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A PEDAGOGIA DA MUDANÇA
Revisitando a Pedagogia do Oprimido de Paulo
Freire para sondar caminhos para a Mudança
em Angola

Autor: Maurílio Luciano Sabino Luiele

Luanda, Fevereiro 2014
A Pedagogia da Mudança: Revisitando a
Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire para
sondar caminhos para a Mudança em Angola

A libertação, por isto, é um parto. E um parto doloroso. O homem que nasce
deste parto é um homem novo que só é viável na e pela superação da
contradição opressores-oprimidos, que é a libertação de todos.
A superação da contradição é o parto que traz ao mundo este homem novo não
mais opressor; não mais oprimido, mas homem libertando-se.
Paulo Freire
São vários os sinais que evidenciam a instalação em Angola de um regime de cariz
autoritário, que subverteu as relações de poder, de relações democráticas entre
representantes e representados, governantes e governados, para uma relação
autocrática de dominação de uma oligarquia que, valendo-se das vantagens do poder,
distribui entre si a riqueza nacional.
A instalação de um regime desta natureza reveste-se de intencionalidade e, no caso
vertente visa proteger interesses consolidados desta oligarquia que ao considerar para
si, como legítima, a “acumulação primitiva de capital”passou a ter uma consciência
fortemente possessiva que os leva a transformar tudo o que os cerca em objectos do
seu domínio. Ter mais e cada vez mais passou a ser a divisa, mesmo que isso significa
pobreza ou mesmo miséria para a maioria. Já dizia Gandhi: “existem em nosso planeta
recursos suficientes para atender às necessidades de todos, mas, em compensação,
eles não bastarão se o objectivo for satisfazer o desejo de posse, a avidez, a cobiça,
mesmo que seja de alguns.” Afinal, “a miséria material de uns está directamente
relacionada à miséria ética, afectiva e espiritual de outros” (VIVERET, 2013).
Nesta condição,ciclos de excitação e depressão acabam impregnando o universo
político e determinar uma relação obssessiva, quase patológica, com o poder que pode
provocar a destruição da substância do tecido democrático (VIVERET, 2013), pois, para
dar vazão à sanha materialista dos detentores de poder o Estado Democrático e de
Direito se revela como um verdadeiro obstáculo, sendo por isso, necessário subvertêlo. De facto, temos vindo a assistir nos últimos anos a uma enormidade de acções que
mais não visam senão desvirtuar o processo democrático em Angola e, com isso,
subverter o Estado Democrático e de Direito.
O processo constituinte que culminou com a promulgação da Constituição de 2010 é
um destes exercícios, carregados de intencionalidade, no sentido de se transformaras
relações de poder de relações democráticas em relações de domínio absoluto que a
oligarquia enriquecida pretende para si. Com efeito, ao pugnar pelo modelo que ficou
conhecido como “atípico” pretendia-se, no fundo, um reforço considerável dos
poderes presidenciais e a desactivação do valioso sistema de “checks and balances”
entre os diferentes poderes, tão cruciais no Estado Democrático e de Direito. Desta
formadestapava-se a intensão de se consagrar uma Constituição de cunho autoritário,
onde o Legislativo e Judiciário seriam completamente rebocados e solapados pelo
Executivo.
Uma Constituição assim, longe de se constituir no espaço do consenso, passou a ser,
na verdade, o campo de conflitos extremados. Isto deriva do facto da Constituição não
ter sido a “expressão de uma limitação que a maioria impõe a si própria, contra a
voragem das paixões e dos impulsos das maiorias conjunturais”como defende
Hamilton em “O Federalista”. Muito pelo contrário, sobressai nesta Constituição o
abusivo aproveitamento da maioria conjuntural do MPLA para usurpar limites e, por
conseguinte, longe de consagrar uma “dinâmica de diálogo social” capaz de “garantir a
vitória do debate político pacífico sobre a expressão agónica das tensões e
conflitos”,segundo a perspectiva constitucional de Hamilton, a Constituição de 2010
passou a ser ela própria geradora de conflitos sociais. Com o Tribunal Constitucional
atrelado ao Executivo, com o sistema de “checks and balances”desactivado, deixou de
existir um espaço para a decisão regulada e isenta de disputas acaloradas que
emergeriam como é o caso do contencioso eleitoral.
Está assim instalada uma crise social aberta que examinada à luz do modelo marxista
pode ser descrita como uma contradição entre dominadores e dominados, “enricados”
(para não dizer ricos) e empobrecidos,

em última instância entre opressores e

oprimidos, pois, na ânsia de tudo dominar, com o fito exclusivo de manter e ampliar
suas posses, a oligarquia sufoca direitos, restringe liberdades e submete à pobreza
franjas extensas de cidadãos, em suma, oprime, já que pobreza é sofrimento, é
opressão. Reverter esta situação, o que é imperioso, antes que a crise social evolua
para explosão social descontrolada, é sobretudo superar esta contradição, ou seja,
devolver aos dominados poder para que reconquistem a liberdade e o poder efectivo
de participação nos assuntos do Estado, participação esta inviabilizada de várias
maneiras pelo regime dominador/dominante.
Analisada a situação na perspectiva da Constituição confrontamo-nos igualmente com
um grande desajuste entre os direitos consagrados e o corpo institucional edificado
para garantir esses direitos. A questão é que, a pressão exercida pelo Sr. Presidente da
República no sentido da elaboração da tal constituição atípica acabou resultando
numa obra feita as pressas, sem a devida ponderação, portanto salpicada de grosseiros
defeitos que teriam, certamente, sido evitados se o ambiente constituinte não tivesse
sido conspurcado com este elemento estranho: a imiscuição grosseira do Presidente.
Qualquer crise social deve ser sempre vista numa perspectiva multidimensional, feita
de várias camadas, que são na verdade concêntricas, mas é talvez a geometria do
fractal que melhor ilustra a relação de cada camada com o todo e do todo com cada
parte. A melhor forma de se analisar uma crise social é, portanto, guardar dela uma
visão complexa que procure abarcar tanto quanto possível as infindáveis interações e
retroações entre os diferentes componentes.
Sem perder de vista, entretanto, esta perspectiva complexa da realidade social,
parece-nos que no caso vertente, quando se isolam a dimensão estritamente social e
jurídico-constitucional percebe-se nítidamente a profundidade do fossso social que se
abriu, e que configura a crise, e palpam-se perceptivelmente as oportunidades
embutidas como potências geradoras de mudanças significativas, capazes de
re(in)verter a situação de crise. A grande potência, sem dúvida, é a vocação ontológica
do ser humano para a liberdade que o leva sempre à resistir diante de situações de
sufoco e a encontrar formas para romper os grilhões da opressão.
Nenhum outro autor terá exposto de forma tão explícita esta vocação do ser humano
para a liberdade como o fez Paulo Freire. Na sua perspectiva,esta vocação humana
para a liberdade sobrepõe-se a própria acção de humanizar e, contrapondo esta à
acção contrária argumenta que,

Humanização e desumanização dentro da história, num contexto real,
concreto, objectivo, são possibilidades dos seres humanos como seres
inconclusos e conscientes da sua inconclusão. (E diz mais) se ambas são
posssibilidades, só a primeira nos parece ser o que chamamos de vocação
dos homens. Vocação negada na injustiça, na exploração, na opressão, na
violência dos opressores. Mas afirmada no anseio de liberdade, de justiça,
de luta dos oprimidos, pela recuperação de sua humanidade roubada
(FREIRE, 2005, pág. 32).

Portanto, o que Paulo Freire sustenta é que numa situação de opressão o impulso do
oprimido para a luta é, de certa forma, natural já que a opressão desumaniza sendo,
por isso, contrária ao destino dos homens que é a humanização. Porém, Freire adverte
que,
Esta luta somente tem sentido quando os oprimidos, ao buscarem recuperar
sua humanidade, que é uma forma de criá-la, não se sentem
idealisticamente opressores, nem se tornam, de facto, opressores dos
opressores, mas restauradores da humanidade em ambos (pois entende
que) aí está a grande tarefa humanista e histórica dos oprimidos – libertarse a si e aos opressores (FREIRE, 2005, pág. 33).

Mesmo que este impulso do oprimido esteja latente, ele é muitas vezes reprimido e
não se manifesta espontaneamente na medida em que o conhecimento dos oprimidos
sobre si mesmos, que é fundamental para soltá-lo, encontra-se “prejudicado pela
“imersão” em que se encontram na realidade opressora”. Mesmo que o oprimido se
reconheça em posição contrária ao opressor isto pode não significar que tenha reunido
força interior suficiente para lutar pela superação desta contradição. Antes pelo
contrário, o envolvimento na “engrenagem da estrutura dominadora” pode levar o
oprimido a adaptar-se e acomodar-se à situação e isto leva-o mesmo a desenvolver um
certo temor pela liberdade. Assim, se tornam incapazes de assumir o risco de lutar
pela liberdade temendo também, na medida em que “lutar por ela significa uma
ameaça, não só aos que a usam para oprimir... mas, aos companheiros oprimidos que
se assustam com maiores opressões” (FREIRE, 2005, pág. 38).
O medo que os oprimidos desenvolvem pela liberdade é amplamente explorado pelos
opressores para ampliar a sua acção dominadora. Por isso, instilar o medo entre os
oprimidos é intrínseco à estratégia dominadora que tudo faz para que este medo se
multiplique. Uma das formas de solidificar a acomodação dos oprimidos e anestesiálos é a falsa generosidade de que se revestem muitas vezes os agentes opressores. Tal
generosidade deve ser rejeitada pois a sua fonte geradora é a “ordem” social injusta
que aos olhos do opressor interessa perpetuar e ela se “nutre da morte, do desalento
e da miséria” (FREIRE, 2005, pág. 33).
São, portanto, vários os factores que levam o oprimido a resignar-se apesar da sua
vocação endógena para a liberdade e do reconhecimento consciente da contradição
que o opõe ao opressor. Levá-lo a superar esta contradição requer, no entender de
Paulo Freire, uma “pedagogia que faça da opressão e de suas causas objecto da
reflexão dos oprimidos de que resultará o seu engajamento necessário na luta por sua
libertação” (FREIRE, 2005, pág. 34). Este engajamento se faz necessário porque,
A liberdade, que é uma conquista, e não uma doação, exige uma
permanente busca. Busca permanente que só existe no acto responsável de
quem a faz. Ninguém tem liberdade para ser livre: pelo contrário, luta por
ela precisamete porque não a tem. Não é também a liberdade um ponto
ideal, fora dos homens, ao qual inclusive eles se alienam. Não é ideia que se
faça mito. É condição indispensável ao movimento de busca em que estão
inscritos os homens como seres inconclusos (FREIRE, 2005, pág. 37).

O que Freire propõe aqui é que a conquista da liberdade implica a transformação
objectiva da situação opressora “combatendo um imobilismo subjectivista que
transformasse o ter consciência da opressão numa espécie de espera paciente de que
um dia a opressão desapareceria por si mesma”. Se a realidade social objectiva é
produto da acção dos homens transformá-la também é sua tarefa histórica. Ora, a
transformação da situação opressora, para ser autêntica, tem que ser iniciativa dos
oprimidos “a quem cabe realmente lutar por sua libertação juntamente com os que
com eles em verdade se solidarizam” pelo que “precisam ganhar a consciência crítica
da opressão, na práxis desta busca” (FREIRE, 2005, pág. 41).
Em resumo, encontramo-nos hoje diante de uma situação de crise social engendrada
por uma oligarquia que na ânsia desmedida pelo enriquecimento acirrou a contradição
ricos e pobres, esticando a corda a tal ponto que não deixa a estes últimos outra
alternativa que não seja a transformação desta realidade social objectiva. A acção
para a mudança, é acção libertadora e a liberdade jamais será servida de bandeja pelo
opressor ao oprimido, a liberdade provém de conquista por meio de luta que o
oprimido deve empreender. A condição de oprimido, todavia, engendra o medo e a
auto-demissão que podem tornar o oprimido impotente. É por isso necessário, por
meio de acção pedagógica apropriada, levar o oprimido a reconhecer dentro de si as
forças, enfim, a potência que carrega para empreender a conquista da liberdade.
Em Paulo Freire, por meio da sua extensa obra, mais particularmente através da
Pedagogia do Oprimido, encontramos vias que esquematizam essa pedagogia
libertadora, estruturando o seu pensamento “numa pedagogia em que o esforço
totalizador da práxis humana busca, na interioridade, retotalizar-se como prática da
liberdade”. Entendo, portanto, que em Paulo Freire podemos encontrar a teoria que
por meio da reflexão acção pode estruturar os caminhos que podem conduzir à
superação da presente contradição social em Angola e assim transformar radicalmente
a situação resgatando de forma sustentada o Estado democrático e de direito.

Referências:
- FREIRE, P.; Pedagogia do oprimido, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2005
- HAMILTON, A.; MADISON, J.; JAY, J.; O Federalista; Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian,
2011.
- LUIELE, M.; Quatro anos de constituição atípica em Angola – O balanço possível; In: Revista
Cibernética, 3.a edição, Janeiro, 2014.
- MORIN, E.; VIVERET, P; Como viver em tempo de crise; Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2013.

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A Pedagogia da Mudança em Angola

  • 1. A PEDAGOGIA DA MUDANÇA Revisitando a Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire para sondar caminhos para a Mudança em Angola Autor: Maurílio Luciano Sabino Luiele Luanda, Fevereiro 2014
  • 2. A Pedagogia da Mudança: Revisitando a Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire para sondar caminhos para a Mudança em Angola A libertação, por isto, é um parto. E um parto doloroso. O homem que nasce deste parto é um homem novo que só é viável na e pela superação da contradição opressores-oprimidos, que é a libertação de todos. A superação da contradição é o parto que traz ao mundo este homem novo não mais opressor; não mais oprimido, mas homem libertando-se. Paulo Freire
  • 3. São vários os sinais que evidenciam a instalação em Angola de um regime de cariz autoritário, que subverteu as relações de poder, de relações democráticas entre representantes e representados, governantes e governados, para uma relação autocrática de dominação de uma oligarquia que, valendo-se das vantagens do poder, distribui entre si a riqueza nacional. A instalação de um regime desta natureza reveste-se de intencionalidade e, no caso vertente visa proteger interesses consolidados desta oligarquia que ao considerar para si, como legítima, a “acumulação primitiva de capital”passou a ter uma consciência fortemente possessiva que os leva a transformar tudo o que os cerca em objectos do seu domínio. Ter mais e cada vez mais passou a ser a divisa, mesmo que isso significa pobreza ou mesmo miséria para a maioria. Já dizia Gandhi: “existem em nosso planeta recursos suficientes para atender às necessidades de todos, mas, em compensação, eles não bastarão se o objectivo for satisfazer o desejo de posse, a avidez, a cobiça, mesmo que seja de alguns.” Afinal, “a miséria material de uns está directamente relacionada à miséria ética, afectiva e espiritual de outros” (VIVERET, 2013). Nesta condição,ciclos de excitação e depressão acabam impregnando o universo político e determinar uma relação obssessiva, quase patológica, com o poder que pode provocar a destruição da substância do tecido democrático (VIVERET, 2013), pois, para dar vazão à sanha materialista dos detentores de poder o Estado Democrático e de Direito se revela como um verdadeiro obstáculo, sendo por isso, necessário subvertêlo. De facto, temos vindo a assistir nos últimos anos a uma enormidade de acções que mais não visam senão desvirtuar o processo democrático em Angola e, com isso, subverter o Estado Democrático e de Direito. O processo constituinte que culminou com a promulgação da Constituição de 2010 é um destes exercícios, carregados de intencionalidade, no sentido de se transformaras relações de poder de relações democráticas em relações de domínio absoluto que a oligarquia enriquecida pretende para si. Com efeito, ao pugnar pelo modelo que ficou conhecido como “atípico” pretendia-se, no fundo, um reforço considerável dos poderes presidenciais e a desactivação do valioso sistema de “checks and balances” entre os diferentes poderes, tão cruciais no Estado Democrático e de Direito. Desta formadestapava-se a intensão de se consagrar uma Constituição de cunho autoritário,
  • 4. onde o Legislativo e Judiciário seriam completamente rebocados e solapados pelo Executivo. Uma Constituição assim, longe de se constituir no espaço do consenso, passou a ser, na verdade, o campo de conflitos extremados. Isto deriva do facto da Constituição não ter sido a “expressão de uma limitação que a maioria impõe a si própria, contra a voragem das paixões e dos impulsos das maiorias conjunturais”como defende Hamilton em “O Federalista”. Muito pelo contrário, sobressai nesta Constituição o abusivo aproveitamento da maioria conjuntural do MPLA para usurpar limites e, por conseguinte, longe de consagrar uma “dinâmica de diálogo social” capaz de “garantir a vitória do debate político pacífico sobre a expressão agónica das tensões e conflitos”,segundo a perspectiva constitucional de Hamilton, a Constituição de 2010 passou a ser ela própria geradora de conflitos sociais. Com o Tribunal Constitucional atrelado ao Executivo, com o sistema de “checks and balances”desactivado, deixou de existir um espaço para a decisão regulada e isenta de disputas acaloradas que emergeriam como é o caso do contencioso eleitoral. Está assim instalada uma crise social aberta que examinada à luz do modelo marxista pode ser descrita como uma contradição entre dominadores e dominados, “enricados” (para não dizer ricos) e empobrecidos, em última instância entre opressores e oprimidos, pois, na ânsia de tudo dominar, com o fito exclusivo de manter e ampliar suas posses, a oligarquia sufoca direitos, restringe liberdades e submete à pobreza franjas extensas de cidadãos, em suma, oprime, já que pobreza é sofrimento, é opressão. Reverter esta situação, o que é imperioso, antes que a crise social evolua para explosão social descontrolada, é sobretudo superar esta contradição, ou seja, devolver aos dominados poder para que reconquistem a liberdade e o poder efectivo de participação nos assuntos do Estado, participação esta inviabilizada de várias maneiras pelo regime dominador/dominante. Analisada a situação na perspectiva da Constituição confrontamo-nos igualmente com um grande desajuste entre os direitos consagrados e o corpo institucional edificado para garantir esses direitos. A questão é que, a pressão exercida pelo Sr. Presidente da República no sentido da elaboração da tal constituição atípica acabou resultando numa obra feita as pressas, sem a devida ponderação, portanto salpicada de grosseiros
  • 5. defeitos que teriam, certamente, sido evitados se o ambiente constituinte não tivesse sido conspurcado com este elemento estranho: a imiscuição grosseira do Presidente. Qualquer crise social deve ser sempre vista numa perspectiva multidimensional, feita de várias camadas, que são na verdade concêntricas, mas é talvez a geometria do fractal que melhor ilustra a relação de cada camada com o todo e do todo com cada parte. A melhor forma de se analisar uma crise social é, portanto, guardar dela uma visão complexa que procure abarcar tanto quanto possível as infindáveis interações e retroações entre os diferentes componentes. Sem perder de vista, entretanto, esta perspectiva complexa da realidade social, parece-nos que no caso vertente, quando se isolam a dimensão estritamente social e jurídico-constitucional percebe-se nítidamente a profundidade do fossso social que se abriu, e que configura a crise, e palpam-se perceptivelmente as oportunidades embutidas como potências geradoras de mudanças significativas, capazes de re(in)verter a situação de crise. A grande potência, sem dúvida, é a vocação ontológica do ser humano para a liberdade que o leva sempre à resistir diante de situações de sufoco e a encontrar formas para romper os grilhões da opressão. Nenhum outro autor terá exposto de forma tão explícita esta vocação do ser humano para a liberdade como o fez Paulo Freire. Na sua perspectiva,esta vocação humana para a liberdade sobrepõe-se a própria acção de humanizar e, contrapondo esta à acção contrária argumenta que, Humanização e desumanização dentro da história, num contexto real, concreto, objectivo, são possibilidades dos seres humanos como seres inconclusos e conscientes da sua inconclusão. (E diz mais) se ambas são posssibilidades, só a primeira nos parece ser o que chamamos de vocação dos homens. Vocação negada na injustiça, na exploração, na opressão, na violência dos opressores. Mas afirmada no anseio de liberdade, de justiça, de luta dos oprimidos, pela recuperação de sua humanidade roubada (FREIRE, 2005, pág. 32). Portanto, o que Paulo Freire sustenta é que numa situação de opressão o impulso do oprimido para a luta é, de certa forma, natural já que a opressão desumaniza sendo,
  • 6. por isso, contrária ao destino dos homens que é a humanização. Porém, Freire adverte que, Esta luta somente tem sentido quando os oprimidos, ao buscarem recuperar sua humanidade, que é uma forma de criá-la, não se sentem idealisticamente opressores, nem se tornam, de facto, opressores dos opressores, mas restauradores da humanidade em ambos (pois entende que) aí está a grande tarefa humanista e histórica dos oprimidos – libertarse a si e aos opressores (FREIRE, 2005, pág. 33). Mesmo que este impulso do oprimido esteja latente, ele é muitas vezes reprimido e não se manifesta espontaneamente na medida em que o conhecimento dos oprimidos sobre si mesmos, que é fundamental para soltá-lo, encontra-se “prejudicado pela “imersão” em que se encontram na realidade opressora”. Mesmo que o oprimido se reconheça em posição contrária ao opressor isto pode não significar que tenha reunido força interior suficiente para lutar pela superação desta contradição. Antes pelo contrário, o envolvimento na “engrenagem da estrutura dominadora” pode levar o oprimido a adaptar-se e acomodar-se à situação e isto leva-o mesmo a desenvolver um certo temor pela liberdade. Assim, se tornam incapazes de assumir o risco de lutar pela liberdade temendo também, na medida em que “lutar por ela significa uma ameaça, não só aos que a usam para oprimir... mas, aos companheiros oprimidos que se assustam com maiores opressões” (FREIRE, 2005, pág. 38). O medo que os oprimidos desenvolvem pela liberdade é amplamente explorado pelos opressores para ampliar a sua acção dominadora. Por isso, instilar o medo entre os oprimidos é intrínseco à estratégia dominadora que tudo faz para que este medo se multiplique. Uma das formas de solidificar a acomodação dos oprimidos e anestesiálos é a falsa generosidade de que se revestem muitas vezes os agentes opressores. Tal generosidade deve ser rejeitada pois a sua fonte geradora é a “ordem” social injusta que aos olhos do opressor interessa perpetuar e ela se “nutre da morte, do desalento e da miséria” (FREIRE, 2005, pág. 33). São, portanto, vários os factores que levam o oprimido a resignar-se apesar da sua vocação endógena para a liberdade e do reconhecimento consciente da contradição que o opõe ao opressor. Levá-lo a superar esta contradição requer, no entender de
  • 7. Paulo Freire, uma “pedagogia que faça da opressão e de suas causas objecto da reflexão dos oprimidos de que resultará o seu engajamento necessário na luta por sua libertação” (FREIRE, 2005, pág. 34). Este engajamento se faz necessário porque, A liberdade, que é uma conquista, e não uma doação, exige uma permanente busca. Busca permanente que só existe no acto responsável de quem a faz. Ninguém tem liberdade para ser livre: pelo contrário, luta por ela precisamete porque não a tem. Não é também a liberdade um ponto ideal, fora dos homens, ao qual inclusive eles se alienam. Não é ideia que se faça mito. É condição indispensável ao movimento de busca em que estão inscritos os homens como seres inconclusos (FREIRE, 2005, pág. 37). O que Freire propõe aqui é que a conquista da liberdade implica a transformação objectiva da situação opressora “combatendo um imobilismo subjectivista que transformasse o ter consciência da opressão numa espécie de espera paciente de que um dia a opressão desapareceria por si mesma”. Se a realidade social objectiva é produto da acção dos homens transformá-la também é sua tarefa histórica. Ora, a transformação da situação opressora, para ser autêntica, tem que ser iniciativa dos oprimidos “a quem cabe realmente lutar por sua libertação juntamente com os que com eles em verdade se solidarizam” pelo que “precisam ganhar a consciência crítica da opressão, na práxis desta busca” (FREIRE, 2005, pág. 41). Em resumo, encontramo-nos hoje diante de uma situação de crise social engendrada por uma oligarquia que na ânsia desmedida pelo enriquecimento acirrou a contradição ricos e pobres, esticando a corda a tal ponto que não deixa a estes últimos outra alternativa que não seja a transformação desta realidade social objectiva. A acção para a mudança, é acção libertadora e a liberdade jamais será servida de bandeja pelo opressor ao oprimido, a liberdade provém de conquista por meio de luta que o oprimido deve empreender. A condição de oprimido, todavia, engendra o medo e a auto-demissão que podem tornar o oprimido impotente. É por isso necessário, por meio de acção pedagógica apropriada, levar o oprimido a reconhecer dentro de si as forças, enfim, a potência que carrega para empreender a conquista da liberdade. Em Paulo Freire, por meio da sua extensa obra, mais particularmente através da Pedagogia do Oprimido, encontramos vias que esquematizam essa pedagogia
  • 8. libertadora, estruturando o seu pensamento “numa pedagogia em que o esforço totalizador da práxis humana busca, na interioridade, retotalizar-se como prática da liberdade”. Entendo, portanto, que em Paulo Freire podemos encontrar a teoria que por meio da reflexão acção pode estruturar os caminhos que podem conduzir à superação da presente contradição social em Angola e assim transformar radicalmente a situação resgatando de forma sustentada o Estado democrático e de direito. Referências: - FREIRE, P.; Pedagogia do oprimido, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2005 - HAMILTON, A.; MADISON, J.; JAY, J.; O Federalista; Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2011. - LUIELE, M.; Quatro anos de constituição atípica em Angola – O balanço possível; In: Revista Cibernética, 3.a edição, Janeiro, 2014. - MORIN, E.; VIVERET, P; Como viver em tempo de crise; Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2013.