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Boa tarde. Obrigado pelo convite. Agradeço à autora, saúdo a editora e a
entidade que acolhe este evento.
1. O livro de Carmen Monereo aqui lançado tem o título A Empresa na Cultura.
O Teatro Amador e a Criação de Novos Públicos da Cultura. Um título extenso
reflete grande ambição. Separado por um ponto final, o título do livro propõe
dois assuntos principais, o primeiro dos quais a relação entre empresa e cultura.
Local de produção e prestação de bens e serviços, a empresa é uma organização
com objetivos e missão. Além do lucro e da remuneração dos seus colaboradores,
a empresa surge como marca traduzida em prestígio, confiança e valores. Um
destes é a cultura. A segunda parte do título do livro significa, por si, três ideias:
o teatro, a distinção entre profissional e amador e a criação de públicos.
O texto original teve um alvo específico: com ele, a autora obteve o grau de
mestre em 2010. Na altura, ele foi pensado como projeto, mas defendido como
dissertação. Há uma estrutura de texto que combina a teoria e a prática pronto a
aplicar à realidade. Uma das partes mais fortes é a análise comparativa. Do
trabalho preparado à volta de 2008-2009 e suas conclusões só faltou a sua
implementação no terreno (na Caixa Geral de Depósitos). Mas o texto é agora
aproveitado para edição e talvez sirva de suporte ao lançamento de um projeto
teatral numa empresa ou grupo empresarial.
Na minha perspetiva, a cultura empresarial reflete melhor quando tem uma
atividade dentro das chamadas indústrias criativas ou artes performativas, como o
teatro. O teatro representa um esforço duplo – o ato reflexivo e criativo (como se
diz) e o ato de representação (como se dirige ao público). No teatro, o palco é o
lugar do que se vê mas também é o bastidor, onde decorre um trabalho não
visível – preparação do texto, capacidade de comunicar, alegria pelo esforço
despendido.
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2. Quanto à obra agora presente, a autora teve uma forte preocupação de
equilibrar a parte conceptual e o lado empírico, fazendo uma proposta de
constituição de um grupo de teatro, a Caixa de Teatro. De começo, ela leva o
leitor para dois aspetos da pesquisa: 1) levantamento teórico na área da
comunicação e indústrias culturais e criativas, 2) conhecimento da literatura
sociológica de públicos de cultura. A que se faz acompanhar por uma definição
do modelo de grupo de teatro ideal. Seleciono duas ideias iniciais. Por um lado, o
projeto a levantar atenderia a uma programação simples, ainda que inovadora,
partindo de situações quotidianas da realidade empresarial com colaboradores da
empresa. No seu projeto, considerou as fases de identificação do plano,
implementação, revisão e finalização. Por outro lado, tópico imprescindível num
trabalho académico, a pergunta de partida: como pode um grupo de teatro de
amadores captar novos públicos de teatro?
3. A definição de público(s) tem muito interesse. Pelo assunto em si e pela
discussão teórica ao longo dos anos. A autora acompanha a definição de Rui
Telmo Gomes em termos de perfis sociais dos públicos: cultivados, retraídos,
ecléticos, displicentes. A diferença entre ir ao teatro e não ir ao teatro pode ser
pequena (displicente). Basta uma disposição ou uma voz amiga que nos leva ao
teatro. Mas a classificação de Rui Telmo Gomes cobre outra dimensão – a do
nível etário. Durante os anos em que se estuda na universidade, o público tende
para o eclético, a ir a qualquer manifestação cultural. Com a idade e as ocupações
profissionais e familiares, torna-se cultivado, pois tem apenas tempo para uma
atividade, o que o torna seletivo.
A autora do livro A Empresa na Cultura. O Teatro Amador e a Criação de Novos
Públicos da Cultura segue outras definições, como Jean-Pierre Esquenazi e
Stuart Hall, que não especifico aqui para não maçar. Mas chamo a atenção para
outras designações como não público e não espectadores. Já não se está no
domínio do displicente ou do retraído (o que acha que não tem cultura para ir ao
teatro). Pessoalmente, gosto da ideia provocadora de quase público em Daniel
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Dayan. Este autor francês indica o quase público como aquele que vê
passivamente televisão e não participa na discussão pública dos temas públicos.
Dayan acabou por ficar isolado, pois os cultural studies advogam a ideia de
(re)construção individual: a telenovela nunca é recebida passivamente mas
interpretada segundo a cultura e os interesses individuais.
Compreendo porque Carmen Monereo coloca o assunto dos públicos. Um novo
grupo de teatro, para além da estrutura e da escolha de repertório, tem de pensar
quem o vai ver. A ideia de fidelização tem uma conotação de marketing, mas este
é também um território da autora, pelo que o devemos receber bem. A promoção
é essencial e não é fruto das tecnologias ou do marketing. Mas defendo que uma
obra de teatro não pode ficar presa pelas preferências maioritárias. A medição de
audiências é algo a refletir muito antes de avançar qualquer medida. O teatro é
mensagem e é qualidade.
4. A segunda parte da obra é fundamental. Carmen Monereo estuda quatro
grupos de teatro amador empresarial, de modo a obter informação para
desenvolver o seu projeto em empresa do setor financeiro. De entre outros
objetivos, destaco: práticas organizacionais, divisão de tarefas e programação.
Logo no começo do livro, a autora indica as empresas que servem de guia:
EPAL, EDP, Vista Alegre e Banco de Portugal. São grandes empresas, marcas
distintivas no país e com capacidade para desenvolver atividades culturais que
prestigiam quem participa e, ao mesmo tempo, criam uma imagem forte. Para
mim, foi adequada a escolha de empresas grandes e de boa imagem nacional,
exemplos para o projeto de criação de um novo grupo teatral na empresa.
Para estabelecer uma base de análise comparativa, a investigadora fez entrevistas
com fundadores, atores encenadores e diretores artísticos, e pesquisa histórica em
arquivo das empresas, publicações internas e imprensa. Do método da autora,
realço o seguinte: ela fez entrevistas gravadas num momento e, depois,
encontrou-se com os entrevistados para correções.
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5. A análise comparativa dos quatro casos estudados serviria depois para a
apresentar do novo grupo de teatro. Para já fiquemo-nos com algumas
características dos grupos analisados: 1) diretor artístico com multifunções
(gestor cultural, programador, diretor de produção, ator), 2) opção por encenador
profissional, 3) falta de espaço próprio não ajuda a criar públicos, 4) interesse em
participar em festivais nacionais (INATEL) e internacionais.
A autora apontou aspetos divergentes e aspetos comuns em assuntos como
financiamento, programação itinerante, recinto próprio e relação atores
amadores/profissionais. Distinguiu ainda pontos fortes e fracos nos grupos de
teatro inseridos em clubes nas empresas.
A terceira parte constitui o núcleo mais importante da obra, projeto liderado por
um gestor cultural. Aqui, destaco a qualidade da parte conceptual e a ausência de
concretização. Carmen Monereo defende a criação de um grupo de teatro com
personalidade jurídica sem fins lucrativos. Nome do grupo: Caixa de Teatro.
Missão do grupo: promover a qualificação dos colaboradores inseridos no grupo
de teatro, incentivar a produção própria, a pesquisa, criar espetáculos, selecionar
um repertório. Estratégias de implementação, dados estatísticos, plano de
comunicação e divulgação, orçamento, programador cultural, equipa de produção
e objetivo de conduzir a práticas culturais regulares são elementos a destacar.
Dois comentários finais: o texto podia refletir a dificuldade financeira atual das
empresas e reflexos no apoio ao teatro. Talvez a autora possa aqui falar desse
constrangimento. A outra sugestão aponta para a relação entre grupos de teatro e
estruturas de empresas familiares, onde é essencial uma divisão clara de tarefas.
Muito obrigado pela vossa atenção. Boa tarde.