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EMOções
Por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga

Sinopse:

Quando o pai de Bryan descobriu sobre sua
verdadeira orientação sexual não aguentou possuir
um filho emo e gay, sendo assim mandou-o para
morar com sua mãe. Bryan muda de escola, mantém
seu estilo e personalidade e a mesma certeza de
sempre: não possuirá amigos verdadeiros. Porém,
parece que a certeza não é algo absoluto, afinal...
“Exclusividade do blog Otakices”
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Capítulo 1: Sozinho ou acompanhado?
Meu despertador tocou. A mesma música de sempre, mas até hoje não sei o que diz,
nome ou quem toca. Pensei em dormir mais cinco minutinhos, mas percebi que aqueles
cinco minutinhos já haviam passados. Na verdade, aqueles cinco minutinhos tinham se
transformado em quinze minutinhos e eu estava atrasado.
Levantei-me e segui minha rotina de sempre, porém apressado. Me vesti com um
casaco com listras horizontais preto com vermelho e coloquei o capuz. Pus meus
acessórios de sempre, como corrente no pescoço e pulseira de taxas. Passei base e
lápis de olho levemente, rezando para não borrar e ter de refazer levando em
consideração que eu já deveria ter saído de casa. Calcei meu All star preto e peguei
minha mochila preta cheia de bótons e acessórios. Passando pela cozinha peguei uma
maçã e saí de casa comendo-a.
Uma brisa soprava de leve, porém não estava frio. Mesmo assim puxei levemente as
mangas de meu casaco até a metade da palma de minha mão, segurando-o com meus
dedos de unhas pretas.
Na medida em que fui me aproximando mais da escola – o qual ficava a duas
quadras de minha casa – comecei a ficar nervoso. Sim, estou mudando de colégio... De
novo. Até três dias atrás eu morava com meu pai, até o mesmo descobrir que sou
homossexual. Já lhe era difícil aceitar que seu único filho fosse emo, descobrir que sou
gay foi a gota d’água que fez o copo transbordar. Mas não o culpo, eu não sou um bom
filho mesmo.
Então, no momento moro com minha mãe. Ela não é contra eu ser emo e
homossexual, mas também não é fã dessa ideia. Ela trabalha o dia todo e não pode me
dar muita atenção, por este motivo que até hoje morei com meu pai. Mas agora não há
escolha.
Eu sei como será, o que dirão de mim e como reagirão, porém é impossível me
manter calmo. Quando o portão do colégio se tornou visível a meus olhos meu coração
acelerou drasticamente, como se possuísse vida própria. Ignorei-o na medida do
possível e segui rumo a minha nova vida.
Adentrando lá a primeira coisa que pude perceber foram os olhares voltados para
mim; olhares até demais. Quis vasculhar o local e procurar por um grupo no qual eu me
encaixasse, mas o orgulho e a vergonha me ensinaram a manter-me focado, visando
nada de especial, porém concentrado. Foi meu modo de dizer “não importa o que
pensem de mim”, mas era mentira. Me importa.
Fui até a diretoria e peguei meu horário. Procurei pela sala 23, na qual eu teria
minha primeira aula: matemática. Quando a encontrei, pela movimentação e ausência do
sinal deduzi que a aula ainda não houvera começado. Entrei na sala de aula focado e
mais uma vez sentindo aqueles olhares numerosos demais e incômodos em minha
direção. Será que nunca viram um emo, é?
Sentei como quarto da fila encostada na parede. Joguei minha mochila ao lado de
minha cadeira e, suspirando apoiei meu cotovelo na classe e meu rosto em minha mão.
O nervosismo ainda pairava em meu corpo, quase fazendo - me tremer.
- Ele é estranho – sussurraram. Suprimi minha imensa vontade de dizer “chama-se
emo. É somente um estilo diferente, sabia?”

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EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Ele é parecido com aqueles garotos do segundo ano – ora, ora. Quem diria que há
emos nesse fim de mundo! Ainda bem, pois estou acostumado a morar e estudar no
centro de cidade grande, onde há maior movimento.
- É emo – continuaram a sussurrar, como se eu não escutasse.
Não é como se tais comentários fossem de suma importância para minha vida, mas a
vontade de chorar predominou. Sei que tenho problemas com emoções, mas não sei o
que eu possa fazer. Não costumo contar coisas assim para meus pais, não sou
importante o suficiente para usufruir do prazer de passar meus problemas para eles.
Quis chorar por medo de ficar sozinho. Infantil, não? Porque não passaram pelo que
eu passei. Sou propenso a solidão por motivos os quais não sei citar, mas isto é mais
acentuado agora que defini um estilo e preferência sexual diferente. Sei que se eu mudar
minha aparência e esconder minha personalidade tenho mais chances de me enturmar,
mas não é isso que eu quero. Não quero ter de me esconder ou ser aceito somente por
aquilo que não sou.
- ‘Falaê aluno novo! - cumprimentou-me alguém.
Eu disse o quanto sou distraído?
Voltei meu olhar na direção do garoto de pé ao meu lado. “Lindo” foi meu primeiro
pensamento, então sorri. Ele jogou sua mochila encima da classe na frente da minha e
sentou-se de lado na cadeira, dando atenção a mim.
- Você se destaca, sabia? E... Usa maquiagem! Nossa! – ele exclamou assustado,
aproximando mais seu rosto do meu, deixando-me nervoso, envergonhado e... Deixa pra
lá. – Você é viado ou isso é comum da onde você veio?
Analisei as opções. Se eu dissesse que sou gay talvez tivesse uma chance dele não
ser preconceituoso e eu poder levá-lo para o outro lado, porém também há a grande
chance dele ter nojo, já que usou o termo “viado”. Já se eu negasse e, mais tarde ele
descobrisse que sou acabaria com as chances. Na segunda parte, sobre ser comum de
onde eu vim, nem adianta discutir, pois há outros como eu, mas não é comum. Sendo
assim a escapatória seria mudar de assunto.
- Essa é sua primeira pergunta? Não quer nem saber meu nome? – eu perguntei
sorrindo, para que assim ele não me interpretasse grosseiramente.
- ‘Malz ‘aê. Seu nome?
- Bryan. E o seu?
- Pedro.
Pedro... Um nome bem comum. Agora posso dizer: Pedro é lindo! Ele é bem...
“garoto”. Digo assim porque ele é normal, diferente de mim. Cabelo castanho escuro e
curto, olhos escuros... Não há nada de muito diferente, porém ele é lindo.
- Você vai ter de tirar o capuz, os professores não deixam usar dentro da sala.
Abaixei o capuz do casaco e balancei a cabeça, em seguida passei os dedos de leve
na minha franja, arrumando-a.
- Nossa cara, você usa maquiagem mesmo!

3
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- É normal os garotos emos usarem um pouco de maquiagem – expliquei por alto,
sem entrar em maiores detalhes. –Os professores se atrasam aqui? – mudei de assunto
antes que ele perguntasse por mais.
- ‘Noops. Na verdade, entram antes do sinal bater.
- Bom dia.
Foi só ele falar que uma mulher baixinha e loira adentrou a sala, carregando consigo
vários livros e cadernos. Pensei em responder para ela, mas ninguém respondeu.
- Começamos há poucos dias o segundo trimestre. Você vai precisar da matéria.
- Você a tem?
- Não. Mas posso consegui-la facilmente para você – ele disse rindo, levando uma
mão até minha cabeça e bagunçando meu cabelo. Calmamente, arrumei com as mãos os
fios bagunçados, tentando ajeitá-los de volta. Pedro estranhou. –Cara, você é estranho.
- E você é normal – respondi com um sorriso, fazendo, assim, ele sorrir também.
O sinal bateu e a aula começou. A professora não exigiu que eu me apresentasse
detalhadamente. De meu lugar mesmo ela deixou eu apenas dizer meu nome, idade e o
que mais gostava. Quando ela começou a passar matéria, para mim pareceu que a
professora falava grego. Explicava tudo embolado e, como eu não tinha a matéria para
entender a parte anterior fiquei boiando. Espero que Pedro realmente me ajude.
Depois de dois períodos com aquela tortura era hora da aula de química. Trocamos
de sala e, na de química era para os alunos sentarem-se em duplas nos balcões. Foi só
Pedro entrar na sala que várias garotas vieram para a volta, como abutres em carne
podre. Sinceramente, achei que as garotas daqui não fossem bobinhas assim, pelo
menos não eram na minha outra escola. Lá, eram os garotos que corriam atrás. Mas, não
poderia ser para menos. Pedro é lindo e não destrata nenhuma delas... Infelizmente.
- Desculpe garotas, mas hoje sentarei com Bryan.
Que vontade enorme de jogar isso na cara delas, agarrando-me firmemente no braço
de Pedro. Mas, limitei-me a sorrir de forma arrogante, sendo alimentado pelas caretas
de irritação daquelas garotinhas chatas.
Não prestei atenção na aula. A professora de química era uma abobada, passou uma
tarefa e nos deixou conversando. Pedro comentou algumas coisas sobre minha
aparência e meu estilo, comentou rapidamente sobre os emos nos quais eu houvera
escutado as garotas citarem mais cedo e logo trocou de assunto, fazendo-me perguntas
sobre gosto e preferências. Já eu, como o distraído que sou limitava-me a responder e
apreciar sua voz, já que tudo nele era encantador. Ele é exatamente o tipo que me atrai.
- Bryan! Bryan, você me escutou?
- Sim – menti.
- Então vamos.
Ele se levantou e esperou que eu me levantasse. Olhei para a volta tentando entender
e percebi que o sinal para o intervalo começar houvera soado alguns segundos atrás,
pois a maioria dos alunos já tinha deixado à sala. Levantei-me e o segui um pouco mais
atrás, quando de repente ele parou.
4
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga

- ‘Peraí. Camila – ele chamou virando-se para trás e, logo uma garota morena de
cabelo liso se aproximou correndo, sorrindo de um jeito idiota.
- Sim Pedro?
- Você me faz um favor?
- Claro!
- Então copie a matéria de matemática do segundo trimestre para Bryan, ok?
Ela não sorriu, mas fez que sim com a cabeça. Eu fiquei parado enquanto Pedro
voltou até minha mochila e começou a mexer nela normalmente, como se fosse a sua
própria.
- Qual deles é?
- O de banda.
Ele pegou meu caderno com o Simple Plan na cama e entregou-o para a garota.
Conversaram alguma coisa em sussurros e Pedro voltou para meu lado. Seguimos para
fora da sala.
- Ela tem uma bela letra, mas não é bom jogar um monte de cadernos encima dela em
um dia. Português pode ficar com a Bianca, Biologia com Amanda...
- Fácil assim? – eu perguntei interrompendo-o, sem saber para onde estávamos indo.
- Claro. Elas fazem qualquer coisa por mim. Qualquer garota do colégio você me diz
que consigo ela para você, fácil, fácil – ele comentou animado, envolvendo meus ombros
com seu braço, fazendo assim meu coração dar um pulo. – Mas de preferência não as
muito metidas principalmente do terceiro ano. Elas me dão nos nervos. Há poucas
exceções, mas da nossa turma qualquer uma!
Não, obrigado. Não gosto de garotas. São tão fúteis, falsas e superficiais...
Limitei-me ao silêncio e percebi que havia muito mais olhares sobre minha pessoa
do que antes. Tentei ignorá-los como sempre, mas desta vez me pareceu impossível.
- Estão me olhando mais do que quando cheguei – comentei para Pedro.
- É claro que sim. Você está andando comigo. Sou bem popular aqui.
- Percebi.
Eu ia manter o silêncio, mas a dúvida estava me consumindo por dentro, quase
corroendo, impondo-me condições de tortura mental para caso eu não a extinguisse.
- Por que você, mesmo sendo tão popular assim quis se aproximou de mim?
Pedro não deu muita bola para minha pergunta. Continuou com o braço sobre meus
ombros, guiando-me para algum lugar o qual desconheço.
- Porque você é diferente. Não me pareceu que fosse querer se aproximar de mim só
porque sou popular.

5
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Você tem razão – o comentário escapou de meus lábios sem querer, daquele jeito
que sai e nunca mais voltam.
Pedro parou de caminhar de supetão, em um solavanco. Largou meus ombros e
puxou meu braço com força pelo mesmo caminho pelo qual viemos. Estranhei, mas
quando fiz menção de perguntar o porquê daquela atitude quando uma onda sonora de
frequência alta viajou pelo ar até meus ouvidos, irritando-me, causando a meus
tímpanos um enorme desconforto.
- Temos mais um para nosso grupo!
Pedro tentou me puxar com mais rapidez, porém um puxão em meu pescoço obrigoume a ir para trás, quase formando um cabo de guerra comigo.
- Você é lindo! – aquela voz aguda de amplitude forte novamente, porém desta vez
tão próximo de meu ouvido que acabei por agir inconscientemente e fazer uma careta.
Olhei para o lado e vi um garoto menor que eu, loiro falso, pois a raiz escura já
começara a nascer. Um casaco preto de caveira, pele coberta por maquiagem, pulseira
de espinhos, botas rasteiras com fivelas e olhos bem marcados.
Um emo.

6
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga

Capítulo 2: Companhias demais, principalmente mi comi.
- Solta ele! – Pedro impôs irritado, tentando desgrudar o emo loiro de meu braço; em
vão.
- Que você quer enchendo o saco? Ele tem nosso estilo, obvio que ele quer andar
com pessoas como ele, né?
O garoto sorriu para mim, enquanto eu continuei atônito, sem saber o que responder.
Estavam mesmo brigando pela minha presença? Gritando assim, como se nem
estivéssemos no intervalo em meio a muitos alunos.
- O que você quer com ele? Por acaso tá afim, é? – perguntou o loirinho, debochado.
Tanto eu quanto Pedro nos assustamos com aquilo. Eu não queria deixar da presença
dele tão cedo.
- É claro que não! Não sou gay!
- Pois emos são.
Que droga! Seu emo de merda boca grande! Custava me deixar ser feliz por mais
alguns dias?
O primeiro garoto que conheci nesse novo colégio, o mais popular daqui é também o
garoto que nunca mais irá falar comigo, cultivando ódio e nojo, raiva e repulsa. Simples
assim.
Deixei-me ser levado para longe por aquela criança. Não adiantaria de nada discutir,
pois para isso teria de mentir. Pedro se afastou, sumindo de meu campo de vista e eu
suspirei. Não há o que eu possa fazer ou dizer, porque não quero mentir. O que posso
fazer agora é andar com meus semelhantes.
- Você é realmente muito bonito! Qual seu nome? O meu é Lucas, mas me chamam de
Lu.
Ele saltitou até a minha frente, posicionando ambas as mãos atrás do corpo e
sorrindo como criança de sete anos. Ficou frente a frente comigo e andou de costas.
- Bryan.
- Bryan, por que você estava andando com aquele garoto? Aliás, você é novo aqui,
certo?
- Ele foi quem começou a falar comigo e querer minha atenção.
- Sério? Aquele lindo garoto popular?
- É. Que não falará mais comigo por sua causa.
- Ohhh, desculpe!
Paramos de andar e mais uma vez ele se pendurou em meu pescoço, abraçando-me
apertado. Quando Lucas me soltou percebi que haviam vários emos a nossa volta. Um
deles em especial me chamou a atenção. Ele era alto e possuía uma franja daquelas que
tapa somente um olho. O cabelo era bagunçado e havia um piercing no canto esquerdo
da boca. Ele sorriu sedutoramente para mim e meu coração acelerou drasticamente.
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EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Garotos, este é o Bryan. É novo aqui. Não é lindo? – por que ele insiste em dizer
tantas vezes que sou lindo? Nem sou bonito nada.
Continuei mirando aquele mesmo garoto que me chamara à atenção. Ainda sorrindo
ele se aproximou de mim, envolveu minha cintura com um de seus braços e meu coração
se desmanchou. Ele aproximou seu rosto de minha orelha.
- É lindo mesmo.
Entendi suas intenções. Ele queria ficar comigo. Isso me deixou feliz, pois além dele
ser lindo estou na seca a uns três ou quatro meses. Assim, depositei meus braços em
torno de seu pescoço, aceitando de bom grado que ele deslizasse uma de suas mãos até
minha bunda, apertando-a. Ele aproximou seus lábios dos meus e eu fechei os olhos,
aguardando. Encostou sua boca na minha e logo adentrou com sua língua pela minha
boca, beijando-me de forma selvagem. Ele puxou meus cabelos, excitando-me. Passamos
tanto tempo nos beijando que, quando nos separamos me senti tonto.
- Você beija bem – ele sussurrou antes de se afastar. Meus olhos estavam abertos,
mas eu estava tão distraído que nem vi nada a minha frente.
Não sei nem ao menos seu nome ou o que mais ele pode querer de mim. Não conheço
ninguém aqui e acabei de beijar um garoto na frente de todo o colégio, para quem
quisesse ver. Acho que agi de forma um pouco irresponsável, mas não estou nem aí.
- Não vai nos apresentar, Lucas? – questionou um dos garotos do grupo, mas não vi
quem. Minha mente continuava desconectada e, aos poucos eu fui retornando a
realidade.
- Ah, agora temos pouco tempo, então vou mostrar o colégio para ele. Na hora da
saída nos conhecemos melhores. Vem – é incrível como esse loirinho consegue ter uma
voz tão irritante, aguda e de amplitude tão forte.
Em poucos segundos meu braço já estava sendo puxado para longe, fazendo-me
tropeçar em várias pedras e felizmente não cair. Continuei sendo afastado dos outros
emos sem entender o porquê. Quando paramos em um corredor qualquer meu
entorpecimento por conta do beijo de anteriormente já houvera se dissipado e eu estava
consciente.
- Qual seu problema? – eu questionei desconfiado, não caindo naquela lábia de que
ele queria somente mostrar o colégio.
- Vou te mostrar o colégio, claro!
Estreitei os olhos em sua direção e apertei os lábios, tentando entendê-lo. Algo
estava errado, tanto dentro daquela cabeça afetada pela água oxigenada dos cabelos
quanto nas atitudes estranhas de motivos ocultos.
- Qual o seu problema? – repeti, desta vez, mais sério.
Desistindo de esconder a verdade, ele cruzou os braços e fez cara de emburrado,
formando com os lábios cheios de batom um biquinho.
- Alex é meu, tá? Pode ir tratando de deixar esses seus lábios bem longes dele!
Não precisei pensar muito para chegar à conclusão de que Alex era o nome daquele
garoto o qual eu beijara anteriormente. Suprimi uma risada de deboche e uma resposta
afiada tal como “Tem seu nome nele?” ou “Vai fingir que ele te beijou ao invés de mim?”.
8
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Vocês não parecem ser namorados – respondi sério, escondendo minha verdadeira
intenção de arrancar um pouco mais da verdade sobre o relacionamento deles. Era
óbvio que não eram namorados.
- Não somos, mas eu fico com ele de vez em quando – ele respondeu de um jeito
infantil, descruzando os braços e entreabrindo a boca levemente. –E eu gosto muito
dele, ‘okey?
- Já transaram? – eu perguntei direto. Até veria as bochechas dele mudarem de cor,
porém o excesso de blush não permitiu.
- Esse é o problema! – ele disse numa amplitude forte, exaltando-se, usando das
mãos para dar ênfase a suas palavras. –Eu nunca fiz isso antes, sabe. E ele... Alex não
consegue viver sem isso! É o único probleminha entre nós... – ele disse juntando ambas
as mãos na frente do corpo e esticando os braços, balançando-se para frente e para
trás.
- Eu diria que é um problemão.
- Eu sei! – e mais uma vez ele exaltou-se, movendo as mãos para cima e irritando
meus ouvidos.
- Garoto, juro que sinto como se sua voz chegasse aos máximos 20 mil hertz que um
ser humano normal consegue ouvir e aguentar – comentei esfregando o dedo pelo lado
de fora da minha orelha, tentando parar com aquele zumbido que permanecia ali,
irritando-me.
- Tipo, eu quero que nosso relacionamento avance, mas não posso chegar pra ele e
pedir “me come”.
De repente, surgiu uma risada. Veio tão de surpresa que ela saiu arranhando minha
garganta, em seguida passando por entre minha língua e o céu da minha boca.
- Que foi?
- Você está tão desesperado que seu apelido deveria ser “mi comi” – respondi rindo
mais abertamente, intensificando a risada quanto vi a expressão de incredulidade
estampada na face dele.
- Como você é mau!
Senti alguns leves socos em meu peito, nada de muito forte. Ele era um pouco mais
baixo que eu e, por conta do excesso de maquiagem e as ações parecia uma criancinha
frágil.
- Insensível! – ele choramingou com a voz embriagada pelo choro iminente.
- Pára mi comi! Afinal, que idade você tem?
Ele se afastou de mim e fitou-me de um modo inocente, olhando de baixo.
- Quatorze. E meu nome é Lucas.
- Sou Bryan. Prazer – debochei, porque sua intenção ao dizer-me seu nome era para
que eu parasse de chamá-lo de mi comi, mas não adiantaria.
- Bryan, vou te mostrar o colégio para que os garotos não desconfiem! – ele disse,
animando-se em segundos e já me puxando pela mão e saltitando.
9
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Principalmente o Alex, não é mi comi? – debochei, vendo a vergonha estampada no
rosto dele.
- Pára de me chamar assim!
Eu ri, ouvindo ele xingar-me de várias ofensas leves, como se fosse mesmo uma
criança. Não disse a ele, mas realmente eu estava decepcionado em ter de deixar Alex
para ele. Alex beijava tão bem e era tão lindo... Ainda estou em dúvida se vou desistir de
ficar com ele fácil assim.

10
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Capítulo 3: Erros, mágoas e perdões.
Como eu já esperava, Pedro afastou-se de mim. Nos dias que decorreram após
aquela chocante revelação – para ele, claro – aquilo que eu considerava o início de uma
amizade desapareceu. Tudo graças à mi comi.
- Bryan, Bryan! – a voz de mi comi me chamou, gritando para todo o colégio meu
nome, de novo e de novo.
Quando vi aquele ser loiro que vestia um short xadrez duas vezes seu tamanho e um
all star de cano longo que quase lhe passava o joelho se aproximando eu fingi não ver.
Virei-me de costas para ele pronto para sair dali o mais rápido possível, porém mi comi
foi mais rápido e puxou meu braço com força, quase o deslocando.
- BRYAAAAAAAANN. Se você tentar fugir de mim de novo eu te mato.
Felizmente não vi o rosto dele para saber se estava com uma cara demoníaca ou
não.
- Seu amiguinho estava te procurando.
Puxei meu braço de volta com força. Posicionei a mão no ombro do braço
machucado e o movi para ter certeza de que estava tudo ok.
- Que amigo?
Mi comi começou a saltitar com as mãos para trás. Eu o segui.
- Aquele que você me xingou por ter contado a ele que você é homo. Ele chegou todo
sem jeito para mim e perguntou onde você estava.
Mi comi riu, divertindo-se.
- Mentira. Se ele quisesse falar comigo me procuraria na aula. Estudamos na mesma
turma.
- Não estou mentindo!
Mi comi virou o rosto para trás e fez bico, estreitou os olhos e fitou-me como se
aquilo que eu houvera dito fosse um horror. Mesmo assim ele não me convenceu.
- Estou sendo um bom amigo e te avisando. Da próxima vez o mando falar contigo
porque não sou garoto de recados!
- Garanto que se ele tiver mesmo vindo falar contigo você não perdeu tempo e se
agarrou nele, não é mi comi? – debochei, fingindo acreditar para que ele não se fizesse
de ofendido.
- Bryaaaaaaan, como você é chato com esse apelido!
- Que apelido?
A risada veio de forma surpresa, sendo assim, mesmo eu tentando impedi-la acabei
soltando alguns sons, como se estivesse aranhando a garganta. Coloquei uma mão na
frente da boca e tentei esconder minhas bochechas que por suas posições denunciavam
meu riso. Por quê? Porque quem perguntara sobre o apelido fora exatamente Alex.
- Não é nada... Nada de mais. Foi só uma brincadeirinha.
11
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Olhar a cara atônita de mi comi, ação esta que somente me fez ter mais vontade de
rir. Alex ergueu uma sobrancelha.
- Que apelido Lucas?
Não consegui mais evitar e comecei a rir alto. A cena era hilária e era somente eu
olhar pelo canto do olho para a expressão incrédula do mi comi para eu rir mais. Mi
comi...
- Você quer saber qual é o apelido?
Antes que eu pudesse raciocinar sobre o que estava acontecendo vi o céu se mexer,
em seguida minhas costas e minha cabeça bateram com força em algo. No chão.
- Não fala!
Senti um grande peso sobre todo meu corpo, prensando-me contra o chão. Senti uma
terrível dor do tronco para cima.
- Me solta! – gritei furioso, tentando retirar aquele garoto estúpido de cima de mim,
sem sucesso.
- Não fala – ele sussurrou entre dentes, perto demais de meu rosto. Mi comi estava
com raiva e eu estava com raiva. Nossos olhos se cruzavam quase que com faíscas. Um
queria matar o outro.
- Sai de cima de mim – lhe disse pausando entre as palavras, tentando controlar
minha raiva. Porém, o mesmo não moveu um músculo sequer, continuava mantendo todo
seu peso sobre mim. Ele só me deixaria quanto eu declarasse não contar. Eu só me
decidiria quanto ele saísse de mim.
O passar do tempo me irritou. Para a infelicidade de mi comi, eu tinha o poder.
Empurrei-o com muita força, jogando ele sentado no chão a meus pés. Sentei-me e
deixei a raiva me dominar.
- Eu mandei você sair de cima de mim mi comi! Mi comi de merda! Agora conta para
eles que você quer tanto que lhe comam!
Antes de ver qualquer reação, me levantei, estapeei minha roupa rapidamente e lhes
dei as costas. Afastei-me deles, crente de que mi comi me xingaria de tudo que era
possível, mas somente o que ouvi fora risadas e perguntas sobre quem ele queria que
lhe comesse e coisas do gênero. Sem muitas alternativas, fui para minha sala de aula.
Entrei nela balbuciando baixinho algumas ofensas a mi comi. Por que ele tem que ser
tão escandaloso? E por que ele teve de pular encima de mim e me jogar no chão? Que
garoto problemático!
- Bryan.
Olhei para trás, de onde vinha a voz que me chamava e encontrei Pedro. Encabulado,
ele me estendeu meu caderno com a capa do Simple Plan.
- Está aqui a matéria de matemática.
- Obrigado.
Virei-me de costas para ele e rumei para meu lugar, sentando-me.
12
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- E... Bryan?
- Oi?
- Você não quer as outras matérias?
Pisquei algumas vezes, tentando clarear meus pensamentos. Antes que eu pudesse
falar algo ele continuou.
- Eu prometi a você que lhe conseguiria a matéria, não foi? Promessa é dívida.
Não entendo o porquê dele ter dito isso, sendo que não me recordo dele prometer,
somente de dizer que me conseguiria a matéria. De qualquer forma, sorri.
- Obrigado.
Pedro olhou para os lados, acho que para garantir que não havia ninguém por perto
para nos ver conversando. Quando viu que estávamos sozinhos sentou-se na classe a
minha frente, de lado, como da primeira vez em que nos vimos.
- Bryan, é verdade que você é viado?
Se ele houvesse usado outra palavra ao invés de “viado” eu teria mais vontade de
responder. Como você assume a sua homossexualidade para um garoto heterossexual o
qual você tem interesse? Eu gosto de Pedro e quero ser seu amigo. Normalmente as
pessoas não gostam de mim e eu não gosto de pessoas em geral, mas gosto de Pedro e
ele gosta de mim como amigo. Amigo hetero, claro.
- Sou gay sim.
A careta de Pedro fez meu coração se contrair.
- Ah cara, que nojo! Gostar de ficar com outros garotos... Isso é muito nojento! Por
que você não gosta de ‘minas? São tão gostosas!
- Quer mesmo saber?
Ele parou e pensou. Mais uma vez olhou para os lados, com medo de que alguém
nos visse sozinhos conversando e interpretasse mal. Pedro se levantou, foi até a porta e
fechou-a. Retornou para a cadeira na frente de minha classe e sentou-se.
- Bryan, não me entenda errado. Não tenho interesse nenhum, absolutamente
nenhum interesse em garotos. Se eu ouvir boatos sobre eu ser viado, quebro sua cara.
Mas... Por que você gosta de garotos? Garotas é que são excitantes!
Arrumei minha franja com a mão, recostei-me na cadeira e descansei minhas mãos
em meu colo.
- Não posso te dar um motivo satisfatório, mas... Em um relacionamento normal, é o
garoto que cuida da garota e eu gosto que cuidem de mim – falei devagar, analisando
todas as suas reações – as quais não eram positivas -, sem nem ao menos saber ao
certo o que dizer. –Eu prefiro que se importem comigo ao invés de ter de me importar
com uma garota. E eu acho meninas muito chatas! São falsas, falam mal daquelas que
consideram suas melhores amigas. Acham-se melhores que os garotos, se preocupam
tanto com coisas bana- Você se sente excitado com outros garotos?
13
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Senti meu rosto esquentar. Conversar com outros garotos que também se sentem
assim era uma coisa, conversar com um garoto hetero o qual tenho interesse é outra
completamente diferente. Ninguém nunca se importou em saber meus motivos para ser
gay, eu mesmo nunca parei para pensar bem neles. Sendo assim, considerei em limitarme a apenas responder com poucas palavras.
- Sim.
Pedro simulou vômito.
- Então você é o passivo?
- Sim.
- E gosta de dar?
- Uma garota pode gostar, então por que eu não posso?
- Por que você tem um pau!
Mais uma vez aquela vergonha me subiu a face, deixando meu rosto mais quente
ainda. Pedro percebeu.
- Você deveria conversar com um ativo, seria melhor. Eles são mais normais porque,
garotos normalmente gostam de comer garotas e ativos gostam de comer garotos – eu
disse tentando me desvencilhar daquele assunto, pois já estava querendo procurar um
buraco para enfiar meu rosto.
- Estou tentando entender você, não um ativo. Achei que você seria um excelente
amigo, mas é gay!
- E por que sou gay muda quem sou?
Finalmente Pedro sorriu, deixando-me confuso.
- Vocês gays sempre dizem isso?
- Não sei, por quê?
- Porque aquele garoto loiro me disse a mesma coisa.
Garoto loiro... Mi comi! Quero dizer, Lucas! Eu não achei que Pedro tivesse mesmo
falado com Lucas.
- Por que vocês conversaram?
- Eu queria te devolver seu caderno. Quando Camila me entregou ele eu te procurei
direto, daí como você tem andado com aqueles garotos perguntei para o loiro que te
arrastou aquele dia.
Realmente, estou chocado. Não levei a sério quando Lucas dissera que conversara
com Pedro, eu poderia jurar que era mentira. Pensei que era somente um deboche da
parte dele.
- E o que ele te falou?
- Ele me disse algumas coisas. Pediu para que eu conversasse com você e não
tirasse minhas conclusões a partir de outros. Que você é legal, se eu deixasse de falar
14
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
contigo seria um idiota preconceituoso, isso seria bullying e blá, blá, blá. Na verdade,
não escutei o resto porque fiquei impressionado com a aparência e a voz daquele
garoto.
Eu ri.
- A voz dele é realmente irritante e aguda.
- É. Eu achei mais... Afeminada mesmo. Bom, mas ele também me disse que não se
deixa de ser um ser humano só porque tem interesse em pessoas do mesmo sexo.
Tive de deixar o silêncio predominar porque simplesmente não soube o que dizer.
Lucas houvera me ajudado e eu fiz algo horrível com ele. Praticamente contei para Alex
que ele queria ser comido só porque ele ficou nervoso e tentou me calar.
- Bryan, tudo bem? Você parece que vai chorar.
- Estou bem sim. Só... Estava pensandUm barulho na porta chamou a atenção de ambos nos dois. Meu coração deu um
pulo, pois se fosse um de nossos colegas e um boato se espalhasse Pedro nunca mais
se aproximaria de mim.
Mas, para nosso alívio era somente um emo. Ele possuía o cabelo bem preto e os
olhos verdes vivos e claros, de chamar a atenção de longe. Um piercing na sobrancelha
e outro no nariz. Era lindo. Como todos os garotos deste colégio conseguem ser tão
bonitos?
Tentei lembrar seu nome, mas não consegui. Sabia que ele fazia parte do grupo de
emos o qual tenho andado ultimamente, pois aqueles olhos contrastando com o cabelo
chamavam muito a atenção.
- Desculpe interrompê-los. Bryan, você viu o Lu?
- Não o vejo dês daquela hora em que saí de perto.
Ouvi barulho na cadeira de Pedro e mudei meu foco para frente.
- Eu já estou de saída mesmo, só queria entregar seu caderno Bryan. Como você
sabe, vou cumprir a promessa e vou lhe conseguir toda a matéria. Até mais – ele fez
questão de explicar bem alto para que não houvesse mal entendido com o garoto emo.
Ou seja, não quer ser chamado de gay.
Quando Pedro passou ao lado do garoto de olhos verdes o mesmo sorriu, porém
Pedro virou as costas e praticamente correu para fora da sala, com... medo? Será que
ele tinha medo que o emo o agarrasse?
- Hetero?
- Isso mesmo.
- Desculpe interrompê-los.
- Que nada. Devo até te agradecer, a conversa aqui estava se tornando um tanto
estranha.
Ele sorriu. Com um sorriso lindo como todos os garotos daqui... Nossa, minha mãe
sabe escolher muito bem colégios!
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EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Lembra-se de meu nome?
- Não. Desculpe – fui obrigado a ser sincero, pois caso a próxima pergunta fosse
“então qual é?” eu não saberia responder.
- Tudo bem.
Ele se aproximou e sentou-se na classe ao lado da minha, literalmente na classe, não
na cadeira.
- Meu nome é Matheus. Lu nos apresentou. Você é Bryan, certo?
- Sim. Me desculpe, é que são tantos nomes novos.
- Entendo. E Lu está com um complexo de amigo que não sai do seu pé e não lhe
deixa conversar com os outros. Perdoe-o, ele só é um tanto sozinho.
- Ele ficou muito mal depois que eu saí? – perguntei temeroso, sem saber se queria
mesmo ouvir a resposta. Na hora eu estava com raiva, mas ele não merecia o que eu fiz.
Em nenhum momento ele me tratou mal ou me fez algo de ruim. Bem, só quando nos
conhecemos que ele contou a Pedro que eu era homo, mas não fora de propósito.
- Bastante. Você mandou muito mal.
Senti-me péssimo. Eu conheci a Lucas há tão pouco tempo, mas aquela agitação dele
e jeito de criança realmente são marcantes. Não o queria triste nem mal. Eu nunca fui
muito sociável e as pessoas nunca quiseram se aproximar de mim, mas com Lucas foi
diferente.
As pessoas deste colégio são diferentes com relação a mim.
- O que houve?
- Ele tentou se explicar, mas não deu. Alex brigou com ele e chamou-o de muitas
coisas, dentre elas de puto e falso. Lu saiu de perto de nós chorando. Eu tentei alcançálo, mas parece que ele conseguiu se esconder no colégio.
- Então acho que vou matar os próximos períodos e procurá-lo.
Matheus desceu da
despreocupadamente.

mesa

e

colocou

as

mãos

nos

bolsos

da

calça,

- Eu terei de ir para a aula. Rodei feio no primeiro trimestre em Física. Quando
encontrá-lo, diga a ele que explique - se para mim, pois tentarei falar com Alex.
Ele se virou para a porta e seguiu na direção da mesma. Parou no caminho e virou o
rosto de lindos olhos verde claros para mim.
- E diga-o que ele é fofo. Ele gosta de ouvir isso.
Matheus saiu da sala e só então percebi que meu coração estava aos pulos. Tentei
acalmar minha respiração e, quando ouvi o sinal bater peguei minha mochila saí
rapidamente da sala de aula, pois tinha de procurar por Lucas.

16
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Capítulo 4: Mi comi, Mi beija.
Saber onde ele se encontrava nem seria tão difícil assim. Quando eu desejava chorar
no colégio eu ia para os banheiros, pois lá nunca há ninguém para incomodar. O
problema é: onde ficam os banheiros neste colégio? E quantos deve haver aqui?
Depois de errar algumas vezes eu encontrei um banheiro que ficava distante dos
outros, próximo a sala de química. Entrei nele e percebi que estava vazio. Fiz o máximo
de silêncio possível e, logo, consegui escutar um choro baixinho vindo do último
banheiro. Antes de bater na porta ou fazer qualquer barulho, abaixei-me e espiei por
debaixo. Encontrei o par de All star preto de cadarços pretos e detalhes em branco que
houvera visto Lucas usar mais cedo.
Bati na porta.
- Lucas – chamei.
Logo, uma voz embriagada pelo choro me respondeu.
- Vai embora.
Suspirei.
- Desculpe.
- Não!
- Lucas, se você me ignorar terá de ficar chorando aí sozinho, pois os outros foram
para a aula.
O choro se tornou mais alto e mais intenso.
- Minha única opção é aquele quem me fez chorar!
- Quem te fez chorar foi Alex, não eu.
- Mas a culpa é sua!
- Eu sei, desculpe.
- E eu nunca te fiz nada de ruim. Você é mal e cruel.
- Desculpe. Foi na hora da raiva, eu não queria te fazer mal.
- Mas fez! Agora Alex me odeia e me chamou de um monte de coisas ruins. Ficou
repetindo que eu era puto o tempo todo.
- Desculpe Lucas. Já expliquei que eu disse só na hora da raiva, eu não tinha
intenção de dizer mesmo. O que mais você quer de mim?
Uma pequena fresta da porta fora aberta. Ali, Lucas espiou, com as lágrimas
escorrendo pelo rosto e sujando-o de preto por conta da maquiagem.
- Posso te bater? – ele perguntou de forma meiga.
Eu fitei-o sem entender.
- O quê?
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EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Se você deixar eu te bater eu te perdoo.
Parei e tentei raciocinar. Ele queria me bater? Isso é muito estranho!
- Um soco só! E no braço.
- Na barriga.
- Não.
- No ombro então.
- Um pouco abaixo do ombro.
- Ok.
Assim que ele concordou não tive tempo de me preparar. Ele abriu a porta do
banheiro e já foi me desferindo um forte soco na parte de cima do meu braço, bem
próximo ao ombro.
- Aí! Puta merda, você é forte!
Lucas riu, mas por pouco tempo. Seus olhos se encheram d’água e ele me envolveu
com seus braços, apertando-me.
- Alex me odeia!
Nunca gostei de ter de consolar pessoas. Normalmente eu acabo chorando junto.
Adentrei o pequeno banheiro para que ninguém nos visse e sentei no vaso que se
encontrava com a tampa abaixada, largando minha mochila ao lado deste. Lucas sentouse em meu colo e afundou sua cabeça abaixo de meu pescoço.
- Alex disse que gosto que qualquer um me coma, mas não quis dar pra ele. Ele disse
bem assim mesmo! E que aquela minha conversa de que eu queria que fosse com amor
era só desculpinha. Ele não acreditou quando eu disse que ainda era virgem.
Suspirei. Por que eu tinha que abrir a minha boca grande? Agora tenho um garoto
chorando em meu colo graças a minha estupidez. Ok, isso foi um tanto insensível de
minha parte. Acho que só estou irritado porque é Lucas quem está chorando em meu
colo e, por mais que eu negue a culpa é minha. Realmente não queria fazê-lo mal assim.
Lucas se esticou e pegou um pedaço de papel do rolo próximo de nós. Amassou-o e
enxugou as lágrimas por debaixo dos cílios, borrando a maquiagem o mínimo possível.
- Ele nem quis me escutar! Disse que provavelmente eu já havia dado para você.
- Isso seria impossível – eu disse revirando os olhos.
- Por quê?
- Porque eu não gostaria de comê-lo. Você já se imaginou sendo comido por mim?
Eu sorri, incentivando-o a rir. Ele fungou um pouco e enxugou as lágrimas
novamente. Quando me dei conta do que estava acontecendo Lucas já estava
perigosamente próximo de mim, com seus lábios sobre os meus. Assustei-me e afastei-o
com as mãos.
- Pára Lucas! O que pensa que está fazendo?
18
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- São somente beijos. Não é como se fôssemos nos tornarmos namorados, irmos
para cama ou algo assim. E eu quero carinho – ele disse fazendo um bico de criança. Eu
suspirei. Realmente, estava tudo bem beijá-lo.
Segurei seus cabelos loiros de raiz escura e beijei-o. Adentrei minha língua pela sua
boca e logo percebi seu ritmo. Era lento e doce. Lucas não beijava mal, mas era bem
diferente de Alex. Como eles poderiam se dar bem?
Tentei me concentrar somente no beijo, mas era uma tarefa extremamente difícil.
Apenas o fato de minha língua estar dentro da boca de Lucas já era o suficiente para
acelerar meus batimentos cardíacos porque, afinal, era Lucas...
Quando nos separamos ele retornou a chorar e soluçar.
- Eu odeio o mundo! Odeio minha vida! Como pode tudo dar tão errado para mim...?
- Somos dois.
- Mas você pode ter meu Alex quando quiser! Agora ele está brabo comigo, eu nunca
vou tê-lo.
- O que importa eu poder ter Alex ou não? Não é ele quem eu quero.
- Você quer o Pedro? Aquele garoto hetero?
- Esse mesmo – falei, recordando-me de que eu havia voltado a falar com ele por
causa de Lucas e me senti obrigado a agradecê-lo. – E obrigado por ter falado com ele.
- E como agradecimento você fez o que fez! Idiota!
Eu não possuía resposta. Para calar sua boca, beijei-o. Suguei seu lábio inferior,
puxando com força. Quando nos separamos ele limpou o nariz e acomodou-se em meu
colo novamente. Acariciei seus cabelos. Ficamos algum tempo assim, enquanto o único
som era o barulho do choro de Lucas.
- Bryan, como é sua vida? Como é sua família? – ele perguntou assim que se
acalmara um pouco.
- Bem... Meus pais são divorciados. Antes eu morava com meu pai. Nunca lhe
agradou o fato de ter um filho emo, mas aceitou. Quando ele descobriu que eu era gay
não quis mais passar vergonha comigo e me mandou para morar com minha mãe. Ela
não para muito em casa, está sempre trabalhando, então não tenho problemas. Sei que
ela tem um namorado, às vezes o vejo em minha casa a noite, mas finjo que não vi e vou
para o quarto.
- E você e seu pai brigam?
- Brigávamos. Ele me mandava trocar de roupa e arrumar o cabelo para sair com ele
na rua, mas eu sempre me recusava. Dizia para eu agir como um garoto normal e que
sentia vergonha de mim, mas para os outros falava que isso era só uma fase. Coisa de
adolescente. E você?
Lucas fechou os olhos, aproveitando melhor meu carinho. Envolvi seu corpo com
meus braços. Ainda bem que Lucas é somente um amigo porque me sinto completamente
desconfortável nesta situação.

19
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Meus pais moram juntos, mas brigam constantemente. Meu pai não gosta de mim.
Ele diz que queria ter um filho, não essa coisa que eu sou. Minha mãe me defende, diz
que ainda sou criança e que garotos amadurecem mais tarde. Ela me dá qualquer coisa
e me trata como criancinha. Meu pai está sempre arranjando desculpas para me pôr de
castigo, diz sempre que sou uma decepção. Às vezes ele tenta me bater, mas minha mãe
não deixa. Eu tenho uma irmã mais velha, mas ela é um nojo de pessoa. Ela também me
odeia. Ela é arrogante e exibida. Muda de namorado a cada semana e veste roupas de
puta, mas meu pai a trata como se fosse a rainha do mundo.
- Nunca vi pais que aceitassem que seu filho fosse emo e gay.
- Os pais de Matheus aceitam. Você lembra quem ele é?
- Sim, sim.
- Os pais dele dizem “não importa quem você é ou como é, te amaremos do mesmo
jeito. Só sentimos porque as pessoas do mundo são ignorantes e você terá uma vida
difícil”. Eles não são incríveis?
- São sim.
- As coisas são mais fáceis para elFomos interrompidos por um barulho de alguém entrando no banheiro.
Rapidamente, empurrei a porta de onde estávamos com os pés.
- Ouviu isso? – perguntou algum garoto para outro.
- Foi só uma porta batendo.
De repente, Lucas começou a gemer como uma garota. Gemeu cada vez mais alto,
fazendo uma voz aguda e feminina. Fitei-o assustando. Quando ele piscou para mim,
entendi o que ele queria.
- Cala a boca, putinha – eu disse fazendo uma voz mais grave, voz esta que nem
parecia que vinha de mim.
- Ah, mas é tão bom...
Ele continuou a gemer como uma garota mesmo. Tentei segurar o riso, mas parecia
impossível. Ouvimos os passos dos garotos se retirando do banheiro com pressa e,
logo, caímos na gargalhada.
- Você é um viado mesmo! Até eu acreditei!
Lucas riu e fungou. Pegou mais um pedaço de papel e enxugou a água por debaixo
dos cílios novamente.
Rapidamente, tentei pensar em algo para dizer, evitando, assim, que seu choro
recomeçasse. Vasculhei minha mente procurando por algo que o fizesse sorrir, porém,
não encontrei. Quando já estava desistindo recordei-me de Matheus e do que ele me
dissera.
- Aliás, você é realmente fofo.
O sorriso que ele abriu fora gigante. Seus olhos brilharam e ficaram duas vezes
maiores. Com um elogio tão simples ele ficara imensamente feliz. Agora entendo do
porquê de Matheus ter me dito para agradar-lhe com tal elogio.
20
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Obrigado! Eu também acho!
Sorri, satisfeito comigo mesmo. Lucas continuou feliz, sorrindo como um bobo,
perdido em pensamentos agradáveis. Segurei-lhe na cintura e puxei seu corpo para mais
próximo do meu. Ele era magro e, mesmo por cima de sua blusa fina pude sentir sua
pele quente.
Uma onda de desejo me invadiu. Fora tão forte e arrebatadora quanto inesperada e
repentina. Começou com um leve formigamento, foi subindo de minhas mãos a meus
braços, invadindo meu peito em forma de calor, se espalhando em um segundo por todo
o resto de meu corpo.
Minha respiração pesou dezenas de vezes mais e eu...
...Eu quis tocá-lo...
- Não quero sair daqui assim.
Ignorei completamente meus pensamentos anteriores, como se nem ao menos
houvessem existido. Abri minha mochila e tirei de lá um estojo com maquiagem.
Primeiramente limpei aquilo que estava borrado, secando seus olhos e retirando os
resquícios de maquiagem espalhados. Em seguida lhe passei lápis de olho, máscara
para cílios, blush e um corretivo para as olheiras.
- Não vai abrir o berreiro se ver Alex, não é?
Desgostei de minha pergunta quase tanto quanto ele.
- Não sei.
- Lucas! Ah, e Matheus disse para você se explicar para ele que tentará conversar
com Alex.
Lucas fechou a cara.
- Você poderia ter dito isso antes. Ajudaria muito.
- Desculpe, esqueci.
Sério mesmo? Se eu houvesse dito isso no início de tudo o choro acabaria? Prefiro
não acreditar nisso.
- E mais uma coisa: continuarei a chamá-lo de mi comi.
Seu queixo foi ao chão.
- O queeeeeee?
- Continuarei a chamá-lo de mi comi, mas não na frente dos outros. Então, seja um
bom mi comi, ok?
Quase me arrependi de chamá-lo novamente pelo apelido, pois deu para perceber
por sua expressão que não estava nada satisfeito com minha decisão. Mas o apelido era
tão engraçado e único que continuei com minha ideia fixa de continuar a chamá-lo pelo
mesmo.
- Você é cruel! Eu-

21
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Interrompi-o com um beijo. Seria muito problemático se ele caísse no choro
novamente e... Bem, é bom beijá-lo. Não que eu vá admitir isso para ele.
Desta vez quem dera o próximo passo fora ele. Sua língua foi adentrando pela minha
boca, sem perder aquela doçura e calma que eu conhecera em nosso primeiro beijo.
Lucas envolveu meu pescoço com seus braços e me aproximou mais de si, encostando
nossos corpos.
- Você gosta de ser beijado, não é?
Vê-lo respirar cada vez mais fundo e inspirar mais pesarosamente proporcionou-me
uma satisfação indescritível.
- Mais ainda quando estou triste – ele respondeu sorrindo, já recuperado.
Dei alguns leves tapinhas em sua coxa, indicando que era para ele se levantar. Mi
comi assim fez.
- Pois então tomarei cuidado para nunca mais fazê-lo triste – debochei sorrindo
diabolicamente. Me levantei, peguei minha mochila e saí dali de dentro para o banheiro
antes de Lucas.
- Bryaaaaaaaann! Você é um chato!
- E você é infantil, escandaloso, chora- Já entendi!
- E beija mal.
Fui para frente do espelho e arrumei meu cabelo. Mi comi aproximou-se de mim e me
empurrou de leve.
- Mentiroso! Você adorou me beijar que eu sei!
- Se eu tivesse adorado teria te agarrado ali.
Lucas sentou-se ao meu lado na frente da pia e balançou as pernas distraidamente.
Ele fitou de longe suas unhas bem pintadas de preto, de um jeito superior.
- E você me agarrou. Só faltou arrancar meus lábios fora!
- ‘Tsc. Foi somente para te consolar!
- Que mentira! Você fala como se beijasse maravilhosamente bem!
Estreitei os olhos para ele, incomodado. Ele houvera acabado de ferir meu orgulho.
Aproximei-me dele e me posicionei entre suas pernas. Mi comi sorriu e envolveu minha
cintura com aqueles All stars longos.
- Vamos ver quem beija mal – desafiei-o, para logo em seguida iniciar mais um beijo
de me deixar trêmulo de tão nervoso.
Enquanto nos beijávamos, Lucas começou a rir. Rir até demais para ser somente um
deboche. Quando ouvi aquele conhecido som de um objeto plano empurrando o ar com
força e batendo percebi que alguém nos vira.

22
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Separei meus lábios dos de Mi comi cessando nosso beijo. Ouvi sua gargalhada
seguida de uma provocação:
- Volta aqui gatinho! Eu deixo você participar da nossa suruba!
- Mi comi! Cala a boca! Estamos no colégio – adverti-o ter ainda uma mínima noção
do quão ruim era aquela frase.
Olhei para o rosto de Mi comi e este me assustou. Vi um sorriso sadicamente
horripilante brincar em seus lábios.
- Ein Bryan, qual é mesmo o nome daquele garoto hetero que você é afim?

23
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Capítulo 5: Já disse que não vou cair nessa.
Assim que ouvi as palavras de Mi comi simplesmente não soube o que dizer. Meu
coração parou de bater por um segundo para, logo em seguida começar a bater
rapidamente.
- Você não fez isso...
Mi comi se deitou tranquilamente ali mesmo, no balcão da pia. Não olhou para mim,
somente ficou a brincar com seu colar de caveira entre os dedos.
- Por que não faria? Foi uma excelente vingança.
Meu estômago começou a revirar o conteúdo de dentro dele por causa do
nervosismo. Senti como se a temperatura ambiente houvesse ultrapassado uns bons 30°
Celsius porque meu corpo todo queimou.
E sabe qual é a pior parte? Ver Mi comi ali, calmamente deitado, como se não tivesse
feito nada de mais.
- Você é um monstro vingativo!
Pedro houvera mesmo me visto com Mi comi? Agora sim ele vai ficar enojado com
gays! Eu pedi desculpas. Disse que estava arrependido. Ele tinha mesmo que acabar
com todas as minhas chances de ficar com Pedro só por causa de um erro meu...?
E eu tentei engolir aquele bolo que se formava em minha garganta. Tentei trancá-lo
junto com minha respiração, mas tal ato estava beirando ao impossível.
- Você é uma pessoa horrível Lucas!
Todos os meus esforços para acabar com a tranquilidade dele finalmente houveram
dado resultado. Lucas se irritou e sentou-se novamente na frente da pia.
- E quem é você para me acusar de algo? Você fez muito pior! E quer saber? Não era
Pedro, era somente um garoto qualquer, porque eu nunca faria com alguém o mesmo
que você fez comigo!
Ele se levantou e saiu correndo. Já eu fiquei ali, parado, tentando digerir a
informação.

***
Os dias seguiram normais. Mi comi não me tratou mal depois daquele dia no
banheiro, continuou sendo o mesmo de sempre, porém, de alguma forma eu o sentia
diferente. Não vou dizer que é “sexto sentido”, pois acho isso ridículo. É somente uma
sensação e essa sensação quando ele está próximo de mim não é a mesma de antes.
O sinal soou, anunciando o final do primeiro período e início do segundo.
Distraidamente, direcionei meu olhar para a porta, aguardando a chegada do professor
de educação física enquanto a sala se tornava uma verdadeira zona. Quando o
professor entrou a sala aquietou-se de imediato. É sempre assim.
Não vou mentir, o professor de Educação Física é muito gostoso, mas há três passos
de distância entre nós: um, a diferença de idade. Dois, o fato de sermos ambos homens e
três, ele possuí uma repulsa por mim que é incrível.
24
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Vamos Bryan?
Fitei a Pedro que me esperava. Sorri e o segui até o pátio. Nesses últimos dias eu e
Pedro estamos nos dando relativamente bem. Como amigos, claro.
- Vai fazer a torcida com as garotas?
Relativamente bem porque, por mais que conversemos como amigos normais, Pedro
sempre solta estas piadinhas um tanto homo fóbicas. Mas, para não criar
desentendimentos finjo que não percebi.
- E por que faria isso? Não sou uma garota metidinha e nojentinha querendo chamar
a atenção – eu disse isso, mas tenho certeza que Mi comi deve fazer torcida com as
garotas.
- Você tem razão. Mas, ‘cê não vai jogar, ‘né?
- Não.
- Vai ficar assistindo?
- Quietinho na arquibancada – respondi sorrindo para ele. Pedro desviou o olhar.
- Bem, então torça por mim.
- Por quem mais eu torceria?
- Ah, sei lá. Pelo time com mais garotos bonitos – percebe a indireta ao
homossexual?
- Não se preocupe Pedro, vou torcer por você.
Chegando ao pátio me recusei a jogar como faço 80% das vezes. O professor me
deu uma bronca leve para não parecer preconceito e me deixou sentado na
arquibancada, observando. Assisti enquanto os garotos se dividiam em times para jogar
futebol. Nunca gostei desse esporte. Foquei-me em Pedro, pois parecia que os times
estavam brigando para escolhê-lo. Acho que ele olhou rapidamente para mim, mas não
tenho certeza. Em seguida ele agarrou a barra da camiseta e puxou-a para cima,
retirando a mesma. Meu coração deu um pulo e, desta vez tenho certeza que ele me
espiou pelo canto do olho.
- Bryaaaaaaaaan!
Senti o peso de um corpo sobre minhas pernas. Olhei para o garoto em meu colo e
sorri.
- Oi Mi comi. O que faz aqui? Não deverias estar em aula?
- Minha professora de química não veio. Tenho esse período e o próximo vago, então
vim passar esse tempo contigo.
Mesmo que eu estivesse feliz por dentro por ter a atenção de Mi comi ainda havia
algo que eu devia perguntar.
- E Matheus? – perguntei por que, dês daquele dia no banheiro Mi comi tem passado
muito mais tempo com Matheus do que comigo.

25
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Ele tinha outras coisas para fazer – ele respondeu fazendo bico enquanto brincava
com meu colar de estrela.
- Você não pode ficar aqui, meu professor irá brigar.
- É o Fernando gostosão?
Concordei sem ter certeza se era mesmo esse o nome do professor. Só lembro-me de
que era um nome com “F” e... Bem, ele é gostoso.
-Não se preocupa, ele não se mete comigo. Uma vez só nós brigamos, mas daí eu
chorei na diretoria e ameacei dizer que ele havia me agarrado.
Mi comi riu, ainda brincando com meu colar, como se estivesse dizendo algo
completamente simples e banal.
Ergui meu olhar para o jogo de futebol e na mesma hora percebi que Pedro desviara
o olhar. Estaria ele me cuidando...? Mas, Pedro não tem interesse em garotos... Não é...?
- Bryan, o que são essas marcas no seu pulso?
Senti o nervosismo envolver meu peito e de imediato puxei meu pulso. Mi comi me
olhou confuso.
- Você tentou... Tentou se matar?
- Isso são cicatrizes antigas – tentei explicar, mas simplesmente não achei uma
desculpa razoável.
- Então você tentou mesmo se matar!
Desviei o olhar de Mi comi para Pedro. Mais uma vez percebi que ele estava me
olhando. Quando percebeu que eu olhava, ele concentrou-se no jogo e chutou a bola
para outro garoto.
Senti os braços de Mi comi me envolverem em um abraço apertado. Eu não queria
sua pena, mas seu corpo quente e macio junto ao meu proporcionava-me um prazer
indescritível.
- Não se mate Bryan!
- Não dá para falar mais baixo Mi comi? Eu não vou me matar!
Eu até poderia xingá-lo e mandá-lo me largar, declarando nada menos que a
verdade: eu não pretendia me matar. Porém... Seu calor e se corpo pequeno junto ao
meu eram tão bom...
Por cima do ombro de Lucas eu olhei para o jogo. Desta vez, quando Pedro olhou
para mim e viu que, mesmo no abraço de Mi comi eu estava o observando, ele não
desviou o olhar. Ele me olhava e eu o olhava. Sorri, incentivando-o a continuar o jogo,
porém, ele não desviou o olhar de mim. Continuamos a nos encarar até um dos garotos
chamar a atenção de Pedro para o jogo e ele ter de ir jogar.

***
26
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga

Andava pelo colégio distraído, finalmente a sós. Mi comi provavelmente estaria
correndo pelo colégio a minha procura, mas era bom aproveitar o pouco de tempo que
eu teria sozinho antes dele me encontrar. Eu ainda deveria estar na aula de educação
física, mas fugi quando o professor não viu. O colégio se encontrava vazio nos
corredores, pois a maioria dos alunos está tendo aula neste momento.
Continuei meu passeio pelo colégio tranquilamente, já estranhando a demora de Mi
comi para me achar. Passei por uma porta e juro que ouvi gemidos e risadas. Voltei
alguns passos e parei na frente da porta. Realmente, ali dentro havia gemidos e risada.
- Pára! Aí não... – pediu uma voz manhosa, mas que parecia ser de um garoto. Seria
um casal gay?
Continuei na frente da porta, escutando o barulho de dentro. Eu realmente estava
curioso se era um casal homo ou não. Considerei abrir a porta, porém eu passaria
vergonha interrompendo o sexo. Bom, quer saber? Foda-se, não tenho nada a perder
mesmo.
Voltei alguns passos em silêncio para, em seguida andar na direção da porta
fazendo barulho, demonstrando que estava me aproximando. Meti a mão na maçaneta
descaradamente, como se não houvesse escutado nada e abri a porta.
Ora, era um casal gay, afinal. E eu os conhecia.
- Desculpe interromper. Não sabia que havia alguém aqui dentro – menti.
Aquela era uma sala de aula normal. Mas, encima da mesa estavam dois garotos sem
blusa, somente de short. Um deles eu reconheci imediatamente, era Matheus. O outro...
Bem, reconheci o cabelo de mechas verde limão recém-pintadas, era outro dos emos do
grupo o qual eu participava ultimamente.
Mesmo tendo sido pegos, ambos estavam sorrindo. Matheus sentado na mesa, com
metade dos braços apoiado atrás dele, erguendo seu corpo. Já o outro garoto estava
sentado encima de seu quadril, com as mãos no peito de Matheus.
Não sou do tipo de garoto que assiste pornô, mas aquela cena realmente daria um
maravilhoso vídeo.
- Vou sair – eu anunciei já me dirigindo para a porta.
- Não, espere. Já estamos saindo, ‘né Luke? – respondeu-me Matheus. Girei meu
corpo na direção deles novamente, mas sem sair do lugar.
- Ahh, Matheeeeeus. Agora não! – pediu de forma manhosa aquele emo de cabelo
preto e mechas verdes, rebolando sinuosamente. Tentei disfarçar, como se não houvera
visto aquilo.
- Eu disse que seria só um pouco. Não podemos fazer isso aqui no colégio, Luke.
Tivemos sorte que foi somente Bryan quem nos viu. Imagine só se fosse um professor?
O garoto resmungou e se remexeu mais um pouco, fazendo bico. De imediato me
lembrei de Mi comi, pois agiam de formas semelhantes. Matheus sorriu docemente e
depositou um leve beijo nos lábios do garoto.

27
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Olha, se quiserem eu saio. Realmente não tinha intenção de interromper nada –
menti, pois minha intenção era exatamente interromper para ver se eram dois garotos
mesmo.
- Não, não. Ainda bem que você interrompeu. Vamos Luke, levante-se, por favor.
O garoto se levantou a contra gosto. Matheus se levantou também e antes de vestir
sua camisa pegou a do garoto das mechas verdes e vestiu-o. Ambos possuíam a mesma
altura. Calçaram os sapatos e vieram para meu lado, saindo de lá.
Fiquei sem jeito de estar somente eu e mais o casal, mas eles não agiam como um.
Pareciam somente amigos, sendo assim terei de perguntar a Lucas qual a relação
desses dois.
- Bryaaaaaaaaaaann!
Sabe, já estou tão acostumado a ouvir Mi comi chamando que, às vezes, quando
minha mente fica em branco o que quebra o silêncio é a voz dele gritando meu nome.
Estranho, não?
Quando achei que ele ia pular no meu pescoço, Mi comi olhou para o lado e viu
quem estava me acompanhando. Seu sorriso se alargou.
- Ahh! Matheus!
Uma pontada de decepção atingiu meu peito quando assisti a Mi comi pulando no
pescoço de Matheus, já este sorriu e lhe beijou o topo da cabeça, seguido de um leve
afago.
- Quantas raízes escuras. Não está na hora de pintar o cabelo, Lu?
- Ah, eu pedi para Luke me trazer água oxigenada e aquele pozinho azul. Ele disse
que tem muito no salão da mãe dele. Você me trouxe Luke? – Mi comi perguntou
voltando sua atenção para o garoto das mechas verdes. Agora entendo do porquê de eu
não ter reconhecido o emo, porque ele está cada dia com um penteado diferente.
- Sim, eu trouxe. Está na minha mochila lá na sala.
- Você pinta para mim Matheus? – perguntou Mi comi, fazendo aquela sua expressão
de criança.
- É claro que sim Lu.
- Ah, então pinte agora! Temos dois períodos vagos mais o intervalo! Eu não quero
ficar moreno. Vem!
E Mi comi simplesmente saiu puxando Matheus para longe, deixando a mim e ao
garoto das mechas verdes para trás.
- Acho que ficamos somente nós dois – ele comentou, rindo.
- Pois é.
- Quer tomar sorvete?
Dei de ombros.

28
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Não tenho nada para fazer mesmo – menti, pois estou no meio da aula de educação
física.
Seguimos para o bar do colégio. Compramos dois sorvetes, o meu de creme e o dele
de morango. Sentamo-nos em uma mesinha que havia ali para os estudantes, um de
frente para o outro.
- Você e Matheus são namorados? – perguntei mesmo já desconfiando qual seria a
resposta, só para não continuar o silêncio chato.
- Não, não. Matheus não gosta de mim assim. Só ficamos de vez em quando. Ah, mas
ele é tão carinhoso...
A cena era completamente diferente. Estávamos na frente de um bar, eu e um garoto
um pouco mais alto que eu, moreno de mechas verdes e olhos castanhos. Ele sorria,
mas não era a mesma coisa e conversávamos sobre um garoto o qual eu já conhecera.
Mesmo assim, de certa forma me senti familiarizado com a cena. Havia certa semelhança
com quando eu conhecera Mi comi, ocasião esta na qual ele me contara sobre sua
paixão por Alex. Seriam estas situações semelhantes ou sou somente eu quem estou
pensando demais em Mi comi...?
- Humm... Esse sorvete está tão bom...! Quer provar?
Fiz que sim com a cabeça e ele me esticou uma colherada de sorvete. Abri a boca e
aceitei. Estava realmente delicioso.
- Muito bom – concordei, sorrindo. O garoto também sorriu e abaixou o olhar para o
sorvete.
Quando uma pessoa é triste você percebe, pois sente a energia. Uma vez minha antiga
psicóloga me contou que o paciente com depressão é o último a ser atendido, pois
independente da pessoa, depressão pega. Inclusive era por isso que eu sempre era o
último paciente do dia. Bom, mas agora estou melhor e sinto a energia desse garoto.
- Tudo bem?
Ele assustou-se e olhou para mim. Em seguida abaixou o olhar novamente,
entristecido. Ele parecia realmente cheio de problemas.
- Sim, estou bem.
- Você frequenta um psicólogo?
- Sim. Ele me manda tomar alguns remédios.
- Você é depressivo.
- E você intrometido.
Sorri, tentando parecer mais simpático. Ele estava certo, eu estava me intrometendo
demais em sua vida.
- Desculpe. Só estava vendo que temos algo em semelhante.
- Você também é depressivo?
- Eu era. Bem, talvez ainda seja. Quando parei de frequentar a psicóloga ela me disse
que eu estava melhorando.
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EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Ele sorriu e fuçou em seu sorvete, sem olhar para mim. Lembrei que eu ainda tinha
de comer o meu próprio sorvete então assim o fiz.
- Qual é sua válvula de escape? – perguntei, já tendo uma ideia de qual seria a
resposta.
- Matheus. Ele não tem problemas, sendo assim os nossos problemas se tornam os
seus problemas. Ele é muito carinhoso e atencioso. Já transou com ele?
Estranhei a pergunta. De imediato o sangue me subiu a face, felizmente o garoto das
mechas verdes estava de cabeça baixa, fitando seu sorvete.
- Não – respondi dando ênfase ao “a”, dando um som diferente aquela pequena
palavra.
- Você é virgem?
Desta vez ele me olhou, desejando ver qual seria minha reação.
Considerei se lhe diria a verdade. Mas, afinal, não havia nada de mais em dizer a
verdade, acho...
- Sim – respondi no mesmo tom do “não”.
- E você gostaria de deixar de ser?
O sorvete começou a entalar na garganta. Não que eu não quisesse, mas era a
primeira vez que eu falava com esse garoto e ele já me vem com assunto de sexo. Mas
acho que não posso reclamar, considerando que eu mesmo estava conversando sobre o
garoto ser depressivo.
- Bem... Acho que sim. Mas não quero que seja de qualquer jeito – admitir isso fora
extremamente difícil. Eu não costumo conversar sobre tal assunto com relação a mim,
seja lá com quem for. Com Mi comi era sobre ele, então tudo estava bem.
- Então, se tivermos mesmo algo em comum, você deveria conversar com Matheus.
Ele é realmente muito amável.
- Você não ficaria chateado com isso?
- Não, porque não estamos saindo. Eu não gosto de Matheus assim, eu só gosto do
carinho dele e isso é difícil de encontrar em um garoto, pelo menos para mim.
- Verdade...
Pensar em sexo... Isso não me assusta, pois eu já fui quase estuprado. Eu até
gostaria – não de ser estuprado, de ter sexo – mas, foi como eu disse, não queria que
fosse de qualquer jeito. Em meu outro colégio os garotos homossexuais que havia não
pensavam em namoro, só queriam comer o maior número possível de garotos, ou dar
para. É como eu disse para ele e também é como ele me disse. Eu gostaria que fosse
com um garoto mais amável que a maioria.
- Matheus fica por cima ou por baixo? – perguntei envergonhado, sem fitá-lo.
- Os dois. Ou o que você quiser, porque ele deixa quase qualquer coisa.
Remexi meu sorvete. Ele era bem clarinho, quase branco, semelhante à cor do
esperma...
30
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Não quero mais comer sorvete. Quer o meu? – ofereci lhe estendendo meu potinho.
Luke era seu nome, ou pelo menos assim que o chamavam. Obriguei-me a gravá-lo,
pois em uma conversa não poderia me referir a ele como o garoto das mechas verdes,
ficaria chato. E se ele pintasse o cabelo de outra cor? Como eu ficaria?
Lembra quando eu citei sobre a mente em branco? Pois é, agora mesmo acabei de
pensar na voz de Mi comi me chamando.
Sexo, sexo, sexo... Isso seria mais fácil para mim agora que moro com minha mãe,
pois ela passa mais tempo na rua do que em casa. Quando eu morava com meu pai era
mais difícil. Se um amigo meu fosse em minha casa somente para jogar vídeo - game ele
já desconfiava. Bem, com razão, pois nunca era somente jogar, sempre acabava em
‘pegação’. De qualquer forma, agora estaria tudo bem, pois minha mãe não ficaria na
volta.
- Sabe Bryan, essa seria uma válvula de escape melhor do que se mutilar.
Arregalei os olhos e fitei meu pulso. Só então percebi que Mi comi retirara minha
pulseira e que agora minhas cicatrizes estavam expostas. Escondi meu pulso embaixo
da mesa, escondendo as marcas com a outra mão.
Merda de Mi comi.
- Bryan!
Virei para o lado e vi Pedro se aproximar. Surpreso, esperei até ele chegar perto e
dizer o que queria.
- Bryan! Então você estava aqui... Eu queria falar contigo.
Olhei para Luke, o qual sorria.
- Tudo bem? – perguntei, não querendo deixá-lo sozinho ali, pois isso nunca é bom
para um depressivo.
- Vai nessa – ele respondeu sorrindo.
Se fosse outra situação, eu ficaria com Luke. Mas, eu realmente fiquei curioso com
relação a Pedro. O que será que ele quer de mim? Ele aparentava estar me procurando
já há algum tempo.
Levantei-me e o segui para longe. Pedro não disse absolutamente nada. Fomos até a
nossa sala de aula, a qual se encontrava vazia. Pedro olhou para os dois lados do
corredor antes de fechar a porta. Foi até as janelas e fechou as cortinas, uma por uma.
Meu coração começou a palpitar cada vez mais rápido. No meu entender, ele queria
fazer algo que ninguém mais poderia ver. Então, vendo a situação pelo lado de fora:
estão dois garotos sozinhos em uma sala de aula, um homossexual e outro
heterossexual. O hetero fechou a porta e as cortinas, para ter certeza de que ninguém
veria nada e aparenta estar nervoso.
Eu estou louco ou Pedro quer ficar comigo?
Vamos, acalme-se Bryan. Esconda este sorriso do rosto. Puxe os cantos dos lábios
para baixo! Vamos, puxe! Eu não acredito que eu consegui realizar esta façanha. Terei
mesmo eu transformado um garoto completamente hetero em um homo?

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EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Pedro? – chamei-o, sem ter certeza se conseguiria escutar sua voz, pois meus
batimentos cardíacos estavam exageradamente acelerados.
Quando ele terminou de fechar a última cortina voltou-se para mim e caminhou
lentamente em minha direção.
- Bryan, eu confio em você. E você sabe que não sou gay e não serei, ‘né?
Sei. E é por isso que você fechou toda a sala e teve certeza de que ninguém estava
nos vendo, não é?
- Bryan eu... Ah, eu me sinto estranho sendo amigo de um gay. Amizade entre um
garoto e uma garota sempre acaba em romance. Amizade entre um gay e um hetero dá
em quê?
- As pessoas dizem que não é possível existir amizade entre um garoto e uma garota
sem rolar romance. Por que com garotos é diferente? Por que dois garotos podem ser
grandes amigos? Muitas vezes uma amizade bem maior do que a do garoto e a
namorada – engoli em seco, tremendo exageradamente. Meu coração estava chegando a
três batidas por segundo. – Pedro, por que amizade entre garotos dura mil vezes mais
que um namoro? Afinal, a única diferença entre amizade e namoro é o interesse sexual,
não é?
Eu já disse o quanto ele é lindo? Já disse sobre todas as garotas aos seus pés? Já
disse que eu nunca pensei ter uma chance com ele? Já disse sobre a quantidade de
piadinhas homo fóbicas que ele faz? Já disse que quando ele descobriu que eu era gay
ele se afastou de mim? Já disse que ele está se aproximando perigosamente de mim? Já
disse que ele está corado e nervoso? Já disse que seus lábios estão quase sobre os
meus?

32
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga

Capítulo 6: Heterossexuais de merda.
Eu já disse que não vou cair nessa.
Pedro encostou seus lábios nos meus devagar, com um cuidado derradeiro. Eu
sabia que ele não me queria assim, era somente uma curiosidade. Obviamente eu não o
deixaria brincar comigo, mas... Um pequeno pedaço de mim, um pedaço bem lá do fundo
gritava desesperadamente, ambicionando um contato a mais dele, exigindo sua atenção
e ansiando por seus cuidados. Percebi que ele não tentaria aprofundar o beijo e, de
certa forma tal falta de atitude dele me decepcionou. Eu não queria ser aquele a definir a
situação, pois assim mais tarde eu não poderia declarar ter sido levado por ele. Mas
somente seus lábios era o suficiente para meu coração derreter, aquecendo meu corpo
por dentro. Eu queria seu toque em minha pele e sua língua brincando com a minha.
Em um impulso de insanidade, eu rodeei seu pescoço com ambos meus braços e
toquei seus lábios com a minha língua suavemente, esperando para ver sua reação. A
cada segundo que ele demorava a se decidir era uma batida que doía em meu peito. Mas
Pedro finalmente se decidiu e, ao invés de corresponder meu beijo ele mesmo foi
empurrando minha língua e invadindo minha boca com a sua, em um beijo quente e forte.
Foi delicioso. Mas algo ainda me incomodava; a falta de contato entre nossos
corpos. Dei um pequeno passo para trás, puxando-o pelo pescoço para junto de mim.
Com dificuldade – pois não queria interromper o beijo – eu ergui meu corpo e me sentei
à mesa do professor. Pedro ainda mantinha seu corpo a certa distancia do meu, sendo
assim fui escorregando minhas mãos para sua cintura e puxei seu corpo para mais
próximo do meu. Movi minha mão ao zíper de meu casco e terminei de abri-lo.
Sei que não devo me iludir, mas Pedro me beijava com tanto desejo... A saliva estava
se formando em minha boca exageradamente e senti vergonha por isso. Toquei minhas
mãos nas suas e Pedro puxou-as de imediato. Tentei novamente e desta vez ele permitiu
que eu o guiasse. Coloquei suas mãos em minha cintura, por baixo da camisa e deixei-as
ali, voltando a envolver seu pescoço. Percebi que ele ficara sem jeito, mesmo assim
movimentou-as levemente, acariciando-me...
Nossos lábios se separaram. A primeira coisa que fiz foi engolir a saliva, tanto a
minha que se formara demais quanto a dele. Coloquei meu rosto ao lado do seu, não
querendo ver a expressão dele. De qualquer forma, suas mãos continuavam em minha
cintura num contato direto de nossas peles.
-Você pode me tocar se quiser e até onde quiser – eu sussurrei ofegante, para logo
me arrepender. Eu realmente não queria ser usado, mas eu queria um carinho dele. O
que fazer? Agora eu já falei, não tem como voltar atrás e colocar as palavras de volta
dentro de minha boca. Tudo que é dito fica no universo e tenho certeza de que elas
voltarão para me assombrar.
Ele movimentou, mas levemente. Eu sabia que Pedro se encontrava em uma situação
completamente desconfortável. Seus movimentos não subiam demais nem desciam.
Beijei suavemente seu pescoço e encostei minha testa ali. Quando percebi que ele não ia
avançar quase chorei. Ele queria o corpo de uma garota e isso eu não poderia lhe dar.
Eu sendo o suficiente ou não ele teria de dizer algo. Não quero ser usado. Não
pensei muito, pois se pensasse minha mente entraria naquele mesmo conflito interno,
quando você pensa em algo com tanta força que é como se você realmente estivesse
fazendo, mas não está. Somente o empurrei para longe um pouco brutal demais. Sem
33
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
olhar para Pedro eu fui até as janelas e abri as cortinas com força. Uma, duas... Na
terceira Pedro segurou meu pulso.
- O que você pensa está fazendo?!
Ele estava bravo, percebi. Voltei-me para ele suavizando meu olhar, como se não
estivesse fazendo nada de mais.
Eu já disse o quanto ele é lindo?
- Estou abrindo as cortinas – respondi simplesmente. Pedro apertou meu pulso.
- Por quê?
Tentei soltar meu pulso, mas a força não deixava. Esse é o problema de ser mais
fraco que os garotos com quem fico.
- Porque se eu posso assumir você também pode! Você me beijou e depois vai ficar
fazendo piada de mim para os outros garotos? Não. Eu não sou brinquedo! Agora me
solte, meu pulso está doendo – exigi, tentando sacudir meu pulso para soltá-lo, mas
infelizmente sua mão ia junto. Aparentava estar colada. Ele apertou com mais força
ainda, me fazendo gemer. Empurrou meu braço para junto de mim e obrigou-me a fitá-lo.
- E você acha que sou o quê? Mulherzinha? Acha que vou ouvir os meus amigos
dizendo que ficaram com garotas lindas, com muito peito e bunda enquanto eu vou dizer
que fiquei com um garoto? E ainda completar “fiquei com o Bryan, aquele ‘gayzinho que
usa maquiagem”. Óbvio que não! Eu disse que não sou gay! Foi um beijo, não um pedido
de namoro, pois eu nunca faria isso! Eu só encostei e você quis que eu lhe tocasse. Isso
me dá nojo!
Quando ergui o olhar eu já sabia que estava com os olhos cheios d’água.
Primeiramente vi uma expressão furiosa, mas quando ele percebeu meu estado suavizou
completamente. Aproveitei para soltar meu pulso já muito machucado.
- Entendi. Você acha que só porque sou gay tenho que ser puto – fiz uma pausa, pois
minha voz começou a oscilar muito. Pensei em secar os olhos, mas daí eu ficaria com
um aspecto pior ainda, pois borraria a maquiagem. – Mas eu não sou e não fiquei com
você para veres como é e depois sair debochando de mim. Fiquei porque gosto de você
e mesmo assim nunca te pedi nada nem invadi teu espaço. Eu deixei bem claro que me
tocasse se quisesse e até onde quisesse. Eu... – minha voz tremeu e eu solucei. O choro
me impediu de continuar, mas forcei-o para dentro de minha garganta. –Eu não sou uma
garota e nunca serei. Você está ciente disso, então se não tinha interesse não deveria ter
me beijado.
Antes de ouvir qualquer outra coisa saí correndo de lá. Pedro queria somente ver
como é um garoto. Ele tinha vergonha de mim. Ele queria a garota que eu não sou. Nós
nunca poderíamos ficar juntos... Pedro queria me usar...
Entrei no primeiro banheiro que vi, me metendo em uma cabine qualquer. Tranquei a
porta e sentei no chão mesmo, com as mãos no rosto. Solucei.
Pedro queria me usar. Pedro tem vergonha de mim. Ele disse na minha cara que
tinha nojo de mim. A cada palavra cruel que eu recordava era um aperto em meu
coração e um soluço saindo de minha garganta. Ele é uma pessoa horrível! Por que eu
tenho que ser tratado como brinquedo? Depois disso seria um “nada aconteceu nem vai
acontecer”. E ele ainda disso aquilo depois de me beijar, ou seja, o beijo não foi nada
para ele.
34
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Por quê...?
Continuei me martirizando. Repeti em minha mente cada palavra sua, de novo e de
novo. Lembrar de sua voz dizendo que teria vergonha de falar para seus amigos que sou
seu namorado doía demais e intensificava meu choro quase me fazendo sufocar, mas eu
precisava daquilo. Precisava fazer uma cicatriz para não desabar quando o visse
fazendo uma expressão de nojo para mim.
Porque eu não sou uma garota. Porque me visto como emo. Porque eu gosto de
garotos. Porque é essa a definição que ele tem de mim, não importando meus gostos.
Em nenhum momento ele quis saber de que tipo de música eu gostava de ouvir, que
gênero de filme gosto de ver, passatempo, comida, idade, signo... Nada! Porque, para ele,
qualquer coisa com relação a mim se resumia a ser gay.
Ouvi barulho no banheiro, mas ignorei completamente. Pedro não seria, óbvio!
Imagina só a vergonha que ele passaria em ir consolar um garoto chorando.
- Bryan?
Porra, que merda! Tive vontade de xingar a todos os Santos existentes no mundo.
Por que não podiam me deixar sozinho um pouco?
Mas, apesar de tudo, o que eu menos queria era ficar sozinho. Sentei-me no vaso e
destranquei a porta. O garoto empurrou-a e abriu. Era Matheus. Abaixei o rosto e
esfreguei meus olhos, mas as lagrimas não paravam de cair.
Diferente daquilo que eu esperava, Matheus nada perguntou. Sentou-se no chão e
puxou-me pelo pulso para seu colo. Assim eu fiz, sentando encima de suas pernas e
escondendo meu rosto.
Matheus afagou meus cabelos e apoiou seu queixo sobre minha cabeça sem dizer
uma palavra. Eu pude ficar quieto pensando e chorando que ele continuou sem fazer
perguntas. Acho que isso foi o melhor, pois, assim, não fui obrigado a ouvir toda a triste
realidade novamente.
Alguns minutos depois, me acalmei e me limitei a somente fungar. Agora eu entendia
Mi comi melhor do que ninguém e, se nossas situações estivessem invertidas eu nunca o
perdoaria como ele me perdoou. Ajeitei-me melhor no colo quente de Matheus e fechei
os olhos, desejando poder dormir.
- Pedro me beijou e me xingou – expliquei por alto, sentindo vontade de chorar
novamente, mas engoli.
- Aquele garoto tem sérios problemas. Você é lindo, Bryan – ele respondeu de forma
carinhosa, me fazendo sorrir de leve.
Fiz com Matheus o mesmo que fiz com Pedro: peguei suas mãos e as coloquei por
dentro de minha blusa, em minha cintura. Suavemente ele esfregou suas mãos quentes
em meu corpo, subindo um pouco mais.
- O que você quer Bryan? – Tal pergunta me obrigou a questionar-me. O que eu
queria? Queria um toque quente, um carinho gostoso. Queria mãos passeando por meu
corpo e queria me sentir bem.
- Me toque – pedi.

35
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Matheeeeuus! Você me deixou lá no banheiro sozinho, esperando! Eu tenho que
tirar essa tinta! Acho que ela já está começando a corroer a carne da minha cabeça.
Puta merda, caralho, eu vou torcer o pescoço alvo de Mi comi! Vou cortá-lo em
vários pedaços e torná-lo carne moída!
- Oh, Bryan...
Enterrei meu rosto no peito quente de Matheus, escondendo-me. Senti a presença de
Mi comi se aproximando e tive vontade de quebrar sua traqueia, impedindo-o de
respirar. Assistiria com gosto ele agonizando até morrer...
- Não se preocupe Lu, é só enxaguar o cabelo.
- O que houve com o Bryan?
Senti-me ser cutucando, como se eu fosse o cadáver de um animal que você quer ter
certeza de que está morto. O agastamento tomou conta de meu corpo e, rapidamente
girei meu tronco e torci seu dedo. Ouvi-o reclamar, mas simplesmente ignorei e afundei
novamente no colo de Matheus.
- Me cutuca novamente que eu arranco seu dedo!
- Ah, ok, me desculpe. Mas o que houve Bryan? Por que está assim?
- Não te interessa – resmunguei contra o peito de Matheus, recusando-me a fitar Mi
comi.
- Ahh Bryaaaaan, não seja mau assim! Me conta o que houve.
Aquelas atitudes por parte de Mi comi já estavam me dando nos nervos. Por que este
garoto tem que ser tão fácil? Isso mesmo, fácil! Ele é amiguinho de todos, ama a vida
como se ela fosse perfeita e perdoa como se tudo fosse simples! Eu tenho repulsa a toda
essa falsidade de Lucas. Sim, falsidade, porque eu sei que ele é falso. Não me engana.
- Bryan. Fala comigo – ele pediu manhoso, ato este que somente aumentou minha
raiva.
Levantei-me bruscamente, empurrei Mi comi que estava em meu caminho e fui até o
espelho, fitando com desgosto minha maquiagem toda borrada.
- Eu vou embora – anunciei decidido. Não passaria o resto da manhã na mesma sala
que Pedro. Aliás, atrás de Pedro!
Liguei a torneira e, com o dedo indicador tentei limpar a maquiagem borrada por
baixo dos cílios. Vi pelo espelho Matheus se aproximando. Ele parou ao meu lado e me
ofereceu um pedaço de papel. Aceitei e segurei-o com a mão seca, usando para limpar
os olhos.
- Se quiser eu vou com você – ofereceu-se Matheus. Não vou mentir, sua oferta
realmente trouxe um sorriso para minha face triste.
- Se você não se importar...
- Eu também vou com você, Bryan!
- Não quero – respondi curto e grosso, sem olhar para Mi comi pelo espelho.
36
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Por quê? – ele perguntou manhoso novamente, aumentando a raiva preservada
dentro de mim.
- Porque eu não quero.
Eu sabia que, apesar de minhas atitudes para com Mi comi estarem sendo frias e
cruéis no dia seguinte ele viria saltitante para minha volta, como sempre fazia. Sendo
assim, não importava se eu descarregasse minha raiva nele.
-Vou buscar minha mochila – noticiei quando percebi que minha imagem no espelho
estava aceitável. Minha imagem sem maquiagem é realmente estranha. Meus olhos até
parecem mais claros, mesmo eles sendo naturalmente azuis clarinhos.
Sai andando para fora do banheiro antes que recuasse. A verdade é que eu estava
com um puta medo de encontrar Pedro na sala de aula, pois a qualquer momento o sinal
pode tocar. Percebi que Matheus estava me seguindo quando senti sua mão junto da
minha. Era quente; muito quente. Inconscientemente olhei para nossas mãos juntas.
Ambas as mãos possuíam as unhas pintadas de preto, porém as minhas eram maiores.
Apertei sua mão e segui pelo corredor na direção de minha sala.
Quando cheguei à porta inspirei fundo e, receoso adentrei a sala. Tinha gente ali. Um
grupo de garotas e uns três garotos no canto perto da minha classe. Entre estes garotos
estava... Pedro, só porque o universo desgosta de minha existência e quer me fuder de
qualquer jeito. Meu coração deu um pulo somente de ouvir o nome ser pronunciado
mentalmente. Sabia que todos os olhares estavam focados em mim por causa de minha
mão junta a de Matheus.
- Olha só! O viadinho arranjou um namorado – comentou maldosamente um dos
garotos junto de Pedro. Eu me recusei a olhar na direção deles, pois tinha medo de
chorar.
Aproximei-me de minha classe e parei de costas para os garotos, com Matheus de
frente para mim, consequentemente na reta dos garotos.
- Você se importa? – sussurrei baixinho, torcendo para que Matheus ouvisse. Não
queria que ele passasse por uma situação ruim tendo eu como culpado.
- Não mesmo – ele respondeu sorrindo, acalmando-me – Quer dar motivo para eles
falarem?
Peguei minha mochila e coloquei-a nas costas. Meu coração estava em disparada,
obstruindo meus pensamentos. Eu sabia que dar um motivo seria um beijo. Tentei
pensar, mas realmente não consegui. Havia pouco tempo para tomar uma decisão.
Segurei na mão de Matheus e rumamos para fora da sala. Eu queria que Pedro
soubesse que não sou um brinquedo. Puxei a mão de Matheus, indicando que era para
ele se virar. Quando ele assim o fez eu tomei-lhe os lábios, em um selinho.
A sala toda enlouqueceu.
- Ai, que nojo! Vou ter pesadelos essa noite! Essa é a pior cena que eu já vi! – gritou
um dos garotos. Eu sorri, de certa forma triste, mas tentando esconder. Imagina só se
soubessem que Pedro me beijou?
- Que nojo! Sério, acho que vou vomitar! E você Pedro ainda andou com ele! Você
tem o que na cabeça? Merda? Ou você é só gay mesmo, ein?

37
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
Já havíamos passado pela porta, então acelerei o passo. Não queria ouvir a resposta
de Pedro, de jeito nenhum! Não queria ouvir os deboches dele para com minha pessoa.
De repente, senti meu braço sendo puxado com força, obrigando-me a retornar dois
passos.
- Luke, me alcança minha mochila.
- Vai matar?
- Sim. Lu está lá no banheiro. Ajude ele a terminar o cabelo. Estou levando Bryan
para casa.
Logo retornamos a andar. Matheus só queria dar o aviso para não deixar Mi comi
sozinho, esperando. Seguimos para a rua e, da calçada mesmo deu para ouvir o sinal
batendo. Andamos em silêncio até minha casa. Nossas mãos não se separaram nem por
um momento, consequentemente minha mão começou a suar. Sempre que estou de mãos
dadas com alguém minha mão começa a suar. Não sei se sou somente eu, mas se sou
Matheus não se incomodou com isso, muito menos com os olhares de censura que nos
lançavam. Felizmente não havia muitas pessoas na rua.
Chegamos a minha casa. Eu abri o portão, atravessei o jardim e cheguei à porta.
Abrindo-a vi minha mãe eufórica, caminhando de um lado para o outro da casa
enquanto conversava no celular.
Larguei a mão de Matheus.
- Mãe, trouxe um amigo – anunciei enquanto jogava minha mochila no sofá.
- Bem, eu já estou de saída – Matheus disse envergonhado. Quando ele fez menção
de ir até a porta eu puxei sua mão, obrigando - o a permanecer comigo. Retirei sua
mochila de seus ombros e coloquei junto da minha.
Minha mãe falou mais algumas coisas no celular e desligou. Sorriu para mim.
- Oi Bryan. Ainda bem que você chegou mais cedo, tenho que sair agora e Amanda
não vêm – ela disse rapidamente. Nem me dei ao trabalho de fitá-la, fiquei encarando o
sofá. – Mas ela deixou o almoço pronto, então é só aquecer – minha mãe fez uma pausa,
provavelmente percebendo a presença de Matheus –Olá, sou a mãe de Bryan, Deise. Que
bom que ele está se enturmando!
- Prazer, sou Matheus – ele se apresentou, mas eu continuei mirando o sofá branco
de almofadas laranja e detalhes marrons.
- Então Matheus, você não quer almoçar aqui? E de preferência dormir aqui também,
assim Bryan não passa a noite sozinho. Eu sei que ele gosta, mas estar sempre sozinho
nessa casa não é bom e ele não costuma trazer muitos amigos aqui, então, por favor,
faça companhia para ele.
- Mãe, deixa ele – disse irritado e envergonhado. Ela estava fazendo parecer pior do
que era ficar sozinho, ou talvez não.
- Ah, vamos Matheus, por favor, não o deixe sozinho.
Ás vezes pergunto-me se meu pai contou a minha mãe sobre eu ser gay. Tenho
certeza que sim, mas ela insiste em agir como se não soubesse.
- Bem... Eu tenho que falar com meus pais e38
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Ótimo! Pode usar o telefone. Acho que só volto amanhã, então seja um bom garoto
Bryan e cuide bem do seu amigo.
- Mãe... – resmunguei, tentando fazê-la entender que Matheus não tinha o dia todo a
dispor dos outros.
Ergui o olhar e a vi se movimentar para as escadas, subindo-as. Em seguida desceu
com vários papéis nas mãos e foi direto para a cozinha, com o celular posicionado entre
seu ombro e sua cabeça. Suspirei.
- Não se sinta obrigado por ela. Não precisa ficar se não quiser – disse voltando-me
para Matheus. Ele apenas sorriu.
- Fico o tempo que você quiser. Meus pais deixam. Se você quiser eu fico, ou posso
ficar menos tempo também. O que você quiser.
Olhamo-nos mais um pouco e, logo, começamos a rir. Não sei se foi somente
impressão minha, mas ambos queríamos a companhia um do outro, ou talvez somente
eu quisesse a companhia dele.
- Não! Acalme-se, já estou indo.
Minha mãe passou por nós ainda no telefone, continuando com ele preso entre a
cabeça e o ombro. Suas mãos estavam ocupadas tentando prender o cabelo castanho
claro comprido, enquanto que em seu pulso encontrava-se uma pasta com vários papéis
saindo para fora.
- Só um minuto. – Ela afastou o celular um pouco, tapando-o com a mão e buscando
por suas chaves no chaveiro da parede. – Bryan, tem dinheiro ao lado do microondas.
Peça pizza para você e seu amigo.
- Tchau mãe – me despedi. Ela nem olhou para mim, prosseguiu falando no telefone
e, assim, saiu porta a fora. –Ela trabalha como secretária, ou algo parecido – expliquei a
Matheus, sacudindo os ombros, fazendo pouco caso. Ela nunca tinha tempo de me
contar sobre algo de seu trabalho, então não sei se ela continua no mesmo.
- Você é filho único? – ele perguntou me abraçando por trás e beijando minha
bochecha, pegando-me desprevenido.
- Sim.
- E seu pai?
- Ele já não gostava da ideia de ter um filho emo, o fato de também ser gay foi demais
para ele.
Senti um beijo úmido em meu pescoço sensível, de imediato arrepiei-me.
- Então, o que você gosta de fazer?
Seus braços foram para meu ombro direito, sendo apoiados ali com seu queixo
sobre eles.
- Internet, vídeo-game, música...
- Que banda você mais gosta?

39
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Simple PLan, Green Day, 30 Seconds To Mars... – respondi, vendo que Matheus
sorriu, ou seja, também apreciava tais bandas.
- Legal. Eu gosto dessas e Panic! At The Disco, Linkin Park, Tokio Hotel, My
Chemical Romance… - respondeu Matheus animado, formando uma extensa lista oral de
várias bandas que eu também apreciava.
- Você está com fome ou prefere fazer alguma outra coisa e almoçar mais tarde?
- Não estou com fome agora, mas se quiseres almoçar por mim tudo bem. Agora,
preciso mesmo ligar para meus pais e avisar, caso contrário eles ficarão extremamente
nervosos sem saber onde estou.
Sorri e me locomovi até o telefone sem fio, entregando-o nas mãos de Matheus. Eu
realmente estava feliz por passar à tarde com alguém. Se não fosse por Matheus eu
absolutamente passaria a tarde inteira sentindo-me jogado no fundo de um poço,
enchendo o mesmo de lágrimas e afogando-me.
Trágico.

***
Passamos a manhã na internet e a tarde no videogame. Era descontraído conversar
com Matheus, pois mesmo os assuntos sendo banais havia sempre uma lógica por trás
deles. Quando o assunto tomava um rumo na direção do colégio, principalmente Pedro
Matheus sempre dava um jeito de contorná-lo.
- Bryan... Você ainda tenta se matar?
Assustei-me. Como primeira reação voltei discretamente meu olhar para meu pulso,
mas o mesmo estava tapado com a manga do casaco. Eu cuidara o tempo todo, então
como ele descobrira...?
- Bryan, não pára seu carro!
Olhei para a tela. Meu carro estava parado, pois acabei soltando o botão. Na tela de
baixo o carro de Matheus se encontrava igualmente parado, esperando-me. Apertei o “x”
e continuei com o jogo. Quando meu carro passou ao lado do de Matheus foi que ele
continuou a jogar.
- Como você...? – balbuciei, não querendo ter de terminar a frase.
- Luke contou. Ele é um grande amigo e eu o amo muito, mas é um grande fofoqueiro.
Sei de toda a conversa que vocês tiveram.
Puta merda, como me descuidei assim? Eu não sou de confiar nas pessoas, então
como deixei...? Mas, pensando bem fora Luke quem se intrometera, fitando meu pulso
descoberto por Mi comi.
Espere. Toda a conversa? Inclusive a parte sobre sexo?
- Você está ficando vermelho – Matheus comentou sem nem olhar para mim, com seu
carro já em grande vantagem no jogo.
- Ele contou tudo?
40
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Tudo. Dês do psicólogo até sexo. – Senti-me envergonhado, torcendo para que o
assunto não houvesse adentrado em... – Comigo.
Fiquei alguns segundos em silêncio. Quem ganhara a corrida obviamente houvera
sido Matheus, ocorrência esta que feriu meu orgulho. Tentei não pensar no rumo de
nosso assunto, mas teria de continuá-lo. E... Talvez isso pudesse se tornar vantajoso
para mim.
- Luke é um grande fofoqueiro – concluí, ouvindo a risada de Matheus.
- Sabe Bryan, eu não só acho você bonito, mas também...
O replay de nossa corrida começara. Meu carro era azul e o de Matheus prata. Dês
do início ele me ultrapassara. Percebi que o mesmo estava se aproximando de mim,
tornando mínima a nossa distância naquele sofá de três lugares. Ponderei que ele me
beijaria, mas estava errado. Matheus levou sua mão gelada a meu pescoço, puxando a
ele levemente, causando-me arrepios. Logo, seus lábios estavam naquela região
sensível, beijando. Foram três beijos, todos descendo na direção de meu ombro.
O beijo subiu e foi para meus lábios. Era a primeira vez que eu beijava Matheus, sem
contar o selinho de mais cedo. Agarrei-me em seu casaco preto com uma estampa roxa,
apertando as mãos com força enquanto sentia sua língua brincando com a minha. O
beijo de Matheus conseguia ser doce e ao mesmo tempo quente. Seu braço envolveu
minha cintura, puxando-me até me deitar no sofá.
Eu queria aquilo, mas estava nervoso. Não é como se eu não pretendesse perder a
virgindade, apenas não pensara nisso o suficiente para poder encarar a situação
tranquilo, aproveitando mais das carícias.
Mais uma vez os beijos foram para meu pescoço, desta vez de forma mais ousada,
chupando a pele que fervia. Sua mão gélida adentrou minha camisa e, sem cerimônias
ela foi subindo até alcançar meu mamilo, segurando-o entre seus dedos. Soltei um
gemido bem baixinho, quase um suspiro, completamente envergonhado. Enquanto seus
lábios chupavam meu pescoço meus olhos viam nossos tênis. O meu All star de cano
médio vermelho e o All star preto de Matheus, propositalmente manchado com clorofina.
- Quer que eu pare? – ele perguntou interrompendo tanto a carícia quanto os beijos.
Ergueu o rosto até ficar no caminho de meu olhar.
- Não – respondi para aqueles olhos verdes tão clarinhos e brilhantes. Matheus é tão
lindo...
- Quer perder a castidade comigo? – ele perguntou de forma debochada, sorrindo
maliciosamente, ato este que pensei não ser possível. Virei o rosto para o lado, sentindo
a vergonha subir-me a face. Luke tinha que ter contado tudo mesmo?
- Sim – respondi confiante, sem deixar margem para dúvidas. Não sei se é um desejo
suprimido meu, mas meu corpo dizia que uma noite com Matheus seria maravilhosa.
Meu corpo e minha pele desejavam o seu, aquele toque, aquelas carícias...
- Ótimo. Mas agora preciso ir à minha casa buscar algumas roupas.
Matheus levantou do sofá e ficou parado ao lado, sorrindo para mim. Incrédulo,
fiquei a fitá-lo sem entender. Ele ia parar fácil assim? Sei que declarei não estar
esperando por isso, mas eu não queria parar!

41
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga
- Vamos Bryan, temos a noite toda pela frente. Até porque, tenho que buscar
algumas coisas para nossa noite. – Buscar algumas coisas? Matheus está se saindo um
grande pervertido! Devo perguntar o que ele pretende buscar? Acho melhor não.
- Bryan, você confia em mim?
- Não – respondi sério. Não que eu quisesse chateá-lo, apenas fui sincero. Sua
expressão mudou e o sorriso sumiu. Acho que ele se aborreceu.
- E eu posso confiar em você?
Confirmei com a cabeça
- Humm... Ok. Mas eu tenho mesmo que ir em casa, vem comigo Bryan, é pertinho.
Ele puxou minha mão, fazendo-me levantar do sofá de muita má vontade e com uma
enorme frustração sexual.

42
EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga

Capítulo 7: Primeira – e não última – vez.
Na hora do jantar fiz como minha mãe sugerira e pedi uma pizza; uma enorme pizza.
Sentamos a mesa da cozinha para comer, um de frente para o outro. Sei que um
adolescente normal comeria em qualquer outro lugar da casa, mas eu realmente não
consigo fazer isso. Tanto a comida quanto a bebida ficam desequilibradas, caindo por
toda minha roupa e estragando-a.
O silêncio começara a me incomodar. Enfatizo bem o “me”, pois Matheus não
aparentava nem um pouco de desconforto, devorava seu pedaço de pizza com uma
felicidade beirando ao infantil.
-Está gostando da pizza? – perguntei ironicamente, pois suas atitudes o
denunciavam. A intenção era somente começar um diálogo, pois a voz descontraída de
Matheus soava a meus ouvidos de forma tão agradável...
Matheus levantou-se, chamando minha atenção. Ele arrancou um pedaço da pizza
com os dentes e colocou parte dela para fora da boca, aproximando-se de mim. Chegou
perigosamente perto de meus lábios, sorri ao entender suas intenções e mordi a pizza,
contudo, mais gostoso do que a pizza eram seus deliciosos lábios...
Ao invés de retornar a cadeira que ele ocupara anteriormente Matheus puxou uma
ao meu lado, sentando-se ali, erguendo um de seus joelhos para próximo de seu tórax.
- É boa... Paga pela noite – ele debochou, sorrindo sarcasticamente.
- Agora você virou garoto de programa e tem que ser pago? – rebati, entrando na
brincadeira. Matheus fingiu estar ofendido.
- Hey! Só para você saber, sou um dos melhores.
- Tanto que é pago com comida...
Rimos juntos. Matheus continuou a comer a pizza, mas eu realmente já saciara minha
necessidade fisiológica por comida. Servi-me mais um pouco de coca - cola e beberiquei
o refrigerante.
- Está nervoso? – Matheus me perguntou concentrado em sua comida. Eu fiquei a
fitá-lo.
- Sim – admiti. Por mais que eu pensasse no que aconteceria, em nenhum momento
consegui manter a calma. Matheus era uma pessoa física e ele está aqui, ao meu lado.
Não consigo me concentrar porque sempre me recordo de que Matheus não faz nem
ideia do que estou pensando, de todas as perversidades que passam por minha mente
tão perversa e impura...
- Isso é normal. Na verdade, seria estranho se você não estivesse nervoso. Então,
mesmo com essa inquietude dentro de você, tente não ter medo. – Falando assim
Matheus realmente parecia ser um expert no requisito sexo.
- Você poderia me distrair um pouco contanto algumas coisas... – disse com um
sorriso malicioso nos lábios, com segundas, talvez até terceiras intenções...
- O que você quer saber? – Matheus perguntou sorrindo, sem se importar com meu
olhar intimidador.
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  • 2. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 1: Sozinho ou acompanhado? Meu despertador tocou. A mesma música de sempre, mas até hoje não sei o que diz, nome ou quem toca. Pensei em dormir mais cinco minutinhos, mas percebi que aqueles cinco minutinhos já haviam passados. Na verdade, aqueles cinco minutinhos tinham se transformado em quinze minutinhos e eu estava atrasado. Levantei-me e segui minha rotina de sempre, porém apressado. Me vesti com um casaco com listras horizontais preto com vermelho e coloquei o capuz. Pus meus acessórios de sempre, como corrente no pescoço e pulseira de taxas. Passei base e lápis de olho levemente, rezando para não borrar e ter de refazer levando em consideração que eu já deveria ter saído de casa. Calcei meu All star preto e peguei minha mochila preta cheia de bótons e acessórios. Passando pela cozinha peguei uma maçã e saí de casa comendo-a. Uma brisa soprava de leve, porém não estava frio. Mesmo assim puxei levemente as mangas de meu casaco até a metade da palma de minha mão, segurando-o com meus dedos de unhas pretas. Na medida em que fui me aproximando mais da escola – o qual ficava a duas quadras de minha casa – comecei a ficar nervoso. Sim, estou mudando de colégio... De novo. Até três dias atrás eu morava com meu pai, até o mesmo descobrir que sou homossexual. Já lhe era difícil aceitar que seu único filho fosse emo, descobrir que sou gay foi a gota d’água que fez o copo transbordar. Mas não o culpo, eu não sou um bom filho mesmo. Então, no momento moro com minha mãe. Ela não é contra eu ser emo e homossexual, mas também não é fã dessa ideia. Ela trabalha o dia todo e não pode me dar muita atenção, por este motivo que até hoje morei com meu pai. Mas agora não há escolha. Eu sei como será, o que dirão de mim e como reagirão, porém é impossível me manter calmo. Quando o portão do colégio se tornou visível a meus olhos meu coração acelerou drasticamente, como se possuísse vida própria. Ignorei-o na medida do possível e segui rumo a minha nova vida. Adentrando lá a primeira coisa que pude perceber foram os olhares voltados para mim; olhares até demais. Quis vasculhar o local e procurar por um grupo no qual eu me encaixasse, mas o orgulho e a vergonha me ensinaram a manter-me focado, visando nada de especial, porém concentrado. Foi meu modo de dizer “não importa o que pensem de mim”, mas era mentira. Me importa. Fui até a diretoria e peguei meu horário. Procurei pela sala 23, na qual eu teria minha primeira aula: matemática. Quando a encontrei, pela movimentação e ausência do sinal deduzi que a aula ainda não houvera começado. Entrei na sala de aula focado e mais uma vez sentindo aqueles olhares numerosos demais e incômodos em minha direção. Será que nunca viram um emo, é? Sentei como quarto da fila encostada na parede. Joguei minha mochila ao lado de minha cadeira e, suspirando apoiei meu cotovelo na classe e meu rosto em minha mão. O nervosismo ainda pairava em meu corpo, quase fazendo - me tremer. - Ele é estranho – sussurraram. Suprimi minha imensa vontade de dizer “chama-se emo. É somente um estilo diferente, sabia?” 2
  • 3. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Ele é parecido com aqueles garotos do segundo ano – ora, ora. Quem diria que há emos nesse fim de mundo! Ainda bem, pois estou acostumado a morar e estudar no centro de cidade grande, onde há maior movimento. - É emo – continuaram a sussurrar, como se eu não escutasse. Não é como se tais comentários fossem de suma importância para minha vida, mas a vontade de chorar predominou. Sei que tenho problemas com emoções, mas não sei o que eu possa fazer. Não costumo contar coisas assim para meus pais, não sou importante o suficiente para usufruir do prazer de passar meus problemas para eles. Quis chorar por medo de ficar sozinho. Infantil, não? Porque não passaram pelo que eu passei. Sou propenso a solidão por motivos os quais não sei citar, mas isto é mais acentuado agora que defini um estilo e preferência sexual diferente. Sei que se eu mudar minha aparência e esconder minha personalidade tenho mais chances de me enturmar, mas não é isso que eu quero. Não quero ter de me esconder ou ser aceito somente por aquilo que não sou. - ‘Falaê aluno novo! - cumprimentou-me alguém. Eu disse o quanto sou distraído? Voltei meu olhar na direção do garoto de pé ao meu lado. “Lindo” foi meu primeiro pensamento, então sorri. Ele jogou sua mochila encima da classe na frente da minha e sentou-se de lado na cadeira, dando atenção a mim. - Você se destaca, sabia? E... Usa maquiagem! Nossa! – ele exclamou assustado, aproximando mais seu rosto do meu, deixando-me nervoso, envergonhado e... Deixa pra lá. – Você é viado ou isso é comum da onde você veio? Analisei as opções. Se eu dissesse que sou gay talvez tivesse uma chance dele não ser preconceituoso e eu poder levá-lo para o outro lado, porém também há a grande chance dele ter nojo, já que usou o termo “viado”. Já se eu negasse e, mais tarde ele descobrisse que sou acabaria com as chances. Na segunda parte, sobre ser comum de onde eu vim, nem adianta discutir, pois há outros como eu, mas não é comum. Sendo assim a escapatória seria mudar de assunto. - Essa é sua primeira pergunta? Não quer nem saber meu nome? – eu perguntei sorrindo, para que assim ele não me interpretasse grosseiramente. - ‘Malz ‘aê. Seu nome? - Bryan. E o seu? - Pedro. Pedro... Um nome bem comum. Agora posso dizer: Pedro é lindo! Ele é bem... “garoto”. Digo assim porque ele é normal, diferente de mim. Cabelo castanho escuro e curto, olhos escuros... Não há nada de muito diferente, porém ele é lindo. - Você vai ter de tirar o capuz, os professores não deixam usar dentro da sala. Abaixei o capuz do casaco e balancei a cabeça, em seguida passei os dedos de leve na minha franja, arrumando-a. - Nossa cara, você usa maquiagem mesmo! 3
  • 4. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - É normal os garotos emos usarem um pouco de maquiagem – expliquei por alto, sem entrar em maiores detalhes. –Os professores se atrasam aqui? – mudei de assunto antes que ele perguntasse por mais. - ‘Noops. Na verdade, entram antes do sinal bater. - Bom dia. Foi só ele falar que uma mulher baixinha e loira adentrou a sala, carregando consigo vários livros e cadernos. Pensei em responder para ela, mas ninguém respondeu. - Começamos há poucos dias o segundo trimestre. Você vai precisar da matéria. - Você a tem? - Não. Mas posso consegui-la facilmente para você – ele disse rindo, levando uma mão até minha cabeça e bagunçando meu cabelo. Calmamente, arrumei com as mãos os fios bagunçados, tentando ajeitá-los de volta. Pedro estranhou. –Cara, você é estranho. - E você é normal – respondi com um sorriso, fazendo, assim, ele sorrir também. O sinal bateu e a aula começou. A professora não exigiu que eu me apresentasse detalhadamente. De meu lugar mesmo ela deixou eu apenas dizer meu nome, idade e o que mais gostava. Quando ela começou a passar matéria, para mim pareceu que a professora falava grego. Explicava tudo embolado e, como eu não tinha a matéria para entender a parte anterior fiquei boiando. Espero que Pedro realmente me ajude. Depois de dois períodos com aquela tortura era hora da aula de química. Trocamos de sala e, na de química era para os alunos sentarem-se em duplas nos balcões. Foi só Pedro entrar na sala que várias garotas vieram para a volta, como abutres em carne podre. Sinceramente, achei que as garotas daqui não fossem bobinhas assim, pelo menos não eram na minha outra escola. Lá, eram os garotos que corriam atrás. Mas, não poderia ser para menos. Pedro é lindo e não destrata nenhuma delas... Infelizmente. - Desculpe garotas, mas hoje sentarei com Bryan. Que vontade enorme de jogar isso na cara delas, agarrando-me firmemente no braço de Pedro. Mas, limitei-me a sorrir de forma arrogante, sendo alimentado pelas caretas de irritação daquelas garotinhas chatas. Não prestei atenção na aula. A professora de química era uma abobada, passou uma tarefa e nos deixou conversando. Pedro comentou algumas coisas sobre minha aparência e meu estilo, comentou rapidamente sobre os emos nos quais eu houvera escutado as garotas citarem mais cedo e logo trocou de assunto, fazendo-me perguntas sobre gosto e preferências. Já eu, como o distraído que sou limitava-me a responder e apreciar sua voz, já que tudo nele era encantador. Ele é exatamente o tipo que me atrai. - Bryan! Bryan, você me escutou? - Sim – menti. - Então vamos. Ele se levantou e esperou que eu me levantasse. Olhei para a volta tentando entender e percebi que o sinal para o intervalo começar houvera soado alguns segundos atrás, pois a maioria dos alunos já tinha deixado à sala. Levantei-me e o segui um pouco mais atrás, quando de repente ele parou. 4
  • 5. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - ‘Peraí. Camila – ele chamou virando-se para trás e, logo uma garota morena de cabelo liso se aproximou correndo, sorrindo de um jeito idiota. - Sim Pedro? - Você me faz um favor? - Claro! - Então copie a matéria de matemática do segundo trimestre para Bryan, ok? Ela não sorriu, mas fez que sim com a cabeça. Eu fiquei parado enquanto Pedro voltou até minha mochila e começou a mexer nela normalmente, como se fosse a sua própria. - Qual deles é? - O de banda. Ele pegou meu caderno com o Simple Plan na cama e entregou-o para a garota. Conversaram alguma coisa em sussurros e Pedro voltou para meu lado. Seguimos para fora da sala. - Ela tem uma bela letra, mas não é bom jogar um monte de cadernos encima dela em um dia. Português pode ficar com a Bianca, Biologia com Amanda... - Fácil assim? – eu perguntei interrompendo-o, sem saber para onde estávamos indo. - Claro. Elas fazem qualquer coisa por mim. Qualquer garota do colégio você me diz que consigo ela para você, fácil, fácil – ele comentou animado, envolvendo meus ombros com seu braço, fazendo assim meu coração dar um pulo. – Mas de preferência não as muito metidas principalmente do terceiro ano. Elas me dão nos nervos. Há poucas exceções, mas da nossa turma qualquer uma! Não, obrigado. Não gosto de garotas. São tão fúteis, falsas e superficiais... Limitei-me ao silêncio e percebi que havia muito mais olhares sobre minha pessoa do que antes. Tentei ignorá-los como sempre, mas desta vez me pareceu impossível. - Estão me olhando mais do que quando cheguei – comentei para Pedro. - É claro que sim. Você está andando comigo. Sou bem popular aqui. - Percebi. Eu ia manter o silêncio, mas a dúvida estava me consumindo por dentro, quase corroendo, impondo-me condições de tortura mental para caso eu não a extinguisse. - Por que você, mesmo sendo tão popular assim quis se aproximou de mim? Pedro não deu muita bola para minha pergunta. Continuou com o braço sobre meus ombros, guiando-me para algum lugar o qual desconheço. - Porque você é diferente. Não me pareceu que fosse querer se aproximar de mim só porque sou popular. 5
  • 6. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Você tem razão – o comentário escapou de meus lábios sem querer, daquele jeito que sai e nunca mais voltam. Pedro parou de caminhar de supetão, em um solavanco. Largou meus ombros e puxou meu braço com força pelo mesmo caminho pelo qual viemos. Estranhei, mas quando fiz menção de perguntar o porquê daquela atitude quando uma onda sonora de frequência alta viajou pelo ar até meus ouvidos, irritando-me, causando a meus tímpanos um enorme desconforto. - Temos mais um para nosso grupo! Pedro tentou me puxar com mais rapidez, porém um puxão em meu pescoço obrigoume a ir para trás, quase formando um cabo de guerra comigo. - Você é lindo! – aquela voz aguda de amplitude forte novamente, porém desta vez tão próximo de meu ouvido que acabei por agir inconscientemente e fazer uma careta. Olhei para o lado e vi um garoto menor que eu, loiro falso, pois a raiz escura já começara a nascer. Um casaco preto de caveira, pele coberta por maquiagem, pulseira de espinhos, botas rasteiras com fivelas e olhos bem marcados. Um emo. 6
  • 7. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 2: Companhias demais, principalmente mi comi. - Solta ele! – Pedro impôs irritado, tentando desgrudar o emo loiro de meu braço; em vão. - Que você quer enchendo o saco? Ele tem nosso estilo, obvio que ele quer andar com pessoas como ele, né? O garoto sorriu para mim, enquanto eu continuei atônito, sem saber o que responder. Estavam mesmo brigando pela minha presença? Gritando assim, como se nem estivéssemos no intervalo em meio a muitos alunos. - O que você quer com ele? Por acaso tá afim, é? – perguntou o loirinho, debochado. Tanto eu quanto Pedro nos assustamos com aquilo. Eu não queria deixar da presença dele tão cedo. - É claro que não! Não sou gay! - Pois emos são. Que droga! Seu emo de merda boca grande! Custava me deixar ser feliz por mais alguns dias? O primeiro garoto que conheci nesse novo colégio, o mais popular daqui é também o garoto que nunca mais irá falar comigo, cultivando ódio e nojo, raiva e repulsa. Simples assim. Deixei-me ser levado para longe por aquela criança. Não adiantaria de nada discutir, pois para isso teria de mentir. Pedro se afastou, sumindo de meu campo de vista e eu suspirei. Não há o que eu possa fazer ou dizer, porque não quero mentir. O que posso fazer agora é andar com meus semelhantes. - Você é realmente muito bonito! Qual seu nome? O meu é Lucas, mas me chamam de Lu. Ele saltitou até a minha frente, posicionando ambas as mãos atrás do corpo e sorrindo como criança de sete anos. Ficou frente a frente comigo e andou de costas. - Bryan. - Bryan, por que você estava andando com aquele garoto? Aliás, você é novo aqui, certo? - Ele foi quem começou a falar comigo e querer minha atenção. - Sério? Aquele lindo garoto popular? - É. Que não falará mais comigo por sua causa. - Ohhh, desculpe! Paramos de andar e mais uma vez ele se pendurou em meu pescoço, abraçando-me apertado. Quando Lucas me soltou percebi que haviam vários emos a nossa volta. Um deles em especial me chamou a atenção. Ele era alto e possuía uma franja daquelas que tapa somente um olho. O cabelo era bagunçado e havia um piercing no canto esquerdo da boca. Ele sorriu sedutoramente para mim e meu coração acelerou drasticamente. 7
  • 8. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Garotos, este é o Bryan. É novo aqui. Não é lindo? – por que ele insiste em dizer tantas vezes que sou lindo? Nem sou bonito nada. Continuei mirando aquele mesmo garoto que me chamara à atenção. Ainda sorrindo ele se aproximou de mim, envolveu minha cintura com um de seus braços e meu coração se desmanchou. Ele aproximou seu rosto de minha orelha. - É lindo mesmo. Entendi suas intenções. Ele queria ficar comigo. Isso me deixou feliz, pois além dele ser lindo estou na seca a uns três ou quatro meses. Assim, depositei meus braços em torno de seu pescoço, aceitando de bom grado que ele deslizasse uma de suas mãos até minha bunda, apertando-a. Ele aproximou seus lábios dos meus e eu fechei os olhos, aguardando. Encostou sua boca na minha e logo adentrou com sua língua pela minha boca, beijando-me de forma selvagem. Ele puxou meus cabelos, excitando-me. Passamos tanto tempo nos beijando que, quando nos separamos me senti tonto. - Você beija bem – ele sussurrou antes de se afastar. Meus olhos estavam abertos, mas eu estava tão distraído que nem vi nada a minha frente. Não sei nem ao menos seu nome ou o que mais ele pode querer de mim. Não conheço ninguém aqui e acabei de beijar um garoto na frente de todo o colégio, para quem quisesse ver. Acho que agi de forma um pouco irresponsável, mas não estou nem aí. - Não vai nos apresentar, Lucas? – questionou um dos garotos do grupo, mas não vi quem. Minha mente continuava desconectada e, aos poucos eu fui retornando a realidade. - Ah, agora temos pouco tempo, então vou mostrar o colégio para ele. Na hora da saída nos conhecemos melhores. Vem – é incrível como esse loirinho consegue ter uma voz tão irritante, aguda e de amplitude tão forte. Em poucos segundos meu braço já estava sendo puxado para longe, fazendo-me tropeçar em várias pedras e felizmente não cair. Continuei sendo afastado dos outros emos sem entender o porquê. Quando paramos em um corredor qualquer meu entorpecimento por conta do beijo de anteriormente já houvera se dissipado e eu estava consciente. - Qual seu problema? – eu questionei desconfiado, não caindo naquela lábia de que ele queria somente mostrar o colégio. - Vou te mostrar o colégio, claro! Estreitei os olhos em sua direção e apertei os lábios, tentando entendê-lo. Algo estava errado, tanto dentro daquela cabeça afetada pela água oxigenada dos cabelos quanto nas atitudes estranhas de motivos ocultos. - Qual o seu problema? – repeti, desta vez, mais sério. Desistindo de esconder a verdade, ele cruzou os braços e fez cara de emburrado, formando com os lábios cheios de batom um biquinho. - Alex é meu, tá? Pode ir tratando de deixar esses seus lábios bem longes dele! Não precisei pensar muito para chegar à conclusão de que Alex era o nome daquele garoto o qual eu beijara anteriormente. Suprimi uma risada de deboche e uma resposta afiada tal como “Tem seu nome nele?” ou “Vai fingir que ele te beijou ao invés de mim?”. 8
  • 9. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Vocês não parecem ser namorados – respondi sério, escondendo minha verdadeira intenção de arrancar um pouco mais da verdade sobre o relacionamento deles. Era óbvio que não eram namorados. - Não somos, mas eu fico com ele de vez em quando – ele respondeu de um jeito infantil, descruzando os braços e entreabrindo a boca levemente. –E eu gosto muito dele, ‘okey? - Já transaram? – eu perguntei direto. Até veria as bochechas dele mudarem de cor, porém o excesso de blush não permitiu. - Esse é o problema! – ele disse numa amplitude forte, exaltando-se, usando das mãos para dar ênfase a suas palavras. –Eu nunca fiz isso antes, sabe. E ele... Alex não consegue viver sem isso! É o único probleminha entre nós... – ele disse juntando ambas as mãos na frente do corpo e esticando os braços, balançando-se para frente e para trás. - Eu diria que é um problemão. - Eu sei! – e mais uma vez ele exaltou-se, movendo as mãos para cima e irritando meus ouvidos. - Garoto, juro que sinto como se sua voz chegasse aos máximos 20 mil hertz que um ser humano normal consegue ouvir e aguentar – comentei esfregando o dedo pelo lado de fora da minha orelha, tentando parar com aquele zumbido que permanecia ali, irritando-me. - Tipo, eu quero que nosso relacionamento avance, mas não posso chegar pra ele e pedir “me come”. De repente, surgiu uma risada. Veio tão de surpresa que ela saiu arranhando minha garganta, em seguida passando por entre minha língua e o céu da minha boca. - Que foi? - Você está tão desesperado que seu apelido deveria ser “mi comi” – respondi rindo mais abertamente, intensificando a risada quanto vi a expressão de incredulidade estampada na face dele. - Como você é mau! Senti alguns leves socos em meu peito, nada de muito forte. Ele era um pouco mais baixo que eu e, por conta do excesso de maquiagem e as ações parecia uma criancinha frágil. - Insensível! – ele choramingou com a voz embriagada pelo choro iminente. - Pára mi comi! Afinal, que idade você tem? Ele se afastou de mim e fitou-me de um modo inocente, olhando de baixo. - Quatorze. E meu nome é Lucas. - Sou Bryan. Prazer – debochei, porque sua intenção ao dizer-me seu nome era para que eu parasse de chamá-lo de mi comi, mas não adiantaria. - Bryan, vou te mostrar o colégio para que os garotos não desconfiem! – ele disse, animando-se em segundos e já me puxando pela mão e saltitando. 9
  • 10. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Principalmente o Alex, não é mi comi? – debochei, vendo a vergonha estampada no rosto dele. - Pára de me chamar assim! Eu ri, ouvindo ele xingar-me de várias ofensas leves, como se fosse mesmo uma criança. Não disse a ele, mas realmente eu estava decepcionado em ter de deixar Alex para ele. Alex beijava tão bem e era tão lindo... Ainda estou em dúvida se vou desistir de ficar com ele fácil assim. 10
  • 11. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 3: Erros, mágoas e perdões. Como eu já esperava, Pedro afastou-se de mim. Nos dias que decorreram após aquela chocante revelação – para ele, claro – aquilo que eu considerava o início de uma amizade desapareceu. Tudo graças à mi comi. - Bryan, Bryan! – a voz de mi comi me chamou, gritando para todo o colégio meu nome, de novo e de novo. Quando vi aquele ser loiro que vestia um short xadrez duas vezes seu tamanho e um all star de cano longo que quase lhe passava o joelho se aproximando eu fingi não ver. Virei-me de costas para ele pronto para sair dali o mais rápido possível, porém mi comi foi mais rápido e puxou meu braço com força, quase o deslocando. - BRYAAAAAAAANN. Se você tentar fugir de mim de novo eu te mato. Felizmente não vi o rosto dele para saber se estava com uma cara demoníaca ou não. - Seu amiguinho estava te procurando. Puxei meu braço de volta com força. Posicionei a mão no ombro do braço machucado e o movi para ter certeza de que estava tudo ok. - Que amigo? Mi comi começou a saltitar com as mãos para trás. Eu o segui. - Aquele que você me xingou por ter contado a ele que você é homo. Ele chegou todo sem jeito para mim e perguntou onde você estava. Mi comi riu, divertindo-se. - Mentira. Se ele quisesse falar comigo me procuraria na aula. Estudamos na mesma turma. - Não estou mentindo! Mi comi virou o rosto para trás e fez bico, estreitou os olhos e fitou-me como se aquilo que eu houvera dito fosse um horror. Mesmo assim ele não me convenceu. - Estou sendo um bom amigo e te avisando. Da próxima vez o mando falar contigo porque não sou garoto de recados! - Garanto que se ele tiver mesmo vindo falar contigo você não perdeu tempo e se agarrou nele, não é mi comi? – debochei, fingindo acreditar para que ele não se fizesse de ofendido. - Bryaaaaaaan, como você é chato com esse apelido! - Que apelido? A risada veio de forma surpresa, sendo assim, mesmo eu tentando impedi-la acabei soltando alguns sons, como se estivesse aranhando a garganta. Coloquei uma mão na frente da boca e tentei esconder minhas bochechas que por suas posições denunciavam meu riso. Por quê? Porque quem perguntara sobre o apelido fora exatamente Alex. - Não é nada... Nada de mais. Foi só uma brincadeirinha. 11
  • 12. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Olhar a cara atônita de mi comi, ação esta que somente me fez ter mais vontade de rir. Alex ergueu uma sobrancelha. - Que apelido Lucas? Não consegui mais evitar e comecei a rir alto. A cena era hilária e era somente eu olhar pelo canto do olho para a expressão incrédula do mi comi para eu rir mais. Mi comi... - Você quer saber qual é o apelido? Antes que eu pudesse raciocinar sobre o que estava acontecendo vi o céu se mexer, em seguida minhas costas e minha cabeça bateram com força em algo. No chão. - Não fala! Senti um grande peso sobre todo meu corpo, prensando-me contra o chão. Senti uma terrível dor do tronco para cima. - Me solta! – gritei furioso, tentando retirar aquele garoto estúpido de cima de mim, sem sucesso. - Não fala – ele sussurrou entre dentes, perto demais de meu rosto. Mi comi estava com raiva e eu estava com raiva. Nossos olhos se cruzavam quase que com faíscas. Um queria matar o outro. - Sai de cima de mim – lhe disse pausando entre as palavras, tentando controlar minha raiva. Porém, o mesmo não moveu um músculo sequer, continuava mantendo todo seu peso sobre mim. Ele só me deixaria quanto eu declarasse não contar. Eu só me decidiria quanto ele saísse de mim. O passar do tempo me irritou. Para a infelicidade de mi comi, eu tinha o poder. Empurrei-o com muita força, jogando ele sentado no chão a meus pés. Sentei-me e deixei a raiva me dominar. - Eu mandei você sair de cima de mim mi comi! Mi comi de merda! Agora conta para eles que você quer tanto que lhe comam! Antes de ver qualquer reação, me levantei, estapeei minha roupa rapidamente e lhes dei as costas. Afastei-me deles, crente de que mi comi me xingaria de tudo que era possível, mas somente o que ouvi fora risadas e perguntas sobre quem ele queria que lhe comesse e coisas do gênero. Sem muitas alternativas, fui para minha sala de aula. Entrei nela balbuciando baixinho algumas ofensas a mi comi. Por que ele tem que ser tão escandaloso? E por que ele teve de pular encima de mim e me jogar no chão? Que garoto problemático! - Bryan. Olhei para trás, de onde vinha a voz que me chamava e encontrei Pedro. Encabulado, ele me estendeu meu caderno com a capa do Simple Plan. - Está aqui a matéria de matemática. - Obrigado. Virei-me de costas para ele e rumei para meu lugar, sentando-me. 12
  • 13. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - E... Bryan? - Oi? - Você não quer as outras matérias? Pisquei algumas vezes, tentando clarear meus pensamentos. Antes que eu pudesse falar algo ele continuou. - Eu prometi a você que lhe conseguiria a matéria, não foi? Promessa é dívida. Não entendo o porquê dele ter dito isso, sendo que não me recordo dele prometer, somente de dizer que me conseguiria a matéria. De qualquer forma, sorri. - Obrigado. Pedro olhou para os lados, acho que para garantir que não havia ninguém por perto para nos ver conversando. Quando viu que estávamos sozinhos sentou-se na classe a minha frente, de lado, como da primeira vez em que nos vimos. - Bryan, é verdade que você é viado? Se ele houvesse usado outra palavra ao invés de “viado” eu teria mais vontade de responder. Como você assume a sua homossexualidade para um garoto heterossexual o qual você tem interesse? Eu gosto de Pedro e quero ser seu amigo. Normalmente as pessoas não gostam de mim e eu não gosto de pessoas em geral, mas gosto de Pedro e ele gosta de mim como amigo. Amigo hetero, claro. - Sou gay sim. A careta de Pedro fez meu coração se contrair. - Ah cara, que nojo! Gostar de ficar com outros garotos... Isso é muito nojento! Por que você não gosta de ‘minas? São tão gostosas! - Quer mesmo saber? Ele parou e pensou. Mais uma vez olhou para os lados, com medo de que alguém nos visse sozinhos conversando e interpretasse mal. Pedro se levantou, foi até a porta e fechou-a. Retornou para a cadeira na frente de minha classe e sentou-se. - Bryan, não me entenda errado. Não tenho interesse nenhum, absolutamente nenhum interesse em garotos. Se eu ouvir boatos sobre eu ser viado, quebro sua cara. Mas... Por que você gosta de garotos? Garotas é que são excitantes! Arrumei minha franja com a mão, recostei-me na cadeira e descansei minhas mãos em meu colo. - Não posso te dar um motivo satisfatório, mas... Em um relacionamento normal, é o garoto que cuida da garota e eu gosto que cuidem de mim – falei devagar, analisando todas as suas reações – as quais não eram positivas -, sem nem ao menos saber ao certo o que dizer. –Eu prefiro que se importem comigo ao invés de ter de me importar com uma garota. E eu acho meninas muito chatas! São falsas, falam mal daquelas que consideram suas melhores amigas. Acham-se melhores que os garotos, se preocupam tanto com coisas bana- Você se sente excitado com outros garotos? 13
  • 14. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Senti meu rosto esquentar. Conversar com outros garotos que também se sentem assim era uma coisa, conversar com um garoto hetero o qual tenho interesse é outra completamente diferente. Ninguém nunca se importou em saber meus motivos para ser gay, eu mesmo nunca parei para pensar bem neles. Sendo assim, considerei em limitarme a apenas responder com poucas palavras. - Sim. Pedro simulou vômito. - Então você é o passivo? - Sim. - E gosta de dar? - Uma garota pode gostar, então por que eu não posso? - Por que você tem um pau! Mais uma vez aquela vergonha me subiu a face, deixando meu rosto mais quente ainda. Pedro percebeu. - Você deveria conversar com um ativo, seria melhor. Eles são mais normais porque, garotos normalmente gostam de comer garotas e ativos gostam de comer garotos – eu disse tentando me desvencilhar daquele assunto, pois já estava querendo procurar um buraco para enfiar meu rosto. - Estou tentando entender você, não um ativo. Achei que você seria um excelente amigo, mas é gay! - E por que sou gay muda quem sou? Finalmente Pedro sorriu, deixando-me confuso. - Vocês gays sempre dizem isso? - Não sei, por quê? - Porque aquele garoto loiro me disse a mesma coisa. Garoto loiro... Mi comi! Quero dizer, Lucas! Eu não achei que Pedro tivesse mesmo falado com Lucas. - Por que vocês conversaram? - Eu queria te devolver seu caderno. Quando Camila me entregou ele eu te procurei direto, daí como você tem andado com aqueles garotos perguntei para o loiro que te arrastou aquele dia. Realmente, estou chocado. Não levei a sério quando Lucas dissera que conversara com Pedro, eu poderia jurar que era mentira. Pensei que era somente um deboche da parte dele. - E o que ele te falou? - Ele me disse algumas coisas. Pediu para que eu conversasse com você e não tirasse minhas conclusões a partir de outros. Que você é legal, se eu deixasse de falar 14
  • 15. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga contigo seria um idiota preconceituoso, isso seria bullying e blá, blá, blá. Na verdade, não escutei o resto porque fiquei impressionado com a aparência e a voz daquele garoto. Eu ri. - A voz dele é realmente irritante e aguda. - É. Eu achei mais... Afeminada mesmo. Bom, mas ele também me disse que não se deixa de ser um ser humano só porque tem interesse em pessoas do mesmo sexo. Tive de deixar o silêncio predominar porque simplesmente não soube o que dizer. Lucas houvera me ajudado e eu fiz algo horrível com ele. Praticamente contei para Alex que ele queria ser comido só porque ele ficou nervoso e tentou me calar. - Bryan, tudo bem? Você parece que vai chorar. - Estou bem sim. Só... Estava pensandUm barulho na porta chamou a atenção de ambos nos dois. Meu coração deu um pulo, pois se fosse um de nossos colegas e um boato se espalhasse Pedro nunca mais se aproximaria de mim. Mas, para nosso alívio era somente um emo. Ele possuía o cabelo bem preto e os olhos verdes vivos e claros, de chamar a atenção de longe. Um piercing na sobrancelha e outro no nariz. Era lindo. Como todos os garotos deste colégio conseguem ser tão bonitos? Tentei lembrar seu nome, mas não consegui. Sabia que ele fazia parte do grupo de emos o qual tenho andado ultimamente, pois aqueles olhos contrastando com o cabelo chamavam muito a atenção. - Desculpe interrompê-los. Bryan, você viu o Lu? - Não o vejo dês daquela hora em que saí de perto. Ouvi barulho na cadeira de Pedro e mudei meu foco para frente. - Eu já estou de saída mesmo, só queria entregar seu caderno Bryan. Como você sabe, vou cumprir a promessa e vou lhe conseguir toda a matéria. Até mais – ele fez questão de explicar bem alto para que não houvesse mal entendido com o garoto emo. Ou seja, não quer ser chamado de gay. Quando Pedro passou ao lado do garoto de olhos verdes o mesmo sorriu, porém Pedro virou as costas e praticamente correu para fora da sala, com... medo? Será que ele tinha medo que o emo o agarrasse? - Hetero? - Isso mesmo. - Desculpe interrompê-los. - Que nada. Devo até te agradecer, a conversa aqui estava se tornando um tanto estranha. Ele sorriu. Com um sorriso lindo como todos os garotos daqui... Nossa, minha mãe sabe escolher muito bem colégios! 15
  • 16. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Lembra-se de meu nome? - Não. Desculpe – fui obrigado a ser sincero, pois caso a próxima pergunta fosse “então qual é?” eu não saberia responder. - Tudo bem. Ele se aproximou e sentou-se na classe ao lado da minha, literalmente na classe, não na cadeira. - Meu nome é Matheus. Lu nos apresentou. Você é Bryan, certo? - Sim. Me desculpe, é que são tantos nomes novos. - Entendo. E Lu está com um complexo de amigo que não sai do seu pé e não lhe deixa conversar com os outros. Perdoe-o, ele só é um tanto sozinho. - Ele ficou muito mal depois que eu saí? – perguntei temeroso, sem saber se queria mesmo ouvir a resposta. Na hora eu estava com raiva, mas ele não merecia o que eu fiz. Em nenhum momento ele me tratou mal ou me fez algo de ruim. Bem, só quando nos conhecemos que ele contou a Pedro que eu era homo, mas não fora de propósito. - Bastante. Você mandou muito mal. Senti-me péssimo. Eu conheci a Lucas há tão pouco tempo, mas aquela agitação dele e jeito de criança realmente são marcantes. Não o queria triste nem mal. Eu nunca fui muito sociável e as pessoas nunca quiseram se aproximar de mim, mas com Lucas foi diferente. As pessoas deste colégio são diferentes com relação a mim. - O que houve? - Ele tentou se explicar, mas não deu. Alex brigou com ele e chamou-o de muitas coisas, dentre elas de puto e falso. Lu saiu de perto de nós chorando. Eu tentei alcançálo, mas parece que ele conseguiu se esconder no colégio. - Então acho que vou matar os próximos períodos e procurá-lo. Matheus desceu da despreocupadamente. mesa e colocou as mãos nos bolsos da calça, - Eu terei de ir para a aula. Rodei feio no primeiro trimestre em Física. Quando encontrá-lo, diga a ele que explique - se para mim, pois tentarei falar com Alex. Ele se virou para a porta e seguiu na direção da mesma. Parou no caminho e virou o rosto de lindos olhos verde claros para mim. - E diga-o que ele é fofo. Ele gosta de ouvir isso. Matheus saiu da sala e só então percebi que meu coração estava aos pulos. Tentei acalmar minha respiração e, quando ouvi o sinal bater peguei minha mochila saí rapidamente da sala de aula, pois tinha de procurar por Lucas. 16
  • 17. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 4: Mi comi, Mi beija. Saber onde ele se encontrava nem seria tão difícil assim. Quando eu desejava chorar no colégio eu ia para os banheiros, pois lá nunca há ninguém para incomodar. O problema é: onde ficam os banheiros neste colégio? E quantos deve haver aqui? Depois de errar algumas vezes eu encontrei um banheiro que ficava distante dos outros, próximo a sala de química. Entrei nele e percebi que estava vazio. Fiz o máximo de silêncio possível e, logo, consegui escutar um choro baixinho vindo do último banheiro. Antes de bater na porta ou fazer qualquer barulho, abaixei-me e espiei por debaixo. Encontrei o par de All star preto de cadarços pretos e detalhes em branco que houvera visto Lucas usar mais cedo. Bati na porta. - Lucas – chamei. Logo, uma voz embriagada pelo choro me respondeu. - Vai embora. Suspirei. - Desculpe. - Não! - Lucas, se você me ignorar terá de ficar chorando aí sozinho, pois os outros foram para a aula. O choro se tornou mais alto e mais intenso. - Minha única opção é aquele quem me fez chorar! - Quem te fez chorar foi Alex, não eu. - Mas a culpa é sua! - Eu sei, desculpe. - E eu nunca te fiz nada de ruim. Você é mal e cruel. - Desculpe. Foi na hora da raiva, eu não queria te fazer mal. - Mas fez! Agora Alex me odeia e me chamou de um monte de coisas ruins. Ficou repetindo que eu era puto o tempo todo. - Desculpe Lucas. Já expliquei que eu disse só na hora da raiva, eu não tinha intenção de dizer mesmo. O que mais você quer de mim? Uma pequena fresta da porta fora aberta. Ali, Lucas espiou, com as lágrimas escorrendo pelo rosto e sujando-o de preto por conta da maquiagem. - Posso te bater? – ele perguntou de forma meiga. Eu fitei-o sem entender. - O quê? 17
  • 18. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Se você deixar eu te bater eu te perdoo. Parei e tentei raciocinar. Ele queria me bater? Isso é muito estranho! - Um soco só! E no braço. - Na barriga. - Não. - No ombro então. - Um pouco abaixo do ombro. - Ok. Assim que ele concordou não tive tempo de me preparar. Ele abriu a porta do banheiro e já foi me desferindo um forte soco na parte de cima do meu braço, bem próximo ao ombro. - Aí! Puta merda, você é forte! Lucas riu, mas por pouco tempo. Seus olhos se encheram d’água e ele me envolveu com seus braços, apertando-me. - Alex me odeia! Nunca gostei de ter de consolar pessoas. Normalmente eu acabo chorando junto. Adentrei o pequeno banheiro para que ninguém nos visse e sentei no vaso que se encontrava com a tampa abaixada, largando minha mochila ao lado deste. Lucas sentouse em meu colo e afundou sua cabeça abaixo de meu pescoço. - Alex disse que gosto que qualquer um me coma, mas não quis dar pra ele. Ele disse bem assim mesmo! E que aquela minha conversa de que eu queria que fosse com amor era só desculpinha. Ele não acreditou quando eu disse que ainda era virgem. Suspirei. Por que eu tinha que abrir a minha boca grande? Agora tenho um garoto chorando em meu colo graças a minha estupidez. Ok, isso foi um tanto insensível de minha parte. Acho que só estou irritado porque é Lucas quem está chorando em meu colo e, por mais que eu negue a culpa é minha. Realmente não queria fazê-lo mal assim. Lucas se esticou e pegou um pedaço de papel do rolo próximo de nós. Amassou-o e enxugou as lágrimas por debaixo dos cílios, borrando a maquiagem o mínimo possível. - Ele nem quis me escutar! Disse que provavelmente eu já havia dado para você. - Isso seria impossível – eu disse revirando os olhos. - Por quê? - Porque eu não gostaria de comê-lo. Você já se imaginou sendo comido por mim? Eu sorri, incentivando-o a rir. Ele fungou um pouco e enxugou as lágrimas novamente. Quando me dei conta do que estava acontecendo Lucas já estava perigosamente próximo de mim, com seus lábios sobre os meus. Assustei-me e afastei-o com as mãos. - Pára Lucas! O que pensa que está fazendo? 18
  • 19. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - São somente beijos. Não é como se fôssemos nos tornarmos namorados, irmos para cama ou algo assim. E eu quero carinho – ele disse fazendo um bico de criança. Eu suspirei. Realmente, estava tudo bem beijá-lo. Segurei seus cabelos loiros de raiz escura e beijei-o. Adentrei minha língua pela sua boca e logo percebi seu ritmo. Era lento e doce. Lucas não beijava mal, mas era bem diferente de Alex. Como eles poderiam se dar bem? Tentei me concentrar somente no beijo, mas era uma tarefa extremamente difícil. Apenas o fato de minha língua estar dentro da boca de Lucas já era o suficiente para acelerar meus batimentos cardíacos porque, afinal, era Lucas... Quando nos separamos ele retornou a chorar e soluçar. - Eu odeio o mundo! Odeio minha vida! Como pode tudo dar tão errado para mim...? - Somos dois. - Mas você pode ter meu Alex quando quiser! Agora ele está brabo comigo, eu nunca vou tê-lo. - O que importa eu poder ter Alex ou não? Não é ele quem eu quero. - Você quer o Pedro? Aquele garoto hetero? - Esse mesmo – falei, recordando-me de que eu havia voltado a falar com ele por causa de Lucas e me senti obrigado a agradecê-lo. – E obrigado por ter falado com ele. - E como agradecimento você fez o que fez! Idiota! Eu não possuía resposta. Para calar sua boca, beijei-o. Suguei seu lábio inferior, puxando com força. Quando nos separamos ele limpou o nariz e acomodou-se em meu colo novamente. Acariciei seus cabelos. Ficamos algum tempo assim, enquanto o único som era o barulho do choro de Lucas. - Bryan, como é sua vida? Como é sua família? – ele perguntou assim que se acalmara um pouco. - Bem... Meus pais são divorciados. Antes eu morava com meu pai. Nunca lhe agradou o fato de ter um filho emo, mas aceitou. Quando ele descobriu que eu era gay não quis mais passar vergonha comigo e me mandou para morar com minha mãe. Ela não para muito em casa, está sempre trabalhando, então não tenho problemas. Sei que ela tem um namorado, às vezes o vejo em minha casa a noite, mas finjo que não vi e vou para o quarto. - E você e seu pai brigam? - Brigávamos. Ele me mandava trocar de roupa e arrumar o cabelo para sair com ele na rua, mas eu sempre me recusava. Dizia para eu agir como um garoto normal e que sentia vergonha de mim, mas para os outros falava que isso era só uma fase. Coisa de adolescente. E você? Lucas fechou os olhos, aproveitando melhor meu carinho. Envolvi seu corpo com meus braços. Ainda bem que Lucas é somente um amigo porque me sinto completamente desconfortável nesta situação. 19
  • 20. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Meus pais moram juntos, mas brigam constantemente. Meu pai não gosta de mim. Ele diz que queria ter um filho, não essa coisa que eu sou. Minha mãe me defende, diz que ainda sou criança e que garotos amadurecem mais tarde. Ela me dá qualquer coisa e me trata como criancinha. Meu pai está sempre arranjando desculpas para me pôr de castigo, diz sempre que sou uma decepção. Às vezes ele tenta me bater, mas minha mãe não deixa. Eu tenho uma irmã mais velha, mas ela é um nojo de pessoa. Ela também me odeia. Ela é arrogante e exibida. Muda de namorado a cada semana e veste roupas de puta, mas meu pai a trata como se fosse a rainha do mundo. - Nunca vi pais que aceitassem que seu filho fosse emo e gay. - Os pais de Matheus aceitam. Você lembra quem ele é? - Sim, sim. - Os pais dele dizem “não importa quem você é ou como é, te amaremos do mesmo jeito. Só sentimos porque as pessoas do mundo são ignorantes e você terá uma vida difícil”. Eles não são incríveis? - São sim. - As coisas são mais fáceis para elFomos interrompidos por um barulho de alguém entrando no banheiro. Rapidamente, empurrei a porta de onde estávamos com os pés. - Ouviu isso? – perguntou algum garoto para outro. - Foi só uma porta batendo. De repente, Lucas começou a gemer como uma garota. Gemeu cada vez mais alto, fazendo uma voz aguda e feminina. Fitei-o assustando. Quando ele piscou para mim, entendi o que ele queria. - Cala a boca, putinha – eu disse fazendo uma voz mais grave, voz esta que nem parecia que vinha de mim. - Ah, mas é tão bom... Ele continuou a gemer como uma garota mesmo. Tentei segurar o riso, mas parecia impossível. Ouvimos os passos dos garotos se retirando do banheiro com pressa e, logo, caímos na gargalhada. - Você é um viado mesmo! Até eu acreditei! Lucas riu e fungou. Pegou mais um pedaço de papel e enxugou a água por debaixo dos cílios novamente. Rapidamente, tentei pensar em algo para dizer, evitando, assim, que seu choro recomeçasse. Vasculhei minha mente procurando por algo que o fizesse sorrir, porém, não encontrei. Quando já estava desistindo recordei-me de Matheus e do que ele me dissera. - Aliás, você é realmente fofo. O sorriso que ele abriu fora gigante. Seus olhos brilharam e ficaram duas vezes maiores. Com um elogio tão simples ele ficara imensamente feliz. Agora entendo do porquê de Matheus ter me dito para agradar-lhe com tal elogio. 20
  • 21. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Obrigado! Eu também acho! Sorri, satisfeito comigo mesmo. Lucas continuou feliz, sorrindo como um bobo, perdido em pensamentos agradáveis. Segurei-lhe na cintura e puxei seu corpo para mais próximo do meu. Ele era magro e, mesmo por cima de sua blusa fina pude sentir sua pele quente. Uma onda de desejo me invadiu. Fora tão forte e arrebatadora quanto inesperada e repentina. Começou com um leve formigamento, foi subindo de minhas mãos a meus braços, invadindo meu peito em forma de calor, se espalhando em um segundo por todo o resto de meu corpo. Minha respiração pesou dezenas de vezes mais e eu... ...Eu quis tocá-lo... - Não quero sair daqui assim. Ignorei completamente meus pensamentos anteriores, como se nem ao menos houvessem existido. Abri minha mochila e tirei de lá um estojo com maquiagem. Primeiramente limpei aquilo que estava borrado, secando seus olhos e retirando os resquícios de maquiagem espalhados. Em seguida lhe passei lápis de olho, máscara para cílios, blush e um corretivo para as olheiras. - Não vai abrir o berreiro se ver Alex, não é? Desgostei de minha pergunta quase tanto quanto ele. - Não sei. - Lucas! Ah, e Matheus disse para você se explicar para ele que tentará conversar com Alex. Lucas fechou a cara. - Você poderia ter dito isso antes. Ajudaria muito. - Desculpe, esqueci. Sério mesmo? Se eu houvesse dito isso no início de tudo o choro acabaria? Prefiro não acreditar nisso. - E mais uma coisa: continuarei a chamá-lo de mi comi. Seu queixo foi ao chão. - O queeeeeee? - Continuarei a chamá-lo de mi comi, mas não na frente dos outros. Então, seja um bom mi comi, ok? Quase me arrependi de chamá-lo novamente pelo apelido, pois deu para perceber por sua expressão que não estava nada satisfeito com minha decisão. Mas o apelido era tão engraçado e único que continuei com minha ideia fixa de continuar a chamá-lo pelo mesmo. - Você é cruel! Eu- 21
  • 22. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Interrompi-o com um beijo. Seria muito problemático se ele caísse no choro novamente e... Bem, é bom beijá-lo. Não que eu vá admitir isso para ele. Desta vez quem dera o próximo passo fora ele. Sua língua foi adentrando pela minha boca, sem perder aquela doçura e calma que eu conhecera em nosso primeiro beijo. Lucas envolveu meu pescoço com seus braços e me aproximou mais de si, encostando nossos corpos. - Você gosta de ser beijado, não é? Vê-lo respirar cada vez mais fundo e inspirar mais pesarosamente proporcionou-me uma satisfação indescritível. - Mais ainda quando estou triste – ele respondeu sorrindo, já recuperado. Dei alguns leves tapinhas em sua coxa, indicando que era para ele se levantar. Mi comi assim fez. - Pois então tomarei cuidado para nunca mais fazê-lo triste – debochei sorrindo diabolicamente. Me levantei, peguei minha mochila e saí dali de dentro para o banheiro antes de Lucas. - Bryaaaaaaaann! Você é um chato! - E você é infantil, escandaloso, chora- Já entendi! - E beija mal. Fui para frente do espelho e arrumei meu cabelo. Mi comi aproximou-se de mim e me empurrou de leve. - Mentiroso! Você adorou me beijar que eu sei! - Se eu tivesse adorado teria te agarrado ali. Lucas sentou-se ao meu lado na frente da pia e balançou as pernas distraidamente. Ele fitou de longe suas unhas bem pintadas de preto, de um jeito superior. - E você me agarrou. Só faltou arrancar meus lábios fora! - ‘Tsc. Foi somente para te consolar! - Que mentira! Você fala como se beijasse maravilhosamente bem! Estreitei os olhos para ele, incomodado. Ele houvera acabado de ferir meu orgulho. Aproximei-me dele e me posicionei entre suas pernas. Mi comi sorriu e envolveu minha cintura com aqueles All stars longos. - Vamos ver quem beija mal – desafiei-o, para logo em seguida iniciar mais um beijo de me deixar trêmulo de tão nervoso. Enquanto nos beijávamos, Lucas começou a rir. Rir até demais para ser somente um deboche. Quando ouvi aquele conhecido som de um objeto plano empurrando o ar com força e batendo percebi que alguém nos vira. 22
  • 23. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Separei meus lábios dos de Mi comi cessando nosso beijo. Ouvi sua gargalhada seguida de uma provocação: - Volta aqui gatinho! Eu deixo você participar da nossa suruba! - Mi comi! Cala a boca! Estamos no colégio – adverti-o ter ainda uma mínima noção do quão ruim era aquela frase. Olhei para o rosto de Mi comi e este me assustou. Vi um sorriso sadicamente horripilante brincar em seus lábios. - Ein Bryan, qual é mesmo o nome daquele garoto hetero que você é afim? 23
  • 24. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 5: Já disse que não vou cair nessa. Assim que ouvi as palavras de Mi comi simplesmente não soube o que dizer. Meu coração parou de bater por um segundo para, logo em seguida começar a bater rapidamente. - Você não fez isso... Mi comi se deitou tranquilamente ali mesmo, no balcão da pia. Não olhou para mim, somente ficou a brincar com seu colar de caveira entre os dedos. - Por que não faria? Foi uma excelente vingança. Meu estômago começou a revirar o conteúdo de dentro dele por causa do nervosismo. Senti como se a temperatura ambiente houvesse ultrapassado uns bons 30° Celsius porque meu corpo todo queimou. E sabe qual é a pior parte? Ver Mi comi ali, calmamente deitado, como se não tivesse feito nada de mais. - Você é um monstro vingativo! Pedro houvera mesmo me visto com Mi comi? Agora sim ele vai ficar enojado com gays! Eu pedi desculpas. Disse que estava arrependido. Ele tinha mesmo que acabar com todas as minhas chances de ficar com Pedro só por causa de um erro meu...? E eu tentei engolir aquele bolo que se formava em minha garganta. Tentei trancá-lo junto com minha respiração, mas tal ato estava beirando ao impossível. - Você é uma pessoa horrível Lucas! Todos os meus esforços para acabar com a tranquilidade dele finalmente houveram dado resultado. Lucas se irritou e sentou-se novamente na frente da pia. - E quem é você para me acusar de algo? Você fez muito pior! E quer saber? Não era Pedro, era somente um garoto qualquer, porque eu nunca faria com alguém o mesmo que você fez comigo! Ele se levantou e saiu correndo. Já eu fiquei ali, parado, tentando digerir a informação. *** Os dias seguiram normais. Mi comi não me tratou mal depois daquele dia no banheiro, continuou sendo o mesmo de sempre, porém, de alguma forma eu o sentia diferente. Não vou dizer que é “sexto sentido”, pois acho isso ridículo. É somente uma sensação e essa sensação quando ele está próximo de mim não é a mesma de antes. O sinal soou, anunciando o final do primeiro período e início do segundo. Distraidamente, direcionei meu olhar para a porta, aguardando a chegada do professor de educação física enquanto a sala se tornava uma verdadeira zona. Quando o professor entrou a sala aquietou-se de imediato. É sempre assim. Não vou mentir, o professor de Educação Física é muito gostoso, mas há três passos de distância entre nós: um, a diferença de idade. Dois, o fato de sermos ambos homens e três, ele possuí uma repulsa por mim que é incrível. 24
  • 25. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Vamos Bryan? Fitei a Pedro que me esperava. Sorri e o segui até o pátio. Nesses últimos dias eu e Pedro estamos nos dando relativamente bem. Como amigos, claro. - Vai fazer a torcida com as garotas? Relativamente bem porque, por mais que conversemos como amigos normais, Pedro sempre solta estas piadinhas um tanto homo fóbicas. Mas, para não criar desentendimentos finjo que não percebi. - E por que faria isso? Não sou uma garota metidinha e nojentinha querendo chamar a atenção – eu disse isso, mas tenho certeza que Mi comi deve fazer torcida com as garotas. - Você tem razão. Mas, ‘cê não vai jogar, ‘né? - Não. - Vai ficar assistindo? - Quietinho na arquibancada – respondi sorrindo para ele. Pedro desviou o olhar. - Bem, então torça por mim. - Por quem mais eu torceria? - Ah, sei lá. Pelo time com mais garotos bonitos – percebe a indireta ao homossexual? - Não se preocupe Pedro, vou torcer por você. Chegando ao pátio me recusei a jogar como faço 80% das vezes. O professor me deu uma bronca leve para não parecer preconceito e me deixou sentado na arquibancada, observando. Assisti enquanto os garotos se dividiam em times para jogar futebol. Nunca gostei desse esporte. Foquei-me em Pedro, pois parecia que os times estavam brigando para escolhê-lo. Acho que ele olhou rapidamente para mim, mas não tenho certeza. Em seguida ele agarrou a barra da camiseta e puxou-a para cima, retirando a mesma. Meu coração deu um pulo e, desta vez tenho certeza que ele me espiou pelo canto do olho. - Bryaaaaaaaaan! Senti o peso de um corpo sobre minhas pernas. Olhei para o garoto em meu colo e sorri. - Oi Mi comi. O que faz aqui? Não deverias estar em aula? - Minha professora de química não veio. Tenho esse período e o próximo vago, então vim passar esse tempo contigo. Mesmo que eu estivesse feliz por dentro por ter a atenção de Mi comi ainda havia algo que eu devia perguntar. - E Matheus? – perguntei por que, dês daquele dia no banheiro Mi comi tem passado muito mais tempo com Matheus do que comigo. 25
  • 26. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Ele tinha outras coisas para fazer – ele respondeu fazendo bico enquanto brincava com meu colar de estrela. - Você não pode ficar aqui, meu professor irá brigar. - É o Fernando gostosão? Concordei sem ter certeza se era mesmo esse o nome do professor. Só lembro-me de que era um nome com “F” e... Bem, ele é gostoso. -Não se preocupa, ele não se mete comigo. Uma vez só nós brigamos, mas daí eu chorei na diretoria e ameacei dizer que ele havia me agarrado. Mi comi riu, ainda brincando com meu colar, como se estivesse dizendo algo completamente simples e banal. Ergui meu olhar para o jogo de futebol e na mesma hora percebi que Pedro desviara o olhar. Estaria ele me cuidando...? Mas, Pedro não tem interesse em garotos... Não é...? - Bryan, o que são essas marcas no seu pulso? Senti o nervosismo envolver meu peito e de imediato puxei meu pulso. Mi comi me olhou confuso. - Você tentou... Tentou se matar? - Isso são cicatrizes antigas – tentei explicar, mas simplesmente não achei uma desculpa razoável. - Então você tentou mesmo se matar! Desviei o olhar de Mi comi para Pedro. Mais uma vez percebi que ele estava me olhando. Quando percebeu que eu olhava, ele concentrou-se no jogo e chutou a bola para outro garoto. Senti os braços de Mi comi me envolverem em um abraço apertado. Eu não queria sua pena, mas seu corpo quente e macio junto ao meu proporcionava-me um prazer indescritível. - Não se mate Bryan! - Não dá para falar mais baixo Mi comi? Eu não vou me matar! Eu até poderia xingá-lo e mandá-lo me largar, declarando nada menos que a verdade: eu não pretendia me matar. Porém... Seu calor e se corpo pequeno junto ao meu eram tão bom... Por cima do ombro de Lucas eu olhei para o jogo. Desta vez, quando Pedro olhou para mim e viu que, mesmo no abraço de Mi comi eu estava o observando, ele não desviou o olhar. Ele me olhava e eu o olhava. Sorri, incentivando-o a continuar o jogo, porém, ele não desviou o olhar de mim. Continuamos a nos encarar até um dos garotos chamar a atenção de Pedro para o jogo e ele ter de ir jogar. *** 26
  • 27. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Andava pelo colégio distraído, finalmente a sós. Mi comi provavelmente estaria correndo pelo colégio a minha procura, mas era bom aproveitar o pouco de tempo que eu teria sozinho antes dele me encontrar. Eu ainda deveria estar na aula de educação física, mas fugi quando o professor não viu. O colégio se encontrava vazio nos corredores, pois a maioria dos alunos está tendo aula neste momento. Continuei meu passeio pelo colégio tranquilamente, já estranhando a demora de Mi comi para me achar. Passei por uma porta e juro que ouvi gemidos e risadas. Voltei alguns passos e parei na frente da porta. Realmente, ali dentro havia gemidos e risada. - Pára! Aí não... – pediu uma voz manhosa, mas que parecia ser de um garoto. Seria um casal gay? Continuei na frente da porta, escutando o barulho de dentro. Eu realmente estava curioso se era um casal homo ou não. Considerei abrir a porta, porém eu passaria vergonha interrompendo o sexo. Bom, quer saber? Foda-se, não tenho nada a perder mesmo. Voltei alguns passos em silêncio para, em seguida andar na direção da porta fazendo barulho, demonstrando que estava me aproximando. Meti a mão na maçaneta descaradamente, como se não houvesse escutado nada e abri a porta. Ora, era um casal gay, afinal. E eu os conhecia. - Desculpe interromper. Não sabia que havia alguém aqui dentro – menti. Aquela era uma sala de aula normal. Mas, encima da mesa estavam dois garotos sem blusa, somente de short. Um deles eu reconheci imediatamente, era Matheus. O outro... Bem, reconheci o cabelo de mechas verde limão recém-pintadas, era outro dos emos do grupo o qual eu participava ultimamente. Mesmo tendo sido pegos, ambos estavam sorrindo. Matheus sentado na mesa, com metade dos braços apoiado atrás dele, erguendo seu corpo. Já o outro garoto estava sentado encima de seu quadril, com as mãos no peito de Matheus. Não sou do tipo de garoto que assiste pornô, mas aquela cena realmente daria um maravilhoso vídeo. - Vou sair – eu anunciei já me dirigindo para a porta. - Não, espere. Já estamos saindo, ‘né Luke? – respondeu-me Matheus. Girei meu corpo na direção deles novamente, mas sem sair do lugar. - Ahh, Matheeeeeus. Agora não! – pediu de forma manhosa aquele emo de cabelo preto e mechas verdes, rebolando sinuosamente. Tentei disfarçar, como se não houvera visto aquilo. - Eu disse que seria só um pouco. Não podemos fazer isso aqui no colégio, Luke. Tivemos sorte que foi somente Bryan quem nos viu. Imagine só se fosse um professor? O garoto resmungou e se remexeu mais um pouco, fazendo bico. De imediato me lembrei de Mi comi, pois agiam de formas semelhantes. Matheus sorriu docemente e depositou um leve beijo nos lábios do garoto. 27
  • 28. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Olha, se quiserem eu saio. Realmente não tinha intenção de interromper nada – menti, pois minha intenção era exatamente interromper para ver se eram dois garotos mesmo. - Não, não. Ainda bem que você interrompeu. Vamos Luke, levante-se, por favor. O garoto se levantou a contra gosto. Matheus se levantou também e antes de vestir sua camisa pegou a do garoto das mechas verdes e vestiu-o. Ambos possuíam a mesma altura. Calçaram os sapatos e vieram para meu lado, saindo de lá. Fiquei sem jeito de estar somente eu e mais o casal, mas eles não agiam como um. Pareciam somente amigos, sendo assim terei de perguntar a Lucas qual a relação desses dois. - Bryaaaaaaaaaaann! Sabe, já estou tão acostumado a ouvir Mi comi chamando que, às vezes, quando minha mente fica em branco o que quebra o silêncio é a voz dele gritando meu nome. Estranho, não? Quando achei que ele ia pular no meu pescoço, Mi comi olhou para o lado e viu quem estava me acompanhando. Seu sorriso se alargou. - Ahh! Matheus! Uma pontada de decepção atingiu meu peito quando assisti a Mi comi pulando no pescoço de Matheus, já este sorriu e lhe beijou o topo da cabeça, seguido de um leve afago. - Quantas raízes escuras. Não está na hora de pintar o cabelo, Lu? - Ah, eu pedi para Luke me trazer água oxigenada e aquele pozinho azul. Ele disse que tem muito no salão da mãe dele. Você me trouxe Luke? – Mi comi perguntou voltando sua atenção para o garoto das mechas verdes. Agora entendo do porquê de eu não ter reconhecido o emo, porque ele está cada dia com um penteado diferente. - Sim, eu trouxe. Está na minha mochila lá na sala. - Você pinta para mim Matheus? – perguntou Mi comi, fazendo aquela sua expressão de criança. - É claro que sim Lu. - Ah, então pinte agora! Temos dois períodos vagos mais o intervalo! Eu não quero ficar moreno. Vem! E Mi comi simplesmente saiu puxando Matheus para longe, deixando a mim e ao garoto das mechas verdes para trás. - Acho que ficamos somente nós dois – ele comentou, rindo. - Pois é. - Quer tomar sorvete? Dei de ombros. 28
  • 29. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Não tenho nada para fazer mesmo – menti, pois estou no meio da aula de educação física. Seguimos para o bar do colégio. Compramos dois sorvetes, o meu de creme e o dele de morango. Sentamo-nos em uma mesinha que havia ali para os estudantes, um de frente para o outro. - Você e Matheus são namorados? – perguntei mesmo já desconfiando qual seria a resposta, só para não continuar o silêncio chato. - Não, não. Matheus não gosta de mim assim. Só ficamos de vez em quando. Ah, mas ele é tão carinhoso... A cena era completamente diferente. Estávamos na frente de um bar, eu e um garoto um pouco mais alto que eu, moreno de mechas verdes e olhos castanhos. Ele sorria, mas não era a mesma coisa e conversávamos sobre um garoto o qual eu já conhecera. Mesmo assim, de certa forma me senti familiarizado com a cena. Havia certa semelhança com quando eu conhecera Mi comi, ocasião esta na qual ele me contara sobre sua paixão por Alex. Seriam estas situações semelhantes ou sou somente eu quem estou pensando demais em Mi comi...? - Humm... Esse sorvete está tão bom...! Quer provar? Fiz que sim com a cabeça e ele me esticou uma colherada de sorvete. Abri a boca e aceitei. Estava realmente delicioso. - Muito bom – concordei, sorrindo. O garoto também sorriu e abaixou o olhar para o sorvete. Quando uma pessoa é triste você percebe, pois sente a energia. Uma vez minha antiga psicóloga me contou que o paciente com depressão é o último a ser atendido, pois independente da pessoa, depressão pega. Inclusive era por isso que eu sempre era o último paciente do dia. Bom, mas agora estou melhor e sinto a energia desse garoto. - Tudo bem? Ele assustou-se e olhou para mim. Em seguida abaixou o olhar novamente, entristecido. Ele parecia realmente cheio de problemas. - Sim, estou bem. - Você frequenta um psicólogo? - Sim. Ele me manda tomar alguns remédios. - Você é depressivo. - E você intrometido. Sorri, tentando parecer mais simpático. Ele estava certo, eu estava me intrometendo demais em sua vida. - Desculpe. Só estava vendo que temos algo em semelhante. - Você também é depressivo? - Eu era. Bem, talvez ainda seja. Quando parei de frequentar a psicóloga ela me disse que eu estava melhorando. 29
  • 30. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Ele sorriu e fuçou em seu sorvete, sem olhar para mim. Lembrei que eu ainda tinha de comer o meu próprio sorvete então assim o fiz. - Qual é sua válvula de escape? – perguntei, já tendo uma ideia de qual seria a resposta. - Matheus. Ele não tem problemas, sendo assim os nossos problemas se tornam os seus problemas. Ele é muito carinhoso e atencioso. Já transou com ele? Estranhei a pergunta. De imediato o sangue me subiu a face, felizmente o garoto das mechas verdes estava de cabeça baixa, fitando seu sorvete. - Não – respondi dando ênfase ao “a”, dando um som diferente aquela pequena palavra. - Você é virgem? Desta vez ele me olhou, desejando ver qual seria minha reação. Considerei se lhe diria a verdade. Mas, afinal, não havia nada de mais em dizer a verdade, acho... - Sim – respondi no mesmo tom do “não”. - E você gostaria de deixar de ser? O sorvete começou a entalar na garganta. Não que eu não quisesse, mas era a primeira vez que eu falava com esse garoto e ele já me vem com assunto de sexo. Mas acho que não posso reclamar, considerando que eu mesmo estava conversando sobre o garoto ser depressivo. - Bem... Acho que sim. Mas não quero que seja de qualquer jeito – admitir isso fora extremamente difícil. Eu não costumo conversar sobre tal assunto com relação a mim, seja lá com quem for. Com Mi comi era sobre ele, então tudo estava bem. - Então, se tivermos mesmo algo em comum, você deveria conversar com Matheus. Ele é realmente muito amável. - Você não ficaria chateado com isso? - Não, porque não estamos saindo. Eu não gosto de Matheus assim, eu só gosto do carinho dele e isso é difícil de encontrar em um garoto, pelo menos para mim. - Verdade... Pensar em sexo... Isso não me assusta, pois eu já fui quase estuprado. Eu até gostaria – não de ser estuprado, de ter sexo – mas, foi como eu disse, não queria que fosse de qualquer jeito. Em meu outro colégio os garotos homossexuais que havia não pensavam em namoro, só queriam comer o maior número possível de garotos, ou dar para. É como eu disse para ele e também é como ele me disse. Eu gostaria que fosse com um garoto mais amável que a maioria. - Matheus fica por cima ou por baixo? – perguntei envergonhado, sem fitá-lo. - Os dois. Ou o que você quiser, porque ele deixa quase qualquer coisa. Remexi meu sorvete. Ele era bem clarinho, quase branco, semelhante à cor do esperma... 30
  • 31. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Não quero mais comer sorvete. Quer o meu? – ofereci lhe estendendo meu potinho. Luke era seu nome, ou pelo menos assim que o chamavam. Obriguei-me a gravá-lo, pois em uma conversa não poderia me referir a ele como o garoto das mechas verdes, ficaria chato. E se ele pintasse o cabelo de outra cor? Como eu ficaria? Lembra quando eu citei sobre a mente em branco? Pois é, agora mesmo acabei de pensar na voz de Mi comi me chamando. Sexo, sexo, sexo... Isso seria mais fácil para mim agora que moro com minha mãe, pois ela passa mais tempo na rua do que em casa. Quando eu morava com meu pai era mais difícil. Se um amigo meu fosse em minha casa somente para jogar vídeo - game ele já desconfiava. Bem, com razão, pois nunca era somente jogar, sempre acabava em ‘pegação’. De qualquer forma, agora estaria tudo bem, pois minha mãe não ficaria na volta. - Sabe Bryan, essa seria uma válvula de escape melhor do que se mutilar. Arregalei os olhos e fitei meu pulso. Só então percebi que Mi comi retirara minha pulseira e que agora minhas cicatrizes estavam expostas. Escondi meu pulso embaixo da mesa, escondendo as marcas com a outra mão. Merda de Mi comi. - Bryan! Virei para o lado e vi Pedro se aproximar. Surpreso, esperei até ele chegar perto e dizer o que queria. - Bryan! Então você estava aqui... Eu queria falar contigo. Olhei para Luke, o qual sorria. - Tudo bem? – perguntei, não querendo deixá-lo sozinho ali, pois isso nunca é bom para um depressivo. - Vai nessa – ele respondeu sorrindo. Se fosse outra situação, eu ficaria com Luke. Mas, eu realmente fiquei curioso com relação a Pedro. O que será que ele quer de mim? Ele aparentava estar me procurando já há algum tempo. Levantei-me e o segui para longe. Pedro não disse absolutamente nada. Fomos até a nossa sala de aula, a qual se encontrava vazia. Pedro olhou para os dois lados do corredor antes de fechar a porta. Foi até as janelas e fechou as cortinas, uma por uma. Meu coração começou a palpitar cada vez mais rápido. No meu entender, ele queria fazer algo que ninguém mais poderia ver. Então, vendo a situação pelo lado de fora: estão dois garotos sozinhos em uma sala de aula, um homossexual e outro heterossexual. O hetero fechou a porta e as cortinas, para ter certeza de que ninguém veria nada e aparenta estar nervoso. Eu estou louco ou Pedro quer ficar comigo? Vamos, acalme-se Bryan. Esconda este sorriso do rosto. Puxe os cantos dos lábios para baixo! Vamos, puxe! Eu não acredito que eu consegui realizar esta façanha. Terei mesmo eu transformado um garoto completamente hetero em um homo? 31
  • 32. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Pedro? – chamei-o, sem ter certeza se conseguiria escutar sua voz, pois meus batimentos cardíacos estavam exageradamente acelerados. Quando ele terminou de fechar a última cortina voltou-se para mim e caminhou lentamente em minha direção. - Bryan, eu confio em você. E você sabe que não sou gay e não serei, ‘né? Sei. E é por isso que você fechou toda a sala e teve certeza de que ninguém estava nos vendo, não é? - Bryan eu... Ah, eu me sinto estranho sendo amigo de um gay. Amizade entre um garoto e uma garota sempre acaba em romance. Amizade entre um gay e um hetero dá em quê? - As pessoas dizem que não é possível existir amizade entre um garoto e uma garota sem rolar romance. Por que com garotos é diferente? Por que dois garotos podem ser grandes amigos? Muitas vezes uma amizade bem maior do que a do garoto e a namorada – engoli em seco, tremendo exageradamente. Meu coração estava chegando a três batidas por segundo. – Pedro, por que amizade entre garotos dura mil vezes mais que um namoro? Afinal, a única diferença entre amizade e namoro é o interesse sexual, não é? Eu já disse o quanto ele é lindo? Já disse sobre todas as garotas aos seus pés? Já disse que eu nunca pensei ter uma chance com ele? Já disse sobre a quantidade de piadinhas homo fóbicas que ele faz? Já disse que quando ele descobriu que eu era gay ele se afastou de mim? Já disse que ele está se aproximando perigosamente de mim? Já disse que ele está corado e nervoso? Já disse que seus lábios estão quase sobre os meus? 32
  • 33. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 6: Heterossexuais de merda. Eu já disse que não vou cair nessa. Pedro encostou seus lábios nos meus devagar, com um cuidado derradeiro. Eu sabia que ele não me queria assim, era somente uma curiosidade. Obviamente eu não o deixaria brincar comigo, mas... Um pequeno pedaço de mim, um pedaço bem lá do fundo gritava desesperadamente, ambicionando um contato a mais dele, exigindo sua atenção e ansiando por seus cuidados. Percebi que ele não tentaria aprofundar o beijo e, de certa forma tal falta de atitude dele me decepcionou. Eu não queria ser aquele a definir a situação, pois assim mais tarde eu não poderia declarar ter sido levado por ele. Mas somente seus lábios era o suficiente para meu coração derreter, aquecendo meu corpo por dentro. Eu queria seu toque em minha pele e sua língua brincando com a minha. Em um impulso de insanidade, eu rodeei seu pescoço com ambos meus braços e toquei seus lábios com a minha língua suavemente, esperando para ver sua reação. A cada segundo que ele demorava a se decidir era uma batida que doía em meu peito. Mas Pedro finalmente se decidiu e, ao invés de corresponder meu beijo ele mesmo foi empurrando minha língua e invadindo minha boca com a sua, em um beijo quente e forte. Foi delicioso. Mas algo ainda me incomodava; a falta de contato entre nossos corpos. Dei um pequeno passo para trás, puxando-o pelo pescoço para junto de mim. Com dificuldade – pois não queria interromper o beijo – eu ergui meu corpo e me sentei à mesa do professor. Pedro ainda mantinha seu corpo a certa distancia do meu, sendo assim fui escorregando minhas mãos para sua cintura e puxei seu corpo para mais próximo do meu. Movi minha mão ao zíper de meu casco e terminei de abri-lo. Sei que não devo me iludir, mas Pedro me beijava com tanto desejo... A saliva estava se formando em minha boca exageradamente e senti vergonha por isso. Toquei minhas mãos nas suas e Pedro puxou-as de imediato. Tentei novamente e desta vez ele permitiu que eu o guiasse. Coloquei suas mãos em minha cintura, por baixo da camisa e deixei-as ali, voltando a envolver seu pescoço. Percebi que ele ficara sem jeito, mesmo assim movimentou-as levemente, acariciando-me... Nossos lábios se separaram. A primeira coisa que fiz foi engolir a saliva, tanto a minha que se formara demais quanto a dele. Coloquei meu rosto ao lado do seu, não querendo ver a expressão dele. De qualquer forma, suas mãos continuavam em minha cintura num contato direto de nossas peles. -Você pode me tocar se quiser e até onde quiser – eu sussurrei ofegante, para logo me arrepender. Eu realmente não queria ser usado, mas eu queria um carinho dele. O que fazer? Agora eu já falei, não tem como voltar atrás e colocar as palavras de volta dentro de minha boca. Tudo que é dito fica no universo e tenho certeza de que elas voltarão para me assombrar. Ele movimentou, mas levemente. Eu sabia que Pedro se encontrava em uma situação completamente desconfortável. Seus movimentos não subiam demais nem desciam. Beijei suavemente seu pescoço e encostei minha testa ali. Quando percebi que ele não ia avançar quase chorei. Ele queria o corpo de uma garota e isso eu não poderia lhe dar. Eu sendo o suficiente ou não ele teria de dizer algo. Não quero ser usado. Não pensei muito, pois se pensasse minha mente entraria naquele mesmo conflito interno, quando você pensa em algo com tanta força que é como se você realmente estivesse fazendo, mas não está. Somente o empurrei para longe um pouco brutal demais. Sem 33
  • 34. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga olhar para Pedro eu fui até as janelas e abri as cortinas com força. Uma, duas... Na terceira Pedro segurou meu pulso. - O que você pensa está fazendo?! Ele estava bravo, percebi. Voltei-me para ele suavizando meu olhar, como se não estivesse fazendo nada de mais. Eu já disse o quanto ele é lindo? - Estou abrindo as cortinas – respondi simplesmente. Pedro apertou meu pulso. - Por quê? Tentei soltar meu pulso, mas a força não deixava. Esse é o problema de ser mais fraco que os garotos com quem fico. - Porque se eu posso assumir você também pode! Você me beijou e depois vai ficar fazendo piada de mim para os outros garotos? Não. Eu não sou brinquedo! Agora me solte, meu pulso está doendo – exigi, tentando sacudir meu pulso para soltá-lo, mas infelizmente sua mão ia junto. Aparentava estar colada. Ele apertou com mais força ainda, me fazendo gemer. Empurrou meu braço para junto de mim e obrigou-me a fitá-lo. - E você acha que sou o quê? Mulherzinha? Acha que vou ouvir os meus amigos dizendo que ficaram com garotas lindas, com muito peito e bunda enquanto eu vou dizer que fiquei com um garoto? E ainda completar “fiquei com o Bryan, aquele ‘gayzinho que usa maquiagem”. Óbvio que não! Eu disse que não sou gay! Foi um beijo, não um pedido de namoro, pois eu nunca faria isso! Eu só encostei e você quis que eu lhe tocasse. Isso me dá nojo! Quando ergui o olhar eu já sabia que estava com os olhos cheios d’água. Primeiramente vi uma expressão furiosa, mas quando ele percebeu meu estado suavizou completamente. Aproveitei para soltar meu pulso já muito machucado. - Entendi. Você acha que só porque sou gay tenho que ser puto – fiz uma pausa, pois minha voz começou a oscilar muito. Pensei em secar os olhos, mas daí eu ficaria com um aspecto pior ainda, pois borraria a maquiagem. – Mas eu não sou e não fiquei com você para veres como é e depois sair debochando de mim. Fiquei porque gosto de você e mesmo assim nunca te pedi nada nem invadi teu espaço. Eu deixei bem claro que me tocasse se quisesse e até onde quisesse. Eu... – minha voz tremeu e eu solucei. O choro me impediu de continuar, mas forcei-o para dentro de minha garganta. –Eu não sou uma garota e nunca serei. Você está ciente disso, então se não tinha interesse não deveria ter me beijado. Antes de ouvir qualquer outra coisa saí correndo de lá. Pedro queria somente ver como é um garoto. Ele tinha vergonha de mim. Ele queria a garota que eu não sou. Nós nunca poderíamos ficar juntos... Pedro queria me usar... Entrei no primeiro banheiro que vi, me metendo em uma cabine qualquer. Tranquei a porta e sentei no chão mesmo, com as mãos no rosto. Solucei. Pedro queria me usar. Pedro tem vergonha de mim. Ele disse na minha cara que tinha nojo de mim. A cada palavra cruel que eu recordava era um aperto em meu coração e um soluço saindo de minha garganta. Ele é uma pessoa horrível! Por que eu tenho que ser tratado como brinquedo? Depois disso seria um “nada aconteceu nem vai acontecer”. E ele ainda disso aquilo depois de me beijar, ou seja, o beijo não foi nada para ele. 34
  • 35. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Por quê...? Continuei me martirizando. Repeti em minha mente cada palavra sua, de novo e de novo. Lembrar de sua voz dizendo que teria vergonha de falar para seus amigos que sou seu namorado doía demais e intensificava meu choro quase me fazendo sufocar, mas eu precisava daquilo. Precisava fazer uma cicatriz para não desabar quando o visse fazendo uma expressão de nojo para mim. Porque eu não sou uma garota. Porque me visto como emo. Porque eu gosto de garotos. Porque é essa a definição que ele tem de mim, não importando meus gostos. Em nenhum momento ele quis saber de que tipo de música eu gostava de ouvir, que gênero de filme gosto de ver, passatempo, comida, idade, signo... Nada! Porque, para ele, qualquer coisa com relação a mim se resumia a ser gay. Ouvi barulho no banheiro, mas ignorei completamente. Pedro não seria, óbvio! Imagina só a vergonha que ele passaria em ir consolar um garoto chorando. - Bryan? Porra, que merda! Tive vontade de xingar a todos os Santos existentes no mundo. Por que não podiam me deixar sozinho um pouco? Mas, apesar de tudo, o que eu menos queria era ficar sozinho. Sentei-me no vaso e destranquei a porta. O garoto empurrou-a e abriu. Era Matheus. Abaixei o rosto e esfreguei meus olhos, mas as lagrimas não paravam de cair. Diferente daquilo que eu esperava, Matheus nada perguntou. Sentou-se no chão e puxou-me pelo pulso para seu colo. Assim eu fiz, sentando encima de suas pernas e escondendo meu rosto. Matheus afagou meus cabelos e apoiou seu queixo sobre minha cabeça sem dizer uma palavra. Eu pude ficar quieto pensando e chorando que ele continuou sem fazer perguntas. Acho que isso foi o melhor, pois, assim, não fui obrigado a ouvir toda a triste realidade novamente. Alguns minutos depois, me acalmei e me limitei a somente fungar. Agora eu entendia Mi comi melhor do que ninguém e, se nossas situações estivessem invertidas eu nunca o perdoaria como ele me perdoou. Ajeitei-me melhor no colo quente de Matheus e fechei os olhos, desejando poder dormir. - Pedro me beijou e me xingou – expliquei por alto, sentindo vontade de chorar novamente, mas engoli. - Aquele garoto tem sérios problemas. Você é lindo, Bryan – ele respondeu de forma carinhosa, me fazendo sorrir de leve. Fiz com Matheus o mesmo que fiz com Pedro: peguei suas mãos e as coloquei por dentro de minha blusa, em minha cintura. Suavemente ele esfregou suas mãos quentes em meu corpo, subindo um pouco mais. - O que você quer Bryan? – Tal pergunta me obrigou a questionar-me. O que eu queria? Queria um toque quente, um carinho gostoso. Queria mãos passeando por meu corpo e queria me sentir bem. - Me toque – pedi. 35
  • 36. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Matheeeeuus! Você me deixou lá no banheiro sozinho, esperando! Eu tenho que tirar essa tinta! Acho que ela já está começando a corroer a carne da minha cabeça. Puta merda, caralho, eu vou torcer o pescoço alvo de Mi comi! Vou cortá-lo em vários pedaços e torná-lo carne moída! - Oh, Bryan... Enterrei meu rosto no peito quente de Matheus, escondendo-me. Senti a presença de Mi comi se aproximando e tive vontade de quebrar sua traqueia, impedindo-o de respirar. Assistiria com gosto ele agonizando até morrer... - Não se preocupe Lu, é só enxaguar o cabelo. - O que houve com o Bryan? Senti-me ser cutucando, como se eu fosse o cadáver de um animal que você quer ter certeza de que está morto. O agastamento tomou conta de meu corpo e, rapidamente girei meu tronco e torci seu dedo. Ouvi-o reclamar, mas simplesmente ignorei e afundei novamente no colo de Matheus. - Me cutuca novamente que eu arranco seu dedo! - Ah, ok, me desculpe. Mas o que houve Bryan? Por que está assim? - Não te interessa – resmunguei contra o peito de Matheus, recusando-me a fitar Mi comi. - Ahh Bryaaaaan, não seja mau assim! Me conta o que houve. Aquelas atitudes por parte de Mi comi já estavam me dando nos nervos. Por que este garoto tem que ser tão fácil? Isso mesmo, fácil! Ele é amiguinho de todos, ama a vida como se ela fosse perfeita e perdoa como se tudo fosse simples! Eu tenho repulsa a toda essa falsidade de Lucas. Sim, falsidade, porque eu sei que ele é falso. Não me engana. - Bryan. Fala comigo – ele pediu manhoso, ato este que somente aumentou minha raiva. Levantei-me bruscamente, empurrei Mi comi que estava em meu caminho e fui até o espelho, fitando com desgosto minha maquiagem toda borrada. - Eu vou embora – anunciei decidido. Não passaria o resto da manhã na mesma sala que Pedro. Aliás, atrás de Pedro! Liguei a torneira e, com o dedo indicador tentei limpar a maquiagem borrada por baixo dos cílios. Vi pelo espelho Matheus se aproximando. Ele parou ao meu lado e me ofereceu um pedaço de papel. Aceitei e segurei-o com a mão seca, usando para limpar os olhos. - Se quiser eu vou com você – ofereceu-se Matheus. Não vou mentir, sua oferta realmente trouxe um sorriso para minha face triste. - Se você não se importar... - Eu também vou com você, Bryan! - Não quero – respondi curto e grosso, sem olhar para Mi comi pelo espelho. 36
  • 37. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Por quê? – ele perguntou manhoso novamente, aumentando a raiva preservada dentro de mim. - Porque eu não quero. Eu sabia que, apesar de minhas atitudes para com Mi comi estarem sendo frias e cruéis no dia seguinte ele viria saltitante para minha volta, como sempre fazia. Sendo assim, não importava se eu descarregasse minha raiva nele. -Vou buscar minha mochila – noticiei quando percebi que minha imagem no espelho estava aceitável. Minha imagem sem maquiagem é realmente estranha. Meus olhos até parecem mais claros, mesmo eles sendo naturalmente azuis clarinhos. Sai andando para fora do banheiro antes que recuasse. A verdade é que eu estava com um puta medo de encontrar Pedro na sala de aula, pois a qualquer momento o sinal pode tocar. Percebi que Matheus estava me seguindo quando senti sua mão junto da minha. Era quente; muito quente. Inconscientemente olhei para nossas mãos juntas. Ambas as mãos possuíam as unhas pintadas de preto, porém as minhas eram maiores. Apertei sua mão e segui pelo corredor na direção de minha sala. Quando cheguei à porta inspirei fundo e, receoso adentrei a sala. Tinha gente ali. Um grupo de garotas e uns três garotos no canto perto da minha classe. Entre estes garotos estava... Pedro, só porque o universo desgosta de minha existência e quer me fuder de qualquer jeito. Meu coração deu um pulo somente de ouvir o nome ser pronunciado mentalmente. Sabia que todos os olhares estavam focados em mim por causa de minha mão junta a de Matheus. - Olha só! O viadinho arranjou um namorado – comentou maldosamente um dos garotos junto de Pedro. Eu me recusei a olhar na direção deles, pois tinha medo de chorar. Aproximei-me de minha classe e parei de costas para os garotos, com Matheus de frente para mim, consequentemente na reta dos garotos. - Você se importa? – sussurrei baixinho, torcendo para que Matheus ouvisse. Não queria que ele passasse por uma situação ruim tendo eu como culpado. - Não mesmo – ele respondeu sorrindo, acalmando-me – Quer dar motivo para eles falarem? Peguei minha mochila e coloquei-a nas costas. Meu coração estava em disparada, obstruindo meus pensamentos. Eu sabia que dar um motivo seria um beijo. Tentei pensar, mas realmente não consegui. Havia pouco tempo para tomar uma decisão. Segurei na mão de Matheus e rumamos para fora da sala. Eu queria que Pedro soubesse que não sou um brinquedo. Puxei a mão de Matheus, indicando que era para ele se virar. Quando ele assim o fez eu tomei-lhe os lábios, em um selinho. A sala toda enlouqueceu. - Ai, que nojo! Vou ter pesadelos essa noite! Essa é a pior cena que eu já vi! – gritou um dos garotos. Eu sorri, de certa forma triste, mas tentando esconder. Imagina só se soubessem que Pedro me beijou? - Que nojo! Sério, acho que vou vomitar! E você Pedro ainda andou com ele! Você tem o que na cabeça? Merda? Ou você é só gay mesmo, ein? 37
  • 38. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Já havíamos passado pela porta, então acelerei o passo. Não queria ouvir a resposta de Pedro, de jeito nenhum! Não queria ouvir os deboches dele para com minha pessoa. De repente, senti meu braço sendo puxado com força, obrigando-me a retornar dois passos. - Luke, me alcança minha mochila. - Vai matar? - Sim. Lu está lá no banheiro. Ajude ele a terminar o cabelo. Estou levando Bryan para casa. Logo retornamos a andar. Matheus só queria dar o aviso para não deixar Mi comi sozinho, esperando. Seguimos para a rua e, da calçada mesmo deu para ouvir o sinal batendo. Andamos em silêncio até minha casa. Nossas mãos não se separaram nem por um momento, consequentemente minha mão começou a suar. Sempre que estou de mãos dadas com alguém minha mão começa a suar. Não sei se sou somente eu, mas se sou Matheus não se incomodou com isso, muito menos com os olhares de censura que nos lançavam. Felizmente não havia muitas pessoas na rua. Chegamos a minha casa. Eu abri o portão, atravessei o jardim e cheguei à porta. Abrindo-a vi minha mãe eufórica, caminhando de um lado para o outro da casa enquanto conversava no celular. Larguei a mão de Matheus. - Mãe, trouxe um amigo – anunciei enquanto jogava minha mochila no sofá. - Bem, eu já estou de saída – Matheus disse envergonhado. Quando ele fez menção de ir até a porta eu puxei sua mão, obrigando - o a permanecer comigo. Retirei sua mochila de seus ombros e coloquei junto da minha. Minha mãe falou mais algumas coisas no celular e desligou. Sorriu para mim. - Oi Bryan. Ainda bem que você chegou mais cedo, tenho que sair agora e Amanda não vêm – ela disse rapidamente. Nem me dei ao trabalho de fitá-la, fiquei encarando o sofá. – Mas ela deixou o almoço pronto, então é só aquecer – minha mãe fez uma pausa, provavelmente percebendo a presença de Matheus –Olá, sou a mãe de Bryan, Deise. Que bom que ele está se enturmando! - Prazer, sou Matheus – ele se apresentou, mas eu continuei mirando o sofá branco de almofadas laranja e detalhes marrons. - Então Matheus, você não quer almoçar aqui? E de preferência dormir aqui também, assim Bryan não passa a noite sozinho. Eu sei que ele gosta, mas estar sempre sozinho nessa casa não é bom e ele não costuma trazer muitos amigos aqui, então, por favor, faça companhia para ele. - Mãe, deixa ele – disse irritado e envergonhado. Ela estava fazendo parecer pior do que era ficar sozinho, ou talvez não. - Ah, vamos Matheus, por favor, não o deixe sozinho. Ás vezes pergunto-me se meu pai contou a minha mãe sobre eu ser gay. Tenho certeza que sim, mas ela insiste em agir como se não soubesse. - Bem... Eu tenho que falar com meus pais e38
  • 39. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Ótimo! Pode usar o telefone. Acho que só volto amanhã, então seja um bom garoto Bryan e cuide bem do seu amigo. - Mãe... – resmunguei, tentando fazê-la entender que Matheus não tinha o dia todo a dispor dos outros. Ergui o olhar e a vi se movimentar para as escadas, subindo-as. Em seguida desceu com vários papéis nas mãos e foi direto para a cozinha, com o celular posicionado entre seu ombro e sua cabeça. Suspirei. - Não se sinta obrigado por ela. Não precisa ficar se não quiser – disse voltando-me para Matheus. Ele apenas sorriu. - Fico o tempo que você quiser. Meus pais deixam. Se você quiser eu fico, ou posso ficar menos tempo também. O que você quiser. Olhamo-nos mais um pouco e, logo, começamos a rir. Não sei se foi somente impressão minha, mas ambos queríamos a companhia um do outro, ou talvez somente eu quisesse a companhia dele. - Não! Acalme-se, já estou indo. Minha mãe passou por nós ainda no telefone, continuando com ele preso entre a cabeça e o ombro. Suas mãos estavam ocupadas tentando prender o cabelo castanho claro comprido, enquanto que em seu pulso encontrava-se uma pasta com vários papéis saindo para fora. - Só um minuto. – Ela afastou o celular um pouco, tapando-o com a mão e buscando por suas chaves no chaveiro da parede. – Bryan, tem dinheiro ao lado do microondas. Peça pizza para você e seu amigo. - Tchau mãe – me despedi. Ela nem olhou para mim, prosseguiu falando no telefone e, assim, saiu porta a fora. –Ela trabalha como secretária, ou algo parecido – expliquei a Matheus, sacudindo os ombros, fazendo pouco caso. Ela nunca tinha tempo de me contar sobre algo de seu trabalho, então não sei se ela continua no mesmo. - Você é filho único? – ele perguntou me abraçando por trás e beijando minha bochecha, pegando-me desprevenido. - Sim. - E seu pai? - Ele já não gostava da ideia de ter um filho emo, o fato de também ser gay foi demais para ele. Senti um beijo úmido em meu pescoço sensível, de imediato arrepiei-me. - Então, o que você gosta de fazer? Seus braços foram para meu ombro direito, sendo apoiados ali com seu queixo sobre eles. - Internet, vídeo-game, música... - Que banda você mais gosta? 39
  • 40. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Simple PLan, Green Day, 30 Seconds To Mars... – respondi, vendo que Matheus sorriu, ou seja, também apreciava tais bandas. - Legal. Eu gosto dessas e Panic! At The Disco, Linkin Park, Tokio Hotel, My Chemical Romance… - respondeu Matheus animado, formando uma extensa lista oral de várias bandas que eu também apreciava. - Você está com fome ou prefere fazer alguma outra coisa e almoçar mais tarde? - Não estou com fome agora, mas se quiseres almoçar por mim tudo bem. Agora, preciso mesmo ligar para meus pais e avisar, caso contrário eles ficarão extremamente nervosos sem saber onde estou. Sorri e me locomovi até o telefone sem fio, entregando-o nas mãos de Matheus. Eu realmente estava feliz por passar à tarde com alguém. Se não fosse por Matheus eu absolutamente passaria a tarde inteira sentindo-me jogado no fundo de um poço, enchendo o mesmo de lágrimas e afogando-me. Trágico. *** Passamos a manhã na internet e a tarde no videogame. Era descontraído conversar com Matheus, pois mesmo os assuntos sendo banais havia sempre uma lógica por trás deles. Quando o assunto tomava um rumo na direção do colégio, principalmente Pedro Matheus sempre dava um jeito de contorná-lo. - Bryan... Você ainda tenta se matar? Assustei-me. Como primeira reação voltei discretamente meu olhar para meu pulso, mas o mesmo estava tapado com a manga do casaco. Eu cuidara o tempo todo, então como ele descobrira...? - Bryan, não pára seu carro! Olhei para a tela. Meu carro estava parado, pois acabei soltando o botão. Na tela de baixo o carro de Matheus se encontrava igualmente parado, esperando-me. Apertei o “x” e continuei com o jogo. Quando meu carro passou ao lado do de Matheus foi que ele continuou a jogar. - Como você...? – balbuciei, não querendo ter de terminar a frase. - Luke contou. Ele é um grande amigo e eu o amo muito, mas é um grande fofoqueiro. Sei de toda a conversa que vocês tiveram. Puta merda, como me descuidei assim? Eu não sou de confiar nas pessoas, então como deixei...? Mas, pensando bem fora Luke quem se intrometera, fitando meu pulso descoberto por Mi comi. Espere. Toda a conversa? Inclusive a parte sobre sexo? - Você está ficando vermelho – Matheus comentou sem nem olhar para mim, com seu carro já em grande vantagem no jogo. - Ele contou tudo? 40
  • 41. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Tudo. Dês do psicólogo até sexo. – Senti-me envergonhado, torcendo para que o assunto não houvesse adentrado em... – Comigo. Fiquei alguns segundos em silêncio. Quem ganhara a corrida obviamente houvera sido Matheus, ocorrência esta que feriu meu orgulho. Tentei não pensar no rumo de nosso assunto, mas teria de continuá-lo. E... Talvez isso pudesse se tornar vantajoso para mim. - Luke é um grande fofoqueiro – concluí, ouvindo a risada de Matheus. - Sabe Bryan, eu não só acho você bonito, mas também... O replay de nossa corrida começara. Meu carro era azul e o de Matheus prata. Dês do início ele me ultrapassara. Percebi que o mesmo estava se aproximando de mim, tornando mínima a nossa distância naquele sofá de três lugares. Ponderei que ele me beijaria, mas estava errado. Matheus levou sua mão gelada a meu pescoço, puxando a ele levemente, causando-me arrepios. Logo, seus lábios estavam naquela região sensível, beijando. Foram três beijos, todos descendo na direção de meu ombro. O beijo subiu e foi para meus lábios. Era a primeira vez que eu beijava Matheus, sem contar o selinho de mais cedo. Agarrei-me em seu casaco preto com uma estampa roxa, apertando as mãos com força enquanto sentia sua língua brincando com a minha. O beijo de Matheus conseguia ser doce e ao mesmo tempo quente. Seu braço envolveu minha cintura, puxando-me até me deitar no sofá. Eu queria aquilo, mas estava nervoso. Não é como se eu não pretendesse perder a virgindade, apenas não pensara nisso o suficiente para poder encarar a situação tranquilo, aproveitando mais das carícias. Mais uma vez os beijos foram para meu pescoço, desta vez de forma mais ousada, chupando a pele que fervia. Sua mão gélida adentrou minha camisa e, sem cerimônias ela foi subindo até alcançar meu mamilo, segurando-o entre seus dedos. Soltei um gemido bem baixinho, quase um suspiro, completamente envergonhado. Enquanto seus lábios chupavam meu pescoço meus olhos viam nossos tênis. O meu All star de cano médio vermelho e o All star preto de Matheus, propositalmente manchado com clorofina. - Quer que eu pare? – ele perguntou interrompendo tanto a carícia quanto os beijos. Ergueu o rosto até ficar no caminho de meu olhar. - Não – respondi para aqueles olhos verdes tão clarinhos e brilhantes. Matheus é tão lindo... - Quer perder a castidade comigo? – ele perguntou de forma debochada, sorrindo maliciosamente, ato este que pensei não ser possível. Virei o rosto para o lado, sentindo a vergonha subir-me a face. Luke tinha que ter contado tudo mesmo? - Sim – respondi confiante, sem deixar margem para dúvidas. Não sei se é um desejo suprimido meu, mas meu corpo dizia que uma noite com Matheus seria maravilhosa. Meu corpo e minha pele desejavam o seu, aquele toque, aquelas carícias... - Ótimo. Mas agora preciso ir à minha casa buscar algumas roupas. Matheus levantou do sofá e ficou parado ao lado, sorrindo para mim. Incrédulo, fiquei a fitá-lo sem entender. Ele ia parar fácil assim? Sei que declarei não estar esperando por isso, mas eu não queria parar! 41
  • 42. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga - Vamos Bryan, temos a noite toda pela frente. Até porque, tenho que buscar algumas coisas para nossa noite. – Buscar algumas coisas? Matheus está se saindo um grande pervertido! Devo perguntar o que ele pretende buscar? Acho melhor não. - Bryan, você confia em mim? - Não – respondi sério. Não que eu quisesse chateá-lo, apenas fui sincero. Sua expressão mudou e o sorriso sumiu. Acho que ele se aborreceu. - E eu posso confiar em você? Confirmei com a cabeça - Humm... Ok. Mas eu tenho mesmo que ir em casa, vem comigo Bryan, é pertinho. Ele puxou minha mão, fazendo-me levantar do sofá de muita má vontade e com uma enorme frustração sexual. 42
  • 43. EMOções – por: Tassiele Viebrantz Cassuriaga Capítulo 7: Primeira – e não última – vez. Na hora do jantar fiz como minha mãe sugerira e pedi uma pizza; uma enorme pizza. Sentamos a mesa da cozinha para comer, um de frente para o outro. Sei que um adolescente normal comeria em qualquer outro lugar da casa, mas eu realmente não consigo fazer isso. Tanto a comida quanto a bebida ficam desequilibradas, caindo por toda minha roupa e estragando-a. O silêncio começara a me incomodar. Enfatizo bem o “me”, pois Matheus não aparentava nem um pouco de desconforto, devorava seu pedaço de pizza com uma felicidade beirando ao infantil. -Está gostando da pizza? – perguntei ironicamente, pois suas atitudes o denunciavam. A intenção era somente começar um diálogo, pois a voz descontraída de Matheus soava a meus ouvidos de forma tão agradável... Matheus levantou-se, chamando minha atenção. Ele arrancou um pedaço da pizza com os dentes e colocou parte dela para fora da boca, aproximando-se de mim. Chegou perigosamente perto de meus lábios, sorri ao entender suas intenções e mordi a pizza, contudo, mais gostoso do que a pizza eram seus deliciosos lábios... Ao invés de retornar a cadeira que ele ocupara anteriormente Matheus puxou uma ao meu lado, sentando-se ali, erguendo um de seus joelhos para próximo de seu tórax. - É boa... Paga pela noite – ele debochou, sorrindo sarcasticamente. - Agora você virou garoto de programa e tem que ser pago? – rebati, entrando na brincadeira. Matheus fingiu estar ofendido. - Hey! Só para você saber, sou um dos melhores. - Tanto que é pago com comida... Rimos juntos. Matheus continuou a comer a pizza, mas eu realmente já saciara minha necessidade fisiológica por comida. Servi-me mais um pouco de coca - cola e beberiquei o refrigerante. - Está nervoso? – Matheus me perguntou concentrado em sua comida. Eu fiquei a fitá-lo. - Sim – admiti. Por mais que eu pensasse no que aconteceria, em nenhum momento consegui manter a calma. Matheus era uma pessoa física e ele está aqui, ao meu lado. Não consigo me concentrar porque sempre me recordo de que Matheus não faz nem ideia do que estou pensando, de todas as perversidades que passam por minha mente tão perversa e impura... - Isso é normal. Na verdade, seria estranho se você não estivesse nervoso. Então, mesmo com essa inquietude dentro de você, tente não ter medo. – Falando assim Matheus realmente parecia ser um expert no requisito sexo. - Você poderia me distrair um pouco contanto algumas coisas... – disse com um sorriso malicioso nos lábios, com segundas, talvez até terceiras intenções... - O que você quer saber? – Matheus perguntou sorrindo, sem se importar com meu olhar intimidador. 43