DEP-UFSCar
ferferrari@uol.com.br toledo@power.ufscar.br
Roberto A. Martins
DEP-UFSCar
martins@power.ufscar.br
Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar como as ferramentas e métodos utilizados no processo de
desenvolvimento de produto (PDP) podem potencializar a gestão do conhecimento neste processo, tornando-se
mecanismos fomentadores dos processos de criação e transferência de conhecimento. Para potencializar a vantagem
competitiva advinda do PDP, as organizações passam a utilizar ferramentas e métodos na gestão deste processo, como
o QFD, o DFMA, o FMEA, a Engenharia Simultânea, entre outras. Além disso, o PDP é um dos processos onde a
necessidade de gestão do conhecimento se manifesta de forma mais crítica, pois o conhecimento pode ser considerado
uma entrada essencial deste processo, um elemento-chave na transformação desta entrada e uma importante saída. As
conclusões deste trabalho ressaltam que algumas ferramentas reforçam mais os princípios e outras, mais as práticas
da gestão do conhecimento, conseguindo assim o equilíbrio necessário entre essas duas dimensões da Gestão do
Conhecimento. Com a identificação de como as ferramentas do PDP podem influenciar as dimensões da gestão do
conhecimento, é possível um direcionamento de esforços, no sentido de maximizar a gestão do conhecimento, e o
entendimento de que essa gestão não é algo distante do cotidiano das organizações.
Palavras chave: ferramentas, técnicas, processo de desenvolvimento de produto, gestão do conhecimento
1. Introdução entrada (“input”) essencial do PDP, um elemento-chave
na transformação desta entrada e uma importante saída
A tendência de crescente globalização da economia, (“output”).
o aumento da diversidade, a variedade de produtos e a Desta forma, as ferramentas do PDP podem ser
redução do ciclo de vida desses produtos no mercado consideradas importantes elementos da gestão do
fizeram com que o Processo de Desenvolvimento de conhecimento neste processo. CORSO E PAVESI (2000)
Produto (PDP) se tornasse uma importante fonte de ressaltam que essas ferramentas são “veículos” para a
vantagem competitiva (TOLEDO, 1994). A importância incorporação do conhecimento, para a alavancagem do
estratégica deste processo é justificada por situar-se na aprendizado e para a transferência do conhecimento em
interface entre a empresa e o mercado, cabendo a ele: toda a organização.
desenvolver um produto que atenda às expectativas do Neste contexto, o objetivo deste trabalho é a análise
mercado, no tempo adequado, a um custo de projeto de como as ferramentas do PDP se tornam agentes da
compatível e com facilidade de produção. gestão do conhecimento. Com esta análise é possível
O desempenho desse processo, segundo TOLEDO conscientizar as organizações da importância de certas
(1994), depende da capacidade das empresas para gerir o ferramentas e partes destas, que poderiam parecer
processo de desenvolvimento e aperfeiçoamento dos insignificantes, mas que têm relevância nos processos de
produtos e interagir com o mercado e com as fontes de criação e transferência de conhecimento do PDP.
inovação tecnológica. Primeiramente, serão destacados os elementos da
É com o intuito de maximizar essa vantagem do gestão do conhecimento que basearão a análise das
processo de desenvolvimento de produto (PDP) que as ferramentas do PDP. Em seguida, serão analisadas cada
organizações fazem uso de uma grande variedade de uma das ferramentas sob a ótica da gestão do
ferramentas durante este processo. conhecimento. A Figura 1 procura representar esta
Segundo ARAUJO (2000), essas ferramentas estrutura de análise.
(métodos, técnicas, conceitos, metodologias, etc.) são
desenvolvidas e utilizadas com o objetivo de suportar o
estabelecimento, a execução e o controle de todos os
tipos de atividades relacionadas ao desenvolvimento de
produtos, sejam elas técnicas ou gerenciais. Estas
atividades estão direta ou indiretamente relacionadas ao
conhecimento, pois o conhecimento é considerado uma
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C o n c e it o P la n e ja m e n to d o E n g e n h a r ia d o P r o je t o d o P r o d u ç ã o P i lo t o
Produto Produto Proc esso
F e r ra m e n t a s d o P D P
A N Á L I SE SO B A Ó T IC A
D A G E ST ÃO D O
C O N H E C IM E N T O
Figura 1 - Representação da estrutura de análise do artigo
2. Gestão do conhecimento • Raciocínio Sistêmico
Relacionada à disciplina Aprendizagem em Grupo,
Para o entendimento da gestão do conhecimento é pode ser citado um outro princípio da Gestão do
preciso ter claro que, como em qualquer abordagem de conhecimento, a Cultura do Compartilhamento. Este
gestão, ela é formada por princípios e práticas. Os princípio está relacionado ao modo como os membros
princípios são valores e crenças que irão nortear e “encaram” a necessidade de compartilhar o
fomentar as práticas. As práticas da gestão do conhecimento. Com este princípio busca-se a alteração da
conhecimento são as ações e alguns elementos idéia “Quem detém o conhecimento, tem o poder” para
complementares, como a infra-estrutura, que irão gerir e “Quem troca o conhecimento, detém o poder”.
disseminar o conhecimento numa organização. Além dessas disciplinas, dois outros princípios são
Cabe ressaltar que estas duas dimensões da gestão essenciais para a Gestão do conhecimento: o Clima de
do conhecimento são essenciais e devem coexistir numa Abertura e o Tratamento do Erro.
organização: é preciso desenvolver e manter os princípios O princípio do Clima de Abertura diz respeito à
fortalecedores do conhecimento e também traduzi-los em liberdade e aproveitamento dados à criatividade dos
mecanismos práticos. A falta de uma delas pode membros da organização, podendo limitar ou
desestruturar toda essa gestão, tornando-a efêmera, pois a potencializar a criação do conhecimento.
organização estará focada apenas na “filosofia” do O princípio do Tratamento do Erro está muito
conhecimento ou em práticas modistas, sem ligação com relacionado à criação do conhecimento através da
seus princípios. chamada “tentativa e erro”. Se o erro é tratado como algo
abominável, esta forma de criação pode ser penalizada.
2.1. Os princípios
2.2. As práticas
NONAKA E TAKEUCHI (apud DAVENPORT &
PRUSAK, 1999) afirmam que o poder do conhecimento Segundo DAVENPORT & PRUSAK (1999:204):
provém de valores e crenças, tanto quanto da informação “sem um método para gerir o conhecimento estruturado,
e da lógica, confirmando, assim, a importância dos o aprendizado organizacional (neste trabalho,
princípios norteadores da gestão do conhecimento. representado pelos princípios da Gestão do conhecimento)
A reflexão sobre os princípios da gestão do é por demais conceitual e abstrato para fazer alguma
conhecimento remete-se à base da teoria da diferença de longo prazo nas organizações”. É neste
Aprendizagem Organizacional, com as cinco disciplinas contexto que se insere a importância das práticas na
propostas por SENGE (1990) para as organizações Gestão do conhecimento.
voltadas para a aprendizagem. Percebe-se, realmente, O “pilar” das práticas da Gestão do Conhecimento
nestas disciplinas um caráter de princípios, pois nelas são pode ser analisado segundo alguns elementos do chamado
apresentadas as crenças que a organização voltada para a “portfolio de conhecimento” , proposto por BIRCHALL
aprendizagem deve ter e não as práticas que ela deve & TOVSTIGA (1998). Esses elementos são os seguintes :
adotar. • Conteúdo
Desta forma, assume-se, neste artigo, que os • Processo
princípios da gestão do conhecimento são baseados nas • Infra-estrutura
cinco disciplinas de SENGE (1990), a saber: BIRCHALL & TOVSTIGA (1998) definem o
• Domínio Pessoal elemento conteúdo como o conjunto de conhecimento que
• Objetivo Comum é estrategicamente importante para a empresa.
• Modelos Mentais A teoria de NONAKA & TAKEUCHI (1995) tem
• Aprendizagem em Grupo uma abordagem diferente para o conhecimento; para eles,
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o conhecimento expresso em palavras e números é apenas conhecimento estruturado, mas também viabiliza a
a “ponta do iceberg”, vendo o conhecimento como sendo transferência de conhecimento tácito entre as pessoas,
basicamente tácito, algo dificilmente visível e exprimível. como a videoconferência e o telefone (DAVENPORT E
Desta forma, o conhecimento pode ser classificado PRUSAK, 1999).
(NONAKA & TAKEUCHI, 1995) em: DAVENPORT E PRUSAK (1999) discutem
• Conhecimento Tácito: algo difícil de ser formalizado e algumas tecnologias infra-estruturais que tornam possível
comunicado aos outros. a transferência do conhecimento, entre elas os repositórios
• Conhecimento Explícito: formal e sistemático, fácil de do conhecimento explícito estruturado, os sistemas
ser comunicado aos outros. especialistas, as redes neurais, entre outras..
Estes conteúdos do conhecimento terão sua Para finalizar a discussão sobre a infra-estrutura das
dinamicidade na organização com base nos processos de práticas de Gestão do conhecimento, é importante
criação e troca do conhecimento, o segundo elemento das ressaltar que a tecnologia isoladamente não transforma
práticas da Gestão do conhecimento. uma empresa em criadora do conhecimento
BIRCHALL & TOVSTIGA (1998) conceituam o (DAVENPORT & PRUSAK, 1999). A tecnologia é
segundo elemento da análise do conhecimento como os comum no campo de distribuição do conhecimento, mas
processos pelos quais o conhecimento é administrado raramente, promove o processo de uso do conhecimento.
dentro da empresa, isto é, como ele é gerado, identificado, Também a tecnologia da informação torna-se
estocado, disseminado, usado e descartado. relativamente menos útil no que se refere à criação do
BELL (apud OLIVEIRA, 1996) propõe algumas conhecimento, que em grande medida continua sendo um
formas de aprendizagem: ato de indivíduos e grupos e de seus cérebros.
• Aprender com experiência passada. Depois de analisada a Gestão do conhecimento, o
• Aprender com os outros trabalho passa a tratar das ferramentas do processo de
• Aprender ao mudar desenvolvimento do produto, baseando a análise nos
• Aprender pela análise de desempenho elementos vistos até então.
• Aprender ao treinar
• Aprender por contratação 3. Análise das ferramentas do PDP com
• Aprender por busca (transferência de tecnologia. base na gestão do conhecimento
Informações codificadas de alguma forma que
precisam ser entendidas, incorporadas e registradas) HUSTAD (1996) classifica as ferramentas que
Estes processos citados por BELL (apud suportam o desenvolvimento de novos produtos em três
OLIVEIRA, 1996) podem ser analisados conforme a categorias: ferramentas de pesquisa de mercado,
classificação dos mecanismos proposta por NONAKA e ferramentas de projeto de engenharia e ferramentas de
TAKEUCHI (1995), que tem como base a diferenciação desenvolvimento organizacional.
entre conhecimento tácito e explícito. Entre as ferramentas de pesquisa de mercado,
• Do tácito para tácito (Socialização) HUSTAD (1996) destaca testes de conceito, focus group,
• Do tácito para explícito (Externalização) voz do cliente, pré-testes de mercado, etc. Na categoria de
• Do explícito para explícito (Combinação) ferramentas de engenharia, tem-se prototipagem rápida,
• Do explícito para tácito (Internalização) engenharia simultânea, DFMA, CAD/CAE, FMEA, entre
Esses processos e também o elemento conteúdo são outras. As ferramentas de desenvolvimento
fortemente influenciados pelos elementos da infra- organizacional são representadas pelos gerentes peso-
estrutura. pesado, equipes autogerenciáveis, organização matricial,
Segundo BIRCHALL e TOVSTIGA (1998), a infra- QFD, etc. (HUSTAD, 1996).
estrutura incorpora todos os elementos funcionais da Por uma questão de foco, este trabalho estará
empresa que suportam e facilitam a administração do concentrado em quatro ferramentas do PDP, a saber:
conhecimento. • QFD (Quality Function Deployment)
Neste trabalho, o elemento infra-estrutura estará • DFMA (Design For Manufacturing and Assembly)
focado na estrutura organizacional, na gestão de recursos • FMEA (Failure Mode and Effects Analysis)
humanos e na Tecnologia de Informação. • Engenharia simultânea
Em termos de estrutura organizacional, cabe As ferramentas QFD, DFMA e FMEA foram
ressaltar a importância dada às equipes numa estrutura de escolhidas por serem citadas (DE TONI, NASSIMBENI
gestão de conhecimento. “O verdadeiro contexto no qual & TONCHIA, 1999) entre as ferramentas e técnicas mais
ocorre grande parte da conversão do conhecimento é o disseminadas no processo de desenvolvimento de
nível de equipe” (NONAKA E TAKEUCHI, 1995). produto, sendo até mesmo recomendadas em normas de
Em termos da gestão de recursos humanos, referência, como por exemplo, a QS9000.
FLEURY & FLEURY (2000) destacam algumas Além disso, as especificidades de cada uma dessas
políticas, que podem ser potencializadoras ou limitantes quatro ferramentas acabam se complementando e
da gestão do conhecimento, como a seleção e o trazendo uma ampla cobertura, no que diz respeito ao
desenvolvimento dos recursos humanos e a remuneração processo de desenvolvimento de produto. Como será mais
destes. detalhado posteriormente, cada uma dessas técnicas e
A Tecnologia de Informação utilizada na Gestão do ferramentas representa o uso de diferentes conhecimentos
conhecimento é aquela que não apenas capta e distribui o do PDP.
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Quanto à engenharia simultânea, o seu destaque se
deve ao fato de não se tratar de uma técnica como as 3.2. FMEA
demais, se aproximando mais de uma “filosofia”, como
destaca HARTLEY (1992): engenharia simultânea é A FMEA (Failure Mode and Effects Analysis) é um
uma maneira de viver. método analítico padronizado para detectar e eliminar
A partir de então, o trabalho passa a analisar cada problemas potenciais de forma sistemática e completa
uma dessas quatro ferramentas, sempre sob a ótica da (HELMAN, 1995). Em termos de conteúdo do
gestão do conhecimento. conhecimento, esta ferramenta está focada no
conhecimento dos próprios membros do PDP, em relação
3.1. DFMA aos problemas de qualidade e desempenho do produto
advindos do projeto do produto ou do processo de
O DFMA (Design for Manufacturing and Assembly) produção.
é um método que ajuda a adequar o produto, da melhor Pelo APQP (Planejamento Avançado da Qualidade
maneira, às características da produção e montagem, do Produto), a FMEA é indicada nas fases de projeto e
procurando melhorar a qualidade e reduzir o tempo de desenvolvimento de produto (FMEA de produto) e de
manufatura-montagem (DUFOUR, 1996). processo (FMEA de processo). (GONZALES &
A própria essência do método, ao relacionar projeto MIGUEL, 2000)
e manufatura, já indica o fortalecimento do princípio A FMEA permite a hierarquização das causas dos
Raciocínio Sistêmico da gestão do conhecimento. problemas, quanto à sua importância, risco, facilidade de
Existem alguns princípios básicos do DFMA, que detecção, e estabelece parâmetros para a adoção de
direcionam as práticas e técnicas deste método. Esses medidas preventivas ou corretivas (HELMAN, 1995).
princípios são conhecimentos no estado explícito (formal e Esta ferramenta vem reforçar um dos princípios da
sistemático), mas que, provavelmente, são frutos de gestão do conhecimento: o tratamento do erro. A busca
experiência passada. Essa externalização (a passagem da por falhas pressupõe a existência de erros, e o mais
experiência, tácita, para as regras, explícitas) torna mais importante, o aprendizado com estes.
fácil a disseminação desse conhecimento entre os A análise de produtos e processos, com o intuito de
envolvidos no processo de desenvolvimento de produto. descobrir falhas, pode ser caracterizada como um
É importante ressaltar que esses princípios genéricos mecanismo de aprendizagem por busca, onde as
são direcionadores do projeto, mas as especificidades de informações codificadas na tecnologia do produto e/ou
montagem e fabricação de cada empresa também precisam processo precisam ser entendidas, incorporadas e
ser consideradas no método do DFMA. É neste ponto que registradas.
cabe ressaltar o equilíbrio que deve existir entre o A aplicação desta ferramenta é formalmente
conhecimento explícito e o tácito: os princípios do DFMA documentada, através de formulários, o que permite
são apenas facilitadores da disseminação do conhecimento, (HELMAN, 1995):
mas não devem substituir o conhecimento tácito específico • Padronizar procedimentos.
da organização, o que poderia “engessar” o seu processo de • Fazer um registro histórico de análises de falhas, que
desenvolvimento de produto. poderá posteriormente ser usado em outras revisões
Para a implementação desse método, pode-se fazer de produtos ou processos, e no encaminhamento de
uso de algumas práticas, como o projeto de um check-list ações corretivas em produtos similares.
a ser utilizado por todos os engenheiros, procedimentos • Selecionar e priorizar projetos de melhoria que
para calcular os custos (e outras performances) do sistema deverão ser conduzidos.
de produção, ou criar acesso a um “banco” de A documentação expressa a preocupação em
componentes, que são consistentes com a arquitetura do explicitar o conhecimento, que estaria tacitamente nas
produto e capazes de prover a funcionalidade requisitada pessoas que estão aplicando a FMEA, para poder, então,
(CLARK & WHELLRIGHT, 1992). disponibilizá-lo a um maior número de membros do PDP.
No parágrafo anterior, fica claro, mais uma vez, o Além disso, essa ferramenta tem em seu
papel do DFMA na externalização do conhecimento. procedimento uma preocupação explícita com o
Nesse método, as limitações e oportunidades do sistema aprendizado. Uma das fases finais da implementação da
de manufatura (equipamentos, mão de obra, materiais, FMEA é a reflexão sobre o processo, onde são verificados
etc.) são formalizadas, seja através de princípios, check- (HELMAN, 1995):
list, procedimentos ou bancos de dados, para que estejam • Se o cronograma de trabalho foi seguido
disponíveis e sejam utilizadas por todos no PDP. • Se o método de trabalho se mostrou adequado
Em resumo, o DFMA refere-se à compreensão das • Se buscou-se o consenso
interações dos elementos (processo, materiais e mão-de-
• Se as conclusões podem ser encaminhadas às chefias
obra) nos sistemas de manufatura e montagem
competentes
(conhecimento sobre a Voz da Fábrica), e à
Então, além de explicitar o conhecimento técnico
externalização, disseminação e uso destes conhecimentos
adquirido com a aplicação da ferramenta, a FMEA
no processo de desenvolvimento de produto, para otimizá-
permite uma reflexão sobre o próprio processo de
los, visando à eficiência na qualidade, custo e tempo de
aplicação, permitindo a aprendizagem com experiência
manufatura e montagem (DUFOUR, 1996).
passada. A Figura 3 traz uma representação da análise da
A Figura 2 procura representar a análise do método
ferramenta FMEA.
DFMA sob a ótica da gestão do conhecimento.
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interações entre os parâmetros de projeto, que podem
3.3. QFD indicar trade-offs potenciais.
A “casa da qualidade” completa é apenas um
Segundo CLARK E WHEELRIGHT (1992), o QFD sumário de informações, uma estrutura, através da qual a
(Quality Function Deployment) é um método utilizado equipe pode analisar e estabelecer objetivos para os
para identificar os atributos críticos para os clientes e para parâmetros críticos (CLARK E WHEELRIGHT,1992).
criar uma ligação específica entre esses atributos e os Percebe-se, então, um ciclo de conhecimento
parâmetros de projeto. Por esta definição, percebe-se que tácito-explícito na implementação do QFD. O
o conteúdo de conhecimento focalizado por esta técnica é conhecimento tácito dos membros da equipe é explicitado
o conhecimento da Voz do Cliente. na elaboração das matrizes. Mas este conhecimento
Trabalhando em uma equipe, o pessoal de marketing apenas tem valor se internalizado novamente, somado às
e os engenheiros, primeiramente, estabelecem os atributos experiências e percepções da equipe, para que esta possa
do produto que são críticos para os clientes. Essa equipe fazer as decisões adequadas.
também estabelece diferentes pesos que representam a Segundo HAUSER E CLAUSING (1988), a “casa
importância relativa dos atributos, na perspectiva dos da qualidade” é um tipo de mapa conceitual que provê
clientes. No segundo passo, o time estabelece os meios para o planejamento e comunicação interfuncional.
parâmetros de projeto críticos, que devem estar CLARK & WHEELRIGHT (1992) ressaltam que o poder
diretamente relacionados aos atributos dos clientes do QFD está justamente no fato de providenciar uma
(CLARK E WHEELRIGHT, 1992). linguagem comum e uma estrutura onde as diferentes
Através do QFD ainda são ressaltadas as percepções funções possam interagir. Esse método facilita a
dos clientes quanto aos parâmetros críticos em termos da compreensão de situações ambíguas e complexas,
própria empresa e dos concorrentes e também as identificando os gaps existentes entre o conhecimento de
marketing e de engenharia.
DFMA
• Princípios Externalização
• Check-list
• Procedimentos
• Banco
FÁBRICA
PDP • Experiências
passadas
Princípio: raciocínio sistêmico • Limitações
• Oportunidades
Figura 2 - DFMA sob a ótica da gestão do conhecimento
Externalização
Produto
Processo
Aprendizagem Disseminação do
por busca conhecimento
Princípio: tratamento do erro
Reflexão sobre o processo – Aprendizagem com experiência passada
Figura 3 - FMEA sob a ótica da gestão do conhecimento
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Apesar do QFD ser um método para sumarizar o infra-estrutura da gestão do conhecimento: a estrutura
conhecimento, a sua força não está em suas matrizes e organizacional em equipe. Essa estrutura facilita a troca
sim no reforço a interação e comunicação interfuncional; do conhecimento entre os membros, principalmente,
pode-se entender que esse método está mais relacionado quando este não é facilmente formalizado, isto é, está no
aos princípios da gestão do conhecimento do que às estado tácito.
práticas desta gestão.
O QFD está relacionado ao princípio dos Modelos 3.5. Resumo das análises
Mentais, pois faz com que as diferentes funções do PDP
coloquem suas percepções em evidência, onde são A Tabela 1 procura resumir as influências que os
encontrados os gaps de conhecimento, que procuram ser métodos e ferramentas do PDP têm nos elementos da
minimizados. gestão do conhecimento (GC).
Além disso, esse método fortalece os princípios de Cada uma dessas técnicas e ferramentas está focada
Aprendizagem em Grupo e da Cultura de num conhecimento essencial para o processo de
Compartilhamento, pois pressupõe sempre o trabalho desenvolvimento de produto; esta diversidade é
em equipe e a troca de conhecimento entre seus membros. extremamente positiva para a Gestão do Conhecimento,
A Figura 4 representa a ferramenta QFD, com base pois os processos embutidos nessas ferramentas trazem a
na análise da gestão do conhecimento. dinamicidade necessária a esses conteúdos.
Apesar de pontos em comum, é possível dividir as
3.4. Engenharia Simultânea quatro ferramentas em dois grupos, ao serem analisadas
sob a ótica da gestão do conhecimento. As ferramentas
“Engenharia Simultânea é uma abordagem DFMA e FMEA têm as suas forças centradas numa
sistemática para o desenvolvimento integrado de prática da gestão do conhecimento: a externalização.
produtos, que enfatiza o atendimento das expectativas dos Ambas procuram estruturar e formalizar o conhecimento
clientes. Inclui valores de trabalho em equipe, tais como dos envolvidos para que seja mais facilmente
cooperação, confiança e compartilhamento, de forma que disseminado. Em relação ao QFD e à Engenharia
as decisões sejam tomadas, no início do processo, em Simultânea, ambas estão focalizadas no fortalecimento
grandes intervalos de trabalho paralelo incluindo todas as dos princípios da gestão do conhecimento.
perspectivas do ciclo de vida, sincronizadas com Como o equilíbrio entre esses dois “pilares”, Prática
pequenas modificações para produzir consenso" e Princípios, é essencial para a gestão do conhecimento,
(PRASAD apud ZANCUL E ROZENFELD, 2000). cabe a organização analisar seu portfolio de ferramentas e
Os grupos previstos pela Engenharia Simultânea, práticas do PDP e direcionar seus esforços na busca deste
normalmente, são formados por engenheiros de projeto, equilíbrio.
de manufatura, pessoal de marketing, de compra e de
finanças, além dos principais fornecedores de 4. Conclusões
equipamentos e componentes (HARTLEY, 1992).
Segundo ZANCUL E ROZENFELD (2000), esta Pela análise dessas quatro ferramentas, pode-se
filosofia toma como base a sinergia entre seus agentes, concluir que há forte relacionamento entre gestão do
que devem trabalhar em equipes multifuncionais, conhecimento e as ferramentas utilizadas no processo de
formadas por pessoas de diversas áreas da empresa. Esta desenvolvimento de produto. Esta conclusão satisfaz às
equipe deve crescer e diminuir ao longo de sua existência, expectativas, pois como citado anteriormente, o
mantendo sempre um mesmo núcleo de pessoas, que conhecimento é o recurso mais importante do PDP e as
acompanham o desenvolvimento. Todo o trabalho da ferramentas utilizadas neste processo não poderiam deixar
equipe deve ser suportado por recursos, métodos e de lidar com este importante elemento.
técnicas integradas, tais como: QFD, FMEA, DFMA, Existem métodos e ferramentas do PDP que
Taguchi, etc. influenciam mais a dimensão Princípios e outros, as
A engenharia simultânea, assim como o QFD, tem Práticas da gestão do conhecimento. Neste contexto, a
mais relação com os princípios da gestão do existência dessas ferramentas de forma integrada no PDP
conhecimento do que com suas práticas. Esta abordagem é uma maneira de buscar o equilíbrio entre princípios e
não está focada em nenhum tipo de conhecimento práticas, que deve sempre existir numa abordagem de
específico do PDP; seu foco está na formação de um gestão do conhecimento.
ambiente que propicie uma intensa troca de diferentes A busca pelo relacionamento entre gestão do
conteúdos de conhecimento. conhecimento e as ferramentas do PDP, objetivo deste
Esta abordagem fortalece o princípio do Raciocínio trabalho, serviu a dois propósitos. Primeiramente,
Sistêmico, por ressaltar a visão de todo o processo, ressaltar que a gestão do conhecimento não é algo distante
envolvendo projeto, produção, venda, compra, etc. Além da realidade das empresas e sim algo que está presente em
disso, a engenharia simultânea estimula e é estimulada seu cotidiano, mesmo que de forma não consciente.
pelos princípios de Aprendizagem em Grupo e Cultura O segundo propósito é o de direcionar esforços: se
do Compartilhamento, pois todo o trabalho deve ser as organizações estiverem conscientes de que as
realizado por equipes e não indivíduos. ferramentas utilizadas no seu PDP estão reforçando
Além de fortalecer esses princípios da gestão do alguns elementos da gestão do conhecimento, poderão
conhecimento, por ter como base o trabalho em grupo, a apenas manter a utilização dessas ferramentas e focar seus
engenharia simultânea acaba reforçando um elemento da
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esforços nos elementos da gestão do conhecimento que quatro ferramentas, além de procurar outras técnicas que
não são fortalecidos diretamente. Um exemplo: no caso estejam focadas em outros conteúdos de conhecimento.
de uma organização que utilize em seu PDP as quatro A análise sob a ótica da gestão do conhecimento
ferramentas analisadas neste artigo, ela deveria focar em pode ser expandida para as demais ferramentas existentes,
práticas que estimulem a internalização dos deixando assim, oportunidades para futuros trabalhos.
conhecimentos, mecanismo pouco reforçado por estas
Aprendizagem em grupo Decisões
Modelos
Mentais
Casa da
Qualidade
Cultura do Conhecimento Conhecimento
Compartilhamento explícito tácito
Figura 4: QFD sob a ótica da gestão do conhecimento
Tabela 1: Resumo da análise das ferramentas/métodos do PDP com base na Gestão do Conhecimento
Método / Princípios da GC Conteúdo focado Processos da GC Infra-estrutura da
Ferramenta GC
DFMA • Raciocínio Sistêmico • Voz da fábrica • Aprendizagem com
experiências
passadas
• Externalização
FMEA • Tratamento do Erro • Conhecimento dos • Aprendizagem por
membros do PDP busca
• Aprendizagem com
experiências
passadas
• Externalização
QFD • Modelos Mentais • Voz dos clientes • Externalização
• Aprendizagem em grupo • Internalização
• Cultura do
Compartilhamento
Engenharia • Raciocínio sistêmico (sem foco em um • Estrutura
Simultânea • Aprendizagem em grupo conteúdo específico) organizacional
• Cultura do em equipe
Compartilhamento
5. Agradecimentos 2. BIRCHALL, D. W.; TOVSTIGA, G. Methodology
for assessing the strategic impact of a firm’s
Os autores agradecem à Fundação de Amparo à knowledge portfolio. Anais do 8º International Forum
Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), órgão on Technology Management. Grenoble. França.
financiador do mestrado da primeira autora deste artigo. 1998.
3. CLARK, K.B.; WHEELRIGHT, S.C.
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Endereço para correspondência:
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7. DE TONI, A.; NASSIMBENI, G.; TONCHIA, S. Rua São Pedro, 1025
Innovation in product development within the CEP: 13880-000 Vargem Grande do Sul – SP
electronics industry. Technovation. 19. 1999. p. 71- Fone: (19) 641-1457 Fax: (19) 641-1023
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