Análise do desenvolvimento cognitivo de Piaget e suas implicações para o currículo escolar
1.
2.
3. CHAKUR (1981), analisa as defasagens
entre as exigências do currículo e o nível de
desenvolvimento cognitivo das crianças. Seu
referencial teórico é a concepção de
aprendizagem e desenvolvimento cognitivo do
psicólogo suíço Jean Piaget.
Para Piaget, a superação de posições
empiristas e apriorísticas no trato da
problemática da aprendizagem, não se
devem exclusivamente a qualidades
adquiridas nem são unicamente produto de
propriedades inatas do sujeito.
4. Para ela, Piaget possui uma posição
relativista e dialética, por conceber o
conhecimento como resultado da
interação sujeito-objeto, culminando
num dado momento, em operações
dedutivas que não evoluem num sentido
pré-determinado, mas que se
constroem progressivamente.
5. Nesta perspectiva, as estruturas do
conhecimento não são dadas de antemão,
elas se desenvolvem; não se fecham em si
mesmas, mas “concluem-se” ao final de um
longo processo genético, ao mesmo tempo
individual e social, com a conseqüente
“abertura” para o conhecimento científico.
Piaget subordina a aprendizagem ao
desenvolvimento cognitivo que passa por
sucessivos estágios, nas diferentes fases da
vida do indivíduo.
6. As etapas do desenvolvimento cognitivo, são:
1ªetapa] período sensório-motor
percepção e manipulação de objetos
concretos (“esquemas de ação”) –
“classificação prática”;
2ªetapa] operatória-concreta inicia-se
pela função simbólica (“coleções figurais” e
“não-figurais”) e se desenvolve até atingir
as operações concretas (ações
interiorizadas, reversibilidade, operações
aplicáveis a conteúdos diversos);
7. 3ªetapa] pensamento operatório-formal
na adolescência – possibilidade de
“refletir” as operações
independentemente dos objetos e de
substituí-los por proposições
(pensamento formal), ou operações
dedutivas, formação de conceitos.
4ªetapa] Ressalta-se sempre a atividade
do sujeito predominando , em cada
estágio, respectivamente, a atividade
motora, a atividade perceptiva e a
atividade mental.
8. Para Piaget, a aprendizagem envolve
assimilação dos dados da realidade às
estruturas cognitivas do sujeito.
Para CHAKUR, tal visão se contrapõe
tanto à idéia da aprendizagem como
simples reação aos estímulos do meio,
quanto à que a concebe como
comportamento contingente, à mercê
do acaso.
9. Para Piaget, são as noções de
equilibração e acomodação, que face
as transformações ocorridas no meio,
o equilíbrio é atingido mediante a
acomodação, que consiste no reajuste
das estruturas presentes, ou numa
adaptação ao novo conceito
apresentado pela realidade exterior.
10. Tal adaptação se dá num quadro de
interação progressiva de fatores
endógenos e exógenos, e o
desenvolvimento da pensamento,
assim como sua correspondência com
a realidade, dependendo do nível de
desenvolvimento do sujeito no
momento dado.
11. As estruturas cognitivas não são
construídas no vazio. Seus
esquemas assimiladores – os
esquemas de ação - sofrem
determinações tanto do sistema
genético quanto do meio em que
vive o sujeito. Isto é, aos
esquemas de assimilação é inerente
um processo de regulação e auto-
regulação.
12. Os conhecimentos lógicos
constituem o “órgão regulador da
inteligência”. Não são inatos nem
adquiridos, resultam da
coordenação de ações e ligam-se à
atividade espontânea do sujeito,
mais que às propriedades físicas do
objeto; têm portanto, origem na
atividade das ações do sujeito.
13. Com efeito, o desenvolvimento das
funções cognitivas se dá por um
processo de equilibração
progressiva, de estágios
inferiores a superiores.
14. Piaget distingue dois níveis de
abstração:
a empírica (que se dá a partir da
experiência física);
a reflexiva ou formal (com base
na experiência lógico-matemática).
15. Da primeira decorre a aprendizagem
caracterizada pela descoberta de
propriedades dos objetos e que consiste
numa conceituação descritiva. Da
segunda, resulta a aprendizagem que
descobre propriedades e relações das
próprias ações do sujeito, do
pensamento em relação à prática,
consistindo na sistematização abstrata
em relação ao pensamento concreto.
16. Pela abstração reflexiva, as
experiências lógico-matemáticas vão se
integrando em novas estruturas, cuja
construção se dá pela reconstrução da
estrutura anterior (permitindo a
coerência e a continuidade) ou pela
ampliação da precedente,
generalizando-a mediante a combinação
com novos elementos (dando-se assim,
o surgimento do novo).
17. As características diferenciam a
“aprendizagem física” da “lógico-
matemática”: enquanto a primeira se dá
por associação, prescinde de lógica e
necessita de incentivos externos, a
segunda se dá por indução-dedução,
necessita da lógica (conforme
diferentes fases do desenvolvimento) e
prescinde de estímulos externos (a
motivação é inerente ao próprio
processo).
18. Os conteúdos concernentes à
experiência física mantêm-se
relativamente inalterados nas
diferentes fases, já na experiência
lógico-matemática, os conteúdos
sofrem modificações com o tempo.
19. A aprendizagem, então, está
intimamente ligada ao desenvolvimento, e
consiste na mudança de conduta,
resultante, ao mesmo tempo, da
experiência e de processos de equilíbrio
(aprendizagem sensu lato). Isto quer
dizer que o desenvolvimento cognitivo não
é determinado pela mudança de conduta
conforme a experiência (ou aprendizagem
sensu stricto), mas ao contrário, a
determina.
20. CHAKUR procura tirar conseqüências
para análise do currículo e do ensino
de ciências.
Entendendo o ensino como “complexo
de ações, intencionalmente destinadas
a provocar a aprendizagem”, pondera
que as atividades escolares devem
“indicar ou expressar algum conteúdo
destinado à aprendizagem dos alunos”.
21. Concebe o conteúdo como” conjunto
de fatos, idéias, noções, princípios e
assuntos contidos num campo de
conhecimento sistematizado”. E vê no
currículo a organização desse conjunto
em experiências de aprendizagem a
serem desenvolvidas na escola.
Quanto aos estudos e pesquisas, suas
reflexões conduzem-na a criticar (ou
a somar-se aos que criticam):
22. A tendência à visão estática das
estruturas do pensamento e suas
conseqüências na prática escolar, seja
na tentativa de acelerar a
aprendizagem sem atentar para seus
limites, seja pela atitude de aguardar
que a criança saia espontaneamente e
sozinha de seu “conflito cognitivo”.
A confusão entre atividade e
trabalho manual, desligada da
estrutura lógica subjacente;
23. A confusão entre atividade e
processo figurativo;
A tendência a explicar o sucesso
de alguns alunos e o fracasso de
outros pela diferença de aptidões ou
pelo nível de capacidade de
compreensão.
24. Quanto à análise da legislação
brasileira constante da Lei 5692/71 e
dispositivos federais e estaduais dela
decorrentes, a autora identifica
alguma aproximação com os
pressupostos de Piaget:
A proposta de variação de conteúdos
e métodos conforme as fases de
desenvolvimento;
25. O escalonamento das matérias segundo
a maior ou menor amplitude do campo de
conhecimento que abrangem;
A recomendação do aproveitamento das
experiências vivenciais do educando para
a sistematização gradativa dos
conhecimentos;
A marcha do concreto para o abstrato,
considerando o período sensório-motor, a
fase das operações concretas e o estágio
das operações formais.
26. Constata também uma série de
confusões (interpretações inadequadas
da teoria psicogenética de Piaget) e
ambigüidades (alusão a autores com
posições epistemológicas distintas).
Incluem-se nessas confusões e
ambigüidades:
A identificação de nível de
escolarização com nível de
operatividade do sujeito;
27. A desconsideração de aspectos do
pensamento infantil segundo a teoria
piagetiana (sincretismo e
justaposição);
A idéia de enquadramento gradativo
dos conteúdos nos esquemas lógicos
segundo a lógica do adulto.
28. O emprego incorreto do termo
atividade (categoria curricular) como
correspondente a uma determinada
fase do desenvolvimento do sujeito
(período de operações concretas),
quando, para Piaget, todo
conhecimento é atividade independente
do nível;
A identificação incorreta dos
termos intuitivo e concreto;
29. Analisando o desenvolvimento das
atividades curriculares em sala de
aula, relativas ao ensino de ciências,
a autora busca verificar a relação
entre as exigências docentes e a
capacidade cognitiva das crianças,
partindo da hipótese de que há uma
defasagem, expressa na exigência
acima das capacidades.
30. Com base no desempenho dos alunos
em provas piagetianas de
classificação, a autora tece algumas
considerações, tais como:
Não se viabiliza na prática o
princípio de que o conhecimento não
pode ser transmitido, tem que ser
construído, conquistado;
31. O fracasso e o desajustamento da
atuação do educador no desenvolvimento
do currículo escolar deve-se em grande
parte, ao fato de que ele inicia as tarefas
pela linguagem e por instrumentos
figurativos do conhecimento, ao invés de
partir da ação;
Omite-se (ou ignora-se ) o fato de que
o comportamento manifesto do aluno traz
subjacentes estruturas cognitivas a serem
levadas em conta no processo de ensino-
aprendizagem.
32. Assim, o meio escolar torna-se cada
vez mais técnico e menos natural, a
ponto de o ensino e a própria escola
chegarem a ser desnecessários
(quando não prejudiciais) à vida
intelectual do sujeito e às suas
atividades práticas.
33. Tais considerações, estendem-se
também ao trabalho de formação dos
professores, em que são apresentadas
orientações diversas, incompatíveis,
inadequadas à realidade dos alunos e
nem mesmo condizentes com as
determinações legais e a proposta
curricular que se pretende sejam
seguidas e cujas confusões e
ambigüidades não são tocadas.
34. Mas é possível vislumbrar algumas
possibilidades, no próprio
desenvolvimento do currículo, nos
limites estreitos da escola, a partir
da contribuição de Piaget. A
abordagem interacionista (sujeito-
objeto), própria do construtivismo
genético (conquista e construção de
conhecimentos), permite levantar
alguns fundamentos para o
desenvolvimento curricular:
35. Noção de competência do aprendiz,
conforme a evolução das capacidades de
certas condutas;
Perspectiva de interação entre o sujeito
que aprende e a situação de aprendizagem;
Pressuposto da construção progressiva das
estruturas cognitivas (ordenação de
objetivos, conteúdo programático e
atividades para atingir, gradativamente o
aspecto propriamente “formal” dos
conhecimentos, atendendo às várias etapas
das estruturas internas do sujeito).
36. É preciso no entanto, tentar
corresponder a estrutura curricular
ao nível de “competência” da criança
em um determinado domínio. Isto
corresponde a criar situações que
provoquem contradições, que gerem o
“desequilíbrio cognitivo´,que causem
distúrbios no modo costumeiro de
pensar, exigindo o acionamento do
processo de equilibração.
37. Finalmente evitar a
compartimentação dos objetivos em
classificação, seriação, raciocínio
numérico, raciocínio espacial, etc,
pois isto reitera uma noção
mecanicista de inteligência, que
consiste na mera justaposição de
competências.
38. Segundo CHAKUR, com o currículo
organizado a partir das estruturas
cognitivas correspondestes às diferentes
fases de desenvolvimento do sujeito, o
ensino deixa de se prender unicamente
ao aspecto discursivo. Para ela, a ação
pedagógica tenderá a apresentar
melhores resultados, se o professor se
apoiar “nas estruturas naturais do
pensamento, sem recorrer
necessariamente aos signos (lingüísticos e
ou matemáticos) e à formalização”.
39.
40. A aquisição dos conceitos
científicos, sob o ponto de vista do
desenvolvimento cognitivo, enquanto
formação de funções psíquicas
superiores, através de investigações
da psicologia contemporânea ,
obteve-se importantes contribuições
para a reflexão sobre problemas de
estruturação do conteúdo curricular
e de organização do processo ensino-
aprendizagem na educação escolar.
41. Refletindo sobre problemas de
generalização do ensino, e colocando
a necessidade da superação do
pensamento empírico-discursivo pelo
científico-teórico, DAVYDOV
(1981), refere-se às críticas que
vem sendo submetida a teoria
empírica do pensamento, no plano
lógico-gnoseológico.
42. Situa a importância das teorias
psicológicas sobre o desenvolvimento
cognitivo, que tratam da
generalização e formação dos
conceitos nas crianças com base nas
peculiaridades gerais da atividade
mental, destacando os trabalhos de
Vygotsky, Rubinstein, Piaget.
43. Piaget, salienta o “papel das
operações do sujeito em seu
pensamento”, e com isso, facilitado
“a interpretação correta das
regularidades fundamentais na
constituição do intelecto infantil.
44. Mas pondera que, não obstante
tenha abordado “as peculiaridades
do pensamento genuinamente
teórico” Piaget limitou-se a
concentrar “sua atenção nos
aspectos estruturais-discursivos do
pensamento”, deixando de analisar
“oo desenvolvimento do conteúdo do
próprio pensamento”
45. O concentrar-se na formação das
estruturas lógicas matemáticas fez
que Piaget identificasse o
desenvolvimento do pensamento com
o das estruturas pensantes,
enxergando, de modo invertido, o
desenvolvimento do conhecimento
das coisas como resultado do
desenvolvimento da lógica.