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O Cadáver no Ensino da Anatomia Humana:
uma Visão Metodológica e Bioética
The Corpse in the Teaching of Human
Anatomy: a Methodological and Bioethics
Overview
Gilliene Batista Ferreira da CostaI
Gilliane Batista Ferreira da CostaI
Carla Cabral dos Santos Accioly LinsI
PALAVRAS-CHAVE
– Anatomia.
– Metodologia.
– Bioética.
– Ensino.
RESUMO
Este trabalho teve por objetivos analisar a opinião de alunos sobre as metodologias de ensino aplicadas
em aulas práticas de anatomia humana e abordar questões bioéticas envolvidas na utilização dos ca-
dáveres. Este estudo foi realizado mediante aplicação de questionário a 542 alunos dos cursos do
Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco que cursavam a disciplina de
anatomia humana em 2011. Os dados obtidos revelaram que 88,9% dos entrevistados consideraram
indispensável o uso de cadáver humano nas aulas práticas e que 98,3% empregam materiais didáticos
auxiliares. Quanto às questões bioéticas, 80,7% afirmaram ter recebido informação sobre o respeito ao
manipular um cadáver. Observou-se que o uso de cadáveres humanos foi considerado indispensável ao
processo de ensino-aprendizagem no estudo da anatomia humana e que a relação em seu manuseio se
reflete na conduta do futuro profissional com os pacientes, fortalecendo a humanização dos profissio-
nais de saúde.
KEYWORDS
– Anatomy.
– Methodology.
– Bioethics.
– Teaching.
ABSTRACT
This study aimed to analyze the opinion of students about the teaching methodologies applied in their
practical classes of human anatomy, as well as to approach bioethical issues involved in the use of
cadavers. This study was conducted through a questionnaire applied to 542 students of courses at the
Health Sciences Center, Federal University in Pernambuco, who were attending the course of human
anatomy in 2011. The data obtained showed that the use of human cadaver in practical classes was
considered essential by 88.9% of surveyed, and 98.3% use some auxiliary teaching material. As for
the bioethical issues, 80.7% said they had received information regarding the handling a corpse. Thus
we see that the use of human corpses was considered essential to the process of teaching and learning
in the study of human anatomy, and that the handling of cadavers reflect in the conduct of the future
professional with their patients, strengthening the humanization of health professionals.
Aprovado em: 07/02/2012
Reencaminhado em: 07/08/2012
Aprovado em: 13/08/2012
REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA
36 (3) : 369-373; 2012369 I
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Pernambuco, PE, Brasil.
REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA
36 (3) : 369 – 373 ; 2012370
Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana
INTRODUÇÃO
A anatomia humana é uma disciplina básica para todos os es-
tudantes ingressantes na área da saúde1,2
. Nela, os alunos
aprendem a forma e a localização das estruturas do corpo hu-
mano, correlacionando-as com suas funções3
.
Para que este conhecimento se concretize, são aplicadas
diversas metodologias, dentre elas o uso de cadáveres huma-
nos dissecados, que representam a forma mais antiga e uma
das mais utilizadas ainda nos dias de hoje para o ensino da
anatomia humana4
. Associados a eles, diversos recursos auxi-
liam no processo de ensino-aprendizagem, como o uso de pe-
ças anatômicas de plástico e meios eletrônicos5
. Recentemente,
incluiu-se o processo de aprendizagem autodirigido baseado
em problemas, com acesso individual do aluno ao laboratório
morfofuncional e de informática6
.
Essas novas ferramentas conduzem à melhoria de desem-
penho do aluno, já que facilitam o aprendizado de conteúdos
considerados difíceis de compreender por meio de aulas expo-
sitivas7
, permitindo a construção efetiva do conhecimento8
.
Diante da diminuição do número de doações de cadáveres, os
métodos alternativos de ensino na anatomia tornam-se cada
vez mais úteis, visto que a necessidade de corpos para estudo
é maior do que a disponibilidade4
.
Do ponto de vista bioético, o cadáver humano não deve ser
visto como simples objeto de estudo, já que é envolvido por um
vínculo emocional e afetivo com os indivíduos com que estabe-
leceu uma relação. A questão da morte está presente desde o
início do ensino médico e das outras profissões da área da saúde,
sendo inegável que o avanço da medicina se deu graças à possi-
bilidade de ensino e pesquisa ética em cadáveres9
. No entanto,
opiniões diversas são encontradas atualmente quanto à vanta-
gem de usar peças cadavéricas no ensino da anatomia humana.
Alguns apontam repulsa visual e forte odor de formol
como aspectos negativos no uso do cadáver para ensino, os
quais podem constituir uma barreira importante ao aprendi-
zado3
. Quanto ao lado positivo, defende-se que a ausência de
cadáveres para estudo compromete o aproveitamento dos alu-
nos de todos os cursos da área da saúde2
, com enfraquecimen-
to do processo de humanização10
.
Dessa forma, é preciso vincular os aspectos técnicos aos
ético-humanísticos para que os estudantes possam desenvol-
ver habilidades para a competência em suas profissões sem
que se esqueçam do lado humanístico do assunto11
.
Mitre et al.12
afirmaram que um dos méritos da educação
atual consiste na
[...] crescente tendência à busca de métodos inovadores,
que admitam uma prática pedagógica ética, crítica, re-
flexiva e transformadora, ultrapassando os limites do
treinamento puramente técnico, para efetivamente al-
cançar a formação do homem como um ser histórico,
inscrito na dialética da ação-reflexão-ação. (p. 2134)
Os objetivos deste estudo foram relatar a opinião dos es-
tudantes sobre as metodologias de ensino utilizadas nas ativi-
dades práticas da anatomia humana e abordar questões bioé-
ticas que envolvem o manuseio do cadáver humano.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizado um estudo descritivo, baseado em levantamento
de dados mediante aplicação de questionários que continham
questões exclusivamente objetivas relacionadas às metodolo-
gias aplicadas no ensino da anatomia humana, assim como
questões bioéticas ligadas ao uso de cadáveres humanos para
estudo. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa Envolvendo Seres Humanos do Centro de Ciências
da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco (CAAE —
0406.0.172.000-11).
A pesquisa foi realizada com 542 estudantes que cursa-
vam a disciplina de anatomia humana da Universidade Fede-
ral de Pernambuco, dos cursos do Centro de Ciências da Saú-
de (Medicina, Odontologia, Fisioterapia, Fonoaudiologia,
Educação Física, Farmácia, Terapia Ocupacional e Nutrição),
do segundo semestre letivo do ano de 2011, que deram seu
consentimento após a leitura do termo de consentimento livre
e esclarecido.
Quanto ao tema metodologia, os alunos foram questiona-
dos sobre: se em suas aulas práticas utilizavam-se cadáveres
para estudo; se era indispensável o seu uso e se eles poderiam
ser substituídos por programas de computador, material sin-
tético ou animais, assim como se deveriam ser utilizados so-
mente para pesquisa; quais eram os materiais didáticos auxi-
liares que eles empregavam e se seus professores faziam uso
de alguma tecnologia em sala de aula. Quanto ao assunto bio-
ética, questionou-se acerca de: se eles haviam recebido algum
tipo de informação sobre a importância do respeito ao mani-
pular um cadáver; se possuir coragem e maturidade emocio-
nal era necessário para manipulá-lo, assim como a influência
religiosa; se as aulas de anatomia humana preparam o futuro
profissional para ter equilíbrio emocional.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dos 542 estudantes que responderam ao questionário, 342
(63,1%) foram do gênero feminino e 200 (36,9%) do masculino,
obtendo-se uma proporção feminino:masculino de 1,7:1,0. A
média de idade foi de 20,15 anos, com idade mínima registra-
REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA
36 (3) : 369 – 373 ; 2012371
Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana
da de 16 anos e máxima de 58 anos. Os alunos pertenciam a
diversos cursos da área de saúde: Medicina, Odontologia, Fi-
sioterapia, Fonoaudiologia, Educação Física, Farmácia, Tera-
pia Ocupacional e Nutrição (Figura 1).
FIGURA 1
Distribuição dos estudantes pesquisados por curso
Fonte: Departamento de Anatomia Humana/UFPE.
Quando questionados sobre religião, 287 (55,6%) afirma-
ram ser católicos, 125 (24,2%) evangélicos, 46 (8,9%) espíritas,
30 (5,8%) disseram não ter nenhuma religião e 28 (5,4%) se-
guiam outras religiões. Do total dos pesquisados, 18,6% consi-
deraram que a religião influencia sua conduta frente à mani-
pulação de um cadáver.
Todos os estudantes afirmaram utilizar cadáveres huma-
nos para estudo em suas aulas práticas na universidade. Desse
universo, 482 (88,9%) consideraram seu uso indispensável nas
aulas de anatomia (Tabela 1). Esses cadáveres vêm sendo utili-
zados pelos alunos apenas para a demonstração das estrutu-
ras anatômicas, já que, segundo Melo e Pinheiro5
, a redução na
doação de cadáveres fez com que os alunos do curso médico
da Universidade Federal de Pernambuco deixassem de disse-
car desde o ano de 1998. Ainda segundo esses autores, a difi-
culdade de entrada de cadáveres no Departamento de Anato-
mia Humana dessa universidade tem feito com que as aulas
práticas sejam realizadas com cadáveres dissecados várias
vezes, alguns até mesmo com objetivos inexistentes.
Quando perguntados se o cadáver humano deveria ser
utilizado somente nas pesquisas científicas e não em aulas de
graduação, 517 (95,7%) estudantes não concordaram. Quando
questionados se o uso de cadáveres poderia ser substituído
por programas de computadores e materiais sintéticos, 443
(81,9%) dos alunos responderam negativamente. E quando in-
terrogados sobre a substituição por animais, 530 (98,1%) res-
ponderam que não são a favor. Segundo Aversi-Ferreira et al.13
,
a dissecação de cadáveres na anatomia humana é uma ferra-
menta importante para a educação médica, por ser uma meto-
dologia de ensino que encoraja o pensamento crítico e investi-
gativo, integrando o ensino básico aos conhecimentos clínicos.
Dessa forma, mesmo sem realizarem a dissecação de cadáve-
res humanos, utilizando-os apenas para observação das estru-
turas anatômicas, comprometendo o desenvolvimento das
habilidades para a formação médica, os estudantes expressa-
ram a necessidade de ao menos ter contato com os cadáveres
em suas aulas práticas.
TABELA 1
Opinião dos estudantes de diferentes cursos quando
questionados se consideram indispensável o uso de cadáver
humano nas aulas práticas de anatomia
Curso Sim (%) Não (%)
Fonoaudiologia 18 (81,8%) 4 (18,2%)
Fisioterapia 71 (95,9%) 3 (4,1%)
Nutrição 27 (84,4%) 5 (15,5%)
Terapia ocupacional 27 (90%) 3 (10%)
Farmácia 20 (100%) —
Odontologia 115 (84,6%) 21 (15,4%)
Educação física 91 (90,1%) 10 (9,9%)
Medicina 113 (89%) 14 (11%)
Fonte: Departamento de Anatomia Humana/UFPE.
Questionados sobre a utilização de materiais didáticos
para auxiliar seu aprendizado, 98,3% afirmaram fazer uso,
sendo que 476 (87,8%) declararam utilizar o atlas, 113 (20,8%)
os modelos de estudo e 131 (24,2%) os programas de computa-
dor. Ainternet foi citada por 413 (76,2%) alunos, sendo o recur-
so tecnológico mais utilizado atualmente em estudo a distân-
cia e se apresentando como um recurso adicional para profes-
sores, alunos e profissionais de saúde, tornando a educação
mais interativa e viável14
. Todos esses materiais didáticos de
auxílio à aprendizagem, se usados de forma correta, contri-
buem para a compreensão do funcionamento correto dos ór-
gãos do corpo e para a construção de conhecimentos15
.
Os professores de anatomia humana da universidade pes-
quisada também foram avaliados pelos estudantes quanto ao
uso de novas tecnologias nas aulas teóricas ou práticas. Dos
alunos pesquisados, 36,2% afirmaram que seus professores fa-
zem uso de novas tecnologias. Esses dados são relevantes, já
REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA
36 (3) : 369 – 373 ; 2012372
Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana
que pesquisas demonstram que aulas meramente expositivas,
nas quais os alunos apenas veem e ouvem, são menos eficien-
tes quando comparadas àquelas em que o aluno vê, ouve, in-
terage e executa3
.
A constante evolução da tecnologia educacional faz com
que os professores precisem adaptar os métodos de ensino-
-aprendizagem para inserir o aluno em seu contexto diário.
Isso leva o professor a se posicionar de forma receptiva às
transformações e às avaliações que contribuem para o aprimo-
ramento metodológico, muitas vezes aperfeiçoando o domí-
nio de tecnologias modernas14,16
.
Na abordagem das questões bioéticas, 434 estudantes
(80,7%) afirmaram ter recebido alguma informação sobre a
importância do respeito ao manipular um cadáver ou parte
dele, não o tratando como um simples material de estudo.
Esse resultado pode ser consequência, muitas vezes, da diver-
sidade cultural, religiosa e biográfica dos estudantes, o que faz
com que o trabalho de conscientização realizado antes das pri-
meiras aulas práticas não atinja a totalidade dos alunos17
.
Maturidade emocional foi tida como uma condição essen-
cial para se adotar uma postura adequada diante de um cadá-
ver por 519 alunos (96,3%). Já 366 (68%) deles afirmaram que,
para seguir carreira na área das Ciências da Saúde, o indiví-
duo deve ter, obrigatoriamente, coragem de ver um cadáver
ou manipulá-lo.
Os pesquisados (74,6%) consideram ainda que as aulas de
anatomia humana preparam o futuro profissional para ter equi-
líbrio emocional e ser mais humano. Essa opinião vai ao encon-
tro daqueles que sustentam que a ausência da relação do aluno
com o cadáver implica um futuro enfraquecimento da relação
com o paciente, dificultando o processo da humanização10
.
As escolas médicas ainda enfrentam dificuldades para as-
sumir a temática da morte com seus alunos, ficando a questão
do morrer ligada apenas ao aspecto técnico, deixando-se de
relacioná-la com o conteúdo de humanização que a cerca. O
envolvimento do estudante com a morte durante a graduação
fortalece a relação médico-paciente durante a vida profissio-
nal. O diálogo sobre a morte no processo de construção do
“ser médico” contribui para melhorar a qualidade de vida e de
morte presente na prática médica18
. Para os que entram em
contato com o cadáver em sua profissão, demonstra-se que há
uma valoração da pessoa, ainda que representada em um cor-
po sem vida19
.
CONCLUSÃO
O uso de cadáveres humanos, mesmo que apenas para de-
monstração das estruturas anatômicas, foi considerado indis-
pensável ao processo de ensino-aprendizagem no estudo da
anatomia humana. O manuseio do cadáver pelo estudante foi
tido como uma forma de fortalecer a humanização dos futuros
profissionais da saúde, refletindo-se em suas condutas com os
pacientes.
REFERÊNCIAS
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mana no curso de medicina da Universidade Federal de
Goiás — avaliação e perspectivas. Arq Ciênc Saúde Uni-
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Morais-Pinto NM, Meirelles CAB, Pinto-Porto C, Moreira
REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA
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Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana
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ficados e implicações para a humanização do cuidado. São
Paulo; 2006. Doutorado [Tese] — Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo.
19. Köhler ICC. O cotidiano dos funcionários de um instituto
médico legal frente à morte: uma leitura à partir da bioéti-
ca personalista. São Paulo; 2006. Doutorado [Tese] — Fa-
culdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
Gilliene Batista Ferreira da Costa contribuiu na concepção e
desenho do estudo, coleta de dados, análise e interpretação
dos dados, elaboração do artigo e aprovação final da versão
encaminhada para publicação. Gilliane Batista Ferreira da
Costa contribuiu na coleta de dados, análise e interpretação
dos dados, revisão crítica do artigo e na aprovação final da
versão encaminhada para publicação. Carla Cabral dos Santos
Accioly Lins contribuiu na concepção e desenho do estudo,
coleta de dados, revisão crítica do artigo e aprovação final da
versão encaminhada para publicação.
CONFLITO DE INTERESSES
Declararam não haver.
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Gilliene Batista Ferreira da Costa
Av. Conde da Boa Vista, 1482 — apto 111
Boa Vista — Recife
CEP 50060-001 — PE
Email: gillienecosta@hotmail.com

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Aprendizagem baseada-em-problemas-na-formacao-medica-e-o-curriculo-tradiciona...
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Anatomia cadaver artigo

  • 1. O Cadáver no Ensino da Anatomia Humana: uma Visão Metodológica e Bioética The Corpse in the Teaching of Human Anatomy: a Methodological and Bioethics Overview Gilliene Batista Ferreira da CostaI Gilliane Batista Ferreira da CostaI Carla Cabral dos Santos Accioly LinsI PALAVRAS-CHAVE – Anatomia. – Metodologia. – Bioética. – Ensino. RESUMO Este trabalho teve por objetivos analisar a opinião de alunos sobre as metodologias de ensino aplicadas em aulas práticas de anatomia humana e abordar questões bioéticas envolvidas na utilização dos ca- dáveres. Este estudo foi realizado mediante aplicação de questionário a 542 alunos dos cursos do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco que cursavam a disciplina de anatomia humana em 2011. Os dados obtidos revelaram que 88,9% dos entrevistados consideraram indispensável o uso de cadáver humano nas aulas práticas e que 98,3% empregam materiais didáticos auxiliares. Quanto às questões bioéticas, 80,7% afirmaram ter recebido informação sobre o respeito ao manipular um cadáver. Observou-se que o uso de cadáveres humanos foi considerado indispensável ao processo de ensino-aprendizagem no estudo da anatomia humana e que a relação em seu manuseio se reflete na conduta do futuro profissional com os pacientes, fortalecendo a humanização dos profissio- nais de saúde. KEYWORDS – Anatomy. – Methodology. – Bioethics. – Teaching. ABSTRACT This study aimed to analyze the opinion of students about the teaching methodologies applied in their practical classes of human anatomy, as well as to approach bioethical issues involved in the use of cadavers. This study was conducted through a questionnaire applied to 542 students of courses at the Health Sciences Center, Federal University in Pernambuco, who were attending the course of human anatomy in 2011. The data obtained showed that the use of human cadaver in practical classes was considered essential by 88.9% of surveyed, and 98.3% use some auxiliary teaching material. As for the bioethical issues, 80.7% said they had received information regarding the handling a corpse. Thus we see that the use of human corpses was considered essential to the process of teaching and learning in the study of human anatomy, and that the handling of cadavers reflect in the conduct of the future professional with their patients, strengthening the humanization of health professionals. Aprovado em: 07/02/2012 Reencaminhado em: 07/08/2012 Aprovado em: 13/08/2012 REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA 36 (3) : 369-373; 2012369 I Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Pernambuco, PE, Brasil.
  • 2. REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA 36 (3) : 369 – 373 ; 2012370 Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana INTRODUÇÃO A anatomia humana é uma disciplina básica para todos os es- tudantes ingressantes na área da saúde1,2 . Nela, os alunos aprendem a forma e a localização das estruturas do corpo hu- mano, correlacionando-as com suas funções3 . Para que este conhecimento se concretize, são aplicadas diversas metodologias, dentre elas o uso de cadáveres huma- nos dissecados, que representam a forma mais antiga e uma das mais utilizadas ainda nos dias de hoje para o ensino da anatomia humana4 . Associados a eles, diversos recursos auxi- liam no processo de ensino-aprendizagem, como o uso de pe- ças anatômicas de plástico e meios eletrônicos5 . Recentemente, incluiu-se o processo de aprendizagem autodirigido baseado em problemas, com acesso individual do aluno ao laboratório morfofuncional e de informática6 . Essas novas ferramentas conduzem à melhoria de desem- penho do aluno, já que facilitam o aprendizado de conteúdos considerados difíceis de compreender por meio de aulas expo- sitivas7 , permitindo a construção efetiva do conhecimento8 . Diante da diminuição do número de doações de cadáveres, os métodos alternativos de ensino na anatomia tornam-se cada vez mais úteis, visto que a necessidade de corpos para estudo é maior do que a disponibilidade4 . Do ponto de vista bioético, o cadáver humano não deve ser visto como simples objeto de estudo, já que é envolvido por um vínculo emocional e afetivo com os indivíduos com que estabe- leceu uma relação. A questão da morte está presente desde o início do ensino médico e das outras profissões da área da saúde, sendo inegável que o avanço da medicina se deu graças à possi- bilidade de ensino e pesquisa ética em cadáveres9 . No entanto, opiniões diversas são encontradas atualmente quanto à vanta- gem de usar peças cadavéricas no ensino da anatomia humana. Alguns apontam repulsa visual e forte odor de formol como aspectos negativos no uso do cadáver para ensino, os quais podem constituir uma barreira importante ao aprendi- zado3 . Quanto ao lado positivo, defende-se que a ausência de cadáveres para estudo compromete o aproveitamento dos alu- nos de todos os cursos da área da saúde2 , com enfraquecimen- to do processo de humanização10 . Dessa forma, é preciso vincular os aspectos técnicos aos ético-humanísticos para que os estudantes possam desenvol- ver habilidades para a competência em suas profissões sem que se esqueçam do lado humanístico do assunto11 . Mitre et al.12 afirmaram que um dos méritos da educação atual consiste na [...] crescente tendência à busca de métodos inovadores, que admitam uma prática pedagógica ética, crítica, re- flexiva e transformadora, ultrapassando os limites do treinamento puramente técnico, para efetivamente al- cançar a formação do homem como um ser histórico, inscrito na dialética da ação-reflexão-ação. (p. 2134) Os objetivos deste estudo foram relatar a opinião dos es- tudantes sobre as metodologias de ensino utilizadas nas ativi- dades práticas da anatomia humana e abordar questões bioé- ticas que envolvem o manuseio do cadáver humano. MATERIAL E MÉTODOS Foi realizado um estudo descritivo, baseado em levantamento de dados mediante aplicação de questionários que continham questões exclusivamente objetivas relacionadas às metodolo- gias aplicadas no ensino da anatomia humana, assim como questões bioéticas ligadas ao uso de cadáveres humanos para estudo. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco (CAAE — 0406.0.172.000-11). A pesquisa foi realizada com 542 estudantes que cursa- vam a disciplina de anatomia humana da Universidade Fede- ral de Pernambuco, dos cursos do Centro de Ciências da Saú- de (Medicina, Odontologia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Educação Física, Farmácia, Terapia Ocupacional e Nutrição), do segundo semestre letivo do ano de 2011, que deram seu consentimento após a leitura do termo de consentimento livre e esclarecido. Quanto ao tema metodologia, os alunos foram questiona- dos sobre: se em suas aulas práticas utilizavam-se cadáveres para estudo; se era indispensável o seu uso e se eles poderiam ser substituídos por programas de computador, material sin- tético ou animais, assim como se deveriam ser utilizados so- mente para pesquisa; quais eram os materiais didáticos auxi- liares que eles empregavam e se seus professores faziam uso de alguma tecnologia em sala de aula. Quanto ao assunto bio- ética, questionou-se acerca de: se eles haviam recebido algum tipo de informação sobre a importância do respeito ao mani- pular um cadáver; se possuir coragem e maturidade emocio- nal era necessário para manipulá-lo, assim como a influência religiosa; se as aulas de anatomia humana preparam o futuro profissional para ter equilíbrio emocional. RESULTADOS E DISCUSSÃO Dos 542 estudantes que responderam ao questionário, 342 (63,1%) foram do gênero feminino e 200 (36,9%) do masculino, obtendo-se uma proporção feminino:masculino de 1,7:1,0. A média de idade foi de 20,15 anos, com idade mínima registra-
  • 3. REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA 36 (3) : 369 – 373 ; 2012371 Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana da de 16 anos e máxima de 58 anos. Os alunos pertenciam a diversos cursos da área de saúde: Medicina, Odontologia, Fi- sioterapia, Fonoaudiologia, Educação Física, Farmácia, Tera- pia Ocupacional e Nutrição (Figura 1). FIGURA 1 Distribuição dos estudantes pesquisados por curso Fonte: Departamento de Anatomia Humana/UFPE. Quando questionados sobre religião, 287 (55,6%) afirma- ram ser católicos, 125 (24,2%) evangélicos, 46 (8,9%) espíritas, 30 (5,8%) disseram não ter nenhuma religião e 28 (5,4%) se- guiam outras religiões. Do total dos pesquisados, 18,6% consi- deraram que a religião influencia sua conduta frente à mani- pulação de um cadáver. Todos os estudantes afirmaram utilizar cadáveres huma- nos para estudo em suas aulas práticas na universidade. Desse universo, 482 (88,9%) consideraram seu uso indispensável nas aulas de anatomia (Tabela 1). Esses cadáveres vêm sendo utili- zados pelos alunos apenas para a demonstração das estrutu- ras anatômicas, já que, segundo Melo e Pinheiro5 , a redução na doação de cadáveres fez com que os alunos do curso médico da Universidade Federal de Pernambuco deixassem de disse- car desde o ano de 1998. Ainda segundo esses autores, a difi- culdade de entrada de cadáveres no Departamento de Anato- mia Humana dessa universidade tem feito com que as aulas práticas sejam realizadas com cadáveres dissecados várias vezes, alguns até mesmo com objetivos inexistentes. Quando perguntados se o cadáver humano deveria ser utilizado somente nas pesquisas científicas e não em aulas de graduação, 517 (95,7%) estudantes não concordaram. Quando questionados se o uso de cadáveres poderia ser substituído por programas de computadores e materiais sintéticos, 443 (81,9%) dos alunos responderam negativamente. E quando in- terrogados sobre a substituição por animais, 530 (98,1%) res- ponderam que não são a favor. Segundo Aversi-Ferreira et al.13 , a dissecação de cadáveres na anatomia humana é uma ferra- menta importante para a educação médica, por ser uma meto- dologia de ensino que encoraja o pensamento crítico e investi- gativo, integrando o ensino básico aos conhecimentos clínicos. Dessa forma, mesmo sem realizarem a dissecação de cadáve- res humanos, utilizando-os apenas para observação das estru- turas anatômicas, comprometendo o desenvolvimento das habilidades para a formação médica, os estudantes expressa- ram a necessidade de ao menos ter contato com os cadáveres em suas aulas práticas. TABELA 1 Opinião dos estudantes de diferentes cursos quando questionados se consideram indispensável o uso de cadáver humano nas aulas práticas de anatomia Curso Sim (%) Não (%) Fonoaudiologia 18 (81,8%) 4 (18,2%) Fisioterapia 71 (95,9%) 3 (4,1%) Nutrição 27 (84,4%) 5 (15,5%) Terapia ocupacional 27 (90%) 3 (10%) Farmácia 20 (100%) — Odontologia 115 (84,6%) 21 (15,4%) Educação física 91 (90,1%) 10 (9,9%) Medicina 113 (89%) 14 (11%) Fonte: Departamento de Anatomia Humana/UFPE. Questionados sobre a utilização de materiais didáticos para auxiliar seu aprendizado, 98,3% afirmaram fazer uso, sendo que 476 (87,8%) declararam utilizar o atlas, 113 (20,8%) os modelos de estudo e 131 (24,2%) os programas de computa- dor. Ainternet foi citada por 413 (76,2%) alunos, sendo o recur- so tecnológico mais utilizado atualmente em estudo a distân- cia e se apresentando como um recurso adicional para profes- sores, alunos e profissionais de saúde, tornando a educação mais interativa e viável14 . Todos esses materiais didáticos de auxílio à aprendizagem, se usados de forma correta, contri- buem para a compreensão do funcionamento correto dos ór- gãos do corpo e para a construção de conhecimentos15 . Os professores de anatomia humana da universidade pes- quisada também foram avaliados pelos estudantes quanto ao uso de novas tecnologias nas aulas teóricas ou práticas. Dos alunos pesquisados, 36,2% afirmaram que seus professores fa- zem uso de novas tecnologias. Esses dados são relevantes, já
  • 4. REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA 36 (3) : 369 – 373 ; 2012372 Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana que pesquisas demonstram que aulas meramente expositivas, nas quais os alunos apenas veem e ouvem, são menos eficien- tes quando comparadas àquelas em que o aluno vê, ouve, in- terage e executa3 . A constante evolução da tecnologia educacional faz com que os professores precisem adaptar os métodos de ensino- -aprendizagem para inserir o aluno em seu contexto diário. Isso leva o professor a se posicionar de forma receptiva às transformações e às avaliações que contribuem para o aprimo- ramento metodológico, muitas vezes aperfeiçoando o domí- nio de tecnologias modernas14,16 . Na abordagem das questões bioéticas, 434 estudantes (80,7%) afirmaram ter recebido alguma informação sobre a importância do respeito ao manipular um cadáver ou parte dele, não o tratando como um simples material de estudo. Esse resultado pode ser consequência, muitas vezes, da diver- sidade cultural, religiosa e biográfica dos estudantes, o que faz com que o trabalho de conscientização realizado antes das pri- meiras aulas práticas não atinja a totalidade dos alunos17 . Maturidade emocional foi tida como uma condição essen- cial para se adotar uma postura adequada diante de um cadá- ver por 519 alunos (96,3%). Já 366 (68%) deles afirmaram que, para seguir carreira na área das Ciências da Saúde, o indiví- duo deve ter, obrigatoriamente, coragem de ver um cadáver ou manipulá-lo. Os pesquisados (74,6%) consideram ainda que as aulas de anatomia humana preparam o futuro profissional para ter equi- líbrio emocional e ser mais humano. Essa opinião vai ao encon- tro daqueles que sustentam que a ausência da relação do aluno com o cadáver implica um futuro enfraquecimento da relação com o paciente, dificultando o processo da humanização10 . As escolas médicas ainda enfrentam dificuldades para as- sumir a temática da morte com seus alunos, ficando a questão do morrer ligada apenas ao aspecto técnico, deixando-se de relacioná-la com o conteúdo de humanização que a cerca. O envolvimento do estudante com a morte durante a graduação fortalece a relação médico-paciente durante a vida profissio- nal. O diálogo sobre a morte no processo de construção do “ser médico” contribui para melhorar a qualidade de vida e de morte presente na prática médica18 . Para os que entram em contato com o cadáver em sua profissão, demonstra-se que há uma valoração da pessoa, ainda que representada em um cor- po sem vida19 . CONCLUSÃO O uso de cadáveres humanos, mesmo que apenas para de- monstração das estruturas anatômicas, foi considerado indis- pensável ao processo de ensino-aprendizagem no estudo da anatomia humana. O manuseio do cadáver pelo estudante foi tido como uma forma de fortalecer a humanização dos futuros profissionais da saúde, refletindo-se em suas condutas com os pacientes. REFERÊNCIAS 1. Siqueiro Neto EGB, Ferreira JR. O ensino da anatomia hu- mana no curso de medicina da Universidade Federal de Goiás — avaliação e perspectivas. Arq Ciênc Saúde Uni- par. 2001; 5(1):41-50. 2. Kruse MHL. Anatomia: a ordem do corpo. Rev Bras En- ferm. 2004; 57(1):79-84. 3. Braz PRP. Método didático aplicado ao ensino da anatomia humana. Anuário da produção acadêmica docente. 2009; 3(4):303-310. 4. Costa LF, Feijós AGS. Doação de corpos: estudo compara- tivo luso-brasileiro sobre a utilização do corpo humano para ensino e pesquisa. Anais do 5º Salão de Iniciação Científica; 2009. Porto Alegre: EDIPUCRS; 2009. 5. Melo EM, Pinheiro JT. Procedimentos legais e protocolos para utilização de cadáveres no ensino de anatomia em Pernambuco. Rev Bras Educ Med. 2010; 34(2):315–323. 6. 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  • 5. REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA 36 (3) : 369 – 373 ; 2012373 Gilliene Batista Ferreira da Costa et al. O Cadáver e o Ensino da Anatomia Humana T, Hoffman LMA. Metodologias ativas de ensino-aprendi- zagem na formação profissional em saúde: debates atuais. Cien Saude Colet. 2008; 13:2133-2144. 13. Aversi-Ferreira TA, Nascimento GNL, Vera I, Lucchese R. The practice of dissection as teaching methodology in ana- tomy applied to medical education. Int J Morphol. 2010; 28(1):265-272. 14. Piazza BL, Reppold Filho AR. O ensino de anatomia huma- na nos cursos de Educação Física da região metropolitana de Porto Alegre. Ciência em Movimento. 2011; 26:99-109. 15. Bucarey S, Alvarez L. Metodologia de construccion de obje- tos de aprendizaje para La ensenanza de anatomia humana em cursos integrados. Int. J Morphol. 2006; 24(3):357-362. 16. Fornaziero CC, Gordan PA, Carvalho MAV, Araújo JC, Aquino JCB. O Ensino da Anatomia: Integração do Corpo Humano e Meio Ambiente. Rev Bras Educ Med. 2010; 34(2):290-297. 17. Ruiz CR, Pessini L. Lições de anatomia: vida, morte e dig- nidade. O mundo da saúde. 2006; 30(3):425-433. 18. Silva GSN. A construção do “ser médico” e a morte: signi- ficados e implicações para a humanização do cuidado. São Paulo; 2006. Doutorado [Tese] — Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 19. Köhler ICC. O cotidiano dos funcionários de um instituto médico legal frente à morte: uma leitura à partir da bioéti- ca personalista. São Paulo; 2006. Doutorado [Tese] — Fa- culdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES Gilliene Batista Ferreira da Costa contribuiu na concepção e desenho do estudo, coleta de dados, análise e interpretação dos dados, elaboração do artigo e aprovação final da versão encaminhada para publicação. Gilliane Batista Ferreira da Costa contribuiu na coleta de dados, análise e interpretação dos dados, revisão crítica do artigo e na aprovação final da versão encaminhada para publicação. Carla Cabral dos Santos Accioly Lins contribuiu na concepção e desenho do estudo, coleta de dados, revisão crítica do artigo e aprovação final da versão encaminhada para publicação. CONFLITO DE INTERESSES Declararam não haver. ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Gilliene Batista Ferreira da Costa Av. Conde da Boa Vista, 1482 — apto 111 Boa Vista — Recife CEP 50060-001 — PE Email: gillienecosta@hotmail.com