1) O documento discute o conceito de instrumento financeiro e fornece definições de autores como Almeida e Antunes.
2) Instrumentos financeiros podem ser classificados como complexos ou não complexos dependendo de fatores como risco e facilidade de determinar rendibilidade.
3) Existem requisitos mínimos de informação e adequação para todos os instrumentos financeiros de acordo com a lei.
1. 1. Conceito de Instrumento Financeiro
Antes de mais, devemos notar, sobre esta matéria, alguma flutuação terminológica,
embora deva dizer-se que as expressões «instrumento financeiro», «produto
financeiro» e “activo financeiro» devem ser, em princípio, sinónimas, sendo criticável
tal diversidade terminológica. Tal sinonímia, porém, pode levantar dificuldades em
alguns casos, devendo sempre atender-se aos concretos regimes jurídicos
consagrados.
O CVM não nos dá uma noção de instrumento financeiro, apresentando-nos antes
uma enumeração de que poderá extrair-se um conceito.
Uma noção geral é-nos dada pelo RGICSF, art. 199-A/3º: «Instrumentos financeiros:
qualquer contrato que dê origem, simultaneamente, a um activo financeiro de uma
parte e a um passivo financeiro ou instrumento de capital de outra parte, incluindo, no
mínimo, os instrumentos referidos na secção C do Anexo I da Directiva nº 2004/39/CE,
do Parlamento europeu e do Conselho, de 21 de Abril.»
Também alguma doutrina se tem preocupado em formular um conceito de instrumento
financeiro.
O professor Carlos Ferreira de ALMEIDA, dá a seguinte noção, [2007, 148]:
“Instrumentos financeiros são documentos e contratos financeiros lato sensu,
isto é, destinados ao financiamento a qualquer prazo ou relacionados com o
financiamento a qualquer prazo.”
Mais recentemente, o professor Engrácia Antunes [2009, 8] avança com o
seguinte conceito: “Designam-se genericamente por instrumentos financeiros
(...) um conjunto de instrumentos juscomerciais heterogéneos susceptíveis de
criação e/ou negociação no mercado de capitais, que têm por finalidade
primordial o financiamento e/ou a cobertura do risco da actividade económica
das empresas”.
2. Elementos Mínimos de um IF
Poderemos dizer que o conceito de IF deve responder pelo menos aos seguintes
elementos mínimos:
i. são posições jurídicas, em regra resultantes de um contrato [de facto a regra
é que haja um contrato, embora possa haver IF’s em que a existência de um
contrato pode não ser tão imediata, mas mais longínqua, por exemplos nos
direitos inerentes que são valores mobiliários];
ii. de natureza patrimonial [esta característica resulta da natureza comercial e
onerosa dos instrumentos em causa];
iii. que incorporam uma álea significativa, envolvendo sempre um risco mais ou
menos elevado [que pode variar até casos de álea total, em contratos que
podem ser qualficados comop jogo e aposta, ainda que permitidos por eli];
iv. e desempenham uma função financeira, seja directa [financiamento da
entidade emitente / investimento-poupança do investidor] ou indirectamente
[cobertura de risco ou especulação].
3. Tipologias de IF
Para uma tipologia de instrumentos financeiros, de acordo com a enumeração legal,
devemos ter em conta:
i. os valores mobiliários incluindo os de natureza monetária (ações, obrigações,
unidades de participação em fundos de investimento(UP's), títulos de
participação (TP's), direitos destacados dos valores mobiliários, warrants
autónomos e certificados);
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2. ii. os IF’s derivados (opções, futuros, swaps, contratos a prazo ou outros
relativos a valores mobiliários, divisas, taxas de juro, índices, mercadorias ou
para transferência de risco de crédito);
iii. os IF’s do mercado monetário (instrumentos interbancários, certificados de
aforro, bilhetes de tesouro, papel comercial, obrigações de caixa, certificados
de depósito);
4. Classificação de IF
De acordo com a legislação aplicável (art. 314º-D CVM), os IF’s podem ser
classificados como não complexos e complexos. Especificamente, no 1º alinea a) do
nº1 art. 314-D são especificados os instrumentos financeiros não complexos;
Acrescenta ainda o mesmo artigo alinea a) do nº2: “Para efeitos da alínea a) do
número anterior, um instrumento financeiro é não complexo, desde que: a) Não esteja
abrangido nas alíneas c), e), f) e g) do artigo 1.º e nas alíneas c) a f) do n.º 1 do artigo
2.º”,
Neste sentido, esta alinea a) do nº2 (art. 314º-D CVM) remete-nos para o art. 1º e 2º
do CVM, concretamente são instrumentos financeiros não complexos, aqueles
referênciados no art. 1º e no art. 2º do nº 1 do CVM;
Nas três alineas subsequentes b, c), d) do nº2 do art. 314-D, basta que uma condição
não ocorra para estarmos em presença de um instrumento financeiro complexo.
Assim, só são considerados instrumentos financeiros não complexos se respeitarem
as condições propostas no subsequentes b, c, d) do nº2.
IF Não complexo
Os IF’s não complexos são aqueles em que a rendibilidade e o risco são mais simples
de determinar, apresentando tendencialmente um menor risco. A rendibilidade de um
investimento em IF’s não complexos inclui normalmente a rendibilidade resultante da
evolução dos preços em bolsa (mais ou menos-valias) e a remuneração periódica
(dividendos ou juros).
IF Complexo
Nos IF’s complexos a rendibilidade e o risco são mais difíceis de determinar. Nalguns
casos podem estar ligados ao comportamento de outro instrumento financeiro (o activo
subjacente) de que depende a sua valorização. Os IF’s complexos podem incorporar
direitos de compra ou de venda do activo subjacente a um preço geralmente bastante
inferior ao preço a que este é negociado. Deste modo, as variações do preço do activo
subjacente têm impacto mais acentuado na rendibilidade deste tipo de instrumentos
complexos do que teriam se o investidor aplicasse directamente o mesmo montante no
activo subjacente.
IF’s não complexos IF’s complexos
• Acções negociadas em mercado • Acções não negociadas em mercado
regulamentado; regulamentado;
• Obrigações, que não incorporem • Obrigações que incorporam derivados
derivados (exemplo: obrigações com warrant);
(exemplos: obrigações do tesouro, • Unidades de participação em fundos
obrigações especiais de investimento;
de dívida privada) • Títulos de participação;
• Instrumentos do mercado monetário • Direitos (de subscrição e de
(como por incorporação);
exemplo bilhetes do tesouro e papel • Warrants autónomos
comercial); • Certificados;
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3. • Unidades de participação em • Reverse convertibles
organismos de • Credit linked notes
investimento colectivo em valores • Valores mobiliários obrigatoriamente
mobiliários convertíveis (VMOC);
harmonizados • Futuros;
• Unidades de participação em fundos de • Opções;
investimento imobiliário abertos (*); • Swaps;
• Unidades de participação em FPR/E (*); • Forwards;
• Unidades de participação em PPA (*) •Contratos derivados para a transferência
de risco de crédito;
• Contratos diferenciais (CFD);
• Contratos derivados sobre mercadorias.
As unidades de participação apenas são consideradas instrumentos financeiros não complexos se
respeitarem as seguintes condições: (i) possibilidade de subscrições e resgates diários ou com elevada
frequência; (ii) as responsabilidades (perda máxima) não excederem o custo de aquisição; (iii) existir
informação publicamente disponível para avaliar a oportunidade de investimento; (iv) os limites da política
de investimento do fundo estarem consagrados nos respectivos regimes jurídicos e (vi) a política de
investimento não recorrer ou depender de estratégias de investimento complexas que
impossibilitem um investidor não profissional médio de tomar uma decisão de investimento informada.
Como podemos verificar, a categoria dos IF’s complexos, não pretende criar um novo
tipo de instrumento financeiro, mas reunir sob um regime jurídico comum vários tipos
de IF’s, que se caracterizam pela sua complexidade e elevando risco para os
investidores. Assim, de forma não explícita, a lei tem vindo a consagrar um regime
geral dos IF’s que, mais cedo ou mais tarde, deverá ser explicitamente assumido como
tal. Mas esse regime jurídico geral, embora em boa medida se encontre no CVM,
encontra-se disperso por outros instrumentos jurídicos.
5. Regime jurídico comum aos IF’s
Podemos dizer, embora em termos superficiais, que o regime geral comum a todos os
IF’s, se reconduz aos seguintes elementos mínimos:
i. exigência de informação, aí se incluindo a informação de natureza
publicitária, que obedeça às regras do art. 7º do CVM: verdadeira, clara,
completa, objectiva, actual e lícita;
ii. exigência de informação pelos intermediários financeiros que transaccionem
os instrumentos, variando conforme o instrumento em causa e o tipo de
investidor.
As exigências de informação são particularmente grandes se estivermos perante
instrumentos/produtos financeiros complexos, aí se exigindo a necessidade de
adequação dos produtos aos investidores a quem se destinam.
A reflexão sobre o regime geral aplicável a estes produtos, em particular os que são
qualificados como complexos, exige um aprofundamento dado o crescimento
exponencial a que têm vindo a ser sujeito e à sua complexidade crescente. Nesse
sentido, talvez se exija que o CVM se passe a chamar Código dos Instrumentos
Financeiros (CIF)e coloque como seu objecto primacial os IF’s e não os valores
mobiliários.
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