SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 2
Downloaden Sie, um offline zu lesen
HISTÓRIA DE UM DOMINÓ
Artur Azevedo


Perdoem-me os leitores se eu, de ordinário alegre, venho contar-lhes uma
história triste, num dia em que todos estão predispostos ao riso; mas. . . que
querem? Tenho uma natureza especial: o carnaval entristece-me, e o "Abre alas,
que quero passar" soa aos meus ouvidos como um canto de agonia e de morte.

***

Dado esse pequeno cavaco, saibam os leitores que conheço um homem, o
Abreu, que é o mais triste dos homens: só se compraz na solidão e no silêncio,
não tem amigos, vive só, e nunca ninguém o viu rir, nem mesmo sorrir.


Entretanto, esse casmurro, em chegando o carnaval, veste um dominó e sai à
rua mascarado. Isto são favas contadas todos os anos.


O ano passado um vizinho teve a curiosidade e a pachorra de mascarar-se
também para acompanhá-lo a certa distância, e observar o que ele fazia.


Era domingo gordo; toda a população estava na rua. O Abreu apeou-se do
bonde, o mesmo bonde em que vinha o curioso que o acompanhava, um bonde
do Catumbi, o bairro onde moravam ambos, e desceu com muita dificuldade a
Rua do Ouvidor. Chegando em frente à casa de um alfaiate, em cuja porta
estavam sentadas algumas donas e donzelas à espera das sociedades, parou,
encostando-se na parede da casa fronteira, e ali se deixou ficar, pegando no
grupo das senhoras os olhos, que faiscavam através dos dois buracos da
máscara de seda.


O Abreu demorou-se ali seguramente meia hora, e o vizinho, farto de esperar,
resolveu abandoná-lo, dizendo consigo: - Ora! é um esquisito!... Deixemo-lo!...


Deixou-o efetivamente, mas uma hora depois voltou, e ainda lá encontrou o
Abreu no mesmo ponto e na mesma posição em que o havia deixado. Examinou
então com mais cuidado o grupo das senhoras, e reconheceu, surpreso, que
uma delas era a mulher do Abreu.

***

Sim, que o Abreu tinha sido casado com uma bonita mulher que um dia o
abandonou para amancebar-se com um sujeito que ele supunha seu amigo, e ao
qual abrira confiadamente as portas de sua casa. O amante lá estava por trás do
grupo também à espera das sociedades. Toda a gente os supõe casados.
Desde que lhe sucedeu essa desgraça, o Abreu tornou-se triste, e sua tristeza
durou e dura ainda, porque ele amava profundamente aquela ingrata. Amava-a
tanto, que neste mundo só uma coisa lhe proporcionava um simulacro de prazer:
vê-la de perto.


Entretanto os leitores compreendem que o Abreu não poderia procurar a miúdo
tão singular espécie de consolação, e nos raros encontros fortuitos que tinha
com ela, não a encarava de modo a satisfazer aquele apetite mórbido.


Mas uma vez, há cinco anos, disseram-lhe que sua mulher tinha assistido ao
carnaval sentada à porta do alfaiate e, no ano seguinte, o Abreu, metido num
dominó alugado, foi verificar se ela escolhera o mesmo ponto. Encontrou-a, e
durante muitas horas conseguiu vê-la de perto e à vontade.


Daí por diante o infeliz marido não perdeu um carnaval, e é muito provável que
amanhã lá esteja a postos em frente à casa do alfaiate. Os leitores, com alguma
pachorra, poderão certificar-se de que este conto não é inventado.

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá
O Gato Malhado e a Andorinha SinháO Gato Malhado e a Andorinha Sinhá
O Gato Malhado e a Andorinha SinháLurdes
 
Eça de queiroz trabalho portugues
Eça de queiroz trabalho portuguesEça de queiroz trabalho portugues
Eça de queiroz trabalho portuguesPedro Martins
 
Os Maias - Cap. XIV
Os Maias - Cap. XIVOs Maias - Cap. XIV
Os Maias - Cap. XIVLuís Rita
 
Texto a disciplina do amor
Texto a disciplina do amorTexto a disciplina do amor
Texto a disciplina do amorrecyda
 
Nova versão da famosa parábola da formiga e a cigarra
Nova versão da famosa parábola da formiga e a cigarraNova versão da famosa parábola da formiga e a cigarra
Nova versão da famosa parábola da formiga e a cigarraAlexandra Machado Costa
 
O quinze, de Rachel de Queiroz - análise
O quinze, de Rachel de Queiroz - análiseO quinze, de Rachel de Queiroz - análise
O quinze, de Rachel de Queiroz - análisejasonrplima
 
Edith Piaff - Uma historia de amor
Edith Piaff - Uma historia de amorEdith Piaff - Uma historia de amor
Edith Piaff - Uma historia de amornikitasts
 
Livrinho 3º ano
Livrinho 3º anoLivrinho 3º ano
Livrinho 3º anosora_dani
 
Os 7 Magnificos
Os 7 MagnificosOs 7 Magnificos
Os 7 Magnificosascorpiona
 
Edith piaff uma-_história_de_amor2
Edith piaff uma-_história_de_amor2Edith piaff uma-_história_de_amor2
Edith piaff uma-_história_de_amor2Joe Superb
 
A cigarra e as formigas
A cigarra e as formigas A cigarra e as formigas
A cigarra e as formigas Fabiola Both
 
Artur azevedo as escuras
Artur azevedo   as escurasArtur azevedo   as escuras
Artur azevedo as escurasTulipa Zoá
 

Was ist angesagt? (20)

O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá
O Gato Malhado e a Andorinha SinháO Gato Malhado e a Andorinha Sinhá
O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá
 
Eça de queiroz trabalho portugues
Eça de queiroz trabalho portuguesEça de queiroz trabalho portugues
Eça de queiroz trabalho portugues
 
Os Maias - Cap. XIV
Os Maias - Cap. XIVOs Maias - Cap. XIV
Os Maias - Cap. XIV
 
Texto a disciplina do amor
Texto a disciplina do amorTexto a disciplina do amor
Texto a disciplina do amor
 
A disciplina do amor
A disciplina do amorA disciplina do amor
A disciplina do amor
 
Os Maias - Capítulo XI
Os Maias - Capítulo XIOs Maias - Capítulo XI
Os Maias - Capítulo XI
 
Os Maias - Capítulo XII
Os Maias - Capítulo XIIOs Maias - Capítulo XII
Os Maias - Capítulo XII
 
Nova versão da famosa parábola da formiga e a cigarra
Nova versão da famosa parábola da formiga e a cigarraNova versão da famosa parábola da formiga e a cigarra
Nova versão da famosa parábola da formiga e a cigarra
 
Os Maias - Capítulo XVI
Os Maias - Capítulo XVIOs Maias - Capítulo XVI
Os Maias - Capítulo XVI
 
Os Maias - Capítulo VIII
Os Maias - Capítulo VIIIOs Maias - Capítulo VIII
Os Maias - Capítulo VIII
 
O quinze, de Rachel de Queiroz - análise
O quinze, de Rachel de Queiroz - análiseO quinze, de Rachel de Queiroz - análise
O quinze, de Rachel de Queiroz - análise
 
Domingo sem cachorro
Domingo sem cachorroDomingo sem cachorro
Domingo sem cachorro
 
Os Maias - Capítulo VII
Os Maias - Capítulo VIIOs Maias - Capítulo VII
Os Maias - Capítulo VII
 
Edith Piaff - Uma historia de amor
Edith Piaff - Uma historia de amorEdith Piaff - Uma historia de amor
Edith Piaff - Uma historia de amor
 
Os Maias - Capítulo XIII
Os Maias - Capítulo XIIIOs Maias - Capítulo XIII
Os Maias - Capítulo XIII
 
Livrinho 3º ano
Livrinho 3º anoLivrinho 3º ano
Livrinho 3º ano
 
Os 7 Magnificos
Os 7 MagnificosOs 7 Magnificos
Os 7 Magnificos
 
Edith piaff uma-_história_de_amor2
Edith piaff uma-_história_de_amor2Edith piaff uma-_história_de_amor2
Edith piaff uma-_história_de_amor2
 
A cigarra e as formigas
A cigarra e as formigas A cigarra e as formigas
A cigarra e as formigas
 
Artur azevedo as escuras
Artur azevedo   as escurasArtur azevedo   as escuras
Artur azevedo as escuras
 

Andere mochten auch

Artur azevedo assunto para um conto
Artur azevedo   assunto para um contoArtur azevedo   assunto para um conto
Artur azevedo assunto para um contoTulipa Zoá
 
Raciocínio lógico (5)
Raciocínio lógico (5)Raciocínio lógico (5)
Raciocínio lógico (5)MARIOJR2013
 
LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+
LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+
LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+orientadoresdeestudopaic
 

Andere mochten auch (8)

A pele do lobo
A pele do loboA pele do lobo
A pele do lobo
 
Artur azevedo assunto para um conto
Artur azevedo   assunto para um contoArtur azevedo   assunto para um conto
Artur azevedo assunto para um conto
 
Machado de assis vida e obra
Machado de assis  vida e obraMachado de assis  vida e obra
Machado de assis vida e obra
 
O Realismo no Brasil
O Realismo no BrasilO Realismo no Brasil
O Realismo no Brasil
 
Machado de assis análise da obra
Machado de assis análise da obraMachado de assis análise da obra
Machado de assis análise da obra
 
Machado de Assis
Machado de AssisMachado de Assis
Machado de Assis
 
Raciocínio lógico (5)
Raciocínio lógico (5)Raciocínio lógico (5)
Raciocínio lógico (5)
 
LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+
LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+
LINGUA PORTUGUESA CADERNO DE ATIVIDADE 5º ANO_3º_e_4º_BIMESTRE-PAIC+
 

Ähnlich wie A história triste do dominó

Artur azevedo história de um soneto
Artur azevedo   história de um sonetoArtur azevedo   história de um soneto
Artur azevedo história de um sonetoTulipa Zoá
 
Artur azevedo as paradas
Artur azevedo   as paradasArtur azevedo   as paradas
Artur azevedo as paradasTulipa Zoá
 
A moreninha
A moreninhaA moreninha
A moreninhaLaguat
 
Adolfo caminha no país dos ianques
Adolfo caminha   no país dos ianquesAdolfo caminha   no país dos ianques
Adolfo caminha no país dos ianquesTulipa Zoá
 
Artur azevedo joão silva
Artur azevedo   joão silvaArtur azevedo   joão silva
Artur azevedo joão silvaTulipa Zoá
 
Artur azevedo fatalidade
Artur azevedo   fatalidadeArtur azevedo   fatalidade
Artur azevedo fatalidadeTulipa Zoá
 
Coração, cabeça e estômago análise
Coração, cabeça e estômago   análiseCoração, cabeça e estômago   análise
Coração, cabeça e estômago análiserafabebum
 
A moreninha (14)hugo
A moreninha (14)hugoA moreninha (14)hugo
A moreninha (14)hugoteresakashino
 
Artur azevedo conjugo vobis
Artur azevedo   conjugo vobisArtur azevedo   conjugo vobis
Artur azevedo conjugo vobisTulipa Zoá
 
Visita de um Amigo
Visita de um AmigoVisita de um Amigo
Visita de um AmigoEditora EME
 
Meu ideal seria escrever
Meu ideal seria escreverMeu ideal seria escrever
Meu ideal seria escreverNancy Nakamura
 
Elegia a cinco livros que falam de amor
Elegia a cinco livros que falam de amorElegia a cinco livros que falam de amor
Elegia a cinco livros que falam de amorJosé Movilha
 
Livro digital folclore professora suse mendes
Livro digital folclore professora suse mendesLivro digital folclore professora suse mendes
Livro digital folclore professora suse mendesSusete Rodrigues Mendes
 
Amor fora de série - Paulino Gil
Amor fora de série - Paulino GilAmor fora de série - Paulino Gil
Amor fora de série - Paulino GilRogerio de Paula
 

Ähnlich wie A história triste do dominó (20)

Artur azevedo história de um soneto
Artur azevedo   história de um sonetoArtur azevedo   história de um soneto
Artur azevedo história de um soneto
 
Artur azevedo as paradas
Artur azevedo   as paradasArtur azevedo   as paradas
Artur azevedo as paradas
 
A moreninha
A moreninhaA moreninha
A moreninha
 
Adolfo caminha no país dos ianques
Adolfo caminha   no país dos ianquesAdolfo caminha   no país dos ianques
Adolfo caminha no país dos ianques
 
Artur azevedo joão silva
Artur azevedo   joão silvaArtur azevedo   joão silva
Artur azevedo joão silva
 
93
9393
93
 
História Originais
História OriginaisHistória Originais
História Originais
 
Artur azevedo fatalidade
Artur azevedo   fatalidadeArtur azevedo   fatalidade
Artur azevedo fatalidade
 
Coração, cabeça e estômago análise
Coração, cabeça e estômago   análiseCoração, cabeça e estômago   análise
Coração, cabeça e estômago análise
 
Noites brancas
Noites brancasNoites brancas
Noites brancas
 
A moreninha (14)hugo
A moreninha (14)hugoA moreninha (14)hugo
A moreninha (14)hugo
 
Artur azevedo conjugo vobis
Artur azevedo   conjugo vobisArtur azevedo   conjugo vobis
Artur azevedo conjugo vobis
 
Visita de um Amigo
Visita de um AmigoVisita de um Amigo
Visita de um Amigo
 
Meu ideal seria escrever
Meu ideal seria escreverMeu ideal seria escrever
Meu ideal seria escrever
 
Elegia a cinco livros que falam de amor
Elegia a cinco livros que falam de amorElegia a cinco livros que falam de amor
Elegia a cinco livros que falam de amor
 
José de Alencar - Ao correr da pena
José de Alencar - Ao correr da penaJosé de Alencar - Ao correr da pena
José de Alencar - Ao correr da pena
 
112
112112
112
 
Livro digital folclore professora suse mendes
Livro digital folclore professora suse mendesLivro digital folclore professora suse mendes
Livro digital folclore professora suse mendes
 
Amor fora de série - Paulino Gil
Amor fora de série - Paulino GilAmor fora de série - Paulino Gil
Amor fora de série - Paulino Gil
 
Visita de um amigo
Visita de um amigoVisita de um amigo
Visita de um amigo
 

Mehr von Tulipa Zoá

MATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLES
MATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLESMATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLES
MATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLESTulipa Zoá
 
Artur azevedo o chapéu
Artur azevedo   o chapéuArtur azevedo   o chapéu
Artur azevedo o chapéuTulipa Zoá
 
Artur azevedo o califa da rua sabão
Artur azevedo   o califa da rua sabãoArtur azevedo   o califa da rua sabão
Artur azevedo o califa da rua sabãoTulipa Zoá
 
Artur azevedo o barão de pitiaçu
Artur azevedo   o barão de pitiaçuArtur azevedo   o barão de pitiaçu
Artur azevedo o barão de pitiaçuTulipa Zoá
 
Artur azevedo o badejo
Artur azevedo   o badejoArtur azevedo   o badejo
Artur azevedo o badejoTulipa Zoá
 
Artur azevedo o asa-negra
Artur azevedo   o asa-negraArtur azevedo   o asa-negra
Artur azevedo o asa-negraTulipa Zoá
 
Artur azevedo o 15 e o 17
Artur azevedo   o 15 e o 17Artur azevedo   o 15 e o 17
Artur azevedo o 15 e o 17Tulipa Zoá
 
Artur azevedo nova viagem a lua
Artur azevedo   nova viagem a luaArtur azevedo   nova viagem a lua
Artur azevedo nova viagem a luaTulipa Zoá
 
Artur azevedo na horta
Artur azevedo   na hortaArtur azevedo   na horta
Artur azevedo na hortaTulipa Zoá
 
Artur azevedo na exposição
Artur azevedo   na exposiçãoArtur azevedo   na exposição
Artur azevedo na exposiçãoTulipa Zoá
 
Artur azevedo morta que mata
Artur azevedo   morta que mataArtur azevedo   morta que mata
Artur azevedo morta que mataTulipa Zoá
 
Artur azevedo mal por mal
Artur azevedo   mal por malArtur azevedo   mal por mal
Artur azevedo mal por malTulipa Zoá
 
Artur azevedo ingenuidade
Artur azevedo   ingenuidadeArtur azevedo   ingenuidade
Artur azevedo ingenuidadeTulipa Zoá
 
Artur azevedo in extremis
Artur azevedo   in extremisArtur azevedo   in extremis
Artur azevedo in extremisTulipa Zoá
 
Artur azevedo história vulgar
Artur azevedo   história vulgarArtur azevedo   história vulgar
Artur azevedo história vulgarTulipa Zoá
 
Artur azevedo herói a força
Artur azevedo   herói a forçaArtur azevedo   herói a força
Artur azevedo herói a forçaTulipa Zoá
 
Artur azevedo fritzmac
Artur azevedo   fritzmacArtur azevedo   fritzmac
Artur azevedo fritzmacTulipa Zoá
 
Artur azevedo epaminondas
Artur azevedo   epaminondasArtur azevedo   epaminondas
Artur azevedo epaminondasTulipa Zoá
 
Artur azevedo entre a missa e o almoço
Artur azevedo   entre a missa e o almoçoArtur azevedo   entre a missa e o almoço
Artur azevedo entre a missa e o almoçoTulipa Zoá
 
Artur azevedo encontros reveladores
Artur azevedo   encontros reveladoresArtur azevedo   encontros reveladores
Artur azevedo encontros reveladoresTulipa Zoá
 

Mehr von Tulipa Zoá (20)

MATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLES
MATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLESMATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLES
MATEMÁTICA FINANCEIRA - REGRA DE TRÊS SIMPLES / JUROS SIMPLES
 
Artur azevedo o chapéu
Artur azevedo   o chapéuArtur azevedo   o chapéu
Artur azevedo o chapéu
 
Artur azevedo o califa da rua sabão
Artur azevedo   o califa da rua sabãoArtur azevedo   o califa da rua sabão
Artur azevedo o califa da rua sabão
 
Artur azevedo o barão de pitiaçu
Artur azevedo   o barão de pitiaçuArtur azevedo   o barão de pitiaçu
Artur azevedo o barão de pitiaçu
 
Artur azevedo o badejo
Artur azevedo   o badejoArtur azevedo   o badejo
Artur azevedo o badejo
 
Artur azevedo o asa-negra
Artur azevedo   o asa-negraArtur azevedo   o asa-negra
Artur azevedo o asa-negra
 
Artur azevedo o 15 e o 17
Artur azevedo   o 15 e o 17Artur azevedo   o 15 e o 17
Artur azevedo o 15 e o 17
 
Artur azevedo nova viagem a lua
Artur azevedo   nova viagem a luaArtur azevedo   nova viagem a lua
Artur azevedo nova viagem a lua
 
Artur azevedo na horta
Artur azevedo   na hortaArtur azevedo   na horta
Artur azevedo na horta
 
Artur azevedo na exposição
Artur azevedo   na exposiçãoArtur azevedo   na exposição
Artur azevedo na exposição
 
Artur azevedo morta que mata
Artur azevedo   morta que mataArtur azevedo   morta que mata
Artur azevedo morta que mata
 
Artur azevedo mal por mal
Artur azevedo   mal por malArtur azevedo   mal por mal
Artur azevedo mal por mal
 
Artur azevedo ingenuidade
Artur azevedo   ingenuidadeArtur azevedo   ingenuidade
Artur azevedo ingenuidade
 
Artur azevedo in extremis
Artur azevedo   in extremisArtur azevedo   in extremis
Artur azevedo in extremis
 
Artur azevedo história vulgar
Artur azevedo   história vulgarArtur azevedo   história vulgar
Artur azevedo história vulgar
 
Artur azevedo herói a força
Artur azevedo   herói a forçaArtur azevedo   herói a força
Artur azevedo herói a força
 
Artur azevedo fritzmac
Artur azevedo   fritzmacArtur azevedo   fritzmac
Artur azevedo fritzmac
 
Artur azevedo epaminondas
Artur azevedo   epaminondasArtur azevedo   epaminondas
Artur azevedo epaminondas
 
Artur azevedo entre a missa e o almoço
Artur azevedo   entre a missa e o almoçoArtur azevedo   entre a missa e o almoço
Artur azevedo entre a missa e o almoço
 
Artur azevedo encontros reveladores
Artur azevedo   encontros reveladoresArtur azevedo   encontros reveladores
Artur azevedo encontros reveladores
 

A história triste do dominó

  • 1. HISTÓRIA DE UM DOMINÓ Artur Azevedo Perdoem-me os leitores se eu, de ordinário alegre, venho contar-lhes uma história triste, num dia em que todos estão predispostos ao riso; mas. . . que querem? Tenho uma natureza especial: o carnaval entristece-me, e o "Abre alas, que quero passar" soa aos meus ouvidos como um canto de agonia e de morte. *** Dado esse pequeno cavaco, saibam os leitores que conheço um homem, o Abreu, que é o mais triste dos homens: só se compraz na solidão e no silêncio, não tem amigos, vive só, e nunca ninguém o viu rir, nem mesmo sorrir. Entretanto, esse casmurro, em chegando o carnaval, veste um dominó e sai à rua mascarado. Isto são favas contadas todos os anos. O ano passado um vizinho teve a curiosidade e a pachorra de mascarar-se também para acompanhá-lo a certa distância, e observar o que ele fazia. Era domingo gordo; toda a população estava na rua. O Abreu apeou-se do bonde, o mesmo bonde em que vinha o curioso que o acompanhava, um bonde do Catumbi, o bairro onde moravam ambos, e desceu com muita dificuldade a Rua do Ouvidor. Chegando em frente à casa de um alfaiate, em cuja porta estavam sentadas algumas donas e donzelas à espera das sociedades, parou, encostando-se na parede da casa fronteira, e ali se deixou ficar, pegando no grupo das senhoras os olhos, que faiscavam através dos dois buracos da máscara de seda. O Abreu demorou-se ali seguramente meia hora, e o vizinho, farto de esperar, resolveu abandoná-lo, dizendo consigo: - Ora! é um esquisito!... Deixemo-lo!... Deixou-o efetivamente, mas uma hora depois voltou, e ainda lá encontrou o Abreu no mesmo ponto e na mesma posição em que o havia deixado. Examinou então com mais cuidado o grupo das senhoras, e reconheceu, surpreso, que uma delas era a mulher do Abreu. *** Sim, que o Abreu tinha sido casado com uma bonita mulher que um dia o abandonou para amancebar-se com um sujeito que ele supunha seu amigo, e ao qual abrira confiadamente as portas de sua casa. O amante lá estava por trás do grupo também à espera das sociedades. Toda a gente os supõe casados.
  • 2. Desde que lhe sucedeu essa desgraça, o Abreu tornou-se triste, e sua tristeza durou e dura ainda, porque ele amava profundamente aquela ingrata. Amava-a tanto, que neste mundo só uma coisa lhe proporcionava um simulacro de prazer: vê-la de perto. Entretanto os leitores compreendem que o Abreu não poderia procurar a miúdo tão singular espécie de consolação, e nos raros encontros fortuitos que tinha com ela, não a encarava de modo a satisfazer aquele apetite mórbido. Mas uma vez, há cinco anos, disseram-lhe que sua mulher tinha assistido ao carnaval sentada à porta do alfaiate e, no ano seguinte, o Abreu, metido num dominó alugado, foi verificar se ela escolhera o mesmo ponto. Encontrou-a, e durante muitas horas conseguiu vê-la de perto e à vontade. Daí por diante o infeliz marido não perdeu um carnaval, e é muito provável que amanhã lá esteja a postos em frente à casa do alfaiate. Os leitores, com alguma pachorra, poderão certificar-se de que este conto não é inventado.