Dor abdominal na infância requer abordagem cuidadosa incluindo anamnese detalhada, exame físico e raciocínio criterioso. Para diagnóstico de dor abdominal recorrente não são necessários exames sofisticados, mas crianças com sinais de alerta precisam de maiores investigações. Neste caso, após exclusão de outras causas, o diagnóstico foi porfiria aguda intermitente, doença genética rara que deve estar no diferencial diagnóstico de distúrbios gastrointestinais e neurol
1. DOR ABDOMINAL NA INFÂNCIA:
ABORDAGEM E DIAGNÓSTICO
DIFERENCIAL
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Departamento de Pediatria
Liga Acadêmica de Pediatria da UFRN
LAPED UFRN
Coordenador
Dr. Paulo M. de Castro
Ligantes
Jessica Aquino Vilaça
Thiago Luiz dos Santos Mariz
2. Dor Abdominal Crônica Recorrente
Definição:
Presença de, pelo menos,
três episódios de dor
suficientemente fortes para
interferir nas atividades
habituais da criança por um
período mínimo de três meses.
3. Caso Clínico
Uma criança de 10 anos foi encaminhada para
realização de EDA devido à dor abdominal crônica
de episódios recorrentes. Tratava-se de uma paciente
eutrófica referindo dor mesogástrica associada à
constipação, sem irradiação, sem comprometimento
do estado geral, febre, perda de peso, aftas de
repetição. Ingesta pobre de fibras. Negava
antecedentes de doenças do trato gastrointestinal
como neoplasias.
4. Caso Clínico
Após o despertar do exame a paciente permaneceu
em gritos devido a dor abdominal acentuada na
mesma localização, evoluindo com vômitos, parada
de eliminação de gases e fezes. Apesar do abdômen
manter-se flácido foi pedido um parecer da cirurgia e
submetido a criança a laparotomia exploradora
branca.
A paciente permaneceu internada com persistência
da dor, vômitos biliosos. Iniciada nutrição enteral e,
no terceiro dia, passando para parenteral.
5. Abordagem Clínica da Dor
Anamnese
i. Dados Clínicos da dor: frequência, localização,
qualidade, associação com outros sintomas, fatores
desencadeantes
ii. Sintomas sistêmicos: perda de peso, atraso no
crescimento, atraso no desenvolvimento puberal,
febre, erupção cutânea e dor articular.
iii. História familiar: Doença inflamatória intestinal e
úlcera péptica
6. Abordagem Clínica da Dor
Exame Físico:
o Curva de crescimento,
o Ganho ponderal,
o Estado geral do paciente,
o Pele,
o Artrites,
o Sinais de inflamação perirretal.
7. Funcionas X Orgânicas
CAUSAS FUNCIONAIS:
o Síndrome da dor abdominal recorrente;
o Dispepsia não ulcerosa;
o Síndrome do intestino irritável;
o Migrânea abdominal.
- Maior parcela.
- Hipersensibilidade visceral + Dismotilidade intestinal.
- Alterações do Sistema Nervoso Autônomo + alterações psíquicas.
o DX:
- Exclusão;
- Critérios de Roma III.
13. Abordagem Clínica da Dor
“Para o diagnóstico de Dor abdominal recorrente
NÃO são necessários os exames subsidiários
sofisticados. É essencial uma análise completa da
queixa e dos outros componentes da história, um
exame físico meticuloso e um raciocínio criterioso de
investigação. Crianças que apresentam sinais de
alerta na história e no exame físico necessitam de
maiores investigações com exames.”
15. Caso Clínico
Exames solicitados e realizados no caso clínico:
o Hemograma com VHS,
o PCR,
o EAS, Urocultura,
o Amilasemia, Lipasemia,
o Uréia, Creatinina,
o EPF (inclusive pelo método Baerman-Moraes),
o TGO, TGP,
• Colesterol, Triglicerídeos,
• Teste de tolerância à lactose,
• Ressonância Magnética de Abdome,
• Ionograma revelando hiponatremia, hipomagnesemia.
17. Porfiria Aguda Intermitente
“Incluir PAI no diagnóstico diferencial de distúrbios
neurológicos, psiquiátricos e gastroenterológicos em
crises, no qual todos os demais exames estejam
normais, contribui para aumentar a chance
diagnóstica bem como adequar o tratamento.”
19. Porfiria Aguda Intermitente
CONCEITO:
o Doença genética rara, autossômica dominante,
decorrente de um distúrbio na via hepática da
biossíntese do heme, causado pela redução dos níveis
da enzima porfobilinogênio desaminase (PBG-D).
o Erro Inato do Metabolismo
20. Biossíntese do Heme
•Células nucleadas dotadas de
mitocôndrias.
•Eritropoiéticahemoglobina.
• Hepáticascitocromo p450...
• Intermediários tóxicos.
•Sintomas cutâneos (acúmulo de
porfirinas nas camadas mais
superficiais da pele).
•Sintomas neuroviscerais (acúmulo
de ALA e PBG).
24. Porfiria Aguda Intermitente
Prevalência: estimada em 1-2 pessoas a cada
100.000 casos (mais comum na Inglaterra, Irlanda e
Suécia). Em portadores de doença psiquiátrica:
1:500.
Ocorrem mais comumente após a puberdade, e são
mais frequentes em mulheres do que em homens.
25. Porfiria Aguda Intermitente
80% dos portadores não chegam a apresentar
sintomas.
É preciso algum fator desencadeante para iniciar as
crises:
i. Medicamentos
ii. Bebidas alcóolicas
iii. Tabaco
iv. Dieta hipocalórica e pobre em carboidratos
v. Estresse (infecção, cirurgia, distúrbio psicológico)
26. Porfiria Aguda Intermitente
CLÍNICA:
o Sinais e sintomas geralmente intermitentes;
o Dor abdominal;
o Náuseas e vômitos;
o Constipação ou diarréia;
o Distensão abdominal;
o Íleo adinâmico;
o Retenção ou incontinência urinária;
o Taquicardia;
o Febre;
o Distúrbios hidroeletrolíticos (hiponatremia);
o Distúrbios neuropsiquiátricos (ansiedade, depressão, insônia,
desorientação, alucinações, confusão, psicose, crises convulsivas e
acometimento de pares cranianos);
o Tetraparesia flácida;
o Urina cor de vinho (acúmulo de porfobilina, produto oxidado da PBG).
28. Porfiria Aguda Intermitente - Diagnóstico
Dosagem na Urina de 24 horas dos precursores das
porfirinas: ácido delta-aminolevulínico (ALA) e
porfobilinogênio (PBG);
Diagnóstico definitivo pesquisa do gene mutante
através de teste genético molecular.
30. Porfiria Aguda Intermitente - Complicações
Parada respiratória
Quadriplegia
Dor neuropática crônica
Dor crônica no sistema digestivo após repetidas
crises
31. Porfiria Aguda Intermitente - Tratamento
Sintomáticos:
- Dor abdominal Clorpromazina, fenotiazínicos,
opióides.
- Hipertensão/taquicardia Beta-bloqueadores.
- Ansiedade/insônia Lorazepan.
- Constipação grave Lactulose, neostigmina.
Aporte elevado de glicose – 300g/dia (inibição da enzima
ALA sintetase diminuição da produção dos
metabólitos tóxicos);
Suspensão de medicamentos porfirinogênicos, álcool e
tabaco.
33. Porfiria Aguda Intermitente - Tratamento
Suporte:
- Correção de distúrbios eletrolíticos (hiponatremia
pode desencadear crises convulsivas).
- Suporte ventilatório.
Hematina (bloqueador bioquímico da ALA sintetase
feedback negativo no fígado evita aumento dos
precursores do heme.
Arginato de Heme
Hemodiálise.
34. Porfiria Aguda Intermitente – Prevenção de crises
Acompanhamento médico periódico;
Dieta adequada;
Evitar drogas porfirinogênicas, álcool, tabaco,
atividade física extenuante e stress;
Tratamento psiquiátrico (risco de suicídio)
Exames periódicos semelhantes ao rastreamento
realizado rotineiramente em portadores de cirrose
(risco aumentado de hepatocarcinoma);
Testar todos os parentes de pacientes com porfiria
para verificar a existência do defeito genético.
35. Referências
Sociedade Brasileira de Pediatria. Consenso sobre dores pouco
valorizadas em crianças: Dor abdominal recorrente. Agosto, 2011.
Uptodate. Chronic abdominal pain in children and adolescents:
approach to the evaluation.
Lopes, DAL et al. Porfiria aguda intermitente: relato de caso e
revisão da literatura. Revista Brasileira de Terapia Intensiva.
Dezembro, 2008.
Lunardi CA et al. Dor abdominal crônica recorrente no ambulatório
de gastropediatria. Jornal de Pediatria. Maio, 1997.
Lourenço CM. Porfirias agudas – Condutas na crise aguda. Hospital
das Clínicas da Faculdadede Medicina da USP de Ribeirão Preto.
Rasquin, A et al. Childhood functional gastrointestinal disorders:
Child/Adolescent. Gastroenterology. Abril, 2006.
Dinardo CL, Fonseca GH, Suganuma LM , Gualandro FM ,
Chamone DA. Porfirias: quadro clínico, diagnóstico e tratamento.
Rev Med (São Paulo). 2010.