Este trabalho analisa como a mídia televisiva reflete a ideia de que os animais são objetos. Estuda programas de entretenimento e informativos nas emissoras RIC SC/Record e RBS TV/Globo na Grande Florianópolis. Tem como objetivo geral analisar como a TV reforça esta ideia e objetivos específicos como mostrar a história da relação homem-animal, a visão de filósofos sobre os direitos animais e analisar como a TV mostra os animais.
A influência da mídia na percepção dos animais como objetos
1. FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ DE SANTA CATARINA
JOSIELE MARIA DE SOUZA
A TELEVISÃO E OS ANIMAIS:
A MANEIRA COMO A MÍDIA TELEVISIVA REFLETE A IDEIA DE
QUE OS ANIMAIS SÃO OBJETOS
SÃO JOSÉ, 2010.
2. JOSIELE MARIA DE SOUZA
A TELEVISÃO E OS ANIMAIS:
A MANEIRA COMO A MÍDIA TELEVISIVA REFLETE A IDEIA DE
QUE OS ANIMAIS SÃO OBJETOS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
disciplina de Projeto Experimental, como
requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Comunicação Social com
Habilitação em Jornalismo, da Faculdade
Estácio de Sá de Santa Catarina.
Professores Orientadores:
Conteúdo: Lúcia Correia Marques de Miranda,
Doutora
Metodologia: Savani Terezinha de Oliveira
Borges, Especialista.
SÃO JOSÉ, 2010.
5. Este trabalho é dedicado a todos os animais,
independente de qual espécie estejam inseridos, que já
sofreram e ainda sofrem nas mãos dos humanos.
6. AGRADECIMENTOS
Agradeço a todas as pessoas que me apoiaram e me ajudaram neste estudo. Aos meus
amigos, familiares, em especial minha mãe e meu namorado. A todos os voluntários que
atuam na causa animal, principalmente o pessoal da OBA! Floripa que me ajudaram e me
deram forças para continuar esta pesquisa. Não posso deixar de fazer um agradecimento
especial aos meus orientadores (de conteúdo e de metodologia) em especial a doutora Lúcia
que conseguiu me aturar nesses meses de orientação e que sem ela eu não conseguiria ter feito
esta monografia devido a sua dedicação e paciência comigo. Agradeço a Deus e aos seres
divinos que sempre estiveram ao meu lado e auxiliando-me nos momentos mais difíceis deste
estudo. E é claro que não posso deixar de agradecer à minha companheira de todas as horas
que também teve papel fundamental para escolha do tema: minha amiga animal, Pithula. Esta
que todos os dias faz me sentir mais feliz e ter a simplicidade de uma criança quando estou ao
lado dela. Obrigada, Pithula e a todos os animais que fazem a minha vida ser mais completa.
7. Jamais creia que os animais sofrem menos do que os
humanos. A dor é a mesma para eles e para nós. Talvez
pior, pois eles não podem ajudar a si mesmos.
Louis J. Camuti
8. RESUMO
Esta monografia pretende analisar a forma como a mídia televisiva reflete a ideia de que os
animais são objetos. Serão analisados os programas da categoria de entretenimento e
informativa nas emissoras que possuem o sinal na Grande Florianópolis da RIC SC/Rede
Record (que retransmite o sinal da nacional) e RBS TV/Rede Globo (que transmite o sinal da
nacional). O meio televisivo foi escolhido devido a fácil divulgação dos assuntos através das
imagens e o seu alcance junto à sociedade. Os procedimentos metodológicos utilizados para
alcançar os objetivos deste estudo foram: as definições de pesquisa exploratória e descritiva; a
prática da pesquisa bibliográfica; e a técnica de observação. Todos estes tópicos têm base nos
procedimentos da pesquisa qualitativa. Para a teoria de televisão foram usados diversos
autores entre eles Ciro Marcondes Filho, Arlindo Machado e Joan Ferrés. O embasamento
teórico para escrever sobre os animais teve como principais autores Tom Regan e Gary
Francione. Esta é a primeira análise sobre o assunto e tem com alicerce a teoria abolicionista
animal.
Palavras-chave: Animais. Abolicionismo. Televisão.
9. LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1: Chacrinha no seu picadeiro onde realizava suas brincadeiras e atrás o respeitável
público.......................................................................................................................................17
Ilustração 2: Cachorro “canta” no Domingão do Faustão. Exemplo clássico da utilização de
animais como entretenimento...................................................................................................22
Ilustração 3: Repórter fazendo sua passagem e mostrando ao fundo um cachorro que seria de
rua e consequentemente um exemplo de “risco para a saúde humana”................................... 24
Ilustração 4: Matérias usam a emoção para atingir os objetivos: maior número de
audiência...................................................................................................................................25
Ilustração 5: Categorias e gêneros............................................................................................32
Ilustração 6: As diferenças e semelhanças entre gênero e formato...........................................33
Ilustração 7: Sílvio Santos, no seu programa dominical de 10 de outubro de 2010, momentos
antes de revelar as garotas quem havia ganhado a brincadeira.................................................36
Ilustração 8: O casal Glória Menezes e Tarcísio Meira na gravação da primeira novela diária
brasileira....................................................................................................................................38
Ilustração 9: Jô Soares entrevistando Maurício Sita que foi ao programa no dia 14 de outubro
de 2010 lançar um livro............................................................................................................41
Ilustração 10: Comparação entre as duas aberturas do Programa.............................................44
10. SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................11
1.1 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA.............................................................................12
1.2 OBJETIVOS.......................................................................................................................12
1.2.1 Objetivo geral..............................................................................................................12
1.2.2 Objetivos específicos...................................................................................................13
1.3 JUSTIFICATIVA................................................................................................................13
1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO........................................................................................14
2 REVISÃO DE LITERATURA...........................................................................................15
2.1 A LINGUAGEM DA TV...................................................................................................15
2.1.2 A origem da linguagem televisiva no Brasil: o rádio e o circo...................................16
2.1.3 O fascínio e a imediatez das imagens...........................................................................19
2.1.4 Os estereótipos................................................................................................................21
2.1.5 As imagens como linguagem na TV..............................................................................28
2.1.6 A televisão e seus gêneros..............................................................................................31
2.1.6.1 Os gêneros baseados no entretenimento.......................................................................34
2.1.6.1.1 Programas de Auditório e Variedades.......................................................................34
2.1.6.1.2 Novelas.......................................................................................................................37
2.1.6.1.3 Talk Shows.................................................................................................................40
2.1.6.2 Os gêneros baseados na informação.............................................................................41
2.1.6.2.1 Documentário............................................................................................................42
2.1.6.2.2 Telejornalismo...........................................................................................................46
2.1.7 O telespectador e a televisão.........................................................................................49
2.2 ANIMAIS............................................................................................................................51
2.2.1 A relação homem-animal...............................................................................................51
2.2.2 Os animais como divindade...........................................................................................53
2.2.2.1 Xamanismo...................................................................................................................53
2.2.2.2 Egípcios.........................................................................................................................54
2.2.2.3 Hinduísmo, Budismo e Jainismo..................................................................................55
2.2.3 A dominação dos animais..............................................................................................56
2.2.3.1 Filosofia grega...............................................................................................................57
11. 2.2.3.2 O cristianismo e os animais..........................................................................................59
2.2.3.3 Os santos e os animais..................................................................................................60
2.2.4 O Renascimento e o Iluminismo...................................................................................61
2.2.5 Ideias e ações ..................................................................................................................64
2.2.6 A domesticação...............................................................................................................66
2.2.6.1 A estima e os animais...................................................................................................67
2.2.6.2 Especismo.....................................................................................................................69
2.2.6.3 Seres Sencientes............................................................................................................70
2.2.6.4 Teorias filosóficas e a relação com os seres sencientes................................................74
2.2.6.4.1 Os argumentos abolicionistas....................................................................................75
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS....................................................................................78
4 ANÁLISE DOS DADOS...................................................................................................................81
4.1 OS ANIMAIS NOS PROGRAMAS DE ENTRETENIMENTO.......................................81
4.1.1 Programas de Auditório e Variedades.........................................................................82
4.1.2 Novelas............................................................................................................................87
4.1.3 Talk Show.......................................................................................................................91
4.2 OS ANIMAIS NOS PROGRAMAS INFORMATIVOS...................................................94
4.2.1 Documentário.................................................................................................................94
4.2.2 Telejornalismo................................................................................................................97
5 CONCLUSÃO..................................................................................................................................104
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................106
ANEXO A – Declaração Universal dos Direitos dos Animais..........................................114
ANEXO B – Retratação Telejornal Bom dia Brasil sobre matéria a favor de eutanásia
de animais abandonados.......................................................................................................117
ANEXO C – Declaração de Responsabilidade...................................................................118
12. 11
1 INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo é mostrar como os animais são ainda vistos na sociedade
como propriedades e de que forma a televisão brasileira reflete isso. Demonstra-se esta ideia,
com base na revisão bibliográfica que mostra a evolução da relação homem/animal e a própria
evolução do ser humano. A partir de então, é possível fazer um paralelo de como a relação
dos homens com os da mesma espécie evoluiu e do homem com os outros animais continua
com estes sendo encarados como inferiores.
O homem criou a dependência com os animais desde o período pré-histórico. Para
isso, ele domesticou algumas espécies trazendo-as mais próximas ao convívio humano. Com
o passar dos tempos, os animais foram classificados como selvagens e domesticados. Entre os
domesticados estão os usados para alimentação, para o lazer e os que dividem o mesmo
espaço com os homens nos lares.
A evolução dos tempos também trouxe novas alternativas para a diversão, para a
alimentação e novos hábitos foram inseridos nas famílias. Dentre os diversos aspectos
relativos a essa questão tem-se o surgimento das mídias e a sua consecutiva evolução. Na
década de 50 a TV no Brasil começa a ganhar vida e surge um novo período. A televisão
fascina, encanta e ajuda na formação de opinião. Diversos autores criticam a pequena tela
pelo poder de persuasão, mas esquecem de mencionar que o telespectador não é como um
papel em branco que aceita tudo que os falam.
A televisão da década de 50 e a disponível em 2010 divulgam novos estilos, novos
hábitos que são seguidos e adaptados pela sociedade. O meio une o que já existe na sociedade
e joga novos padrões que nem sempre são seguidos pelas pessoas. Isso ocorre devido à forma
como a TV faz isso: antes de se fazer um programa analisa-se um público alvo e constrói-se
um modelo de telespectador, surge assim um espaço propício à criação de estereótipos.
Assim como se cria um modelo de telespectador também é possível criar um modelo
de como os animais são vistos: para alimentos, diversão e propriedades dos homens. Os
bichos aparecem na televisão em diversas situações, no entanto, neste estudo serão analisados
os animais de estimação. Embora seja de interesse da pesquisadora analisar a relação da
televisão com todas as espécies de animais, para que este estudo seja melhor aprofundado
foram escolhidos os animais de estimação.
13. 12
1.1 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA
A partir da leitura do livro Jaulas Vazias, de Tom Reagan começou-se a observar
como a mídia televisiva mostrava os animais. O autor afirma que notícias sobre direitos
animais só aparecem quando sangram o suficiente. A partir dessa declaração a acadêmica
começou a observar os programas da categoria de entretenimento e informativa nas emissoras
que possuem o sinal na Grande Florianópolis da RIC SC/Rede Record (que retransmite o sinal
da nacional) e RBS TV/Rede Globo (que transmite o sinal da nacional). A escolha dessas
emissoras deve-se ao sucesso que elas possuem junto ao público nacional e estadual e pela
produção de conteúdo nas categorias estudadas.
Inicialmente o estudo trará um breve resumo sobre a história da televisão no país e
uma reflexão acerca de um dos aspectos mais relevantes da sua linguagem: a utilização da
imagem. Mais adiante falará sobre a relação dos homens e os animais para entender como ela
se estabelece nos dias de hoje. Após a junção destes dois temas será feita a análise do material
que tem como premissa a forma que a televisão transmite os assuntos relacionados ao meio
animal.
1.2 OBJETIVOS
1.2.1 Objetivo geral
Analisar como a mídia televisiva no Brasil reforça a ideia de que os animais são
objetos.
14. 13
1.2.2 Objetivos específicos
a) Iniciar um estudo científico, através da monografia, mostrando como programas
de televisão (com ênfase nos informativos e de entretenimento) tratam os animais,
na maioria dos casos, como bens de consumo;
b) Mostrar por meio de breve histórico as fases da relação homem/animal;
c) Definir o porquê, de acordo com filósofos, dos animais serem dignos de ter uma
vida;
d) Analisar programas de televisão no país (informativos e de entretenimento)
mostrando os animais de acordo com a ótica destes;
e) Retratar a forma como a televisão, grande formadora de opinião, divulga os
costumes da sociedade no tratamento dado aos animais, transformando o que é
transmitido em verdade absoluta.
1.3 JUSTIFICATIVA
A presente análise é a primeira deste segmento. Não há estudos (artigos,
monografias, teses) que analisam como a televisão reflete a ideia de que os animais são
objetos. Dessa forma, esta pesquisa pretende mostrar que existe um novo campo de estudo
nesta área e que precisa ser estudado já que os animais fazem parte da vida de todos da
sociedade.
A televisão reflete os comportamentos, os costumes das pessoas, no entanto ela
também lança novos hábitos e modas que podem ser incorporados ou não. Existe uma visão
geral de que os animais são inferiores perante aos humanos. Porém, há outras teorias que
defendem que os bichos também são dignos de direitos e que não podem ser considerados
inferiores aos homens somente por pertencerem a uma raça diferente da humana.
Quem defende os direitos aos animais ainda é uma minoria e geralmente quando
estas ideias aparecem na mídia é de forma pejorativa ou sensacionalista. Dessa forma, o
presente estudo pretende mostrar como os animais aparecem na televisão brasileira. Com esta
15. 14
análise, pode-se verificar o que poderia ser mudado para que a televisão mude o seu caráter
especista1.
1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO
A revisão de literatura é dividida em duas partes. Uma sobre televisão onde há um
pequeno resgate histórico da televisão, suas raízes, seus gêneros, o diferencial da imagem na
televisão e a relação da TV com o telespectador.
A segunda parte aborda os temas relacionados aos animais. A relação entre o homem
e o animal, os animais segundo as religiões; a visão sobre os animais de acordo com o tempo
histórico; e mais à frente os filósofos e as teorias que mostram os bichos como dignos de
direitos e de possuírem uma vida livre. Nesta parte consegue-se compreender a forma como
os animais são vistos na sociedade.
Com o embasamento do capítulo dois se tem o resultado no capítulo quatro na
análise de dados. Este capítulo foi dividido em duas partes: em programas da categoria de
entretenimento (dentro dessa estão os gêneros auditório/variedades, novelas e talkshows) e
informativos (documentários e telejornais). Foram analisados cerca de dois vídeos em cada
gênero. O capítulo quatro apresenta a teoria da revisão de literatura sobre a análise dos vídeos
escolhidos.
Os procedimentos metodológicos utilizados nesta pesquisa são explicados no
capítulo três. Já no capítulo cinco, finalmente, é apresentado a conclusão que é o resultado da
do que foi apresentado na análise de dados.
1
Que julga pela espécie a qual o animal pertença. Semelhante ao racismo que julga um ser inferior ou superior
somente por ter uma cor diferente dá de outras pessoas. Esta expressão será explicada de forma mais detalhada
na revisão de literatura.
16. 15
2 REVISÃO DE LITERATURA
Mesmo com as tecnologias disponíveis como a internet, grande parte da população
ainda utiliza a televisão como forma de entretenimento e de se manter informado. É uma
forma barata e confortável de se divertir e de receber as notícias sem fazer esforço. A
televisão, mesmo depois de mais de meio século no Brasil, ainda fascina e encanta. Dessa
forma, esta primeira parte da revisão de literatura trará um breve histórico da televisão no
país, a relação dela com o rádio e o circo, o fascínio das imagens, os estereótipos utilizados
para simplificar a comunicação entre veículo e telespectador, os gêneros jornalísticos além da
relação do público com a TV.
Já na segunda parte, serão apresentados os assuntos relacionados à temática dos
animais para que, na Análise de Dados, se possa observar a maneira como a televisão reflete a
ideia de que os animais são objetos. Para isso, é necessário conhecer a relação homem/animal
desde a antiguidade aos tempos atuais. Também serão apresentados os principais filósofos
defensores da causa animal e as teorias que valorizam os animais como seres possuidores de
direitos.
2.1 A LINGUAGEM DA TV
Entre os meios de comunicação aquele que atingiu a massa de modo significativo e
peculiar foi a televisão. Diariamente milhares de brasileiros assistem aos programas de TV
veiculados nos poucos canais abertos do país. A linguagem deste meio é mais acessível a
todos os públicos, ao contrário dos outros veículos de comunicação (jornal, internet e rádio)
que necessitam de compreensão do que está escrito (jornais e internet), a TV traz os assuntos
falados e ilustrados com imagens, o que caracteriza uma relação de identificação mais
imediata entre os extremos envolvidos no processo (emissor-receptor).
O sucesso da televisão no Brasil deve-se a fatores econômicos e culturais:
[...] a má distribuição da renda, a concentração da propriedade das emissoras, o
baixo nível educacional, o regime totalitário nas décadas de 1960 e 70, a imposição
17. 16
de uma homogeneidade cultural e até mesmo a alta qualidade da nossa
teledramaturgia. (REZENDE, 2000, p. 23).
Em países onde há outras alternativas para o lazer e o acesso à informação, a TV
divide a preferência da sociedade. No Brasil, o veículo ganhou destaque e importância nos
lares devido à praticidade que ele ocasiona. Outras formas de entretenimento como ir ao
cinema, por exemplo, exige a locomoção até o local e ainda o custo para assistir aquela
película. Já a TV traz a diversão gratuitamente no conforto de casa com o sinal aberto. Você
não precisa ir até a diversão, ela vem até você (REZENDE, 2000).
Mas a programação da TV não está baseada só no entretenimento. Mesmo em
novelas, consideradas por alguns como divertimento, também há a transmissão de mensagens
que auxiliam a viver em sociedade. Frequentemente, os canais divulgam enredos que abordam
temas delicados para serem expostos nestes programas. Como o caso da cadeirante
interpretada por Aline Moraes na novela Viver a Vida da Rede Globo (exibida entre
setembro de 2009 e maio de 2010). A ficção mostrava as dificuldades e os preconceitos
vividos por Luciana (Aline Moraes). Já os programas jornalísticos são exemplos do acesso à
informação de diversos locais do mundo em poucos minutos. A programação da TV é
ininterrupta e proporciona ao telespectador o acesso a diversos assuntos em qualquer
momento do dia.
2.1.2 A origem da linguagem televisiva no Brasil: o rádio e o circo
A televisão no país surge na década de 1950, com a extinta TV Tupi. Assis
Chateaubriand foi o pioneiro que além de montar a primeira emissora do Brasil também
trouxe a produção das televisões para o país. De acordo com Marcondes Filho (1988), ao
contrário de outros países que tiveram influência da linguagem do cinema na televisão, o
Brasil desenvolve-se sob outros gêneros: “ela [a linguagem] derivou-se mais das formas de
comunicação populares: o circo e o rádio”. (MARCONDES FILHO, 1988, p. 43).
O estilo circense é notadamente visível nos programas de auditório realizados no
início da década de 50. “A influência do circo [...] é vista não apenas pela presença dos
palhaços ou do homem de auditório, mas também pelo estilo circense de alguns animadores
como Chacrinha, Sílvio Santos, Bolinha”. (MARCONDES FILHO, 1988, p. 43).
É só lembrar-se dos programas apresentados por José Abelardo Barbosa de
Medeiros, o Chacrinha. O apresentador ficou famoso pelo uso de diversas expressões dentre
18. 17
elas: Quem não se comunica, se trumbica; Vocês querem bacalhau?, jogando bacalhau,
abacaxi ou que estivesse em mãos para a plateia. A própria figura do Chacrinha (ver
Ilustração 1) já remete à imagem de artista de circo. O estilo circense aproxima o
telespectador/pessoas no auditório do apresentador/animador. Este estilo popular cativou e
ainda cativa a atenção do público. Assim, “[...] os programas de auditório acabam se tornando
uma síntese, uma nova modalidade de espetáculo de palco [...]”. (MIRA, 1995 apud SOUSA,
2009).
Ilustração 1: Chacrinha no seu picadeiro onde realizava suas brincadeiras e atrás o respeitável público
Fonte: Ex-motorista... (2010).
Os primeiros programas de auditório e os atuais não diferem muito. Com o
desenvolvimento tecnológico, o estilo e algumas ferramentas mudaram o cenário improvisado
de antigamente. Entretanto, é possível perceber que os programas que Sílvio Santos ainda
apresenta possuem as mesmas características dos primórdios deste estilo televisivo. O
Programa Sílvio Santos, por exemplo, apresenta diversos blocos com diferentes quadros,
mas com estilos semelhantes: variedades, atrações musicais, jogos, disputas, quis,... esta
estrutura, se não igual, é muito parecida com a realizada nos programas da década de 1950.
Os programas de auditório baseiam-se no diálogo, no discurso oral. Este tipo linguagem é a
mais próxima do cotidiano tornando assim estes programas mais familiarizados com a
sociedade (SOUSA, 2009).
19. 18
A influência circense também está presente em outros estilos da televisão. O
respeitável público não pode ficar sem seu espetáculo diário. Para isso, a televisão privilegia o
formato espetacular de sua programação, segundo Rezende (2000). O uso do espetáculo nos
últimos anos
[...] ganhou proporções com a proliferação das emissoras (monotemáticas ou não)
que transmitem suas programações 24 horas por dia. Hoje se cumpre o velho ditado
do circo: o espetáculo não pode parar. Na televisão, o espetáculo se desenrola
continuamente hora após hora, dia após dia. Sempre. (REZENDE, 2000, p. 36).
Essa técnica, do espetáculo, cria laços de proximidade entre o telespectador e o
veículo. Porém, para o telespectador é apresentado um clima de familiaridade. Sodré (1984)
afirma que o público espera que a TV interaja com ele ampliando o clima de simpatia e
proximidade, características da família.
Como citado anteriormente, o rádio também teve forte influência na televisão. Nos
primeiros programas de TV não havia muita distância entre ela e o rádio: é como se
tivéssemos um rádio televisionado. Essa influência é bastante presente devido à falta de uma
identidade do novo meio. O veículo ainda não possuía uma linguagem própria, dessa forma
utilizou a experiência dos profissionais radiofônicos e adaptou os programas do rádio para o
meio televisivo.
O Repórter ESSO é um exemplo desta transição. O noticiário foi o primeiro neste
estilo no radiojornalismo brasileiro. De acordo com Machado (2009), o programa surgiu na
década de 40 com o objetivo de divulgar a “propaganda da guerra americana direcionada ao
povo brasileiro”. Ainda segundo o autor (2009), o programa divulgava “notícias de
autoridades, notáveis, estrelas e astros de cinema e feitos científicos norte-americanos”.
Entretanto, informações que não fossem de interesse dos norte-americanos não eram
noticiadas.
O nome do programa é este devido ao patrocínio da empresa petrolífera ESSO que
também orientava como deveriam ser os programas. Devido ao sucesso no rádio, em 1952 o
Repórter ESSO passa a ser transmitido pela TV Tupi. “Assim como no rádio, o Repórter
ESSO na TV ficou conhecido pela pontualidade e credibilidade perante seus telespectadores”.
(MACHADO, 2009). Essas características também migraram para outros programas
jornalísticos, transformando-as em itens obrigatórios na televisão brasileira.
De acordo com Marcondes Filho (1988), no período inicial da TV, o veículo trabalha
com cenas ao vivo e em cenários improvisados. Os recursos técnicos para filmagem também
20. 19
eram precários e de difícil uso. Os equipamentos do rádio tornam-se insuficientes frente ao
novo desafio de transmitir as imagens. A linguagem do rádio usa a voz, a entonação e os
efeitos sonoros. Já a televisão, além de usar esses itens, também precisa montar um ambiente
para transmitir as imagens.
2.1.3 O fascínio e a imediatez das imagens
Através da televisão é possível o acesso a informações de diversos lugares do globo e
de diferentes culturas. Essa janela para o novo mundo também possibilita que as nossas
fantasias sejam alimentadas. Num programa sobre viagens, por exemplo, o ato de assistir
aquelas imagens já alimenta o desejo de conhecer aqueles locais, graças ao trabalho de edição
das imagens escolhidas, revelando o potencial turístico do local.
Como explica Marcondes Filho (1988), o fascínio da TV não está no aparelho, mas
na proximidade entre os telespectadores e outros mundos. A TV tem a capacidade de ligar o
mundo externo (real) e interno (desejos, imaginações) do telespectador. Ela consegue isso no
trabalho de edição dos materiais, pois tenta adequar o produto aos desejos e anseios do
telespectador. A psicanálise explica que as pessoas sempre viveram em prisões mentais.
Embora os costumes da sociedade atual sejam mais liberais do que há 100 anos, o ser humano
continua sendo prisioneiro dos seus desejos. Estes desejos estão trancados no nosso
inconsciente e sempre acham uma forma de escapar, os chamados recalques.
O guardião [dessa prisão] é o ego, e a autoridade carcerária superior, que atua sobre
o ego, chama-se superego. O id, prisioneiro irrepreensível, indomável,
permanentemente buscando formas de fuga, às vezes, se disfarça em alguém livre,
tapeia o guardião e dá umas fugidinhas: são os nossos sonhos, nossos desejos
mascarados com símbolos sem censura, nossos desejos recalcados. (MARCONDES
FILHO, 1988, p. 38-39).
Essas definições da psicanálise ajudam a compreender o que acontece no mundo
interno de cada ser humano. A televisão atrai pela representação de elementos que compõem a
estrutura mental e, de certa forma, os homens desejam possuir aqueles elementos. Entretanto,
não há consciência desta ação que ocorre na área psíquica a qual não existe muitas
informações: é o recalcado que faz parte do inconsciente (MARCONDES FILHO, 1988).
O verbo fascinar, de acordo Houaiss e Villar (2001), refere-se, dentre outras
21. 20
definições, ao ato de atrair, seduzir através do olhar. Ora, a televisão fascina os
telespectadores com os artifícios utilizados e, como falado anteriormente, age diretamente no
inconsciente. Entretanto, é interessante comentar a diferença entre seduzir e convencer. Ferrés
(1998) aborda que a sedução não utiliza a via racional, apenas a emocional. Ela não se baseia
nos argumentos, mas no fascínio. Enquanto convencer significa levar alguém a aceitar uma
ideia por meio de razões, em argumentos bem fundados (HOUAISS; VILLAR, 2001).
A sedução quando domina as emoções tende a adormecer a realidade e ativa a
transferência globalizadora ativada pelo pensamento primário. Já o pensamento primário é
quem organiza as percepções de forma mais clara, alinhando as expectativas a uma
uniformidade (FERRÉS, 1998).
Para Freud (1876 apud LIMA, 2006), o assunto fascinação está ligado ao tema
narcisismo. Ele faz esta relação, pois para o psicanalista o narcisismo é quando um indivíduo
ama a si próprio ou quando o ama da mesma forma que o faz com o corpo da pessoa amada.
O mito grego de Narciso explica o fascínio do jovem pela própria imagem. O narcisismo
define, dessa forma, quando um ser está apaixonado por si mesmo (LAMBOTTE, 1996 apud
LIMA, 2006).
Para o pai da psicanálise (1876), a fase narcisista é necessária para formação do eu,
entretanto no caso da paixão, por exemplo, essa fascinação volta-se para o objeto desejado.
[...] tanto na paixão do amor quanto na hipnose, o sujeito idealiza de tal modo o
objeto que se torna fascinado por ele. O corpo do objeto vira luz, sedução. No amor
idealizado, o objeto é tratado como se fosse o próprio sujeito, isto é, o objeto é
investido de libido narcísica. Quanto mais o objeto é idealizado, mais o sujeito se
torna fascinado, de forma tal que se estabelece uma servidão voluntária do sujeito ao
objeto. (FREUD, 1876 apud LIMA, 2006, p. 4).
Segundo Ferrés (1998), a televisão possui características narcisistas porque é uma
experiência sedutora. O fascínio que as mensagens transmitem provém do contato com os
desejos, sonhos, medos dos espectadores. A televisão não só reflete a realidade representada,
mas também o conteúdo interno de quem assiste.
A produção televisiva tem o objetivo de fascinar e fixar o público. Como cita
Marcondes Filho (1988), se a televisão estimulasse a participação da sociedade levando a
realizar experiências e vivências reais a TV não seria tão ruim. Entretanto,
os produtos da comunicação captam as fantasias dos receptores, estimulam-nas,
permitem que se desenvolvam. [...] Isso vai até certo ponto. Se os estímulos
ultrapassassem esses limites, começariam a incomodar, pois iriam exigir do
22. 21
telespectador ações e comportamentos concretos. [...] O fascinante da TV é isso: a
tensão entre momentos de fantasias liberada e o restabelecimento de esquemas da
ordem. (MARCONDES FILHO, 1988, p. 39-40).
A televisão condiciona essas fantasias a serem somente fantasias no momento que
impõem um limite para elas. Mesmo assistindo a um telejornal, por exemplo, cuja principal
função é a de informar sobre os fatos “mais importantes” do momento, os telespectadores
recebem a mensagem, mas não são estimulados a fazer algo mesmo que a ação transmitida
pelo veículo seja contrária aos ideais de quem assiste.
2.1.4 Os estereótipos
No mundo há vários tipos de cultura e costumes. A televisão minimiza estas
diferenças construindo modelos que não causem grande estranhamento ao telespectador.
Esses modelos são os chamados estereótipos.
Para transmitir uma mensagem, o veículo utiliza o estilo de esquemas. “Por exemplo,
há certas características na aparência de um homem que personifica o herói de TV. Esses
traços típicos são então construídos pelos idealizadores de tipos e apresentados na tela de
forma acentuada”. (MARCONDES FILHO, 1988, p. 43).
Vai-se acentuando dessa forma uma representação da realidade característica da TV.
Esses traços acentuados são os chamados estereótipos. A mocinha do filme geralmente é bela
e delicada; o vilão de uma novela é tão malvado e desumano que faz os telespectadores
odiarem o personagem e, muitas vezes, o próprio ator.
Programas dominicais como Domingão do Faustão (exibido semanalmente pela
Rede Globo) geralmente apresentam quadros que estereotipam os animais. O quadro Se vira
nos 30, por exemplo, frequentemente mostra animais realizando ações humanas para
entretenimento. Um exemplo apresentado no dia 1° de agosto de 2010 é o caso de um cão da
raça São Bernardo “cantor” (ver ilustração 2). É bom lembrar também que o vencedor do Se
Vira... ganha 15 mil reais, ou seja, o animal está sendo exposto e utilizado como
entretenimento para concorrer a um prêmio para os seus tutores. Vale ressaltar que a definição
de cantar no sentido que é conhecido no mundo humano não é transferida literalmente para o
animal. Neste caso o cachorro não canta, mas uiva. Ultimamente, diversos vídeos neste estilo
estão disponíveis na internet ou até mesmo na TV, mostrando animais que realizam essa tal
23. 22
cantoria. No quadro apresentado é fácil perceber o desconforto do animal quando a sirene do
tempo esgotado toca. Até o próprio apresentador comenta sobre o barulho. Por ser um local
estranho, com muitas luzes e pessoas diferentes do seu convívio, o cão mostra-se algumas
vezes inquieto. Outro fato a ser comentado é o acessório utilizado pelo animal. Cães não usam
gravatas, pois não possuem esta necessidade. Este acessório é mais um exemplo da
humanização imposta ao animal. Neste quadro percebe-se o estereótipo utilizado. Para os
telespectadores se identificarem e assistirem aquele programa é mostrado um cão que canta e
usa gravata. É fácil perceber que mesmo sendo domesticados os cachorros não cantam e não
possuem a necessidade de usarem acessórios. A necessidade humana é transferida ao animal
para que aquele conteúdo transmitido seja captado pelo público de maneira mais simples. O
telespectador ao receber estas informações não demonstra estranhamentos já que esses
elementos (impostos ao cão) são naturais do dia a dia dos humanos. Programas e vídeos deste
tipo reforçam a ideia de que os animais podem ser usados no entretenimento dos homens
realizando ações humanas.
Ilustração 2: Cachorro “canta” no Domingão do Faustão. Exemplo clássico da utilização de animais como
entretenimento
Fonte: Max... (2010).
24. 23
Os programas televisivos possuem o ritmo da vida dos trabalhadores. A televisão
prolonga essa continuidade do trabalho, mesmo as pessoas estando em repouso. Para
Marcondes Filho (1988, p. 24), “enquanto assiste à TV, o sujeito mantém seu ritmo de
produção [...] Ansiedade e sensação de estar sempre funcionando são as neuroses permanentes
que garantem ao trabalhador a impressão de „estar vivo‟. Viver significa produzir e apresentar
resultados em todos os sentidos”.
Entretanto, ao assistir um programa televisivo não há essa percepção de que o
veículo transmite a ideia desta continuação de ritmo de trabalho. Isso acontece devido à
linguagem utilizada. A televisão tende a reduzir as mensagens para que o telespectador receba
aquele conteúdo e compreenda instantaneamente. Dessa forma, a TV tende a transmitir as
mensagens e os telespectadores as recebem como reais, pois as ideias transmitidas vêm num
formato definido que facilita a decodificação. Os estereótipos dão uma falsa sensação de
conforto, pois não apresentam surpresas, não exigem grandes reflexões.
De acordo com Ferrés (1998, p. 135),
os estereótipos são representações sociais, institucionalizadas, reiteradas e
reducionistas. São representações sociais porque pressupõem uma visão
compartilhada que um coletivo social possui sobre outro coletivo social. São
reiteradas porque são criadas com base na repetição. A palavra estereótipo provém,
justamente, da tecnologia utilizada para a impressão jornalística, “na qual o texto é
escrito em um molde rígido – na impressão em offset ou de estereótipo – que
permite reproduzi-lo tantas vezes quanto se deseje” (E. Noelle Neumann, 1995,
p.191). O estereótipo tem, pois, muito desse molde rígido que permite a repetição. A
base da rigidez e de reiteração, os estereótipos acabam parecendo naturais; o seu
objetivo é, na realidade, que não pareçam formas de discurso e sim formas da
realidade. Finalmente, são reducionistas porque transformam uma realidade
complexa em algo simples.
Ainda segundo Ferrés (1998), as representações audiovisuais utilizam o estereótipo
como forma de amenizar a recepção das mensagens, tornando-as mais leves e seguras no
momento da recepção:
tanto nos noticiários como na ficção, o uso de estereótipos ajuda a reduzir a
incerteza. Os estereótipos contribuem para potencializar a sensação de que se tem
controle da realidade, de que esta pode ser conhecida, entendida, explicada,
dominada. [...] A televisão ocupou o destaque, levando mais ao extremo as
simplificações, porque pretende atingir audiências mais vastas. (FERRÉS, 1998, p.
137-138).
O estereótipo construído pela televisão reflete significativamente na vida dos
telespectadores. Cria-se uma falsa sensação de proximidade, de intimidade com a realidade ali
25. 24
representada. A padronização das situações e das pessoas empobrece o cotidiano fazendo as
pessoas reproduzirem aquela informação que recebem. Em matéria divulgada pela RBS TV
de Santa Catarina – afiliada Rede Globo no Estado - (RBS Notícias, março/2010 – ver
ilustração 3), por exemplo, sobre animais abandonados em Florianópolis, o conteúdo
informativo falava sobre o problema do abandono de animais. Porém a matéria tinha o foco
nos animais abandonados como risco para saúde humana (expressão usada pela repórter ao
um minuto e trinta segundos na presente matéria).
Ilustração 3: Repórter fazendo sua passagem e mostrando ao fundo um cachorro que seria de rua e
consequentemente um exemplo de “risco para a saúde humana”
Fonte: Rede Brasil Sul (2010).
Os canais de TV regionais quando abordam este tema caem sempre neste lugar
comum: o problema do abandono de animais é secundário. A televisão tende a reduzir as
informações para que a compreensão seja de maneira mais rápida pelo telespectador. A mídia,
em geral, reflete o que a sociedade acredita. Entretanto, ela delimita um recorte perante aquele
assunto que será abordado. No caso dos animais, por exemplo, nem todos da sociedade
26. 25
acreditam que o abandono é um problema de saúde pública. Porém, o recorte escolhido
delimitou somente este enfoque.
A maioria das matérias veiculadas tende a mostrar o problema, achar um culpado e
uma possível solução. Neste caso específico, os culpados são os animais e a possível solução
é o extermínio. Este mesmo problema poderia ser falado de outra forma abordando, por
exemplo, que o abandono é realizado por pessoas que jogam fora o próprio animal doméstico.
Não só nos noticiários regionais, como nos nacionais, em programas de
entretenimento e novelas os estereótipos estão presentes. Programas como Gugu/Rede
Record, Domingão do Faustão/Rede Globo, Eliana/SBT e Tudo é Possível/Rede Record
frequentemente apresentam quadros que estereotipam os animais tornando-os apenas como
elementos de entretenimento conforme exemplo citado acima. Vale ressaltar, que estes
programas televisivos também exibem (mesmo que não seja de forma rotineira) quadros que
valorizam a adoção de animais, a castração,... como o exibido no domingo, 8 de agosto de
2010, no programa da Eliana/SBT (ver ilustração 4) sobre a importância da castração e a
adoção de animais. Entretanto, estes não deixam de ser um estereótipo, pois tocam na emoção
do telespectador, principalmente nas pessoas apaixonadas por animais.
Ilustração 4: Matérias usam a emoção para atingir os objetivos: maior número de audiência
27. 26
Fonte: Programa Eliana (2010).
Para quem acabou de assistir a série de matérias tem a conclusão de que: existe um
problema (aumento populacional de animais, principalmente em áreas carentes) e aqueles
voluntários são a solução. O conteúdo da mensagem não deixa de ser importante, pelo
contrário, é imprescindível que trabalhos como estes sejam divulgados. O foco destas
matérias está nos finais felizes (com o auxílio da trilha sonora que transmite estas mensagens)
com histórias de animais castrados, animais resgatados, adotados..., mostrando apenas
superficialmente o outro lado. O receptor daquela mensagem já recebe as informações prontas
e com os problemas já solucionados, enquanto, na vida real o problema persiste e talvez não
se resolva de modo tão simples. As escolhas das imagens e da trilha sonora auxiliam nesta
conclusão.
Ferrés (1998) afirma que os estereótipos servem como forma de socialização entre os
membros da sociedade quando realiza esta identificação emocional entre o conteúdo e o
receptor. O telespectador identifica-se com um ou outro personagem dependendo do ponto de
vista que é mostrado. Em geral, os audiovisuais tendem a criar algum tipo de herói,
satisfazendo as necessidades emocionais do espectador.
No espetáculo de televisão, as emoções não servem apenas como entretenimento.
Não existem emoções neutras. Toda emoção é portadora de significação. Em alguns
casos, a significação é intencional. Em outros, é involuntária. Mas explícita ou
implícita, manifesta ou latente, a significação está ali. A utilização da via emotiva no
espetáculo cinematográfico ou televisivo cumpre, pois, uma dupla função: a
liberação catártica e a partir dela, a transferência ideológica. (FERRÉS, 1998, p.
151).
O termo catarse tem sua origem com Aristóteles. Desenvolvido para explicar os
gêneros artísticos da tragédia, os sentimentos de compaixão e temor que provocam um efeito
de purificação ao se chocar com uma tragédia (BILL, 2010).
Fatos de grande repercussão como da morte da menina Isabella Nardoni
mobilizaram a família da vítima, a imprensa e toda sociedade e são exemplos da catarse
televisiva. Mesmo sem o julgamento final da justiça, as informações transmitidas pela mídia
já havia, de certa forma, condenado o pai e a madrasta. Durante semanas após a morte da
criança, os noticiários eram bombardeados com ilustrações explicando detalhadamente o
crime, dados e testemunhas de amigos e familiares dos réus e da mãe da vítima, além das
constantes visitas de curiosos ao local. Estes atos mostram o lado perverso dos homens e a
necessidade de testemunhá-los (BILL, 2010).
Para Bill (2010), a sociedade tem a necessidade de experenciar a tragédia e a
28. 27
consegue através da televisão.
Hoje ela [a tragédia] ultrapassa o campo [...] da ficção, e chega às telas da televisão,
no retrato das tragédias da vida real. O público consome o trágico na TV de maneira
a se sentir aliviado de seu próprio cotidiano e redimido de seus próprios conflitos.
(BILL, 2010, p. 4).
Vale ressaltar que a TV sempre teve seu uso e utilidade discutidos. A forma
espetacular dos conteúdos, as mensagens transmitidas e o estilo trazem a tona o
questionamento da importância deste veículo, assim como comenta Sodré (1984, p. 14, grifo
do autor):
O que é a televisão? Do ponto de vista das necessidades imediatas do mercado
capitalista, o primeiro ponto observável dessa engenhoca tecnológica, capaz de
hipnotizar cotidianamente centenas de milhões de pessoas com imagens cinéticas, é
a sua maior absoluta superfluidade. Realmente, a televisão não surgiu para absorver
a uma <<necessidade>> real de comunicação por imagens. O rádio também não, de
certo modo. Mas a técnica radiofônica propiciou o contato entre regiões distantes,
culturas diversas, fazendo emergir formas comunicacionais que já se impunham
diante da pressão dos descobrimentos e expansões posteriores à Revolução
Industrial. A televisão, ao contrário, não veio atender a nenhuma específica e
preexistente da comunicação social. Surgiu diretamente do meio técnico, como
resultado da crescente autonomia dos bens eletrônicos (mercado) com relação às
reais carências humanas. A televisão é uma técnica, um eletrodoméstico, em busca
de necessidades que a legitimem socialmente.
Não é necessário fazer uma pesquisa para compreender a importância da TV na
sociedade atual. Este “utensílio doméstico” tem servido para usos diversos além de enfeitar os
lares brasileiros. Através da televisão tem o acesso ao mundo sem sair de casa. Entretanto, o
que Sodré (1984) questiona é que a televisão, diferente do jornal e do rádio, surge para suprir
uma necessidade, uma carência dos seres humanos.
Além desta falta de algo a humanidade também possui a necessidade da fantasia. Há
mais de 100 anos as pessoas exercitavam-na lendo livros: romances, livretos de aventuras, de
acordo com Marcondes Filho (1988). Para o autor, as pessoas vivem em dois mundos: o das
obrigações (trabalhar, estudar, cuidar da casa...) e da fantasia. Neste último as pessoas estão
livres e podem realizar os sonhos e desejos. A televisão tem o poder de ocupar este espaço da
fantasia e o faz pontualmente através do fascínio do audiovisual, em que se apresenta um
cotidiano através de imagens em movimento controladas pelo controle-remoto
proporcionando um prazer peculiar de dominação da realidade.
Marcondes Filho (1988, p. 28) critica a maneira como a comunicação é produzida
29. 28
quando industrialmente, pois as fantasias, os sonhos são domesticados e a satisfação desses
desejos é desviada: “em vez de atender, de satisfazer nossos desejos e vontades, só recebemos
dela alguns indícios: o perfume da flor e não a flor [...]. A comunicação industrial nos seduz
com vãs promessas, abandonando-os sem efetivamente nada nos dar”.
A produção industrial da comunicação transforma a necessidade – de estar informado
– em um produto capaz de ser vendido e modificado. Essa produção fica mais massiva no
veículo TV, pois a utilização de imagem vende mais. Como já diz aquela célebre frase: Uma
imagem vale mais do que mil palavras.
2.1.5 As imagens como linguagem na TV
O diferencial da TV, como já foi falado, é a utilização das imagens em movimento.
Os sinais luminosos transmitidos pela telinha têm a capacidade de prender a atenção dos
telespectadores. Todos os dias, milhares de pessoas ligam seus televisores e muitos, sem nem
prestar atenção à programação que vão assistir.
A imagem foi criada para desviar a atenção do ser humano da solidão, de acordo com
Marcondes Filho (1988). As formas de entretenimento (como esportes, diversões, festas,...)
também foram criadas para este objetivo, mas é na imagem que o homem teve mais sucesso.
As obras de arte e a imagem, neste ponto, têm algo em comum: ambas foram concebidas para
congelar e cristalizar o presente negando a degeneração do corpo e da vida.
De acordo com o autor (1988, p. 10), “a imagem é uma das formas mais bem
sucedidas que o homem criou para superar o fato angustiante de que depois do dia de hoje
virá o amanhã, o seguinte, e que sua vida caminha para um fim inevitável”.
Para camuflar este inevitável fim, a imagem estabelece uma ligação entre o homem e
o imaginário, ou seja, entre o real e os sonhos do próprio homem. A vida real transcorre
regularmente, cotidianamente. Já a mente trabalha por melhorias, em mudanças na vida
daquele homem (MARCONDES FILHO, 1988).
Essa relação com a imagem remete a tempos pré-históricos. Ao desenhar os animais
em cavernas, por exemplo, os humanos acreditavam estar dominando aqueles animais e assim
seria mais fácil enfrentá-los. Para Marcondes Filho (1988), este ato refere-se à magia
propiciatória.
O mundo para os homens, nesta época, era uma única realidade. Não havia separação
30. 29
entre o mundo real e o espiritual, entre o visível e o invisível. Dessa forma, o desenho de um
animal morto referia-se à magia: eu o matei no momento que o desenhei morto. No entanto,
cada imagem funcionava para um único ritual: depois aquela pintura era desprezada e quando
os caçadores saiam novamente para caçar desenham novos animais (JANSON; JANSON,
1993).
A representação da imagem foi evoluindo assim como os homens e tomando papéis
diferenciados ao longo da história. No Egito as imagens eram pintadas em tumbas funerárias e
representavam a morte. Na civilização grega eram utilizadas para humanizar as imagens e
representar a sensualidade (MARCONDES FILHO, 1988).
A noção de imagem considerada hoje vem do Renascimento. A profundidade de
campo produz a sensação de estar na própria natureza representada. Já a profundidade é
conseguida através da perspectiva. Esta possui regras de volumes e distâncias que aumentam
a ilusão do que está representado. O Renascimento inovou perante os outros estilos artísticos,
pois introduziu um ponto de fuga central para onde convergem todas as linhas da imagem.
Assim, a arte deste período proporciona a sensação de profundidade e transmite o efeito de
estar diante a uma janela onde se pode ver tudo (ESTEVÃO; GONÇALVES, 2006).
A importância da imagem muda de acordo com a necessidade do período histórico.
Quando surge a fotografia, um novo conceito de análise das imagens é exigido. A foto é a
representação do real. Na verdade, de um recorte que é tido como real. Tanto o cinema como
a televisão utiliza este sentido da imagem, a diferença entre eles e a fotografia é a imagem que
está em constante movimento.
De acordo com Marcondes Filho (1988), a relação que se tem hoje com a fotografia é
uma relação intensiva, pois se pode observar os detalhes, a densidade, todas as informações
contidas ali e assim chegar a outra realidade através do ilustrado. Já com a televisão tem-se
uma relação extensiva. Não há tempo para analisar o que está sendo mostrado, observar os
detalhes, as cenas acontecem de maneira rápida sem que o telespectador tenha tempo de se
prender ao mostrado.
Pela TV as imagens passam rapidamente e não nos detemos nela (sic), não as
exploramos completamente. [...] Então, percebe-se que, enquanto a fotografia o
sujeito escolhe os detalhes que mais o interessam, na televisão eles são escolhidos
para as pessoas, e isso acarreta grandes perdas: o direito de escolha e da livre
concentração, além de serem impostas as cenas que interessam principalmente ao
realizador do programa e ao patrocinador. (MARCONDES FILHO, 1988, p. 13).
Esses recortes escolhidos são os que determinam o rumo que aquele conteúdo
31. 30
televisivo tomará. As imagens na televisão já vêm prontas para serem consumidas pelo
telespectador. Não há tempo para refletir o conteúdo ou os detalhes, a não ser que esta seja a
intenção do produtor. No geral, as imagens são como fast food: já vêm embaladas prontas
para serem deglutidas.
Outro aspecto importante nesta situação é a utilização dos estereótipos. Como
explica Ferrés (1998), os estereótipos são, ao mesmo tempo, verdadeiros e falsos. Verdadeiros
porque utilizam elementos da realidade. Mas também são falsos “porque toda generalização
simplificadora pressupõe uma traição a uma realidade que é, necessariamente, complexa,
contraditória, dual”. (FERRÉS, 1998, p. 136).
Sessenta anos após a transmissão do primeiro programa de TV o veículo ainda é
objeto para muitos estudos. Tilburg (1990) estudou o porquê das pessoas serem
telespectadores assíduos. Após um árduo dia, o trabalhador encontra no televisor a diversão
mais adequada para o seu estado físico e psicológico.
A atração pela imagem, seja em cores seja em preto e branco, exerce uma influência
proporcional a um nível de abstração que é resultado tanto da natureza do trabalho
exercido quanto de hábitos e atitudes adquiridos por ocasião da educação na família
e na escola. (TILBURG, 1990, p. 61).
Para receber a imagem televisiva não é exigido nenhum esforço do telespectador. As
imagens já entregam a informação completa sem que o telespectador precise de tempo para
processar. Exemplo disso são os telejornais. A rapidez com que as notícias são transmitidas
muitas vezes faz questionar ao fim do noticiário quais informações acabaram de ser
transmitidas. De acordo com Tilburg (1990, p. 91), “70% das informações do Jornal Nacional
não são absorvidas, exatamente em virtude do ritmo acelerado na edição, que impede o
aprofundamento das notícias transmitidas”.
Já no caso das telenovelas, através das histórias o público se sente mais íntimo dos
personagens, ou seja, intimidade com o que está sendo transmitido. A fusão entre o real e o
simbólico se confunde, segundo Tilburg (1990, p. 94),
[...]criando uma realidade com características próprias que pouco tem (sic) a ver
com o dia de trabalho monótono, repressivo e exaustivo, o que permite liberar os
desejos e a agressão - causada pelo mundo de trabalho – mediante os mecanismos
mais variados e extremamente complexos de identificação.
Seguindo essa mesma linha de raciocínio, Arbex (1995) afirma que para fugir dos
problemas da realidade as pessoas eliminam o limite que existe entre a ficção e o real. “[...] A
32. 31
televisão seria, nessa perspectiva, o „ópio do povo‟, uma droga anestesiante, uma quebra
lúdica que tornaria suportável o cotidiano do trabalho, dos chefes neuróticos e opressivos, dos
impostos, das obrigações, das dívidas, do desamor”. (ARBEX, 1995, p. 23).
Diversos são os críticos deste meio. As definições apresentadas neste tópico servem
para ilustram como alguns pensam a TV. No entanto, o meio não pode ser julgado somente
como um veículo ruim já que os insatisfeitos podem se ver livre da televisão desligando o
aparelho.
2.1.6 A televisão e seus gêneros
Neste estudo serão apresentados os programas das categorias de entretenimento e
informativos. No entanto, existem diversas categorias e sucessivamente diferentes gêneros e
formatos. Antes de falar de gêneros é necessário compreender a diferença entre estas três
classificações.
Estas denominações seguem uma ordem. Primeiramente vem a categoria. Esta segue
os princípios da lógica de Aristóteles. É só lembrar como os reinos animais, vegetais,
humanos são divididos. Assim, os programas televisivos podem ser divididos basicamente em
três categorias: entretenimento, informativos e educativos (ARONCHI, 2006). No entanto,
somente os programas de caráter educativo não serão apresentados neste estudo.
Os gêneros são reunidos a partir de características semelhantes. Na categoria
entretenimento, por exemplo, existem diferentes gêneros como de auditório, esporte,
novelas... (ver ilustração 5). Já os formatos (ver ilustração 6) ajudam a definir e a identificar
os gêneros e podem aparecer de diversas formas criando novos programas (ARONCHI,
2006).
34. 33
Ilustração 6: As diferenças e semelhanças entre gênero e formato
Fonte: Aronchi (2006, p. 8).
Dessa forma, pode-se concluir que o “formato está sempre associado a um gênero,
assim como gênero está diretamente ligado a uma categoria”. (ARONCHI, 2006, p. 9, grifo
do autor).
Estas classificações seguem a ótica das emissoras de televisão. De acordo com o
manual de programas desenvolvido pela British Broadcasting Corporation, da rede BBC da
Inglaterra os programas podem ser informativo ou educativo, mas devem sempre entreter
(ARONCHI, 2006).
Segundo Aronchi (2006), a televisão é uma indústria e seus produtos são os
35. 34
programas. Para vender estes produtos é necessário agradar os anunciantes. Já estes preferem
não investir em programas que fogem do convencional. Ou seja, a programação 2 da televisão
é montada com base nos programas que agradarão aos anunciantes e não aos consumidores.
A identificação dos gêneros televisivos, ao contrário do cinema e da fotografia, é
mais complexa já que há uma hibridação entre eles. Pode-se observar, por exemplo, haver
informação em programas de entretenimento. No entanto, estes gêneros possuem um padrão,
de certa forma estáveis caracterizando o espetáculo televisivo (COSTA, 2005).
Os conceitos de categoria, gêneros e formatos auxiliarão no entendimento dos
tópicos que seguem sobre os programas de gêneros de entretenimento e informativos.
2.1.6.1 Os gêneros baseados no entretenimento
Como já mencionado antes, os programas independentes de qual categoria pertençam
devem sempre entreter o telespectador. No entanto, vale ressaltar que mesmo os programas da
categoria de entretenimento também possuem caráter informativo como mostrar problemas
sociais nas novelas, por exemplo. Ao mesmo tempo em que o telespectador se diverte também
é bombardeado com as informações que são transmitidas de forma codificada ou não. Antes
de aprofundar na categoria informativa, é necessário compreender quais gêneros e quais as
diferenças da categoria entretenimento quanto às outras.
Existem diversos gêneros baseados no entretenimento, mas aqui serão apresentados
os de interesse deste estudo que são: Auditório e Variedades, Novelas e Talkshow.
2.1.6.1.1 Programas de Auditório e Variedades
Este gênero tem origem, como abordado anteriormente, no estilo circense. O formato
2
De acordo com Aronchi (2006, p.10-11), “programação é o conjunto de programas transmitidos por uma rede
de televisão. O principal elemento para a programação é o horário de transmissão de cada programa. A economia
é imprescindível hoje em dia para entender o funcionamento da televisão, desde a produção de programas até as
estratégias de programação e de marketing. Atualmente, as emissoras comerciais baseiam-se nos dados de
audiência para decidirem pela programação de um gênero em determinado horário. O principal fornecedor
dessas informações é o IBOPE (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), que trabalha com pesquisa
de mercado. O IBOPE estima o número de aparelhos de TV ligados em um canal no mesmo horário”.
36. 35
do programa com os quadros divididos em brincadeiras, música, participação do público...,
traz mais proximidade ao telespectador e para o público que está no local. Aronchi (2006, p.
18) afirma que “os programas de auditório prendem a atenção do público e do telespectador
pela variedade das atrações apresentadas num só programa, aproximando-se da mesma
linguagem utilizada pelo circo”.
Marcondes Filho (1988) afirma que os programas de auditório têm origem no circo.
Este teve sua decadência com a era industrial e quase desapareceu com o surgimento e
aperfeiçoamento dos meios de comunicação. Mais tarde, a TV absorveu caractérísticas
básicas circences: o entretenimento e a diversão. “O termo „circo‟ vem do latim circu (círculo)
e designa o local onde se realizavam os jogos públicos. Já no período moderno, a palavra
circo adquiriu a conotação de ser itinerante e oferecer espetáculos em troca de pagamentos de
ingresso, como nos dias atuais”. (MARCONDES FILHO, 1988, p. 68).
O clássico programa do Chacrinha, em que o próprio apresentador fazia parte
daquele grande circo com suas roupas de palhaço, é um ótimo exemplo da herança circense.
Desde os primeiros programas aos atuais, o que faz as emissoras levar o público ao estúdio é
o controle da plateia. Devido à dinâmica (contando com apresentações musicais, danças,
brincadeiras, reportagens,...), o auditório também faz parte do programa (ARONCHI, 2006).
Programas como os que Sílvio Santos apresenta no SBT também são clássicos
exemplos. O apresentador utiliza o diálogo como forma de deixar os participantes dos quadros
mais descontraídos (ver ilustração 7).
Além disso,
as tomadas de câmera, combinadas com a sonoridade, dotam as cenas de um ritmo
acelerado. Esse gênero de programa, então, organizado espacialmente em torno de
um palco, sempre oferencendo prêmios, através de jogos, sorteios, ou atrações
variadas, dá-se a ver como uma grandiosa encenação. Nessa cena circense e popular
não é possível ficar triste ou parado, pois o clima de festa, show e empolgação
colabora para a tematização da alegria. (SOUSA, 2009, p. 46).
37. 36
Ilustração 7: Sílvio Santos, no seu programa dominical de 10 de outubro de 2010, momentos antes de revelar as
garotas quem havia ganhado a brincadeira
Fonte: Sistema Brasileiro de Televisão (2010).
Os programas de auditório tiveram seu auge na década de 60. A inauguração de
novas redes de TVs e o crescente número de novos programas de auditório tornaram este
gênero mais apelativos. Concursos com as pessoas mais gordas, os mais magros passam a
dominar o horário nobre e a render grandes audiências. O que importa, neste período, é
comunicar não interessando se isso se realiza de maneira boa ou ruim, sensacionalista ou não
(MIRA, 1995).
No início da década de 70, diversos programas utilizam o estilo sensacionalista para
ganhar audiência, empobrecendo a produção de programas com conteúdos. Após diversos
incidentes, os programas começam a mudar o estilo grotesco na TV e os programas de
auditório começaram a ser gravado para evitar qualquer imprevisto que pudesse complicar a
emissora mais tarde (MIRA, 1995).
Para melhorar a imagem destes programas, atualmente, as emissoras de televisão
têm repaginado os programas de auditório, chamando-os de Variedades. Essa mudança no
nome do gênero deve-se à versatilidade que estes programas comportam recebendo desde
reportagens a apresentações musicais. Porém, essa atitude é uma forma de mudar alterando
sua imagem de programa popular (ARONCHI, 2006).
38. 37
Aronchi (2006) questiona que os novos programas de Variedades aplicam o uso do
bizarro e do grotesco nos seus quadros. Programas que exibem crimes, exploração da dor dos
outros, brigas..., são exemplos. Além disso, “são os programas de auditório pós-modernos na
TV que promovem uma guerra de audiência com prejuízo para o telespectador que vê, ri,
chora e se espanta com tudo o que é apresentado”. (ARONCHI, 2006, p. 19).
Programas como O Melhor do Brasil, da Rede Record (ainda no ar) que tem como
apresentador Rodrigo Faro, é um exemplo. Não há muitos resquícios dos programas de
apresentados por Chacrinha, mas mesmo assim mantém as características básicas de um
programa de auditório com os quadros, as danças, a participação do público. Vale ressaltar
que este é chamado de programa de Variedades, e não mais de auditório.
Assim como os programas de auditório e Variedades ainda fazem sucesso, outro
gênero que é adorado pelo público é a novela, tópico que será mostrado a seguir.
2.1.6.1.2 Novelas
A TV em seu início utilizou dos recursos e da mão de obra do rádio. O que se tinha
conhecimento, no início da década de 50 com relação a televisão era insuficente para produzir
uma boa programação sem utilizar dos recursos radiofônicos. Assim, as novelas também têm
origem no rádio. Tanto os profissionais quanto o estilo de narrativa veio do rádio.
A primeira novela transmitida foi Sua Vida Me Pertence em 1951 transmitida pela
TV Tupi. Seu modelo ainda era baseado em teleteatros e a trama se desenrola em capítulos,
como hoje. Porém, as narrativas eram ao vivo, possuiam cerca de 15 capítulos e eram
transmitidas duas vezes por semana. O gênero caiu no gosto do povo brasileiro que começou
a pedir telenovelas diárias (ver ilustração 8). Assim, a primeira novela diária, chamada de 2-
5499 Ocupado, foi criada em 1963 pela TV Excelsior (ANKERKRONE, 2001).
39. 38
Ilustração 8: O casal Glória Menezes e Tarcísio Meira na gravação da primeira novela diária brasileira
Fonte: E foram... (2009).
As novelas brasileiras ganharam destaque no Brasil e no mundo. Tanto que diversas
telenovelas foram exportadas para outros países. Segundo Matterlart e Matterlart (1998,
p.111), a popularidade das novelas se mede
[...] pelo espaço que ocupam nas conversas e debates de todos os dias, pelos boatos
que alimentam, por seu poder de catalisar uma discussão nacional, não somente em
torno dos meandros da intriga, mas também acerca das questões sociais. A novela é
de certa forma a caixa de ressonância de um debate público que ultrapassa.
Diversas vezes já foram noticiados casos de atores e atrizes que apanharam por causa
dos personagens que interpretavam. Há telespectadores que se envolvem de tal maneira com a
trama daquela novela que não separam o real da ficção. Parte do público que assiste as
novelas sabe diferenciar que o que está sendo transmitido é uma ficção. No entanto, ao
mesmo tempo que a novela é ficção, o gênero também transmite mensagens sociais, ou seja,
informa. Como os efeitos do uso das drogas que foi destaque na novela O Clone (2001-2002,
Rede Globo) com a interpretação de Déborah Fallabela no papel de Mel uma garota viciada
em drogas.
No caso dos animais utilizados tanto em seriados, séries ou em novelas eles são
40. 39
apresentados como um personagem. Os bichos são treinados para fazer parte daquela história.
Entretanto, o telespectador o vê como mais um personagem sem avaliar o que foi feito para
aquela cena ser realizada. Ao contrário dos homens, os animais não têm livre escolha para
decidir se querem ou não. Ser personagem de um audiovisual depende de escolha e isso os
animais não possuem.
Para Martín Barbero (1997 apud FERREIRA, 2005), o gênero novela é um dos
principais produtos da cultura popular não só no Brasil, mas também em toda América Latina.
Devido à forte influência, os telespectadores mudam seus comportamentos e hábitos de
consumo adotando outras formas para se assemelhar aos transmitidos pela novela. As
telenovelas rompem a ligação como gênero somente fictício quando alteram o comportamento
do público. A televisão tem o poder de influenciar as pessoas. Vale ressaltar, no entanto, que
os telespectadores não são como uma folha em branco e não recebem todos os estímulos de
forma homogênea. A partir das características daquele espectador, da carga emotiva e da sua
herança cultural é que o telespectador vai decodificar aqueles estímulos. Ou seja, cada pessoa
interpreta o estímulo de acordo com suas heranças (culturais, emocionais...,).
As tramas atingem diversos públicos de diferentes classes sociais. Isso ocorre, pois
ao escrever uma novela o autor busca construir histórias de personagens que se identifiquem
com o público. Para isso, também são criados diversos personagens que mostram diversas
classes sociais, diferentes idades,... para atrair os telespectadores. No entanto, a audiência em
diversos casos é que decide o rumo que aquele personagem terá na trama (FERREIRA, 2005).
As novelas expoêm os telespectadores a mundos e situações vivenciados no dia-
adia, o que faz com que eles sintam-se familiarizados com o universo visto nas
novelas e ao mesmo tempo usa de sentimentos aprendidos nas relações sociais. É
nesse sentido que as telenovelas são consideradas como histórias verdadeiras e
realistas, na medida que tratam de sentimentos humanos, que alguns telespectadores
julgam universais. (FERREIRA, 2005, p. 20).
O modelo industrial das novelas é característica da TV. Percebe-se este modelo ao
analisar a formatação dos cenários, a escolha dos mesmos atores, dos mesmos figurinos para
elaborar uma novela (MACHADO, 2001).
A necessidade de alimentar com material audiovisual uma programação ininterrupta
teria exigido da televisão a adoção de modelos de produção em larga escala [...] o
programa da televisão é concebido como um sintagma padrão que repete o seu
modelo básico ao longo de um certo tempo, com variações maiores ou menores.
(MACHADO, 2001, p. 88).
41. 40
Vale ressaltar também que este padrão das novelas consegue prender o público, pois
ao final de cada episódio, há uma ligação para que o telespectador fique esperando o próximo.
Um dos gêneros mais rentáveis da TV, a novela é um dos gêneros que consegue juntar ficção,
informação e entretenimento sem tornar a trama cansativa.
2.1.6.1.3 Talk Shows
Existe uma discussão quanto a este gênero, se ele pertence ao informativo ou ao
entretenimento. Analisando o modelo de talk shows que se tem no Brasil, que é o estudado, os
programas misturam informação, música, humor, debates, entrevistas,... Novamente há uma
hibridação dos formatos. Claro, como já mencionado anteriormente, os gêneros têm a missão
de entreter, mas também informam. O gênero talk show está na categoria de entretenimento
devido a sua diversidade na composição.
Este gênero valoriza a presença do apresentador que precisa comandar o programa
independendo do conteúdo e do entrevistado. O programa pode contar com mais de um
convidado. Além disso, é comum contar com auditório para aumentar o clima de descontração
(ARONCHI, 2006).
Este gênero começa a ter destaque a partir da década de 1980 no Brasil e tem origem
com o modelo americano. Na década de 1950 o gênero nasce nos Estados Unidos que o
utilizam em três momentos do dia: no período matutino os talk shows se dedicam às notícias;
à tarde, programas de debates com ênfase no aconselhamento; e no período noturno dão
ênfase aos programas de humor e entrevistas com celebridades (TIMBERG, 2004 apud
SILVA, 2009).
Mas no Brasil, em 1980, o gênero surgiu após a consolidação do gênero de
entrevistas no país. O primeiro talk show brasileiro foi exibido em 1988 pelo SBT: Jô Soares
onze e meia (ver ilustração 9). Embora o foco fossem as informações, principalmente
política, o programa apresentava uma pitada de humor. O programa mudou os formatos
existentes que tinham foco somente na informação trazendo entretenimento e humor ao
gênero (SILVA, 2009).
42. 41
Ilustração 9: Jô Soares entrevistando Maurício Sita que foi ao programa no dia 14 de outubro de 2010 lançar um
livro
Fonte: Jornalista... (2010).
Jô Soares já trabalhou com humor, dirigiu peças de teatro, escreveu livros,... Hoje
apresenta o Programa do Jô, na Rede Globo. O programa traz atrações musicais, de humor,
entrevistas, a particação da banda do programa e do auditório. O que se nota, como é de se
esperar dos programas de talk shows, é a presença constante de Jô Soares. Muitas vezes, o
entrevistado precisa disputar espaço para falar.
2.1.6.2 Os gêneros baseados na informação
Os gêneros desta categoria possuem em comum o caráter jornalístico de informar.
No mesmo caso que os programas da categoria de entretenimento, estes gêneros não só
informam, mas também entretem. Esta diversão ocorre de maneira diferente da outra
categoria, já que é necessário se adequar aos moldes informativos. O objetivo das categorias
43. 42
entretenimento e informativo é o mesmo: prender a atenção do telespectador gerando
audiência e consequentemente aumentando os lucros da emissora. Podem citar-se os gêneros
programas de entrevistas, debates, documentário e telejornalismo nesta categoria. No entanto,
será apresentado de forma mais detalhada os gêneros documentário e telejornalismo que serão
o objeto da análise realizada mais adiante.
O gênero entrevista é muito utilizado na categoria de entretenimento, principalmente
no gênero talk show. A grande diferença entre estes dois gêneros é o objetivo: enquanto a
entrevista tem o foco no jornalismo, o talk show pretende divertir. Nos programas de talk
show o apresentador é o destaque, já nas entrevistas o foco é o entrevistado (ARONCHI,
2006).
Os programas de debate não exigem grandes investimentos das emissoras e podem
ser realizados também para preencher espaços vazios na grade da programação. Ao contrário
da entrevista, o debate é criado pelo número de participantes. O programa pode contar com
mais de um apresentador que também pode atuar como comentarista, assim como os
convidados. A escolha do assunto e dos participantes varia de acordo com a emissora. Estes
programas também podem contar com pequenas reportagens que servem para ilustrar
(ARONCHI, 2006).
Como serão expostos a seguir, ao contrário dos programas de debates e entrevistas,
os gêneros documentário e telejornalismo são mais versáteis e podem utilizar dos recursos
deste últimos para implementar ainda mais o conteúdo.
2.1.6.2.1 Documentário
Os documentários possuem papel importante na área de jornalismo das emissoras.
Redes de TVs pequenas geralmente importam este gênero de outras emissoras. A BBC é um
exemplo de rede que fabrica e vende documentários. No entanto, não só emissoras pequenas
compram estes programas. O capital de redes como a BBC é muito maior para fabricar
documentários com ótima qualidade e conteúdo.
Este gênero aborda temas que possuem importância histórica, social, política,.. e
também aprofundam assuntos do dia a dia. O documentário teve raízes no cinema durante a
Segunda Guerra Mundial. Neste período, o gênero tinha o objetivo de informar e de divulgar
as ideologias (ARONCHI, 2006).
44. 43
O primeiro documentário foi filmado pelo americano Robert Flaherty, no norte do
Canadá de 1912 a 1919. O documentarista acompanhou uma família de esquimós neste
período e lançou, em 1922, o filme Nanouk, o esquimó (ZANDONADE; FAGUNDES, 2003).
De acordo com Penna (apud ZANDONADE; FAGUNDES, 2003), Robert construiu um novo
estilo de representar a realidade ao pedir aos membros da família para interpretar as próprias
atividades diárias.
Para Zandonade e Fagundes (2003), o documentário pode ser dividido em dois
modelos: clássico e moderno. O primeiro “era utilizado no início século 20, com a escola
britânica de John Grierson, baseada em ilustrações e narrações construídas com finalidades,
na maioria das vezes, institucionais”. (ZANDONADE; FAGUNDES, 2003, p. 12).
O moderno começou a ser utilizado no Brasil3 a partir da década de 1960 e “busca
uma interação com o público alvo, de modo a lhes despertar o senso crítico e permitir
interpretações variadas, de acordo com a realidade de cada espectador”. (ZANDONADE;
FAGUNDES, 2003, p. 12).
Vale ressaltar, que os documentários não mostram a realidade, mas apenas um olhar
sobre ela. A partir desse recorte, os telespectadores receberão as informações e interpretarão
de acordo com sua herança cultural. Assim, o modelo moderno, que é utilizado atualmente,
conquistou novos espectadores devido a sua proximidade com o público ao interagir com este.
O formato do documentário possibilitou a divulgação de uma visão do mundo de outras
culturas, outros povos. De acordo com Aronchi (2006), o gênero busca a seriedade com o
máximo de informações daquele conteúdo e utiliza técnicas com captura de imagens em
diversos locais e entrevistas. No entanto, o autor questiona que as atuais emissoras brasileiras
reduziram o tempo de duração destes programas, devido ao apelo mercadológico,
transformando o conteúdo em meras reportagens.
Os documentários podem contar com diversos formatos que auxiliam na produção do
programa. Pode-se citar os formatos entrevistas, debates e narração em off. Segundo Aronchi
(2006), a utilização destes visa deixar o documentário mais leve e mais fácil de ser
compreendido.
Exemplos de produção de documentário é o caso do Globo Repórter (Rede Globo),
Câmera Record (Rede Record) e SBT Repórter (SBT). Os programas possuem duração de
cerca de uma hora e abordaram diversos assuntos. Estas emissoras possuem produção própria,
3
A história do documentário Brasil no Brasil pode ser conferida na monografia: O vídeo documentário como
instrumento de mobilização social (2003) de Vanessa Zandonade e Maria Cristina de Jesus Fagundes. Disponível
em: http://www.bocc.uff.br/pag/zandonade-vanessa-video-documentario.pdf.
45. 44
mas também transmitem documentários comprados de redes estrangeiras.
O Globo Repórter (Rede Globo), por exemplo, começou a ser exibido em 3 de abril
de 1973 (ver ilustração 10). De acordo com o site oficial do programa (2010), sobre a
primeira edição, “o programa se destinava a analisar com mais profundidade os principais
acontecimentos jornalísticos nacionais e internacionais do mês, que, por uma questão de
tempo, não podiam ser detalhados nos telejornais”.
Ilustração 10: Comparação entre as duas aberturas do Programa
Fonte: Adaptado de Conheça... (1973) e Globo... (2010a).
O Globo Repórter foi considerado como um dos melhores do gênero. No entanto, o
programa tem perdido espaço devido às restrições que a emissora impõe. Segundo Brasil
(2002 apud ZANDONADE; FAGUNDES, 2003, p. 33),
o projeto pioneiro do Globo Repórter sobreviveu à ditadura, mas não sobreviveu ao
peso da sua própria história de sucesso, criatividade e inovação. (...) Passou a ser um
programa com reportagens longas sobre temas óbvios e abandonou definitivamente
a experimentação de novas linguagens audiovisuais. (...) Os temas passaram a
privilegiar, com raras exceções, a vida dos animais estranhos e o turismo em locais
exóticos, e programas burocráticos e pouco criativos. Os temas sociais e as
denúncias de um jornalismo mais investigativo e impessoal, características
fundamentais do gênero documental foram substituídos pela produção institucional
tímida e bem comportada.
O programa exibido pela Rede Globo é só um exemplo do que outras emissoras
também estão passando quanto à produção e a manutenção deste gênero no ar. Para
Sacramento (2008, p. 14), para ser feita uma análise do gênero, é necessário compreender
alguns aspectos: “a construção ideológica da narrativa; as condições de produção; as relações
com o cenário midiático e o contexto sociocultural e político”.
O autor ainda afirma que esta distinção não contempla todo o processo, mas auxilia
na identificação. Na construção ideológica da narrativa deve-se observar como é
apresentado e construído desde a produção, na captura de imagens, até na finalização, como a
46. 45
escolha do melhor depoimento de uma fonte. A produção do conteúdo tem de estar de acordo
com a visão dos autores, produtores e diretores daquela emissora (SACRAMENTO, 2008).
Nas condições de produção, de acordo com Sacramento (2008), não se pode
esquecer do período histórico em que o documentário foi construído. É preciso também
observar as relações que a emissora possui com o Estado bem como com outras instituições.
Conhecer a história do programa onde o documentário foi exibido também é importante. Esta
ação auxilia a compreender o porquê daquele recorte, por exemplo.
As relações com o cenário midiático definem que o documentário deve se localizar
de acordo com o seu gênero no contexto histórico em que está situado. Um documentário que
será transmitido num programa que apresenta conteúdos sobre o mundo animal, por exemplo,
deverá seguir aquela linha a que se filia e do programa de que fez parte num determinando
contexto (SACRAMENTO, 2008). Além disso,
devem ser percebidas quais são as aproximações e os distanciamentos de uma obra
em particular com o coletivo de que ela faz parte. Deve também ser notado ainda
como o documentário para a televisão se relaciona com outros textos da cultura da
mídia – filmes, reportagens televisivas, matérias na imprensa do conjunto da época
em que foi produzido. Também se deve tratar do efeito provocado pelo programa e
dos significados e dos valores que são a eles relacionados. Artigos e reportagens em
jornais e revistas ou até mesmo comentário feitos na própria televisão em relação ao
documentário também devem ser incorporados à análise. As diversas formas de
recepção ajudam a materializar o terreno de lutas em que o programa se
circunscreve. (SACRAMENTO, 2008, p. 15-16).
Outro fator a ser analisado é o contexto sociocultural e político. Este ajuda a
identificar qual o momento histórico em que o documentário está situado, além de analisar a
posição das fontes utilizadas no conteúdo. Para Sacramento (2008, p. 16), “é preciso mostrar
como ela [a situação política] se materializa, de algum modo, em obras concretas assim como
perceber como se relacionaram os sujeitos envolvidos com o processo, e as múltiplas pressões
a que estavam submetidos no cotidiano de planejamento e realização da obra”.
Estes aspectos são exemplos de como a posição ideológica, tanto das emissoras
quanto dos produtores, influenciam na produção de um documentário. Entendê-los ajudará na
análise que será feita mais adiante.
47. 46
2.1.6.2.2 Telejornalismo
Os telejornais têm um papel fundamental na vida dos brasileiros: trazem as principais
informações do dia em poucos minutos. Não importa a natureza das notícias - regionais,
locais ou mundiais - estas informações chegam aos telespectadores de forma sintética e
resumida para quem assiste possa receber aquele conteúdo de maneira mais simples. A
própria seleção das principais informações do dia já é um fato questionável. As notícias
consideradas as mais importantes são interessantes a todos os telespectadores? Novamente
entra a questão do uso do estereótipo. Um modelo de telespectador é utilizado pelas emissoras
para, assim, ter um destinatário para aqueles conteúdos.
As informações são noticiadas em forma de espetáculo (mais uma vez o circo)
transformando os conteúdos em shows para serem vendidos. Independente do assunto que a
TV aborde, seja um movimento social ou uma informação sobre saúde, ela descaracterizará as
notícias transformando-as em informações neutras. Tanto na produção quanto na apresentação
no estúdio, as notícias perdem o caráter crítico (MARCONDES FILHO, 1988).
O telejornalismo, assim como outros produtos da TV, deve dar lucro às emissoras.
Mesmo num gênero informativo (jornalístico), o que mais chama a atenção do público, e
consequentemente gera maior audiência, é a fantasia. Dessa forma, o que rende mais
telespectadores é um telejornal que está mais longe da realidade e mais próximo da ficção
(MARCONDES FILHO, 1988).
A anarquia do telejornal não ocorre logo na primeira página, como no caso do jornal
impresso, mas na apresentação de suas pequenas manchetes – chamadas – que se
anunciam durante o noticiário. É uma miscilância de diversos assuntos, apresentados
um após o outro, sem que o telespectador tenha tempo de pensar e refletir sobre cada
um deles. Mal são transmitidos já vem outra notícia, completamente diferente, que
distrai outra vez o receptor, e assim até o final. Ninguém se informa seriamente de
nada; só se tem a impressão de ficar informado. (MARCONDES FILHO, 1988, p.
54, grifo do autor).
Devido ao curto tempo para informar as notícias, o telejornalismo se utiliza muito de
duas formas de produção: a fragmentação e a personalização. Na fragmentação é analisado
o contexto geral do conteúdo e escolhido um recorte específico, um fragmento daquela
informação. A partir deste fragmento, constrói-se a notícia. Como afirma Marcondes Filho
(1988), a fragmentação no jornalismo nada mais é que expor um recorte da realidade, pois ao
realizar tal ação outras informações, muitas vezes importantes para compreender o contexto,
48. 47
são excluídas.
Já a personalização é quando se coloca a responsabilidade de um acontecimento em
uma pessoa (líder de movimento, religioso,...) “[...] quando, na verdade, ele é um produto de
um conjunto maior, de uma instituição ou mesmo de toda a sociedade”. (MARCONDES
FILHO, 1988, p. 54-55).
Ainda segundo Marcondes Filho (1988), o telejornal utiliza expressões e recursos
técnicos para alterar ainda mais o caráter de realidade das notícias. Isso ocorre quando se usa
os termos fontes bem-informadas ao invés de informar quem é a fonte. Ou quando usa
expressões que deixam o informante ou o produtor daquela informação oculto: foi aprovado
(quem aprovou?),... Clóvis Rossi (apud MARCONDES FILHO, 1988) afirma que esses
recursos são formas de padronização tanto dos profissionais que trabalham na emissora
quanto de quem recebe as informações.
A história do telejornalismo no Brasil começa na década de 1950 com o advento da
televisão no país. Assim como a televisão, de forma geral, teve seus programas e profissionais
vindos do rádio, no telejornalismo não foi diferente. O primeiro telejornal foi o Repórter
Esso. Esse programa era patrocinado pela empresa Esso, como já abordado anteriormente
(ARONCHI, 2006).
As emissoras no país investem pesado na área jornalística. O gênero telejornalismo
tem destaque e grandes investimentos nas maiores emissoras do Brasil. Esse investimento é
de fácil percepção devido à qualidade dos programas exibidos. Para Gontijo Teodoro (apud
ARONCHI, 2006, p. 29, grifo do autor), que já foi apresentador do Repórter Esso e diretor de
telejornalismo da TV Tupi do Rio de Janeiro, os objetivos do telejornal são: “de informar,
educar, servir, interpretar e entreter”.
Para Machado (2001), um dos principais erros é identificar os telejornais como
gênero que tem o objetivo de informar. Não é um pressuposto errado já que grande parte dos
telespectadores assiste aos programas sem se preocupar com o conteúdo e dessa mesma forma
vêem os telejornais para manterem-se “informados”. No entanto, o autor questiona que as
montagens dos discursos exibidos pelo telejornal acabam se confrontando. Ao recortar e
encaixar depoimentos diferentes no mesmo contexto, o telejornalismo não consegue construir
um discurso unitário. Diferentes enunciados são colocados num noticiário e entregues ao
público de forma não processada fazendo os telespectadores ordenarem aquelas informações.
Vale ressaltar que o telejornalismo brasileiro teve influência do modelo norte-
americano. Os formatos que se tem hoje também foi influenciado pela tv americana.
Atualmente, os formatos podem ser divididos em: “nota, notícia, reportagem, entrevista,